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FERNANDO HENRIQUE CARDOSO AS TRADICOES DO DESENVOL\/IMENTO-ASSOCIADO* A capacidade preditiva e a forga criadora dos modelos de interpretagéo propostos nas ciéncias estéo intimamente * ligados a sensibilidade que eles tém para detectar os proces- sos sociais novos. Se, como se sabe, a dificuldade metodolé- - gica fundamental nas ciéncias do homem consiste na elabo- ragao de instrumentos de anélise que expliquem, tanto os mecanismos de reprodugao das sociedades como os modos de sua transformacao, é por ai também que se deve medir a adequagao analitica e o alcance interpretative dos esquemas explicativos novos. Ser4 que as andlises baseadas na perspectiva da dependéncia, tao em voga nos tiltimos anos, foram capazes de cumprir estes requisitos no estudo das formas de crescimento econdmico e de dominacdo politica na América Latina? Eu temo que muitos dos estudos etiquetados como partes integran- tes de uma “teoria da dependéncia” tenham pouco a pouco deixado de lado a preocupagdo com a caracterizag3o tanto nas formas de repro- dugdo social quanto com os modos de transformacao que existem em cada uma das modalidades basicas de dependéncia. Numa espécie de marcha batida na diregdo da volta 4 ideologia, parte da literatura sdcio-econdmica sobre o tema acabou por restabelecer o império da repeticao. Com o af correto de denunciar a exploragio, voltou-se a conceber as relagdes imperialistas e 0 processo de acumulacao capita- lista nas economias periféricas de uma forma que, como no provérbio inglés, jogou fora a crianga com a dgua do banho. Os esforgos tedricos e analiticos feitos para mostrar o que ha de especifico e novo nas formas atuais de dependéncia como que se foram esboroando em beneficio de imagens cheias de atrativos faceis, mas enganosas: “desenvolvimento do subdesenvolvimento”, “sub-imperialismo”, “lunpen-burguesias”, “revo- lugdo dos marginais” etc., so idéias que, embora apontem As vezes para aspectos importantes da especificidade do processo de industriali- zagado da periferia e das formas de dominagdo que lhe sao correlatas, induzem também a anidlises distorcidas. O pior é que a distorgdo analitica pode ter conseqtiéncias praticas muito graves. Leva, as vezes, 4 proposi¢ao de politicas desastradas para os que desejam transformar a realidade em beneficio das classes e grupos sociais dominados. O exemplo mais dramatico de uma interpre- tagdo equivocada — e que pouco teve que ver com as analises sobre a dependéncia pode ser dado com o caso de Debray que se precipitou numa interpretagéo apressada sobre a América Latina (que foi vista como homogeneamente pobre) e equivocada quanto a natureza dos processos contemporaneos de exploracao imperialistas (que foram con- 43 cebidos como se estivessem baseados exclusiva ou principalmente na exploracao colonialista de matérias-primas e produtos primérios). A andlise politica resultante ndo poderia ser outra: a acdo redentora de grupos organizados, redimindo a indigéncia das maiorias marginadas e exploradas dever-se-ia opor 4 explorago de uns poucos, sustentados pelo brago armado estrangeiro de uma patria ocupada por seu proprio exército. A capacidade de reagdo dos grupos dominantes locais contra © que no jargio politico do Continente a direita batizou como “terro- tismo” e “subversdo” foi subestimada, assim como ficou na penumbra a possibilidade (que se efetivou) de que setores sociais nas classes médias e inclusive entre os trabalhadores se dissociassem das forgas tevolucionérias e passassem a dar sustentacao, pela apatia ou pelo consentimento aberto frente a agdo repressora, a0 que se supunha ser, na andlise debrayista, os bragos de um “exército de ocupagao”. Em vez da luta popular pela libertagdo nacional e contra a exploragdo social, instalou-se uma espécie de reagdo termidoriana no Continente, por tras de cujo escudo, ativaram-se as forgas econdmicas e com elas comega- ram a beneficiar-se grupos sociais que “teoricamente” deveriam opor-se ferozmente a essa forma de dominagao. Por que? Ser4 que sé os estudantes e intelectuais radicalizados, com 0 apoio de um ou outro nucleo de trabalhadores ou de militares, tém a consicéncia real da situagaéo e todos os demais sao ilusos e oportunistas? Serd que as revolug6es sio um problema de consciéncia? Ou haver4 que inquirir mais a fundo sobre o processo social e buscar formas de andlise capazes de propor politicas que em vez de arderem nos circulos candentes da imaginagdo generosa do romantismo, redescu- bram as contradigdes e oposigdes no sitio em que elas podem, pela forca da realidade, transformar o impulso generoso da denincia em forga organizada que expresse 0 ponto de vista dos que s4o social e politicamente oprimidos? Mas, como é possivel redescobrir uma pratica politica que se abra para o futuro, e portanto que induza a negagdo da reprodugdo das formas prevalecentes de dependéncia, sem uma andlise correta das formas atuais de dependéncia ¢ imperialismo? E neste particular eu creio que é preciso indicar, como hé tempos o fez Stavenhagen com seu penetrante ensaio, as novas teses equivocadas sobre a dependéncia e o imperialis- mo na América Latina. Sem o afa de esgotar o tema, eu diria que se devem reconhecer e alinhar pelo menos algumas dessas teses erréneas: Primeira Tese: 0 desenvolvimento capitalista na periferia é invidvel. Nao s&o poucos os textos que sustentam, por motivos diversos, a 44 ‘AS TESES EQUIVO. CADAS inviabilidade do crescimento capitalista na periferia. Mesmo economis- tas experientes e competentes tiveram momentos de tentagdo para alinhar-se ao lado dos que defendiam a fatalidade da estagnacdo na América Latina. Na esquerda latino-americana esta tese, que é uma espécie de reminiscéncia da ideologia narodinik (dos populistas russos) tem muitos adeptos. Por que nado pode haver desenvolvimento capita- lista? As razGes alegadas so varias; as principais so as seguintes: a) pela falta de mercado interno, o qual, por sua vez, 6 concebido como reduzido em fungdo de obstaculos estruturais que nao foram superados. O primeiro e principal deles seria a estrutura da propriedade fundidria que, sem uma reforma agraria profunda, prenderia a popula- ¢do rural a formas tradicionais de trabalho e impediria a expansio do mercado. Ao lado disso, a ‘concentragao crescente de rendas colabora para 0 estreitamento do mercado. O segundo obstdculo estaria na industrializagao “capital intensive”, baseada na poupanga da méo-de-obra, que se juntaria 4s anteriores causas estruturais para conspirar contra a possibilidade da expansao real do capitalismo. E ainda é preciso contar com a marginalizago crescente da populagdo urbana (e também rural), que estaria carecendo de meios regulares de trabalho, inchando as cidades, mas ndo contribuindo para ampliar o mercado, b) pela insuficiéncia dinamica do capital. Ou seja, porque a capacidade de poupanga interna é pequena. As vezes se atribui ao comportamento “consumistico” da burguesia um papel de relevo na baixa taxa de acumulacao. Como em toda justificativa ideol6gica, também neste caso ha gréos de verdade nos motivos alegados para visdo narodinik contempornea. De fato, a forma que o capitalismo periférico adota expressa a existén- cia de contradigdes sociais importantes que se agucam com o desenvol- vimento capitalista. Mas daf a elevar a categoria de Jei inevitavel a de que s6 pode haver desenvolvimento se houver harmonia e solugfo de conflitos, h4 um passo ilegitimo que, faz com que o pensamento cientifico tropece e caia na ideologia. J4 os classicos que analisaram o capitalismo, e os comentadores do inicio do século que se opuseram as interpretagdes narodinik, mostraram que a existéncia de contradicdes nao indica um impecilho para o capitalismo, mas uma condigfo de seu desenvolvimento. E nem sequer é justo pensar que a contradigao que se expresse, por exemplo, na miséria das populagdes marginais é aquelas que, por si mesma, aponte as possibilidades mdximas de negacZo da expansdo capitalista. E possivel que em alguns paises latino-americanos 45 ocorra a destruigdo social e politica destes grupos sem que desse processo derive o fim da expansao capitalista. Toda economia capitalista e ndo sO a periférica cresce contradito- riamente, criando problemas sociais, politicos e econdmicos. Assim por exemiplo, strictu sensu, a marginalidade urbana é conseqiiéncia de uma certa fase do desenvolvimento capitalista, em condig6es sociais dadas. Mas a partir dos efeitos negativos do capitalismo dependente sobre a oferta de empregos a visdo catastrofista ndo pode ser generalizada para todos os paises, nem para todas as fases dos ciclos de expansio capitalista. Deixe-me ilustrar com um caso extremo e favoravel ao argumento: a Argentina importa mao-de-obra. Por outra parte as desigualdades tegionais, por certo existentes, no sao tao grandes a ponto de se poder pensar que inexiste a unificacéo do mercado nacional naquele pais, sob égide capitalista. Tomemos agora outro caso de condigdes contrérias ao argumento: no Brasil — pais de grandes desigualdades tegionais e populagGes pobres — na década de 1960 a 1970, houve uma expansdo real no setor de empregos industriais e hoje existe (por razdes tépicas) falta de mdo-de-obra mesmo desqualificada no setor de cons- trugdo civil, por exemplo, nos grandes centros urbanos. Quer isto dizer que o capitalismo dependente tera condigées para resolver os problemas de emprego da maioria da populac4o? Claramen- te, nfo. Nem o dependente, nem o capitalismo nos pajfses centrais oferece condigdes estaveis de pleno emprego. Por sua natureza, trata-se de um sistema cfclico que absorve e libera mao-de-obra. E também por sua natureza este processo ndo se dé homogeneamente no espago: ao mesmo tempo em que pode haver escassez de mao-de-obra em Sao Paulo, haverd excesso de oferta em Sao Luiz