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Ee ie eam ela 1 En avi as Maria Viétoria de Mesquita Benevides A UDN E O UDENISMO AMBIGUIDADES DO LIBERALISMO BRASILEIRO (1945-1965) Maria Victoria de Mesquita Benevides Originalmente uma tese de doutoramento defendida na USP, o presente trabalho submete a uma andlise aguda e despreconceituosa a historia da UDN e suas caracteristi- cas como partido. O resultado é um quadro que enriquece muito a nossa compreensdo da vida politica brasileira em geral. Leitura imprescindivel para quem se interessa pelos problemas da democracia no nosso pais. @ MAIS UM LANCAMENTO PAZ E TERRA UMA EDITORA A SERVICO DA CULTURA Bg, Senor EO UDENISMO AMBIGUIDADES DO LIBERALISMO BRASILEIRO (1945-1965) ©} 5 al a Bt eS Zz OQ — — caPiTuLot RAIZES A CRIACAO DA UDN NO CREPUSCULO DO ESTADO Novo Ll = O Novo Sete de Abril “No fundo, a revolugio de sete de abril foi um desquite a ‘ivel entre o Imperador ¢ a nagio, entendendo-se por nagio a ‘minoria politica que a represent Joaquim Nabuco, 1897* O espirito de luta contra o Estado Novo econtra Getolio Vargas, em suas varias encarnacdes, das mais idealistes as mais pragmaticas, formou, plasmou e reuniu os diversos grupos que se comporiam no partido da “eterna vigilancia’”. Foi, portanto, como um movimento ~ ampla frente de oposicdo, reunido de antiges partidos estaduais ¢ alianga politica entre novos parceiros - que surgiu a Uniio Democra- tica Nacional, oficialmente fundada a sete de abril de 1945, para lembrar 0 outro sete de abril, de 1831, festejada data do liberalismo brasileiro. Homenagens a efemérides nem sempre trazem bons augirios. Neste caso preciso, a escolha da data talvez revele indesejaveis afinida- des que pesariam, para o futuro partido, no fardo de ura heranga cu- jas raizes remontam as ambigiidades da dicolomia liberalismo/con- * In Um Estadista do Império, Rio: Nove Aguilar, 1975, p. 57 servudorismo, constantes na hist6ria politica das elites brasileiras. O significado do sete de abril de 1831 suscita distintas interpretagées, a partir da avaliagio dos proprios personagens. Como assinala Ray- mundo Fuoro, pura os conservadores da época, © movimento ndo so- mente no fora liberal, como representara uma verdadeire subversao. “do 7 deabril s 1434 tudo foi reclamado ~ a federagdo, a liberdade re- ligiosa, a justiga eletiva, aextingdo do poder moderador e do Consetho do Estado, a repiblica depois do governo de D. Pedro Il, o senado temporirio, a divisdo das despesas publicas entre as provincias, O con- servador Visconde do Uruguay sentia que estava tudo fora dos eixos” (1975, 1, p. 308). Sea dendncia subversiva afaga a consciéncia libert&- ria dos conspiradores de 1945, uma contundente critica aos idos de abril de 1831 se deve, paradoxalmente, a um liberal "exaltado”, deca- no entre os herdis da erénica udenista. Dird Teéfilo Ottoni em 1860: “o sete de abril foi uma verdadeira journée des dupes. Projetado por homens de idéias liberais muito avangadas, jurado sobre o sangue dos Cunecas e dos Ratcliffs, o movimento tina por fim o estabelecimento do governo do povo por si mesmo, na significagdo mais alta da pal yra” (Nabuco, 1975, p. 60). O que, evidentemente, ndo aconteceu. Se Virgilio de Mello Franco retomaria a expresso “jornada de tolos” para desqualifict 0 gol de 29 de outubro conta Geli, para a aioria dos udenisti*historicos a “rebeldia liberal” de 1831 marcaria uma data importante, porém ndo