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P rojeto

PERGUNTE
E
RESPONDEREMOS
ON-LINE

Apostolado Veritatis Spiendor


com autorizagáo de
Dom Estéváo Tavares Bettencourt, osb
(7n memoriam)
APRESENTAQÁO
DA EDIQÁO ON-LINE
Diz Sao Pedro que devemos estar
preparados para dar a razáo da rtossa
esperanga a todo aquele que no-la pedir
(1 Pedro 3,15).

Esta necessidade de darmos conta


da nossa esperanca e da nossa fé hoje é
■- mais premente do que outrora, visto que
somos bombardeados por numerosas
- correntes filosóficas e religiosas contrarias á
fé católica. Somos assim incitados a procurar
consolidar nossa crenga católica mediante
um aprofundamento do nosso estudo.

Eis o que neste site Pergunte e


Responderemos propóe aos seus leitores:
aborda questóes da atualidade
controvertidas, elucidando-as do ponto de
vista crístáo a fim de que as dúvidas se
dissipem e a vivencia católica se fortalega no
Brasil e no mundo. Queira Deus abencoar
este trabalho assim como a equipe de
Veritatis Splendor que se encarrega do
respectivo site.

Rio de Janeiro, 30 de julho de 2003.

Pe. Esteváo Bettencourt, OSB

NOTA DO APOSTOLADO VERITATIS SPLENDOR

Celebramos convenio com d. Esteváo Bettencourt e


passamos a disponibilizar nesta área, o excelente e sempre atual
conteúdo da revista teológico - filosófica "Pergunte e
Responderemos", que conta com mais de 40 anos de publicacao.
A d. Estéváo Bettencourt agradecemos a confiaga depositada
em nosso trabalho, bem como pela generosidade e zelo pastoral
assim demonstrados.
Ano xxxvm Abril 1997 419
"Cantai um cántico novo..." (SI 96,1)

Pastores protestantes se tornam católicos.

Ensino Religioso Aconfessional?... Sem ónus para o


Estado?

As Mensagens de Vassula Ryden

Que significa rezar pelos mortos?

Como se transmite a Vida Humana?

O Homem é Descendente do Macaco?

"Budismo, o Desafio da Modernidade"


ABRIL 1997
PERGUNTE E RESPONDEREMOS
N°419
Publicagáo Mensal

SUMARIO
Diretor Responsável
Estéváo Bettencourt OSB
Autor e Redator de toda a materia "Cantal um cántico novo..." (SI 96,1) 145
publicada neste periódico
Nos Estados Unidos:
Pastores protestantes
Diretor-Administrador:
se tornam católicos 146
D. Hildebrando P. Martins OSB
Discussáo candente:
Administracáo e Distribuicao: Ensino Religioso Aconfessional?...
Edicóes "Lumen Christi" Sem ónus para o Estado? 161
Rúa Dom Gerardo, 40 - 5° andar - sala 501
Novo Pronunciamento sobre:
Tel.: (021) 291-7122 As Mensagens de Vassula Ryden 165
Fax (021) 263-5679
Na Comunháo dos Santos:
Endereco para Correspondencia: Que significa rezar pelos morios? 171
Ed. "Lumen Christi"
Poucos conhecem as Minucias:
Caixa Postal 2666 Como se transmite a Vida Humana? 176
CEP 20001-970 - Rio de Janeiro - RJ
Pergunta Popular:
Visite O MOSTEIRO DE SAO BENTO e "PER O Homem é Descendente do Macaco? .... 181
GUNTE E RESPONDEREMOS" na INTERNET:
Diz a Imprensa:
http://www.osb.org.br.
"Budismo, o Desafio da Modernidade" ... 188

Impressao e EncadernaipSb

COM APROVAQÁO ECLESIÁSTICA


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«Sua Santidade» (Bernstein e Politi) - Planejamento Familiar e Aborto (Dr. J. E. dos
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Fundamentalismo: origem e histórico. - A Missa do Campeiro ou do Boiadeiro.

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3 Em qualquer agencia dos Correios, VALE POSTAL, enderezado ás EDIQOES "LUMEN


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Obs.. Correspondencia para: Edicoes "Lumen Christi"


Caixa Postal 2666
20001-970 Rio de Janeiro - RJ y
"CANTAI UM CÁNTICO NOVO..." (Si 96,1)
O mes de abril é todo perpassado pelos ecos de Páscoa, celebrada
aos 30/03pp. Na vigilia da Ressurreicáo do Senhor, os cristáos renovaram as
suas promessas de Batismo, recordados de que pelo Batismo participaram
da morte de Jesús ao pecado e da sua ressurreicáo como novo Adáo. Ser
batizado é realmente ser nova criatura, enxertada em Cristo, feita filho(a) de
Deus no FILHO. Faz-se necessário, porém, renovar periódicamente a consci-
éncia desta grande verdade, visto que a natureza, lerda como é, tende a levar
sempre á rotina e á acomodacáo. S. Agostinho (t 430) dirígia-se aos cristáos
recém-batizados na vigilia de Páscoa em termos que até hoje conservam
pleno valor:

"Ó irmaos, ó filhos, ó novos rebentos da Igreja Católica, ó geragao san


ta e celestial, que renascestes em Cristo para urna vida nova! Ouvi-me, ou
antes, ouvi através do meu convite: Cantai ao Senhor um cántico novo. 'Já
canto', dir-me-eis. Sim, ougo que cantáis. Mas oxalá a vossa vida nao dé
testemunho contra a vossa lingual

Cantal com a voz, cantai com o coragao, cantai com a boca, cantai com
a vida: 'Cantai ao Senhor um cántico novo' (SI 96,1). Perguntais-me o que
deveis cantara respeito daquele a quem amáis. Sem dúvida, é acerca daque-
le a quem amáis que vos desejais cantar. Queréis saber entao que louvores
haveis de cantar? Já o ouvistes: Cantai ao Senhor um cántico novo. E que
louvores? Cantai os vossos louvores na assembléia dos santos. O maior iou-
vordo cántico éopróprío cantor. Queréis tributar louvores a Deus? Sede vos
o cántico que haveis de cantar. Vos sois o Seu maior louvor, se viverdes
santamente".

Estas palavras de S. Agostinho lembram oportunamente que a riqueza


do cristáo consiste em sua fidelidade incondicional a Deus; sua vida, ainda
que modesta, é um cántico ao Senhor:
"Nao deixeis de viver santamente, e louvareis sempre a Deus. Deixais
de O louvarquando vos afastais dajustiga e do que Lhe agrada. Se nunca vos
desviardes do bom caminho, ainda que se cale a vossa língua, clamará a
vossa vida e o ouvido estará perto do vosso coragao. Porque, assim como os
nossos ouvidos escutam as nossas palavras, assim os ouvidos de Deus es-
cutam os nossos pensamentos" (S. Agostinho).

E, cantando a Deus por urna vida santa, o cristáo canta também aos
seus irmaos. Nao há dúvida, aquilo de que o mundo de hoje mais necessita,
é o testemunho de vivencias coerentes e corajosas, decididas a amar a Ver
dade e a morrer por ela no comezinho de cada dia ou também no pareo
sangrento da perseguicáo. Quem assim procede, é urna flor rara, que real
mente proclama a novidade de Páscoa ou da Vitoria de Cristo sobre o pecado
e a morte. - Ser arauto de tal mensagem é a maior dignidade que alguém
possa almejar neste mundo. Seja cada cristáo urna nova criatura num mundo
sedento de "novidades"!
E. B.

145
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS"

Ano XXXVIII-N° 419-Abril de 1997

Nos Estados Unidos:

PASTORES PROTESTANTES SE TORNAM CATÓLICOS

Em síntese: A revista norte-americana SURSUM CORDA! Special


edition 1996, refere a noticia de que nos últimos anos cinqüenta pastores
protestantes se converteram ao Catolicismo, sendo que outros mais es-
tao a caminho da Igreja Católica. Cita varios casos de tal ocorréncia, ex
pondo os motivos que levaram tais cristSos a conversao. As tres razóes
mais freqüentemente apontadas sao as seguintes: 1) o subjetivismo que
reina ñas denominagóes protestantes em conseqüéncia do principio do
"tivre exame da Biblia"; cada cristao é tido como apto a interpretara Pala-
vra de Deus segundo Ihe parega; 2) o retomo á literatura patrística ou dos
oito prímeiros séculos da Igreja, evidenciando o modo de entender a fé
professado pelos antigos cristaos; 3) a definigáo do canon da Biblia, que
nao é deduzida da própría Biblia, mas sim da Tradigao oral, que é anterior
a Biblia e a identifica ou abona, indicando o respectivo catálogo.
* * *

A revista norte-americana SURSUM CORDA!, Special edition 1996,


refere a noticia de que nos últimos anos cinqüenta pastores protestantes
se converteram ao Catolicismo, sendo que outros mais estáo a caminho
da Igreja Católica. O artigo respectivo, da autoría de Elizabeth Althau, tem
por título Protestant Pastors on the Road to Rome (pp. 2-13). Cita vari
os casos de tal ocorréncia, expondo os motivos que levaram tais cristáos
á conversao. Visto o significado muito atual de tal fenómeno, publicamos,
a seguir, em traducáo portuguesa, quatro de tais relatos.

1. INTRODUgÁO

Nos últimos dez anos, no mínimo cinqüenta pastores protestantes,


na maíoria evangélicos, renunciaram as suas funcóes e encontraram o
caminho para a Igreja Católica. Cada qual passou por conflitos da mente
e do coracáo; cada qual sachficou conforto e seguranca. Muítos haviam
sido induzidos, por especial doutrinacao, a temer e desprezar a Igreja
Católica; os demais simplesmente consideravam-na como a mais erró
nea de todas as seitas.

146
PASTORES PROTESTANTES SE TORNAM CATÓLICOS 3

Já que um dos fatores mais penosos dessa caminhada é a solidáo,


alguns dos ex-pastores constituiram uma sociedade chamada The Net-
work (A Rede) para se ajudarem mutuamente na caminhada. Dos cento
e cinqüenta membros dessa sociedade, cerca de cem aínda estio desen-
volvendo seu processo de conversáo. E a lista vai crescendo...

2. EXCOMUNGADO: BILL BALES

Bill Bales cresceu em ambiente presbiteriano progressista em


Bethesda, Md. "Eu tinha uma especie de fé adormecida em Cristo", lem-
bra ele. "Eu nao tinha vida de oracáo regular nem praticava o estudo da
Biblia. Essas coisas eram, para mim, secundarias".

Bales matriculou-se num curso preparatorio para a Faculdade de


Medicina numa Universidade americana; jogava futebol. Contraiu uma
lesáo pulmonar, que o obrigou a penosa cirurgia.

"Comecei a contemplar coisas tais como a morte. Passei a conviver


com cristáos que tinham uma fé robusta. Comecei a rezar: 'Se Deus exis
te, que Ele se revele!'. Se existisse realmente, eu ficaria feliz por crer
nele. Comecei a ler a Biblia, e algumas páginas da mesma tomaram sen
tido para mim".

Passou a freqüentar uma igreja presbiteriana mais tradicional, e fi-


cou impressionado pela conduta de muitos de seus membros. "Cristo era
uma realidade. Vocé podía ter um relacionamento com Ele. Nao era um
feixe de palavras vazias".

Bales deixou de lado seus planos de estudar Medicina. Pós-se a


trabalhar pordoís anos numa Pastoral de Juventude de uma igreja presbi
teriana; depois fez-se pastor numa igreja nao denominacional (nao conven
cional) protestante. "Mas eu tinha que entrar num Seminario, caso eu qui-
sesse continuar o meu ministerio pastoral. Eu desejava mais aprendiza-
gem - e também algum tempo para pensar a respeito de certas idéias e
possíveis solucóes. Havia tantas ¡ndagacóes que me surgiam na mente!".

Bales entrou para o Gordon Conwell Theological Seminary, institui-


cáo seria interdenominacional em South Hamilton, Mass. Essa época foi,
para ele, maravilhosa.

"Reverenciavam a Escritura. Alguns dos professores que eu freqüen-


tava, interpretavam o Antigo Testamento de maneira semelhante á dos
Padres da Igreja1 e bem melhor do que muita gente no evangelismo. Nao
1 Padres da Igreja sao aqueles escritores que contribuirán! para a reta formulagao das
verdades da fé relativas á SS. Trindade, a Jesús Cristo, a Igreja, a graga... Sao padres
(= país) mediante a transmissao da Palavra da vida. A época patrística temiina com S.
Gregorio Magno no Ocidente (t 604) e no Oriente com S. JoSo Damasceno (f 749).
(Nota do tradutor).

147
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 419/1997

estudávamos a fundo os Padres. Tratava-se mais de urna escota de trei-


namento para pastores do que de urna escola de graduacáo".

Terminados os estudos em 1985, Bales aceitou o encargo de pastor


associado na igreja presbiteriana de Gainesville, na Virginia. A principio
ele esteve ali muito feliz.

"Mas na primavera de 1988, algumas das questóes que eu nunca con


siderara realmente ou que abordara superficialmente, comecaram a emer-
gir. A mais crucial era a da definicao do canon das Escrituras. Quem tinha
a autoridade necessária para definir o conteúdo do catálogo sagrado? É
esta urna questáo fundamental. Senti-me mais e mais estranho á respos-
ta calvinista, que eu sempre professara1; as outras sentencas proferidas
no mundo protestante, fora do Calvinismo, pareciam-me muito lacunosas.
Eu nao estava a ponto de ser atraído pelo Catolicismo, embora eu
acreditasse que devia haver urna resposta para as perguntas que eu le-
vantava. Desde que Scott Hahn, meu amigo dos tempos do Seminario, se
convertera ao Catolicismo, estava a conversáo no meu subconsciente.
Na seqüéncia dos tempos, eu sentía que devia ser plenamente honesto,
reconhecendo a fragilidade da minha posicáo relativa ao canon.

Urna saída, n§o satisfatória, porém, seria passar-me para urna mo-
dalidade de protestantismo mais liberal. Se Deus nao instituiu urna auto
ridade sobre a térra capaz de decidir a respeito de certos problemas, en-
táo parecia-me que tudo ia pelos ares. Eu nao conseguía contornar essa
questao".

Mas, se o Catolicismo era urna possibilidade, Bales tinha urna serie


de leituras a fazer, urna serie de respostas a confrontar. Ele encontrou o
Development of Christian Doctrine, de Newman, o The Spirit of
Catholicism de Karl Adam, e algumas obras de Louis Bouyer especial
mente interessantes.

"Mais e mais me convencí, através do estudo da historia, de que a


doutrina católica já era professada na antigüidade, talvez em termos me
nos desenvolvidos, mas já presentes aos antigos. Convenci-me também,
mediante as Escrituras, de que, na maioria dos casos em que havia urna
definicáo (como a do primado de Pedro) ou ainda nos casos controverti
dos, a Igreja Católica tinha a melhor argumentacáo; isto nao quer dizer
que eu havia de decidir minha filiacáo á Igreja por efeito de alguma passa-

1 Para os reformadores protestantes em geral, um livro é inspirado por Deus se produz


abundantes frutos espirítuais para o leitor ou se é escrito em belo estilo literario ou,
ainda, se é de origem apostólica. Como se vé, o primeiro criterio é muito subjetivo; o
segundo nao se aplica a varios livros da Biblia, cujo estilo deixa a desejar (cf.
Apocalipse). Confonve o terceiro criterio, poder-se-ia pórem dúvida a inspiragao e a
canonicidade de alguns livros do Novo Testamento. (Nota do tradutor).

148
PASTORES PROTESTANTES SE TORNAM CATÓLICOS 6

gem bíblica. Eu via também que, de modo muito lógico e compreensível,


a Igreja Católica tinha crescido, favorecida pela acao de Deus. Parecía
me mais razoável pensar assim".

No fim de 1989, Bales se sentía pouco á vontade no exercício do seu


ministerio e da sua pregacáo. Renunciou a eles no comeco de 1990.

"Eu tentava conceber uma imagem pouco atraente do presbite-


rianísmo. Os presbiterianos tinham sofrido outras defeccóes: as de Scott
Hahn e a de Gerry Matatícs, por exemplo. Havia um punhado de crentes
que nao queriam deixar-me partir".

Bales julgava que podía ter evitado uma excomunhao formal se se


transferisse primeiramente para uma Igreja episcopal. Mas ele estava sin
ceramente certo de que a Igreja Católica era o seu destino, e ele nao o
quería negar de público. Em conseqüéncía, o processo de excomunhao
contra ele foi iniciado.

"Encontrei-me tres ou quatro vezes com pequeñas comissóes. Da


primeira vez tentaram-me compreender e colheram informacóes para ins
tituir o processo jurídico. Nao houve jamáis aiguma mesquinhez. A terca
parte do presbiterio votou pela n§o-excomunháo; nao houve unanímidade".

Quais sao as conseqüéncias da excomunhao no presbiterianismo?

"Existe a concepeáo generalizada, declara Bales, de que o exco-


mungado tem que se arrepender, pois está imerso em determinado tipo
de pecado. O modo de tratar o excomungado varia de paróquía para pa-
róquia. A minha paróquia era de linha muito dura. Essa dureza ¡ntimidava.
Abandonar a paróquia era molesto. Eu o via como se fosse morrer para
toda aquela gente.

A voz dos nossos amigos era suave. Mas a chefia nao estava em
absoluto interessada em que algum membro da congregacáo continuas-
se a ser meu amigo... A comunidade era muito fechada. Ali havia muitas
amizades profundas, um monte de gente boa".

Bill Bales foi recebido na Igreja Católica na festa dos Santos Anjos
da Guarda (2/10) de 1990.

3. PATO MORTO: MARCUS GRODI

Marcus Grodi cresceu numa igreja luterana um tanto liberal, perto de


Toledo, Ohio. Era ativo no Grupo Jovem, catequizava e confirmava os
colegas na fé. "Conheci muitas coísas", disse ele, "mas nao penetraram
em meu coracáo". "Os acampamentos de veráo dos jovens da Igreja pa-
reciam preparados mais para uma exibicao de música do que para temas
espirituais".

