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Projeto

PERGUNTE
E
RESPONDEREMOS
ON-LIN.E

Apostolado Veritatis Spiendor


com autorizacáo de
Dom Estéváo Tavares Bettencourt, osb
(in memoríam)
APRESENTAQÁO
DA EDIpÁO ON-LINE
Diz Sao Pedro que devemos
estar preparados para dar a razáo da
nossa esperanga a todo aquele que no-la
pedir (1 Pedro 3,15).

Esta necessidade de darmos


conta da nossa esperanga e da nossa fé
hoje é mais premente do que outrora,
visto que somos bombardeados por
numerosas correntes filosóficas e
religiosas contrarias á fé católica. Somos
assim incitados a procurar consolidar
nossa crenca católica mediante um
aprofundamento do nosso estudo.

Eis o que neste site Pergunte e


Responderemos propoe aos seus leitores:
aborda questóes da atualidade
controvertidas, elucidando-as do ponto de
vista cristáo a fim de que as dúvidas se
dissipem e a vivencia católica se fortaleca
no Brasil e no mundo. Queira Deus
abencoar este trabalho assim como a
equipe de Veritatis Splendor que se
encarrega do respectivo site.

Rio de Janeiro, 30 de julho de 2003.

Pe. Esteváo Bettencourt, OSB

NOTA DO APOSTOLADO VERITATIS SPLENDOR

Celebramos convenio com d. Esteváo Bettencourt e


passamos a disponibilizar nesta área, o excelente e sempre atual
conteúdo da revista teológico - filosófica "Pergunte e
Responderemos", que conta com mais de 40 anos de publicagáo.

A d. Esteváo Bettencourt agradecemos a confisca


depositada em nosso trabalho, bem como pela generosidade e
zelo pastoral assim demonstrados.
ANO XXXIV

JUNHO

1993

co SUMARIO

co
Ul "Manso e Humilde de Corapao..."
o
CO
Nulidade de Casamento
UJ

o
Eutanasia voluntaria... Eutanasia involuntaria

co "Historia" (Joel R. dos Santos)


<

i UJ
_l
Que é a Ordem DeMolay?

Santo Antonio de Categeró


o
GC
Q.
Preservativo ou Prevengao?
PERGUNTE E RESPONDEREMOS
JUNHO 1993
Publicarlo mensal N? 373

Diretor-Responsavel SUMARIO
Estévao Bettencourt OSB
Autor e Redator de toda a materia "Manso e Humilde de Coráceo 241
publicada neste periódico
Causas de:
Nulidade de casamento 242
Oiretor-Administrador:
D. Hildebrando P. Martins OSB "RevelacSo":
Novo rito de Batismo? 260
Administracao e distribuido: A experiencia ensina:
Edicoes "Lumen Christi" Eutanasia voluntaria... Eutanasia
Rúa Dom Gerardo, 40 ■ 59 andar ■ sala 501 involuntaria 264
Tel.: (021) 291-7122
Livro antididático:
Fax (021) 263-5679
"Historia" por Joel Rufino dos
Santos 270
Endereco para correspondencia:
Ed. "Lumen Christi Mais urna proposta:
Que é a Ordem DeMolay? 275
Caixa Postal 2666
20001-970 - Rio de Janeiro - RJ Quem é?
Impressáo e Encadernscáo Santo Antonio de Categeró 283

O Flagelo da AlDS:
Preservativo ou Prevencio? 286

MA R QUESSA RAÍ VA"


GRÁFICOS E EDITORES S A,
Telt.: 1021) 2739498 273-9447

NO PRÓXIMO NÚMERO:

A Astrologia considerada á Luz da Ciencia. — Pessoa: Como identifíca


la? — A Vida da Mae ou a do Filho? — "O que é preciso saber sobre a
Renovacao Carismática" (D.A.A. Miranda). — Comunidade Ideal.

COM APROVACÁO ECLESIÁSTICA


ASSINATURA ANUAL 112 numaros) Cr$ 350.000.00 - n° avulto ou aunado Cr$ 40.000.00

O pagamento poderá ser a sua escolha

1. Enviar EM CARTA cheque nominal ao Mosteiro de Sao Bento. cruzado,


anotando no verso: "VÁLIDO SOMENTE PARA DEPÓSITO na conta do
favorecido" e onde consta "Cod. da Ag. e o N? da C/C." anotar: 0229
02011469-5.

2. Depósito no BANCO 00 BRASIL, ag. 0435-9 Rio C/C 0031-304-1 do


Mosteiro de S. Bento do Rio de Janeiro, enviando a segu'r xerox da guia
de depósito para nosso controle.

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Sendo novo Assinante. é favor enviar carta com nome e endereco legiveis.
Sendo renovacao, anotar no VP nome e endereco em que está recebendo
a Revista.
LJIUL.IW I

'MANSO E HUMILDE DE CORAQÁO...'

0 mes de junho é, pela piedade católica, consagrado ao Coracao de


Jesús. Esta devocao visa a cultuar o Amor de Deus aos homens, simboliza
do pelo sinal do coracao. Urna vez concluidos os ciclos de Natal, Páscoa e
Pentecostés, a Igreja quer deter-se, com especial afeto, sobre a razao de ser
mais profunda de toda a historia da salvacao, ou seja, o Amor daquele que
primeiro nos amou (cf. Uo 4, 19).

O coracao na Biblia significa a sede do pensamento e dos afetos do


homem,.de tal modo que, quando o Senhor anuncia a conversao do seu
povo, promete: "Dar-vos-ei um coracao novo... tirarei do vosso peito o co
racao de pedra e vos darei um coracao de carne" (Ez 36, 26).

O Coracao de Jesús é a expressao concreta do Amor de Deus, que


nao recusou assumir a sorte do homem para santificá-la e transfigurá-la. Pelo
Coracao de Jesús que batía, era o amor de Deus que pulsava; nesse Cora-
cao achavam-se todos os tesouros da sabedoria e da ciencia para se mani
festar aos homens; por isto o próprio Jesús convidava: "Aprendei de Mim,
que sou manso e humilde de coracao" (Mt 11,29). Traspassado pela lanca
do soldado, esse Coracao deixou correr agua e sangue, ou seja, os sacra
mentos do Batismo e da Eucaristía, as torrentes de grapas que percorre-
riam os sáculos a fim de atingir todos os homens; cf. Jo 19, 31-37.
Com o passar dos tempos, a piedade crista foi-se voltando mais e mais
para o símbolo do Coracao de Jesús. Foi, porém, no sáculo XVII que a de
vocao ao S. Coracao se irradiou de maneira decisiva. Campeava entao o
jansenismo, ou seja, a heresia segundo a qual Jesús nao teria morrido por
todos os homens, mas por alguns apenas; o Cristianismo se tornava frió e
apavorante. Nesse contexto, Jesús apareceu a S. Margarida María Alacoque
(t 1690) e Ihe apresentou o seu Coracao, dizendo: "Eis o Coracao que tan
to amou os homens, a quem encheu de ¡números beneficios, e que, em
troca do seu Amor infinito, em vez de gratidao, só recebe indiferenca,
ofensas e esquecimento. É assim que Ihe respondem até mesmo aqueles
que (pelo amor privilegiado que recebem) Ihe deveriam responder com es
pecial amor". Mais adiante, referindo-se á displicencia e mesmo aos sacri
legios de pessoas consagradas, acrescentava Jesús: "Eis as feridas que rece
bo de meu povo eleito. Os outros se satisfazem em ferir o meu corpo; es
tes, porém, atacam o meu Coracao". Estas palavras lembram os "imprope
rios" cantados pela Liturgia de Sexta-feira Santa e inspirados em Miquéias
6, 1-14; Salmo 54, 13-15.

Possa o mes de junho, dedicado ao culto do Amor de Deus a todos os


homens, suscitar nos crístaos novo surto de amor que responda generosa
mente ao Primeiro Amor!

E.B.

241
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS11

ANO XXXI11 - N9 373 - Junho de 1993

Causas de:

NULIDADE DE CASAMENTO

Em síntese: O artigo aprésenla as causas que podem tornar nulo o


matrimonio sacramental. Sao: 1) Falhas no consentimento matrimonial;
2) impedimentos dirimentes e 3) falta de forma canónica. A Igreja nao
anula un¡oes sacramentáis validamente contraidas e consumadas, mas po
de, após processo meticuloso, reconhecer que nunca houve casamento,
mesmo nos casos em que todos o tinham como válido.

A atual legislacao da Igreja leva muito em conta as capacidades e limi-


tacdes psíquicas dos nubentes para contrair obrigacoes matrimoniáis vita
licias. Nao basta anaiisar o comportamento externo de aiguém para o defi
nir; é preciso reconhecer que muitos atos das pessoas sao irresponsáveis,
semiconscientes e inexpressivos, porque no foro interno faltam o senso de
responsabilidade, a maturidade ou a liberdade necessárias para que o ato
tenha valor plenamente humano e jurídico.

* * *

Sao cada vez mais freqüentes os casos de matrimonio fracassado. Se


tal foi validamente contraído na Igreja, nao há como o dissolver, pois, se
gundo a lei de Cristo, nao há divorcio; cf. Me 10,11s; Le 16,18; Mt 19,1-9;
1Cor 7,10. Pode acontecer, porém, que o vínculo matrimonial nunca te
nha existido, pois terá havido um vicio que terá tornado nulo o consenti
mento dos noivos. Em tais casos, a Igreja pode instaurar um processo para
averiguar a nulidade do matrimonio; se esta é comprovada, a Igreja declara
nulo o casamento1. Nem todas as pessoas interessadas estao esclarecidas

1 Notemos a diferenca entre declarar nulo e anular. Anular significa desfa-


zer. destruir o vínculo matrimonial, ao passo que declarar nulo implica
averiguar e tornar público o fato de que nunca houve vínculo matrimonial.

242
NULIDADE DE CASAMENTO

a respeito. Por ísto sofrem o fracasso de um "matrimonio" que talvez nun


ca tenha existido. Daí a importancia de oferecermos aos nossos leitores
urna explanacáo das normas do Direito Canónico relativas á validade e á
nulidade do casamento. Já em PR 303/1987, pp. 338-357 foi o assunto
abordado. Voltamos ao mesmo, acrescentando-lhe um ou outro trago
novo.

1. O CONCEITO DE MATRIMONIO SACRAMENTAL

O Código de Direito Canónico, canon 1055, baseando-se na Consti-


tuicao Gaudium et Spes, n° 48, do Concilio do Vaticano II, assim define
o matrimonio:

"Canon 1055 — § 1? A alianza matrimonial, pela qual o homem e a


mulher constituem entre si urna comúnnao de vida toda, é ordenada por
sua indo/e natural ao bem dos cónjuges e á geracao e educacao da prole,
e foi elevada, entre os batizados, á dignidade de sacramento.

§ 29 Portanto, entre balizados nao pode haver contrato matrimonial


válido que nao se/a, ao mesmo tempo, sacramento".

Como se vé, o canon define o matrimonio como alianca (ou como


contrato), pela qual duas pessoas se'dao totalmente urna á outra, a fim de
se ajudarem mutuamente a atingir as finalidades que o Senhor Ihes assina-
lou. Dessa mutua complementacao nasce a prole, expressao do amor recí
proco de esposo e esposa.

Notamos que, conforme o canon, o matrimonio é urna instituicao na


tural, pré-crista, que por Cristo foi elevada a um plano superior, sacramen
tal, realizando urna miniatura da uniao de Cristo com a sua Igreja. Isto
quer dizer que as propriedades da uniao matrimonial — monogamia e indis-
solubilidade - nao vigoram apenas no plano sacramental, para os fiéis ca
tólicos, mas decorrem da própría índole natural do matrimonio. Urna doa-
clo total, por ser total, nao pode ser retalhada entre um homem e varias
mulheres (ou urna mulher e varios homens), nem admite condicoes ("eu te
amarei... até o dia em que me aborreceres").

Corroborando a leí natural, a doutrina católica ensina que o matrimo


nio sacramental validamente contraído e consumado (isto é, completado
pela cópula sexual) só pode ser dissolvido pela morte; nunca é anulado.
Pode acontecer, porém, que, apesardas aparéncias, nunca tenha havido ma
trimonio. Por qué? - Por ter faltado alguma condicao essencial á validade
do casamento. Essa condicao essencial falta quando: 1) há falhas no con-
sentimento dos nubentes; 2) quando o casamento é contraído apesar de

243
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 373/1993

impedimentos dirimentes, anulantes (mantidos ocultos); 3) quando falta


a forma canónica na celebracao do sacramento.
Examinemos cada qual desses títulos de nulidade.

2. NULIDADE: QUANDO?

Eis, numa visao de conjunto, os motivos pelos quais um casamento


pode ser nulo:

A. Falhas de consentimento (cánones 1057 e 1095-1102)

A. 1. Falta de capacidade para consentir (canon 1095)


A.2. Ignorancia (canon 1096)
A.3. Erro (cánones 1097-1099)
A.4. Simu lacio (canon 1101)
A.5. Violencia ou medo (canon 1103)
A.6. Condicao nao cumprida (canon 1102)

B. Impedimentos dirimentes (cánones 1083-1094)

B. 1. Idade (canon 1083)


B.2. Impotencia (canon 1084)
B.3. Vínculo (canon 1085)
B.4. Disparidade de culto (canon 1086; cf. cánones 1124s)
B.5. Ordem Sacra (canon 1087)
B.6. Profissao Religiosa Perpetua (canon 1088)
B.7. Rapto (canon 1089)
B.8. Crime (canon 1090)
B.9. Consangüinidade (canon 1091)
B. 10. Afinidade (canon 1092
B. 11. Honestidade pública (canon 1093)
B. 12. Parentesco legal por adocao (cénon 1094)

C. Falta de forma canónica na celebracao do matrimonio


(cánones 1108-1123)

Há, pois, dezenove títulos que possam tornar nulo um casamento no


ato mesmo de ser contraído. Percorramo-los atentamente.

3. FALHAS DE CONSENTIMENTO (CÁNONES 1057 e 1095-1102)

Para contrair matrimonio validamente, os nubentes devem consentir


livremente em unir suas pessoas numa comunhao de vida definitiva e irre-
vogável:

244
NULIDAOE DE CASAMENTO

"Canon 1057 - § 19 O matrimonio é produzido pelo consentimento


legítimamente manifestado entre pessoas jurídicamente habéis; esse con
sentimento nao pode ser suprído por nenhum poder humano,

§ 29 O consentimento matrimonial é o ato de vontade pelo qual o


homem e a muiher, por al¡anca irrevogável, se entregam e se recebem mu
tuamente para constituir matrimonio".

O consentimento matrimonial assim exigido pode ser impedido ou


impossibilitado por

3.1. Falta de capacidade para consentir (canon 1095)

Escolher um(a) consorte, comprometer-se a levar todo o resto da vi


da com ele(a) na mais estrita intimidade é, sem dúvida, urna das decisoes
mais importantes que um homem ou urna muiher possam tomar. Por isto
tal ato, para que seja válido, exige que a pessoa contraente tenha conscién-
cia das obrigacoes que assume e se decida com plena liberdade. Eis por que
reza o canon 1095:

"Canon 1095 — Sao ¡ncapazes de contrair matrimonio:

19 os que nao tém suficiente uso da razio;

29 os que tém grave falta de discrícao de juízo a respeito dos direitos


e obrigacoes essenciais do matrimonio, que se devem mutuamente dar
e receber;

39 os que nao sao capazes de assumir as obrigacoes essenciais do ma


trimonio por causas de natureza psíquica".