inspiradora quanto as fontes da am- bigGidade de sua préprie heranga ideologica. Esbocada, em répida lembranga, a linguagem de uma fatia expres- siva da meméria udenista, dé-se o necessério salto para-o novo sete de abril de 1945. Com uma devidu ressalva: 0 saudosismo hist6rico na es- colha da data (no sentido “subversivo"), o idealismo ou o romantismo politico de alguns atores, ndo deve obscurecer o fato de que somente a conjuntura especial de fins de 1944 © comegos de 1945, fruto da galo- pante desagregagdo das forcas estadonovistas (e sob @ forte influéncia das mudangas na situago internacional, em favor dos Aliedos) pode: ria proporcionar a unio de elementos tao diversos, quando no anta- gonicos. Pois como seria possivel fundar um partido nacional, razoa- Yelmente eoeso, se nada mudara na politica dos estados, se permane- ciam as rivalidaldes regionals, 05 ressentimentos pessoais, a oligérquica intrunsigéncia dos grupos locais? Somente a polarizagao em torno de uum inimigo comum, ou heréi comum. A futura UDN 0s tinka, ambos. Havia uma definida bandeira politica: a reconquista das liberda- des democraticas. Havia uma promessa de eleigdes: a Lei Constitucio- nal n¥ 9, de 28 de fevereiro de 1945. Havia, sobretudo, um herdi- candidato, 0 Major-Brigadeiro Eduardo Gomes. Este, um ponto cu rioso: em torno de uma candidatura &s eleigdes ainda hipotéticas for- muse um partido politica, ao inverso da tradigdo, ou seja, surgit um candidato de um consenso partidério. (Essa marca de criggdo seguird a trajetéria do partido, frustrado nas grandes derrotas eleitorais, porém empedernido na unido— muitas vezes espiria ~em torno de uri candi- dato & Presidéncia da Republica). O objetivo declarado da reunigo do sete de abril, além da organizagdo formal do partido, era a preparacdo da Convengdo que langaria, oficialmente, a candidatura do Brigad ro, jd sugerida na imprensa através da entrevista de José Américo, 20 Correio da Manhé (a qual, segundo Paulo Emilio Sailes Gomes, “fora 9 soco no puralitico de que falava Trotsky”) seguida das de Prado Kelly e Virgilio de Mello Franco a0 0 Globe. ‘A reunido solene do sete de abril, no “auditorium” (como diz a Ata) da Associagdo Brasileira de Imprensa, no Rio de Janeirb, des- dobrou-se numa encenagao de grande efeito plistico e vibracdo oraté- ria, o que perturba, de certa forma, a identificagdo dos atores, ao diluir suas diferengas na emocdo comum, O clenco, forgosamente heterogé- neo, 0 que se revela jé no titulo “‘delegados dos partidos estaduais € das correntes de opinido”, mantém-se ligado por um tnico fator: a luta contra a ditadura. O peso da ret6rica, que caracterizaria o partido ‘como um reduto dos bacharéis, nao impede, todavia, que se apreen- dam, nas propostas mais significativas, alguns dos temas que seriam dominantes na campanha do Brigadeiro ¢ just ficavam 2 unido de to- dos: liberdade de imprensa e de associagdo, anistia, restabelecimento da ordem juridica, eleigdes livres e sufragio universal. O embrido da Futura mobilizacao por “todo o poder ao judicidrio” surge nas propos- tas de entrega do poder 20 presidente do Suptemo Tribunal Federal. A urgéncia da reconstituicdo juridica - reclamada, entre outros, pelo representante da Ordem dos Advogados do Brasil, secgdo DF, Augus- to Pinto Lima ~ €explicita ao se identificar na Constituinte (sem Geti- lio!) a primeira organizacéo no caminho da legalidade: “ndo podemos votar com a Carta de 37. Nao