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"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 419/1997

Os colegas de Grodi na Escola Superior provinham de diversas de-


nominacóes religiosas, nao, porém, do Catolicismo. "Minha visáo do Ca
tolicismo nao era extremamente negativa, mas trazíamos um monte de
interpretagóes mitológicas da Igreja Católica, que se encontrava do outro
lado da cidade. Imaginávamos que estivesse cheia de supersticoes, e
que o povo estava quase escravizado pelos padres e as freirás".

Marcus, porém, comecou a se surpreender, vistas as diferencas exis


tentes entre as denominacoes protestantes.

Grodi estudava Engenharia em Case Western Reserve. "Passei tres


anos sem entrar numa igreja", declarou. "Eu estava envolvido numa
convivencia fraterna e tudo que Ihe diz respeito. Finalmente no veráo an
terior ao meu último ano experimentei urna profunda renovacáo da minha
fé mediante o testemunho de um amigo - o que representou urna guiñada
de 180" na minha vida".

Grodi voltou para a sua igreja luterana e achou que as palavras da


Liturgia Ihe significavam alguma coisa pela primeira vez. "Mas, quando
considerei os bancos da igreja, vi estudantes de Escolas Superiores que
eram como eu quando tinha a idade deles, a recitar palavras sem as com-
preender. Eu concluí entáo que o liturgicismo tradicional estava morto; ele
produzia cristáos de nome apenas, quase destituidos de compreensáo.
Eu julguei que Deus quería ouvir algo de diferente, nao as mesmas coisas
cada domingo".

Urna vez formado, Grodi comecou a trabalhar como engenheiro e


como apostólo da juventude. Escolheu o congregacionalismo1. "Cada igreja
congregacional é autónoma e pode decidir a respeito do que ela quer
fazer. Ela pode redigir seu próprío Credo. É surpreendente o que algumas
igrejas congregacionais, de fato, créem".

Em 1978,... Grodí entrou para o Gordon-Conwell Theological Se-


minary. Muito lucrou nos anos que ali viveu.

"Eu nao rejeito meu fundo evangélico. Ele me levou de volta para
Jesús Cristo. Colocou em meu coracáo o sincero desejo de Lhe dar total
mente a minha vida. E creio que foi por causa desta convicgao que agora
eu sou católico. Mesmo o Seminario Gordon-Conwell, com seu zelo pela
S. Escritura e pela verdade (visto que era interdenominacional, evitava as
questóes controvertidas da Igreja Batista, da Metodista e da Presbiteriana),
proporcionou a muitos de nos a ocasiáo de passarmos para a Igreja Cató
lica^

1 Congregacionalismo é a denominagao protestante em que a Congregagao govema a


si mesma mediante os pastores que ela escolhe. Nao reconhece hierarquia. (Nota do
tradutor).

150
PASTORES PROTESTANTES SE TORNAM CATÓLICOS 7

Grodi voltou para a sua igreja congregacional com entusiasmo e con-


viccáo. Era urna igreja da Florida: "Eu nao estava lá nem seis meses quan-
do percebí que havia algo menos bom no congregacionalismo. Mas eu
nao sabia indicar exatamente o que era".

Grodi entrou na Igreja Presbiteriana como pastor, mas as dúvidas


continuaram. "Como poderia eu estar certo de que nossos pontos de vista
presbiterianos estavam corretos em comparac§o com os de meus irmáos
metodistas ou da Assembléia de Deus ou da Igreja de Cristo ou dos
anglicanos - ou até dos católicos? Como poderia eu saber que a minha
interpretacáo da Escritura era coerente com aquilo que Jesús Cristo real
mente disse?

Eu quería ser fiel. Eu sabia que um día comparecerei diante de Jesús


Cristo, meu Senhor, e terei que dar contas das almas das pessoas que
dirijo. Eu tinha consciéncia de que eu devia ter certeza de que os meus
ensinamentos eram verídicos e o meu procedimento era correto".

Grodi nao podía ir pedir ajuda á chefia da Igreja Presbiteriana. "Eu


tinha rejeitado quase todos os seus pontos de vista. A maioria deles era
muíto liberal. Deixavam muíta coísa ao arbitrio de cada um. Nove sobre
dez oficios que chegavam ao meu escritorio provenientes da chefia cen
tral, iam parar na cesta de papéis.

Nao havía normas. Eu estava reinventando o fio condutor. Nao teria


sentido admitir que Jesús fundou urna Igreja e depois deixou tudo ao leu".

Grodi tentou voltar sua atencáo para urna denomínacáo mais con
servadora, mas nao se sentía á vontade com o que ele chamava o aspec
to de escolha pessoal vigente entre as denominacóes protestantes. Re-
nunciou entáo as suas fungóes de pastor e voltou para Case Western
Reserve, com a ¡ntencáo de conseguir o seu Ph. D. em Biología molecular
e depoís associar ciencia e religiáo no cultivo da Bioética. "Eu imagínava
que acabaria sendo um professor de Genética ou de Etica em alguma
Faculdade".

Nao estava longe de terminar a sua tese doutoral quando numa ma-
nhá urna noticia de jornal Ihe chamou a atencáo: "O teólogo católico Scott
Hahn fará urna palestra na paróquia local".

Teólogo católico Scott Hahn? "Havia oito anos que nao nos víamos.
Fui entao ouvi-lo, escutei a sua gravagáo e li o livro Catholicism and
Fundamentalism de Karl Keating. Ao cabo de fazer estas tres coisas, eu
era um pato morto". Grodi pós-se a ler os antigos Padres da Igreja e a
historia da Igreja. Ele tinha consciéncia de que nao podía continuar a ser
protestante. "Meu problema é que eu nao me podia tornar católico. Havia
coisas estranhas em demasía. Imagine que vocé foi protestante durante

151
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 419/1997

quarenta anos e se poe a considerar o Menino Jesús de Praga; este há de


parecer realmente estranho. Eu crescera com todos esses preconceitos.
A Igreja Católica e a Mafia eram, para mim, a mesma coisa. Os católicos
bebiam e fumavam.

Mas verifiquei que, se eu pudesse confiar na autoridade do magiste


rio situado na cátedra de Pedro, tudo mais se assentaria em seu lugar
certo. Foi o livro Development of Christian Doctrine de Newman que
me convenceu disto. E assim eu já era um católico".
Marcus Grodi foi recebido na Igreja Católica em 1993.
Comentario da Redagáo de PR: Muito interessante é o raciocinio
final de Marcus Grodi. O criterio que autentica a Igreja de Cristo ou a
Igreja fundada por Cristo, nao é a virtude ou o pecado dos seus membros,
pois estes sao criaturas oscilantes, que, hoje virtuosos, amanha podem
vira ser pecadores. O criterio de autenticidade é a presenca de Cristo na
Igreja ou, mais explicitamente, a assisténcia prometida por Cristo a sua
Igreja confiada a Pedro e seus sucessores (cf. Mt 16,16-19; 28,18-20; Jo
14,26; 16,13-15). Quem eré nesta promessa de Jesús, adere lógicamente
a Igreja Católica e sabe considerar o comportamento dos fiéis católicos
dentro dos moldes da fragilidade humana (também existente entre os pro
testantes); há entre os católicos certamente belos testemunhos de santi-
dade. O que importa, porém, é Cristo presente e atuante, e nao a conduta
dos homens fiéis ou infléis a Cristo.

4. O HOMEM CÓSMICO: STEVE WOOD

O caminho de Steve Wood para o Seminario Gordon-Conwell foi muito


diferente do de Bill Bales e Marcus Grodi. Ele foi educado por país fiéis e
dignos presbiterianos, mas "nao como urna crianca dócil", dizia ele. "Eu
Ihes dei muita dor de cabeca. Fui ingrato, rebelde e teimoso". Após um
par de anos muito desregrados na mais desregrada república da Univer-
sidade da Florida, Steve desistiu de tudo, e entrou para a Marinha.

Pós-se a procurar urna alternativa para o hedonismo ou a procura


sistemática do prazer. Quando o seu navio estava no porto da baía de
Virginia, Steve empregou o seu tempo livre no Edgar Cayce Institute, apren-
dendo misticismo e medítacáo orientáis. Os seus companheiros da Mari
nha chamavam-no "o homem cósmico". Todavía um amigo gurú insistiu
em que Steve aprofundasse a sua própria religiao, antes de procurar mais
elevadas formas de consciéncia de si mesmo.

"Nada quero com o Cristianismo!" protestava Wood. Mas, diante da


insistencia do seu amigo, Wood comprou urna Biblia.

"Eles vendem Biblias no Cayce Institute de todos os tipos. Minha


teología foi fraca, de tal modo que eu nao sabia a diferenca entre aqueles

152
PASTORES PROTESTANTES SE TORNAM CATÓLICOS 9

que tém 'Evangelhos secretos perdidos' e aqueles que nao os tém. Já


que eu nao tinha capacidade de discernir, eu continuava a proferir os
meus Ohms, meus mantras diante da prateleira de Biblias. Por graca de
Deus, eu adquirí uma Biblia auténtica".

Wood julgava que acharia a Biblia árida e cheia de poeira. Surpreen-


deu-se, porém, porque a encontrou muito dinámica. Logo ele se deixou
persuadir da natureza divina e da missáo de Jesús Cristo assim como da
sua própria pecaminosidade. Ele passou assim por uma profunda e clás-
sica conversao evangélica.

Wood sentiu-se atraído pela Cápela do Calvario na California, santu


ario náo-denominacíonal muito impregnado de significado bíblico, que era
procurado por muitos jovens. Ele aprendeu a desprezar o Batismo que
ele havia recebido como enanca, julgando que o Batismo de enancas era
um infeliz vestigio do Catolicismo Romano. Estudou hebraico e grego numa
escola da Assembléia de Deus e exerceu sua atividade pastoral com a
juventude na Cápela do Calvario.

A seguir, retornou para a Florida na esperanga de acender nos jo


vens do lugar a fé muito viva que ele havia experimentado na California.
Em 1978 foi ordenado por uma Igreja carismática interdenominacional.
Batízou de novo muitos católicos e protestantes. Entrementes encontrou-
se com aquela que se tornou sua esposa Karen. Pouco depois, ele se
matriculou no Gordon-Conwell Semínary.

Ficou muito surpreso ao aprender que muitos teólogos protestantes


de bom nome aprovavam o Batismo de criancas. O casal Steve e Karen
Wood estava á espera do seu primeiro filho, o que tornava urgente a solu-
cáo da questáo.

"Eu estava para ser o pai de uma enanca chamada á vida eterna e eu
quería estar seguro de proceder corretamente. Afinal concluí pela valida-
de do Batísmo de criancas - conclusáo que me foi muito difícil. Nao so-
mente ela me levou a maíor proximidade da Escritura, mas também me
fez voltado para a historia da Igreja".

Wood tornou-se pastor de uma igreja protestante nova em Venice,


Fia., onde ele servíu durante quase dez anos. Continuava a estudar e a
perguntar como Cristo quería que fosse a sua Igreja. Levou sua congre-
gacáo a filiar-se á Igreja Presbiteriana da América, e pós-se a ler sempre
maís assiduamente os antígos Padres da Igreja. "Se vocé quer encontrar
a Igreja, eis os seus sinais a ser descobertos: una, santa, católica e apos
tólica, como refere o Credo de Nicéia (325), pelo qual nos professamos a
nossa fé. Os reformadores protestantes mudaram as notas de identidade
da Igreja e, se vocé muda as notas, nunca encontrará a Igreja.

153
10 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 419/1997

A Igreja é una. Mas um diagrama da Igreja Presbiteriana nos dois


últimos séculos se parece com o desenho esquemático para uma placa
de computador".

Wood meditou muito sobre a oracáo de Cristo na sua última ceia. Ele
pediu em prol da unidade da Igreja. Wood estava convicto de que Cristo
tinha em vista nao apenas uma unidade espiritual dos crentes, mas sim
uma unidade visível, táo perceptível que os nao crentes a pudessem des-
cobrir, como Jesús disse, a fim de acreditarem.

Ele pregou sobre essas notas num sermáo datado de 1986. Disse
aos seus fiéis que nao compreendia como podia acontecer que essa ora
cáo de Cristo podia ficar sem resposta.

"A Igreja Católica ficava ainda fora de cogitacio para mim. Vocé sabe
que algumas vezes a verdade é identificada com uma pessoa para que o
impensável se possa tornar pensável.

Sim. Eu ouvi dizer que Scott Hahn era uma causa perdida. Mas eu
pensei que era meu dever chamar Gerry Matatics e falar-lhe da Igreja".
Wood se esforcou. Ele se adentrou nos Padres da Igreja antiga. Ele
conversou com sua esposa. A questáo do governo da Igreja tomou-se
obscura, nao mais clara:

"Os Apostólos impuseram as máos sobre homens, e os designaram


como oficiáis da Igreja".

Wood fora perturbado durante anos pela tese protestante referente


ao vínculo matrimonial. Ele entáo estava chegando á conclusao de que
Cristo o quería indissolúvel. Desanimado por causa da esterilidade de um
ativismo em favor da vida que durara muitos anos, ele comecou a perce-
ber que somente a santidade do casamento podia oferecer um funda
mento sólido para se conceber a santidade da vida.

Ele preparou um sermáo sobre Oséias, o profeta do Antigo Testa


mento cuja esposa se foi para tornar-se uma prostituta.

"Deus mandou a Oséias que trouxesse de novo a sua esposa para


casa. E serviu-se do adulterio dessa mulher para ilustrar a apostasia do
povo de Israel. Como procedería eu para apresentar a lei de Cristo, que
era também a da Igreja Católica, a uma assembléia protestante? Pior
ainda: depois que terminei o sermáo, tomei consciéncia de que nao devia
dar a comunháo a pessoas divorciadas e de novo casadas".

Ele se desculpou junto á congregacáo, pronunciou uma béngáo e


partiu para o seu escritorio. Os mais antigos o seguiram e aceitaram a sua
renuncia ao cargo.

154
PASTORES PROTESTANTES SE TORNAM CATÓLICOS ^

Poucas semanas depois, Wood foi cumprir urna sentenca que o con-
denava a sessenta dias de prisáo por ter, numa Clínica, dissuadido al-
guém de abortar. Na prisáo ele leu muito e pediu luzes a Deus para que
descobrisse a verdadeira Igreja. Ele esperava receber urna inspiragáo.
Em lugar disto, ele recebeu urna visita: a visita do Bispo de Venice.

Steve e Karen Wood foram recebidos na Igreja Católica em julho de


1990.

5. MISSIONÁRIOS ENVIADOS AO CATOLICISMO


Muitos dos convertidos do protestantismo ao Catolicismo comecam
por questionar as suas crencas protestantes ao perceberem as muitas
interpretacóes dadas á S. Escritura por homens de boa vontade.

Kristine Franklin foi educada como "urna crista bíblica" fundamentalista


em Tacóme (Washington). O seu marido Marty era de familia episcopal
(anglicana) e fora batizado numa comunidade chamada "Vida Jovem"
(anglicana).

Explica Kristine Franklin que aprendeu desde enanca a valorizar enor


memente a vocagáo de missionáho(a) em térra estrangeira: "Meu irmáo e
minha irmá mais velhos se tornaram missionários, ele na Espanha, em El
Salvador, em Costa Rica e no México, afastando os católicos das igrejas
de Roma. Minha irmá e seu marido foram á Nova Guiñé".

Logo depois de se casarem, Marty e Kristine se puseram a planejar


sua atividade missionária. Levaram oito anos a se preparar para tanto, e
dois anos e meio para angaríar fundos que Ihes permitissem viajar para
além-mar. O casal foi primeramente para Costa Rica, depois para a
Guatemala.

Havia na Guatemala grande número de missionários protestantes,


trabalhando entre católicos. Dizia Kristine: "... trabalhando com grande
sucesso, porque os católicos nao estáo devidamente instruidos na fé e -
esta é minha opiniáo - porque os missionários americanos, ao chegarem,
oferecem vantagens de vida de estilo americano".

Disse ainda Kristine: "Quando estávamos na Guatemala, varias coi


sas se tornaram muito claras para mim. Urna délas era que, apesar de
toda a minha educacáo religiosa, eu nada sabia a respeito do Catolicismo.
Só tinha nocáo daquilo que me haviam dito e de que era urna religiáo falsa".

Num grupo de estudos da Biblia Kristine Franklin encontrou pela pri-


meira vez urna católica romana muito fiel.

"Olhando para tras agora, verifico que ela foi para mim um desses
marcos ao longo da estrada. Era urna mulher profundamente devota, prova-

155
12 -PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 419/1997

velmente da minha idade; nao era missionária. Tornava-se muito claro, a


partir das suas palavras e da sua conduta, que era urna católica muito
dedicada a Jesús Cristo. Foi surpreendente para mim, depois que ela se
foi, ouvir as outras mulheres se referirem ás suas tentativas de a evan
gelizar, pois era obvio, para mim, que ela nao precisava de ser evan
gelizada.

Outra coisa que me impressionou, é que meu marido estava dando


aulas para enancas norte-americanas e canadenses, pertencentes a cer
ca de quarenta denominacoes. Assim pudemos tomar consciéncia do que
era o protestantismo americano na América Latina; também fomos bom
bardeados pela realidade do protestantismo, que é um conjunto de gru
pos nos quais cada um tem sua mensagem própria.

Entre aqueles que trabalham em áreas rurais, há um acordó tácito


sobre essas diferencas: de um lado da montanha, acham-se os pente-
costais e, do outro lado, os metodistas. Estes dizem aqueles: 'Se voces
nao ensinarem ao meu povo que ele tem que falar em línguas para rece-
ber o Espirito Santo, nos nao diremos á gente de voces que eles tém que
batizar suas enancas".

