Lendas de Portugal de norte a sul
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About this ebook
Mesmo se as narrativas de fundação fazem referência a fenômenos históricos, têm sempre um conteúdo fictício e mítico.
A literatura oral é uma forma de arte. O texto transmitido oralmente é transformado de acordo com os interesses de cada um visto que o narrador depois de vizualizar as personagens e o cenário improvisa o fraseado fazendo aparecer novas variantes. Por conseguinte, nunca duas narrativas de uma mesma história oral serão iguais.
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Book preview
Lendas de Portugal de norte a sul - Eunice Martins
SUMÁRIO
Viana do Castelo
As Unhas do Diabo
Deu-La-Deu Martins
A Inês Negra
Lenda da Serra do Nó
Lenda da Cabeça da Velha
Lenda da Conversão de Abul
A Truta da Raínha
Braga
O Castelo de Faria
O Senhor do Galo de Barcelos e o Milagre do Enforcado
Egas Moniz, o Aio
Lenda da Cruzes de Barcelos
Bragança
Lenda do Castelo de Bragança ou da Torre da Princesa
Lenda do Bálsamo na Mão
Vila Real
Lenda da Moura da Ponte de Chaves
Lenda da Praga do Fogo
Porto
O Senhor de Matosinhos
Santiago e Caio
Lenda de Valongo e Susão
Lenda do Rei Ramiro
Lenda de Pedro Sem
Lenda dos Tripeiros
Aveiro
A Mula da Rainha Santa
Lenda de Santa Joana Princesa
Lenda da Nossa Senhora de Vagos
Viseu
Origem do Nome de Viseu
Lenda de Lamego
A Cura do Infante
Lenda dos Távoras
Lenda da Caninha Verde
A Senhora da Lapa
Origem do Nome de Viseu
Lenda de Viseu
Guarda
Lenda da Conversão dos Mouros de Trancoso
O Açor e o Príncpe – Lenda dos Três Milagres
Lenda da Serra da Estrela ou do Pastor e da Estrela
Lenda das Águas de Almofala
Coimbra
Lenda do Milagre das Rosas
A Raiva do Alva
Os Ferreiros de Penela
Os Degolados de Montemor-o-Velho
As Arcas de Montemor
Lenda do Mouro do cabril
Castelo Branco
Lenda do Cativo de Belmonte
Lenda da Bezerra de Monsanto
Leiria
A Padeira de Aljubarrota
O Monstro de Aljubarrota
S. Jorge e o Dragão
A Bilha de Água – Lenda da Bilha de S. Jorge
O Lidador ou a Lenda da Porta da Traição
Lenda do Milagre da Nazaré
Lenda da Nazaré
A Abóboda
A Fonte da Barroquinha
A Moeda de Prata
A Ponte do Cavaleiro
A Princesa Zara
A Senhor da Gaiola
Amor e Cegovim
Ana de Bragança
As três portas da Sé
O Agulhado
O Bodo do pão e do queijo
O Corvo da tomada de Leiria
O Milagre das rosas
O Pajem invejoso
Os Olhos de água da Caranguejeira
Pastorinha do Arrabal
Santa Iria
Senhora do Monte
Santarém
Mem Ramires e a Conquista de Santarém – Lenda da Fundação do Mosteiro de Alcobaça
Lenda da Fonte da Moura
Lenda da Princesa Fátima
Lenda de Santa Iria
Beatriz e o Mouro
Lenda de Santarém
Lenda do Alfageme de Santarém
O Algar do Mouro
Milagre de Santo António
Lisboa
Lenda da Obras de Santa Engracia
Lenda da Cova Encantada ou da Casa da Moura Zaida
Lenda dos Sete Ais
O Cavaleiro Henrique
Martim Moniz
A Mula da Rainha Santa
Lenda de Santa Joana Princesa
Setubal
Lenda da Caparica
Lenda do Santo António da Charneca
Portalegre
Lenda do Pastor da Corrente de Ouro
Lenda dos Amores de D. Lopo
Evora
Lenda de Geraldo Geraldes, o Sem Pavor
Lenda dos Estremoços
Beja
Lenda do Milagre de Ourique
A Morte do Lidador
Faro
Lenda das Amendoeiras em Flor
Lenda da Casteslã Moura de Salir
Lenda do Manto de Santo António
Lenda de Dona Branca ou da Tomada de Silves aos Mouros
Lenda do Almocreve de Estói
Algôs ou Algoz
A Moura do Castelo de Tavira
Lenda das Três Gémeas
Lenda dos Corvos de S. Vicente
Lenda da Moura Cassina
Açores
Lenda das Sete Cidades
O Senhor Jesus de Ponta Delgada
Madeira
Lenda de Machico ou do Amor Imortal
Lenda do Cavalum
O Milagre da Senhora do Monte
Lenda da Noite de S. Silvestre
Outras Lendas
Lenda de S. Cristovão
Lenda do Vidro
Bibliografia
Viana do Castelo (lendas)
As Unhas do Diabo
Em tempos que já lá vão, morreu um célebre escrivão que vivia em Ponte de Lima. O escrivão não era modelo de virtude ou honestidade. Tendo lesado muitas famílias, falsificava documentos e aceitava subornos que guardava numa arca escondida no sótão de sua casa. Era do consenso geral que aquela alma não tinha salvação possível e duvidava-se mesmo que tivesse direito a um enterro cristão. No entanto, os frades franciscanos do Convento de Santo António ofereceram-se para sepultar o homem. À meia-noite do dia do enterro, os franciscanos foram acordados por três sonoras argoladas na porta do convento. Do outro lado, uma voz pedia-lhes para se reunirem na capela pois queria falar-lhes. Quando abriram a porta, entrou um vulto imponente e de olhar penetrante. Os frades assustados reparam que apesar de estar muito bem vestido tinha uns pés estranhos, chanfrados como os das cabras. O visitante dirigiu-se à capela onde estava sepultado o escrivão. Parando à frente da sua sepultura, retirou o corpo amortalhado e fez com que este vomitasse a hóstia que tinha na boca. Em seguida o vulto, mais negro e temível, elevou-se no ar com o corpo do defunto e saiu por uma janela com um grande estrondo. A comunidade correu para o adro e ainda conseguiu ver os dois corpos unirem-se num só e voarem pelos céus com uma risada diabólica, deixando atrás de si um rasto de cheiro a queimado.