queremos eleigées prostituidas e cons- purcadus, como obdséquio, como graca do Sr. Getilio Vargas, através do Sr. Agamenon, esse bandoleiro do Dircito" '. Pedro Aleixo, presi- dindo a sess2o solene, enfatiza 0 papel do Poder Legislativo como “a coluna mestra da democracia” e conclama todas as correntes liberais a protestarem contra a censura prévia & imprensa, lembrando 0 fecha- mento recente do Didrio de Pernambuco, “Orglo de centendria tradi- 0 liberal”. Na esteira das ameagas de censura, 0 discurso de Joo Mangabei- ra € 0 mais contundente: “a pretexto de greves provocadas adrede ou causadas pela politica inflacionista do governo; a pretexto de planos | Todas us ctagBes de discursos dos fundadores so textuals, de acordo com as Noras ‘Taquigrificas pata 1 Ata da Sessio de Fundagio da UDN, Arquivo UDN. 5 inexistentes de motins e revoltas cavilosamente atribuldas pelo gover- no & oposigdo, urde-se & conjure para reimplantar no Brasil o renega- do regime de censura & imprensa (...) Reagiremos. Apelaremos para o8 lribuniis, para os jornais e os jornalistas, para as classes armadas e us conservadorus, para 05 profissionais liberais, pare 0 operariado, para todos os homens © mulheres que amam # Patria e a Liberade’ A insisineia em imagens retdricas de gosto passadista - como a somparagio de Washington Luis com D. Pedro II no exilio, ou de exaltagdo & memdria de Rui Barbosa ~ ndo impede # hora da audici Reclamta-se a concessito da “anistia ampla e irrestrita”” ¢ chega-se a su- getir que “a vaya do lider comunista Luis Carlos Prestes na prisio sel ocupada pelo Sr. Getilio Vargas por mais uns trinta anos”. A Proposta du anistia, assim como a mogiio de Jodo Mangabeira de re- piidio d romada do poder por meio de golpes, $80 aplaudidas de pé por todos os presentes. Afirnta Jodo Mangabeira: “Sao absolutamente in- subsistentes todos os rumores circulantes, provenientes de fontes of ciais ou oficiosas, segundo os quais 0 movimento politico democrat co, que erguen em toda a nagdo a candidatura do Major-Brigadeiro Eduardo Gomes, tenba 0 objetivo de chegar a0 poder por meio de gol- pes ou revolugdes”, Oalvo da célera serd um 86, undnime e absoluto: o regime getulis- ta, Mauricio de Lacerda, um dos mais combatentes jornalistas repre- sentantes das esquerdas, explode numa curiosa acusagio a “acefalia” do governo, sugerindo 0 “encantamento sinistro da mula sem cabege” (1) © se refere avs jornais censurados como “as folhas de chucrute da ditadura”, A reorganizugéo administrativa do Estado Novo em torno de inovagdes na area trabalhista, que, teoricamente, poderia sensibi zar 08 grupos muis progrestitas, € igualmente condenada na critica es- pecitica uos Institutos, chariados de verdadeitos “prostitutos” (aplau- 303) que teriam criado “um falso capitalismo de Estado”, Merecem destayue duas dnicas concessées ao regime execrado: 0 voto de congra- tulagdes pelo restabelecimento de relagdes diplomaticas com 2 URSS, sugetide por Mauricio de Lacerda, ¢ u defesa da aluagdo de Oswaldo Aranlra quando no Ministerio das Relagdes Exteriores, feita pelo pro- prio, que também discursou em homenagem ao Brigadeiro Eduardo Gomes. A oragio oficial de langamento da candidatura do Brigadeiro coube ao gaticho Ruut Pilly, apoiado pelas delegagdes de todos os es- tados. Ao se uprovar a criago de uma Comissdo de Estudos para elabo- rat 0s estatutos do partido, escotha dos membros refletiu 2 predomi- nincia dos “notaveis” que