Examinemos de perto este texto:

"§ 1? ... os que nao tém suficiente uso da razio". Este parágrafo nao
se refere apenas ás enancas e aos doentes mentáis, mas a todos aqueles
que, por um motivo ou outro, nao gozem do pleno uso de suas faculdades
no momento em que exprimem seu consentimento, porestarem perturba
dos por um trauma psíquico ou por se acharem sob a acao de drogas ou
em estado de embriaguez. Na verdade, tais observacoes nao sao novas, mas
hoje encontram mais vasta área de api ¡cacao do que outrora, porque a psi
quiatría melhor conhece as anomalías mentáis, sua evolucao e seus efeitos.
Outrora julgava-se suficiente que a pessoa tivesse parecido estar lúcida no
momento das nupcias, mesmo se antes tivesse dado sinais de alienacao
mental. Atualmente, porém, sabe-se que certas molestias psíquicas, como
a esquizofrenia, podem estar incubadas por muito tempo antes de se decía-

245
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 373/1993

rar; os familiares mesmos podem nao o perceber, mas a doenca já existe e


está atuante. Em outros casos, as molestias se manifestam em ritmo inter
mitente, podendo o paciente parecer normal quando a doenca está latente;
os acompanhantes o tém por curado ou sadio, apesar de estar sob o influ-
xo da molestia. Conta-se o caso, por exemplo, de um rapaz que julgava ser
o Messias, mas, por éfeito de prudencia ditada pelo seu subconsciente, ja
máis o disse á sua noiva. Ora dois dias após as nupcias, certo de que a espo
sa nao o abandonaría, teve grave crise de "delirio místico"!

Além do uso da razio, requer-se que os nubentes tenham maturidade


intelectual e afetiva proporcional á decisao que vao tomar. Daí prosseguir
o canon 1095:

"§ 2? Sao incapazes... os que tém grave falta de discernimento a res-


peito dos direitos e das obrigagoes essenciais do matrimonio, que se devem
dar e receber mutuamente".

O discernimento implica

- o suficiente conhecimento das obrigacoes que o(a) nubente con-


trai,... conhecimento que nao seja abstrato, mas aplicado á vida e as cir
cunstancias concretas do sujeito;

- "saber que o matrimonio é um consorcio permanente entre ho-


mem e mu I he r, ordenado á procriacao da prole por meio de alguma coope-
racao sexual" (canon 1096); "cooperacao sexual" é expressao assaz gené
rica, que nao incluí necessariamente o conhecimento de todos os porme
nores do processo fisiológico da reproducao;

- ter consciéncia de que, entre os deveres conjugáis, está a obrígacao


de comunhao de vida entre os cónjuges, com as exigencias que isto impli
ca; "amar nao é querer o outro construido, mas é querer construir o ou-
tro", diz-se popularmente.

O discernimento supoe que o noivo ou a noiva, tendo ultrapassado a


idade mental da adolescencia, tenha adquirido a estábil¡dade necessária
para se comprometer de modo irrevogável — o que implica autonomía em
relacao aos genitores (independencia frente a pai e mae), como também
autodominio para dispor de sua pessoa e entregá-la ao(á) consorte de
sua vida.

A falta de discernimento pode provir de causas varias: imaturidade


afetiva, retardo intelectual, o hábito da volubilidade, da instabilidade, do
provisorio, do "descartável" (tío incutido pelos meios de comunicacao

246
NULIDADE DE CASAMENTO

social). Acontece que pessoas dotadas de bom quociente intelectual e ha-


bitualmente equilibradas experimenten!, ñas proximidades do casamento,
urna fase de perturbacao que nao Ihes permita pronunciarse de maneira
livre e refletida. Tal foi o caso de urna jovem, bastante sensata e pondera
da, que hesitava seriamente entre o noivo que seus país Ihe impingiam, e o
rapaz que ela amava realmente; dois dias antes do casamento, foi procurar
um psiquiatra, pois já nao sabia como proceder; faltava-lhe o discernimen-
to. Claro está que quem se acha assim perturbado, nao tem condicoesde
assumir um compromisso para o resto da vida.

"§ 3?. Ineptos... os que nao sao capazes de assumir as obrigapóesessen-


ciáis do matrimonio, por causas de natu reza psíquica".

Supoem-se, neste caso, pessoas que tenham o discernintento necessá-


rio, mas sof ram de um desvio de personalidade que as impede de sustentar
a comunhao matrimonial. É o que acontece com homossexuais, mesmo
quando capazes de procriar; nao Ihes é possível viver urna vida conjugal
normal, pois difícilmente escapam á atracao por um parceiro fora do lar.
É o que acontece também com mulheres lésbicas e com linfomanfacas
(mulheres que tendem patológicamente ao abuso do coito). É o que ocor-
re outrossim com pessoas muito ciumentas, visto que se torna muito difí
cil a um(a) consorte viver com alguém que repete varias vezes por dia, sem
fundamento: "Estou certo(a) de que tu me engañas".

Incluem-se aínda sob o mesmo título de incapacitado os estados


obsessivos, que resultam de idéias fixas, neuroses e outras perturbacoes
mentáis.

O canon 1095, que trata da falta de capacidade para consentir, é o


mais evocado atualmente nos processos de declaracao de nulidade. Toca
em pontos nevrálgicos, que, sem dúvida, me rece m consideracao, mas que
estao sujeitos a ¡nterpretapoes, por vezes, laxas demais. Na verdade, é difí
cil dizerqual o límite entre maturidade e imaturidade afetiva, entre capaci-
tacao para comunhao de vida e incapacidade... Em nao poucos casos, os
tribunais eclesiásticos tém que recorrer a peritos em psicologia - o que
nao excluí certa margem de subjetivismo ao julgar. Por isto a Santa Sé
tem recomendado prudencia na aplicacao do canon 1095.

3.2. Ignorancia (canon 1096)

Suponhamos que alguém tenha plena capacidade para dar consenti-


mento matrimonial válido. Poderá acontecer, porém, que ignore os pontos
essenciaisdo compromisso conjugal. Reza o canon 1096:

247
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 373/1993

"Canon 1096 - § 1. Para que possa haver consentímento matrimo


nial, é necessário que os contraentes nao ignorem, peto menos, que o ma
trimonio é um consorcio permanente entre homem e muiher, ordenado á
procriacao da prole por meio de alguma cooperacao sexual.

§ 29 Essa ignorancia nao se presume depois da puberdade".

Este canon exige que os nubentes saibam, ao menos, que o matrimo


nio é

— um consorcio, ou seja, urna comunidade de vida e interesses...

— permanente, isto é, estável...

— entre um homem e urna muiher, isto é, tal que exclui unioes pa


ralelas {aínda que transitorias) e requer necessariamente pessoas de sexo
diverso;

— ... ordenado á procriacao, embora esta nem sempre aconteca de fato;

— ... por meio de alguma cooperacao sexual, sem que os contraentes


conhecam necessariamente todos os pormenores do processo fisiológico da
reproducao. Presume-se que, após a puberdade, rapazes e mogas conhecam
as nocoes fundamentáis de tal processo (canon 1036 § 29).

3.3. Erro (cánones 1097 e 1099)

O erro distingue-se da ignorancia, pois esta significa ausencia de no


coes, ao passo que o erro implica presenca de nocoes nao verídicas ou fal
sas. Ora pode-se conceber que os nubentes tenham concepcoes erróneas no
tocante ao que assumem. Verdade é que nem todas as concepcoes erróneas
invalidam o matrimonio: as mais graves o tornam nulo, pois quem dá seu
consentimento na base de um erro decisivo, dá-o a algo que nao existe; por
conseguinte, nfo contrai matrimonio.

Quais seriam, pois, as modalidades de erro que tornam o casamento


nulo?

3.3.1. Erro a respeito do próprio matrimonio (canon 1099)

O matrimonio sacramental é urna comúnhao de vida monogámica e


indissolúvel, elevada por Cristo a urna dignidade singular. Quem tem con
cepcoes falsa? a propósito, incorre no que se chama "erro de direito".

248
NULIDADE DE CASAMENTO

Sabemos que em nossos días mesmo os fiéis católicos naoestao bem


esclarecidos a respeito, especialmente após a ¡ntroducüo da leí civil do di
vorcio. Muitos talvez se casem pensando em dissolver seu casamento, se
nao for feliz, a fim de contrair nova uniao. Pergunta-se entao:há, nestes
casos, auténtico consentimento matrimonial?

O problema nao é de fácil solucao. Para encammhá-la, o Direito Ca


nónico distingue entre "pensar" e "querer". Alguém pode pensar que o ca
samento é rescindível, mas talvez nao queira que ele seja dissolvido de fa-
to; faz questao de que o seu casamento dure a vida inteira. Ora ém tal caso
o consentimento dado é válido. Eis o que diz o canon 1099:

"Canon 1099 - O erro a respeito da unidade, da indissolubilidade ou


da dignidade sacramental do matrimonio, contanto que nao determine a
vontade, nao vicia o consentimento matrimonia/".

Para evitar o erro de direito e os problemas daí decorrentes, a Confe


rencia Nacional dos Bispos do Brasil emitiu a seguinte norma:

"Cuidem os sacerdotes de verificar se os nubentes estao dispostos a


assumir a vivencia do matrimonio com todas as suas exigencias, inclusive a
de fidelidade total, ñas varias circunstancias e situacoes de sua vida conju
gal e familiar. Tais disposicoes dos nubentes devem explicitar-se numa de-
c/aracao de que aceitam o matrimonio tal como a Igre/'a o entende, inclu-
indo a indissolubilidade" fOrientacoes Pastorais sobre o Matrimonio,
n° 2.15).

3.3.2. Erro sobre a identidade da pessoa (canon 1097 § 19)

Reza o canon 1097, § 19: "O erro de pessoa torna inválido o matri
monio".

Distingamos entre identidade física e identidade moral.

A identidade física refere-se á pessoa como tal. Tal foi o caso, narra
do pela Biblia, de Jaco, que quería esposar Raquel e que, na noite de nup
cias, viu que estava com Lia (Gn 29,15-25). Este caso hoje em dia pratica-
mente nao ocorre.

A identidade moral diz respeito á personalidade. Há certos predica


dos que caracterizam urna personalidade bem formada. Se após o casamen
to um dos cónjuges verifica que o(a) consorte nao é absolutamente aquela
pessoa ideal ou idealizada, terá cometido erro de pessoa? Terá contraído
um matrimonio inválido?

249
\0 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 373/1993

A resposta a tais questoes é muito difícil, pois muito depende da no-


gao subjetiva que alguém tenha de consorte ideal.

Na verdade, todo ser humano está sujeito a falhas e a causar decep


coes; a nenhum nubente é lícito imaginar que encontrará a pessoa perfeita
que ele deseja. Por conseguirte, urna certa margem de decepcoes é quase
normal no casamento e nao invalida a este. Todavia pode haver atitudes de
cónjuge posteriores ao casamento que revelem urna personalidade funda
mentalmente diferente daquela que o outro cónjuge quis abracar; caso essa
diferenca seja realmente básica ou fundamental, pode-se dizer, segundo o
Pe. Hortal, que houve erro de pessoa, erro que tornou nulo o casamento1
Deve-se reconhecer que é difícil definir os limites entre predicados básicos
e predicados nao básicos, no caso. Deve-se também notar que as pequeñas
decepcoes inerentes á vida conjugal nao sao algo de extraordinario ou des
concertante na vida de um cristao, visto que este, em qualquer vocacao, é
sempre chamado a seguir o Cristo portador de sua Cruz em demanda da vi
da plena ou da ressurreicao. Exemplo de erro de personalidade ocorreu na
Franca logo após a segunda guerra mundial (1939-1945). Urna jovem, de
excelente familia, conheceu um rapaz que passava por Oficial do Exército,
herói da resistencia aos nazistas e Cavaleiro da Legiao de Honra. Casaram-
se entre si. Todavia pouco depois das nupcias a esposa descobriu que o
"herói" da Legiao de Honra nao era senao um foragido dos cárceres. O
processo terminou com a declaracao de nulidade de tal casamento, pois re
almente um réu procurado pela Policía nao é a mesma pessoa moral que
um honesto e brilhante Oficial do Exército.

' Tafea opiniao que o Pe. Jesús Hortal, S.J. emite em caráter estritamen-
te pessoal (o que quer dizer que o assunto nao é claro e permite sentenca
contraditória):

"Quando a personalidade de um cónjuge se revela completamente di


ferente de como era conhecida antes do casamento, pode-se dizer que o
consentimento matrimonial do cdnjuge que errou, é verdadeiro? Nao aca-
bou por casar com urna pessoa inexistente, que formou em sua imagina-
cao? Ao nosso modo de ver, nesse caso, podería ser invocado, como causa
de nulidade, o erro sobre a pessoa de que trata o canon 1097 § 1? 0 pro
blema está em determinar o limite entre o que é apenas urna qualidade,
mas que nao muda fundamenta/mente a personalidade, e a própria perso
nalidade. A dificuldade, porém, nao deve impedir de reconhecer que pode
haver matrimonios nulos por erro sobre a personalidade do cón/'uge" (Ca-
samentos que nunca deveriam ter existido. Urna solucao pastoral, Sao
Paulo 1987, p. 19).

250
NULIDADE DE CASAMENTO

Mais difícil é o julgamento quando se trata nao de erro de pessoa (ou


personalidade), mas de erro sobre as qualidades da pessoa. Daí o canon
1097 § 29

3.3.3. Erro sobre as qualidades da pessoa (canon 1097 § 2?)

Eis o texto em pauta:

"O erro de qualidade da pessoa, embora se/a causa do contrato, nao


torna nulo o matrimonio, salvo se essa qualidade for direta e principal
mente visada" (canon 1097 §

O caso é assaz complexo. Trata-se de determinar o limite entre urna


simples qualidade, que nao muda á personalidade, e a própria personali
dade.

Eis um exemplo:

Urna jovem esposa exclamou: "Esposei Tibúrcio, que eu julgava por


tador de todas as prendas. Infelizmente estou frustrada. Ele nao me dá
atencao; deixa-me sozinha aos domingos para ir á pesca ou jogar futebol".

Tibúrcio, por sua vez, alega:

"Mariana nao sabe por ordem em casa. Gasta dinheiro á toa, nao tem
interesse pelas enancas".

Pode-se dizer que houve entao erro sobre qualidades das pessoas to
madas em casamento? — Somente o contato direto com os dois esposos
pode ajudar a responder. Afinal de contas, qual das qualidades visadas,
mas nao encontradas na vida conjugal, tornou nulo o matrimonio? Onde
está o limite entre falhas humanas previsi'veis e aceitáveis, e falhas inaceitá-
veis, que permitem dizer que houve erro sobre as qualidades da pessoa? O
Código de Direito Canónico, no canon citado, ensina que ó erro sobre qua
lidades nao invalida o casamento a nao ser que se trate de qualidade direta
e principalmente visada, ou seja, qualidade que o(a) consorte fazia muita
questao de encontrar no(a) parceiro(a).

3.3.4. O erro doloso (canon 1098)

Chama-se dolo o erro cometido por fraude ou má fé do(a) pretenden-


te, cíente de que, se nao engañar, nao conseguirá casar-se. A propósito reza
o canon 1098:

251
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 373/1993

"Quem contrai matrimonio, engañado por dolo perpetrado para


obter o consentimento matrimonial, a respeito de alguma qualidade da ou-
tra parte, qualidade que, por sua natureza, possa perturbar gravemente o
consorcio da vida conjugal, contrai-o indevidamente".