Deu-la-Deu Martins
Uma imagem de mulher, segurando um pão em cada mão do alto de uma torre, figura no brasão de Monção com a legenda : Deus a deu - Deus o há dado. Esta é uma homenagem à coragem e astúcia de uma grande heroína, Deu-la-Deu Martins, mulher do capitão-mor de Monção, Vasco Gomes de Abreu. Na época das guerras entre D. Fernando de Portugal e D. Henrique de Castela, vivia em Monção Deu-la-Deu Martins, mulher do capitão-mor da região. Um dia, o galego D. Pedro Rodriguez Sarmento resolveu pôr cerco a Monção com um poderoso exército, aproveitando a ausência temporária do seu capitão-mor. A vila foi aguentando o cerco sob o comando de Deu-la-Deu Martins, mas a escassez de alimentos começava a tornar-se desesperante. Foi então que Deu-la-Deu se lembrou de mandar fazer alguns pães da pouca farinha que restava. Pegou nos pães, subiu à muralha e atirou-os aos sitiantes, dizendo-lhes que as provisões abundavam na cidade e que, dada a duração do cerco, os galegos poderiam precisar de alimento. O inimigo, também cheio de fome e pensando que o cerco ainda poderia demorar mais tempo, decidiu retirar para Espanha. Este feito ficou para sempre na memória dos portugueses e deu origem ao costume de os vereadores do município se dirigirem ao túmulo de Deu-la-Deu, quando tomavam posse dos seus cargos, prestando-lhe homenagem.
A Inês Negra
Esta história teve lugar em 1388, no início do reinado de D. João I, em que se travou uma guerra contra Castela pela independência de Portugal. Esta contenda, em que sobressaíram os feitos do Condestável Nuno Álvares Pereira e de muitos nobres portugueses, dividiu a aristocracia e o povo português, tomando muitas terras o partido de Castela.Inês Negra era uma mulher do povo fiel à causa da independência de Portugal, no início do reinado de D. João I. Nessa altura, algumas terras portuguesas eram a favor de Castela. Por essa razão, Inês Negra abandonou Melgaço. Mais tarde, D. João I decidiu reconquistar Melgaço e Inês Negra juntou-se ao seu exército, mas as duas facções nunca chegaram a defrontar-se. Diz a lenda que a Arrenegada
, inimiga de longa data de Inês Negra, desafiou Inês do alto das muralhas, propondo que a contenda fosse resolvida entre ambas com o acordo do exército castelhano. D. João I assistiu espantado à resposta de Inês Negra que dizia aceitar o desafio e ambos os exércitos consentiram o confronto entre as duas. No meio da luta, a Arrenegada
conseguiu retirar a espada das mãos de Inês, mas esta tirou uma forquilha da mão de um camponês e continuou o confronto. Passado pouco tempo, as duas resolveram lutar sem armas e Inês feriu a Arrenegada
de tal forma que esta fugiu para o castelo. Os castelhanos abandonaram Melgaço no dia seguinte e D. João I quis recompensar a heroína, mas esta respondeu que estava plenamente recompensada pela sova que tinha dado à sua inimiga.
Lenda da Serra do Nó
A lenda do Castelo da Serra do Nó, perto de Viana de Castelo, é do tempo em que os mouros dominavam parte da península ibérica, vivia um chefe mouro, Abakir, na região de Viana do Castelo. Abakir morava num castelo, mesmo do topo da serra do Nó, tinha fama de conquistador de terras e de mulheres e era dos mais ricos do mundo, segundo se dizia. Um dia, quando regressava a casa após mais uma batalha bem sucedida, Abakir viu uma linda pastora por quem se apaixonou imediatamente. Mandou que a trouxessem à sua presença e disse-lhe que queria que ela ficasse ali a viver com ele para sempre. Conhecendo a reputação de Abakir, a jovem pastora recusou a oferta. Enfurecido, Abakir mandou prender a pastora na torre do castelo até que lhe pedisse perdão por ter ousado afrontá-lo. Como ela nunca o fez, Abakir ofereceu-lhe o seu amor incondicional. Então, a pastora impôs-lhe uma condição : afastar-se de outras mulheres e só ter olhos para ela. Abakir aceitou a imposição. Viveram felizes até que um dia a ameaça dos exércitos cristãos se fez sentir e Abakir aconselhou os seus súbditos a fugir, tendo ficado sozinho com a sua pastora no castelo. Quando se ouviam já os gritos de vitória dos cristãos, Abakir abraçou a sua amada, pegou no Corão, sussurrou umas palavras misteriosas e fez um sinal mágico com a mão. Quando os cristãos chegaram à Serra do Nó, o castelo tinha desaparecido. Segundo conta a lenda, quem conseguir descobrir a entrada do castelo encantado através de uma gruta ficará possuidor de maravilhosas riquezas !