Além de sentir-se perturbado por essa ampia variedade de doutrinas


e práticas existentes entre os missionários, o casal Franklin foi impressio-
nado pelo analfabetismo ou quase analfabetismo de alguns membros do
clero protestante.

Alguns tém apenas a instrucáo primaria e logo sao feitos pastores.


Outros proclamavam a si mesmos ministros do Evangelho, sem ter o de-
vido aprendizado; talvez tivessem um exemplar de partes da Escritura
Sagrada. Eles traziam um monte de perguntas. Vocé nao pode traduzir a
Biblia para o linguajar da cada um deles. Vocé tem que Ihes ensinar urna
maneira totalmente nova de ver o mundo. E vocé tem que Ihes transmitir
um sistema de interpretado da Biblia.

E aqui está a pergunta:... qual sistema?"

Apesar de tudo, esta nao era a questáo mais difícil.

"Para mim, era realmente intrigante o fato de que eu vinha de um


nivel de instrucáo e vivia numa regiáo em que havia 60% de analfabetos.
Comecei a me colocar perguntas como: 'Como alguém se pode tornar
cristáo se nao sabe ler? Se minha responsabilidade, como crista, consis
te em conhecer minha Biblia por dentro e por fora e entender de teología
e estudá-la diariamente e chegar a conclusoes teológicas próprias (quero
dizer que o protestantismo está baseado na interpretado pessoal que
cada um dá á Biblia), como é que aquele povo poderia realizar isso?

156
PASTORES PROTESTANTES SE TORNAM CATÓLICOS 13

Que é que esse povo tem de cristáo se ele nao sabe ler? E nunca
chegaráo a ler. Que é que Deus jamáis teve em vista para eles? E pense
agora: há atualmente poucos sáculos que tais povos da América Latina
podem conseguir ler, mas no resto do mundo há urna multidáo de gente
que nao sabe ler. Que é o Evangelho para eles? Quem será responsável
pela tarefa de ir até eles para Ihes pregar a verdade?

O casal Franklin pós-se a discutir estas e outras perguntas. Se, de


um lado, havia boas novas pelo fato de que Guatemala se estava protes-
tantizando, de outro lado a historia da Europa Ocidental sugería que as
coisas nao iam táo bem.

"As nac.6es européias que se passaram para o protestantismo em


conseqüéncia da Reforma, sao agora países sem Deus. Quando a Refor
ma os atingiu, os povos foram protestantizados por um certo número de
geracóes; depois destas, quase como conseqüéncia natural, se tornaram
sociedades atéias.

De acordó com o meu modo de ver, isto acontece porque, se vocé


introduz o principio do livre exame e da interpretacáo privada (pessoal) da
Biblia, vocé, na verdade, está introduzindo o povo no conceito de que a
verdade é algo de subjetivo. Ora o Catolicismo e nossa fé crista estáo
baseados em verdades objetivas.

E o povo pode deixar de crer em principios absolutos de Moral. Na


igreja protestante da Guatemala, de classe media, em que nos servía
mos, havia um bom número de pessoas divorciadas e casadas de novo.
Perguntamos a um desses casáis com que fizemos amizade: 'Como é
que voces puderam renascer? Como é que voces se tornaram protestan
tes?1 A esposa do homem em questáo o abandonara e ele nao consegui
rá anular seu primeiro casamento... Foi-me parecendo que o protestantis
mo na Guatemala está muito ligado ao modo de vida norte-americano.
Ele se parece com algo importado, á semelhanca dos hamburgers de
McDonald e Reebok".

A igreja na qual o casal Franklin servia, distava, de sua casa, cerca


de dez milhas. Num domingo eles voltavam de carro para casa com seus
dois filhos. Passaram diante de urna igreja católica que ficava a dois quar-
teiroes da sua residencia.

"Minha filha, que tinha quatro anos aproximadamente, disse: 'Máe,


por que n§o entramos na igreja católica?' Tomei consciéncia de que eu
nao tinha resposta. Eu nao podia dizer: 'Porque eles nao ensinam a ver
dade1, pois eu nao pensava assim... Pude verificar que nos, os protestan
tes, escolhíamos as nossas igrejas de acordó com a nossa doutrina pes
soal. Isto faz de nos a autoridade suprema, que julga o que é verdade e o

157
14 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 419/1997

que é correto. Isto realmente me impressionou: minha interpretacáo da


Escritura é o criterio da verdade. Eu escolho minha verdade. Eu escolho
minha verdade crista.

Entáo comecamos a ler urna serie de livros de historia da Igreja.


Fomos servir numa igreja episcopal, que ficava nos arredores. Nunca nos
tínhamos aproximado do Catolicismo. Meu marido nao entendía a Liturgia.
Eu nunca tinha assistido a um oficio litúrgico.

Qual foi nossa impressáo ao presenciarmos um cerimonial litúrgico


pela primeira vez?

Eu gritei. Sentia-me táo bem que me ajoelhei para a Comunháo. Havia


ali urna beleza, embora tudo me parecesse muito estranho. Era bonito ver
as criancas ser levadas ao Batismo. Eu fora educada numa tradicáo
anabatista, que nao aceita o Batismo de changas, de modo que eu nunca
vira tal coisa. Era grandiosa a énfase dada á Liturgia, na qual a Eucaristía
se sucedía ao sermáo.

Em meu coracáo havia algo que eu nunca experimentara antes. Nao


sou urna pessoa que anda á cata de experiencias, mas o que eu via era
muito profundo e muito emocionante. Meu marido tinha o claro sentimen-
to de estar entrando em sua casa.

Apesar disto tudo, faltava-nos alguma coisa. Nao pudemos ficar muito
tempo na ¡greja episcopal, pois a teología ali era quase nula. Renuncia
mos á nossa missáo, e voltamos para os Estados Unidos. Nao sabíamos
ainda onde íamos parar. Só sabíamos que nao podíamos continuar a ser
protestantes".

O casal Franklin tinha deixado nos Estados Unidos urna igreja muito
dinámica. Nao podiam voltar para ela.

"Era difícil, pois lá tínhamos amigos. Nao sabíamos onde nos agar
rar, mas sabíamos onde nao nos agarrar. Apesar de tudo, procuramos a
¡greja episcopal nos Estados Unidos. Era um bom oasis. Neste comeca
mos a estudar seriamente a doutrina católica. Nao tardou muito e já podí
amos superar a antítese 'Escritura versus Igreja1. Já nao era difícil fazer-
mos a síntese entre urna e outra. Algumas das outras doutrinas ainda nos
pareciam difíceís... Mas, já que tínhamos vivido fora da nossa cultura,
havíamos aprendido a considerar as coísas com olhos diferentes. Era o
que acontecía: tínhamos aprendido a olhar o Catolicismo um pouco mais
como ele é ou sem preconceitos.

Para nos, a grande questáo era: 'Que é a verdade? E como a pode


mos reconhecer? E sobre que base hao de repousar nossas crencas?
Como havemos de decidir?' Quando nos pusemos a comparar a face

158
PASTORES PROTESTANTES SE TORNAM CATÓLICOS 15

nítida da Igreja Católica com a face nítida do protestantismo, a Igreja Ca


tólica ganhou nos planos da lógica, da historia, da filosofía e da Escritura.
Todas as nossas respostas lá se encontravam".

Marty e Kristine Frankiin foram recebidos na Igreja Católica em abril


de 1996.

6. REFLETINDO...

Os testemunhos atrás citados sugerem, entre outras, tres reflexóes


principáis.

6.1. Subjetivismo

Um dos grandes motivos para a conversáo dos irmáos em pauta foi


o subjetivismo do protestantismo. Cada crente é incitado ao livre exame
da Biblia, donde cada qual deduz seus principios de fé e de Moral. É isto
que explica o esfacelamento da Reforma: na época em que Marty Frankiin
ensinava, havia criangas de quarenta denominacóes protestantes na tur
ma. Encontram-se também crentes que estáo fora de alguma denomina-
cáo ou de algum sistema e se guiam únicamente pela Biblia, lida e enten
dida segundo Ihes parece. Tais atitudes nao podem deixar de esvaziar o
próprio Cristianismo, pois há denominacóes oriundas do protestantismo
que já nao sao cristas, como as Testemunhas de Jeová, os Mórmons, a
Ciencia Crista...

Os séculos XVI e XVII deram origem ao subjetivismo do pensar ou á


relativizacáo da verdade. Lutero (t 1546) foi o arauto desse subjetivismo
em materia de religiao, e Descartes (t 1650) o foi no tocante á Filosofía.
De Descartes em diante a Filosofía se volta quase exclusivamente para a
capacidade de conhecimento do homem e vai relativizando a verdade, tanto
no sensismo (Thomas Hobbes, Condillac) como no idealismo (Kant, Hegel).

Ora Deus nao se terá revelado aos homens, entregando ao leu ou ao


arbitrio dos homens a sua Santa Palavra. Era sabio instituir urna instancia
que garantisse a conservacao incólume da sua mensagem: foi o que Je
sús Cristo fez, confiando a Pedro e seus sucessores a guarda do Evange-
Iho (cf. Mt 16,16-19; Le 22,31s; Jo 21,15-17; Jo 14,26; 16,13-15); a única
Igreja fundada por Cristo tem a certeza de que Jesús Ihe está presente e
Ihe assiste até o fim dos tempos (cf. Mt 28,18-20) de modo que nela se
mantém intata a verdade transmitida pelo Senhor Deus aos homens. A
verdade é algo de objetivo, independente do parecer subjetivo e da cultu
ra dos homens (isto nao quer dizer que ela nao interpele pessoalmente a
cada ser humano).

É, pois, na Igreja Católica que se encentra o depósito da fé íntegro e


fielmente conservado. Este depósito é como urna sementé que vai des-

159
16 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 419/1997

dobrando suas virtualidades, de modo que no decorrer dos tempos se


váo descobrindo as riquezas contidas na sementé da Palavra de Deus;
essa descoberta é homogénea ou está em continuidade com suas ori-
gens e é garantida pela assisténcia do Senhor Jesús e do seu Espirito.

6.2. A Definicáo do Canon (catálogo) bíblico

Um dos pontos cruciáis que abalaram os convertidos em foco, era o


de saber como se definiu o catálogo dos livros sagrados. Certamente nao
é a própria Biblia que delimita o seu catálogo; é algo de fora da Biblia,
anterior á Biblia ou é a Tradigáo oral. É esta que autentica e recomenda
os escritos sagrados. Por conseguinte, é ilusorio dizer alguém que segué
somente a Biblia; segué, sim, a Tradicáo oral que apresenta a Biblia e,
conseqüentemente, apresenta o sentido ou a interpretacáo da Biblia. Os
católicos seguem a Tradicáo oral que parte de Jesús Cristo e dos Apostó
los. Os protestantes seguem a Tradicáo oral que vem dos judeus de Jámnia
e que é adotada pelo fundador da respectiva denominacáo (Lutero, Calvino,
Wesley...); este fundador do século XVI ou posterior dá inicio á tradicáo
oral e ao modo de interpretar a Biblia próprios dos luteranos, dos calvinis
tas, dos metodistas... Assim os protestantes tém também sua tradigáo
oral, que é anterior á Biblia e a acompanha...; todavía é tradigáo oral que
nao comeca com Jesús Cristo e os Apostólos, mas comeca com um ho-
mem "iluminado" dos séculos XVI, XVII, XVIII, XIX, XX...

6.3. A Historia do Cristianismo

Os convertidos de que falam os relatos atrás, verificaram que o Cris


tianismo nao comecou com Lutero nem com Calvino, nem com Wesley...,
mas comegou com Jesús Cristo. É importante, portante, retroceder para
tras do século XVI e considerar a literatura crista dos primeiros séculos ou
os escritos ditos "patrísticos" (que váo até o século VIII); tais escritos,
como os de S. Justino (t 165), S. Ireneu (t 202), Orígenes (t 250), S.
Basilio (t 379), S. Atanásio (t 373), S. Leáo Magno (t 461), S. Gregorio
Magno (f 604)... sao aínda o eco vivo da pregacáo dos Apóstelos e dos
discípulos dos Apóstelos; nao há melhores intérpretes da Palavra de Deus
do que tais autores. Foi o que Henry Newman e a Escola de Oxford veri
ficaram na Inglaterra do século passado, suscitando importante movimento
de volta ao Catolicismo. O Cristianismo nao comeca no século XVI (nem
recomeca em tal época), mas tem inicio em Cristo e na geracáo dos Após
telos, que Ele formou e dotou dos carismas do Espirito Santo para que
transmitissem incólume a verdade do Evangelho.

160
Discussao candente:

ENSINO RELIGIOSO ACONFESSIONAL?... SEM


ÓNUS PARA O ESTADO?

Em síntese: A nova Leide Diretrízes e Bases da Educagao, promul


gada aos 20/12/96, prevé o ensino religioso ñas escolas públicas sem
ónus ou encargos para o Govemo; além do qué, esse ensino deveria ser
aconfessional, segundo muitos govemantes e mestres. - Ora tais posi-
góes ferem a índole democrática do Estado brasileiro. Este recebe dinhei-
ro (impostos) da populagáo para servir á mesma. Se o Estado é leigo ou
arreligioso, o povo brasileiro é religioso; toca-lhe o direito de ser atendido
ñas escolas oficiáis de acordó com a modalidade de educagao - e educa-
gao religiosa, se for o caso - que os pais querem dar aos filhos. Se as
familias optam por ensino religioso confessional em casa, compete ao
Estado oferecer as criangas o ensino religioso confessional correspon
dente, subvencionando com o dinheiro público ou o dinheiro do povo os
professores de cada confissao registrada.

Aos 20/12/96 foi sancionada a nova Lei de Diretrízes e Bases da


Educacáo, também chamada "Lei Darcy Ribeiro", que, no tocante ao en
sino religioso, prevé: "Ensino religioso de matrícula facultativa, no horario
normal de aulas, mas sem ónus para os cofres públicos".

Além de nao ser remunerado pelo Estado, o ensino religioso, como


se pensa, deverá ser aconfessional, ou seja, ministrará concepcóes reli
giosas que nao sejam propriamente católicas nem protestantes, nem es
piritas nem judaicas... Tal perspectiva tem agitado os ambientes religio
sos do país, que nao aceitam nem urna nem outra das normas assim
formuladas.

Vejamos o que se pode dizer a respeito nao somente do ponto de


vista católico, mas também á luz dos principios da democracia.

1. QUE É O ENSINO ACONFESSIONAL?

A nocáo e a prática do ensino religioso aconfessional encontram


adeptos nao somente em ambientes governamentáis, mas também entre
pensadores católicos e protestantes. Entre outros, distinguem-se profes
sores do Estado do Paraná reunidos na Associacao Interconfessional de

161
18 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 419/1997

Educa$áo de Curitiba (ASSINTEC); defendem a mesma tese o Conselho


de Igrejas para a Educacáo Religiosa (CIER) de Santa Catarina e o Insti
tuto Regional de Pastoral de Mato Grosso do Sul (IRPAMAT). Por ocasiáo
da elaboracáo da Constituigao do país, enviaram á Assembléia Constitu
irte a seguinte mensagem:

"Educagao Religiosa... nao pode ser entendida como mera informa-


gáo sobre urna ou mais religióes... ser confundida com doutrinagáo,
catequese ou formagao da fé dos crentes das diversas confíssdes religio
sas, religióes, igrejas... Assim a visao de Educagao religiosa é muito se-
melhante á da educagao e necessita de seracolhida como integrante da
vida escolar, ajudando a tornaras relagóes mais humanas e fraternas, ou
seja, favorecendo para que a educagao seja mais personalizante, neces-
sária á formagao da personaüdade do ser humano, fomecendo criterio de
seguranga na busca da sua maturídade e plena realizagao, processo de
formagao social e pessoal, que permita ao educando um ambiente mais
favorável ao desenvolvimento de atitudes de abertura ao sentido mais
profundo e radical da vida, da relagao com o Transcendente, o Sagrado, a
partir do elemento cultural já presente nele...

Portante Educagao Religiosa nSo é ensino da religiao, mas realida-


de mais ampia e mais rica, que nao visa a formagao de crentes, mas á de
seres humanos compromissados com a vida, agentes da historia, cons-
trutores de urna nova sociedade mais justa, fraterna e solidaría".

Como se vé, a Educacáo Religiosa assim entendida redunda em


Educacáo Moral e Cívica. Perde seu caráter de transmissáo das verda
des da fé ou deixa de ser profissáo de um Credo para reconhecer tio
somente o Deus que a razio ou a filosofía pode atingir. Nem os fiéis cató
licos nem os protestantes nem algum outro cidadáo religioso que seja
convicto de sua fé, poderá aceitar essa redugao do ensino religioso ao
plano do aconfessional.

A tendencia ao ensino aconfessional, que partiu de grupos religio


sos, mas nao da Igreja Católica como tal, está sendo atualmente conside
rada pelo Governo como a melhor forma de preservar o ensino religioso,
dada a pluralidade de correntes religiosas existentes no Brasil. Diante
disto, impoe-se urna reflexáo objetiva e serena.

2. QUE DIZER DO ENSINO ACONFESSIONAL?

Distinguiremos o dever do Estado e a posicao da Igreja.

2.1. O Devor do Estado

O ensino aconfessional, se for adotado pelo Governo, vira a ser um


gesto de desrespeito aos cidadáos brasileiros, que tém suas crencas re-

162
ENSINO RELIGIOSO ACONFESSIONAL?... SEM ÓNUS PARA O ESTADO? 19

ligiosas e possuem o direito de ver essas crencas respeitadas quando o


Governo oferece ensino religioso ñas escolas públicas.

Dirá alguém: mas o Estado leigo, arreligioso1, pode ou deve oferecer


aulas de religiáo ñas escolas oficiáis?