É capital para o bom éxito de um casamento que haja boa fé e trans


parencia de um cónjuge para outro. Quando, porém, isto nao se verifica,
mas um dos cónjuges quis deliberadamente induzir o(a) consorte ao erro
para poder casarse, tal matrimonio é nulo. É o que se dá quando o rapaz
aparenta ser sadio, mas na verdade sofre de AIDS e nao o diz, ou quando
a noiva esconde ao futuro esposo o fato de que I he amputaram os ovarios
de modo que nao pode ter filhos.

3.4. Simulacao (canon 1101)

Eis o teor do canon 1101:

"Presume-se que o consentimento interno está em conformidade com


as palavras ou os sinais empregados na celebracao do matrimonio" (§ 19).

"Contudo, se urna das partes ou ambas, por ato positivo de vontade,


excluem o próprio matrimonio, algum elemento essenciai do matrimonio
ou alguma propriedade essenciai, contraem inválidamente" {§ 29).

Um principio geral do Direito leva a supor que as pessoas dizem a


verdade, enquanto nao se pode provar o contrario; daí o § 1? do canon
1101.

Existe, porém, a mentira... mentira ocorrente no próprio ato do casa


mento; é chamada simulacao. Esta pode ser total ou parcial.

É total quando um dos contraentes, embora profira com os labios o


seu consentimento, recusa interiormente o seu Sim. Isto pode acontecer
quando se obriga um rapaz a casar-se, á revelia sua, com a moca que ele
fez engravidar, ou quando urna moca é constrangida por terceiros a casar
se com um play-boy que só pensa em divertirse e nada quer levar a serio.

A simulacao é parcial quando um dos parce ¡ros aceita, sim, o casa


mento, mas recusa urna das propriedades essenciais do matrimonio: a mo
nogamia, a indissolubilidade e a abertura para a procriacao. é nulo, por-
tanto, o casamento quando alguém declara, no ato de casar-se, que aceita a
indissolubilidade, mas na verdade quer poder usar do divorcio (nao basta
que o nubente pense que o casamento é solúvel; é preciso que queira usar
do divorcio, para que o casamento seja nulo). Também é nulo o casamento

252
NULIDADE DE CASAMENTO 13

de quem, de antemao, rejeita ter filhos, embora declare o contrario ao ca-


sar-se.

3.5. Violencia ou medo (canon 1103)

O consentimento matrimonial há de ser expresso com liberdade ou


sem constrangimentó (nem interior nem exterior). Daí o canon 1103:

"É inválido o matrimonio contraído por violencia ou por medo grave


proveniente de causa extema, ainda que nao dirigido para extorquir o con
sentimento, e quando, para dele se livrar, alguém se veja obrigado a con-
trair o matrimonio".

Observemos a respeito:

1) O mal que a pessoa receia, se nao aceitar o casameto, deve ser gra
ve. A gravidade pode ser avaliada subjetivamente: o mesmo mal pode ser
tido como grave por certas pessoas, e como leve por outras. Basta, porém,
que naja gravidade subjetiva ou relativa.

2) O medo há de ser incutido por causa extrínseca {ameaca de morte,


de denuncia, de vinganca...). Nao seja fruto da imaginacao de quem se ca
sa. Nao é necessário que o medo ou a violencia visem di reta mente ao con
sentimento matrimonial, mas basta que o(a) nubente, pressionado(a) por
urna situacao embaracosa qualquer, julgue nao ter outra saída senao o
casamento.

Chama-nos a atencao ainda o medo reverencial ou o rece ¡o de desa


gradar a pai ou rnae, caso o(a) filho(a) recuse determinado casamento. Tal
medo é geralmente leve, mas pode tornar-se grave, especialmente quando a
moca ouve seu pai repetir-lhe constantemente: "Esqueces tudo o que fiz
por ti! Tu me farás morrer de tristeza!".

3.6. Condicáo nao cumprida (canon 1102)

Eis outra fonte de fal has de consentimento. Imaginemos que alguém


faga o seu consentimento depender de urna determinada condicao, que
acaba por nao se cumprir: da parte do rapaz, por exemplo, seria a exigen
cia de que a consorte seja virgem; da parte da moca, a condicao de que o
noivo nao tenha tido outra mulher na sua vida. Se, após o casamento, a
comparte interessada verifica que a condicao nao se realizou, esteja certa
de que o casamento foi nulo.

Nao é desejável que se coloquem tais condicoes antes do casamento.


Por isto o Código prescreve que, para colócalas, osnubentesprecisamda

253
U "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 373/1993

I¡cen^a previa da autoridade eclesiástica. — É diverso o caso aquí mencio


nado do caso da simulacao: neste existe rná fé ou o desejo de engañar, ao
passo que, no caso de condicao, pode a comparte silenciar um ou outro
traco de seu passado slmplesmente de boa fé ou porque nSo Ihe ocorre
abordar tal assunto.

Eis o teor do canon 1102:

"§ 1. Nao se pode contrair validamente o matrimonio sob condicao


de futuro1.

§2. O matrimonio contraído sob condicao de passado ou de presente


é válido ou nao, conforme exista ou nao aquilo que é objeto da condicao.

§ 3. Todavía a condicao mencionada no § 2 nao pode licitamente ser


colocada sem a licenca escrita do Ordinario local".

4. IMPEDIMENTOS DIRIMENTES (CAÑONES 1083-94)

A Igreja, como também o Direito Civil, estipula certas normas que


restringem o direito ao casamento em doze casos, todos eles graves, tendo
em vista o próprio bem dos interessados e da sociedade em geral.

Tais impedimentos já foram comentados em PR 303/1987, pp. 349-


357. Lirn i tamo-nos aqui a enunciá-los, acrescentando-lhes ocasionalmente
algum comentario.

1) A idade mínima para a validade de um casamento sacramental é


14 anos para as mocas e 16 anos para os rapazes. Os Bispos podem dispen
sar dessa condicao, mas rarissimamente o ifazem. A Conferencia Nacional
dos Bispos do Brasil exige dois anos mais para os casamentos no Brasil,
ou seja, 16 e 18 anos respectivamente; todavía esta exigencia incide sobre
a liceidade, nao sobre a validade do casamento.2 Cf. canon 1083.

1 Isto é, condicao de que isto ou aquilo venha a acontecer: por exempto,


"o consentimento valere se meu marido conseguir um bom emprego" ou
"... se minha esposa se formar em Música".

7 A invalidade equivale é nu/idade; torna sem efeito determinado ato. A


iliceidade nao torna nulo o ato, mas dele faz urna infracao ou urna viola-
cao da lei (eventualmente, um pecado). Por exemplo, um roubo é ato ilí
cito, ilegal e pecaminoso, mas o dinheiro roubado conserva seu valor de di-
nheiro e serve para pagar dividas (embora se/a pagamento ilícito, porque
realizado com dinheiro roubado). Urna fruta roubada é urna fruta que nao
me é lícito comer, mas que nem por isto deixa de alimentar a quem a
come.

254
NULIDADE DE CASAMENTO 15

2) A impotencia (ou incapacidadede praticar a cópula conjugal) ante


rior ao casamento e perpetua, absoluta ou relativa, é impedimento diri
mente.1 Cf. canon 1084.

3) É impedimento dirimente o vínculo de um matrimonio validamen


te contraído, mesmo que nao consumado. Cf. canon 1085.

4) A disparidade do culto também é causa de nulidade de casamento,


desde que a parte católica nao tenha obtido dispensa do impedimento.
Com outras palavras: é inválido o casamento entre um católico e. urna pes-
soa nao batizada, se a parte católica nao pede dispensa do impedimento.
Esta pode ser concedida pelos Bispos desde que

— a parte católica declare estar disposta a afastar os perigos de aban


dono da fé e prometa fazer tudo para que a prole seja batizada e educada
na Igreja Católica;

— a parte nao católica seja informada desse compromisso;

— ambas as partes sejam instruidas a respeito dos fins e propriedades


essenciais do matrimonio, que nenhum dos contraentes pode excluir.

A propósito convém dizer algo sobre o impedimento de mista reli-


giao, ou seja, sobre o casamento de um católico com urna pessoa batizada
fora do Catolicismo (protestante ou ortodoxa). Tal impedimento nao é di
rimente, isto é, nao invalida o casamento, mas torna-o ¡lícito; cf. canon
1124. A parte católica pode contrair tal matrimonio válida e licitamente
desde que obtenha a dispensa do respectivo Bispo mediante astréscondi-
poes atrás mencionadas para o caso da disparidade de culto.

1 Por "impotencia" entende-se nao a esterílidade, mas a incapacidade de


realizar urna auténtica relagao sexual. Ora a impotencia anterior ao matri
monio e perpetua (incurável) torna nulo o casamento, mesmo que o outro
conjuge conheca previamente e aceite tal situacao. Notemos bem: há pes-
soas que nao sao impotentes (sao capazes de cópula sexual), mas sao esté-
ríes (/amáis o seu ato sexual poderá redundar em prole); tais individuos
podem casarse validamente. Nao há dispensa da Igreja para esse impedi
mento, porque a relagao sexual, realizada de modo humano, é a consuma-
cao do contrato matrimonial.

Impotencia relativa é a que impede relacionamento sexual somente


com alguma ou algumas pessoas. Só é impedimento para o matrimonio
com tais pessoas. É indiferente a causa (física ou psíquica) donde procede
a impotencia. Compete aos médicos e psiquiatras averiguar se é perpetua
ou se há esperanca de cura.

255
16 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 373/1993

5) é impedimento dirimente para o matrimonio sacramental a orde-


nacáo diaconal, presbiteral ou episcopal. Cf. canon 1087.

6) Também é tal a profissao religiosa perpetua. Cf. canon 1088.

7) Rapto; cf. canon 1089. Urna mulher levada pela forca nao se pode
casar validamente com quem a está violentando dessa maneira.

8) Crime; cf. canon 1090. Os que matam seu ou sua consorte, para
facilitar um casamento posterior, estao impedidos de realizar validamente
esse casamento. Da mesma forma, se um homem e urna mulher, de comum
acordó, matam o esposo ou a esposa de um deles, nao se podem casar vali
damente entre si.

9) Consangüinidade; cf. canon 1091. Nao há dispensa na linha verti


cal (pai com filha, avó com neto...); na linha horizontal, o impedimento
(dispensável) vai até o quarto grau, isto é, atinge tio e sobrinha e pri
mos irmaos.

10) Afinidade na linha vertical; cf. canon 1092. Nao há matrimonio


válido entre o marido e as consangüi'neas da esposa e entre a esposa e os
consanguíneos do marido, suposta a viuvez previamente ocorrida. Na linha
horizontal nao há impedimento: um viúvo pode casar-se com urna irma
(solteira) de sua falecida esposa.

11) Honestidade pública; cf. canon 1093. Quem vive urna uniáo ile
gítima, está impedido de se casar com os filhos ou os pais de seu (sua)
companheiro (a).

12) Parentesco legal; cf. canon 1094. Nao é permitido o casamento


entre o adotante e o adotado ou entre um destes e os parantes mais pró
ximos do outro. Este impedimento, como outros desta lista, podem ser
dispensados por dispensa emanada da autoridade diocesana.

5. FALTA DE FORMA CANÓNICA NA CELEBRACÁO DO


MATRIMONIO (CAÑONES 1108-23)

"Forma canónica" é o conjunto de elementos exigidos para a cele


bradlo ritual do casamento. Requer-se, com efeito, que a cerimónia se rea-
lize perante o pároco do lugar e, pelo menos, duas testemunhas (padri-
nhos). O pároco pode delegar a sua atribuicao a outro sacerdote, a um
diácono ou, em algumas dioceses do Brasil que gozam de especial I ¡cenca
da Santa Sé, também a certos leigos.

256
NULIDADE DE CASAMENTO 17

A forma canónica só obriga os católicos. Basta, porém, que um dos


noivos seja católico para que a forma canónica seja obrigatória, isto é,
para que o casamento deva ser celebrado na Igreja Católica sob pena de
nulidade.

Pode haver dispensa da forma canónica. O Bispo tem a faculdade de


concede-1 a quando se trata de um casamento entre um católico e um nao-
católico, especialmente se é um cristao batizado no Protestantismo ou na
Ortodoxia. Em tais casos, porém, o prelado determina qual outra ce rimó-
nía (civil ou religiosa) substituí a católica.

Além disto, há casos em que nao é possível encontrar, sem demora,


um padre credenciado para assistir ao casamento sacramental; é o que
acontece em territorios de missao, por exemplo, pelos quais so algumas
vezes ao ano passa um missionáro. 0 próprio Direito Canónico prevé, para
esses casos, a dispensa da forma canónica nos seguintes termos:

"Canon 1116 — § 1. Se nao é possível, sem grave incómodo, ter o as-


sistente competente de acordó com o direito, ou nao sendo possível ir a
ele, os que pretenden) contrair verdadeiro matrimonio podem contrai-lo
válida e licitamente só perante as testemunhas:

19 em perigo de morte;

29 fora do perigo de morte, contanto que prudentemente se preveja


que esse estado de coisas vai durar por um mes.

§ 2. Em ambos os casos, se houver outro sacerdote ou diácono que


possa estar presente, deve ser chamado, e ele deve estar presente á celebra-
cao do matrimonio. Juntamente com as testemunhas, salva a validade do
matrimonio só perante as testemunhas".

6. DISPENSA DO CASAMENTO (VINCULO NATURAL)

Até o presente momento tratamos da verif¡cacao de nulidade de certos


casamentos; desde que esta conste, após o devidoexame, a Igreja reconhece
publicamente a nulidade e considera solteiras as duas partes interessadas.

Há, porém, casos em que o matrimonio validamente contraído no


plano natural é dissolvido pela Igreja em favor de um matrimonio sacra
mental. Examinemo-los. Com outras palavras: a Igreja nao tem o poder de
dissolver um casamento sacramental validamente contraído e consumado.
Quando, porém, o matrimonio nao é sacramental (é sustentado pelo vín-

257
_18 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 373/1993

culo natural apenas), a Igreja, em casos raros, pode dissolvé-lo em vista


da fé ou de urna vivencia matrimonial sacramental.

6.1. O Privilegio Paulino (canon 1143-47)

Em 1Cor 7,15 Sao Paulo considera o caso de dois pagaos unidos pelo
vínculo natural; se um deles se converte á fé católica e o(a) consorte pá
galo) Ihe torna difícil a vida conjugal, o Apostólo autoriza a parte católica
a separar-se para contrair novas nupcias, contanto que o faga com um ¡r-
mao ou urna irma na fé. Antes, porém, da separacao, é necessário interpe
lar a parte nao batizada, perguntando-lhe se quer receber o Batismo ou se,
pelo menos, aceita coabitar pacificamente com a parte batizada, sem ofen
sa ao Criador. Isto se explica pelo fato de que, para o fiel católico, o matri
monio sacramental é obrigatório: ou ele o contrai com o cónjuge pagao
ou, se este nao o propicia, contrai-o com urna pessoa católica. Cf. cáno
nes 1143-47.