marceriam, por muitos anos, a orientacéo jusidica da UDN, como Raul Fernandes, Prado Kelly e Waldemar Ferreira, Os outros membros da Comissdo dos Estatutos eram: Mari Brant, Jodo Sampaio, Flores da Cunha, Pedro Gago, José Américo e Oscar Stevenson; a secretaria coube a Prado Kelly. Os Estatutos fo- ram aprovados juntamente com o Programa, na Convencao de 17/08/45. respeito comum as importancias regionais, como um acordo té- cito, se revelu de maneira inequivoca. O mineiro Pedro Aleixo preside 1 reunido e o baiano Otavio Mangabeira (ausente) & aclamado como “a bandeira da liberdade, a bandeira do Dircito, a bandcirs da Justiga, 4 bandeira da honra, a bandeira da dignidade, « bandeira do Brasil” ‘A delegacdo carioca impie sua superioridade numérica (25 memoros) €.a presenga de uma pequena ala universitéria ¢ outra, minima, operd- ria; salida-se 0 vigor combativo dos democratas do Rio Grande do Sul (lembre-se que havia uma certa hostilidade aos conterraneos de Var- gas; Gurunte uma das reunides preparatérias Luis Camilo de Oliveira Neto e Aduuto Liicio Cardaso gritaram “abaixo os gaichos”, atingin~ do especialmente a presenca de Oswaldo Ararha) a Sao Paulo reser- vasse « honra do titulo “meca da democracia”, 'A noite da fundagdo se encerra com o pedido de reintegragto dos professores que haviam sido afastados da Universidade do Brasil, Lednidas de Rezende, Hermes Lima, Castro Rebelo, Mauricio de Me- deiros ¢ Bilac Pinto. Os exilados politicos, inspiradores da conspiragao udenista, como Otavio Mangabeira, Armando de Salles Oliveira € Paulo Nogueira Filho, so aclamados com votos de breve retorno. So- lenemente se dispersam 05 novos udenistas apés um minuto de silencio ‘em memiéria do estudante Demécrito de Souza Filho, 0 mértir da redemocratizagao, morto durante o tiroteio de repressdo a0 comicio pr6-Brigudeiro no Recife, a 3 de margo de 1943. Assinaram a Ata da Fundagao da Unido Democrética Nacional: Jose Augusto Bezetta de Medeiros, Adhemer de Barros, Joaquim Bandeira de Mello, Jozo Cleophas, Carlos de Lima Cavalcanti, Carlos Castitho Cabral, Anto- nio Carvatho Guimaraes, Jodo Carlos Machado, Rau! Pilla, Poty Me- deiros, Waldemar Ferreira, Oscar Stevenson, Mathias Olimpio, José Candido Ferraz, Osério Borba, Arnon de Mello, Wanderley Pinho, Adhelmar Rocha, Francisco Alves Cavalcanti, Raphael Cincura de ‘Andrade, Oswaldo Trigueito, Belmiro Medeiros, Raphael Fernandes Gurido, Ernani Satyro, Nehemias Gueiros, Amorim Parga, Maria Luiza Bittencourt, Maria Rita Soares de Andrade, Orlando Vieira Dantas, Tristao da Cunha, Lourival de Melle Motta, Pedro da Costa Rego, Orlando Araijo, Lino Machado, Luis Camillo de Oliveira Net- to, Joaquim de Salles, Astrogildo Pereira, Nelson Souza Carnciro, Jo- sé Guudéncio, Emilio Diniz da Silva, Domingos Velasco, José Ferrei- ra de Souza, Alde Sampaio, Paulo Martins, Luis Pinheiro Paes Leme, Jones Rocha, Tito Livio de Sant’ Anna, Joo Mangabeira, Heitor Bel- ito, Mario Martins, Nelson de Sena, Jacy de Figueiredo, Carmem Portinho, Mauricio de Larceda, Lengruber Filho, Miguel Costa Filho, a Raul Leite Filho, Xavier de Araujo, Evandro Lins e Silva, Dortmund Martins, Benjamim Miranda, Aristides Mariano de Azevedo, Juran- dyr Pires Ferreira, Jodo Evangelista Lobato, Luiz Tinoco da Fonseca, Jeronymo Monteiro Filho, Oscar Przewodosky, José Eduardo de Prado Kelly, Dionisio Busier Bentes, Arthur Leandro de Araiijo Cos- ta, Romo Junior, Virgilio A. de Mello