Respondemos que o Estado pode ser leigo ou arreligioso, mas a


populacao brasileira é religiosa, profundamente religiosa. - O papel do
Estado é servir ao povo, proporcionando-lhe os servigos de que necessita
para seu bem-estar (hospitais, transportes, moradia, escola...). A escola es
tatal deve ser continuadora da tarefa educativa dos pais na familia. É o que
lembra a Declaragáo Gravissimum Educationis do Concilio do Vaticano II:

"A tarefa de ministrar a educagáo, embona primordialmente seja da


familia, necessita do auxilio de toda a sociedade... É encargo seu (do
Estado) promover de muitos modos a educagáo da juventude... De acor-
do com o principio da subsidiaríedade, na falta de iniciativa dos pais e das
outras sociedades, deve a sociedade civil levar a termo a obra da educa
gáo, respeitando, porém, o desejo dos pais" (n° 3,7).

Com efeito, a educagáo dos filhos está entregue primeiramente aos


genitores; sao eles que definem o tipo de educagáo que daráo aos filhos
e querem que a escola ministre as suas criancas. Por conseguinte, se os
pais sao religiosos, tém o direito de exigir que a escola oferega ensino
religioso - aquele ensino religioso que continué as nogóes e a formagáo
que os alunos recebem em casa. O Estado que nao oferega tal tipo de
servigo, nao é democrático; impoe aos alunos urna visáo arreligiosa, ou
seja, urna visáo na qual a religiao é um elemento acidental, nao integran
te, como seria a filiagáo a tal ou tal sociedade cultural ou esportiva. Com
efeito; é impossível ser neutro em materia de religiao; quem nao a profes-
sa oficialmente, indica que ela nao é necessária para a formagáo da ju
ventude; únicamente necessárias seriam a geografía, a historia, a mate
mática... Isto equivale a negar o valor próprio da religiáo.

Com outras palavras: a Religiáo nao se apresenta ao Estado como


algo que possa ser ignorado. Refutamos bem: o Estado pode omitir o
ensino da Informática em suas escolas, pois o estudo desta ciencia nao
constituí parte integrante, imprescindível, da formagáo de urna pessoa
humana. A Religiáo, porém, trata do sentido da vida. Ela tenta responder
as perguntas básicas: Quem sou eu? Donde venho? Para onde vou? Por
que trabalho? Por que sofro?... Verdade é que o Estado nao tem o direito
de dar urna resposta oficial obrigatória a tais perguntas, dizendo aos cida-
dáos para que é que eles existem, mas o Estado tem o dever de oferecer
1 Distinguimos arreligioso e irreligioso. O primeiro significa "sem religiáo" (o prefixo a
é negativo). O segundo quer dizer "contrario á religiao".

163
20 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 419/1997

a cada um dos seus súditos os meios para elucidar tais perguntas funda
mentáis, decisivas para nortear a vida nao só do individuo, mas também
da sociedade.

Daí o dever que toca ao Estado, de oferecer ensino religioso aos


alunos cujos pais o solicitam e o oferecer confessional sem criar urna
nova religiáo (filosófica), que nao corresponde á opcao dos interessados.

Para corroborar quanto acaba de ser dito, seja citado o artigo 26,
letra c da Declaracáo Universal dos Direitos Humanos promulgada pela
ONU em 1948:

"Os pais tém príoridade de direito na escolha do género de instmgáo


que será ministrada a seus fíihos".

Vai mais adiante ainda o Protocolo Adicional da Convencáo Euro-


péia de Salvaguarda dos Direitos do Homem, art. 2o:

"O Estado, no exercício de suas fungóes, que deve assumirno domi


nio da educagáo e do ensino, respeitará o direito, dos pais, de assegurar
esta educagáo e este ensino conforme suas convicgóes religiosas e filo
sóficas".

A propósito vale a pena transcrever consideracoes de D. Lourenco


de Almeida Prado no seu artigo "Ensino Religioso no Estado Democráti
co" (revista Cultura e Fé, ano XIX, n° 73, abril/junho de 1996):

«O Estado é prestador de servigos. Recolhe o dinheiro dos impos-


tos, nao para tomarse urna entidade poderosa e dominadora (risco que é
tentagáo do que se torna forte), mas para prestar servigos em atendimen-
to ás carencias e desejos dos cidadaos. Há urna certa analogía entre a
organizagao do Estado e a de urna cooperativa. Como observou lucida
mente Joao XXIII, a vida moderna, com o progresso da ciencia e da técni
ca, com o crescimento da vida urbana, tornou certos bens fundamentáis,
como transporte, saúde, moradia e educagáo, inacessíveis a cada um
singularmente. As pessoas tém que se associar para construir e equipar
um hospital. Cada um coopera com urna contríbuigáo. O hospital, entre
tanto, nao é fim, mas um meto. Meio para tomar a assisténcia á saúde
acessivel a cada um. O arrecadado é devolvido em servigos. Servigos
que atendam ás postulagóes dos associados. Imaginemos que o diretor
desse hospital se desse, um dia, á prepotencia de determinar que, no
mesmo, só se praticaría a homeopatía. Nada tenho contra a homeopatía,
mas é ao doente que cabe o direito de escolher o tipo de medicina e, até,
o próprio médico. Esse hospital, se quisesse ser plenamente democrático
e humanizado, nao devería impor um médico determinado, mas oferecer
varios médicos, a fim de que a variedade permitisse a escolha. Os
cooperadores sejuntam nao para criar urna entidade prepotente, mas um

164
ENSINO RELIGIOSO ACONFESSIONAL?... SEM ONUS PARA O ESTADO? 21

servigo capaz de dar a cada um o que deseja. Para precisar a fungáo


servidora (nao dominadora) do Estado e, ao mesmo tempo, marcara dife-
renga entre neutralidade tiránica, que nega a verdadeira neutralidade, que
é oferta variada, para cada um ter o direito de escolher, imaginarei um
Estado metido em difículdades internacionais que, pretendendo fícar neu
tro em materia da língua moderna, se dispusesse a retirar do currículo
oficial o ensino de qualquer língua. Quem quisesse aprender francés ou
inglés assumisse o ónus e o fizesse em aulas particulares. É a neutralida
de que se pretende em relagáo ao ensino religioso. Negar. Qual seria a
verdadeira neutralidade estatal em relagáo ao ensino da língua? Colocar
se na posigáo de devedor. Deve ao cidadáo, contribuinte do imposto, o
ensino de língua. Oferecerá varias línguas, na medida do possível, para
que cada um possa optarpela que prefere... Assim, no tocante á Religiáo,
0 Estado deverá assegurar, sem ónus para o contribuinte, o ensino e con-
digóes a cada um para a escolha...».

Passemos agora ao exame da

2.2. Posigáo da Igreja

A Igreja Católica reconhece a existencia de varias correntes religio


sas no Brasil. Mas nem por isto pleiteia o ensino aconfessional nem mes
mo o interconfessional1, mas sim o ensino pluriconfessional, em que
cada cidadáo encontra a mensagem correspondente as suas conviccóes
religiosas: a católica, a protestante, a judaica...

Os Papas tém repetido a necessidade de nao se mutilar a doutrina


católica na catequese, nem mesmo a título de facilitar o ensino religioso,
ou promover o ecumenismo. Sao palavras de Paulo VI:

"A fidelidade ao depósito da Revelagáo é claro que exige também


que nao se passe em silencio alguma verdade essencial da fé: o Povo de
Deus, confiado aos nossos cuidados, tem o sagrado e inalienável direito
de receber a Palavra de Deus, toda a Palavra de Deus" (Alocugáo aos
Padres Conciliares, citado por Odiláo Moura, Ecumenismo e Ensino Re
ligioso na Escola Pública, Rio de Janeiro 1988, p.15).

Joáo Paulo II retoma o pensamento de Paulo VI:

"Para ser verdadeira a oblagáo da fé, aqueles que se tomam discípu


los de Cristo tém o direito de receber a palavra da fé nao mutilada,
1 O ensino interconfessional nao corresponde nem a mensagem católica completa,
nem á protestante na sua íntegra. Se o aluno nao completar sua fonvagao na Igreja,
como há de ser o caso de muitos, ficará ao nivel de um Credo religioso próprio, muito
mais próximo do protestantismo do que do Catolicismo, teto é, por certo, muito incon
veniente; nao é lícito ao cristao ocasionar voluntariamente o surto de um ramo do
Cristianismo.

165
22 TERGUNTE E RESPONDEREMOS" 419/1997

falsificada ou diminuida, mas sim plena e integral, com todo o seu rigor e
com todo o seu vigor. Atraigoarem qualquer ponto a integridade da men-
sagem é esvaziar perígosamente a própria catequese... Assim a nenhum
catequista verdadeiro é lícito fazer, por seu próprío arbitrio, urna selegéo,
no depósito da fé, entre aquilo que considere importante e aquilo que ele
julgue sem importancia, para ensinaro 'importante' e rejeitaro resto" (Exor-
tagáo Apostólica Catechesi Tradendae n° 30).

Vé-se que seria traicáo querer mutilar a mensagem da fé no que ela


tem de essencial, qualquer que fosse o motivo evocado.

Passemos a ulterior aspecto da problemática.

3. "... SEM ÓNUS PARA O ESTADO"

De quanto foi dito até agora decorre, com clareza, que ao Estado
compete oferecer o ensino religioso que as familias solicitem, sem ulteri
or encargo para estas; visto que pagam impostos, tém o direito de rece-
ber do Governo os servicos de que precisam, inclusive o da educagáo
correspondente ao desejo dos pais.

Continuagáo da pág. 192:

finito e o Infinito, o relativo e o Absoluto, o temporario e o Eterno, o contin


gente e o Necessário, em última análise,... o Sim e o Nao. Ora isto nao se
sustenta aos olhos da razáo e, portanto, nao se concilia com a mentalida-
de ocidental, que costuma ser rigorosamente lógica. É a falta de conheci-
mento exato da doutrina budista que a torna aparentemente compativel
com as categorías científicas do homem de hoje. Quem se aprofunda em
materia religiosa, verifica a incompatibilidade da filosofía budista com a
mentalidade científica do homem ocidental.

2) Na verdade, o que atrai no budismo, é a sua sede de valores invi-


síveis e superiores. Todo homem possui o anseio do Absoluto, que fica
além das criaturas finitas e relativas como sao. A ascese budista, a sua
procura de claro encontró com a Divindade mediante um coracáo purifi
cado é que fascinam o cidadáo contemporáneo. Todavía é de notar que a
Mística nao é privilegio do budismo; ela é humana e, por isto, está muito
presente no Cristianismo. Este conta na sua historia com grandes figuras
contemplativas, cheias do amor a Deus e ao próximo, como Sao Paulo
Apostólo, Sta. Teresa de Ávila, Santo Inácio de Loiola, Sao Francisco de
Assis, Santa Teresa de Lisieux, Santa Catarina de Sena... Basta estudar
um pouco a tradigáo crista para descobrir belas e profundas páginas de
elevacáo espiritual, que nada deixam a desejar para quem procura a inti-
midade com Deus (além do qué, nao ferem a lógica).

Continua na pág. 187

166
Novo Pronunciamento sobre

AS MENSAGENS DE VASSULA RYDEN

Em síntese: A Congregagao para a Doutrina da Fé, aos 29 de no-


vembro de 1996, emitiu nova Declaragáo sobre as obras da Sra. Vassula
Ryden, que atribuí a Jesús Cristo certos oráculos relativos á reuniáo dos
cristaos, á piedade crista, a flagelos que deverao sobrevir a humanida-
de... Tal Declaragáo confirma os dizeres de Declaragáo anterior, datada
de 6 de outubro de 1995 e dissipa qualquerdúvida que possa subsistirá
respeito do alvitre que o fiel católico deve tomar frente ás mensagens
provenientes da Sra. Vassula. Esta merece respeito. Competía, porém,
ao magisterio da Igreja esclarecer o povo católico, ao qual Vassula dirige
seus escritos.

A Sra. Vassula Ryden, greco-ortodoxa, tem apresentado ao mundo


mensagens que ela diz receber de Jesús Cristo, relativas á reuniáo dos
cristaos, á auténtica piedade, a castigos vindouros... Esses dizeres se
acham colecionados em diversos voiumes, que vém deixando o povo ca
tólico sem saber o que julgar a respeito.

Diante da situacáo assim oriunda, a Congregacáo para a Doutrina


da Fé, em 6 de outubro de 1995, emitiu urna Notificacáo que desabonava
tais mensagens, qualificando-as de meditacóes pessoais da Sra. Vassula,
e nao de oráculos divinos. Tal Declaracáo da S. Sé suscitou ampia con
testacáo, como se nao fosse auténtica ou como se nao emanasse de
autoridade competente nem tivesse forca de lei. Em conseqüéncia, a
Congregacáo para a Doutrina da Fé publicou nova Declaracáo datada de
29 de novembro de 1996, que confirma a anterior e dissipa qualquer mal
entendido a respeito da mesma.

Dada a importancia desta segunda Declaragáo, publicamo-la a se


guir, antepondo-lhe, para maior clareza do leitor, a primeira Notificacáo, já
reproduzida em PR 406/1996, pp. 116s. O leitor encontrará ainda em PR
406/1996, pp. 118-123 um comentario de D. Murilo Krieger, Bispo de Pon-
ta Grossa (PR) em defesa da autenticidade da primeira Notificacáo.

Eis a Notificacáo de 6/10/95:

167
24 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 419/1997

CONGREGAQÁO PARA A DOUTRINA DA FÉ


NOTIFICAQÁO

Muitos bispos, sacerdotes, religiosos, religiosas e leigos se dirigen) a


esta Congregagáo para ter um juízo autorízado sobre a atividade da Se-
nhora Vassula Ryden, greco-ortodoxa, ¡vsidente na Suíga, que está a
difundir nos ambientes católicos do mundo inteiro, com a sua palavra e
com os seus escritos, mensagens atribuidas a presumíveis revelagóes
celestes.

Um exame atento e sereno da inteira questáo, realizado por esta


Congregagáo a fím de "por á prova as inspiragóes para verificar se pro-
vém verdadeiramente de Deus" (cf. Uo 4,1), fez notar- ao lado de aspec
tos positivos - um conjunto de elementos fundamentáis, que devem ser
considerados negativos á luz da doutrina católica.

Além de evidenciar o carátersuspeito das modalidades com que acon-


tecem essas presumíveis revelagóes, é imperioso ressaltar alguns erros
doutrinais nelas contidos.

Entre outras coisas, com urna linguagem ambigua fala-se das Pes
soas da Santíssima Trindade, até confundir os específicos nomes e fun-
góes das Pessoas Divinas. Preanuncia-se nessas presumíveis revelagóes
um ¡mínente período de predominio do Anticristo no seio da Igreja. Profe
tizase em chave milenarista urna intervengéo resolutiva e gloriosa de Deus,
que estaría para instaurar sobre a térra, antes aínda da vinda definitiva de
Cristo, urna era de paz e de bem-estar universal. Anunciase, além disso,
o futuro próximo de urna Igreja que seria urna especie de comunidade
pancristé, em contraste com a doutrina católica.

O fato de nos escritos posteriores da Senhora Ryden os menciona


dos erros já nao aparecerem, é sinal de que as presumíveis "mensagens
celestes" sao apenas fruto de meditagóes privadas.

Além disso, a Senhora Ryden, participando habitualmente nos sa


cramentos da Igreja Católica, embora se/a greco-ortodoxa, suscita em di
versos ambientes da Igreja Católica nao pouca surpresa; parece pór-se
ácima de qualquerjurisdigáo eclesiástica e de todas as regras canónicas
e cria, de fato, urna desordem ecuménica, que irrita nao poucas autorida
des, ministros e fiéis da sua própria Igreja, colocándose fora da disciplina
eclesiástica da mesma.

Considerando que, nao obstante alguns aspectos positivos, o efeito


das atividades exercidas por Vassula Ryden é negativo, esta Congrega-
gao solicita a intervengao dos Bispos, a fím de que informem adequada-
mente os seus fiéis, e nao seja concedido nenhum espago no ámbito das

168
AS MENSAGENS DE VASSULA RYDEN 25

prúprías dioceses á difusáo das suas idéias. Convida, por fim, todos os
fiéis a nao consideraren! como sobrenaturais os escritos e as interven-
góes da Senhora Vassuia Ryden, e a conservarem a pureza da fé que o
Senhor confíou á Igreja.

Cidade do Vaticano, 6 de Outubro de 1995.

Eis a segunda Notificará o:

Cidade do Vaticano, 29 de novembro de 1996.

Hoje foi dado ao público o seguinte Comunicado da Congregagáo


para a Doutrina da Fé:

Chegaram á Congregagáo para a Doutrina da Fé diversas perguntas


relativas ao valor e á autoridade da Notificagao da mesma Congregagáo
datada de 6 de outubro de 1995 e publicada no jornal L'OSSERVATORE
ROMANO de 23/24 de outubro de 1995, pág.2; dizia respeito aos escritos
e as mensagens da Sra. Vassuia Ryden, atribuidos a presumidas revela-
góes e difundidos em ambientes católicos do mundo inteiro.

A este propósito a Congregagáo para a Doutrina da Fé queroferecer


as seguintes precisóes:

1) A Notificagao dirigida aos Pastores e aos fiéis da Igreja Católica


mantém todo o seu vigor. Foi aprovada pelas autoridades competentes e
será publicada no órgao oficial da Santa Sé ACTA APOSTOUCAE SEDIS,
com a assinatura do Prefeito e do Secretario da Congregagáo.

2) Com relagáo as noticias que alguns órgáos da imprensa difundi-


ram a respeito de urna interpretagao restritiva de tal Notificagao, interpre-
tagáo dada pelo Cardeal Prefeito numa conversa privada com um grupo
de pessoas as quais concedeu audiencia em Guadalajara (México) aos
10 de maio de 1996, o mesmo Cardeal Prefeito deseja esclarecer que

a) como ele mesmo afinvou, os fiéis nao devem considerar as men


sagens de Vassuia Ryden como revelagáo divina, mas apenas como me-
ditagóes pessoais dessa senhora;

b) em tais meditagóes, como já afirmava a Notificagao, juntamente


com aspectos positivos, existem elementos negativos do ponto de vista
da doutrina católica;

c) por conseguinte, os pastores e fiéis sao convidados, a propósito, a


um serio discernimento espiritual e a conservara pureza da fé, dos costu-
mes e da vida espiritual, sem se apoiar em presumidas revelagóes, mas
seguindo a Palavra de Deus revelada e as diretrizes do magisterio da
Igreja.