do Maranhdo, por exemplo. Entretanto, dado o cardter progressivo e cumulativo do sistema capitalista, pagando-se o prego do esmagamento de geragdes e de segmentos importantes das classes exploradas, o que é proprio deste sistema € sua capacidade de crescer em espiral, transformando as relac6es sociais de producgdo como conseqiiéncia do aumento do pata- mar de acumulagdo e do desenvolvimento das forgas produtivas. Esse processo nao ocorre homogeneamente em toda a periferia. Ele comega a realizar-se (de forma incompleta, como adiante exporei) nos paises onde a internacionalizacdo do mercado interno avangou mais. Mas é inegdvel que o avango do capitalismo no campo, por exem- plo, destréi a economia camponesa da subsisténcia, tende a diminuir o peso das formas tradicionais de exploragao do trabalho e a criar uma classe de assalariados agricolas (os béias-fria). De igual modo cria um 46 operariado mais numeroso, como adiante se vera, provoca uma diferen- siagGo nos setores médios, expandindo o nimero de ocupagdes do tercidrio moderno, etc. Assim como nao é correto generalizar para todos os paises da periferia 2 estagnagao eventual de alguns deles (e a forma distinta de dependéncia a que podem estar submetidos, segundo o grau de avango da industrializacdo baseada na internacionalizagéo do mercado, ou, a0 contrario, a preservagdo da relagdo de produtores e exportadores de mercadorias primérias), seria equivocado nao ter presente que os ciclos de auge também levam ao recesso. S6 que este recesso ndo deve ser transformado de fendmeno conjuntural em aspecto permanente que caracteriza 0 capitalismo “na periferia dependente”. Permanente é 0 cardter ciclico da acumulacio capitalista e a tendéncia & concentragao da renda, cujos efeitos se acentuam quando o estado nao promove politicas compensatérias. Segunda Tese: 0 capitalismo dependente esté baseado na exploragdo extensiva da mao-de-obra e preso a necessidade de sub-remunerar 0 trabalho Este é o engano correlato com o anterior. Faz-se uma ligacdo indevida entre fases distintas e processos sociais que embora concomi- tantes num momento dado, nao guardam mais, como poderiam ter guardado, no momento anterior, uma relagéo de necessidade. Geral- mente esta tese esta por tras das idéias, defendidas por Frank, da acumulagdo do atraso, do desenvolvimento do subdesenvolvimento. A versio mais sofisticada dela pode ser encontrada em Rui Mauro Marini em seu estudo sobre “Dialectica de la Dependencia” '. No fundamental, se sustenta que ¢ proprio do capitalismo depen- dente explorar a mao-de-obra abundante; isto tem como conseqiiéncia positiva para a acumulagdo nos paises centrais o fato de que se exportam produtos alimentares baratos (os quais barateiam, por sua vez, © custo de reprodugao da mao-de-obra no centro e permitem intensificar a acumulagdo nas maos dos capitalistas). A mesma dialética explicaria a funcionalidade do colonialismo interno e da marginalidade social? para a acumulacdo capitalista. Para os que se extremam nesta tese, as conseqiiéncias limitantes desse estilo de desenvolvimento esta- tiam em que © consumo individual dos trabalhadores, é restrito dado que a contradigdo essencial da dependéncia latino-americana repousaria na acumulagaéo baseada na super-explora¢éo do trabalhador. Sendo assim, a circulagdo do capital e a realizagdo da mais-valia seriam freadas pela forma que a super-exploragao adota. Correlata a esta tese, estd a idéia de que 0 controle salarial e a 47 distribuigdo regressiva da renda so condigdes essenciais e permanentes para a acumulagao capitalista, o que levaria a explicar o desenvolvimen- to do subdesenvolvimento, a miséria crescente, etc.. Estas teses comple- mentam as anteriores, falsas em sua formulagao indeterminada, de que haveria uma tendéncia a estagnacdo, pela falta de mercado consumidor. A saida capitalista para essa situagdo seria a expansdo das exportagdes € o sub-imperialismo. Por tras da aparente racionalidade e diddtica da explicagdo, escon- dem-se equivocos quanto 4 natureza do processo capitalista de produ- ¢do. Marx ja havia mostrado, ao criticar Ricardo, que o essencial para a acumulacdo capitalista ndo é a concorréncia entre trabalhadores que leva a baixa relativa crescente do custo da forga de trabalho, mas sim que este regime produtivo esté baseado no que ele caracterizava como a “tendéncia 4 elevagao da taxa de composic¢ao organica do capital”. Ou seja, a introdugdo crescente de tecnologias, potenciando as forgas produtivas, aumenta a parte do capital chamado constante em contra- posigao a parte chamada varidvel (para o pagamento de saldrios) & medida em que avanca 0 processo de acumulagao. A concorréncia entre os capitalistas e a introdugdo de novas tecnologias, juntamente com a ampliagdo crescente da escala de acumulagao é que garante o dinamis- mo do sistema. E verdade que em certas etapas (nos perfodos de acumulagéo inicial), a extensdo da jornada de trabalho joga um papel importante na acumulagdo. Por isso pode ter razdo Francisco de Oliveira quando chama a atengdo para o fato de que a baixa produtividade do trabalha- dor do setor terciério ou a manutencdo de formas de trabalho baseadas em relagdes de producdo nao tipicamente capitalista-industriais, podem ser funcionais para a acumulagao. Mas generalizar este raciocinio, para outras fases, quando a dindmica da acumulagdo do setor mais avancado repousa na exploragdo clara da mais-valia relativa e no aumento da taxa de composigao organica do capital, constitui um anacronismo. Depois de implantado um setor capitalista avangado, sua dinamica (que pode ter-se beneficiado na fase inicial com as reservas de mao-de-obra e os bolsdes de pobreza) nfo depende mais do desenvolvimento do subde- senvolvimento, mas, ao contrdrio, depende da criagdo real de um mercado de consumo capitalistico. Este ndo se compde apenas pelos gastos dos trabalhadores, mas também pelo consumo dos capitalistas e, especialmente, das empresas, do Estado e das classes ligadas ao setor tercidrio, Assim, nfo dialetizando-se a anélise, transforma-se uma fase do ciclo expansivo ou uma etapa da acumulacdo em condi¢do “‘necessdria” da etapa ou fase seguinte, e perde-se a especificidade do que é novo no 48 processo social. Criam-se dessa forma “leis” que se fixam no arsenal ideolégico, dificultando a caracterizago adequada da reatidade e, por conseqliéncia, impedindo-se a proposicéo de politicas realmente ade- quadas para sua transformacao. Para evitar leituras equivocadas do argumento que estou sustentan- do, convém frisar alguns pontos basicos: O erro nas interpretagdes que estou criticando ndo esté em apontar a existéncia de um mercado estreito ou as distorgdes que a estrutura da propriedade agraria ocasio- nam na capacidade produtiva: esta em listar estas caracteristicas como fatores que tornam invidvel o desenvolvimento do capitalismo-depen- dente. Eu sustento que eles constituem condigdes que dao forma a especificidade desta modalidade de capitalismo e que acentuam as contradigées da economia capitalista no seu desenvolvimento na perife- ria. Por outro lado, nado estou advogando a tese apologética de que “com o tempo”, ser4 possivel promover uma redistribuigdo adequada da renda, posto que a exploracGo da mais-valia relativa permitiria a quebra da relagdo entre custo de reprodugdo da mdo-de-obra e acumu- lagdo. Continua a existir uma relagdo entre o setor industrial-monopo- lico e 0 competitivo da economia, pela qual os salérios minimos pesam fortemente e para a determinagdo destes as formas pré-capitalistas de exploragéo contam de modo significativo, para néo mencionar que pesam nele também a oferta excedente de mao-de-obra. Porém, a especificidade da etapa de “internacionalizagao do mercado interno” estd justamente na emergéncia dos setores monopdlicos e nao na gencralizacéo da cxploragdo baseada na mas valia absoluta, Esta foi importante (como de resto no capitalismo central também) numa fase inicial da acumulagao capitalista, mas suas caracteristicas se redefinem e passam a ser submetidas as peculiaridades da etapa posterior da acumulacdo. Continua a existir a exploragéo da mas valia absoluta, mas é simplista explicar 0 avango da acumulacdo como se as formas mais complexas de exploragdo nao existissem. Por fim, convém repetir que a utilizagdo do argumento que estou sustentando também pode ser incorreta e pode levar a equivoco simé- trico e oposto aquele que estou criticando: pode-se perder a especifici- dade da forma dependente do capitalismo periférico. De fato, é preciso voltar constantemente ao argumento conhecido que realga as diferengas entre a acumulacdo nas economias centrais e nas periféricas: a concor- réncia entre os capitalistas (que explica o crescimento da taxa de composig¢ao organica de capital) leva — no caso das economias depen- dentes — a ampliar a demanda de produgao de bens de produgao nas economias centrais. E, como a industrializagéo da periferia deu-se 49 concomitantemente com a internacionalizagéo do sistema produtivo capitalista, 0 barateamento do custo de reprodugdo da forga de traba- Iho foi conseqiiéncia dos investimentos estrangeiros com o avango tecnolégico que eles trazem, muito mais do que da pressio local de falta de mao-de-obra. Tudo isto acentua o cardter contraditério (po- rém, insisto, dindmico) do desenvolvimento-associado. Terceira Tese: as burguesias locais deixaram de existir como forga social ativa. Com a mesma ligeireza com que se inviabiliza a expansao do capitalismo nas economias dependentes ou se articula uma argumen- tacdo aparentemente racional para demonstrar que o avango do capita- lismo depende do atraso crescente, em nome de elaboragGes discutiveis sobre a forma que adota o capitalismo periférico, se descarta qualquer papel na cena historica para as burguesias locais. Elas passam a ser lunpen, incapazes de