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GUIÃO PARA LEITURA ORIENTADA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
de Manuel da Fonseca 
 
 
 
 

L. Portuguesa Prof. Elsa Giraldo


MESTRE FINEZAS, de Manuel da Fonseca.

 
          Agora  entro,  sento‐me  de  perna  cruzada,  puxo  um  cigarro,  e  à  pergunta  de  sempre 
respondo soprando o fumo:  
‐Só barba.  
Ora é de há pouco este meu à‐vontade diante de mestre Ilídio Finezas. Lembro‐me muito 
bem de como tudo se passava. Minha mãe tinha que fingir‐se zangada. Eu saía de casa, rente à 
parede,  sentindo  que  aquilo  era  pior  que  ir  para  a  escola.  
            Mestre Finezas puxava um banquinho para o meio da loja e enrolava‐me numa enorme 
toalha. Só me ficava a cabeça de fora. Como o tempo corria devagar!  
A tesoura tinia e cortava junto das minhas orelhas. Eu não podia mexer‐me, não podia 
bocejar sequer. ‐ «Está quieto, menino» ‐ repetia mestre Finezas segurando‐me a cabeça entre 
as  pontas  duras  dos  dedos:  ‐  «Assim,  quieto!»  ‐  Os  pedacitos  de  cabelo  espalhados  pelo 
pescoço,  pela  cara,  faziam  comichão  e  não  me  era  permitido  coçar.  Por  entre  as  madeixas 
caídas para os olhos via‐lhe, no espelho, as pernas esguias, o carão severo de magro, o corpo 
alto curvado. Via‐lhe os braços compridos, arqueados como duas garras sobre a minha cabeça. 
Lembrava  uma  aranha.  Era  pelo  Inverno.  Jantávamos  à  pressa  e  nessas  noites  minha  mãe 
penteava‐me com cuidado. Calçava uns sapatos rebrilhantes e  umas  peúgas de seda  que me 
enregelavam os pés. Saíamos. E, no negrume da noite que afogava as ruas da vila, eu conhecia 
pela voz famílias que caminhavam na nossa frente e outras que vinham para trás. Depois, ao 
entrar no teatro, sentia‐me perplexo no meio de tanta luz e gente silenciosa. 
Mas todos pereciam corados de satisfação.  Daí a pouco, entrava num mundo diferente. Que 
coisas  estranhas  aconteciam!  Ninguém  ali  falava  como  eu  ouvia  cá  fora.  E  mesmo  quando 
calados tinham outro aspecto; constantemente a mexerem os braços. Mestre Finezas era o que 
mais  se  destacava.  E  nunca,  que  me  recorde,  o  pano  desceu,  no  último  acto,  com  mestre 
Finezas ainda vivo. Quase sempre morria quando a cortina principiava a descer e, na plateia, as  
Senhoras  soluçavam  alto.  Aquelas  desgraças  aconteciam‐lhe  porque  era  justo  e  tomava,  de 
gosto, o partido dos fracos. E, para que os fracos vencessem, mestre Finezas não tinha medo de 
nada nem de ninguém. Heroicamente, de peito aberto e com grandes falas ia ao encontro da 
morte.  
         Eu arrepiava‐me todo. Uma noite mestre Finezas morreu logo no primeiro acto. Foi um 
desapontamento. Todos criticaram pelo corredor, no intervalo. ‐ «0 melhor artista morrer mal 
entra em cena ... ! Não está certo! Agora vamos gramar, quatro actos só com canastrões!», 
Dizia o doutor delegado a meu pai. Mas a cena tinha sido tão viva e a sua morte tão notada 
durante  o  resto  do  espectáculo  que,  no  outro  dia,  me  surpreendi  ao  vê‐lo  caminhando  em 
direcção à loja.   
         Ora  havia  também  um  outro  motivo  para  a  minha  admiração.  Era  o  violino.  Mestre 
Finezas, quando não tinha fregueses, o que era frequente durante a maior parte do dia, tocava 
violino.  E  muita  vez  aconteceu  eu  abandonar  os  companheiros  e  os  jogos  e  quedar‐me, 
suspenso, a ouvi‐lo, de longe. Era bem bonito. Uma melodia suave saía da loja e enchia a vila 
de tristeza.  
Passaram anos. Um dia, parti para os estudos. Voltei homem. Mestre Finezas é ainda a 
mesma  figura  alta  e  seca.  Somente  tem  os  cabelos  todos  brancos.  
       ‐ Olha bem para mim, ‐ pede‐me às vezes ‐ olha bem e diz lá se este é o mesmo homem 
que tu conheceste?...  
 Finjo‐me admirado de uma tal pergunta. Procuro convencê‐lo de que sim, de que ainda 
é. Compreende as minhas mentiras e abana docemente a cabeça:  
  ‐Estou um velho, Carlinhos...    
 Vou  lá  de  vez  em  quando.  A  loja  está  sempre  deserta.  As  mãos  muito  trémulas  de 
mestre  Finezas  mal  seguram  agora  a  navalha.  E  também  abriram,  na  vila,  outras  barbearias 