Franco. stu lista de fundadores da UDN encontra-se apenas nos arqui- vos do extinto partido c apresenta algumas curiosidades: ~ omissoes importantes, como os nomes de Pedro Aleixo e Oswaldo Aranha, pre- semtes e atuantes na reunigo do sete de abril (Oswaldo Aranha dizia que jamais pertencera & UDN, embora tivesse apoiado o Brigadeiro); = omissdes importantes de nomes ausentes & reunido do sete de abril porém fundadores do partide, como José Américo de Almeida, Otévio Mangubeira, Arthur Bernardes, Armando de Salles Oliveira, Flores da Cunha ¢ Bilac Pinto, entre outros; ~ presenga de nomes de politicos que se afastariam radicalmente do partido, por motivos diametralmen- te opostos, como Adhemar de Barros (fundaria o PSP) ¢ Astrogildo Pereira (comunista); - a identificagao por nacionalidade (todos brasi- leiros), estado civil (apenas cinco solteiros) e profissio. O item profis- sto revela uns dados interessantes: 26 advogados, 9 professores, 9 mé- dicos, 9 jornalistas, 5 industriais, 3 fazendeiros, 3 engenheiros, 2 mili- lures, 2 escritores, | Tunciondrio e.... | lavrador, este o ilustre Dr. Vir- gilio de Mello Franco, politico, advogado, fazendeiro e jornalista. Quuse todos os professores sio também advogados e quase todos os industriais so também fazendeiros. 1.2 - 0 Elenco “Até os velhos partidos que renhiam, em seus crdnicos dissl- ios, formaram wma unidade milagrosa, em coligagdes, seludes pelo sentiment comum de uma nove vida publica, que sfo, hoje, a estrutura da Unido Democrética Nacional” Jose Americo, vast Amplu frente de oposigio, a UDN surge como um movimento uregudor das mais variadas tendéncias polftcas e ralzes historicas Algumus adesdes, sob o prisma do passado aparentemente incom- preensiveis - como a de Arthur Bernardes (um “earcomido” no parti do do Brigadeiro'), a de Adhemar de Barros (ex-interventor em Sio Paulo, persona non grata por exceléncia das elites paulistas, tanto do PRP quunto do PD), ou uinds a de Oswaldo Aranha, amigo e uliado de Gettilio ~ revelam a predomindncia do caleulo polltico sobre as "ra- * Chuado por Yves de Oliveira, 1971, p. 182, 2s z0es do coragdo” ou da meméria historica, Adversdrios de tempos i periais, velhos inimigos, desafetos jurados, reiem-se com a finalidade nice de apressar a queda de Vargas e suprimir seu regime. No segun- do semestre de 1945, jd se registram desmembramentos em pequenos partidos (PL, PR, PSP), além das defecgdes individuais ~ tanto pela es- querda, quanto pela direita - 0 que torna ainda mais importante iden- tificar, na época de sua fundacdo, os diversos grupos que compunham a UDN. Estes podem ser situados em cinco categorias, que néo serio rigidas ou exaustivas, mas que indicam, 120 proximamente quanto possivel, as origens, as posigdes e as aliancas: a) As oligarquias destronadas com a Revolugio de 30; b) Os antigos aliados de Getilio, marginalizados depois de 30 ou em 3; ©) Os que participaram do Estado Novo e se afastaram antes de 1945; €) Os grupos liberais com uma forte identficacdo regional; ©) As esquerdas 1) Os membros das oligarquias destronadas a partir de 1930: 0s per- repistas mineiros, liderados por Arthur Bernardes, como Mario Brant © Dario de Almeida Magalhdes; os perrepistes paulistas, em torno de Jalio Prestes ¢ Joao Sampaio; os autonomistas baianos, vinculados a Otavio Mangubeira (vencidos em 1930 e, fortanto, adversarios do grupo de Juraci Magalhdes, que também ingressaria na UDN); os clas