acumular racionalmente, dilapidadoras no consu- mismo, cegas a seu “real interesse”’. Aqui o engano é quanto 4 distingdo entre um processo real e um processo ideolégico. O que deixou de ter qualquer fungdo foi a “‘ideo- logia do desenvolvimento nacional burgués’’, ndo as burguesias locais. Eu proprio fiz o que esteve a meu alcance, em trabalhos escritos desde 1962, para demonstrar o infundado das teses que viam na politica das burguesias nacionais a mola para o progresso econdmico e social. Os fatos demonstraram, em toda a América Latina, que 0 comportamento teal das liderangas e do grosso do empresariado local nao sustentou as te- ses reformistas quanto as modificagdes agrarias que se julgava serem neces- sdrias para ampliar 0 mercado; nem sustentou a politica de fortaleci- mento dos centros locais de deciséo e de transformacdo do estado em instrumento de oposig¢do 4 penetragao econdmica estrangeira. Mas estas politicas ndo correspondiam aos interesses das burguesias locais, tal como elas os definiam, e sim ao idedrio politico do nacio- nal-populismo. Os itens anteriores j4 indicaram as limitagdes que este tipo de politicas implicam quando s4o pensadas como se fossem condi- ¢do necessaria para o avango do capitalismo. Eles podem ser até muito importantes (como é a igualdade social) mas por outras razOes e para outras classes, que nao as burguesias industriais locais. Entretanto, reconhecer que as burguesias nacionais ndo se compor- tam como o idedrio nacional-populista prescreve, nao deve implicar em desconhecer que a forma adotada pelo desenvolvimento-dependente beneficia as burguesias locais e promove sua expansdo, a condi¢do que elas se associem ou fiquem “enfeudadas” aos monopélios multinacio- nais e ao Estado. Com estas limitagdes, as burguesias nacionais conti- 50 nuam a desempenhar um papel ativo na dominagao politica e no controle social das classes submetidas. A analise das politicas do que eu chamo de “‘burguesias internacio- nalizadas”, incluindo neste conceito tanto os setores locais dos mono- polios multinacionais como os empresdrios nacionais, a eles associados ou “enfeudados” continua a ser um tema importante. Mormente quan- do a forma politica de dominagdo que emerge com maior forga nos paises em fase de desenvolvimento-dependente, implica tanto num burocatismo-autoritario como no remanejamento dos aparatos ideoldgi- cos e politicos das burguesias internacionalizadas para buscar um lugar ao sol no solo do Estado. Afirmar que existe acumulacao capitalista e negar importancia as burguesias é uma contradicdo formal. Isto sé seria possivel se fosse verdade que a forma predominante de acumulacdo estaria assegurada exclusivamente pelo imperialismo (0 que nado é certo) ou por um capitalismo de Estado. Esta tltima hipotese, que merece um item a parte, precisa ser melhor discutida. Quarta Tese: a penetragéo das empresas multinacionais leva os Estados locais a uma politica expansionista A medida em que o processo de desenvolvimento-dependente prossegue, ele implica na reordenagaéo da economia e da politica de forma noya e complexa. O eixo dinamico do capitalismo periférico se constitui ao redor da “internacionalizagao do mercado interno”. Como este processo nado ocorre num sO pais, mas em varios, e como essa internacionalizagéo se faz para atender aos reclamos da forma produ- tiva gerada pelo capitalismo avangado, que repousa nas chamadas em- presas multinacionais, a redefinigéo do espago econdmico e politico torna-se pega necessdria da expansao capitalista-dependente. Sofreram drdsticas redefinigdes de sentido os mecanismos de inte- gracdo regional, como a ALALC ou mesmo como o Mercado Comum Centro-Americano, que foram inicialmente o resultado de politicas alimentadas pelas ilusdes nacional-desenvolvimentistas. Por causa do tamanho reduzido dos mercados nacionais, procurava-se estabelecer uma espécie de “patria latino-americana” (idéia que subsiste no caso do Mercado Andino). Depois de anos de hibernagdo e desinteresse por parte do empresariado, os mecanismos de integragao econémica e seus bancos, passaram a reativar-se. $6 que agora eles obedecem diretamente as politicas de reorganizaco do espago econdmico e A diviséo interna- cional do trabalho que interessam as empresas multinacionais. Bem antes que a consciéncia critica da regido percebesse 0 que estava ocorrendo, as empresas estrangeiras comegaram a instalar fabricas cujo tamanho visava parcialmente a uma produgdo internacionalizada de partes complementares de produtos finais. Esta tendéncia, real e inequivoca, foi comprovada no caso do Brasil por um cuidadoso estudo no qual se mostra que existe, por um lado, uma relag&o entre o volume das exportagdes e o tamanho das empresas e, por outro lado, entre o tamanho das‘empresas e 0 controle delas pelas multinacionais. Tudo isso mostra que a exportacdo de manufaturados do Brasil serve, em parte, aos setores internacionaliza- dos. As filiais estrangeiras (que, se bem sejam maiores que as concor- rentes brasileiras, representam algo assim como apenas 1% do capital global do conjunto de cada multinacional) levam ébvias vantagens na concorréncia com as nacionais porque recorrem 4 tecnologia das matri- zes, tém acesso rapido a recursos financeiros importantes e sua amplia- ¢ao corresponde a um risco menor para os acionistas do que no caso das empresas controladas localmente °. Contudo, no conjunto, a dinamizagdo das exportagdes nos anos tecentes nao se fez apenas em beneficio dos produtos controlados por empresas multinacionais. Estas, como se disse, controlam especialmente os setores de alta tecnologia nos quais existe grande concentracdo industrial, mas “a maior parte das exportacGes industriais do Brasil provém dos setores menos concentrados” *. Portanto, se a exportagdo serviu as multinacionais nfo deixou de beneficiar, e mesmo, em certo periodo de forma preponderante (pelo menos em certo periodo), 4 burguesia local. Este ultimo caso ocorreu, por exemplo, quanto 4 exportagao de téxteis e calgados, que permitiu a utilizagdo da capaci- dade ociosa destes setores industriais. Por outra parte, o governo tem promovido ativamente as exporta- gdes, como se verd na parte subseqiiente desta comunicacdo. Neste caso, a quem serve o Estado? * Estaré ele constituindo um patamar para, em termos tipicamente sub-imperialistas, servir 4s empresas multi- nacionais? Tera como propésito (ou como resultado) o fortalecimento dos setores da burguesia local de menor produtividade relativa que as multinacionais e que estariam sofrendo as conseqiiéncias de um “es- trangulamento” do mercado interno? Ou, quem sabe, estara servindo interesses politicos e ideais nacional-estatistas de formacdo de poténcias que utilizam a uns e outros setores (nacionais ou externos) para atingir seus objetivos? A essas indagacdes (algumas das quais discutirei adiante) se tem respondido em forma mecdnica afirmando-se que apesar das diferencas notérias entre a situagdo de dependéncia e a dos paises centrais, alguns estados latino-americanos (Brasil e México especialmente), ao mesmo tempo que servem objetivamente a necessidade de expansdo das 52 multinacionais, repetem processos (como a alegada intensificag@o de produgdo bélica® que s6 teriam sentido se houvesse uma classe social local — uma burguesia ov uma burocracia — capaz de agir realmente como sustentdculo de algum tipo de expansionismo econémico-poli- tico, Isso para nao mencionar que jamais se discute, neste contexto (dada a inverossimelhanga da hipétese) se existe investimento externo de monta de capital pablico ou nacional feito pelos paises chamados sub-imperialistas, Em suma, antes de adjetivar, convém avaliar com mais informacdes os processos em marcha para explicar o sentido das exportagdes de manufaturados, seus alcances e as politicas estatais que est@o imple- mentadas na América Latina. Na parte seguinte desta comunicacado apresentarei dados a respeito. Quinta Tese: 0 caminho politico do Continente esta frente a uma encruzilhada — “socialismo ou fascismo” A interpretagdo de que o capitalismo é inviadvel na periferia e portanto, de que ndo existe um desenvolvimento-dependente’ esta estreitamente ligada 4 visdo politica baseada em que ou bem uma revolugao vitoriosa constréi o socialismo para possibilitar a potenciagao das forgas produtivas e o desenvolvimento social, ou se marchara para 0 fascismo. A primeira parte do raciocinio é correta, mas em geral. Ou seja, também nos paises centrais, para alcangar metas sociais igualitarias, o capitalismo é um impedimento. Mas nas duas situagdes, com as contra- digdes que lhe sao proprias e com a exploragdo capitalistica tipica, o processo histérico tem mostrado que o regime capitalista se diversifica e se amplia. Seria mais facil a implantagéo de uma ordem igualitaria se houvesse freios puramente econdmicos para a expansdo capitalista. Por certo esta, como ja disse e é sabido, avanca com crises. O crescimento capitalista é desigual. Em varias etapas e ciclos implica numa explora- co brutal dos trabalhadores, mormente nos paises da periferia, que tentam percorrer de um modo diverso caminhos ja trilhados pelos paises centrais em outras épocas. Pode-se também especular sobre os limites ao erescimento, como até mesmo correntes conservadoras o fazem. Duvida-se hoje da existéncia de um progresso sem limites, do tipo do que era sustentado pelo pensamento sobre o capitalismo produzido no século XIX. Mas até hoje a experiéncia histérica mantém valida a verificagio de que essas condigdes negativas por si s6 sao insuficientes para assegurar uma transformagéo basica no regime produ- tivo e no sistema social. Os caminhos para alcangar uma transformagao 53 deste tipo sdo politicos e nao se desligam das forgas sociais ativadas pelo proprio processo de expansao-capitalista. Ao voluntarismo que esteve (e ainda esté) em voga na