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cheias de espelhos e vidrinhos, e letreiros sobre as portas, a substituírem aquela bola com um 
penacho  que  mestre  Finezas  ainda  hoje  tem  à  entrada  da  loja.  
Mestre  Finezas  passa  necessidades.  Vive  abandonado  da  família,  com  a  mulher  entrevada, 
num  casebre  próximo  do  castelo.  Eu  sou  o  seu  único  confidente  e  um  dos  raros  fregueses.  
        Algo  de  comum  nos  aproximou.  Ilídio  Finezas  sonhou  ser  um  grande  artista,  ir  para,  a 
capital, e quem sabe se pelo mundo fora. Eu falhei um curso e arrasto, por aqui, uma vida de 
marasmo  e  ociosidade.  Há  entre  mim  e  esta  gente  da  vila  uma  indiferença  que  não  consigo 
vencer. O meu desejo é partir breve. Mas não vejo como. E, quando o presente é feio e o futuro 
incerto, o passado vem‐nos sempre à ideia como o tempo em que fomos felizes. Daí eu ser o 
confidente  de  mestre  Finezas.  Ele  ajuda  as  minhas  recordações,  contando‐me  dos  dias  a  que 
chama  da  «sua  glória».  Estamos  sozinhos  na  loja.  De  navalha  em  punho,  mestre  Finezas 
declama  cenas  inteiras  dos  «melhores  dramas  que  ainda  se  escreveram».  E  há  nele  uma 
saudade tão grande das noites em que fazia soluçar de amor e mágoa as senhoras da vila, que, 
amiúde,  esquece  tudo  o  que  o  cerca  e  fica,  longo  tempo,  parado.  Os  seus  olhos  ganham  um 
brilho  metálico.  Fixos,  olham‐me  mas  não  me  vêem.  Estão  a  ver  para  lá  de  mim  através  do 
tempo.  
        Lentamente, aflora‐lhe aos lábios, premidos e brancos, um sorriso doloroso.  
       ‐Eu fui o maior artista destas redondezas...‐murmura. 
 Na cadeira, com a cara ensaboada, eu revivo a infância e sonho o futuro. Mestre Finezas 
já nem sonha; recorda só. 
 –A navalha magoa‐te?   
Uma  onda  de  ternura  por  aquele  velho  amolece‐me.  Dá‐me  vontade  de  lhe  dizer  que 
não, que a navalha não magoa e nem sequer a sinto. O que magoa é ver a presença da morte 
alastrando pelas paredes escuras da loja, escorrendo dos papéis caídos do tecto, envolvendo‐o 
cada vez mais, dobrando‐lhe o corpo para o chão...  
Mas  Mestre  Finezas  parece  nada  disto  sentir.  Salta  de  um  assunto  para  outro  com 
facilidade.  Preciso  de  tomar  atenção  para  lhe  seguir  o  fio  do  pensamento.  Agora  faz‐me 
queixas da vila. E termina como sempre:  
‐  Esta  gente  não  pensa  noutra  coisa  que  não  seja  o  negócio,  a  lavoura.  Para  eles,  é  a 
única razão da vida... 
 Volto  a  cabeça  e  olho‐o.  Sei  o  que  vai  dizer‐me.  Vai  falar‐me  do  abandono  a  que  o 
votaram. Vai falar‐me do teatro, da música, da poesia. Vai repetir‐me que a arte é a mais bela 
coisa  da  vida.  Mas  não.  Já  nos  entendemos  só  pelo  olhar.  Mestre  Finezas  salta  por  cima  de 
tudo isto e ergue a navalha num lance teatral:   
Atravessou  a  loja,  abriu  um  armário  cavado  na  parede,  e  tirou‐o  violino.  
‐ Eu não te disse nada, Carlinhos... mas, olha, tenho vendido tudo para não morrer de fome... 
Tudo. Mas isto! ... Estendeu o violino na minha direcção e continuou reprimindo um soluço: 
 ‐  Isto  nem  que  eu  morra!...  É  a  minha  última  recordação...  
Calou‐se por muito tempo com os olhos no chão. Depois, de boca muito descerrada, disse‐me 
como quem pede uma esmola:  
‐ Tu queres ouvir uma música que eu tocava muito, Carlinhos?... 
Manuel da Fonseca
 
