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Os miiltiplos enirelagamentos entre impérios, Estados e regides Andréa Lisly Gongalves Valdei Lopes de Araujo O primeiro seminario Impérios e lugares no Brasil nasceu no contexto de amplo debate no interior do departamento de histéria da UFOP sobre as direcdes de pesquisa a serem tomadas na constituigao de um Programa de Pés-Graduacao. Partiamos da idéia de que os avangos da historiografia no século XX permitiam recolocar em novo contexto as relagdes, sempre dina- micas, que as sociedades estabeleciam entre os diversos niveis geograficos e de poder em que estavam organizadas. Essa idéia concentrou-se em torno de trés palavras que depois serviram para nomear a area de concentragao de nosso programa: estado, sociedade e regiao. A partir dessa diregiio geral, um grupo de professores — particularmen- te envolvidos com a histéria do Brasil entre 1750 e 1900 — procurou operar suas pesquisas individuais em torno do problema das diversas solugdes para as relagdes entre as dimensdes mais gerais € universais simbolizadas pela idéia de impérios, e as dimensées mais concretas, ligadas ao mundo da vida, simbolizada pela expressiio lugares. A escolha de termos aparentemente tao contrapostos nao deveria implicar o obscurecimento das relages negocia- das existentes entre suas diversas figuracdes, muito menos amenizar com isso o uso da violéncia e da forga que lhes sao préprias. No caso brasileiro, estudar a historia a partir dessa dimenséo estruturante deve permitir identifi- car certas permanéncias, sem com isso mascarar 0 novo. Assim, as diferen- tes configuragdes do Império podem ser pensadas como momentos de recombinagiio inédita de elementos muitas vezes j4 existentes.' ' SMITH, Anthony in BALAKRISHNA, Gopal. Mapping the Nation. London: Verso, 1996. OS MULTIPLOS RELACAMENTOS ENTRE IMPERIOS, ESTADOS ERE( A historiografia moderna nasceu em estreita conjungao com os cha- mados Estados-nacionais. Com a perda de legitimidade dos mecanismos de identificagdo tipicos de Antigo Regime e a insatisfagio com os modelos universalistas/abstratos produzidos no Século das Luzes, a realidade social foi submetida a um rdpido processo de historicizagdo desde fins do século XVIII. Mais do que um cidadao racional ou o stidito de um monarca, os habitantes precisavam assumir o papel de sujeito de um longo processo histérico de formacao nacional. As antigas unidades de sentido e acao — como eram as cidades desde a Idade Média,” precisavam ser reduzidas a partes histérica e culturalmente submetidas a nacionalidade. Nesse proces- so, a nogdo de “regido” desempenhou um papel capital. A essa tradigaio historiografica que poderiamos chamar de romAntica, ao mesmo tempo tributaria e critica da nogdo de “regido”, somam-se as tendéncias atuais, questionadoras da associacao entre Estado e nagao. Mui- tos trabalhos foram produzidos com o objetivo de criticar a naturalizagao dessas categorias, procurando desvendar as conseqiiéncias de sua conjun- giio.* Tal movimento de revisdio do discurso da histéria é simultaneo 4 emer- géncia de novos sujeitos sociais que passam a reivindicar uma histéria dos esquecidos e excluidos. Conforme observou Renan, no final do século XIX, uma nagdo é feita de memoria e esquecimento; esta incisiva afirmagao nos leva a pensar naquilo de mais relevante que foi esquecido ou reduzido para a producao da tradigao historiografica moderna, em sua conjungio original com os Estados-nacionais. O passo seguinte 4 desnaturalizagiio da associagao entre Estado e nagao deve ser pensar os efeitos dessa conjungéio em nossa visdo do passado. Se ja nao parece possivel escrever a histéria como uma grande narrativa coerente da formagao da nacionalidade, impée-se a tarefa de escrever e reescrever a hist6ria do que foi esquecido, sobrevalorizado ou distorcido, ou seja, recom- por as miiltiplas hist6rias possiveis a partir das experiéncias compartilhadas em um territério geografico e/ou simbolicamente constituido. No lugar de ® GUERRA, Frangois-Xavier. A