169
26 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 419/1997

No que concerne á difusao de textos das presumidas revelagóes pri


vadas, a Congregagáo para a Doutrína da Fé esclarece:

1) Nao é, de modo algum, válida a interpretagao dada por algumas


pessoas a urna Decisáo aprovada por Paulo VI em 14 de outubro de 1966
e promulgada em 15 de novembro do mesmo ano, em virtude da qual
(interpretagao) se poderíam difundir livremente, na Igreja, livros e mensa-
gens provenientes de presumidas revelagóes. Na verdade, aqueta Deci
sáo se referia á aboligáo do índex de Livros Proibidos e estipulava que,
eliminada a censura relativa, permanecía a obrigagáo moral de nao pro
pagar nem ler aqueles escritos que póem em perigo aféeos bons costu-
mes.

2) Nao obstante, para a difusao de textos de presumidas revelagóes


privadas, continua válida a norma do Código de Direito Canónico vigente,
canon 823, § 1o, que confere aos Pastores o direito de exigir que sejam
submetidos ao seu juízo, antes de sua publicagáo, os escritos dos fiéis
que tratam da fé e da Moral.

3) As presumidas revelagóes sobrenaturais e os escritos correspon


dentes estáo, em primeira instancia, sujeitos ao juízo do Bispo Diocesano
e, em casos particulares, ao da Conferencia dos Bispos e ao da Congre
gagao para a Doutrina da Fé.

Diante de tais textos da Congregacáo para a Doutrina da Fé, o fiel


católico nao hesita sobre o alvitre que Ihe compete tomar. A Igreja funda
da por Cristo e confiada a Pedro e seus sucessores tem a promessa da
assisténcia infalível de Cristo para que conserve incólume o patrimonio
da fé; cf. Mt 16,16-19; Le 22,31s; Jo 21,15-17;14,26; 16,13-15. A Sra.
Vassula merece respeito. As Declaragóes da Santa Sé visam aos escritos
que Vassula transmite nao somente ao povo ortodoxo (do qual ela é mem-
bro), mas também ao mundo católico, que, em conseqüéncia, se senté
perplexo. Era, pois, necessário que a Igreja, Máe e Mestra, dissesse a
respeito urna palavra de esclarecimento aos fiéis católicos.

PARA RESPONDER ÁS TESTEMUNHAS DE JEOVÁ


MUITO SE RECOMENDARA OS ESCRITOS DO PE. EGIONOR CU-
NHA INTITULADOS: "BÍBLIA, SANGUE E MEDICINA", "ESTÁ PRÓXI
MO O FIM DO MUNDO?", "IMAGENS E SANTOS", "INFERNO", "HO-
MENS DE SERIE 'B'", "A SANTÍSSIMA TRINDADE", "A SENHORA
CONTESTADA"... A ARGUMENTACÁO É SÓLIDA E DE FÁCIL LEITU-
RA. PEDIDOS Á EDITORA AVE-MARIA, RÚA MARTIM FRANCISCO,
656, 01226-000 SAO PAULO (SP).

170
Na Comunháo dos Santos:

QUE SIGNIFICA REZAR PELOS MORTOS?

Em síntese: Rezar pelos morios e, especialmente, celebrara S. Mis-


sa pelos morios nao é celebrara fé das pessoas falecidas nem é celebrar
a fé dos que ficaram neste mundo. É celebrar o misterio da fé, ou seja, o
sacrificio de Cristo perpetuado sobre os nossos altares e oferecido ao Pai
em favor de tal ou tal irmao ou irmá falecido(a). Mediante a S. Missa, a
Igreja pede ao Pai que faga que o amor a Deus existente na alma do(a)
falecido(a) seja corroborado para que extinga qualquer amor desregrado
ou qualquer resquicio de pecado que tenha ficado na alma do defunto. Este
se encontra em estado de purificagao, preparándose para ver Deus face-a-
face mediante o repudio radical de qualquer escoria de infidelidade.
* * *

Um jornal paroquial publicou em novembro pp. um artigo intitulado


"O que significa rezar pelos falecidos". O conteúdo da explanacáo é ambi
guo e suscitou hesitacáo em varios leitores. Daí a conveniencia de algu-
mas reflexoes sobre o assunto.

Eis os trechos mais significativos do artigo;

"A festa de todos os Santos e o dia dos Finados nos oferecem urna
ótima oportunidade para refletirmos sobre nossas atitudes para com nos-
sos falecidos. Mais concretamente, sobre o sentido das Missas de sétimo
dia, trigésimo dia e primeiro ano...

Redescubramos o sentido da Eucaristía oferecida pelos defuntos:


toda Missa é renovagáo do dom total de Jesús Cristo, que morreu por nos
e ressuscitou para a nossa salvagño. Oferecer a Missa por um irmáo que
faleceu é um ato com duplo sentido: celebragáo da fé que ele tinha e da fé
que nos temos. O fundamento do Cristianismo é a fé em Jesús Cristo
ressuscitado. 'Se Cristo nao ressuscitou, va é nossa fé...'

A Missa é um ato de fé na comunháo dos santos, isto é: quer viva


mos peregrinos nesta tena, querjá estejamos com Deus, fonvamos urna
só Comunidade de Batizados".

Passemos a um comentario.

1. QUE É A MISSA?

O autor do artigo afirma que a Missa é "renovagáo do dom total de


Jesús Cristo, que morreu por nos e ressuscitou para nossa salvagao".

171
28 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 419/1997

Ora aquí já se ¡mpóe urna observacáo: a Missa nao é propriamente a


renovacáo da entrega de Cristo ao Pai; a palavra "renovacáo" pode suge
rir a idéia de repeticáo - o que seria falso, visto que o sacrificio de Cristo
foi cabal e infinitamente meritorio; é irrepetível, de modo que mais ade-
quado é falar de "perpetuado" ou "re-apresentacao" do sacrificio de Cris
to sobre os nossos altares.

Outra observado - e esta mais grave - refere-se á afirmacáo de


que "a Missa é a celebracao da fé que a pessoa falecida tinha e a celebra-
cao da fé que nos temos". - Ora isto é falho ou falso. Na verdade, a Missa
nao é a celebragáo da fé das criaturas: a Missa é a re-apresentacáo do
sacrificio do Caivário, com a diferenca de que na Cruz Jesús se ofereceu
a sos ao Pai, ao passo que sobre os nossos altares Ele se oferece conos-
co ou com a sua Igreja ao Pai. Com outras palavras: a Missa nao é a
celebracáo da fé, mas é a celebragáo do misterio da fé por excelencia.
Jesús torna presente sobre os nossos altares a sua entrega ao Pai para
que nos entreguemos com Ele na qualidade de cooferentes e na qualida-
de de cooferecidos, participando do sacerdocio de Cristo e da condicáo
de Cristo como vítima ou hostia.

Perguntamos entáo:

2. POR QUE CELEBRAR A MISSA PELOS DEFUNTOS?

A resposta está associada á doutrina do purgatorio, que vai aquí bre


vemente recordada.

1) O amor a Deus, num cristáo, pode coexistir com tendencias des-


regradas e pecados leves (ao menos, semideliberados). Há, sim, em todo
individuo humano um lastro ¡nato de desordem: egoísmo, vaidade, amor
próprio, covardia, negligencia, moleza, infidelidade... acham-se táo inti
mamente arraigados no interior do homem que chegam por vezes a acom-
panhar as suas mais serias tentativas de se elevar a Deus e dar a Deus o
lugar primacial que Ihe toca. A psicología das profundidades ensina que
essas tendencias nem sempre sao conscientes, mas muitas vezes atuam
no nosso subconsciente ou inconsciente.

2) Mais: todo pecado (principalmente quando grave, mas também a


falta leve) deixa na alma um resquicio de si ou urna inclinacáo má (meta
fóricamente:... deixa urna cicatriz, deixa um pouco de ferrugem na alma,
dificultando-lhe a prática do bem). Com efeito; o pecado implica sempre
urna desordem. Quando, após o pecado (grave ou leve), a pessoa se
arrepende e pede perdáo a Deus, o Pai do céu perdoa (o Senhor nunca
rejeita a contrica o sincera). Mas o amor do pecador arrependido, por mais
genuino e leal que seja, pode nao ser suficiente para extinguir todo res
quicio de amor desregrado, egoísta, existente na alma. Em conseqüén-

172
QUE SIGNIFICA REZAR PELOS MORTOS? 29

cia, o pecador arrependido recebe o perdáo do seu pecado, mas ainda


deve libertar-se da desordem deixada pelo pecado em sua alma; quantas
vezes se verifica que, mesmo após urna confissao sincera e contrita, o
cristao recaí ñas faltas de que se arrependeu! Isto se deve ao fato de que
ficou no seu íntimo a raiz ou o principio do pecado. Figuradamente, póde
se dizer que o cristao arranca a folha e o caule da tiririca, mas difícilmente
arranca também o caroco ou a raiz da tiririca; esta se manifesta dentro em
pouco, através de novos pecados. Para extirpar o principio do pecado
remanescente, o cristao deve excitar e exercitar mais intensamente o amor
a Deus. Ora este estímulo do amor a Deus se realiza mediante a satisfa-
gáo ou atos de penitencia que despertem e fortalecam o amor a Deus no
íntimo do cristao.

Notemos bem: a satisfacáo assim entendida nao deve ser compara


da a urna multa mais ou menos arbitraria imposta por Deus ou a um cas
tigo vingativo; é, antes, um auxilio medicinal; é também urna exigencia do
amor do cristao a Deus, amor que, estando debilitado, pode ser corrobo
rado e purificado.

3) Digamos agora que um cristao morre com o seu amor voltado


para Deus, mas ainda portador de contradicdes ou incoeréncias: ama a
Deus, mas caí em impaciencia, maledicencia, omissóes... O Senhor Deus
nao há de o rejeitar, porque ele nao opóe um obstáculo decisivo ao amor de
Deus, mas também é de notar que esse cristao nao poderá ver Deus face-a-
face como acontece aos cristáos purificados de todo resquicio de pecado.
Deus é tres vezes santo: por isto nao pode subsistir diante dele nenhuma
sombra de pecado. Por conseguinte, a misericordia divina concede a essa
alma a graca de se purificar depois da morte: nao se trata de conversáo do
pecado mortal para a vida da graga, mas trata-se de eliminar o apego ao
"pecadinho", que é sempre pecado ou deficiencia. Essa purificacáo nao se
faz pelo fogo, mas faz-se pela ¡ntensificacáo do amor a Deus; este, tor-
nando-se mais intenso ou mais forte, apaga os resquicios do pecado exis
tentes na alma. Tal é o processo que se realiza no purgatorio postumo.

Os cristáos peregrinos na térra podem ajudar seus irmáos falecidos


que estejam no purgatorio, mediante oracoes ou sufragios: pedem a Deus
que fortalega o amor das almas do purgatorio para que apague toda som
bra de tendencias desregradas e Ihes permita entrar quanto antes na vi-
sáo de Deus face-a-face.

Ora a S. Missa é o melhor meio de sufragar as almas do purgatorio.


Oferecemos a Deus o sacrificio de Cristo perpetuado sobre os nossos
altares para que o Pai conceda a essas almas a graga necessária para
vencerem as resistencias do pecado ou do "pecadinho"... Sabemos por
experiencia como é difícil a cada um de nos vencer certos impulsos

173
30 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 419/1997

desordenados que nos humilham, que nos repudiamos, mas que se acham
táo arraigados em nosso íntimo que difícilmente os eliminamos. Tenha-
mos em vista os movimentos de impaciencia que nao queremos alimen
tar, mas que se antecipam á nossa deliberagáo e nos fazem sofrer porque
nos desfiguram... Pois bem: essas coisas desregradas tém que desapa
recer por completo para que possamos ver Deus face-a-face.

A purificacáo da alma ou a extirpacáo dos resquicios do pecado há


de ser normalmente realizada na vida presente, de modo que, terminada
a caminhada terrestre, a alma do cristáo possa ¡mediatamente gozar da
visáo de Deus face-a-face. Caso, porém, nao ocorra nesta vida a elimina-
cáo dos resquicios do pecado, a misericordia divina concede ao cristáo a
graca do purgatorio postumo. Este nao é um lugar, mas um estado no
qual o amor a Deus existente na alma do falecido toma posse, por com
pleto, dessa alma livrando-a de qualquer apego ao pecado.

3. NOCÓES COMPLEMENTARES

1. Notemos a propósito que a comunicacáo de bens espirituais entre os


fiéis nao conhece classes nem privilegios; todos os bens espirituais da Igreja
circulam entre todos os membros desta. Por isto nao é adequada a expres-
sáo "as almas mais abandonadas no purgatorio"; nao há alma abandonada.

Mais explícitamente: nao se deve imaginar o purgatorio como se fos-


se um cárcere onde se encontrem prisioneros de origens diversas; os
que tém familia numerosa e rica, ai recebem mais visitas e presentes, ou
seja, passam melhor do que aqueles que pertencem a familias pobres ou
negligentes; poderáo sair da prisáo mais cedo do que os seus compa-
nheiros indigentes. Evitemos transpor tal imagem, com suas categorías e
classes, para o além-túmulo. O purgatorio, de certo modo, transcende os
conceitos que adquirimos neste mundo; pertence aos sabios e misterio
sos designios salvíficos de Deus, a respeito dos quais a Revelacáo Divina
é sobria. Por isto nao devemos crer que urna alma do purgatorio pela qual
ninguém reza - ou porque nao tem familiares na térra ou porque só tem
familiares incrédulos ou pobres -, é "urna alma abandonada"; na verdade,
ela está envolvida pela infinita misericordia de Deus, á qual a Igreja sempre
eleva suas preces em favor de todos os que carecem (doentes, moribundos,
viajantes, enancas que morrem sem o Batismo, almas do purgatorio...).

Assim vemos como é infundada a alegacáo seguinte: "As almas de


familias pobres que nao tém dinheiro para mandar celebrar Missas, so-
frem mais, e mais tempo, no purgatorio, do que as almas dos ricos! O
dinheiro é decisivo até no purgatorio!"

Nao creíamos que essas regras de lógica terrestre e comercial se-


jam observadas também por Deus. O Senhor seria mesquinho se aten-

174
QUE SIGNIFICA REZAR PELOS MORTOS? 311

desse menos solícitamente aos interesses daqueles que menos dinheiro


tém; heranca monetaria nao significa primazia para alguém diante de Deus.
Jamáis poderemos esquecer que a graca e a misericordia de Deus tém o
primado sobre as obras dos homens. As almas dos pobres, por conse-
guinte, sao amadas por Deus como todas as demais.

Acontece, porém, que entre nos e as almas do purgatorio há o dever


de sufragar... e de sufragar segundo determinada ordem: impóem-se á
nossa caridade primeiramente aqueles que nos estáo mais próximos (pa-
rentes, amigos, colaboradores, benfeitores...). A uma familia crista toca o
dever de sufragar as almas, a comecar pelos membros defuntos dessa
familia.

2. É oportuno observar que nao se pode oferecer a Comunhao


Eucarística como tal nem pelos vivos nem pelos defuntos; a Comunhao,
enquanto sacramento, age apenas sobre o cristáo a quem é dada; nin-
guém pode receber os sacramentos pelos outros. Todavía, na medida em
que é obra boa e meritoria, a S. Comunhao pode ser oferecida por vivos e
defuntos (o mérito que adquiro ao comungar fervorosamente, posso
oferecé-lo em favor de meus irmáos)...

Também tém valor de sufragio as oracóes particulares e comunitari


as dos fiéis, a paciencia ñas provacóes de cada día, os sacrificios genero
samente empreendidos por amor a Deus e ao próximo. Ás obras boas,
principalmente ás que sao praticadas com fervor, correspondem méritos
preciosos, que podem ser aplicados em prol dos defuntos.

3. Notemos aínda que nao nos é possível avaliar a duragáo do pur


gatorio, pois este nao está submetido ao sistema de anos e días que na
térra observamos, considerando os movímentos dos astros. No purgato
rio a duracao é representada pelos atos espirituais (atos de conhecimen-
to e amor) que as almas praticam. Cada um destes atos é uma unidade
de duracáo ou um instante espiritual, e cada qual desses instantes pode
corresponder a vinte, trinta ou sessenta horas do nosso tempo (como
uma pessoa pode permanecer horas continuas absorvida por um único
pensamento); os atos sucessivos dos espiritas constituem a serie de ins
tantes espirituais chamada "evo" ou "eviternidade". Ora, já que nao se vé
qual a proporcáo vigente entre o tempo solar e o evo dos espíritos, torna
se impossível avaliar a duracáo do purgatorio para alguma alma. Cada
qual traz em si afetos desregrados, que estáo arraigados com maior ou
menor profundidade, e assim opóem resistencia ao amor de Deus, que
quer penetrar até o íntimo da alma.

Os sufragios podem ter efeíto retroativo: aplicam-se aos fiéis na medi


da em que deles necessitem. Se alguém reza por uma alma que já se acha
na gloria do céu, as suas preces beneficiaráo quem ainda precise délas.

175
Poucos conhecem as minucias:

COMO SE TRANSMITE A VIDA HUMANA?

Em síntese: O Dr. Joño Evangelista dos Santos Alves descneve mi


nuciosamente o processo pelo qual se transmite a vida humana. Aponta a
agao dos cromossomos e o subseqüente desenvolvimento do concepto
até a plena confíguracao no útero materno.