 
 
 
 
 

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“ MESTRE FINEZAS “
 
I ‐ COMPREENSÃO GLOBAL 
 
1‐ Com dados  retirados / inferidos do conto, faz uma Ficha de Identificação para 
o Mestre Finezas: 
 
Nome:             
Apelido:             
Morada:             
Local de nascimento:         
Estado Civil:           
Habilitações académicas:         
Situação familiar:           
Profissão:             
 
 
2‐ À Descoberta ... 
 
2.1‐ Lê atentamente as seguintes questões e assinala a resposta correcta: 
 
a) O narrador‐ personagem chama‐se... 
• Manuel 
• Carlos  
• Ilídio 
 
b) Quando pequeno o narrador... 
• Gostava de ir à escola 
• Gostava de cortar o cabelo 
• Tinha medo do barbeiro 
 
c) No Inverno, a mãe preparava‐o para ir 
• Ao teatro 
• Ao cinema 
• A casa de amigos 
 
d) Além de barbeiro e actor Mestre Finezas tocava... 
• Piano 
• Viola 
• Violino 
 
e) Já adulto, o narrador vai à barbearia... 
• Cortar o cabelo 
• Reviver velhas histórias  
• Conversar com os fregueses 
 
f) Por necessidade Mestre Finezas... 
• Vendeu o violino 
• Vendeu tudo 
• Pede esmola 

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g) De súbito, uma revoada de notas soltaram‐se porque Mestre Finezas... 
• Se esqueceu da música 
•  Adoeceu 
• morreu 
 
 
3‐ Dispõe segundo a ordem cronológica dos acontecimentos as seguintes frases 
do texto: 
 
1‐   Uma onda de ternura por aquele velho amolece‐me. 
2‐ Agora entro, sento‐me de perna cruzada e puxo um cigarro 
3‐ Nesse tempo tinha‐lhe medo. Medo e admiração. 
4‐ Um dia, parti para os estudos. Voltei homem. 
5‐ Mestre Finezas curvou a cabeça branca. 
6‐ Mestre Finezas passa necessidades. 
7‐ Mestre Finezas era o que mais se destacava. 
8‐ Jantávamos  à  pressa  e  nessas  noites  a  minha  mãe  penteava‐me  com 
cuidado. 
9‐ Via‐lhe os braços compridos, arqueados como duas garras sobre a minha 
cabeça. 
10‐ Vai falar‐me do abandono a que o votaram. 
 
 
‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐‐
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“ MESTRE FINEZAS “ 
 
 
II – INTERPRETAÇÃO 
 
Responde correctamente às seguintes questões: 
 
1‐ Reparaste certamente no nome atribuído à personagem. 
 
1.1‐ Indica o significado da palavra FINEZAS. 
 
1.2‐ Tendo em conta a profissão e os seus momentos de glória no palco e na música, 
justifica o seu nome: Mestre Finezas. 
 