6.2. O Privilegio Petrino (privilegio da fé); cf. cánones 1148-1150

O privilegio da fé é como que urna extensao do anterior. Como dito,


a Igreja nao pode dissolver um casamento sacramental validamente con
traído e consumado. Há, porém, unioes matrimoniáis nao sacramentáis en
tre pessoas nao batizadas. Suponhamos que alguma dessas unioes fracasse:
em conseqüéncia, urna das duas partes (convertida ao Catolicismo ou nao)
quer contrair novas nupcias com urna pessoa católica, habilitada a receber
o sacramento do matrimonio. Esta pessoa católica pode entao recorrer á
Santa Sé e pedir a dissolucao do vínculo natural do(a) seu (sua) pretenden-
te, assim como a eventual dispensa do impedimento de disparidade de cul
to (caso se trate de um judeu, um muculmano, um budista...); realiza-seen
tao a cerimónia do casamento católico. Está claro, porém, que os cónju-
ges que se separam, deve rao prover á subsistencia e á educacao (católica, se
possível) dos respectivos filhos.

O privilegio petrino ou da fé tem especial api ¡cacao nos países em


que vigora a poligamia. Se o homem nao ¿atizado que tenha simultanea-
mente varias esposas nao batizadas, receber o Batismo na Igreja Católica,
poderá escolher a mulher que preferir, e deverá casar-se com ela na Igreja
(observadas as prescricoes relativas a matrimonios de disparidade de culto,
se for o caso). O mesmo vale para a mulher nao batizada que tenha simul
táneamente varios maridos nao batizados. é evidente, porém, que o ho
mem que se converte, tem que prover ás necessidades das esposas afasta-
das, segundo as normas da justica e da caridade; cf. canon 1148.

Diz-se que a dissolucao do vínculo natural em favor de um casamento


sacramental se faz para o bem da fé (in bonum fidei), isto é, para permitir

258
NULIDADE DE CASAMENTO 19

que ao menos um dos cónjuges (a parte católica) se possa casar de acordó


com a sua fé ou na Igreja.

7. DISSOLUCÁO DO MATRIMONIO NAO CONSUMADO


(CANON 1142)

Diz o canon 1142:

"O matrimonio nao consumado entre batizados ou entre urna parte


batizada e outra nao batizada pode ser dissolvido pelo Romano Pontífice
por justa causa, a pedido de ambas as partes ou de urna délas, mesmo que
a outra se oponha".

Este caso pode ocorrer; todavía nao é fácil comprovar que nao hou-
ve consumacao carnal do matrimonio. O canon n° 1061 observa que a
consumacao do matrimonio deve ser praticada humano modo, isto é, de
modo livre e normal; na hipótese contraria, nao se pode falar de consuma-
pao. A exigencia de modo humano é muito oportuna, pois excluí os casos
de inseminacao artificial (mesmo que desta nasca urna enanca); excluí
também os casos em que a esposa é constrangida ou colhida num momen
to de transtorno mental provisorio. Outrora julgava-se que o matrimonio
estaría consumado e feito ¡ndissolúvel mesmo que a esposa, recusando
por medo iniciar a vida sexual, fosse violentada.

Como se vé, a temática matrimonio é muito complexa. O que hade


novo na legislacao da Igreja datada de 1983, é a compreensao mais apura
da do psiquismo humano e das suas potencialidades, como também dos
seus limites. Este fator é importantíssímo, pois nao se pode julgar o com-
portamento de alguém únicamente pelo seu foro externo. É decisivo o fo
ro internó, que nem sempre transparece. Em conseqüéncia, verífica-se que
muitos matrimonios outrora tidos como válidos hoje podem ser conside
rados nulos, porque faltaram ao(s) nubente(s) as condicoes psicológicas
para contrair as obrigacoes matrimoniáis.

* * *

CURSOS POR CORRESPONDENCIA

S. Escritura, Iniciacáo Teológica, Teología Moral, Historia da Igreja, Liturgia, so


bre Ocultismo, Parábolas e Páginas Dificeis do Evangelho, Doutrina Social da Igreja,
Novfssimos (Escatologia), Diálogo Ecuménico.

Pedidos de informacSes e encomendas sejam dirigidos á Escola "Mater Ecclesiae",


Caixs Postal 1362, 20001-970, Rio (RJ).

259
'Revelado":

NOVO RITO DE BATISMO?

Em síntese: Urna revelacao particular, atribuida a Jesús, ensina novo


rito de Batismo em favor das enancas que estao para morreroufá morre-
ram no seio materno. Tal rito é estranho e nao goza do reconhecimento
da S. Igre/a. Esta tem seu rito batismal. que exige o contato físico da agua
com a pele do batizando. A criancinha que morra sem ter recebido o Batis
mo assim concebido, nao está excluida da bem-aventuranca celeste, como
ensinam os teólogos recentes, baseados em válidos argumentos; a existen
cia do limbo das enancas nunca foi definida como objeto de fé.
* * *

O jornal "Em Defesa da Vida", de benemérito moví mentó antiabor


tista, com sede em Rancho Queimado (SC), publicou recentemente urna,
noticia extraída do livro "Matanpa de Inocentes ou Sangue que clama aos
Céus" <ed. Boa-Nova, Sameiro, Braga, Portugal). Tal noticia refere urna vi-
sao de que foi beneficiaría urna senhora chamada María, á qual Jesús terá
ensinado novo rito de Batismo. — O tema merece breve abordagem em
nossas páginas, visto que alguns leitores se mostram perplexos diante dos
fatos.

1. A NOTICIA

A Sra. María, modesta mae de familia e heroína pelo seu empenho de


salvar as almas, terá tido urna visao de Jesús, que Ihe dizia:

"Mari&l Tens urna grande missao a cumprir. Estes pequeninos pode-


rao aínda ir para o Céu e chegará visao de Deus... Comunica o que eu vou-
te dizer, mesmo aos meus sacerdotes. Encontrarás resistencia e sotreras
com as dífículdades, mas, com o tempo, compreender-se-á tudo o que te
digo e por-se-á em prátíca... para a maior felicidade de todas estas crían-
cínhas... VOS PODÉIS BATIZÁ-LAS le aquí Jesús nos dá asprímeíras ¡n-
dicacoes para o Batismo)...

NOTA como Eu désejo que ¡sto se faca:

260
NOVO RITO DE BATISMO7 21

VERDADEIRO RITUAL DESTE BATISMO REVELADO POR JESÚS

1 — Oracao preliminar: duas invocacoes do Salmo 32:


"Os designios do Senhor permanecen) eternamente. E os pensamen-
tos do seu Coracao, de geracao em geracao.

Para livrar da morte as suas almas. E alimentá-las no tempo da fome"


(SI 32, 11e19).

Recitase o Credo: Creio em um só Deus...

Aspersao da agua benta na direcao dos quatro pontos cardeais.

2-0 Sacramento do Batismo:

"Vos todos, que nascestes ou nascereis mortos, que fostes ou seréis


morios nos seios maternos (dizer aqui os nomes de María, José, Joao... e
do santo do día. Deus fará cair a agua benta sobre a cabeca das criancas e
dará a cada urna um nome particular)
Para que, por Jesús Cristo, possuais a Vida Eterna,

Eu vos batizo em nome do Pai e do Filho e do Espirito Santo.

3 - Oracoes Fináis:

Chamei-te pelo teu nome, és me'u (Is 43, 1}.


Cantaiao Senhor um cántico novo, porque Ele fez maravilhas (SI 97,1).
Cantare/' eternamente as grapas do Senhor (SI 88,1).
Aleluia, aleluia, aleluia.
Ó amor, ó infinito Amor de Deusl
Aleluia, aleluia, aleluia.
Pai Nosso, Ave María, Gloria ao Pai".

Pergunta-se agora:

2. QUE DIZER?

Podem-se formular tres observacoes á noticia atrás:

1) Revelacao particular

Nossos tempos sao freqüentemente perpassados pela noticia de reve


lares particulares, das quais ciertamente urna boa parte nao é auténtica.
Daí a necessidade de senso crítico perante o assunto, para quei os fiéis nao
se deixem levar pela fantasía e cultivem urna piedade meramente subjetiva,
sonhadora e ilusoria. A doutrina e a praxe da Igreja sao suficientemente ri
cas para levar todos os homens (e as changas) á vida eterna. Deus só inter-

261
22 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 373/1993

vém extraordinariamente na historia para confirmar ou esclarecer o que


Ele mesmo ensina por sua Santa Igreja.

Pode-se crer que o grande número de revelacoes particulares hoje re


gistradas corresponde a urna necessidade psicológica de muitas pessoas.
Atribuladas e perplexas, esperam sinais especiáis de Deus, que lancem luz
ou tragam alivio sobre as situacdes angustiantes de nossos dias. é necessá-
rio, pois, que os católicos estejam atentos ao fenómeno psicológico e se es-
forcem por discernir dos genuínos sinais de Deus aqueles que a imaginacao
pode estar atribuindo ao Senhor.

2) Praxe Batismal e Liturgia da Igreja

A S. Igreja fixou, em seus livros oficiáis, o rito do Batismo e a praxe


anexa. Para evitar inovacoes subjetivas e até fora da ortodoxia, a legislacao
da Igreja estipula que a ninguém 6 lícito ¡novar o que seja, no setor da Li
turgia. Por isto nao é de crer que, através de revelacoes particulares, de'ori-
gem incerta, o Senhor Deus que ira instituir um ritual novo de Batismo,
aínda que destinado apenas a casos extraordinarios. Na Igreja nao há dois
magisterios: um oficial, e outro paralelo, de índole particular.

3) Observacoes ao novo rito

CMancas já mortas nao podem ser batizadas nem precisam disto, co


mo se dirá adiante. Os sacramentos sao meios de santificacao para os vivos,
postos em demanda da vida eterna, e nao para os que já atingiram o termo
de sua caminhada terrestre. Daí ser errónea a ¡ntencao de batizar enancas
já falecidas no seio materno.

A agua deve tocar a pele do batizando. Os sacramentos agem por con


tato físico, e nao á distancia. Ora o novo Ritual prevé a aspersao da agua
na direcao dos quatro pontos cardeais, ao passo que Deus se encarrega de
fazer a agua benta cair sobre a cabeca das enancas (dando a cada qual um
nome particular). Isto supoe o milagre como algo de ordinario, e nao algo
de extraordinario. Ora a dispensacao da grapa se faz por vias ordinarias e
nao procede habitualmente por via de milagros; estes sao sempre algo de
esporádico e gratuito, nao provocável, portanto algo com que nao se
pode contar "por encomenda".

3. A DOUTRINA DA IGREJA

A doutrina da Igreja já levou em consideracao a sorte das enancas


que morrem sem Batismo.

No sáculo XI S. Anselmo de Cantuária (t1109) concebeu o limbo


como estado de felicidade natural, em que as criancinhas mortas sem Ba-

262
NOVO RITO DE BATISMO? 23

tismo veriam a Deus por analogía, ou seja, no espelho das criaturas; como
se compreende, o limbo nao seria punicao. S. Anselmo julgava que tais
criancinhas, nao tendo sido elevadas á ordem sobrenatural1 pelo Batismo,
nao estariam habilitadas á visao de Deus face-a-face (bem-aventuranpa ce
leste, que toca aos batizados), mas também nao mrerceriam o inferno por
nao terem pecado consciente. Por isto atribuia-lhes a felicidade postuma
correspondente á inocencia de tais criaturas. A existencia do limbo foi sen
do professada de modo ge ral na Igreja; nunca, porém, declarada artigo de
fé.

Em nossos dias, os teólogos propoem outro enfoque da temática.


Ponderam que o Criador, desde o inicio da historia, tratou o ser humano
como filho de Deus, elevado á ordem sobrenatural. O pecado original im-
plicou a perda dos dons sobrenatural; a Redencao efetuada por Cristo foi
a restauracao do homem no plano da filiacao divina perdida pelos prínrcei-
ros pais. Por conseguinte, toda a historia religiosa da humanidade tem co
mo referencial a ordem sobrenatural, nunca a ordem meramente natural.
Daí nao parecer lógico que as criancas mortas sem Batismo passem a gozar
de bem-aventuranca meramente natural.

Ademáis, dizem os teólogos, a solidariedade com Cristo, o segundo


Adío, eixo central da historia, há de ser muito mais forte do que a solida
riedade com o primeiro Adao, imagem ou figura do segundo Adao (cf. Rm
5, 14). Por isto, a Teología contemporánea é propensa a crer que Deus
concede também ás criancinhas mortas sem Batismo a bem-aventuranca
sobrenatural ou o céu; a Providencia Divina age independentemente dos
sacramentos; leva em conta a oracao universal da Igreja pelos agonizantes,
os enfermos, os aflitos, os carentes em geral, e, em vista dessa valiosa inter-
cessao, supre nos pequeninos aquilo que o Batismo nao Ihes confere.

Esta doutrina tranquiliza os cristaos no tocante á sorte postuma das


criancas nao batizadas. Todavía nao isenta os genitores e responsáveis da
obrigacao de prover ao Batismo dos pequeninos com a possível prontidao.
Nao sendo possível ministrar o sacramento segundo o rito da Igreja, nao
há por que conceber outro rito, de inspiracao particular e fantasiosa. A
Igreja, como Mae, tem a necessária solicitude para prover aos meios de
salvacao de todos os seus filhos. Compete ás familias católicas tomar co-
nhecimento da doutrina da Igreja e oferecer a Deus seus filhos postos em
perigo de vida, confiando na sabia Providencia Divina.

1 Sobrenatural, em teología, nao quer dizer "portentoso, maravilhoso",


mas um dom de Deus que ultrapassa as exigencias de qualquer criatura.
Tai é, sem dúvida, a visao de Deus face-a-face.
Natural, para o homem, é aquilo que compete ao ser humano como
tal, considerado em suas notas essenciais.

263
A experiencia ensina:

EUTANASIA VOLUNTARIA . . .
EUTANASIA INVOLUNTARIA

Em símese: A eutanasia voluntaria é objeto de debates, já tendo sido


oficialmente legalizada na Holanda e em outros países. Agora os legislado
res dos Países-Baixos pensam em oficializar também a eutanasia involun
taria ou compulsoria para doentes mentáis e enancas deficientes. Vé-se
assim como o mal se alastra: a principio toma aparéncia de humanitarismo
benéfico para o paciente-vítima; depois perde o pudor e tornase aberta-
mente agressivo ao homem, como no caso de se impor a morte a pessoas
tidas como incómodas ou indesejáveis na sociedade.

. O presente artigo traz consideracoes a propósito emanadas da pena


de Mons. Maree! A.J. Gen/ais, Arcebispo de Ottawa (Canadá) e tiradas da
imprensa periódica.
■k * *

As tentativas de legalizar a eutanasia tomam vulto crescente. A Moral


católica nao vé obrigacSo em manter a vidadealguémsujeitoatratamento
aparatoso e caro (agulhas, relógios, maquinaria sofisticada) sem resultados
proporcionáis ao material e aos esforcos dispendidos. Pode-se admitir a
suspensao da aparelhagem em tal caso, ou seja, desde que os recursos apli
cados nao surtam o efeito almejado ou o efeito correspondente ¿técnica
médica utilizada.

0 que se discute, porém, é a supressao da vida de alguém mediante


recursos suaves, como sao as injecoes, a fim se evitar o sofrímento do pa
ciente. Tal é a eutanasia direta ou positiva; constituí um ato de occisao
planejada, a título de compaixao (ou também a título de economía, alivio
dos acompanhantes...). A Moral católica rejeita tal procedimento, que ge-
ralmente é inspirado por motivos humanitarios (ou pretensamente huma-
' nitários); ninguém tem o direito de dispor sobre a sua própria vida ou so
bre a vida alheia, já que Deus é o Senhor exclusivo da vida. Com outras pa-
lavras: ninguém tem o direito de definir quem pode e quem n3o pode viver.