consciéncia socialista latino-americana (e européia, sempre que se refira ao Terceiro Mundo...), somou-se a interpretagdo catastrofista ligada a idéia da estreiteza do mercado, da incapacidade de absorcao social, da falta de crescimento do emprego etc., que levariam as classes dominantes locais (com apoio externo) a adotar politicas e formas organizatérias fascistas. O processo histérico recente (dos ultimos dez anos, incluindo o que ocorre depois da recente tragédia de uma das mais promissoras tentativas latino-americanas de transformag@o social: o Chile de Allen- de) mostra que as classes dominantes locais tém militarizado cada vez mais o estilo de dominagao. Mas é um equivoco pensar que os regimes autoritarios e burocraticos que constituem a resposta politica reaciond- tia das classes dominantes locais frente ao desafio do movimento politico urbano de massas, e as disputas entre grupos dominantes se orientaréo na diregdo do apartheid social ou que eles estéo decantando formas fascistas de organizacao politica. O equivoco nfo é meramente nominal. Nao se trata do nome que se dard ao regime, mas de quais séo suas caracteristicas e sua capaci- dade de buscar apoios. E isso é decisivo para analisar quais sao as formas eficazes de oposigao. Alguns espiritos simplistas pensam que ao caracterizar como autoritdério um regime e nao como totalitario, como militar burocratico e ndo como fascista, esté-se buscando eufemismo. A ninguém versado em ciéncias politicas pode ocorrer a idéia de que nao se trata, em qualquer hipdtese, de tipos de ditadura. Mas, que tipo? é a questo a ser respondida. Convém repetir que os regimes autoritérios que caracterizam a fase atual do desenvolvimento-dependente (e com ele guardam ao menos afinidades eletivas ...) ndo so mobilizadores, nado organizam partidos e limitam as tendéncias existentes para transformar em doutrinas aberta- mente totalitarias as bases ideolégicas sobre que se assentam. Em geral, nos primeiros momentos de crise de Estado as tendéncias fascistas apresentam-se com energia (como no Chile de hoje), mas com o tempo a apatia é preferida 4 mobilizagdo, a ordem estatal-militar 4 ordem politico-partiddria, 0 sopro de uma mentalidade autoritaria frouxamen- te articulada as ideologias vigorosas de estatismo anti-democratico. Eu penso que os regimes deste tipo, nas sociedades dependentes, encontram sua raison d’étre menos nos interesses politicos das corpora- gdes multinacionais (que preferem formas de controle estatal mais permeaveis a seus interesses privatistas) do que nos interesses sociais ¢ 54 politicos dos estamentos burocraticos que controlam o Estado (civis e militares) e que se organizam cada vez mais no sentido de controlar o setor estatal do aparelho produtivo. A esse eixo se aliam alguns setores empresariais locais, mas de forma caudataria. Convém deixar claro também que frente ao inimigo principal ~ as presses democratizantes de massa e os grupos revolucionarios de varios tipos — as discrepancias entre interesses politicos do Bloco de Poder dao lugar 4 unidade de agdo. Tanto os setores monopdlicos ptiblicos como os privados almejam, antes de mais nada, garantir a ordem interna para permitir o crescimento econdmico. Essa ressalva (que politicamente é fundamental), ndo deve obscurecer, entretanto, que o problema do poder nos regimes burocrdtico-repressivos nao se resolve com afirma- ¢Ges faceis sobre © interesse “necessirio” do grande capital em fascisti- zat o Estado para garantir 0 apartheid social que a “estreiteza do mercado” impée e para permitir a associagdo direta do setor piblico com 0 setor privado, pela via da criagdo de uma industria pesada e bélica ®, Penso que a caracterizagdo das forgas sociais que esto por tras dos regimes autoritario-burocraticos requer andlises mais profundas. A guisa de hipétese, eu perguntaria se ndo cabe falar, em alguns pafses latino- -americanos, como especialmente o Brasil e 0 México — mas até que ponto nao ocorrerd algo semelhante no Peru? — na formagdo de uma nova categoria social que pode ser designada como uma “burguesia de estado”. Esta expressfo, que é formalmente contraditéria, ganha relevo quando se vé que a expansao do setor piblico das economias latino- -americanas que enveredaram para o caminho da internacionalizacao do mercado (que constitui quase como uma resposta nacional ao desafio imperialista), da-se de maneira que a forma da propriedade das empre- sas estatais é piblica, mas o controle delas se faz por um grupo que eu tenho chamado de burocrdtico mas que comega a ter caracterjsticas que o fenémeno da burocracia nao explica. Nao me refiro ao crescimen- to da burocracia que também ocorre no setor empresarial privado, nem a importancia dos técnicos no decision making process. Este tem sido © angulo pelo qual se tem tentado caracterizar os regimes auto- ritérios latino-americanos, mas ele me parece insuficiente para dar conta do fendmeno. Refiro-me especificamente 4 formagao de uma camada social que controla politicamente os aparatos estatizados de produg@o, apesar de nao deter a propriedade privada dos meios de producdo, Esta camada estd sendo recrutada nos escaldes da buro- cracia civil e militar, entre os técnicos e profissionais liberais e algumas vezes entre empresdrios locais que perderam chances no setor privado. O reconhecimento da existéncia de agentes sociais distintos do empre- 5S sariado privado e que servem de suporte para a acumulacao capitalista nao altera necessariamente os mecanismos econdmicos de seu funciona- mento, mas incide sobre os aspectos politicos de forma marcante. Se esta hipOtese for comprovada, com as implicagGes tedricas que envolver4, a problematica politica das ‘“‘classes médias”, j4 tao desacre- ditada, néo pode ser apenas substitufda pela da grande burguesia ou pela da tecnocracia ou burocracia no sentido estrito. Por acaso esta “burguesia de estado” ndo seria uma camada social capaz de alentar esperangas, agora sim, de um estatismo expansionista? Que oportunida- des reais (dada a dependéncia estrutural bésica da economia) tera um grupo deste tipo para ganhar hegemonia no Bloco de Poder e, a despeito da forma de reorganizacdéo dos mercados e da ordem politica que poderia interessar 4 burguesia internacionalizada, impor uma viséo de estado capaz de lavar a expansio das esferas de influéncia politica e econdmica? Sera que a base social real do autoritarismo vigente repou- sa nessa “burguesia de estado” e nos eixos de poder (militar e civil) que formam a seu lado? A visio do processo politico em termos de um fascismo clissico ¢ da mobilizagdo da classe média em favor do grande capital mais obscurece do que amplia o conhecimento e a caracterizagao do proces- ‘so social latino-americano. Eu sugeri em outros ensaios que a analise sobre os processos politicos contemporaneos precisa reavaliar as relagdes entre sociedade civil e estado e discutir mais a fundo os limites da visio herdada da tradi- gao européia de que a relacdo classe-partido-estado se da nesta ordem e com um nivel de autonomia institucional que supde uma sociedade civil ativa e autonoma. Nao vou repisar argumentos °, mas parece-me que a originalidade da caracterizagdo da forma contemporanea de industriali- zagio da periferia que leva ao “desenvolvimento dependente” requer que também para a andlise do processo politico se busquem as especifi- cidades estruturais proprias da situago de dependéncia que ordenaram a relagio entre as classes locais e o estado de modo complexo e sobredeterminado pela situacdo de dependéncia. Em alguns paises (e a heranga da sociedade ibérica do periodo mercantilista favoreceu este processo) as classes dominantes privadas fundiram-se com o aparelho de estado, apropriando-se dos cargos, que de publicos mantiveram apenas © nome, e utilizam a organizacdo estatal como arena politica direta. Minimizaram, portanto, as organizagdes partiddrias independentes do estado e limitaram, quanto possivel, a mobilizacdo politica das classes subaltemas. As cliques burocrdtico-privatistas, articuladas mais frouxa- mente do que os partidos, em torno de anéis de interesse politico-eco- némico, desempenham um papel crescente e decisivo no jogo de Poder. 56 Tudo isso requer uma teoria politica que nado pode limitar-se a enquadrar a multiplicidade do real em analogias com processos que ocorrem ou ocorreram na Europa ou nos Estados Unidos. E nesta matéria o pensamento latino-americano caminhou muito pouco. Por certo, a interpretagZo de que a existéncia de uma camada social nova (a “burguesia de Estado”), articulada com a burocracia e a tecnocracia bem como com parte da burguesia local, assegura a possibi- lidade de um novo tipo de expansionismo !