O Dr. Joáo Evangelista dos Santos Alves, médico ginecologista e


mastologista (CRM 5201135-7) escreveu um livro intitulado "Considera-
coes em torno da Sexualidade Humana e Integridade na Transmissáo da
Vida". De tal obra, ainda nao editada, o ilustre autor permitiu a PR a publi-
cacáo de capítulos seletos. Recebendo com gratidáo tal autorizado, a
nossa revista tenciona publicar em cinco de seus números (a partir do
presente) as seccóes que mais precisóes de ordem médico-profissional
apresentam, pois a fundamentacáo científica é muitas vezes breve de-
mais ñas consideracóes filosóficas e éticas relativas á origem da vida
humana. A ordem de publicacáo será a seguinte: 1) O processo de forma-
cáo do embriáo; 2) O aborto; 3) Os métodos anticoncepcionais; 4) Os
métodos naturais; 5) A fecundacáo artificial. A leitura e o entendimento de
cada seccáo seráo independentes das outras seccóes.

Ao Dr. Joáo Evangelista dos Santos Alves seja registrado o vivo agra-
decimento de PR por táo valiosa colaboracáo.

1. O INÍCIO DA VIDA HUMANA

Sabemos que todas as células do organismo trabalham para a ma-


nutencáo da saúde e da integridade do próprio corpo a que pertencem,
mas nao assim as células reprodutoras - espermatozoides (gametas
masculinos) e óvulos (gametas femininos) -, - as quais se destinam á
transmissáo da vida, á perpetuacáo da especie.

As células reprodutoras se diferenciam das demais células do orga


nismo nao apenas pelo fim a que se destinam, mas também pela sua
constituigáo cromossomial.

Como sabemos, os cromossomos - pequeníssimas partículas pre


sentes no núcleo das células - contém ¡menso número de partículas infi-

176
COMO SE TRANSMITE A VIDA HUMANA? 33

nitesimais chamadas "genes", as quais sao responsáveis pela transmis-


sáo dos caracteres hereditarios.

Os cromossomos caracterizam as diferentes especies de seres vi


vos. Na especie humana, todas as células somáticas apresentam 46 cro
mossomos (23 pares de cromossomos), sendo um par característico do
sexo, denominado XX para o sexo feminino e XY para o sexo masculino.

Ao contrario das demais células do organismo, as células reprodu-


toras, ao amadurecerem, perdem, cada urna, a metade dos cromossomos:
os pares de cromossomos se separam, ficando cada componente do par
em urna célula diferente. Desse modo, cada célula reprodutora madura
fica com apenas 23 cromossomos ¡solados (nao em pares). Também os
componentes do par de cromossomos sexuais se separam, de modo que
cada célula reprodutora feminina madura (o óvulo) contém um cromossomo
X, enquanto que a célula reprodutora masculina (o espermatozoide) con
tém também um cromossomo sexual, que pode ser o X ou o Y.

Quando urna célula reprodutora completa o seu desenvolvimento,


apresentando metade do número de cromossomos próprio da especie
humana, encontra-se em condicóes de se unir, de se fusionar á célula
reprodutora madura do sexo oposto, também com o número de cromos-
somos reduzido á metade. Se isso acontece, as duas células reprodutoras
maduras somam os seus cromossomos, e reconstituem os 23 pares pró-
prios da especie. Transformam-se assim na célula mais imatura que exis
te, com número completo de cromossomos (46 = 23 pares), mas que na
realidade nao é apenas urna simples célula; é um novo ser humano, que
surge com todas as suas características biológicas específicas e individu
áis genéticamente determinadas.

Nao pretendemos entrar em consideracoes filosóficas em torno da


conceituacáo ou definicao de vida humana. Todavia, podemos dizer que
a ciencia nos informa onde e quando se inicia o ciclo de urna nova vida. É
fato científicamente comprovado e amplamente difundido que a fecunda-
cáo do óvulo pelo espermatozoide, que normalmente ocorre na trompa1,
é o estágio em que comeca o ciclo de urna nova vida humana. É o inicio
de um processo vital que só terminará com a morte. Assim, o novo ser
humano evolui segundo um plano inexorável até a plenitude do desenvol
vimento de todo o organismo, cujas características já estavam contidas
nos cromossomos da célula única inicial. Com a fusao dos gametas cons-
titui-se urna unidade bem estruturada que, pela transmissáo dos caracteres
hereditarios paternos e maternos, tem suas características futuras essen-
ciais bem determinadas: sexo, grupo sanguíneo, fator Rh, cor dos olhos,

1 Trompa ou Tuba (Trompa de Falópio) é um tubo sinuoso e flexivel situado a cada la


do do útero, por onde os espermatozoides penetram em busca do óvulo para fecundá-lo.

177
34 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 419/1997

da pele, dos cábelos, certas doencas hereditarias, a idade em que deve-


ráo surgir as primeiras rugas, etc., e até mesmo o porte, tragos psicológi
cos, de temperamento, etc. Ali está escondido também o que, de certa
forma, se tornará a base da inteligencia e até mesmo da personalidade.
Tanto assim é que - sabem muito bem os psicólogos - profundos distur
bios da personalidade podem ter origem remota, no período pré-natal.
Assim o novo ser formado com o padrao cromossómico humano é um ser
vivo. Agora perguntamos: é coelho? é gato? Que especie de ser vivo é?
Nao há dúvida de que se trata de um ser vivo humano. É o que continuará
a ser sempre: a mesma pessoa com toda a sua individualidade própria. É
a ciencia moderna que assim o demonstra. Querer negar esse fato é fa-
zer vistas grossas e ouvidos surdos a importantes descobertas científi
cas. Há unidade e continuidade no desenvolvimento do novo ser, embora
ocorram profundas modificacóes, porém todas acidentais, alterando-lhe
0 formato, o volume, etc., mas sem que naja mudanca substancial, espe
cífica, pois é sempre o mesmo ser que, desenvolvendo-se, passa por
todas as fases genéticamente determinadas na célula inicial. Para que o
homem chegue as fases de recém-nascido, infancia, adolescencia, matu-
ridade, velhice, é necessário que também passe pelas fases de formacáo
no ventre materno, que comega na trompa, com a fecundacáo do óvulo pelo
espermatozoide, e evolui até o parto. Sao, todas, etapas da mesma vida.

2. EVOLUQÁO DO NASCITURO

Entende-se por concepto o ser humano no período da vida que vai


desde o seu inicio, na concepcao, até o nascimento; assim também o
termo nascituro ("aquele que há de nascer; gerado, mas ainda nao nas-
cido")1; usa-se o termo embriao para designar o concepto durante as pri
meiras semanas de vida, reservando-se o termo feto para designá-lo no
período subseqüente. As designacóes de mórula2 e blastocisto3 refe-
rem-se a fases iniciáis do embriáo, e a palavra ovo4 identifica os primei-
ros estágios de vida, a partir da célula inicial resultante da fusáo dos
gametas (fecundacáo = concepcáo).

1o a 2o dias - A concepgáo ocorre na ampola tubária. Um novo ser


humano - fruto da uniao de gametas humanos - inicia sua vida. Desde o
momento da concepgáo, ainda sem nome, escondido no ventre materno,

1 Pequeño Dicionário Brasileiro da Lingua Portuguesa, H. DE LIMA BARRETO,


Ed. Civilizado Brasileira S/A.
2 Mórula designa a fase inicial da vida embrionaria, em que o volume celular constituí
urna massa sólida de células agrupadas, tomando aspecto semelhante ao da amora.
3 Blastocisto ou blástula designa a fase de desenvolvimento do embriao caracteriza
da pelo aparecimento de urna vesícula no interior da mórula.
4 Ovo ou zigoto designa o óvulo fecundado pelo espermatozoide.

178
COMO SE TRANSMITE A VIDA HUMANA? 35

está personalizado: é o filho de Eduardo e Isabel, com sua individualida-


de própria e irrepetível bem caracterizada. Nunca existiu, nem jamáis exis
tirá, outro ser humano igual. "É detentore executorde seu própño progra
ma genético". Decorridas algumas horas após a fecundacáo, ocorre a
primeira divisáo celular. Segue-se urna serie de outras divisoes, aumen
tando o número de células: é o novo ser humano em pleno desenvolvi-
mento. Após certo número de divisoes celulares, o concepto atinge a fase
denominada mórula. Entrementes está sendo levado através da trompa
em diregáo ao útero.

3o a 4o dias - O embriáo, sob a forma chamada mórula, com 12 a 16


células, chega á cavidade uterina. Forma-se urna cavidade no interior da
mórula, passando o concepto a denomiar-se blastocisto. Já ñas células
da mórula existe certa especificidade, de modo que as mais internas fi-
cam situadas em um polo do blastocisto (o embrioblasto, que dá origem
aos tecidos do embriáo) e as células externas achatam-se e formam a
parede do blastocisto (o trofoblasto1, que se converterá na placenta).

6o a 7o dias - Inicia-se a nidacáo, ou seja, a implantacáo do concepto,


sob a forma de blastocisto, na mucosa uterina (endométrio), previamente
preparada para recebé-lo.

12° dia - Inicia-se a diferenciacjáo dos tecidos embrionarios.

15° a 17° dias - Inicia-se a hematopoiese2 e a formacáo de vasos


sanguíneos.

18° a 21° dias - O coracáo comeca a pulsar.

1o mes e meio - É possível fazer eletroencefalograma. A crianca já é


capaz de realizar movimentos rudimentares, embora a máe ainda nao os
perceba.

2o mes - Todos os sistemas orgánicos estáo praticamente formados.


É possível fazer um eletrocardiograma e pode-se ouvir as batidas de seu
n coracáo com instrumentos de precisáo.

\ 3o mes - Todos os sistemas orgánicos estáo aptos a funcionar. A >


J crianca já é capaz de deglutir líquido amniótico3, de realizar movimentos \
) respiratorios e de urinar também. Possui até impressóes digitais e já seria y

j ' Trofoblasto é o tecido que constituí o ovo dos mamíferos e dá origem aos anexos
v fetais, inclusive a placenta.
2 Hematopoiese é a formagáo do sangue.
3 Amniótico - referente a ámnio - a mais interna das membranas fetais, que forma
urna bolsa cheia de liquido (liquido amniótico), para protegáo do concepto. A rotura da
"bolsa d'água" (porgáo da membrana que está relacionada ao orificio cervical) dá sa-
ída ao liquido amniótico, no inicio do trabalho de parto.

179
36 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 419/1997

possível tirar sua carteira de identidade... Quando sua máe dorme, ela
tambétn dorme, e acorda quando ouve ruido forte do exterior ou quando
sua máe realiza movimentos bruscos. Daí por diante, as únicas mudan-
gas básicas seráo o crescimento e o aperfeicoamento do que já está for
mado.

A propósito da vida humana na fase intra-uterina, o Dr. William A.


Liley, chamado o "Pai da Fetologia", que aperfeicoou a transfusáo de san-
gue no feto, escreveu o seguinte (citado por Wilke):

"O novo individuo comanda o seu ambiente e o seu destino com te-
nacidade de propósito; implantase na parede esponjosa do útero e, numa
demonstragao de vigor fisiológico, interrompe a menstruagao da máe.
Aquele vai ser a sua casa durante os duzentos e setenta dias seguintes.
Para tomá-la habitável, o embríao desenvolve uma placenta e um envoltorio
protetor com líquido (amniótico). Ele resolve sozinho o problema de sua
conformagao e faz o arranjo extraordinario de sua convivencia com a máe,
durante nove meses, embora sejam um e outro imunologicamente dife
rentes, de tal forma que nao poderíam receber um enxerto de pele, nem
transfusáo de sangue um do outro. Apesar de tudo, toleram-se mutua
mente em uniáo de vida de nove meses. Sabemos que o feto está sempre
se movimentando naquele liquido e sua posigáo depende de como ele se
senté mais confortável. Senté dor, pressao extema, frío e percebe o som
e a luz. O feto também bebe o líquido amniótico, e mais aínda se for artifi
cialmente adogado, e menos se o gosto for desagradável. Ele soluga e
chupa o dedo. O feto dorme e acorda. Ás vezes, também fica enfadado,
quando tudo está do mesmo jeito, mas pode serensinado a ficar atento a
um sinal diferente. Enfim, ele mesmo é quem determina o dia em que vai
nascer, porque, sem sombra de dúvida, o comego do parto é uma decisao
unilateral do feto. Tal é, pois, o feto que nos conhecemos e que nóspróprí-
os fomos um dia. É o feto de que cuidamos na Obstetricia moderna, e que
vem a ser o mesmo bebé do qual cuidamos antes e depois do nascimen-
to, o qual pode ficar doente antes de nascer, exigindo diagnóstico e trata-
mento como qualquer outro paciente".*

No próximo número de PR publicaremos um estudo sobre Aborto,


da autoría do mesmo Dr. Joáo Evangelista dos Santos Alves.

CONHECA MELHOR A IGREJA MEDIANTE O CURSO DE ECLE-


SIOLOGIA POR CORRESPONDENCIA DA ESCOLA "MATER ECCLE-
SIAE" - CAIXA POSTAL 1362, 20001-970 RIO DE JANEIRO (RJ).
TELEFAX: (021) 242-4552.

1 WILKE. J.C., O Aborto, 2a edifáo, pág. 36, 1988, Edigóes Paulinas.

180
Pergunta Popular:

O HOMEM É DESCENDENTE DO MACACO?

Em síntese: O ser humano é um composto de corpo material e alma


espiritual. A alma, nao sendo materia, nao veto (nem vem) da materia
preexistente posta em evolugáo. O corpo, sendo material, pode terorigem
na materia viva preexistente, nao, porém, na materia dos macacos atuais
(orangutango, chimpanzé, gorila), pois estes sao especializados ao extre
mo. O corpo humano pode terorigem num tronco primitivo, dito "primata",
do qual teráo procedido os macacos e o corpo organizado ao qual Deus
infundiu a alma espiritual, dando inicio ao primeiro ser humano; desta
maneira se pode aceitar a hipótese evolucionista; o corpo humano seria
primo dos macacos modernos, mas o homem, como tal, seria de urna
dignidade muito superior, porque animado por urna alma espiritual. Esta
doutrina é reconhecida pela Igreja, em nome da qual tém falado Pió XII e
Joáo Paulo II. O darwinismo fot condenado no sáculo passado, porque
admitía urna evolugáo mecanicista, devida simplesmente a luta pela vida.
A S. Escritura nao se opóe a quanto está dito, porque nao tenciona ensi-
nar ciencias naturais; a imagem do Deus-Oleiro era muito freqüente na
antigüidade.
* * *

Pergunta-se em linguagem popular se, afinal de contas, o homem


descende do macaco ou é primo do macaco. A questáo é provocada pe
los freqüentes debates sobre evolugáo, que deixam o público inseguro,
visto que nao raro faltam claras nocoes filosóficas. Eis por que passamos
a considerar o assunto.

1. HOMEM: COMPOSTO DE CORPO E ALMA

Nao se pode responder adequadamente á pergunta se nao se ob


serva a distingáo entre os dois componentes do ser humano, que sao o
corpo e a alma. Na verdade, o homem nao é um bloco monolítico, mas a
unidade do homem provém de que os seus dois componentes (corpo
material e alma espiritual) se unem entre si como materia e forma no
sentido aristotélico-tomista. A alma é o principio vital que vivifica a mate
ria, e faz que o calcio, o ferro, o magnesio, o potássio e os demais ele
mentos químicos do organismo humano funcionem nao isoladamente,
mas como integrantes de um conjunto harmonioso e unitario, que se cha
ma "o ser humano".

181
38_ "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 419/1997

Visto que o corpo é materia e a alma é espirito, cada qual destes dois
componentes tem sua origem própria.

1.1. Origem da Alma Humana

Sendo espiritual, a alma humana nao provém da materia em evolu


cáo, pois o espirito nao é éter nem gas nem energía elétrica, mas é um
ser totalmente incorpóreo (nao redutível a números ou nao "matema-
tizável"), dotado de inteligencia e vontade. Por conseguinte, a alma hu
mana é criada diretamente por Deus e infundida ao óvulo fecundado pelo
espermatozoide, dando assim origem a um embriáo ou um novo ser hu
mano. Até nossos días a alma humana é criada diretamente por Deus
todas as vezes que se dá a fecundacáo de um óvulo.

1.2. Origem do Corpo Humano

Se o corpo humano é materia, nada impede que se admita a origem


do mesmo a partir da materia viva preexistente. Assim falando, o filósofo
nao professa necessariamente o evolucionismo ou o fato da evolucáo,
mas professa a legitimidade ou racionalidade (a possibilidade lógica) da
evolucáo da materia viva. Toca á ciencia, mediante suas pesquisas
paleontológicas, precisar a resposta, afirmando ou nao o fato e, eventual-
mente, as modalidades da evolucáo.

Dado, porém, que o corpo humano venha da materia viva preexistente,


nao se pode dizer que vem ou procede do macaco tal como hoje o conhe-
cemos (orangutango, chimpanzé, gorila), pois este tipo de viventes está
de tal modo especializado que nao evolui mais1. O corpo humano viria
entao de um tronco mais primitivo dito "o primata", do qual teriam procedi
do os macacos mais aperfeicoados e o corpo organizado, apto a ser sede
da vida humana. A este corpo organizado o Criador terá infundido a alma
humana, especialmente criada para tal corpo, dando assim origem a um
vívente específicamente diverso dos macacos, pois dotado de alma (prin
cipio vital) espiritual, á diferenca dos macacos, cujo principio vital (alma
vegetativa e sensitiva) é material; há, pois, o salto da vida do macaco para
a vida do ser humano; o principio vital do primata terá desaparecido quan-
do Deus Ihe terá infundido a alma humana. Desta maneira há de ser enten
dida a expressáo "o homem é primo do macaco", nao descendente do ma
caco; note-se bem, alias, que nao se trata do homem como tal, mas apenas
do corpo humano, sendo ainda que tal corpo animado por urna alma espiri
tual pertence a urna categoría de viventes muito superior á dos macacos.
1 A evolugáo nao é um processo indefinido; ela chega ao seu climax; após o qué,
declina. É o que se dá, porexemplo, com os chifres dos animáis irracionais: até certo
ponto, sao instrumento valioso de defesa; quando, porém, excedem determinadas
dimensóes, tomam-se trambolho mortífero. Algo de semelhante ocorre com a cauda:
até certo tamanho é útil; ultrapassadas essas dimensóes, vem a ser um peso mortb.