Baseado em tais premissas, o Arcebispo Mons. Marcel A.J. Gen/ais,


da arquidiocese de Ottawa (Canadá) e Presidente da Conferencia dos Bis-

264
EUTANASIA. .. 25

pos do Canadá, escreveu uma Declaracao significativa e corajosa, que pas-


samos a apresentarem traducao brasileira. Depois do qué, examinaremos o
processo legislativo na Holanda, que, seguindo os prognósticos de Mons.
Gervais, vai passando da legalizarlo da eutanasia voluntaria para o da euta
nasia involuntaria, aplicada a doentes mentáis e enancas deficientes.

I. "COLABORAR COM O SUICIDIO E A EUTANASIA"

1.1. O texto de Mons. Marcel Gervais

"No decorrer dos últimos anos foram tomadas numerosas iniciativas


tanto no Canadá como nos Estados Unidos para tornar aceita a eutanasia1
e a ajuda ao suici'dio dos enfermos em fase terminal, desde que a pecam.
Esta evolucao de mentalidades comporta implicacoes éticas de longo al
cance concernentes á vida, á dignidade e á solidariedade humanas. Nao se
ria uma cruel irania fazer que uma expressao habitualmente utilizada para
designar o respeito á vida, como "morrer com dignidade", seja empregada
para justificar a eliminagao da vida?

Todos nos sentimos grande compaixao para com o sofrimento dos


moribundos e daqueles que estao cientes de estar afetados por doenca in-
curável. A dor de estarem separados dos seus entes queridos, o medo dos
enfermos diante da obstinacao terapéutica, a incerteza do futuro ou do
desconhecido, tudo isto sao fenómenos profundamente humanos. A sitúa-
pao dos doentes em fase terminal ou próximos da morte é extremamente
complexa e sentida no mais profundo do seu ser. Esperam de nos uma res-
posta nao menos intensa. Nos, que somos a Igreja deles, a familia, a comu-
nidade, a sociedade a que pertencem, temos a oferecer-lhes algo de melhor
do que a morte.

Morrer com dignidade, isto quer dizer, antes do mais, morrer cercado
de todo o respeito devido á pessoa, aliviado de dores mediante os melhores
cuidados paliativos que a medicina moderna possa oferecer. Isto implica
também que estejamos atentos ás carencias afetivas, físicas, sociais e espiri-
tuais dos moribundos e reconhecamos que estes, e as pessoas que os acom-
panham, podem experimentar instantes mais intensos de serenidade na paz
a eles proporcionada. Os médicos e especialistas nada omitirao para pdr ao
servico dos doentes e dos moribundos toda a sua competencia, mas nao
de se recordar também de Ihes levar o reconforto, ainda mais necessário,
de uma ¡mensa ternura e de ardente caridade.

1 "Eutanasia" quer dizer aquí "acao ou omissao que tem por finalidade
eliminar todos os sofrimentos, mas que, por si mesma ou na ¡menguo de
quem a suscita, acarreta a morte da pessoa em foco" fGuide d'Ethique des
Soins de Santé, 1991, p. 71).

265
26 "PERPUNTE E RESPONDEREMOS" 373/1993

Nos, cristaos e cristas, povo de fé, temos a conviccao de que a vida é


um dom de Deus, do seu amor e da sua benevolencia. Deus nao nos dá a
soberanía absoluta sobre este dom. Somos os seus administradores, nao os
proprietários. Nao toca a nos escolher o tempo e as circunstancias da
nossa morte.

Mesmo se atribuímos grande valor á vida, nos nao consideramos nos


sa vida na térra como um valor absoluto, que conven ha preservar a todo
preco. A morte nao é nem um mal nem um revés; é um aspecto inelutável
da condicao humana. A Igreja nos ensina que é inelutável e que, sem pro
curar antecipar o momento da nossa morte, temos que saber aceita-1 a com
toda a responsabilidade e dignidade.

Julgamos nao ser necessário recorrer a tratamentos médicos inúteis


ou desproporcionáis, que apenas fazem diferir o inevítável desenlace. Nao
se pode considerar como ajuda ao suicidio ou etapa para a eutanasia a re
cusa ou a cessacao de um tratamento penoso e excessivo. Nao confunda
mos o permitir que alguém morra, com a provocacao da morte desse al-
guém. Sao duas atitudes esencialmente diversas. Mais: os doentes em fase
terminal podem pedir e obter os analgésicos necessários para amenizar
suas dores e seus sofrimentos, mesmo se esses analgésicos podem abreviar
a vida do paciente.

As iniciativas em favor da ajuda ao suicidio ou á eutanasia apoiam-se


sobre o valor que a nossa cultura atribuí á liberdade individual e á autono
mía da pessoa. Este ponto de vista nao justifica, porém, a extincao de urna
vida humana. O respeito á vida é, desde muíto, o fundamento da nossa so-
ciedade. Aceitar que a eliminacao de urna vida seja assunto privado e de
escolha pessoal, é enfraquecer o respeito á vida humana, é transigir com a
consciéncia e desumanizar a nossa sociedade.

Descriminalizar a ajuda ao suicidio e permitir a eutanasia poderiam


levar-nos a conseqüéncias de grande porte. O direito de matar tomar-se-á
um dia o dever de matar? O direito a morrer tornar-se-á o dever de mor-
rer? Será que um dia estimularemos os doentes crónicos, os enfermos, os
andaos e muitos outros que sofrem de serias deficiencias físicas ou men
táis, a por termo aos seus padecimentos? Passaremos da morte voluntaria
á morte involuntaria? Veremos em breve ¡nstalar-se um clima de descon-
fianca em relacao aos doentes e aqueles que deles tratam? Cuidar com spli-
citude e dedicacao será um dia substituido por dar a morte?

Mais: como se configurará o confuto entre o que se percebe ser inte-


resse pessoal de um individuo, e o bem comum da sociedade? Por mais do
loroso que seja o estado no qual alguém se encontra, isto nao pode justifi
car o desprezo dos valores fundamentáis, cujo respeito é indispensável para
que nossa sociedade continué a ser justa e humana. A ajuda ao suicidio e á

266
EUTANASIA. . . 27

eutanasia nao pode ser avaliada apenas no plano da Moral individual. Tal
prática acarretaria serias conseqüéncias para a sociedade, pois nossa atitu
de para com aqueles que vao morrer influi sobre a nossa atitude para com
os outros, que aínda tém alguns anos de vida.

Em resumo, aquilo de que precisamos, é um acréscimo de compaixao


e ternura, e urna verdadeira solicitude para com todos os seres humanos,
em todas as etapas de sua vida. Como sociedade e como comunidade de
Igreja, nos podemos fazer muita coisa para aliviar aqueles e aquelas que ex-
perimentam grandes dores e padecimentos. Convido todos os membros da
comunidade católica a se comportar com amor para com aqueles e aquelas
que sofrem urna doenca terminal, como também para com os seus familia
res e amigos. Entao comportar-nos-emos como verdadeiros discípulos de
Jesús Cristo, que se debrucou sempre com compaixao sobre os doentes
e os moribundos.

Aos 13 de Janeiro de 1993


Marcel A.J. Gervais — Arcebispo de Ottawa
Presidente da Conferencia dos Bispos do Canadá"

1.2. Refletindo...

O texto é significativo especialmente a dois títulos:

1) Nao só alerta para o fato de que a vida humana é um dom de


Deus, do qual nao é lícito ao homem dispor como queira, mesmoque ale
gue compaixao, mas também porque

2) poe em relevo a evolucao de certas concessoes feitas, nao raro, de


boa fé e com ¡ntencao pura: o direito de morrer pode-se tomar o deverde
morrer. A sociedade que atribuí ao paciente o direito de morrer como
queira, poderá um dia, por degenerescencia progressiva, ¡mpor-lhe o dever
de morrer como nao queira. Pois é lícito crer que, no fundo de muitos da-
queles que pleiteiam a eutanasia dos seus semelhantes por compaixao,
existe um qué de egoísmo e comodismo..., egoísmo que, na verdade, dése-
ja ver-se livre dos incómodos encargos que o cuidado de um doente impoe
aos acompanhantes.

A experiencia ensina que as concessoes ao mal tendem a se avolumar


muito além dos limites previstos porquem as pratica. — É o que passamos
a considerar concretamente em fatos da historia contemporánea.

II. NA HOLANDA

Aos 10 de fevereiro de 1993 o Parlamento Holandés aprovou a euta


nasia direta nos termos que o JORNAL DO BRASIL assim transmite:

267
28 "PERPUNTE E RESPONDEREMOS" 373/1993

Lei holandesa admite prática da eutanasia

HA/A — O Par/amento da Holanda aprovou urna leí que, embora nao


descriminalize a eutanasia, torna quase impossfvel processar o médico que
abrevia a vida de um dóente incurável — se efe agir a pedido do paciente e
seguir 28 r'egras preestabelecidas. Oficialmente, a eutanasia continua proi-
bida na Holanda, e o código penal prevé pena de 12 anos para quem a pra-
ticar sem consentimento do paciente, e de tres anos se apenas assistir á
morte.

As precaucoes que o médico deve tomar sao as seguintes: certificarse


de que a doenca é incurável; de que a dor é intolerável; levar em conta a
personalidade e inteligencia do paciente; obterdele "um pedido explícito,
reiterado e formulado com pleno conhecimento de causa"; consultar um
colega; e preparar um relatório para que a decisao possa ser avallada por
um médico-legista ou por um ¡uiz.

Resultado de 20 anos de debates, a nova lei confere base legal a urna


prática amplamente aceita. Jurisprudencia firmada em 1973 estabelece
que, para evitar processos, basta que os médicos holandeses se guiem por
normas informáis semelhantes ás que o Par/amento aprovou. De acordó
com um informe governamental de 1991, um em cada 50 holandeses tem
sua morte abreviada, geralmente por meio de in/'ecao.

Posteriormente, ou seja, em margo do córreme ano, o mesmo Parla


mento dos Países-Baixos comecou a estudar a extensao da api ¡cacao da eu
tanasia a doentes mentáis e enancas disformes, exatamente como previram
Mons. Gervais e os observadores da problemática. Eis o que se lé a respeito
no jornal L'OSSERVATORE ROMANO, edicao portuguesa de 7 de marco
de 1993, p. 6:

A propósito da eutanasia "involuntaria"

A Holanda — outrora forja de missionários e de "humanismo pleno"


— parece que se encaminhou pelas sendas da cu/tura da morte. Há apenas
poucos dias o Parlamento aprovou um projeto de lei, que autoriza a euta
nasia voluntaria a pedido do paciente.

Agora o Governo é chamado a examinar outro projeto de lei que, se


aprovado, legalizará a eutanasia "involuntaria". O termo está a indicar a
eutanasia que a autorídade impoe aos doentes mentáis e aos recém-nasci-
dos disformes.

Ficam assim desmentidos redondamente os sustentadores da eutana


sia "voluntaria", que juravam que jamáis seriam superados os confins da

268
EUTANASIA. . . 29

decisao pessoal para aplicar a praxis da eutanasia a pessoas "incómodas",


consideradas "como peso"para a sociedade.

A experiencia ensina que, quando se está á beira do precipicio, nin-


guém conseguirá retardar a queda nem evitar os seus efeitos moríais.

Para além da metáfora, que exprime, porém, a trágica realidade, fica


urna tremenda constatacao. Principios jurídicos e éticos un¡versáis sao sub
vertidos com apticacoes aberrantes.

Desde que apareceram os problemas, o magisterio da igre/a consióe-


rou no mesmo piano o aborto e a eutanasia. Se nao se respeita a vida nas-
cente, antes ou depois nSo se respeitará nem sequer a vida nascida e desen
volvida, especialmente quando nao é desejada. Talvez sem querer se cami-
nhe para urna selecao rigorosa e drástica da vida, a qual nao vale pelo que
é, mas pela gratificacSo que oferece. Nao se considera digna de ser vivida a
vida marcada por dor insuportável, por doencas chamadas incuráveis, por
deformacdes congénitas que nSo podem ser eliminadas. Com maior exati-
dio, a vida que sobrecarrega a familia e a sociedade.

Esta concepcao degradante da vida é urna heranca do iluminismo e


do racionalismo, encarnada na cultura neocapita/ista, que va/oriza a quali-
dade da vida pela eficiencia. E o substrato ideológico é o secularismo: um
substrato essencialmente ateu. Desaparece, perdese o sentido verdadeiro e
auténtico da vida, quando Deus é negado e eliminado da própria conscién-
cia. Nao sem fundamento o Concilio Vaticano II, num dos seus documen
tos mais significativos, e Joao Paulo II, na sua primeira Encíclica, afirmam
que só Cristo revela plenamente o homem ao homem.

Se desaparece Deus, também desaparece o sentido do homem, da sua


dignidade, dos seus direitos; o homem relativiza-se e fica subordinado aos
interesses hedonistas e utilitaristas. Aceitase deste modo a cultura da mor-
te, preferíndo-a á cultura da vida. A eutanasia, como o aborto, tanto
voluntaría como imposta, é um efeito bárbaro, mas horrendamente lógi
co, dessa premissa.

Se nao se reage ¡mediata e unánimemente, a humanidade corre o ris


co de percorrer o mesmo caminho seguido pelo aborto; em prímeiro lugar
invocam-se algumas motivacoes pseudo-humanitárias (para nao fazer sofrer
os pacientes); em seguida, a casuística alargase até se tornar um meio
cruel, nao só para conter o desenvolvimento demográfico e para selecionar
a raga (nos casos de eutanasia pré-natal e neonatal), mas também para pri
vilegiar apenas homens e mulheres eficientes e produtivos.

Sem comentarios...

269
Livro antididático:

'HISTORIA'

porjoel Rufino dos Santos

Em síntese: 0 manual escolar de historia da autoría de Joel Rufino


dos Santos é obra superficial e errónea sob certos aspectos, dada a levian-
dade com que o autor aborda temas importantes; procura ser "simpático",
talando a linguagem de meia-gi'ria dos adolescentes, caricaturando e defor
mando episodios do passado. 0 manual é espécimen do baixo nivel de nos-
so 19 grau escolar, como também é comprovante de quanto a historia tem
sido "manipulada" para apoiar ideologías estranhas.

* # *

0 Prof. Joel Rufino dos Santos publicou um Manual de Historia Ge-


ral e Historia do Brasil para as series 5a, 6a, 7a e 8a do 19 grau, pela
Editora F.T.D. Pretende ser um livro didático. Na verdade, porém, é urna
obra que, em vez de formar o aluno, contribuí para prejudicá-lo tanto por
seu estilo (que chega ao sarcasmo e ao "engracado-gaiato") como por seu
conteúdo, que é superficial e tendencioso, especialmente quando trata do
Cristianismo. 0 autor se coloca em posicao francamente anticristá* e faz da
historiografía o ve ículo para caricaturar a mensagem do Catolicismo.

Detenhamo-nos sobre alguns dos varios pontos vulneráveis dessa obra.

1. EQUÍVOCOS E IRONÍA

0 autor, de ponta-a-ponta, é impreciso e superficial ñas suas explana-


coes. Isto tem importancia especial quando encara o Cristianismo. Pouco
conhecedor do assunto, baseando-se em informacoes vagas, o Sr. Joel R.
dos Santos desfigura a historia:

1) No volume (destinado ao professor) para a 7a serie, p. 89, Jesús é


chamado "o sujeito". 0 autor nao conhece devidamente o Evangelho, de
modo que inverte a ordem dos acontecimentos concernentes a Jesús: Pila-
tos teria interrogado Jesús a respe ito do título "Reí dos Judeus"; vendo
que Jesús era ¡nocente, deixou-o partir e Jesús continuou a pregar... — Ora

270
"HISTORIA" 31

isto nao corresponde á historia: Jesús foi questionado por Pilatos horas an
tes de morrer; depois disso nao mais pregou a Boa-Nova; cf. Jo 19,28-40.