°, corre o risco de ser também ideolégica. Nao basta mostrar que existe uma camada social ou uma fracgGo de classe e que esta dispde de uma ideologia para prever que 0 curso historico objetivo vai conformar-se aos interesses e designios deles. A andlise deverd deslindar as contradigdes entre estes setores e os outros que formam o Bloco de Poder (especificamente, os organizados em torno dos interesses e ideologias das empresas multina- cionais), bem como as contradigdes fundamentais que geram as lutas entre o conjunto das classes dominantes e as classes exploradas. Mas, em qualquer hipdtese, é preciso afastar a tese simplista de que existe uma relacdo linear entre o interesse direto do grande capital monopolista internacional, a estreiteza do mercado interno, a expor- tacdo de manufaturados e o expansionismo politico dos estados nacio- nais. As pegas do quebra-cabecas sio as mesmas, mas a maneira de monté-las — como se vera na parte subseqitente deste trabalho - é outra. O modo pelo qual a economia e 0 regime polltico brasileiro vem configurando um modelo de desenvolvimento dependente-associado ilustra as possibilidades e os condicionamentos fundamentais do desen- volvimento-dependente. Nao é necessdrio repisar neste trabalho 0 que ja tem sido escrito sobre o assunto'!, Vou apenas aprofundar a caracterizagao conhecida no sentido de avaliar quais sdo as tendéncias de expansao prevalescen- tes, com a preocupacao basica de avaliar as estruturas de controle da economia, em termos do tipo de empresas nela atuante e das forcas sociais que lhe dao sustentagdo, e de analisar o alcance das tendéncias da exportago de manufaturados. Neste tltimo aspecto, interessa discu- tir a relagdo entre “estreitamento do mercado” e exporta¢do, por um lado, e, por outro, as teses propostas sobre o sub-imperialismo. Comego pelo que tem de mais geral o modelo de crescimento associado: ele se caracteriza por uma expansdo simulténea e diferen- ciada dos trés setores da economia: o privado nacional, o estrangeiro ¢ © piiblico. Os dados gerais que ilustram a forma pela qual se organiza c controle da produgdo industrial brasileira sdo os seguintes: oy QUADRO I Bs CLASSIFICACGAO DAS 10 MAIORES EMPRESAS POR SETORES, SEGUNDO CAPITAL + RESERVAS BRASIL 1967 E 1972 | 1967 1972 Estatal | Nacional | Estrangeira Sem Clas Estatal Sem Clas- sificagdo sificagao DISCRIMINAGAO Bens de Capital Bens de consumo duraveis Bens de consumo nao duraveis Bens intermediarios Servigos publicos Construgio civil Comércio Comunicagaio FONTE Quem é Quem na Economia Brasileira, Editora Visao S. A., vol. 33, n.° 5, de 30/8/68 ¢ vol. 43, n.° 6, de agosto 1973. | Tendéncia semelhante ji se encontrava em dados anteriores, pois em 1962, utilizando outra classificagdo e baseando-me em pesquisa sobre os grupos econémicos!?, fora possivel estabelecer o seguinte resultado: QUADRO IT DISTRIBUICAO DOS GRUPOS MULTIBILIONARIOS POR SETOR DE ATIVIDADE E POR TIPO DE CONTROLE BRASIL — 1962 SETORES DE ATIVIDADE | Nacionais | Estrangeiros | Mistos Nao industriais (exportagao-importagio, setor financeiro e servicos industriais) Industriais consumo nao durdvel consumo duravel mecanica pesada inddstria de base TOTAL 24 29 2 De igual modo, a participagéo do setor: piblico na formagav do capital fixo era, em 1960, de 38,2%, 0 das empresas estatais de 8% e 0 setor privado de 53,6%, sendo de destacar que as empresas estatais haviam passado de 3,1% em 1956 para 8% em 1960. Os dados apresentados, apesar de simples, confirmam que houve expansdo no setor ptiblico da economia e mostram, ao mesmo tempo, que o capital nacional continuou a manter posigGes e mesmo a expan- dir-se em alguns setores econdmicos. Garantiu para si o setor de construgdes (que aumentou de importancia com o impeto das obras publicas) e 0 comércio varejista, sem mencionar que outros dados confirmam que também no setor financeiro o controle nacional (e estatal) continuou a exercer-se. Mas, a0 mesmo tempo, houve uma clara divisio de dreas de atuagdo entre as trés formas de controle econdmico aqui consideradas. Nesta divisio, o “fillet mignon” da economia coube as empresas estrangeiras. Essa tendéncia se manifesta no quadro n9 III, que mostra que, se é verdade que cresceu o 59 patriménio do setor estatal, 0 lucro Ifquido é maior nas maiores empresas estrangeiras. QUADRO III PROPRIEDADE DAS 100 MAIORES EMPRESAS DO PAIS POR PATRIMONIO LIQUIDO, FATURAMENTO E LUCRO LIQUIDO — Patrimonio ae CLASSIFICAGAO Liquido Faturamento | Lucro Liquido DAS EMPRESAS | 197; ] 1972 | 1971 | 1972 | 1971 | 1972 Estatais 41 46 20 21 22 23 Nacionais 30 21 44 41 38 37 Mistas (1) 2 5 2 2 3 2 Estrangeiras 27 28 34 36 37 38 FONTE: Quem é Quem na Economia Brasileira - agosto de 1972 ¢ agosto de 1973 Visio. (1) Mistas — empresas predominantemente nacionais ou estatais que contam com uma participacdo do capital estrangeiro acima de 30%, PATRIMONIO LIQUIDO DOS 4 MAIORES CONGLOMERADOS NO BRASIL (Cr$ -precos correntes) DISCRIMINAC AO. 1967 1972 S/A Indtistrias Reunidas Francisco Matarazzo | 564.284 | 1.219.019 S/A Industrias Votorantin 202.127 809.053 Rhodia Industrias Quimicas e Téxteis S/A 266.293 754.616 Pirelli S/A ~ Companhia Industrial Brasileira 229.085 647.784 FONTE: Quem é Quem na Economia Brasileira, ditora Visdo $/A, vol. 33, 1.9 5, de 30/8/68 e vol. 43, n.0 6, de agosto de 1973. OBS.: As Indistrias Francisco Matarazzo pertencem totalmente a um grupo nacio- nal; as Indistrias Votorantin sdo controladas por um grupo nacional; a Rhodia S/A € totalmente propriedade de Rhéne-Toulene (I'ranga); e a Pirelli $/A & controlada pelo grupo Pirelli (Italia). 60, Estes dados, por mais grossciros que scjam, revelam o “segredo” da forma de desenvolvimento dependente-associado: faz-se uma divisdo de 4rea de atuagao que, sem eliminar a expanséo dos setores controlados pela burguesia local, desloca-os dos setores-chave da economia ou, quando a burguesia local consegue manter-se neles é de forma associada e subordinada.. Ao mesmo tempo, cresce a base econdmica do setor estatal, que se enderega aos setores de infra-estrutura, e assegura-se as empresas multinacionais especialmente o controle dos bens de consumo durdveis (automéveis, eletrodomésticos etc.), bem como parte impor- tante no controle da produ¢do e exportagdéo de produtos primirios, brutos ou semi-industrializados. Entretanto, este corte morfolgico também pode induzir a enga- nos. Ele fornece apenas um quadro estatico das condigées estruturais que permitem compreender como, numa fase de expansdo da econo- mia, pode haver uma acomodagdo entre os conflitos de interesse dos trés referidos setores. E preciso indagar pelo sentido ¢ pelas tendéncias desse processo. Em primeiro lugar, como jd indiquei, o setor nacional no sé se associa a capitais estrangeiros, como funciona de modo “enfeudado”, tendo ora o Estado, ora as multinacionais, como clientes ou como fornecedores quase-exclusivos. Esta tendéncia é nitida, por exemplo, no caso das empreiteiras que dependem do Estado, ou das fabricas de auto-pegas, que dependem das multinacionais. Mesmo os bancos, guardam relag6es especiais com os grandes clientes estrangeiros. Essa forma de relacionamento dificulta a articulagdo interna da burgue- sia nacional, tornando escassos os momentos e os setores capazes de permitir a definigéo de propdsitos comuns aos membros deste setor de classe. Por outro lado, 0 padrdo indicado acima talvez jd nfo seja o mais dinamico. Esta-se ultrapassando a etapa em que a produgao de bens de consumo durdvel, simbolizada pela produgdo auto-motriz, representava a vanguarda do desenvolvimento industrial. E o novo patamar de crescimento econdmico tem dois cixos e esta provocando um destocamen- to quanto a forma preferencial de associagdo. Bascia-se na produgdo de insumos industriais (tipo produtos petroquimicos ou laminados de ago, p. ex.) e de produtos minerais industrializados (manganés e ferro, especialmente), Para conseguir a massa de capitais necessaria a produ- gdo destes produtos e para assegurar mercados consumidores (bem como para alcangar vantagens tecnoldgicas), a associagdo privilegiada passou a ser a relacdo direta entre empresas estatais e consdrcios internacionais. Esta nova fase da economia brasileira — sem prejuizo do prossegui- mento da expansdo industrial orientada para o mercado interno — 61 acarreta a redefinigao do antigo modelo exportador que passa a basear- se na produgdo associada a capitais estrangeiros e na exportagao de produtos industrializados. Por outra parte, como sdo empresas estatais as que ganham posigGes estratégicas no novo modelo, em associagao, como disse, com capitais estrangeiros, buasca-se uma politica de “‘auto- nomia relativa”. Essa baseia-se na pressuposi¢éo de que a capacidade reguladora de um estado cada vez mais forte limitaré a ingeréncia interna das multinacionais, na diversificagdo da origem nacional dos capitais externos (japoneses, alemaes, suecos etc., a0 lado dos america- nos) e na crenga de que, apesar da vantagem que as empresas estrangei- ras possuem no controle dos mercados externos, na introdugdo de novas tecnologias e na disposicao de recursos financeiros, a firme deciséo de criagdo de uma grande poténcia sob a égide do estado nacional garantira os riscos do futuro. E esta a ideologia fundamental tanto do que eu chamei de “burguesia de estado” quanto dos militares, técnicos e funciondrios. Em vez do nacional-populismo anti-imperialis- ta, um nacional-estatismo que deve purgar os pecados do padrao objetivo da associagdo crescente com os capitais foraneos, da dependén- cia do mercado externo e do financiamento externo crescente, como indica o aumento acelerado da divida externa. O jogo politico basico, em termos do desenvolvimento, da-se em fungao das contradigdes entre as pressGes para acentuar o nacional-esta- tismo ou para, deixando-o um pouco a margem, concentrar as esperan- gas no dinamismo da “racionalidade” da grande empresa internacional e de sua associagZo com o setor estatal ou privado local. Trata-se, entretanto, de contradigdes secundérias, enquadradas no amplo leito das acomodagGes permitidas por uma economia que se expande com forca e que d4 um lugar ao sol (enquanto estiver crescendo e enquanto houver demanda externa sustentada) para todos, como os quadros anteriores indicam. Neste contexto, convém indagar sobre as fontes da demanda para © consumo da produgdo gerada pelo desenvolvimento industrial-depen- dente ‘>. Sobre esta matéria existem confusdes de base que convém esclarecer. Em determinado periodo (1967/1968) houve politicas de intensificagdo de exportagées, inclusive de manufaturados, para garantir a demanda industrial, porque a economia interna estava em fase de recesso, desde 1962, e os anos de contengdo salarial violenta, de 1964 a 1968, haviam deteriorado a capacidade interna de consumo. A partir deste fato, ndo foram poucos os estudos criticos que viram na exporta- ¢@o a safda para industrializar com falta de mercado. Parecia que mesmo 0 padrao de “industrializagdo restritiva”, baseada no consumo das camadas de rendas elevadas, perdera seu mercado interno. Este foi 62 um dos argumentos apresentados para mostrar a tendéncia 4 expansao politico-econdmica do Brasil na dire¢do do exterior (sub-imperialismo). Entretanto, 0 argumento desconhece que, em primeiro lugar a relagdo alegada entre exportacdo de manufaturados e crise de consumo interno foi conjuntural. E, em segundo lugar, que numa economia capitalista, 0 mercado constitui-se também pelo proprio consumo capi- talfstico (das empresas, do setor piblico e dos grupos sociais que controlam a ambos) e nao apenas pelo consumo de todos e cada um dos trabalhadores, do campo e da cidade, sub-empregados, pobres em geral, etc.. Havendo reativagéo da economia, mesmo quando induzida pelas exportagdes, renasce a espiral consumista interna que ndo depen- de (salvo no caso de indtstrias de consumo macigo individual, como tecidos, ou calgados populares e alimentagdo bdsica) do consumo da maioria, mas do consumo capitalistico. Como este processo ndo é regulamentado, nem automitico, mas é desordenado e depende de politicas que o induzam a expansdo capita- lista da-se permeada por crises, conflitos e contradigées, mas nao se paraliza quando existe uma tendéncia a baixa dos saldrios reais dos trabalhadores, como existiu no periodo considerado no Brasil. Viu-se, pelo contrdério, altos indices de crescimento industrial e queda do salério minimo real (cerca de 35% entre 1964 e 1970!