182
O HOMEM É DESCENDENTE DO MACACO? 39

2. O PENSAMIENTO DA IGREJA

A doutrina atrás exposta está contida nos ensinamentos da Igreja. A


propósito pronunc¡ou-se o Papa Pío XII em sua encíclica Humani Generis
datada de 12/08/1950:

«O Magisterio da Igreja nao proíbe que, em conformidade com o atu-


al estado das ciencias e da teología, seja objeto de pesquisas e de dis-
cussóes, por parte dos competentes em ambos os campos, a doutrina do
evolucionismo, enquanto e/a investiga a orígem do corpo humano, que
proviña de materia orgánica preexistente (a fé católica nos obriga a pro-
fessar que as almas sao criadas ¡mediatamente por Deus). Isto, porém,
deve serfeito de tal maneira que as razóes das duas opinióes, ¡sto é, da
que é favorável e da que é contraría ao evolucionismo, sejam ponderadas
e julgadas com a necessáría seriedade, moderagao, justa medida e
contanto que todos estejam dispostos a se sujeitarem aojuízo da Igreja, á
qual Crísto confiou o oficio de interpretar auténticamente a S. Escritura e
de defender os dogmas da fé. Alguns, porém, ultrapassam temeraria
mente esta liberdade de discussáo, procedendo como se estivessejá de
monstrado com certeza plena que o corpo humano se tenha originado de
materia orgánica preexistente, argumentando com certos indicios encon
trados até agora e com raciocinios baseados sobre tais indicios; e isto
como se ñas fontes da Revelagáo nao existisse nada que exija neste as-
sunto a maior moderagao e cautela.»

O S. Padre Joáo Paulo II em mensagem dirigida á Pontificia Acade


mia das Ciencias, datada de 22/10/1996, escrevia:

«Pió XII sublinhou este ponto essencial: se o corpo humano tem a


sua origem da materia viva que Ihe preexiste, a alma espiritual é ¡mediata
mente criada por Deus ('anima enim a Deo immediate creari catholica
fides nos retiñere iubef, Ene. Humani generis, AAS 42 [1950], pág. 575).

Como conseqüéncia, as teorías da evolugao que, em fungáo das filo


sofías que as inspiram, consideram o espirito como emergente das forgas
da materia viva ou como um simples epifenómeno desta materia, sao in-
compatíveis com a verdade sobre o homem. Elas sao poroutro lado inca-
pazes de fundar a dignidade da pessoa.

Com o homem, encontramo-nos entáo diante duma diferenga de or-


dem ontológica, diante dum salto ontológico, poder-se-ia dizer. Mas supor
urna tal descontinuidade ontológica, nao é ir ao encontró desta continui-
dade física que parece ser como o fio condutor das pesquisas sobre a
evolugao, e isto a partir do plano da física e da química? A consideragáo
do método utilizado ñas diversas ordens do saberpermite harmonizar dois
pontos de vista, que pareceriam inconciliáveis. As ciencias da observa-
gao descrevem e medem, de modo cada vez mais preciso, as múltiplas

183
40 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 419/1997

man/festacoes da vida e inscrevem-nas na Iinha do tempo. O momento da


passagem para o espiritual nao é objeto duma observagao deste tipo, que
nao pode nem sequer manifestar, a nivel experimental, urna serie de si-
nais muito preciosos da especificidade do ser humano. Mas a experiencia
do saber metafisico, da consciéncia de si e da sua reflexividade, a da
consciéncia moral, a da liberdade, ou aínda a experiencia estética e reli
giosa, sao da competencia da análise e da neflexáo filosófica, ainda que a
teología esclarega o seu sentido último segundo os desígnbs do Criador».

Como se vé, o Papa Joáo Paulo II retoma e abona a posicáo de Pió


XII, levando-a um pouco mais adiante, pois afirma que "a teoría da evolu
cáo é mais do que urna hipótese"; visto o grande número de dados
empíricos (fósseis, testemunhos da Genética e da Biología), o Papa ad
mite a grande probabilidade da evolucáo. Esta atitude de Joáo Paulo II
(que, como se vé, nao canonizou nem dogmatizou a evolucáo) causou
especie ao grande público; pelo qué exige elucidagáo:

1) ao se pronunciar de tal maneira, Joáo Paulo II nao falou como


Mestre da fé nem tencionou formular um dogma, mas, como estudioso e
em seu nome pessoal, diz aceitar a verossimilhanca da teoría evolucionista.
Se algum fiel católico nao concorda com tal teoría, nao está ferindo o
Credo; tenha a liberdade de pensar como queíra;

2) a Igreja combateu o evolucionismo proposto por Charles Darwin


de modo que, ao aceitar hoje a teoría da evolucáo, parece cair em contra-
dicáo.... - A contradícáo é apenas aparente: a Igreja opós-se ao darwinis-
mo por ser urna doutrina mecanicísta, ateleológica; afirma a evolucáo na
base da "luta pela vida (struggle for I ¡fe)": as especies mais fortes teráo
subsistido nesse embate, ao passo que as mais iracas teráo perecido.
Ora tal teoría contrariava os dados da fé; esta admite um Deus Criador
Providente, que concebeu o universo e o ser humano segundo a sua sa-
bedoria ou segundo modelos e metas a realizar. Com o decorrer do tem
po, porém, o primeiro impacto causado pelo darwínismo foi-se amainan
do...; os teólogos abriram os olhos para os dados cada vez mais eviden
tes da evolucáo e perceberam que poderíam distinguir entre os elemen
tos empíricos e a interpretado filosófica materialista que Darwin Ihes dava;
assumiram os resultados da paleontología, e os ¡nterpretaram em chave
finalista, ou seja, á luz da Providencia Divina, que tem seu plano a respei-
to do mundo e do homem; se a evolucáo ocorreu (diga-o a ciencia, defi-
nindo tanto o fato quanto as modalidades do mesmo), ocorreu segundo
intencóes predefinidas pelo Criador, e nao ao acaso nem por efeíto da
forca bruta. O que a Igreja rejeitou, e rejeíta, no darwinismo, é a sua pers
pectiva materialista, que dispensa a Sabedoria Divina. A evolucáo torna
se assim aceitável... aceítável na proporgáo dos argumentos concretos,
de ordem experimental, que a possam fundamentar. Dizemos aceitável
(podendo ser aceita), e nao "definida como dogma de fé".

184
O HOMEM É DESCENDENTE DO MACACO?

O que a Igreja propoe como absolutamente certo no tocante á ori-


gem do mundo e do homem, sao dois pontos básicos:
a) Criacáo da materia inicial, em sua forma primitiva, como os den
tistas a concebem ao falar do big bang ou de teorías semelhantes. A
materia nao é eterna, mas criada por Deus. - Este Ihe poderá ter dado as
leis da sua evolucáo, que a foram organizando ou complexificando atra-
vés dos reinos mineral, vegetal e animal irracional.
b) Quando a materia atingiu o grau de evolucao correspondente ao
do organismo humano, o Senhor Deus terá criado a alma espiritual
para esse organismo, dando origem ao ser humano.

A concepcáo católica, portanto, inspirada pela sá razao e pela fé,


exige dois atos criadores de Deus: o primeiro para dar origem á materia
primitiva, donde terá procedido a evolucao; e o segundo, para dar origem
ao espirito, ou seja, as almas1 dos primeiros seres humanos e dos seus
descendentes.

Levanta-se, porém, urna dúvida:

3. E A PALAVRA DA BÍBLIA?

Em Gn 2,7 está dito que Deus formou o corpo do homem a partir do


barro - o que parece excluir o conceito de evolucio.

A propósito, porém, deve-se observar:

1) a S. Escritura nao foi redigida para ensinar ao homem ciencias


naturais. Ela tem em vista expor ao homem o sentido e o valor das criatu
ras que as ciencias exploram e descrevem. Esta verdade tornou-se evi
dente em conseqüéncia do caso Galileu (séc. XVII), de modo que ne-
nhum exegeta a póe em dúvida nos nossos dias.

2) A imagem do Deus-Oleiro era muito freqüente na antigüidade pré-


cristá, visto que, para um povo primitivo, o oleiro é um "pequeño Deus".
Com efeito; a populacáo depende dele para obter seus jarros, pratos e
tigelas; ademáis trabalha com agilidade e presteza que o tornam figura
venerável. É o que atesta o exegeta G. Lambert, no artigo L'Encyclique
Humani Generís et l'Ecriture Sainte, em Nouvelle Revue Théologique
73(1951)234:

"Nao se pode perder de vista a importancia da cerámica ñas civiliza-


góes antigás e prímitivas e quanto a profissao do oleiro estava espalhada.

1 A alma humana é espirito ou espiritual. Todavía devemos notar que o conceito de


espirito é mais ampio do que o de alma.
Espirito é, sim, um ser incorpóreo dotado de inteligencia e vontade. Ora Deus é
espirito nao criado. O anjo é espirito criado para existir sem corpo. A alma humana é
espirito criado para se aperfeigoar no corpo.

185
42 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 419/1997

Para o homem que entao procurava explicagáo para a sua orígem pró-
pría, a hipótese do Oleiro Divino era algo de obvio, como parece...

Numa viagem ás tenas bíblicas, o autor destas linhas visitou um olei


ro de Naplous. Em homenagem aos seus visitantes, o velho artesáo fabrí-
cou sucesivamente, em um nada de tempo, urna lamparina com tres bo
cas, um gracioso jarro de quinze centímetros de altura, um pote para o
/e/fe, um jarro grande e dilatado, de aproximadamente cinqüenta centíme
tros de altura. Nao tínha instrumento a nao ser seus olhos, o polegar e o
dedo indicador; nao tínha compasso a nao seros seus olhos. Sobre o seu
tomo, que ele impulsionava com o pé, todos estes objetos surgiam de
repente entre os seus dedos criadores, a seu bel-prazere segundo a sua
fantasía. Com maravilhosa facilidade e surpreendente rapidez. Entao foi-
nos dado compreenderporque ñas Escrituras o oleiro e sua obra servem
de imagem da obra do Criador. Tal imagem evoca períeitamente a sobera
na liberdade de Deus, seu maravilhoso poder criador, seu dominio abso
luto sobre a obra de suas maos, a total dependencia da criatura que so
mos nos frente ao nosso Criador, assim como a bondade e a misericordia
de Deus para com a nossa fragilidade.

O tema antigo e popular do Deus-oleiro poderá parecer infantil e sim-


plório tao somente aqueles que nao se derem ao trabalho de procurar
conhecer a mentalidade segundo a qual tal explicagáo nos é proposta
pelo Divino Autor das Escrituras".

Eis alguns exemplos de quanto era propagada a ¡magem do Deus-


oleiro na antigüidade, especialmente entre os assírios e babilonios, os
egipcios, os autores gregos e latinos, assim como ñas tradicóes de al
guns povos ditos primitivos:

Assim na epopéia babilónica de Gilgamesch conta-se que, para criar


Enkidu, a deusa Aruru "plasmou argila". Na lenda assiro-babilónica de Ea
e Atar-hasis, a deusa Miami, intencionando criar sete homens e sete mu-
Iheres, fez quatorze blocos de argila, dos quais suas auxiliares plasma-
ram quatorze corpos; a deusa rematou-os, imprimindo-lhes tragos de in
dividuos humanos e configurando-os á sua própria imagem.

No Egito um baixo-relevo em Deir-el-Bahari e outro em Luxor apre-


sentam o deus Cnum modelando sobre a sua roda de oleiro os corpos
respectivamente da rainha Hatshepsout e do Faraó Amenofis III; as deu-
sas colocavam sob o nariz de tais bonecos o sinal hieroglífico da vida f,
para que a respirassem e se tornassem seres vivos. Noticias devidas a G.
Lambert, L'Encyclique «Humani Generis» et l'Écriture Sainte, em Nou-
velle Revue Théologique 73 (1951) 233ss.

Entre os Maoris da Nova Zelandia conta-se o seguinte episodio:


186
O HOMEM É DESCENDENTE DO MACACO? 43

Um certo deus, conhecido pelos nomes de Tu, Tiki e Tañé, tomou


argila vermelha á margem de um rio, plasmou-a misturando-lhe o seu
próprio sangue, e déla fez urna copia exata da divindade; depois de a
terminar, animou-a soprando-lhe na boca e ñas narinas; ela entáo nasceu
para a vida, e espirrou. O homem plasmado pelo criador Maori parecia-se
tanto com este que mereceu por ele ser chamado Tiki-Ahua, isto é, ima-
gem de Tiki.

Quando o escritor sagrado em Gn 2,7 recorre á imagem do Oleiro,


nao quer significar senáo que há urna analogía entre o oleiro e Deus no
modo de tratar seu artefato: como o oleiro é sabio, providente, carinhoso,
soberano... em relagáo ao barro, assim Deus é (infinitamente mais) sabio,
providente, carinhoso, soberano em relacáo ao homem, independente-
mente do modo como tenham vindo á existencia o homem e a mulher.

Assim se verifica que o texto bíblico nao faz obstáculo ás concep-


cóes modernas relativas á origem do ser humano.

Continuagao da pág. 166:

3) Podemos também apontar no artigo de Ernesto Soto a referencia


a que "nao existem no budismo nem Deus todo-poderoso, dogmas
¡ntocáveis, ou normas moráis impostas do exterior". - Realmente estas
proposicóes negativas satisfazem ao subjetivismo da mentalidade mo
derna, segundo a qual cada um faz sua religiáo, tem "sua verdade" e
pratica sua ética no campo religioso. - Todavía religiáo significa reconhe-
cer a Suma Perfeicáo ou o Ser Supremo e, conseqüentemente, tributar-
Ihe a obediencia devida; o budismo escapa a esta conseqüéncia pelo fato
de afirmar que todo ser humano é a própria Divindade ou urna centelha
da Divindade. Como dito, porém, o panteísmo é falso e ilusorio. Há urna
nobre grandeza em entregar-se a criatura ao Criador como sendo a fonte
de todos os bens e o esteio da plena realizacáo da criatura.

4) O Catolicismo também é rico de símbolos, que se exprimem atra-


vés da Liturgia bem celebrada; esta se destina a fazer passar o orante do
visível ao Invisível e ao amor dos bens definitivos.

Em conclusáo, verifica-se que nao há como justificar pela lógica e


pela mentalidade científica o atrativo do budismo sobre o homem ociden-
tal. A expansao daquela filosofía religiosa vem a ser um apelo indireto
para que os fiéis católicos déem a conhecer ao mundo os valores da ora-
gao e da contemplacáo do Cristianismo. Vivenciando-os e expondo-os
aos seus semelhantes, estaráo correspondendo a profundo anseio da
sociedade moderna.

Estéváo Bettencourt O.S.B.

187
Diz a Imprensa:

"BUDISMO, O DESAFIO DA MODERNIDADE"

Em síntese: O budismo vai-se expandindo na Europa e na América


nao porque corresponda ao espirito lógico e cientificista do homem oci-
dental, mas porque é urna tentativa de descobrirmais e mais os valores
da oragáo e da contemplagao. Ora o Cristianismo possui rica tradigao
mística, que pode atender as aspiragóes do homem contemporáneo, ao
passo que o budismo, professando o panteísmo, incide numa falta contra
a lógica, visto que o Absoluto (á Divindade) nunca se poderá identificar
com o relativo (o mundo vislvel). A propagagáo do budismo vem a ser um
apelo indireto aos fiéis católicos para que mostrem ao mundo, de maneira
teórica e vivenciada, as riquezas de seu patrimonio de oragáo e contem
plagao.
* * *

O JORNAL DO BRASIL, cad. B, edicao de 10/11/96, pág. 4 publicou


um artigo de Ernesto Soto intitulado "Budismo, o Desafio da Modernidade".
- Dado que tem chamado a atencáo de muitos leitores, passamos a
comentá-lo ñas páginas subseqüentes.

1. "BUDISMO, DESAFIO..."

Antes do mais, importa por em relevo os principáis traeos do artigo


em foco. Assim comeca o autor:

«Parece religiáo, tem gosto de religiáo, jeito de religiáo, mas nao é


religiáo. É o budismo, apontado como o maior fenómeno espiritual deste
final de milenio. Urna verdadeira onda budista envolve o mundo ocidental.
A crescente aceitagáo de nogoes como Karma e reencamagao, dezenas
de livros, filmes (após Bertolucci é Jean-Jacques Annaud quem filma atu-
almente no Tibete com Brad Pitt no papel principal), programas de televi-
sao e a enorme popularidade mundial do Dalai Lama sao apenas alguns
indicativos da surpreendente atragáo que os ensinamentos de Buda exer-
cem sobre os ocidentais, fascinando um público constituido principalmen
te por universitarios, profissionais liberáis e formadores de opiniáo.

dentistas sociais se debrugam sobre o fenómeno procurando enten


der como as milenares propostas budistas (Buda viveu no século VI, an
tes de Cristo), mais antigás que as do cristianismo, respondem as indaga-
góes espirituais do homem da virada do terceiro milenio que convive com

188
"BUDISMO, O DESAFIO DA MODERNIDADE" 45

viagens espaciáis, computadores, informagao em tempo real, CNN e


Internet».

Entre as causas que explicam o avanco do budismo, o articulista


aponta as seguintes:

1) O budismo oferece ajuda "para enfrentar a angustia e a depressáo


geradas pela ameaca do desemprego, a crise económica, social e psico
lógica. E, por nao encontrarem ñas instituicóes religiosas tradicionais res-
postas as suas inquietacóes nem aceitarem que Ihes respondam com
'normas' enquanto elas buscam desesperadamente um sentido".