2) No mesmo volume, á p. 91, o autor escreve:

"A pritneira exp/icacao para a vitória do Cristianismo é essa: parasi-


tou as religioes mais fortes de Roma. Uma colcha de retalhos. Ganhando
Roma, ele se irradiou pelas térras do Imperio".

Só pode escrever tais linhas quem nao estudou a materia. O Cristia


nismo se propagou precisamente porque apregoava uma grande novidade
aos povos mediterráneos, vítimas do ceticismo e desesperanzados das suas
religioes politeístas e mitológicas. Com efeito; o Cristianismo proclamou
algo de inédito: Deus é o primeiro a amar o homem; nao é este quem atrai
os favores da Divindade por ser justo e reto, mas, antes que o homem pro
cure a Deus, Este já Ihe disse Sim, criando-o para ser consorte da bem-
aventuranca do próprio Deus; cf. Uo 4,9s; Rm 5,8. O Cristianismo, sem
dinheiro, sem protecao dos maiorais, sem armas, antes perseguido, se ¡m-
plantou no Imperio Romano precisamente por causa do valor intrínseco
da sua mensagem, que correspondía aos mais profundos anseios dos ho-
mens. As religioes do Imperio, com as suas concepcoes mitológicas e infan-
tis, como também a filosofía dos gregos e romanos, haviam fracassado, deí-
xando céticos os pensadores da época; basta lembrar os discursos de Cice
ro, as escolas do pirronismo (descreme), do cinismo (zombeteiro), dos pre
gad o res ambulantes dos sáculos ¡mediatos antes e depois de Cristo. 0 pró
prio Apostólo Sao Paulo faz questao de dizer que o Evangelho destoa de
sabedoria e da arte retórica dos grandes de sua época; a fé crista parecía
loucura e escándalo, pois se centrava na mensagem de um Deus crucificado
(cf. 1Cor 1,17.23). Donde se vé quao fainas sao as afirmacoesdo Manual
em foco.

Se há aparentes pontos de contato entre o Cristianismo e as religioes


nao cristas, isto nao se deve a dependencia daquele em relapao a estas, mas
ao fato de que existe em todo ser humano uma religiosidade natural, pré-
crista e pré-paga, que tem suas manifestacoes espontáneas, manifestacoes
que sao assumidas pelos diversos Credos: assim o rezar de joelhos, de bra
pos estendidos, em prostracao no chao, o peregrinar a lugares tidos como
sagrados, as procissoes, as orapoes I ¡tan ¡cas, as ablupoes rituais, as peías sa
gradas... Nenhum desses ritos é privilegio de alguma corrente religiosa,
porque cada qual tem sua base na própria natureza humana psicossomáti-
ca, espontáneamente necessitada de símbolos. É claro, porém, que cada
corrente religiosa coloca dentro dessas expressoes naturais os artigos de
sua fé. Conseqüentemente o Cristianismo, ao celebrar seu Batismo, sua
Ceia Eucarística, parte de premissas monoteístas (e nao politeístas nem

271
32 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 373/1993

mitológicas) e exprime as grandes verdades reveladas através desses ritos


espontáneos: a agua é símbolo de purif¡cacao, a ce ¡a é sinal de partilha e
común hao...

3) A p. 90 do mesmo volume, J.R. dos Santos cita a máxima: "Nao


facaís aos.outros o que nao queréis que vos facam"; teria sido inspirada a
Jesús por Confúcio. - A propósito devemos dizer que o próprio bom sen-
so humano anterior a Confúcio e Jesús é suficiente para explicar tal norma.
Todavía o que R. dos Santos nao observa, é que no Evangelho é positiva
(muito mais exigente) e nao negativa: "Tudo aquilo que queréis que os ho-
mens vos facam, fazei-o vos a eles" (Mt 7,12).

4) No volume do professor para a 7a serie, á p. 91, lé-se que "no cul


to egipcio de Isis o Cristianismo foi buscar a Sagrada Familia: José, María
e Jesús sao copia de Osires, Isis e Horus". — Ora

- a Sagrada Familia, no Cristianismo, nao é produto de fícelo, mas


redunda de fatos históricos; em Nazaré (Israel) a arqueología aponta os lu
gares sagrados em que Jesús, María e José viveram; a Tradicao guardou a
lembranca desses vestigios do passado, de modo que nao era preciso aos
cristaos recorrer ao Egito para reconhecer a S. Familia.

— Mais sagaz do que J.R. dos Santos, a Escola das ReligiSes Compara
das (com seus corifeus Frazer, Jansen, Max Müller, Bousset, Eichhorn,
Gunkel...), no fim do século passado e no inicio do presente, quis derivara
SS. Trindade (Pai, Filho e Espirito Santo) das trindades do Egito ou da
Mesopotámia. — Tal Escola, porém, perdeu sua voga; as aparentes seme-
Ihancas encobriam fundamentáis diferencas; a mentalidade crista era (e é)
algo que nao se confunde com a mitologia, a tal ponto que até 313 o Cris
tianismo foi perseguido no Imperio Romano por nao se compatibilizar
com as proposicoes do paganismo. Os cristaos eram (e sao) ciosos da sua
identidade; preferiam morrer mártires a pactuar com alguma crenca ou
prática mitológica. Varios estudos publicados no decorrer do século XX
demonstraram a inequívoca singularidade do Cristianismo, de modo que já
a Escola das Religioes Comparadas hoje em dia perdeu autoridade. Ver a
propósito P. Cermtti, O Cristianismo em sua Origem Histórica e Divina.
Pontificia Universidade Católica, Rio de Janeiro.

5) A p. 90 do mesmo volume encontra-se ainda: "A partir do impera


dor Constantino, ai pelo ano 300... quem nao era cristao foi perseguido".
- O autor, sendo historiador, podía e devia ser mais preciso: em 313
Constantino, pelo Edito de Mí lio, concedeu a paz e a liberdade aos cris
taos; nao oficializou o Cristianismo como religiao do Estado, coisa que
Teodósio I fez em 380. Precisamente sob DiQdeciano (284-305) foi desen-
cadeada a mais grave e a mais longa perseguica*o aos cristaos.

272
"HISTORIA" 33

6) A p. 104 do mesmo volume, o autor mostra mais urna vez a sua


impericia. Desfigura o pensamento de S. Agostinho, interpretando mal a
sua obra De Civitate Dei (sobre a Cidade de Deus): o santo mestre refere-se
ai a dois amores que constituiram para si cada qual urna cidade: o amor a
Deus até o desprezo de si, e o amor a si até o desprezo de Deus. Sao duas
cidades existentes neste mundo, e nao cidades do além, como julga J.R.
dos Santos. De resto, S. Agostinho, que é, recon heridamente, um dos
maiores genios da humanidade, nao era o pal hago que o historiador apre-
senta logo a seguir. — É melhor nao entrar em certos assuntos para nao
trair a própría incompetencia do que se intrometer sem ter o adequado
conhecimento de causa, como faz J.R. dos Santos.

7)' Á p. 102 do referido volume, o autor se refere ao Cristianismo dos


prime ¡ros séculos como algo de masoquista: "Os cristaos faziam do mundo
urna idéia triste. Um vale de lágrimas entre o nascimento e a morte. O me
lhor era se conformar com a travessia, cheia de dores, na certeza de ser re
compensado do outro lado com urna vida sem fim no regaco de Cristo".

O autor nao leu os documentos emanados do próprio Cristianismo,


pois, se os conhecesse, nunca diría isso. Basta lembrar as passagensem que
Sao Paulo exorta os fiéis á alegría:

"Alegrai-vos sempre no Senhofl Repito: alegrai-vos'." (Fl 4,4). Cf.


FI1,4; 3,1; 4,10.

"De resto, irmaos, alegrai-vos, procura! a perfeicao, encorajai-vos"


(2Cor13, 11).

Urna corrente melancólica ou pessimista nao atrai adeptos, como os


atraiu a pregacao crista, de maneira que nao teve similar até hoje na histo
ria. O masoquismo é o contrario do entusiasmo com que os cristaos pro-
fessavam a sua fé perante os jui'zes e carrascos. A galhardia e a fortaleza de
ánimo dos cristaos sao belamente descritas por um autor anónimo na sua
Carta a Diogneto {sáculo III):

"Os cristaos obedecem ás feis, mas as ultrapassam em sua vida. A mam


a todos, sendo por todos perseguidos. Desconhecidos, sao assim mesmo
condenados. Mas, quando entregues á morte, sao vivificados. Na pobreza
enriquecerá a muitos; desprovidos de tudo, sobram-lhes os bens. Sao des-
prezados, mas no meio das desonras sentem-se glorificados. Difamados,
mas Justos; ultrajados, mas benditos. Injuriados, prestan) honra. Fazendo
o bem, sao punidos como malfeitores; castigados, rejubilam-se como re
vivificados".

273
34 "PEHGUNTE E RESPONDEREMOS" 373/1993

8) Ao referír-se á origem da vida, diz o autor á p. 8 do livro em foco:


"Um día por acaso, dentro da sopa, um molécula daquelas fez copia de si
mesma". — Sabe-se que o recurso ao acaso para explicar a vida e o univer
so é subterfugio da ignorancia. A Filosofía ensina que o acaso nao é um
senhor sujeito de atividades; o acaso é o nome que se dá a um fenómeno
cujas causas ignoramos. Se saio á procura de urna livraria e encontró na rúa
um amigo, há muito desaparecido, digo que o encontrei por acaso. Isto,
porém, nao quer dizer que o evento nao foi causado por causas conscien
tes: eu sai com propósito bem definido e meu amigo também saiu de casa,
porque tinha urna finalidade concebida por sua razao. Todavía, já que
ignoro por que meu amigo se encontrava a caminho, digo que o encontró
se deu "por acaso". Acaso, pois, significa um evento bem determinado por
suas causas, mas nao previsto por quem o observa; acaso nao designa o su
jeito de alguma apao.

A alusao ao acaso por parte de J.R. dos Santos mostra que o autor
nao tem conceitos filosóficos claros e confirma a impressáo geral de que é
um escritor superficial, mais gozador e sensacionalista do que profundo e
coerente.

2. REFLETINDO...

O manual de Historia em foco é nítido síntoma do baixo nivel de


nossos estudos de 1? grau. Temos em maos os livros do professor; se estes
sao tío falhos e vagos, quanto mais nao o serao os livros do aluno?

Dir-se-ia que o autor escreve na base de preconceitos, entre osqüais


predomina o de satisfazer ao desejo de ser "simpático" por um linguajar
de quase gi'ria ou "gaiatice". Passa por cima de grandes temas sernos apro-
fundar, em perspectivas unilateraise deformantes. Alias, nao é este um ca
so singular na historiografía; esta tem sido um campo predileto das ideolo
gías; muitos pensadores preconcebidos servem-se da historia, vista de relan
ce, para tentar incutir suas concepcoes unilaterais ou tendenciosas. 0 amor
á verdade objetiva falta em muitos mestres... É doloroso que tal deforma-
cao se transmita a adolescentes, que nao tém parámetros para avaliar o que
Ihes é apresentado; sao vítimas dos preconceitos e das caricaturas que os
mais velhos Ihes passam irresponsavelmente, e possivelmente nao de se rés-
sentir dessa falha escolar por todo o resto de sua vida.

Possam os educadores tomar consciéncia da problemática de ordem


ética (e nao apenas de índole historiográfica) que a obra de J.R. dos San
tos langa sobre o mundo escolar!

274
Mais urna proposta:

QUE É A ORDEM DeMOLAY?

Em sintese: A Ordem DeMolay deriva seu nome do Grao-Mestre Jac-


ques de Mofai, da Ordem dos Templarios, vi tima de difamacao e mono em
1314. Tal Ordem reunía Cavaleiros destinados a proteger os peregrinos que
visitavam a Térra Santa; o nome efe Templarios Ihes foi dado pelo fato de
terem sua sede principal junto a Esplanada do antigo Templo de Sa/omao
em Jerusalém.

0 mestre macom Frank Shermann Land resolveu fundar em 1919


urna sociedade, dita "Ordem DeMolay", destinada a formar ¡ovens de 13 a
21 anos no exercício de sete virtudes principáis aptas a torná-los cidadaos
úteis á sociedade. Nao é dito ao público como ou segundo que estilo é mi
nistrada a formacao aos membrosda Ordem.

Tal iniciativa, patrocinada e orientada pela Maconaria, é incompatfvel


com os principios do Catolicismo ou mesmo do Cristianismo (varías con-
fissoes cristas nao católicas condenaram a Maconaria). Urna das razoes des-
ta incompatibilidade é o caráter relativista que a Maconaria assume frente
a Deus e é própria verdade; ademáis a Maconaria nos países latinos da
Europa e da América se tornou explícitamente avessa ao Catolicismo;
parece que até hoje é sociedade em que tendencias anti-religiosas penis-
tem. — Ora tal oríentacao fundamental das Lo/as nao pode deixar de in
fluir nos quadros e ñas atividades da Ordem DeMolay. Mais: para formar
bons cidadaos, já existem varias escolas confessionais, inclusive católicas; a
Ordem, porém, parece nao reconhecer o valor destas, já que en fatiza unila-
feralmente o apoio ás escolas públicas.

* * *

A chamada "Ordem DeMolay" vem exercendo suas atividades entre


colegiáis, incitando-os a urna vida ética e procurando inscrevé-los em suas
fileiras. 0 nome DeMolay é desconhecido á maioria, de modo que muitos
perguntam qual a filosofía específica que possa estar implicada em tal títu
lo e na agremiacao que o professa. É o que procuraremos explanar, valen-

275
36 "PSRGUNTE E RESPONDEREMOS" 373/1993

do-nos da obra de Wilton Cunha: "Ordem DeMolay. Introdujo á sua Fi


losofía" (Colecao Maconaría Universal. Ed. Mandarino, Rio de Janeiro).

1. QUEM FOI JACQUES DE MOLAI?1

Jacques de Molai (1245-1314) foi Grao-Mestre da Ordem dos Cavalei-


rosdo Templo. Esta foi fundada por Hligues de Payns em 1119 para man-
ter a boa ordem na Térra Santa e proteger os peregrinos que desejassem
visitar os lugares sagrados. Tiveram sua sede principal perto da Esplanada
do antigo Templo de Salomao em Jerusalém; daí o nome de "Cavaleiros
do Templo" ou "Templarios". Desenvolveram atividades benéficas em fa
vor dos cristaos que corriam o risco de peregrinar ao Oriente. Todavía,
urna vez tendo caído o Reino Latino na Térra Santa, os Cavaleiros Tem
plarios perderam, de certo modo, a sua razao de ser; além do qué, eram
proprietários de mu i tos bens, que Ihes haviam sido doados pelos nobres e
fiéis, em sinal de estima. 0 rei da Franca Filipe IV o Belo, cobicoso de tais
bens, moveu, a partir de 1307, candente campanha contra os Templarios,
difamando-os e mandando prender muitos que viviam em territorio fran
cés. O Grao-Mestre Jacques de Molai foi especialmente visado: é de crer
que ten ha sido vítima de pressoes violentas da parte dos agentes do rei:
em 24/25-10-1307, na presenca de um tribunal regio, confessou oscrimes
de que a Ordem dos Templarios era acusada; mas em 1308 perante delega
dos do Papa Clemente V (que nao I he inspiravam o medo que os repre
sentantes do rei suscitavam), negou tais crimes. Em 1308, diante de dele
gados do rei, reconheceu graves faltas dos Templarios; em 1309 tomou atí-
tude contraria; e aos 18 de marco de 1313 morreu protestando sua ino
cencia.