nagdo modema: nova legitimidade e velhas identida- des, In: JANCSO, Istvan (organizador). Brasil: formagao do estado e da nagao. So Paulo: Hucitec; Unijuf; Fapesp, 2003. ’, HOBSBAWM, Eric. Ethnicity and nationalism in Europe today. Antropology Today, 8 (February) 1992. BHABHA, Homi. (ed.) Nation and Narration. London and NY: Routledge, 1991. HOBSBAWM, Eric. Nagées e Nacionalismos desde 1780: programa, mito e realidade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1990, Balakrishna, Op. Cit. ANDERSON, Benedict. Imagined Communities: Reflections on the Origin and Spread of Nationalism. Revised edition ed. London & NY: Verso, 1991. PALTI, Elias. The nation as a problem: historians and the ‘national question’. History and Theory, October 2001, 324-346. 10 ANDREA LISLY GONCALVES E VALDEI LOPES DE ARAUJO uma histéria do Estado-nagio trata-se agora de pensar, pesquisar e escrever uma histéria das sociedades em suas miltiplas e contraditérias manifesta- goes.4 Um nivel de andlise complementar a esse diz respeito a relagdo entre a “tegiao” e os processos formadores do “Estado”. A maneira como estas dimensées se relacionam é um problema que precisa ser investigado e equacionado em cada situagaio histérica concreta. Esses fendmenos apre- sentam ritmos diferenciados, dai a importancia do estudo das hierarquias sociais e regionais, das elites politicas, dos movimentos populares, e dos processos de produgio de “mitos fundadores”. Regio nao deve ser aqui entendida apenas em sua dimensio geografi- ca, mas também como referéncia aos fendmenos locais, aos lugares onde o mundo cotidiano reage aos processos totalizantes e homogeneizadores. Por isso, a concentragio na sociedade e na regio, em suas relagdes com as diversas formagdes do Estado, assume, na atual pesquisa histérica, uma fungao heuristica central.’ Além disso, podemos pensar que pares conceituais como nacao/regiao, local/global, centro/periferia sao operadores historica- mente definidos dessas categorias fundamentais que organizam o mundo da vida.’ As divisdes amigo/inimigo, interno/externo também parecem ter a forga de categorias histéricas, como afirma Koselleck’ em seus tltimos tex- tos. Tais categorias sdo estratégias de distribuico de poder, que envolve definigdo de identidades e a luta por novos arranjos sociopoliticos, espaciais e institucionais. A perspectiva comparada assume papel relevante nesse empreendi- mento, pois ajuda na “desideologizacao” do problema da singularidade, transformada em bandeira pela historiografia romAntico/conservadora do século XIX. Assim, o estudo comparado de experiéncias histéricas espago- temporalmente distantes pode nos ajudar a trazer nova luz a antigos proble- mas. Em campos to distintos como os estudos sobre a escravidao e a histé- * JANCSO, Istvan. “A Construcao dos Estados nacionais na América Latina - aponta- mentos para o estudo do Império como projeto. In Tamas Szmrecsdnyi & José R. do A. Lapa. (orgs.). Hist6ria econdmica da Independéncia e do Império. So Paulo: Hucitec, 1996. CARVALHO, José Murilo de. Pontos e Bordados. Escritos de Historia e Politica. Belo Horizonte, Editora UFMG, 1998. MELLO, Evaldo Cabral de. A Ferida de Narci- so: ensaio de hist6ria regional. Sao Paulo: Senac, 2001. 5 MELLO, Op. Cit. © GUMBRECHT, Hans Ulrich. Production of Presence: what meaning cannot convey. Stanford: Stanford University Press, 2004. * KOSELLECK, Reinhart. Los estratos del tiempo: estudios sobre la historia. Barcelona, Buenos Aires: Paidés, 2001. 11 0S MULTIPLOS ENTRELAGAMENTOS ENTRE IMPERIOS, ESTADOS E REGIOES ria da historiografia, pesquisas comparativas — de autores como Finley e Momigliano, entre outros —, tém sido decisivos.* Da mesma forma que “pedagos” da histéria brasileira ficaram perdidos em territérios excluidos durante 0 processo de formagiio de suas fronteiras geograficas,’ devemos pensar que a definicao simbélica da nacionalidade também excluiu territ6rios e sujeitos que precisam ser recuperados. O ne- gro, a mulher, o marginal, o estrangeiro, os homens que viveram alheios a uma idéia de nado, hegemdnica a partir do século XIX, sio alguns exem- plos de camadas do passado que precisam ser historiados em suas miltiplas experiéncias regionais. Os textos reunidos neste volume certamente nos ajudam a pensar esse conjunto de problemas, particularmente em torno da nogéo de Império. Desde algum tempo, essa categoria vem se incorporando as interpretagdes acerca da América Portuguesa. Apesar de nem sempre se encaminhar para conclusdes comuns, a historiografia parece reconhecer que sua inclusao re- presentou a possibilidade de desvendamento dos mecanismos que articulam as diversas partes dos dom{nios ultramarinos portugueses e a superaciio de esquemas interpretativos baseados na dualidade colénia-metrépole. O artigo “Do dilivio Universal a Pai Sumé: mediagées entre o universal eo local na historiografia erudita lusoamericana (1724-1759)”, de autoria de Iris Kantor, desvenda aspectos das disputas havidas em torno das inter- pretagées acerca da origem da América Portuguesa. Longe de representar meras dissensdes interpretativas entre os eruditos, opondo aqueles que de- fendiam que os dominios lusitanos no Novo Mundo eram um continente jovem aos que, como os s4bios das Academias da América Portuguesa, propugnavam que, por ter tomado parte no Dilivio Biblico, as terras brasflicas faziam parte da Hist6ria européia, as conseqiiéncias extraidas do debate correspondiam a designios bastante praticos. Ao depender do “testemunho” indigena para que a assertiva de que a América também sofrera 0 Diltvio ganhasse validade, a defesa dessa perspectiva pelos académicos da América ° FAVERSANTI, Fabio. “As relagées interpessoais sob o Império Romano: uma discus- sao da contribuicao tedrica da Escola de Cambridge para o estudo da sociedade roma- na”, In Alexandre Galvao Carvalho (Org.). Interagéo social, reciprocidade e profetismo no mundo antigo. Vitéria da Conquista: UESB, 2004. FINLEY, Moses. Escravidéo antiga e ideologia moderna. Rio de Janeiro, Graal, 1991. MOMIGLIANO, Arnaldo. As raizes classicas da historiografia moderna. Bauru, Edusc, 2004. MARQUESE, Rafael B. & JOLY, Fabio D. Entre a escravidéo e liberdade. Sio Paulo: Mindem, 2003. ° SILVA, Alberto da Costa e. A Manilha e o Libambo: a Africa ¢ a escravidao, de 1500 a 1700. Rio de Janeiro: Nova Fronteira; FBN, 2002. ANDREA LISLY GONGALVES E VALDEI LOPES DE ARAUJO portuguesa resultava em conseqiiéncias de natureza metodolégicas, uma vez que se tratava de defender que os testemunhos orais eram t&o validos como outros tipos de registro. O paradoxo representado pelos que defendiam essa vertente historiografica, discriminada como “fabulosa” pelos adeptos de uma historia calcada nos preceitos iluministas, numa tendéncia que se aprofunda a partir do diretério pombalino, era o da capacidade da tradigao oral indigena pre- servar as informacées sobre Noé, mas se mostrar incapaz de reter 0 processo de evangelizac4o promovido por Sao Tomé. O “esquecimento” permitia nao apenas a justificagao do carater evangelizador da colonizacao, como tam- bém a guerra justa sobre aquelas populagées autéctones que se revelaram apéstatas, ao recusarem a conversio realizada por Sao Tomé. Assim, se a insisténcia no estabelecimento de cronologias poderia parecer, A primeira vista, uma discussao restrita ao ambiente douto dos académicos, elas revela- vam designios bastante concretos ao justificarem a escravidao indigena e consagrarem a importancia da América Portuguesa, parte indissocidvel da Histéria européia. Os posicionamentos dos membros das academias da América lusitana apontavam para o fato de que, se nao eram antagénicos em relacdo As dis- cussées travadas no contexto da metrépole, ao menos significavam algum tipo de alteridade apontando para a complexidade das relagdes entre as partes que compunham o Império Portugués. Também revelador das complexas relacdes que se operavam no interior do Império Portugués é 0 artigo de Renato Pinto Venancio “O Alvara portu- gués de 1761 e os escravos do Brasil”. Embasada em argumentos da ilus- tracao, sustentados pelo governo pombalino, a proibig&o da entrada de es- cravos em territério portugués, tema central do trabalho, nao ird encobrir 0 verdadeiro “monumento A moderacao” que representou 0 “lentissimo pro- cesso de extincdo da escravidao em Portugal”. Sem discordar dos autores que afirmam que o trafico africano, mediter- raneo e asiatico desaparece da Europa ocidental no século XVIII, 0 autor chama a atengio para a persisténcia de um microtrafico estabelecido entre a América Portuguesa e o reino lusitano e que ira perdurar até as primeiras décadas do século XIX. Apesar de pouco expressivo do ponto de vista demografico, o transito de cativos da América para Portugal abastecia uma demanda qualificada. Remontando ao século XVI, no Reinado de D. Joao III, ainda no oitocentos a tradigfio de bobos da corte negros mantinha o seu vigor, com “Rosa, an& negra de propriedade de D. Maria I, e Dom Tigao, pertencente ao Marqués de Pombal”. Os africanos preponderavam também entre os trudes das festas populares, com destaque para as touradas e as 13 OS MULTIPLOS ENTRELAGAMENTO STADOS E REGIOES: dangas de pretos, nas quais se parodiavam combates. Mas era como artifices, marinheiros ¢ servigais domésticos que se empregava a maior parte dos escra- vos vendidos da América para Portugal. Sem contar os negros de aluguel, que trabalhavam no embarque e desembarque de mercadorias, como pedreiros, caiadores e até ““‘intérpretes’, levados nos navios destinados a Africa”. Baseando-se em pesquisa de fontes primarias originais, como os regis- tros paroquiais de casamento da Sé de Lisboa e Cartas e provisdes do Con- selho Ultramarino, o autor aponta para o fato de que o espaco colonial era um importante intermedidrio de escravos africanos desembarcados na me- trépole, constituindo um curioso fenémeno que Renato Venancio designa como “cativos, por assim dizer, globalizados”. A aproximar 0 texto “Trafico e familias escravas em Minas Gerais: 0 caso de Sao José do Rio das Mortes (1743-1850)”, de autoria de Afonso de Alencastro Graga Filho e Fabio Carlos Vieira Pinto, do artigo precedente temos 0 tema do trafico de escravos. Desta vez, porém, nao mais sob a perspectiva das relagGes entre o Reino e a América Portuguesa, mas entre Africae Brasil, ou, mais especificamente, entre aquele continente e a capita- nia e a provincia de Minas Gerais e suas repercussdes sobre a formacéio da familia escrava. ‘Tema classico da historiografia brasileira, 0 assunto da constituic&io de lagos familiares entre os cativos ganha com o trabalho de Afonso Alencastro e Fabio Carlos sobre a Comarca do Rio das Mortes uma importante contri- buig&o. Baseado em extensa pesquisa empirica, com destaque para os in- ventarios post-mortem da Vila de Sao José Del Rei entre os anos de 1743 a 1850, as conclusdes dos autores revelam um importante aspecto do tema ao indicarem que independentemente do comportamento do trafico de escra- vos entre Africa e Brasil a tendéncia que se manifesta, na regido estudada, é a da preservagaio dos casais nos momentos da partilha de bens, observando- se, porém, uma tendéncia contréria no que diz respeito a prole dos casais escravos, em boa proporgdo, separada dos pais apés a morte do senhor. Tal constatagao certamente surpreendera os leitores, acostumados a informagao de que nao havia, pelos riscos implicitos em tal iniciativa, uma demanda expressiva por criangas cativas. A explicacéo para o fato, esclarecem os autores, deve ser buscada “na formacao das redes de parentesco e compadrio, que poderiam ajudar na elucidagaio das separagdes de filhos escravos em idade imprépria para a exploragio do trabalho”. Nao se esgota, porém, no tema da familia escrava a contribuicao dos autores para a elucidacao de questées-chave da historiografia sobre escravi- dao. Est&o presentes, sempre embasadas em pesquisa em fontes primdrias originais, discussdes em torno da forma de recomposic¢io dos plantéis na 14 ANDREA LISLY GONGALVES E VALDEI LOPES DE ARAUJO capitania e na provincia mineiras, se produto do tréfico internacional ou se resultado da reprodugao endégena dos plantéis; as regides de origem dos cativos africanos, dentre outras. A Provincia de Minas Gerais também é 0 recorte espacial privilegiado pela andlise de Ana Rosa Cloclett Silva “(Re)inventando a Monarquia: o modelo de Estado Dindstico na transi¢ao para a modernidade politica minei- ra (1821-1831)”. Em seu trabalho, Ana Rosa contempla a trajetéria do que se vem designando como “De um império ao outro”. Assim, se os dois primeiros textos que abrem este livro atém-se a aspectos das complexas relaces no interior do Império lusitano, Ana Rosa centra na conjuntura em que diferentes projetos politicos se enfrentam no encaminhamento da crise do Antigo Regime Portugués na América. A complexidade desses conflitos no se circunscreveria ao “embate entre as novas idéias do constitucionalismo ea fidelidade A metrépole e ao Antigo Sistema”, mas incorporaria as diver- géncias “acerca do novo arranjo politico constitucional entre os préprios liberais da provincia”. No centro do debate, a discusso se a legitimidade do Trono de Pedro I residia no fato de que “fora aclamado Imperador pela Constituicéo” ou “por se herdeiro do Trono Portugués”. Um bom exemplo de como a nova histéria politica tem resultado na revisao de temas consagrados da nossa historiografia, o estudo empreendido por Ana Rosa Cloclett se insere, com inigualavel sucesso, entre os esforgos de reinterpretagao em torno das nogées de Estado Nacional, estabelecidos nos iiltimos anos. Também, em grande parte, fruto da renovaco da histéria politica, 0 recurso ao método da reconstituigéio de biografias individuais ou coletivas tem colaborado para o redimensionamento do papel dos sujeitos no proces- so histérico, antes muitas vezes subsumidos por estruturas descarnadas. Preocupagées desse tipo guiam a interpretacéo de Marcos Ferreira de Andrade. Assim como no artigo precedente, 0 tema da formagio do Estado nacional brasileiro encontra-se no centro do debate. A opcdo, desta vez, porém, é pela abordagem da trajetéria de uma importante familia tendo como cendrio a Comarca do Rio das Mortes. A trajetéria da familia Junqueira, registrada pelo autor em “Unidade, autonomia regional e construgdo do Estado nacional brasileiro: a participa- Gao das elites do Sul de Minas Gerais (1831-1842)”, inicia-se com a chega- da do portugués Joao Francisco, natural de Sao Simao da Junqueira, Portu- gal, A Comarca sul mineira, por volta de 1750. A partir dai, so analisadas as estratégias de enriquecimento e de projecao politica que levaram a conso- lidagao do nome da familia. A opc&o metodolégica adotada por Marcos Andrade revela todo o seu potencial no transito entre a ago dos persona- 15 OS MULTIPLOS ENTRELAGAMENTOS ENTRE IMPERIOS, ESTADOS E REGIOES gens e 0 contexto no qual se movem, apontando a consolidag&o dos interes- ses relacionados ao trafico interno de escravos — assunto que ainda aguarda aatencao dos historiadores —, as mobilizagées politicas de escravos nos anos iniciais da Regéncia, a projecao politica na Corte dos setores voltados para 0 abastecimento interno, num processo reconhecido, a partir dos trabalhos de Alcir Lenharo, como as “Tropas da moderacao”, além de langar luz sobre as elites agrarias participes do movimento politico liberal de 1842. O transi- to entre o particular e o geral permite que o autor se ocupe de questdes centrais, dentre as quais “Em que medida as demandas impostas pelas elites proprietarias regionais conferiam ‘um determinado perfil a uma determina- da agenda’ para o Estado Brasileiro”. De autoria de Ronaldo Pereira de Jesus, o artigo “Chrispin, Pedro, Silvino e Miguel: visées da Monarquia” se circunscreve as décadas finais do Brasil Imperial. Completa-se, assim, 0 percurso de “Um império ao outro”. Seu tema central, as visdes correntes que as pessoas comuns manifestaram sobre o regime mondrquico. Se, entre o que se convencionou chamar de construtores da Nagi, as definicdes da Monarquia Imperial abrigavam, de acordo com a localizagao no espectro politico, heranga dindstica e Monar- quia constitucional, como bem nos mostra Ana Rosa Cloclett, no presente artigo tem-se o esclarecimento das construgdes mentais populares acerca do regime Monarquico, num processo de longa duracgao, no qual se nota a “convivéncia real ou imaginaria das tradigdes portuguesas e africanas, referenciadas no passado colonial mais longinquo”. Partindo de uma documentagao original, que lhe permite “analisar as atitudes, estratégias (de conduta e discursivas) e expectativas sustentadas pela maioria da populacao diante da Monarquia no periodo final do impé- rio”, o autor combina o estudo das mentalidades das pessoas comuns, em torno da Monarauia, a anlise estrutural da sociedade oitocentista, cujo ar- caismo explicaria a natureza do poder politico assentado no mandonismo que atuava como reforco, sobretudo da faceta da representagao do governo monérquico como um Estado provedor. Se no texto de Iris Kantor, que abre este livro, nos s4o apresentados os desafios impostos pela descoberta do Novo Mundo aos modelos geograficos, cronolégicos e etnograficos da Antiguidade Classica, vigentes na Europa Moderna, em “Impérios Antigos, Modernos e Contemporaneos”, de Fabio Adriano Hering, nos deparamos exatamente com a forma pela qual os mo- delos dos Impérios da Antiguidade sao apropriados, no atual mundo unipolar, pelos teéricos norte-americanos, ndo através de uma ingénua “equagao line- ar genética entre a Grécia Classica e os Estados Unidos contemporaneos”, mas sim como “estratégia na conquista do ‘consentimento’ (em termos 16 ANDREA LISLY GONGALVES E VALDEI LOPES DE ARAUJO gramscianos) para uma hegemonia de Estado que também nunca prescindiu de expedientes coercitivos”. Problemas semelhantes aos levantados por Cel- so Taveira, no artigo que encerra esta coletanea “Da primeira A terceira Roma: considerag6es acerca do papel de BizAncio na sucesso histérica e geo-politica de centros de poder imperial”. Talvez chame a atengo o fato de que exatamente os autores especializados em Histéria Antiga e Medieval tenham se proposto a dar conseqiiéncias, de forma a mais transparente possivel, a idéia de que a hist6ria é feita de acordo com os desafios impostos pelo presente. No caso de Celso Taveira, seu interesse recai sobre “o carater regionalmente localizado de alguns graves problemas da histéria atual e sua insercio no quadro macro- regional envolvendo o conflito latente entre Ocidente capitalista, por um Jado, e por outro o Leste europeu e o Oriente islAmico, regides que nao atingiram o molde ocidental de desenvolvimento econémico muito avangado”. As contribuigées teéricas e metodolégicas, resultantes da abordagem proposta, para a histéria comparada, para a definigdo dos conceitos de tem- po, espaco e ideologia sao inequivocas. Nao menos importantes sao suas contribuigdes para a construgao teérica acerca do Estado Absolutista, a par- tir da experiéncia das sociedades orientais. Contribuicao das mais bem vin- das, principalmente quando o debate em torno do assunto ganha corpo, evidenciando os limites do Império lusitano — abordado em mais de um capitulo deste livro - em um momento em que 0 “caso” portugués nao é& mais encarado como precursor dessa forma de organizacao politica. A multiplicidade dos temas, espacos e periodos abordados nos diversos artigos correspondeu, por fim, a estratégia de buscar validar o “programa” que presidiu a realizagao do “I Simpésio: Estado, regio e sociedade” e que se tem mostrado, conforme destacado nos pardgrafos iniciais do presente texto, uma das chaves para a renovacdo dos estudos histéricos: realgar as telagdes entre as dimensées mais gerais e universais, associadas a idéia de impérios, e as dimensdes mais concretas, ligadas 4 nogio de lugares. Assim procedendo, a regiaio deixa de ser encarada apenas em sua dimensao geo- grafica, passando a representar os lugares onde repercutem, no mundo co- tidiano, os processos totalizantes e homogeneizadores. 1%,

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