*, bem como uma queda dos saldrios médios entre 1964/1966, acompanhada de um ganho de cerca de 2% ao ano, depois de 1966, nos saldrios médios industriais (que incluem operarios e empregados'*®. A expansdo do emprego urbano industrial entre 1960 e 1970, que passa de 2 790 789 pessoas‘a 5 263 805, ocupando, respectivamente uma porcentagem da P.E.A. de 12,3 e 17,8%, e a propria concentragao de renda nos estratos médios altos e altos, garantiram o crescimento do mercado interno, mesmo para os produtos cuja demanda nio se satisfaz diretamente pelo consumo das empresas. Alguns pretenderam explicar a expansdo industrial, como disse, pelas exportagdes de manufaturados. Os dados dificilmente poderiam servir para confirmar a hipdtese. As exportagdes cresceram enormemen- te nos anos recentes, especialmente nos setores “nao tradicionais”. Eis os principais resultados: 63 ouapRo 1V'* EXPORTACAO DE PRODUTOS PRIMARIOS E MANUFATURADOS, POR MILHARES DE DOLARES FOB (BRASIL) TOTAL DE PRIMARIOS TOTAL DE MANUFATURADOS TOTAL DAS ANO EXPORTACOES - 1.471.955 123.484, 1.595.479 1969 2.088.530 222.639 2311.169 1970 2.318.351 420.571 2.738.922 1971 2.320.323 582.762 (1) 2.903.585 FONTE: El desarrollo de las exportaciones no tradicionales de América Latina. CEPAL, op.cit., pag. 42. (1) Cifras da CACEX, do Banco do Brasil. Nota: Os dados sobre o valor das exportacdes e, especialmente, dos _produ- tos manufaturados, variam segundo as fontes consideradas e a nomenclatura de produtos usados. Para 0 ano de 1970, por exemplo, Doellinger, citando dados de “Exportag6es Dinamicas Brasileiras”, fala em 2,700,000.000 délares exportados © apenas 302 milhdes de manufaturados. Em 1965, apresenta, respectivamente, 1.559.500.000 e 109.500.000 détares. Mas a proporgdo das exportagdes com respeito ao produto indus- trial global nao .ultrapassa em nenhum dos rubros de manufaturados os 3% em cada ano. Como o crescimento global seguiu uma taxa maior que essa, dificil sustentar que houve “estreiteza” do mercado interno e que por isso seguiu-se uma politica exportadora. Com efeito, os analistas mais competentes tém reafirmado que, do ponto de vista da porcentagem das exportagdes de manufaturados no produto industrial global, a significagdo da tendéncia exportadora é reduzida'’. Por outro lado, ela é geral nos paises que se estdo industrializando na América Latina. Isto quer dizer que independe de uma relacdo meca- nica com o regime politico prevalecente. A exportagao de manufaturas cresceu muito mais rapidamente na regido que a exportagéo de produ- tos primdrios, passando de 5,7% da exportagdo total em 1965 para 12,7% em 1971. Esse esforgo para exportar se deveu a necessidade de equilibrar a balanga de pagamentos pressionada pelo aumento do servigo da divida e pelas importagdes. A forma que assumiu, com o crescimen- to da exportagao de produtos industriais, prendeu-se, por sua vez, a jd referida industrializagéo da periferia e 4 reorganizagdo, sob comando das empresas multinacionais, da divisio internacional do trabalho is) Nao pode ser imputado a “‘ideologia expansionista” de um pais ou de 64 uma classe no poder local. Embora em posigdo de lideranga na ex porta- ¢ao de manufaturados na América Latina, 0 Brasil ndo é 0 nico pais a trilhar este caminho: QUADRO V EXPORTACAO DE MANUFATURADOS (CLASSIFICACAO PROPRIA DOS PAISES) (US$1,000-lOB) VARIAGAO % 1970-71 596.500 | 644.100 | 653.000 11,6 495.000 | 664.986 | 822.048 23,6 208.504 | 221.057°| 254.030 14,9 198.500 | 204.900 | 246.900 PAIS Argentina Brasil Colémbia México FONTE: CEPAL, op. cit., Como os dados acima respeitam as classificagdes que os proprios paises fazem quanto ao que sejam produtos manufaturados, é preciso analisar com mais cuidado a pauta de exportagfo. Para o caso do Brasil, impSem-se, ndo obstante, conclusdes nitidas. A participacao dos manufaturados cresce no conjunto das exportagdes de 1% ou menos até 1959, para 11,2% em 1970'*. E, sem davida o salto maior verificou-se depois de 1964, Dentre o que se considera como manufatu- rados, entretanto, as “‘manufaturas segundo a matéria-prima”, que de fato compreende produtos extrativos algo transformados, mantém-se estavelmente desde 1964 ao redor de 44% do total das exportagdes de manufaturados; os produtos quimicos baixaram de 25% para 17% e as maquinas e vefculos subiram de 26% para 33% ?°. Em comparagdo com os outros paises industrializados da regido, a exportacdo em US$ de alguns produtos realmente manufaturados nao colocam 0 Brasil como “tipicamente sub-imperialista”: 65 QUADRO VI EXPORTACAO DE ALGUMAS CLASSES DE PRODUTOS POR PAIS 1970 Em milhdes de US$ PRODUTOS Vidro e manufaturas de vidro Produtos quimicos Maquinaria elétrica Aparelhos e maquinas nao elétricas Material de transporte Ferramentas manuais FONTE: Relatério jé citado da CEPAL sobre “Desarrollo de las exportacionesno tradicionales”, pags. 57-58. Convém indicar que sio dados preliminares, as vezes distorcidos, como no caso do México, pelas “indistrias — fron- teirigas”. Houve avangos importantes nas exportagdes de semi-manufaturados de ferro e ago (laminados, perfis, tubos, etc.) onde o Brasil exportou, em 1970, 98 milhdes de délares, tendo duplicado a cifra de 1965. Mas, embora em nivel absoluto menor, também a Argentina quintuplicou suas exportagdes para alcancar 28 milhGes de délares em 1970 e o México, vendendo 30 milhdes, aumentou em 40% a exportagio em comparagao com 1965. Trata-se, pois, outra vez, de uma tendéncia que tem a ver com a forma atual do modelo de dependéncia industrial-ex- portadora na América Latina. Igualmente, houve avangos considerdveis, nos paises em quest@o, na exportacao de produtos semi-elaborados da inddstria extrativa de madeira e de couros..E, nas manufaturas “tradi- cionais”, como vestudrio, calgados, também houve progressos que, se medidos pelas cifras relativas, parecem impressionantes porque se parte de um patamar muito baixo, mas em termos do valor em délares sio modestos: QUADRO VII?* EXPORTACOES 1970 Em milhdes de US$ ARGENTINA MEXICO 16 3 1,1 - 8 MANUFATURAS Vestudrio Calgados 66 Se nao bastassem as informagGes sobre a porcentagem das exporta- ges dos manufaturados sobre o produto industrial para comprovar que nao se pode pensar que a expansio econdmica atual se deva, do ponto de vista da sustentagdo do consumo, as exportagdes, mas que a deman- da interna continua sendo dinamica, 0 quadro n9 VIII confirma a interpretagao. Por certo, para setores espectficos, a exportagdo de manufaturados, em certas conjunturas, representou uma tdbua de salvacdo ou permitiu, apesar do dinamismo do consumo interno, ampliar a producdo. No primeiro caso estao as industrias téxteis, de vestudrios e de calgados. Os téxteis exportaram 13 milhGes de délares em 1968, 57,4 em 1971 cerca de 100 milhdes em 1972. A indistria de vestudrio aumentou as ex- portagdes em 310% entre 1971 e 1972 e é sabido que a indistria téxtil “ainda luta com o problema da distorc@o entre producdo € consumo interno: este nao acompanha aquela” 23. No segundo caso est4 a industria de auto-pegas, que, apesar da expansado do consu- mo externo, teve um incremento na participacdo das exportagdes em seu faturamento de 2% em 1970 para 20% em 1972. Nada disso desmente o fato de que a industria de cimento, os laminados de aco, a produgdo de insumos industriais bdsicos, a industria de papel e celulose etc., tenham como tém, dificuldades para atender ao consumo interno na atual fase do ciclo expansivo da economia (1973) e que, ao mesmo tempo, a indtstria de bens de capital proteste contra a Lei do Similar Nacional, que nfo a protege adequadamente das importagdes para atender ao consumo interno 24 que se esteja montando um Plano Sidertirgico para atender 4 expansdo do consumo interno e ainda exportar insumos industriais de ago. E dessa forma, desordenada, e nem sempre combinada, que se verifica 0 crescimento industrial capitalista. Quando se pergunta especificamente pelos setores (estatais, nacio- nais ou estrangeiros) que controlam as exportagdes, os dados disponi- veis mostram que o setor nacional cresceu a exportagdo entre 1967 e 1969 no item relativo aos “produtos manufaturados sobre matérias-pri- mas”, de mais baixo teor tecnolégico, diminuindo sua participagao em todos os demais itens, enquanto a porcentagem de exportagao de manufaturados crescia em todos os itens (produtos quimicos, maquina- tia e vefculos, manufaturados sobre matéria-prima e manufaturados diversos). Mesmo no item que acusa crescimento da participagdo das empresas nacionais, houve crescimento das estrangeiras, porque nele havia também uma forte participagdo governamental, que caiu de 56,5% para 33,1% 75 67 89 QUADRO VIII PRODUGAO, EXPORTACAO E CONSUMO APARENTE DE ALGUNS PRODUTOS ELETRONICOS E ELETRODOMESTICOS BRASIL 1968/1971 (por unidades) PRODUCAO PRODUTOS 1971 Auto-rddios Televisores Aspiradores de pd Enceradeiras © Liquidificadores Refrigeradores Automéveis Onibus e caminhdes Camionetas e utilitarios FONTE: Revista Indistria ¢ Desenvolvimento, junho 1973, p. 112 e 115. OBS.: OQ consumo aparente foi calculado produgo menos exportago; como os dados de produgao ¢ de exportagdo provém de tabelas diferentes, os dados referentes ao consumo devem ser considerados como meramente indicativos. Nao disponho de dados sobre a exportagdo por unidades produzidas para o perfodo posterior a 1971. Com os dados apresentados, que conclusdes podem-se tirar? Em primeiro lugar, é dificit sustentar a hipétese de que a exporta- gdo de manufaturados fez-se para compensar a estreiteza do mercado interno. Este continua expandindo-se. O crescimento das empresas e 0 aumento do emprego urbano-industrial tém dinamismo proprio. E certo que em 1967/1968 a politica de exportagdo teve o propésito (e o resultado) de contornar um periodo de crise. Mas desde 1968/1969 tanto crescem as exportagdes como o produto industrial e © consumo interno aparente. Houve portanto crescimento indiscutivel do mercado interno. E por isso que existe um dinamismo social que obriga a cautela nas comparagGes entre a sociedade brasileira e outras sociedades, de regime politico autoritério ou fascista, marcadas pelo imobilismo social. Sendo assim, como explicar a polftica favordvel as exportagdes 7° que 0 governo vem sustentando com tanto afinco? Em primeiro lugar, 6 irrecusavel que em 1967/1968 a politica de exportag6es visou a reativar a economia, que completava um ciclo de baixa iniciado em 1961/1962, depois do que se chama de “esgotamen- to da industrializagao substitutiva de importagdes”. A partir de 1968, em parte devido ao proprio fluxo monetério gerado pelas exportacdes, mas especialmente depois de 1969-1970, os beneficios fiscais tornaram lucrativa a atividade exportadora regular, independentemente da exis- téncia de crises de mercado interno. Simultaneamente, o governo ado- tou uma politica de busca de financiamentos externos para expandir o investimento e para garantir a expansdo do crédito ao consumidor 77. Essa politica reforga as relagdes de dependéncia financeira entre centro e periferia, permitindo, por um lado, o desenvolvimento industrial e a expansio do consumo baseado nas camadas de rendas elevadas e médias (que obtém hoje créditos faceis para o consumo) e, por outro lado, a dependéncia financeira. As exportacdes tornam-se vitais, mesmo depois de ativado o merca- do interno, para obter recursos em moedas fortes com os quais finan- cia-se a importacdo de insumos e bens de capital e amortizar-se, 20 mesmo tempo, 0 servigo da divida. Assim, em vez de expressar uma tendéncia do sub-imperialismo econdmico, na acepgao corrente na América Latina, a expansdo das exportagdes € um indicador do grau e do tipo de relagdes entre desenvolvimento e dependéncia que caracteriza o estilo de crescimento econdmico baseado na internacionalizagéo do mercado. De fato, é preciso distinguir no conjunto das polfticas favordveis 4 industrializagdo, & exportacdo e a constituicgdo de dreas externas de influéncia, os diferentes setores sociais interessados e os objetivos pelos 69 quais propugnam. Os dados que apresentei mostram que uma parte da politica industrial-exportadora orientou-se para sustentar setores de produtividade limitada e que enfrentaram problemas circunstanciais de mercado interno (calgados, téxteis, vestudrios), Quando a generalizagdo. sobre a cconomia brasileira foi feita baseando-se nestes setores, 0 boom exportador foi interpretado como se fosse o resultado de uma pressdo derivada da estreiteza do mercado. Mostrei, contudo, que no total do crescimento das exportagdes, 0 papel deste conjunto de atividades industriais foi pequeno. Em geral as exportag6es deste tipo se orienta- ram para a Europa e os EUA. Por outro lado, existem pressGes inequivocas que se localizam no setor de produgao de infra-estrutura e de insumos industriais basicos (energia elétrica, petréleo, carvdo, gds natural etc.) que parecem reque- rer algum grau de complementariedade com economia de outros paises. Embora os resultados deste tipo de expansio econémica ainda nao possam ser medidos pelas estatisticas disponiveis, pois os projetos encontram-se em fase de negociagdo, parece certo que terfo um peso significativo no futuro. Estes projetos parecem atender mais aos recla- mos do impeto de crescimento do setor estatal da economia do que as empresas multinacionais e as empresas controladas pela burguesia local. Como © modelo adotado é associado, é dificil separar os efeitos do avango de um dos sécios das vantagens que os outros irdo auferir. Mas © impulso de expansdo externa, neste caso, parece originar-se do setor estatal da economia, e nada tem a ver com a “estreiteza” do mercado interno. Por enquanto os resultados ccondmicos desta politica sio modes- tos, embora seja compreens{vel que, avaliados a partir da ética dos paises vizinhos com relacgéo aos quais existem agora negociagdes de investimentos (Bolivia, Paraguai, Colémbia, especialmente) possam ser vistos como de forte impacto sobre as economias locais. Tao pouco neste caso a nogdo de “sub-imperialismo” ajuda muito: nao se trata da acéo das multinacionais com a mao de gato do Brasil, mas sim, diretamente, dos interesses das empresas estatais brasileiras na expansdo da economia nacional (embora, como disse tantas vezes, aceitando formas de associagao com os capitais privados). A continuidade da expansio dos setores realmente nao tradicionais de exportacdo depende, por sua vez, de outros mecanismos: da divisao de mercado entre as multinacionais. E, neste caso (despido das grande- zas ideologicas nacional-estatistas) que 0 mercado latino-americano é importante, tanto para o Brasil, como para a Argentina, 0 México ou a Colémbia. Convém, portanto, deslindar os interesses em jogo, ndo atribuir a 70 this aad alguns dos participantes as intengdes e os interesses de outros ¢ nao esquecer, sobretudo, que no conjunto a politica de exportagdes, como o endividamento externo crescente e 0 tipo de mercado interno que se forma, esto estruturados num todo que assenta no sistema produtivo controlado, em forma associada, mas com especializagao de fungdes, pelas multinacionais, pelo Estado e pelo capital local. E na perspectiva global de analise desse tipo de desenvolvimento-dependente que se deve encarar cada uma das pegas que 0 compéem. Ele se redefine agora para intensificar 0 papel que a associagdo direta entre Estado e multinacio- nais vai desempenhar na produgao tipica da fase atual de industrializa- ¢G0 da periferia. E possivel mesmo que o dinamismo futuro do sistema econdmico deixe de estar assentado apenas nos setores de produgao de bens de consumo duravel (controlados pelas multinacionais) para deslo- car-se na diregGo da grande siderurgia, da exportagdo de produtos semi-industrializados e dos minérios. Isso nao significaré a carta de alforria da dependéncia, que alentaria expansdes de mercado a serem incentivadas pelos estados nacionais?*, mas sim que na nova divisio internacional da produgdo o pais busca obter vantagens relativas (e as esta conseguindo) sob o guarda-chuva protetor da associagéo com as multinacionais de distintos paises. No futuro, a economia brasileira, embora noutro patamar de desenvolvimento, estard exposta aos azares da “dependéncia externa” com este tipo de produtos industrializados de cxportagdo, como esteve no perfodo agroexportador tfpico. A taxa de cambio, as reservas, as dividas externas, as crises mundiais e a distancia entre o estado nacional e os centros de decisio do mercado internacional recolocar-se-Ao como problemas de primeira linha na discussio sobre 0 modelo de desenvolvimento industrial-exportador, mas dependente. ?° Poder-se-ia pensar, diante disso, que, tirando as castanhas com a mao do gato, as multinacionais usam o Estado para obter seus fins e que, neste sentido, sustenta-se a idéia de sub-imperialismo, embora fosse mais dificil sustentar a crenga num pré-imperialismo. Entretanto, a expanséo real dos controles estatais, a subsisténcia de interesses capitalistas locais, e especialmente o controle politico crescente dos setotres ligados 4 burguesia de estado, complicam a cena. No funda- mental, como se viu, o dinamismo do mercado interno e, por conse- qiiéncia, os problemas ligados as formas de exploracio social intemas ¢ 4 distribuigéo da renda constituem a contradigdo fundamental do modelo. A luta inter-classes dominantes é que se orienta, nos limites da acomoda¢ao possivel ja assinalada, entre tendéncias nacional-estatistas ¢ tendéncias favoraveis ao predominio das multinacionais. Contudo, para a expansao externa econOmica-industrial tipica de uma economia indus- n trial avangada as multinacionais nado precisam fortalecer os instrumen- tos de controle dos estados locais e a eles, freqiientemente, se opdem. Antes, é o setor das empresas estatais que impulsiona suas operacdes no exterior, fazendo inclusive investimentos. Mas, quando o setor econdmico nacional-estatista se langa 4 aventura do controle do mer- cado externo (minerais, petréleo, insumos semi-industrializados, etc.) depende e tem que associar-se com as multinacionais, alienando, assim, parte de seu impeto imperial. E do jogo e do desencontro entre estas contradigdes que se nutre a hist6ria recente dos paises periféricos que fortalecem o