Esta figura de Grao-Mestre, que, como se eré, foi vítima de calúnias e


morreu após muito sofrer, tornou-se, de certo modo, símbolo de heroísmo
e magnanimidade. Eis por que no secuto XX um macom, de origem protes
tante, como Frank Shermann Land, houve por bem fundar urna Sociedade
ou Ordem destinada a fomentar honestidade, fidelidade, cortesía... entre
adolescentes e jovens sob o patrocinio de Jacques de Molai.

De resto, entre Macons e Templarios há quem queira estabelecer um


relacionamento. Os macons sao antigos pedreíros2; dizem ter origem re
mota nos pedreiros que construiram o Templo de Salomao no sáculo X a.

1 Encontram-se as duas grafías: Molai e Molay. Adotaremos a prímeira ao


falarmos do Grao-Mestre condenado em 1314.

' Em francés, macón = pedreiro.

276
AORDEM OeMOLAY 37

C; a sua linhagem terá passado por todos os grandes construtores de tem


plos e cátedra i s da Idade Media e também ... pelos Cavaleiros Templarios
dos sáculos XII/XIV. - Nao há dúvida, porém, de que esta filiado da Ma
conaria Moderna as sociedades pré-cristas e aos Templarios medievais é
ficticia. A Maconaria dos séculos XVIII eseguintesé a sucedánea das cor-
poracoes de pedreiros medievais, com a diferenca, porém, de que os me
dievais eram profissionais cristaos da construcao civil, ao passo que os ma-
cons modernos já nao praticam a construcao civil, mas sao filósofos movi
dos por ¡ntencSes sócio-poh'ticas e atuantes no campo da organizacao da
sociedade.

Vejamos agora os trapos do fundador da Ordem DeMolay.

2. O FUNDADOR: "TÍO LAND"

O fundador da Ordem foi Frank Shermann Land, nascido no ano de


1890 em Kansas City (U.S.A.). Foi educado no protestantismo, freqüen-
tando a Escola Dominical congregacional de Saint-Louis. Adolescente,
Frank S. Land resolveu criar sua própria escola de formacao bíblica no po-
rao de sua casa, funcionando domingo á tarde; um pequeño órgao doado
por amigos acompanhava suas prelecoes, de modo que ia aumentando o
número de discípulos; Frank pregava enfáticamente a prática das virtudes
essenciais a qualquer bom cidadao:*honestidade, lealdade, fidelidade ao
dever...

Tendo completado seus estudos escolares, Frank tomou parte ativa


em projetos da ¡greja e da sua cidade. Com dezenove anos de idade, era di
rigente de restaurante de sucesso; como artista amador, trabalhava para
embelezar a cidade. Entrou na Maconaria, onde foi tao bem aceito que,
aos 25 anos de idade, era Diretor do Escritorio de Servicos Sociais do
Rito Escocés.

As atividades de Frank junto aos jovens levaram-no finalmente a fun


dar a Ordem DeMolay aos 18/03/1919 em Kansas City (U.S.A.), tendo em
vista formar jovens de 13 a 21 anos de idade comofcons cidadaos e líderes
de personalidade desenvolvida. Tal Ordem nao é urna instituicao mace-ni
ca, mas é orientada e dirigida por macóns.

A imagem de Frank Shermann Land foi-se projetando sempre mais, a


tal ponto que em 1958 o Presidente Eisenhower, dos Estados Unidos, o
declarou "cidadao extraordinario".

Com 35 anos foi condecorado com o Grau 339 da Maconaria, distin-


cao esta que nao é concedida a pessoas de tao pouca idade.

277
38 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 373/1993

Após urna vida de estorbos e luta em prol dos seus ideáis, Frank
Shermann Land, o "tío Land" (como era chamado), expirou aos8 de no-
vembro de 1959; foi entao reconhecido como "um amigo do mundo" e
"urna personalidade que tinha o poder de conseguir o melhor em todas as
vidas onde sua vida tocava".

Importa-nos agora examinar com mais atencao o que seja

3. A ORDEM DeMOLAY

Á p. 21 do livro citado lé-se:

"A Ordem DeMolay é urna organizacao de formacao do caráter dos


jovens de treze a vinte e um anos de idade, que estao procurando se prepa
rar para serem me/hores cidadaos e líderes para o futuro, desenvolvendo o
conjunto de fatores que formam a personalidade de todos os homens de
bem que lutam peta emancipacao pacifica e progressista da humanidade.

Frank Shermann Land melhor defíniu a Ordem DeMolay como


'DeMolay é conforme urna re/igiao que é difícil definir. Traba/ha de tantas
maneiras e pratica tantas boas acoes para e em beneficio de um jovem que
realmente tem que ser experimentada para ser totalmente compreendida,
avadada e apreciada... Falando literalmente, DeMolay é urna organizacao
de jovens cuja finalidade é formar melhores cidadaos'".

0 Ordem DeMolay é constituida de núcleos ou Capítulos, que devem


obediencia ao Supremo Conselho Internacional da Ordem DeMolay. Cada
Capítulo é patrocinado e dirigido por um Grupo Macónico regularmente
reconhecido.

0 número de associados de um Capítulo é limitado a rapazes

1 — que nao tenham ainda 21 anos de idade,


2 — que professem urna crenca em Deus e reverencia a seu Santo
Nome,
3 — que afirmem lealdade a seu país e respeito á Bandeira Nacional,
4 — que aderem á prática de moral pessoal,
5 — que fazem votos de seguir os elevados ideáis típicos das sete vir
tudes cardeais da Coroa da Juventude,
6 - que aprovem a filosofía da Irmandade Universal do Homem e a
nobreza de caráter exemplificada pela vida e morte de Jacques DeMolay,
7 — que estejam cientes de que o ingresso na Ordem DeMolay, que
nao é urna organizacao mapónica juvenil, nao Ihes garantirá no futuro a
iniciacao em um corpo Macónico.

278
AORDEM DeMOLAY 39

As sete virtudes cardeais atrás mencionadas sao: Amor Filial, Reve


rencia pelas Coisas Sagradas, Cortesía, Amizade, Fidelidade, Pureza e Pa
triotismo.

O objetivo do cultivo destas virtudes é "a compreensao mutua dos


valores culturáis e sociais de cada nacao, independentemente de origem,
rapa, cor, nacional idade, religiao e língua".

A ética de um DeMolay se exprime nos seguintes itens:

"Um DeMolay serve a Deus.


Um DeMolay honra todas as mulheres.
Um DeMolay ama e honra seus país.
Um DeMolay é honesto.
Um DeMolay é leal a ideáis e amigos.
Um DeMolay executa traba/hos honestos.
Um DeMolay é sempre um cavalheiro.
Um DeMolay é um patriota tanto em tempo de paz quanto em
tempo de guerra.
Um DeMolay sempre permanece inabalável a favor das Escolas
Públicas.
Um DeMolay sempre possui a fama de um bom cidadao, cumprí-
dor das leis.
A palavra de um DeMolay é tao-válida quanto sua confianca.
Um DeMolay é o orgulho de sua Patria, seus Pais, sua Familia e seus
Amigos.
Um DeMolay, por preceito e exemplo, deve manter os elevados ni-
veis aos quais ele se comprometeu" (p. 24 da obra citada).

Como se vé, o texto nao toca em religiao; a Ordem exige, sim, que ca
da um de seus membros creía em Deus e Lhe sirva... Pouca coisa mais se
encontra no livro de Wilton Cunha sobre as exigencias e as atividades da
Ordem DeMolay. Pode-sedizer, em símese, que ela pretende contribuir pa
ra a formacao do caráter dos jovens de 13 a 21 anos, incutindo-lhes a prá-
tica das virtudes humanas na base do respeito a Deus, respeito que nao é
explicitado num Credo religioso. Nada mais se pode apurar da leitura da
obra de Wilton Cunha; o leitor ignora quais os métodos aplicados para
obter os objetivos colimados ou qual o estilo de vida dos membros da Or
dem DeMolay.

Wilton Cunha aínda pode acrescentar:

"Mais de tres milhoes de jovens já se ajoelharam perante os Altares


da Ordem DeMolay em todo o mundo; atualmente existem mais de

279
40 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 373/1993

111.000 jovens DeMolay em doze países espalhados pela superficie da


Térra, com mais de 5.000 Capítulos sob o patrocinio de Grandes Lo/as,
Grandes Orientes, Supremos Conselhos, Lo/as Simbólicas, Corpos Filosó
ficos, agrupamentos de macons..." (p. 16).

Resta a pergunta:

4. QUEDIZER?

Tres observa?oes parecem impor-se:

4.1. Maconaria e Cristianismo

A Ordem DeMolay é de inspiracao e orientacao macónicas, como


dizem claramente os seus mentores. Notemos que existem dois ramos na
Maconaria: a) o Regular, que conserva a crenca no "Grande Arquiteto do
Universo", o respeito a Deus e á Biblia, como o tinham os fundadores da
primeira Loja Macónica Moderna em 1717. Tal é a Maconaria dos países
nórdicos da Europa e da América; b) o Ramo Irregular da Maconaria é o
que renega a Oeus e tem militado contra a Religiao nos países latinos da
Europa e da América.

Ora a Ordem DeMolay parece orientada pela Maconaria Regular. To


davía em nossos dias a Maconaria em geral segué urna linha de pensamen-
to preponderantemente relativista nao só em relacao a Deus, mas também
em relacao á própria verdade. Esta é urna das razoes pelas quais a Igreja
Católica nao aceita a Maconaria.1

A Ordem DeMolay, inspirada pelos líderes macónicos, adota conse-


qüentemente tal modo de pensar relativista. Mais: nao pode deixar de estar
impregnada de outras concepcoes magónicas, as quais de modo geral nao
se coadunam com os principios do Catolicismo. Alias, é de notar que a re-
jeicao da M apon aria nao é atitude exclusiva da Igreja Católica; é a posicio
também de outras confissoes cristas na própria Inglaterra, onde a Macona
ria Moderna teve origem. A propósito já escrevia o Pe. Jesús Hortal S.J. em
PR 369/1993, p. 77:

1 Eis a última Declaracao da Igreja Católica a respeito, datada de 26/11/83


e emanada da Congregacao para a Doutrina da Fé:
"Permanece imutável o parecer negativo da Igreja a respeito das asso-
ciacoes macónicas, pois os seus principios foram sempre considerados in-
conciliáveis com a doutrina da Igreja e, por isso, permanece proibida a ins-
crícao nelas. Os fiéis que pertencem as associacoes macónicas, estao em es
tado de pecado grave e nao podem aproximarse da Sagrada Comunhao".

280
AORDEMDeMOLAY 41

"A Igreja da Inglaterra (Anglicanos) é conhecida pelas suas estreitas


relacoes com a Maconaria. O antigo arcebispo de Cantilena, Fisher, era sa
bidamente macom. Mesmo entre nos, no Brasil, varios dos ministros da
Igrefa Episcopal, ¡ncluindo bispos, sao ou foram macons. Apesar desses la
gos históricos, em 1986, urna comissao especial anglicana de sete mem-
bros, ¡ncluindo dois macons, publicou um documento com o título Franco-
Maconaria e Cristianismo sao ¡ncompatíveis? A conclusao era claramente
afirmativa e baseava-se no caráter pelagiano da concepcao macbnica de
aperfeicoamento e salvacao do homem. O Sínodo Geral da Igreja da Ingla
terra, realizado em York, em 1987, aprovou, por 394 votos contra 52 e 5
abstencoes, a dec/aracao de incompatibilidade entre Maconaria e fé
anglicana.

Em 1985, a Igreja metodista (da Inglaterra) condenou o sincretismo


anticristao da Maconaria. As Igrejas evangélicas americanas do Missouri e
do Wisconsin já haviam-se pronunciado na mesma linha em 1967. A Igreja
Ortodoxa nunca retificou a declaracao contra a Maconaria, publicada em
1933. Também a Igreja Católica Apostólica Ortodoxa Antioquena man-
tém, no Brasil, essa atitude.

Conforme um jornal católico da Holanda (23/05/89), em 20 de maio


de 1989, o Sínodo Geral da Igreja Presbiteriana da Escocia aprovou, por
grande raaioria, o texto duma circular dirigida aos membros macons da
Igreja, convidando-os a abandonar a Maconaria, por ser ela inconciliável
com a fé crista.

As tres principáis Igrejas luteranas dos Estados Unidos (American


Lutheran Church, Lutheran Church Missouri Synod, Lutheran Church in
América^ proibem que seus pastores pertencam a Maconaria; no que res-
peita aos membros leigos, nao há atitude unánime: a LCMS o proibe, a
ALC o desaconselha, a LCIA o permite".

AJZ. Escola Pública e Escola Particular

A Ordem DeMolay enfatiza grandemente "inabalável apoio as


Escolas Públicas". Esta é, entre outras, urna tese macónica. A Igreja Ca
tólica propugna, ao lado da Escola Pública, a existencia da Escola Particu
lar. Esta pertence ao regime democrático. Com efeito; compete aos geni
tores o direito de educar seus filhos segundo a filosofía que mais oportuna
Ihes pareca; para que isto possa acontecer, é necessário que, além da escola
pública (devedora da filosofía do Estado), naja a escola particular, orienta
da por outras cosmovisóes, inclusive por concepcoes religiosas. 0 exercício
deste direito nao pode ser sufocado pelo Estado mediante o monopolio do
ensino. Donde se concluí que o apoio á escola pública, com detrimento da

281
42 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 373/1993

escola particular, é antidemocrático. Infelizmente, porém, é um trago da


atuapao da Ordem DeMolay.

4.3. Formacao da Juventude

É louvável o interesse da Maponaria pela juventude, visando a formar


cidadaos úteis á sociedade. Este programa é certamente um foco de atra-
cao para a Ordem DeMolay. É preciso, porém, registrar que a formacao da
juventude pode e deve ser obtida fora de ambientes macón icos. Precisa
mente os educandários confessionais tém oferecido notável contingente de
homens beneméritos á sociedade do Brasil e do estrangeiro; de modo espe
cial a escola católica incluí sempre um programa de cultivo dos valores éti
cos e religiosos; além do qué, em muitas instituicoes católicas há agremia-
coes que reúnem alunos interessados em adquirir formacao aínda mais es
merada ou aprofundada.