2) "O budismo atrai também porque jamáis se afasta da experiencia


cotidiana das pessoas, resiste perfeitamente á crítica da razáo e jamáis
faz apelo a algo exterior. Na cultura budista nao existem nem Deus todo
poderoso, dogmas intocáveis ou normas moráis impostas do exterior. Albert
Einstein costumava afirmar que o budismo era a única religiáo compatível
com a ciencia moderna. O budismo dá um gosto de divino permanecendo
totalmente humano".

3) "O budismo fascina por seu respeito ao próximo, sua visao tole
rante do ser humano e o profundo respeito pelo meio ambiente... A atitu-
de nao violenta do Dalai Lama em relacáo aos chineses que oprimem e
cometem crime de genocidio no Tibete contribuí para o charme envolvente
e pouco discreto do budismo".

4) "O budismo é perfeitamente conciliável com a atual cultura oci-


dental. Os ocidentais parecem ter-se cansado de conviver com um Deus
exterior ao mundo real e de acreditar em verdades imutáveis. Mas nao é
só isto. O budismo vem também seduzindo pela beleza de seus rituais,.
sua liturgia e exotismo. Para muitos ocidentais, ele atende as necessida-
des de símbolos e emocáo religiosa sem renunciar a urna transacáo raci
onal e pragmática."
Dito isto, vejamos propriamente em que consiste o Budismo. Pode-
remos averiguar que a pretensa conciliacao de budismo e mentalidade
ocidental é mais aparente do que real; consiste mais em palavras do que
em convergencias doutrinárias. O pensamento oriental é pouco lógico em
se tratando de religiáo, ao passo que o pensamento ocidental prima pelo
rigor lógico, que é o penhor do éxito de toda pesquisa científica.

2. O BUDISMO: MENSAGEM

Vejamos quem foi o fundador, e o que anunciou ao mundo.

2.1. O fundador

A Palavra "Buda" significa, em língua páli, "o Iluminado". É o cognome


atribuido a Siddhartha Gautama, também conhecido por "Sakyamuni\o

189
46 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 419/1997

sabio dos Sakya). Deve ter vivido entre os anos 566 a 486 a.C, no nor
deste da india. Filho de familia principesca, foi educado por seu pai no
luxo burgués. Casou-se com 19 anos e levou urna vida conjugal feliz e
abastada durante dez anos.

A existencia faustosa que levava, no entanto, nao Ihe satisfez. Um


belo dia, estimulado pelo encontró com um velho, um doente e um cortejo
fúnebre, viu-se forcado a considerar a realidade da vida e a seriedade da
passagem do homem sobre a térra. Depois, o exemplo de um religioso
mendicante levou o príncipe a abandonar tudo para pesquisar as causas
do sofrimento, da velhice, da morte e do renascer. Abandonou entáo a
familia, fez-se monge numa floresta e se pos a estudar os grandes mes-
tres da época.

2.2. As quatro "nobres verdades"

Buda refletiu sobre a realidade que o cercava, fez o respectivo di


agnóstico, procurou a causa dos fatos descobertos e finalmente a cura e a
terapia dos males apontados. Esse roteiro se concretizou do seguinte modo:

1-0 homem é afetado por múltiplos sofrimentos. Dukkha, ou sofri


mento, é o mesmo que nascer, declinar e morrer. Nesse itinerario estáo
disseminadas a dor e a tribulagáo. A continua mudanga de tudo, ou sua
desintegrado, é especial motivo de sofrimento.

2 - A causa de todo esse sofrimento é o desejo, o anseio; o homem


quer ser, quer ter ou quer evitar... Apega-se ás coisas sensíveis, porque
estas Ihe proporcionam urna satisfacáo momentánea, satisfagao esta que,
por sua vez, gera aínda mais desejos e apegos. A causa dessa avidez é a
ignorancia do significado das coisas sensíveis; o homem tende a nao
considerar o quanto elas sao vazias. Se alguém morre com desejos nao
realizados, deve renascer, e o ciclo de dores continuará.

3-0 sofrimento cessa quando se extinguem todas as aspiracóes da


mente e dos sentidos do individuo. Quem se liberta de todos os anseios
experimenta a cura e goza de paz e felicidade indizíveis, num estado dito
"Nirvana".

4 - Pergunta-se, entáo: qual a via que leva a tal felicidade? É a via


media entre a extrema mortificacáo e a desenfreada satisfacáo dos anseios
sensuais. É esta a quarta "nobre verdade", que por sua vez compreende
oito deveres:

Sila: a) discurso reto; b) agir reto; c) meios de subsistencia justos;


Samadhi: d) esforco justo; e) atencáo justa; f) meditacáo justa (con-
centragáo);

Panna: g) idéias justas; h) aspiracóes (pensamento) justas.

190
"BUDISMO, O DESAFIO DA MODERNIDADE" 47

2.3. O Nirvana

A palavra "M/vana"(sánscrito) significa desaparecimento ou extingo,


á semelhanga da extincáo do fogo. Buda afirmava que o mundo todo está
em chamas, incendiado pelo fogo do desejo. Cada reencarnacáo reacende
urna chama. O Nirvana a apaga definitivamente e poe termo á vida como
os homens a entendem comumente. Por isso, nao pode ser descrito com
palavras; só o conhece quem o experimentou pessoalmente. Pode ser
atingido nesta térra mesmo, embora isso seja difícil e fique reservado a
poucos.

O Nirvana só é pleno após a última desencarnacáo. Entáo, todos os


atributos pessoais desapareceráo; nao haverá mais eu, tu e ele, com suas
notas características.

Na verdade, o budismo ensina que no homem nao existe um eu ou


urna alma permanente; professa a an-atta (nao-alma). Essa doutrina é
tida como o ñervo do budismo; é aquilo que o distingue de todos os outros
sistemas filosófico-religiosos. O eu é apenas urna combinacáo, sempre
em mudanca, de forcas e energías mentáis e físicas, que se podem agru
par em cinco categorías:

- Materia: solidez, fluidez, calor, movimento;


- Sensac§o: visáo, audicáo, paladar, olfato, tato, memoria;
- Percepcáo: as seis percepcóes correspondentes ás seis sensa-
cóes;
- Formacáo mental: vontade ou atividade mental;
- Consciéncia: a reacáo ou a resposta aos fenómenos.

Conseqüentemente, no Nirvana ou no estado de paz absoluta, o eu


estará desintegrado, e nao se poderá falar de felicidade pessoal. Haverá
um nada, nao em sentido negativo, mas sim um nada positivo, porque
será a negacSo das realidades negativas. O bramanismo propóe a salva-
gáo mediante a fusao do eu e do Absoluto; o budismo, ao contrario, diz
que nao devem existir nem o eu nem o Absoluto, mas a superacáo de
ambos no Nirvana, ou em algo que é totalmente positivo e inefável.
Os budistas, mesmo os nao consagrados á vida monástica, tendem
a levar urna vida sempre mais sobria, pois procuram extinguir em si mes-
mos todo desejo e anseio, a fim de poder atingir o Nirvana. Por isso,
também os monges sao como que os adeptos modelares do budismo;
sao os conselheiros e orientadores, por excelencia, do povo budista.
Buda era contrario aos ritos religiosos e ás oragoes e cerimónias
litúrgicas. Por isso, nao fundou casta sacerdotal nem quis organizar ou
estruturar a sociedade dos seus discípulos.

191
48 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 419/1997

3. COMPARANDO BUDISMO E CRISTIANISMO...

Há quem diga que o budismo, na sua concepcáo originaria, nao é


urna religiao, pois volta a sua atencáo para o homem mais do que para
Deus, procurando levar seus adeptos ao auto-desenvolvimento e á insen-
sibilidade frente as paixdes.

O budismo tem em comum com o Cristianismo o anseio por urna


vida pura e perfeita, isenta de paixdes desregradas. Todavía, as diferen-
cas sao evidentes:

- o budismo prega a auto-salvacáo, ao passo que o Cristianismo


prega a "hétero-salvacao". É Deus quem toma a si a salvacáo do homem
(que este, sem dúvida, pode rejeitar);

- o Cristianismo se interessa pela salvacáo do homem, mas sem


deixar de ser teocéntrico ou de estar voltado para Deus; a salvagáo do
homem dá gloria a Deus. Em última análise, o mundo e o homem existem
porque Deus, que é o Sumo Bem, os fez para difundir a sua bondade e
espelhar no homem a sua imagem e semelhanca.

- o Cristianismo propoe ao homem o encontró com o "Grande Tu" ou


o grande referencial de sua vida. Deixa de ser um sistema físico e
mecanicísta para ser a mensagem do Amor que "primeiro nos amou" (1 Jo
4,19) e que espera a condigna resposta do homem. A cruz de Cristo,
Deus e homem verdadeiro, faz a ponte entre o céu e a térra, e dá ao
sofrimento o sentido de um testemunho de fidelídade e amor. A dor foi
transfigurada pela ressurreicáo na Páscoa;

- além dessas, há ainda urna diferenca fundamental: enquanto o


Cristianismo é monoteísta e fala de um Deus que é o primeiro Amor, o
budismo é panteísta, isto é, identifica a divindade com o homem e o mun
do. Essa premissa básica provoca urna diferenciacáo geral entre o siste
ma de Buda e o de Jesús Cristo. É, sim, ilógico identificar o homem -
contingente e volúvel como é - com a própria divindade, que por definicáo
é o contrario do contingente e volúvel. Deus é essencialmente distinto do
homem, do mundo e das realidades visíveis, pois Ele é absoluto e eterno, ao
passo que as criaturas sensíveis sao relativas, transitorias e temporarias. O
infinito nao resulta das realidades finitas postas em evolucáo. Nem devemos
imaginar que o eterno seja a soma de numerosíssimas parcelas de tempo.

4. POR QUE O BUDISMO ATRAI?

Proporemos quatro consideracóes


1) Para quem reflete, o panteísmo é ilógico ou aberrante, como dito,
pois afirma que tudo (pan) é Deus (Theós). Desta maneira identifica o
(Continua ñas págs. 166 e 187)

192
PUBLICACÓES MONÁSTICAS:

- SAO BENTO, UWIWIESTRE PARA O NOSSO TEMPO, D. Gregorio Paixáo, OSB. Edi
les Sao Bento-Salvador-BA-1996.112 págs R$ 10,00.
Trecho da introducá©: "...Assim, além do texto inicial sobre a atualidade de Sao Bento,
acrescentamos outros, especialmente selecionados, de sua Regra e de sua Vida,
com urna traducáo facilitada, aproximando o texto do leitor de "primeira viagem...".
- DIÁLOGO COM DEUS. INTRODUgÁO A "LECTIO DIVINA". D. García M. Colombás,
MB. Traducáo: Monges do Mosteiro da Ressurreicáo. Paulus. 1996,128 págs.. R$ 9,40.
Trecho de apresentacáo: "...O presente texto, como lemos no prólogo da edicáo es-
panhola, reúne conferencias originariamente dirigidas a auditorios monásticos. Po-
dem, entretanto, por sua simplicidade, aliada ao dominio seguro e profundo do tema,
orientar leigos e religiosos na prática frutuosa da lectio divina...".
- O MANTO DE ELIAS. ITINERARIO ESPIRITUAL PARA A VIDA RELIGIOSA. Enzo
Bianchi Traducáo Mosteiro de N. Sra. das Grapas. Cimbra-1996. Editora Santuario.
114 págs R$17,00.
Trecho do prefacio: "...Na crise atual que a vida religiosa, profundamente, ainda atra-
vessa, nao é oportuno urna modernizacáo, mas apenas urna resposta do radicalismo
evangélico testemunhado pela grande tradigáo...".
- A MEDALHA DE SAO BENTO. D. Próspero GuérangerO.S.B., Abade de Solesmes. 2a
edicáo -1996 - Artpress - Sao Paulo. 142 págs.
Brinde: Urna Medalha de Sao Bento R$15,40.
Trecho de prologo do autor:"... O único desejo que nos leva a publicar este ensaio
sobre táo delicado assunto, numa época em que o racionalismo vai causando tantos
estragos, é sermos de utilidade a nossos irmáos na fé...".
- TRATADO SOBRE A ORACÁO. Tertuliano, S. Cipriano e Orígenes. Traducáo do Revmo.
D. Abade Timoteo Amoroso Anastácio, OSB. Revisáo: Mosteiro de María Máe do Cristo
- Caxambu. Cimbra-1996. Mosteiro da Santa Cruz. 250 págs R$ 16,50.
- VIDA E MILAGRES DE S. BENTO - LIVRO SEGUNDO DOS DIÁLOGOS DE S.
GREGORIO MAGNO. Traducáo do Mosteiro de S. Bento do Río de Janeiro. 4a edicáo.
1996.115 págs. Edicóes "Lumen Christi" R$6,00.
Trecho da introducáo:"... A traducáo que estas páginas apresentam, é a vida de um
santo escrita por um santo. S. Gregorio, o grande Papa restaurador da disciplina
eclesiástica após a invasáo dos Bárbaros, o reformador da liturgia romana, escreve a
vida de S. Bento...".
- OS OBLATOS SECULARES na familia beneditina. D. Jean Guilmard, OSB.
Traducáo: Bernard Barrandon, obl. O.S.B. Sao Paulo. 1995. Mosteiro de Sao Bento -
Sao Paulo. Impresso pelo Mosteiro da Santa Cruz. 65 págs R$ 6,60.
Trecho do prefacio: "...Dirige-se a todos que, ansiosos por aprofundar sua vida crista,
se sentirem movidos pelo Espirito Santo a se agregar mais estreitamente a urna fami
lia monástica...".
- CONSTITUICÓES - Congregacáo Beneditína do Brasil - 2a edicáo revista.
Apresentacáo de Dom Basilio Penido, O.S.B. Abade Presidente, de 11 de julho de 1988.
Edicóes Lumen Christi. Impresso no Mosteiro da Santa Cruz, 120 págs R$ 15,00.
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3) - VOLUME X: SERMONES (2o) - 51-116 - SOBRE LOS EVANGELIOS SINÓPTICOS.
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4)- VOLUME Xla: CARTAS (2o) - 124-187 - TERCERA.EDICIÓN CORREGIDA Y
MEJORADA. MCMLXXXVI I, 854 págs R$ 110,00.
5)- VOLUMES XVI Y XVII: LA CIUDAD DE DIOS (1o Y 2°) - CUARTA EDICIÓN -
MCMLXXXVIII, 1920 págs R$ 133,00.
6) - VOLUME XXV: SERMONES (5°) - 273-338 - SERMONES SOBRE LOS MÁRTIRES.
MCMLXXXIV, 790 págs R$ 69,00.
7) - VOLUME XXVI: SERMONES (6o) - 339-396 - SERMONES SOBRE DIVERSOS TE
MAS, índices bíblico, litúrgico y temático de todo el sermonario
AGUSTINIANO. MCMLXXXV, 925 págs R$ 104,00.
8) - VOLUME XXVII: ESCRITOS BÍBLICOS (3°) - EXPRESIONES DEL HEPTATEUCO
ESPEJO DE LA SAGRADA ESCRITURA. OCHO CUESTIONES DEL ANTIGUO TES
TAMENTO. MCMXCI, 568 págs R$ 104,00.
9)- VOLUME XXVIII: ESCRITOS BÍBLICOS (4o) - CUESTIONES SOBRE EL
HEPTATEUCO (EN SIETE LIBROS). MCMLXXXIX, 740 págs R$ 104,00.
10) - VOLUME XXIX: ESCRITOS BÍBLICOS (5°) -ANOTACIONES AL LIBRO DE JOB
LA CONCORDANCIA DE LOS EVANGELISTAS. MCMXCI I, 740 págs.. R$ 118,00.
II) - VOLUME XXX: ESCRITOS ANTIMANIQUEOS (1°) - Las dos almas. - Actas del
debate con Fortunato. - Réplica a Adimanto. - Réplica a la carta llamada "del Fun
damento". - Actas del debate con Félix. - Respuesta a Secundino. MCMLXXXVI
640 págs R$ 78,00.
12) - VOLUME XXXI: ESCRITOS ANTIMANIQUEOS (2°) -CONTRA FAUSTO. MCMXCIII
838 págs R$ 121,00.
13)- VOLUME XXXII: ESCRITOS ANTIDÓNATISTAS (1°) - SaJmo contra la secta de
Donato. - Réplica a la carta de Parmeniano. -Tratado sobre el bautismo. - Resumen
del debate con los donatistas. MCMLXXXVIII, 968 págs R$ 122,00.
14) - VOLUME XXXIII: ESCRITOS ANTIDONASTISTAS (2o) - Réplica a las cartas de
Petiliano. El único bautismo. Mensaje a los donatistas después de la Conferencia.
Sermón a los fieles de la Iglesia de Cesárea. MCMXC, 712 págs R$ 109,00.
15) - VOLUME XXXV: ESCRITOS ANTIPELAGIANOS (3°) - La perfección de la justicia
del hombre. El matrimonio y la concupiscencia. Réplica a Juliano. MCMLXXXIV
1005 págs R$ 107,00.
16)- VOLUME XXXVI: ESCRITOS ANTIPELAGIANOS (4o) - Réplica a Juliano (obra
inacabada) (Libros l-lll). MCMLXXXV, 658 págs R$ 68,00.
17)- VOLUME XXXVII: ESCRITOS ANTIPELAGIANOS (5°) - Réplica a Juliano (obra
inacabada) (Libros IV-VI). MCMLXXXV, 607 págs R$ 84,00.
18) - VOLUME XXXVIII: ESCRITOS ANTIARIANOS Y OTROS HEREJES. MCMXC 937
Págs R$ 104,00.
19) - VOLUME XL: ESCRITOS VARIOS (2o). MCMXCV, 1007 págs R$ 132,00.
OBS.: De alguns volumes resta apenas 01 exemplar. Nao mande pagamento anteci-
pado. Faca o pedido e atenderemos via Reembolso Postal.

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