politico-familiares, como os Konder, em Santa Catarina (os quais se aliariam a Irineu Bornhausen, formando uma forte ala udenista que dominaria, por décadas, a politica no estado); a familia Caiado em Goids, conhecida como de “latifundiérios intelectuais”, no poder des- de 0 inicio do século e derrubados pelas forcas revolucionarias minei- ras, que invadiram 0 estado em 1930; 0s Correia da Costa, em Mato Grosso; os Nery, no Amazonas; José Augusto e seu grupo no Rio Grande do Norte eo de Leandro Maciel, em Sergipe. Nesta categoria, situam-se, igualmente, os grupos mais recentes, surgidos depois de 30 = € que, aparentemente, ndo poderiam ser considerados “oligérqui- cos” mas que também nao seriam “liberais”. Trata-se das tamilias de peso politico emergente no Nordeste, que mais tarde dominariam as politicas estaduais, mas que, pelo fato de surgirem em oposicao as in- terventorias, néio poderiam ingressar no PSD: os Tavore, no Ceard; 03 Sampuio'e Jodo Cleophas em Pernambuco e os representantes da burguesia baiana mais tradicional como Clemente Mariani, entre ou- tos. ) Os antigos aliados de Getilio: os teneates que se sentiram trai- dos, como Eduardo Gomes, Isidoro Dias Lopes, Juraci Magalhaes; os membros da Alianga Liberal, cuja ruptura definitiva ocorre com 0 apoio & Revolucio Paulista de 32, como o grapo gaiicho chefiado por Borges de Medeiros (Partido Republicano Riograndense); os minci- » ros, como AntOnio Carlos (perdeu a presidéncia da Camara) ¢ Virgilio de Mello Franco (perdeu, junto com Gustavo Capanema, para Bene dito Valudares,« indicugdo para a interventoria no estado, em 1933);0 candidato apoiado por Getilio as eleigdes presidenciuis frustradas com o golpe de 37, José Américo (embora a maioria de seus partid Tios tenhu ingressudo no PSD); os governadores dissidentes Ou alija- dos do poder em 317, como Flores da Cunha (RS), Lima Cavalcanti (PE) e Juraci Magalhaes (BA), cuja autoridade foi diminuida pela fe- Aeralizagdo das forcas pUblicas; € os politicos que apoiaram ou inte- graram 0 governo, no periodo constitucional, como Pedro Aleixo (presidente da Cimara quando de seu fechamenio em 1937) ¢ Odilon Braga, ministro da Agricultura, que se recusou a essinar a Carta de 37 ©) Os que participaram do Estado Novo: sao 08 que apoiaram 0 golpe ¢ tiveram cargos piblicos durante @ ditadura, mas romperam com Getilio ou com as forzas locas situacionistas, antes de 1945. En- tre outros, Oswaldo Aranha, Ministro do Exterior até 1944; Gabriel Passos, procurador-geral ds Repiblica até 1945; Adhemar de Burros, interventor em Sdo Paulo até 1942 e Argemiro de Figueiredo, na Pa: raiba, uté 1940. Substituido na interventoria do estado por Ruy Ca neiro (um dos futuros caciques do PSD estadual e nacional), Argemiro de Figueiredo, embora rompido com José Américo, se vé compelido a ingressur na UDN. Também na Paraiba, Ernani Sétiro constitui outro Lipieo exemplo do *“udenists por contingéncia”: fora chefe de policia e prefeito de Jodo Pessoa, durante o Estado Novo, sendo afastado da si- tuagao local em 1940 (Ernani Sétiro confirmaria mais tarde: "s6 no entrei para o PSD por causa das divergéncias locais. UDN e PSD erum farinha do mesmo saco”. Entrevista & autora, 10/1/1977) 4) Os liberais nos estados: aqui, 0 corte regional é importante, porque u oposigdo liberal tinha uma nitida idemtificago em termos de correntes estuduais, como o grupo dos libertadores gatichos, chefiados por Ruul Pilla ