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Resumo Abstract
O presente ensaio visa discutir uma determi- The present paper intends to investigate
nada forma de expansão das grandes cidades a certain form of expansion of great
contemporâneas relacionada a novas formas contemporary cities which is related to new
de mobilidade, tanto de trabalhadores e forms of mobility as much of workers and
consumidores, como de mercadorias e pres- consumers, as of goods and supplied services.
tação de serviços. A nossa hipótese é que o Our hypothesis is that the increase in mobility,
aumento da mobilidade, o conseqüente es- the consequent sprawl of the urban fabric
praiamento longínquo do tecido urbano e o over long distances and the appearance of the
surgimento de chamadas áreas perimetropo- so-called perimetropolitan areas cannot be
litanas não podem ser entendidos como mera understood as a mere extrapolation of those
extrapolação daquelas dinâmicas e formas de dynamics and forms of urban expansion that led
expansão urbana que levaram à conformação to the formation of the modern metropolises.
de metrópoles. Procura-se, aqui, indicar ca- It is intended, here, to indicate approaches
minhos de investigação capazes de verificar of investigations which might be capable of
se há nessas áreas perimetropolitanas uma verifying if there are, in these perimetropolitan
possível ruptura com a lógica metropolitana. areas, possible ruptures with the traditional
Colocado num contexto mundial, o debate metropolitan logic. Placed in a world context,
apresentado está voltado particularmente pa- the debate presented in our paper focuses on
ra a metrópole latino-americana, em geral, e a the Latin-American metropolis, in general, and
brasileira em particular. on the Brazilian one in particular.
Palavras-chave: metrópole; expansão; área Keywords: metropolis; expansion;
perimetropolitana; dinâmica metropolitana; Rio perimetropolitan area; metropolitan dynamics;
de Janeiro; Brasil. Rio de Janeiro; Brazil.
metrópoles e suas formas de expansão em ge- dade consistiria no fato de que as separações
ral; não obstante, o foco da nossa discussão e tradicionais entre trabalho, moradia, estudo,
investigação será a metrópole latino-america- consumo e lazer – que se consolidaram a par-
na, em geral, e a brasileira em particular. Na pri- tir do advento da sociedade industrial – irão
meira caracterização de áreas perimetropolita- ser superadas por novas articulações e, tam-
nas serão observados os entornos das quatro bém, novos espaços do exercício das respec-
maiores metrópoles do Brasil: São Paulo, Rio tivas atividades.
de Janeiro, Belo Horizonte e Salvador. Como Devido à sua localização privilegiada
caso específico para aprofundar a discussão, – por razões que não cabe aprofundar aqui
foram selecionadas a região metropolitana e a –, espera-se que essas transformações acon-
área perimetropolitana do Rio de Janeiro (vide teçam primeiramente nas metrópoles e em seu
para isto também Randolph e Gomes 2007). entorno; há toda uma discussão, nos últimos
O atual ensaio termina com algumas re- anos, sobre o papel da reestruturação econô-
flexões acerca das espacialidades e temporali- mica para a transformação das metrópoles e
dades que estão envolvidas nas transformações da sua expansão para além das suas fronteiras.
aqui em pauta, provocadas por mudanças ain- De fato, em relação ao Brasil, nota-se hoje um
da incipientes da mobilidade de trabalhadores padrão espacial distinto de crescimento da
população urbana do que aquele ocorrido
e consumidores nessas áreas e dos tradicionais
num período inicial da urbanização (Santos
padrões profissionais surgidos durante o perío 61
1993) quando apresentou uma forma concen-
do da industrialização no Brasil.
trada principalmente nas grandes cidades e
metrópoles do país. Pois, já desde a década
de 1980, observa-se um maior espraiamento
Mobilidade, expansão
da distribuição populacional (Martine 1994);
das metrópoles essa dispersão ocorreu desde a ocupação de
e advento de áreas áreas suburbanas ou mesmo de municípios
perimetropolitanas vizinhos aos grandes centros até através do
deslocamento de parcelas da população ur-
Partimos do pressuposto de que o avanço, bana para áreas rurais dentro de um município,
mesmo quando ainda lento, hoje, de um con- processo denominado por Limonad (1999)
junto de tecnologias não aumentará apenas suburbanização no seu sentido literal. Mas,
quantitativamente a mobilidade de trabalha- existia também o movimento contrário, que
dores e consumidores – em relação a raios e partiu das áreas rurais para áreas urbanas onde
velocidades de seus deslocamentos, tendên- os fluxos não se dirigiam mais, como costuma-
cia secular desde o início da industrialização; va acontecer no período anterior, aos grandes
mas criará também as bases para formas de centros urbanos, o que Armijo (2000) cha-
vida qualitativamente novas (Randolph 2004, mou de “suburbanização campesina” – para o
Lefebvre 1991). O caráter novo dessa mobili- caso chileno.
O que mais nos interessa no presen- tiva, o tipo de cidade que agora se está
te trabalho são aqueles deslocamentos da desenvolvendo seria o resultado de um
população para lugares mais distantes fora conjunto de mutações perfeitamente
das regiões metropolitanas. Há na literatura compatíveis com a modalidade especí-
diferentes autores que procuram caracterizar fica daquela urbanização cujas origens
esse processo por meio de diferentes termos seguramente deve se situar no momento
em que se inicia a revolução industrial.
como involução urbana ou metropolitana
(Mattos 2001)
(Santos 1996), urbanização extensiva (Monte-
Mor 1994), contra-urbanização (Berry 1976)
Entretanto, existe uma forma diferente
e, mesmo, implosão/explosão metropolitana
de interpretar os mesmos processos. Aguilar
(Lefebvre 1999) como marco da propagação
(2002) chega a conclusões que contradizem
de uma “sociedade urbana”.
essa visão de Mattos a partir do estudo do
Podem-se identificar duas perspectivas
desenvolvimento econômico e da estrutura
distintas a respeito da interpretação desses
territorial metropolitana da Cidade de Mé-
processos de expansão. Por um lado, há
xico. Para Aguilar, os estudos sobre o papel
aqueles que admitem o processo de um es-
das grandes cidades dentro da economia glo-
praiamento para além das fronteiras metro-
bal negligenciam o desenvolvimento das pe-
politanas e, inclusive, identificam o advento
riferias metropolitanas e, por causa disso, não
de uma nova geografia de cobertura global
62 conseguem identificar que a expansão metro-
baseada na valorização das cidades à medida
politana está adquirindo uma forma diferente
que assumem um crescente número de fun-
daquela do passado recente.
ções globais e no conseqüente surgimento
de novas centralidades no sistema das cidades
Em anos mais recentes, podemos apreciar
mundial (vide p. ex. Mattos, 2001). Porém, que na medida em que diminuiu o cres-
esse processo não passa, conforme o mesmo cimento da grande metrópole, continuou
autor, de uma “metropolização expandida, um importante crescimento das cidades
na qual, progressivamente, vão ser ocupadas intermediárias próximas à primeira, com
as aldeias e áreas rurais que se encontram em o qual tem aumentado uma marcada
seu caminho, transbordando uma e outra vez concentração de atividades produtivas
seus limites anteriores.” Mattos, como mui- e de população urbana em uma “região
tos outros autores – vide, para o caso do Rio central” que contém a maior cidade do
de Janeiro, particularmente Castello Branco país, mas cobre um território muito mais
(2006) –, não considera essas tendências co- amplo. (2002)
mo novas, mas
Acrescenta ainda que
[...] como uma culminação lógica e pre-
visível de uma forma de urbanização ca- [...] as expandidas e cada vez mais difusas
pitalista, que já se havia anunciado antes. periferias metropolitanas ao redor dessas
E que, portanto, a partir dessa perspec- grandes cidades tornaram-se sumamente
importantes para entender a natureza em Pereira, 2000; Furtado, 2005): uma realidade
mudança das megacidades; .... Em termos que talvez não seja mais rural, mas que também
territoriais, a megacidade apresenta na não pode ser considerada plenamente urbana.
atualidade uma expansão mais policêntri- O termo “perimetropolitano”, denominaria,
ca através de centros e subcentros urbanos
nesse sentido, uma área de interface entre o
que seguem um padrão de rede que tende
metropolitano e um território urbano-regional
a ampliar-se ao longo das principais rodo
que está próximo à região metropolitana, mas
e ferrovias que saem em forma radial do
que tem e mantém alguma característica pró-
centro da grande cidade. (Ibid.)
pria. Pois, nos municípios nessa área de inter-
Adotamos, no presente ensaio, uma face entre metrópole e região, a problemática
perspectiva que corresponde àquela de Agui- periurbana parece estar bastante presente e
lar. Procuramos, indo além disso, investigar e importante à medida que se observam trans-
entender melhor aquela realidade que esse formações das relações entre áreas urbanas
autor chama de “difusas periferias metropoli- e rurais nesses lugares (Randolph, 2005). Ao
tanas”. Na medida em que não descartamos a nosso ver, o perimetropolitano distingue-se
presença de uma nova dinâmica urbana nessas assim do “proto” metropolitano, que pode
periferias fora das regiões metropolitanas, pa- fazer referência ao processo de uma transição
rece-nos justificado designá-las com um nome de uma área não metropolitana em metropo-
próprio que tanto expresse sua distinção em litana (vide essa denominações usadas pela
63
relação à metrópole e sua área de influência, Empresa Paulista de Planejamento Metropo-
como faça alusão ao fato de que essa realida- litano – Emplasa, 2007)
de não possa ser entendida sem a presença da Em síntese, para tornar mais nítido e rigo-
metrópole. Parecia, então, a qualificação de roso o termo perimetropolitano, é preciso,
“perimetropolitana” bastante adequada para a antes de tudo, esclarecer a definição e a de-
designação de um conjunto de municípios li- limitação das próprias regiões metropolitanas.
mítrofes às regiões metropolitanas dessas áreas Diferentes perspectivas e procedimentos de
(vide Randolph, 2004, 2005). Na literatura, sua formação, implicarão, logicamente, dife-
esse termo surgiu ao menos desde o início da rentes significados de sua possível área peri-
década de 1990 (Hart, 1991) em investigações metropolitana relacionada. O caso da Região
fundamentalmente na Austrália, que diziam Metropolitana do Rio de Janeiro é uma instru-
respeito às metrópoles daquele país (vide, por tiva referência: criada e modificada, em termos
exemplo, Murphy e Burnley, 1993; Burnley e legais, por Leis Complementares estaduais,
Murphy, 2002). essa região tem sido redefinida em vários mo-
Inicialmente, a denominação perimetro- mentos após a promulgação da Constituição
politana pode ser entendida enquanto analo- Federal de 1988 e da Constituição Estadual
gia com o termo “periurbano”, que se refere a do Rio de Janeiro.
alguma franja urbana e pretende designar a in- O uso do termo perimetropolitano exige,
terface entre o urbano e o rural (España, 1991; portanto, que seja explicitada, brevemente, a
natureza da noção da região metropolitana ção de dados oficiais com vistas a publi-
na qual se apóia. Sem entrar numa discussão cação do censo norte americano, tendo,
mais profunda da vasta bibliografia existente a portanto um objetivo bem preciso e defi-
respeito da metrópole e de sua região, serão nido. (2001, p. 106)
apresentadas, no item seguinte, abordagens
com uma preocupação mais operacional No Brasil, as regiões metropolitanas fo-
de delimitação – e seus critérios – dessas ram pensadas e instituídas a partir da década
regiões. de 1960 sob influência francesa. Lá, na França,
a questão metropolitana despertou uma cer-
ta preocupação a partir da década de 1960,
A criação e a delimitação quando o governo francês pôs em ação o
de regiões metropolitanas programa denominado Metrópoles de Equi-
líbrio, no qual foram eleitas oito metrópoles
Nos diferentes países do mundo, as áreas me- regionais, que seriam
tropolitanas foram definidas e delimitadas a
partir de diversos e diferentes critérios e mé- [...] capazes de delimitar regiões pela
todos. Uma breve síntese a respeito daqueles influência de seu terciário de alto nível,
países que fazem parte da Organização para [assegurando] uma autonomia ..., passan-
o Desenvolvimento e Co-Operação Eco- do a capital nacional a ter apenas um pa-
64 pel superior de coesão dessas unidades
nômica (ODCE ou OECD) encontra-se em
funcionais. (Rochefort, 1998, p. 154)
recente estudo dessa organização (OECD,
2006, pp. 245-249). Nos Estados Unidos, por
Durante o governo militar no Brasil, a
exemplo, as áreas metropolitanas começaram
razão do reconhecimento formal das metró-
a ser delimitadas na década de 1950, sendo
poles era dupla: sob o ângulo econômico,
denominadas Standard Metropolitan Areas
tornar mais racional a prestação dos chama-
(SMA). No decorrer dos anos, as áreas sofre-
dos serviços de interesse comum, ou seja, ser-
ram diversas alterações na sua denominação;
viços que interessam a mais de um município
ao mesmo tempo em que foram aprimorados
e que podem ser mais inteligentemente ofe-
os critérios de sua definição. Na década de
recidos por meio de uma gestão integrada; e
1990, as unidades regionais foram, finalmen-
sob o ângulo da geopolítica interna, na qual
te, denominadas Metropolitan Areas, segun-
buscava-se intervir mais facilmente nesses es-
do o Geographic Áreas Reference Manual da
administração federal daquele país (GARM, paços-chave da vida econômica e político-
1994). De acordo com Moura e Firkowski social brasileira (Souza, 2003, p. 35).
(2001), essas áreas As regiões metropolitanas foram inicial-
mente criadas, sob parâmetros político-insti-
[...] são designadas e definidas pelo Fe- tucionais, pelo Congresso Nacional no início
deral Office of Management and Budget da década de 1970, época que se instalaram
(OMB), e utilizadas para coleta e produ- nove regiões metropolitanas no território
mos de mencionar; e, segundo, serão consi- ca dos municípios-núcleo tem uma influência
derados municípios perimetropolitanos ape- importante na conformação, tanto da região
nas aqueles que são limítrofes com a fronteira metropolitana como da sua área perimetro-
da região metropolitana; certamente, essa politana. No caso de São Paulo, nota-se ain-
segunda restrição, em particular, precisa ser da a proximidade imediata de uma segunda
revista em estudos posteriores. região metropolitana que inibe a extensão
Os nomes dos municípios selecionados a de uma área perimetropolitana para o sul. As
partir desses critérios encontram-se na Tabela 1; localizações de Rio de Janeiro e Salvador na
para cada uma das áreas em torno das quatro costa do Atlântico são outro determinante
metrópoles há uma linha com os nomes dos que impede qualquer possibilidade de cres-
municípios que fazem parte da região metro- cimento em determinadas direções.
politana; e uma segunda linha com aqueles que Em relação aos dados da densidade de-
pertencem à área perimetropolitana (APeM). mográfica (habitantes por km²) e da taxa de
Já se observa a configuração bastante distinta urbanização encontrados, tanto nos municí-
entre as quatro áreas por nós consideradas. pios-núcleo, nas suas regiões metropolitanas
Uma melhor – se bem incipiente – im- (RM) como nas respectivas áreas perimetro-
pressão dessas diferenças ganha-se ainda a politanas (ApeM) a Tabela 2 apresenta uma
partir dos mapas que se seguem nas páginas diferenciação bastante nítida entre os quatro
subseqüentes. A própria localização geográfi- casos estudados.
68
Município-núcleo
Região Metropolitana de São Paulo (com exceção do município-núcleo)
Área Perimetropolitana
Elaborado por Labore, 2007
Região Metropolitana da Baixada Santista
Município-núcleo
Região Metropolitana do Rio de Janeiro (com exceção do município-núcleo)
Área Perimetropolitana Elaborado por Labore, 2007
69
Município-núcleo
Município-núcleo
70
Rio de Janeiro
Município-núcleo 4.627,9 100,0 - -
RM 2.845,2 94,5 100,0 67,4
APeM 175,0 85,7 99,0 65,3
Belo Horizonte
Município-núcleo 6.718,0 100,0 - -
RM 558,0 80,5 100,0 26,3
APeM 71,6 70,8 97,8 35,1
Salvador
Município-núcleo 3.440,3 100,0 - -
RM 794,0 93,0 100,0 81,8
APeM 63,2 67,4 98,9 34,5
71
Tabela 3 – Comparação da distribuição da população
nas quatro metrópoles
Rio de Belo
São Paulo Salvador
Janeiro Horizonte
Total (Núcleo + RM + APeM) 29.566.294 17.355.827 7.058.265 5.629.613
Município-núcleo 35,30 33,75 31,71 43,40
Região Metropolitana 60,47 61,71 61,75 53,67
Área Perimetropolitana 4,23 4,54 6,54 2,93
Total (%) 100,00 100,00 100,00 100,00
Fonte: Censo demográfico de 2000, IBGE.
menor morando nas periferias da metrópole tanto sobre o crescimento populacional en-
e, menor ainda – apenas 3% –, na sua APeM. tre 1980 e 2000, como também sobre os
Esses dados podem indicar que a dinâmica da movimentos pendulares entre os municípios
expansão de Salvador seja diferente daquelas no ano 2000, diferenciados pelas três cate-
das outras três metrópoles. goriais territoriais por nós utilizado: o cres-
A Tabela 4 contém dados dos Censos cimento no município-núcleo, na periferia
Demográficos de 1999 e 2000, do IBGE, (RM) e no seu entorno (APeM).
Belo Horizonte
Município-núcleo 2.238.526 13,44 10,81 - - -
RM 4.358.171 31,36 23,71 11,2 11,2 11,2
APeM 461.568 32,89 19,21 4,6 4,6 4,6
Total 7.058.265
APeM/Núcleo 20,6%
APeM/RM 10,6%
Salvador
Município-núcleo 2.443.107 38,17 17,72 - - -
RM 3.021.572 41,31 21,03 6,0 6,0 6,0
APeM 164.934 7,57 8,32 5,7 5,7 5,7
Total 5.629.613
APeM/Núcleo 6,8%
APeM/RM 5,5%
(coluna 1), isso significa uma distribuição bas- não apenas em relação ao número de mora-
tante eqüitativa das taxas entre os municípios; dores e número de municípios, mas também
e vice-versa: se ficar próximo ao pico e longe a sua própria configuração territorial. Os ma-
da média mostra que poucos municípios têm pas seguintes pretendem dar uma primeira im-
74 uma elevada articulação com a metrópole. pressão dessas diferenças que, em parte, são
Nos Gráficos 1 e 2, elaborados a partir resultado da própria localização geográfica
da Tabela 4, identifica-se que, para as RM de cada região – tanto em relação ao ambien-
das quatro metrópoles (Gráfico 1) o caso te natural como ao construído. A seguir, ob-
do Rio de Janeiro apresenta um pico mui- serva-se o município-núcleo, os municípios
to alto (coluna 2) e relação à média geral circundantes que fazem parte da respectiva
(coluna 1); um padrão que se repete em região metropolitana (conforme definida le-
grau menor nos outros três casos e indica galmente) e a área perimetropolitana com
uma concentração da articulação em rela- relação aos quatro casos acima analisados:
tivamente poucos municípios. Já nos muni- São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e
cípio das APeM (vide Gráfico 2), além de Salvador/Bahia
seus valores mais baixos, Rio de Janeiro, Em síntese, a comparação entre as re
Belo Horizonte e Salvador apresentam uma giões metropolitanas e as áreas perimetro-
distribuição relativamente homogênea de politanas no caso das quatro principais me-
articulação. A exceção fica por conta de trópoles do país confirma basicamente as ex-
São Paulo, onde há um pico muito alto em pectativas a respeito das características inves-
um município. tigadas dessas últimas áreas: de uma maneira
A comparação entre as quatro regiões genérica, podem ser descritas como áreas de
metropolitanas precisa ser realizada com bas- relativamente baixa densidade populacional,
tante cuidado, tendo em vista suas diferenças, tendo municípios com taxa de urbanização
ainda não muito elevada, com uma articula- Os fenômenos encontrados na nossa
ção reduzida com outros municípios e, cer- própria investigação e em pesquisas acerca
tamente, também com a metrópole; mas com dessa temática são apenas fracos indícios de
taxas de crescimento populacional elevadas. uma realidade profundamente alterada pela
Entretanto, mesmo com o cumprimento das acima apontada nova qualidade da mobilida-
expectativas, os dados indicam também que de. Apesar do inquestionável mérito das pes-
cada uma dessas áreas deve ser tratada em sua quisas empíricas e estatísticas a respeito das
singularidade, mesmo naqueles casos em que transformações das metrópoles contemporâ-
as regiões metropolitanas de referência apre- neas – como aquela que acabamos de realizar
sentam determinados traços comuns – como aqui –, seu valor parece limitado quando se
vimos em relação às metrópoles do Sudes- encara o processo de mudança em toda sua
te. Essa singularidade representa exatamente profundidade.
sua “essência” e sua potencialidade: que não Dentro desse quadro geral das transfor-
apresentam o mesmo padrão de ocupação mações que observamos aqui nos últimos 20
e desenvolvimento como a metrópole e sua a 25 anos, para avançar no entendimento dos
periferia imediata que, até certo ponto, repro- processos, é necessário empreender pesqui-
duzem determinados esquemas de segregação sas estatísticas mais sofisticadas como aquelas
socioespacial. como, no caso do Rio de Janeiro, as de Cas-
tello Branco (2006). Na análise dos fluxos de
movimentos pendulares, essa pesquisadora 75
Subnúcleos no Entorno
do Rio de Janeiro
Submetropolitano
Centro Urbano 1
Centro Urbano 2
Centro Urbano 3
Centro Urbano 4
Centro Urbano 5
Fluxos segundo a hierarquia
Nível 1
Nível 2
Nível 3
desses aspectos – parcial, mas que pode ilus- É essa potencialidade de uma certa “fle-
76 trar a questão da continuidade ou ruptura – é xibilidade da função” – sob constância da
a investigação das próprias formas que as ocu- forma – que nos leva a chamar atenção, no
pações urbanas estão assumindo nessas áreas final do nosso pequeno ensaio, para o fato
perimetropolitanas. A temática dos condomí- de que cada investigação pressupõe um cer-
nios fechados, por exemplo, parece-nos ofe- to posicionamento – muitas vezes implícito
recer uma oportunidade para realizar estudos – com relação ao seu “objeto” ou aquilo que
comparativos entre a proliferação dessa mo- compreende como sua “realidade”. A proble-
dalidade de habitação (produto imobiliário) mática apresentada nesse pequeno ensaio só
dentro do núcleo e mesmo periferia do Rio vai poder ser investigada adequadamente, ao
de Janeiro e sua difusão nas áreas semi-rurais nosso ver, se a “realidade” estudada for com-
ou periurbanas nos municípios do entorno preendida a partir do conceito de Lefebvre,
da metrópole (vide, por exemplo, Randolph que atribui ao real uma virtualidade própria e
e Lopes, 2006). Uma outra questão que está propõe identificar, nela mesma, seu potencial
presente em uma boa parte dos municípios futuro – possibilidades que podem (ou não)
perimetropolitanos do Rio de Janeiro é a da se tornar real (Lefebvre, 1999, p. 16).
segunda residência e do turismo de fim de Nesse sentido, entende-se que a acima
semanas. Trata-se aqui de formas intermitentes mencionada “nova mobilidade” precisa ser
de ocupação de residências fora da metró- compreendida ainda hoje como uma (po-
pole que podem facilmente ser transformada derosa) potencialidade cuja “realização” não
em permanentes. depende apenas do avanço de mudanças
acompanhada ou precedida pelas mu- dades que orientou a atenção da nossa pes-
danças das formas. quisa: imaginamos que ali haveria uma chance
Certas formas espaciais do passado po- maior – em relação a outras áreas – para o
derão ser reabilitadas pela simples atri- surgimento de uma nova mobilidade e para a
buição de novas finalidades. (2004, p. 81,
realização mais imediata de mudanças na sua
destaques nossos)
estrutura espacial, inclusive a da metrópole
E, num primeiro momento, foi esse po- inteira. A resposta à pergunta sobre “conti-
tencial que julgamos presente em determina- nuidade” ou “ruptura” não cabe, em última
das partes da franja metropolitana do Rio de instância, à pesquisa, mas à atuação de todos
Janeiro, de uma reabilitação de formas espa- nas realidades das quais somos partícipes e
ciais pela simples atribuição de novas finali- protagonistas.
Rainer Randolph
Doutor em Ciências Econômicas e Sociais, professor titular no Instituto de Pesquisa e Planejamento Urba-
no e Regional-IPPUR, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Rio de Janeiro, Brasil)
rainer.randolph@gmail.com
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Recebido em fev/2007
Aprovado em mar/2007