Talvez a penetracao da Ordem DeMolay dentro de educandários cató


licos se torne um estímulo a que estes aprimorem o seu servico educacio
nal, mantendo vivo o ¡nteresse dos alunos pelos valores oferecidos na pró-
pria instituicao confessional.
• * *

"LEMBRA-TE. SENHOR..."
(Paulo VI)
"LEMBRA-TE, SENHOR, DE QUE SOU TUA CRIATURA.
LEMBRA-TE DE QUE ME FIZESTE NASCER PARA A VIDA.
EU NAO EXISTÍA E TU ME CONCEBESTE EM TUA MENTE.
TU ME TIRASTE DO NADA, E ME DESTE A GRACA DE RESPONDERTE: EU
EXISTO.
PELA TUA SECRETA PROVIDENCIA, TU ME GUIASTE, PELA ESTRADA DA
MINHA EXISTENCIA.
DISPUSESTE AS ETAPAS DA MINHA CAMINHADA.
DE LONGE ME CHAMASTE A FIM DE QUE DE PERTO EU TE RESPONDA.
FOI ASSIM QUE COMECEI A EXISTIR, CRIATURA DE TU AS MÁOS. ARGILA
DISFORME E IMAGEM DO TEU SEMBLANTE.
RESTAÚRAME Á TUA SEMELHANCA. Ó SENHOR, SEM ME JULGAR SE EU
A ESQUECI.
SOU FRÁGIL EM TUAS MÁOS PODEROSAS, MINHA FRAQUEZA É O SINAL
DA TUA SOBERANÍA.
MAS AS TUAS MÁOS SAO SUAVES, SUAVES MESMO QUANTO ME PÓEM Á
PROVA.
TUAS MÁOS ALIVIAM E SUSTENTAM. TUAS MÁOS CASTIGAM E VIVIFICAM.
EU LHES ENTREGAREI A MINHA VIDA. O DOM QUE TU ME DESTE, EU O
CONFIAREI A TI.
LÁ ONDE NADA SE PERDE. EU PERDEREI O MEU SER,
EM TI, Ó SENHOR, O MEU PRINCIPIO E O MEU FIM".

282
Quem é?

SANTO ANTONIO DE CATEGERÓ

Em síntese: Santo Antonio de Categeró nao consta do catálogo dos


Santos da tgreja Católica; terá sido um franciscano africano do século
XVI. Parece nao ter existido. - É estranho que urna denominacao crista
oriental (siriana), separada da Igreja Católica, e a Igreja Brasileira facam a
propaganda da devocao a esse Santo (que nao era orientalnem brasi/eiro/,
atraindo fiéis católicos com promessa de milagres, com oracoes e novenas.
Que interesses estao sub/acentes a este tipo de propaganda piedosa?

* * *

Tém-se espalhado folhetos que divulgam a devocao a "Santo Antonio


de Categeró", cujo santuario seria a igreja pa raquial de Nossa Sen hora da
Anunciacao, da Igreja Católica Ortodoxa Siriana, no Rio de Janeiro. A po-
pulacao católica se vé perplexa dianfe desses panfletos, pois tal Santo é ti-
do como grande taumaturgo, mas é desconhecido na Tradicao da Igreja.
Vejamos o que a respeito dizem os ¡mpressos de propaganda e o que se
pode pensar a respeito.

1. O QUE SE DIZ...

Lé-se o esboco biográfico do Santo num dos folhetos em pauta:

"Nasceu o nosso Santo de país infléis, maometanos, perto da cidade


de Barca na África. Deportado para a cidade de Noto, na Sicilia, como
prisioneiro, foi vendido a Joao Landuvula, que fez de Antonio pastor de
seus grandes rebanhos. Convivendo com os cristaos, compreendeu o erro
em que vivía na religiao de Maomé e pediu para ser batizado, tendo rece-
bido o nome de Antonio. Urna nova vida comecou para Antonio, agora
feito cristao e seguidor de Cristo. Inimigo dos vicios e do pecado, chegou
ao grau heroico das virtudes evangélicas; amava a Deus e ao próximo inten
samente. A/'udava os pobres, tomava conta dos doentes, assistindo-lhes e
aliviando suas dores, rezava, trabalhava e fazia penitencias. Chorava o
tempo passado fora do Cristianismo e agradecía a liberdadeobtida, aperfei-

283
44 "PERPUNTE E RESPONDEREMOS" 373/1993

coando-se na vida religiosa até chegar é santidade. Faleceu no día 14 de


margo de 1549 em Noto e ali foi enterrado na igre/a de Santa María de Je
sús. No dia 13 de abril de 1559, cincoenta anos depois de sua morte, aber-
to o seu sepulcro, foi encontrado o seu santo corpo integro e incorrupto,
/números os milagres que Deus operou por sua intercessao. Quem experi-
mentou o seu patrocinio, sabe que nenhum pedido de graca a ele feito
fica sem resposta. Fique devoto de Santo Antonio de Categeró e visite a
sua imagem verdadeira, vinda diretamente da África. Venerada em seu
altar-mor".

Celebra-se a festa do santo em 14 de margo e 13 de junho.

Há orapoes a Santo Antonio de Categeró nos impressos difundidos


com a lacónica rubrica "Com Aprovacao Eclesiástica"; nao se diz qual o
signatario da "Aprovacao".

Os devotos sao convidados a doar dinheiro para as obras do Santua


rio do Santo na Agencia X da Caixa Económica Federal, conta Y.

Sao também convidados a pedir gracas e mandar celebrar, em agrade-


cimento, tres Missas na igreja do Santo e distribuir gratuitamente "100 no
venas" (cem folhetos portadores de oracoes para novena?).

Urna imagem do Santo atribui-lhe semblante de africano e hábito


franciscano.

2. QUE PENSAR?

1. Antes do mais, é preciso dizer que nenhum Martirologio ou Catá


logo de Santos da Igreja Católica apresenta Santo Antonio de Categeró.
Mais: nenhuma das Enciclopedias mais usuais entre nos1 conhece o nome
Categeró. A pretensa súmula biográfica do Santo atrás transcrita nao men
ciona Categeró; terá sido urna cidade do itinerario de vida de Antonio? Es
te terá nascido em Barca e morrido em Noto.

Este silencio das fontes leva a crer que Santo Antonio de Categeró
nunca existiu, pois um Santo franciscano de época relativamente recente
(sáculo XVI) nao poderia deixar de figurar no catálogo hagiográfico da
Igreja.

1 Barsa, Mirador, Larousse, Círculo do Livro...

284
SANTO ANTONIO DE CATEGERÓ 45

2. Nao é a Igreja Católica que propaga a devocao a tal Santo (poisa


Igreja nao o conhece); mas é a chamada "Igreja Católica Ortodoxa Siria-
ña". Este título designa um grupo dissidente, que nao é fácil identificar
através do respectivo título:

- a designacao Católica compete ás comunidades que guardam a


comunhao com a Sé de Pedro ou com o Papa. A Igreja tem quatro notas:
una, santa, católica, e apostólica;

- a designacao ortodoxa refere-se aos cristaos que se separaram de


Roma em 1054, sob Miguel Celulario, Patriarca de Constantinopia. Sao
ditos ortodoxos, porque nao aderiram ás heresias cristológicas do século
V: o nestorianismo, condenado pelo Concilio de Éfeso em 431, e o mono-
fisismo, condenado pelo de Calcedonia em 451. Guardaram naquela época
a reta fé ou a ortodoxia;

- o predicado Siriana pode indicar a circunscricao ortodoxa da Siria.


Parece, porém, designar no caso urna comunidade independente das comu
nidades ortodoxas orientáis, ou seja, urna comunidade siria monofisita. Se
assim é, o título ortodoxa siriana perde o seu significa, pois implica con-
tradicao.

3. Como quer que seja, é muito estranho que urna comunidade orien
tal separada da Igreja Católica explore a devocao a um pretenso Santo oci-
dental católico (franciscano), com todo o aparato de sugestoes e preces
que Ihe dio aparéncia de culto católico. Por que usar um artificio que tan
to fala ao povo simples, prometendo-lhe milagres, se os sirianos nao com-
partilham a fé dos ocidentais ou a fé que terá tido "Santo Antonio de Ca-
tegeró"? Este nao foi sirio, se eremos na lenda, mas foi africano. Será que,
exaltando-o, os sirianos querem atrair gente para os seus oficios e o seu
santuario?... gente, porém, ludibriada, pois os fiéis convidados imaginam
que vio entrar num templo católico quando, na verdade, passam a
frequemar urna corrente religiosa nao católica.

Haverá boa fé nessa propaganda de devocao? Sao os interesses do


Reino de Deus que animam os promotores dessa piedade? Por que celebrar
a festa de S. Antonio de Categeró precisamente no dia 13 de junho,
quando os fiéis católicos costumam cultuar Santo Antonio nascido em Lis
boa, mas residente em Pádua?

Temos informacoes de que também a Igreja Brasileira propaga a de


vocao a S. Antonio de Categeró. Recorre ao mesmo engaño para atrair
incautos.

285
UN INI<V - FF.S

O Flagelo da AIDS:
cu .

He ■ '■ lo

PRESERVATIVO OU PREVENCÁO?

Em síntese: O Arcebispo de Tolosa (Franca), Mons. André Collini, di


rígese as pessoas que nao aceitam os principios da Moral Católica (princi
pios que, alias, nao sao, muitas vezes, senao os principios da lei natural).
Mostra-lhes que, já aos olhos do bom senso, o uso de preservativos é inefi
caz para evitar o contagio de virus malignos; alémde nao oferecerplena se-
guranea de profilaxia, os preservativos cedo ou tarde deixam de ser utili
zados pelos interessados, seja porque diminuem o prazer, se/a porque;em
ambientes alcoolizados e entregues a paixoes violentas, tal cuidado parece
despropositado ou inexeqüivel. Mais: a Campanha em favor dos preserva
tivos dá a entender que a promiscuidade e a plena liberdade em materia
de sexo sao algo de aceitável, desde que se tomem cautelas "profHéticas";
ora esta conclusao é errónea nao só aos olhos da fé, mas também aos olhos
da própria razao.

Vai, a seguir, traduzido um artigo de Mons. André Collini, arcebispo


de Tolosa (Franca), publicado no Bulletin Diocésain de Toulouse (05/07/
1992). Versa sobre o tema, muito atual também no Brasil, dos preservati
vos, indicados como profiláticos contra a AIDS. Como diz o texto, o autor
se dirige principalmente aos jovens... e aos jovens que nao pretendem
observar as diretrizes da Moral Católica. Argumenta, pois, em nome da ra
zao e do bom senso, prescindindo de razoes de fé — o que se torna espe
cialmente ¡nteressante para os cidadaos de um mundo secularizado.

O TEXTO

"Recentemente as autoridades governamentais e os meios de comuni-


cacoes sociais lancaram de novo, e com grande vigor, urna campanha que
pretende ser 'Campanha de Prevencáo contra o Flagelo da AIDS'.

Notemos que essa Campanha se dirige prioritariamente aos jovens e


as jovens que nao vivem maritalmente de modo estável, ligados ou nao por

286
PRESERVATIVO OU PREVENgAO?

um contrato matrimonial. Notemos também, que o único meio proposto


para impedir a expansao do flagelo é o uso do preservativo masculino.

As consideraqoes que se seguem, situam-se neste quadro. Tencionam


dirigir-se aos jovens, inclusive aqueles que nao admitem, neste setor, as
exigencias da Moral da Igreja Católica. Lembremos, porém, para ser ciaros,
que essas exigencias sao de dois tipos:

De um lado, a uniao sexual só tem seu pleno sentido humano na me


dida em que é inseparável do amor que liga um homem a urna mulher, de
modo irreversível, excluindo qualquer outra relacao sexual com outros
parceiros; tal uniao há de ser aberta á fecundidade carnal e espiritual. Dou-
tro lado, é gravemente culpada a pessoa que, para satísfazer aos seus im
pulsos ou ao seu desejo de prazer, poe em perigo a vida de um parceiro
ou de um terceiro, negtigenciando as precaucoes necessárias.

Após este lembrete, desejo propor algumas reflexoes correspondentes


as seguintes questóes: urna Campanha de prevencao estruturada únicamen
te sobre o uso do preservativo masculino goza de plena garantia de efica
cia? Nao se pode crer que, ao contrario, ela multiplica os riscos que ela
pretende combate r?

Urna Campanha que chama a atenclo da opiniao pública apenas para


tal recurso, é perigosa, principalmente se ela favorece a distribuícao quase
gratuita de preservativos nos lugares*publicóse principalmente nosestabe-
lecimentos escolares.

— Perigosa, primeramente porque nao é certo que tal meio preserve


cem por cento e em todas as circunstancias contra as infeccoes devidas aos
virus responsáveis pelas doencas sexualmente transmissi'veis.

— Perigosa, principalmente porque tal Campanha difunde a idéia de


que sao normáis as relacoes sexuais precoces e a 'vadiagem' sexual... como
se tais comportamentos nao tivessem conseqüéncias psicossomáticas sobre
as pessoas nem alguma influencia sobre as estruturas fundamentáis da so-
ciedade. Seria bom que se desse atencao aos especialistas em ciencias hu
manas que manifestam a propósito serias reservas e advertencias. Verdade
é que sua voz nao se faz ouvir fácilmente nos meios de comunicacao social.

Urna Campanha de tal tipo corre o risco de ter efeitos perversos. Con
vida o adolescente a passar á prática por curiosidade ou por rece ¡o de ser
'anormal'...

Urna vez dado o primeiro passo, os jovens relutam para usar preserva
tivos. O uso deste diminuí a intensidade do prazer. Numa ligapao que pre
tende ser 'amorosa', o preservativo pode ser interpretado por um dos par

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48 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 373/1993

ceiros como falta de confianca ou como um reconhecimento mascarado de


doenca.

Por fim, o uso do preservativo torna-se praticamente ¡mpossível


quando o encontró se realiza em circunstancias que diminuem a plena
consciéncia ou a plena liberdade do ato: assim, no ambiente agitado de
certas reunioes de jovens, em contexo alcoolizado ou simplesmente na
concessao a impulsos imprevistos e nao dominados.

Nessa tarefa, como em qualquer outra, nao se pode simultáneamente


favorecer o superconsumo e evitar os abusos.

Urna Campanha de prevencao, para ser eficaz e sem ambigüidades,


nao deve recear alertar contra os perigos de relacoes sexuais precoces com
parceiros múltiplos. O melhor meio de lutar contra a AIDS é devolver á
sexualidade humana toda a sua dignidade; dever-se-ia mesmo ousar lem-
brar que o autodominio é um fator de liberdade, abre a via a um amor que
nao se reduz ao mero prazer, á paixao apenas e tao-somente á satisfacao de
dois egoísmos solitarios, mas se orienta para a plena común ¡cacao de duas
pessoas.

Se estas ref lexoes nao vos convencem, escutai ao menos a declaracao


de um dos melhores especialistas de AIDS, o Professor Luc Montagnier,
feita ao jornal Le Monde:

'O poder político está mal situado nesta questao. Pensó principal
mente que a televisad poderla e deveria fazer rhuito mais em prol da pre
vencao. Creio também que deu énfase demasiado unilateral ao papel dos
preservativos masculinos. Eu desejaría ver Campanhas baseadas sobre o te
ma: Vos sois responsáveisV.

Que advertencia e que desafio!"


* * *

Como dito, o texto tem o valor de mostrar nao so mente a inepcia,


mas também as conseqüéncias desastrosas das Campanhas pro-preservati
vos, pois, em vez de coibir as doencas, fomentam as causas que as origi-
nam, ou seja, a promiscuidade sexual.

Verifica-se outrossim que o autor do artigo teve em mira particular


mente os jovens desejosos de levar vida sexual precoce. É certo, porém,
que as ponderacóes de Mons. Collini sao válidas para todo tipo de relacio-
namento sexual alheio ás normas da lei natural; por conseguinte, dirigem-
se também a quem se entrega ao homossexualismo.

Possa afinal o bom senso calar fundo no ánimo dos interessados!


Estévao Bettencourt O.S.B.

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espelhada na trajetória de um viver humano renascido do san-
gue redentor de Cristo. - Assim, o discípulo de Sao Bento ou-
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