Estado e, com investimentos e financiamento externos, procuram um lugar na nova divisdo internacional do trabalho. * Trabalho apresentado 4 Conferéncia Internacional sobre “Sociologia del Desarrollo y Desarrollo: Dependencia y Estructuras del Poder” organizada pela Fundigdo Alem para o Desenvolvimento Internacional, de 4 a 11 de novembro de 1973, em Berlin. Tabelas elaboradas pelos assistentes da pesquisa Teresa Marta Smith de Vasconcelios e Carlos Eduardo Silveira. (1) Ver R.M. Mari “Dialectica de la Dependencia, la economia exporta- dora”. Santiago, Sociedad y Desarrollo, vol. 1, janeiro-marco de 1972, pags. 35-51. Q A Tespeito deste ltimo ponto, a melhor andlise que conhego sobre as fungdes do tercidrio © do inchago urbano sobre a acumulagdo ¢ 0 estudo de Francisco de Oliveira, “A economia brasileira: critica 4 razdo dualista”, Estudos CEBRAP (2) 1972. Ver a apreciagao critica dos trabalhos sobre marginalidade em Liicio Kowarick — Marginalidade Urbana e Desenvolvimento. Sio Paulo, 1972 (mimeo), especialmente capitulo IV. (3) O estudo a que me refiro ¢ de onde retire’ estas informagées foi o de Fernando Fajnzilber, Sistema Industrial e Exportagdo de Manufaturados, andlise da experiéncia brasileira, Rio de Janeiro, IPEA/INPES, 1971, cap. II. (4) Idem, ibidem, p. 123, 55,3% do valor das exportagées de manufaturados em 1969 provinha de setores em que o indice de concentracdo industrial é inferior a 25%. (5) Ver a este respeito as cogitagdes de Carlos E. Martins, in Brasil-Estados Unidos dos anos 60 aos 70, Sio Paulo, CEBRAP, Cadernos CEBRAP, n° 9, 1972. (6) Ver Rui Mauro Marini, op. cit., e “BRAZILIAN SUBIMPERIALISM” in MONTHLY REVIEW, neste iltimo artigo, Marini assegura que o sub-imperia- lismo é a forma que o capitalismo dependente adota quando atinge a etapa do capital financeiro ¢ monopélico. Para ele, “a crise dos sessenta resultoi da impossibilidade de expansdo posterior baseada na insuficincia do mercado inter- no” (pag. 15), que afetou a indiistria de bens durdveis de consumo. (7) Por desenvolvimento estou entendendo aqui (na mais ortodoxa tradig&o marxista) a acumilacio de capitais ¢ sua incidéncia na diferenciacdo do sistema produtivo. Nao me refiro, obviamente a um idilico resultado capaz de igualar as das ¢ terminar com a exploracdo pois que estes alvos nao se definem como jidos para uma economia de mercado. (8) Ver sobre este ponto R.M. Marini, artigo jé citado sobre sub-imperia- lismo, especialmente na versio castelhana, Santiago, CESO, 1971 (mimeo). (9) Ver “Estado e Sociedade”. In: Notas sobre estado e dependéncia. Sao Paulo, CEBRAP, Caderno 11, 1972. 72 NOT, (10) Ou seja, que em vez de “‘sub-imperialismo” dever-se-ia comegar a falar de “préimperialismo”, como sugeriu em interessante ensaio recente Carlos Este- vam Martins, in Brasil-Estados Unidos dos 60 aos 70, op. cit. (11) Em outra reunio patrocinado pela Fundacdo Alem para o Desenvol- vimento procurei sintetizar alguns estudos que caracterizam 0 modelo brasileiro de desenvolvimento. Ver, O “modelo brasileiro” de desenvolvimento: dados e perspectivas, 1972. Publicado em portugués em Debate e Critica, Sao Paulo, ano I, n9 1, julho/dezembro de 1973, Existe versio alemi em Probleme des Klassen- -Kampfs, Berlin, n9 6, marz 73. (12) Ver artigos de Mauricio Vinhas de Queiroz, Luciano Martins e J. Pessoa de Queirés, publicados na Revista do Instituto de Ciéncias Sociais. Rio de Janeiro, vol II, n9 1, 1965. Para maiores explicagdes, ver F. H. Cardoso — “Hegemonia Burguesa e Independéncia Econémica”. In: Mudancas sociais na América Latina, Sao Paulo, DIFEL, 1969. (13) Quero remeter o Ieitor para esclarecimentos que fiz sobre o significado da expressio industrial-dependente. Ver “Notas sobre o estado atual dos estudos sobre dependéncia”. Sdo Paulo, CEBRAP, Caderno 11, 1972. Basicamente man- témrse a situagdo de dependéncia, além das razOes j4 aduzidas de controle direto pelas multinacionais e de dependéncia do mercado externo, porque mesmo o setor industrial desenvolve-se de forma incompleta. O setor de producdo de bens de produgao (setor I), que numa economia central é 0 eixo da acumulagio, nao se desenvolve plenamente. Vulgarmente os economistas referem-se a este problema em termos de “dependéncia tecnolégica”. De fato, ele € um indicador da deficiéncia da acumulacdo. Isto leva a economia a ter de importar Aquinas e insumos indus- triais e a.ter, por conseqiiéncia, que ativar 0 setor exportador (especialmente pri- mério) para gerar as divisas necessdrias. Esse processo foi mais acentuado nas modalidades anteriores de dependéncia. (14) Cf. Edmar Bacha — “Hierarquia e Remuneragio Gerencial”. Brasilia, Universidade de Brasilia, setembro de 1973. Quanto ao crescimento industrial, as taxas foram as seguintes: 1965 — 4,7 1967 — 2,9 1969 — 10,7 1971 — 11,2 1966 — 11,7 1968 — 13,1 1970 - 11,1 1972 ~ 13,8 (15) © estudo citado de Bacha mostra que os saldrios do setor industrial abriram-se em leque, depois de 1964. Baseando-se em pesquisa localizada, mostra que a média do salério dos trabalhadores entre 1966 € 1972 elevou-se em 2,4% ao ano. Entretanto, outros dados apresentados no mesmo trabalho mostram que os salirios da mao-de-obra desqualificada (serventes e ajudantes, que compdem mais de 50% da forca de trabalho urbana do pafs) “experimentaram uma perda de substincia entre 1966 e 1972” (pag. 24). Os demais salirios variam, no Mesmo periodo entre ~1,5% e 7,4%. Ou seja, enquanto os gerentes ¢ técnicos tém ganhos reais importantes, o crescimento das categorias de operdrios é nulo ou bem menor. (16) Utilizo aqui dados da CEPAL porque permitem maior comparabilidade com outros paises da América Latina. Além disso, a defini¢go do que seja “produto industrializado”, nas estatisticas nacionais é muito variével. Assim, por exemplo, tomando-se os cdlculos de exportagdo FOB do Banco Central do Brasil, temese os seguintes resultados: (em milhées de délares) Anos Pro xdutos Industrializados | Totais | industrializados _ Primarios totais 1965 594,4 282,9 877,3 32,1 1969 983,2 462,3 1.445,5 32,0 1970 | 1.110,0 622,4 1.732,4 35.9 1971 1.216,0 772,1 1.988,1 38,8 1972 1.735,4 1.153,8 2.889,2 39,9 1973 2.852,3 1.8414 4.693,7 39,2 FONTE: Até 1971 — Boletim do Banco Central do Brasil, vol. 10, n.0 2, fev. 1974, pags. 152/154. 1972 e 1973 — Relatério Anuat do Banco Central do Brasil (1973) , Boletim n,0 3, vol. 10, margo de 1974, pag, 207. Observagoes: exclui café soitivel e em grao, Dados para 1973 a serem confirmados. (17) A cifra global dos 3% encontra-se em CEPAL, El desarrollo de las exportaciones no tradicionales de América Latina. ECLA/SE/Draft/84, documen- to de sintese, pag. 39. Carlos V. Doellinger, num estudo “sobre “Exportagdes brasileiras: diagnéstico perspectivas”, pesquisa e Planejamento, 1PEA, Rio, vol. I, n9 1, junho de 1971, pag. 106, depois de haver chamado a atencdo para o mesmo fato, apresenta 0 quadro seguinte: Participagdo das ExportagGes de Manufaturados no Produto Industrial (Brasil) Anos % 1967 3,11 1968 2,59 1969 3,00 1970 (1) 5,00 Fonte: Relatorio Parcial do Setor Externo, IPEA/1970. (1) Estimativa Segundo os dados que pude encontrar, apenas num rubro (0 de maquinas nio elétricas) a participacdo da exportacio foi algo maior com relagio & produgdo industrial, alcangando 5,9% em 1970. Em maquina elétricas, foi de 2,2%; material de transporte, 0,8%; calcado e vestudrio, 2,4%. Fonte: El sector industrial latino- americano y la estrategia internacional de desarrollo. ECLA/DI/Draft 85, San- tiago, marco de 1973, pag. 100. (18) Cf. op. cit. nota anterior. (19) Na nota do quadro IV indico dados mais recentes, do Banco Central do Brasil, que elevam um pouco a porcentagem dos produtos industrializados na pauta brasileira de exportagdo. As variagdes devem-se as diversidades de critérios sobre os produtos considerados como industriais. (20) Ver os dados em Doellinger, C., pag. 106. (21) Dados mais recentes para o Brasil indicam, contudo, um salto impor- ante na exportagio de calgados. Em 1972 foram exportados 54,6 milhdes de délares e em 1973 (dados provisorios) 93,5 milhdes. Infelizmente nao disponho de dados mais recentes para Argentina e México. Fonte para o Brasil: Relatério do Banco Central, 1973, pag. 220. 74 (22) Segundo Revista Industria e Desenvolvimento, jutho de 1973, vol Vi, nO 7, pag. 143. . (23) Idem, pag. 144. (24) Ver, por exemplo, “Similaridade entrava avango da indistria de bens de capital”, in: Revista Industria e Desenvolvimento, vol VI, n° 7, julho de 1973, pag. 136. (25) C. Doellinger, op. cit, pig. 136. (26) As exportagSes estdo sustentadas por uma politica de “taxa cambial Tlexivel” e de mini-desvatorizagSes do cruzeiro, por incentivos fiscais 4 exporta- do e por incentivos crediticios (ver 0 jd citado artigo de Doellinger), Em outras palabras, a exportacdo € subsidiada, promovendo-se uma reducio no preco das mercadorias em comparagio com o mercado interno, da ordem de 36% em média. Ver “‘Polfticas e instrumentos para cl desarrollo de las exportaciones no tradicionales” (Brasil) CEPAL, SE/EX, Santiago, janeiro de 1973, pag. 26. (27) Sobre a divida externa e 0 “boom” brasileiro, ver Wells, J. — “Euro- -dollars, foreign and the Brazilian boom’. Cambridge, Centre of Latin American Studies, 1973 (mimeo). F também King, K. — “Recent Brazilian monetary Policy”, Belo Horizonte, CEDEPLAR, 1972 (mimeo). (28) Nao qucro minimizar, naturalmente, o papel dos setores de produgao de bens de consumo e as dificuldades que existem para sua exportagio. Nem é de prever que o estado deixe de ocupar-se das “trade companies”. (29) Depois de feito este trabalho, li um estudo de José Eduardo Carvalho Pereira “novos padrées no relacionamento da economia brasileira com o exterior” que analisa bem as fungdcs e os efeitos da politica de endividamento externo recente. 75

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