2‐ As noites de récita tinham uma solenidade especial. Indica de que forma se revela essa 
solenidade ao nível: 
• Do vestuário do rapazinho 
• Das atitudes da mãe 
• Das reacções das pessoas 
 
    2.1‐ “ Daí a pouco entrava num mundo diferente” 
    2.1.1‐ Qual era esse mundo? 
    2.1.2‐ Como é que influenciava o narrador? 
 
3‐ Mestre Finezas não se deixou corromper pelo progresso e vive apenas de recordações. 
 
3.1‐ Retira do texto as frases que justificam esta afirmação. 
 
4‐ Agora o narrador tornou‐se confidente de Mestre Finezas. Como justificas essa relação 
entre ambos? 
 
5‐ Mestre Finezas mostra uma relíquia ao narrador. 
 
5.1‐ Indica‐a. 
 
5.2‐ Como explicas o valor que ela adquire para ele e para o narrador? 
            
   
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

6
MESTRE FINEZAS 
 
III – CATEGORIAS DA NARRATIVA 
 
1‐ Divisão do texto em partes lógicas. 
 
2‐ A acção do conto desenvolve‐se  à volta de momentos que correspondem a diferentes 
fases da vida das personagens. Preenche o quadro seguinte com elementos retirados 
do texto. 
 
Momentos do texto  Localização  Sentimentos/    atitudes  Causas  dos  sentimentos/ 
Tempo                 Espaço  do narrador  atitudes 
1º       
 
 
2º       
 
 
3º       
 
 
4º       
 
 
5º       
 
 
6º       
 
 
7º       
 
 
 
 
3‐ O  conto  constrói‐se  sobre  a  alternância  temporal,  isto  é,  ora  o  narrador  fala  do 
presente, ora fala do passado. 
 
3.1‐ Transcreve as expressões que introduzem essa alternância. 
 
3.2‐ “Como o tempo decorria devagar.” 
 
  Como explicas o aparente absurdo que encerra esta frase? Será que o tempo corre a 
diferentes velocidades? A que tipo de tempo se refere esta frase? 
 
 
4‐ Indica os espaços físicos onde decorre a acção durante a infância do narrador. 
 
4.1‐ Relaciona esses espaços com as actividades da personagem principal. 
 
4.2‐ Caracteriza o espaço social onde decorre o conto. 

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5‐ Mestre Finezas está  retratado  física e psicologicamente. 
 
5.1‐ Procura elaborar o retrato de Mestre Finezas. ( Físico, Psicológico e social). 
 
PASSADO  PRESENTE 
   
 
 
 
 
 
5.2‐  Indica  o  recurso  expressivo  utilizado  no  5º  parágrafo,  para  caracterizar  esta 
personagem. 
 
5.3‐ Que ideia pretenderá o autor exprimir através deste recurso? 
 
6‐ Classifica o narrador relativamente à sua presença e à sua posição face ao que conta. 
 
7‐ Neste conto são utilizados vários modos de representação do discurso. 
 
7.1‐ Identifica‐os. 
 
7.2‐ Exemplifica‐os 
 
7.3‐ Qual deles é predominante? 
 
IV 
 
“ O arco roçou pelas cordas e um murmúrio lento começou, (...) e penetrava‐me de uma 
sensação dolorosa (...) Mas, na minha frente, Mestre Finezas, alheio a tudo, fazia gemer o 
seu violino (...) Todo jogado para o tecto.” 
 
Nestes três parágrafos está contida uma sugestão de lentidão e de melancolia. Selecciona 
as  palavras  ou  expressões  responsáveis  por  tal,  identificando  as  respectivas  classes 
morfológicas: 
• Nomes 
• Adjectivos 
• Verbos 
• advérbios 
 
 
V‐ COMPOSIÇÃO 
 
 
Imagina que após a morte de Mestre Finezas, o Jornal da terra, considerando que 
morrera  uma  pessoa  importante,  típica  da  região,  pede  ao  nosso  narrador  para 
escrever  um  pequeno  texto  biográfico  sobre  ele.  Faz  de  conta  que  és  o  nosso 
narrador escrevendo o texto. 
(Se preferires redige a notícia que será publicada no jornal). 
 

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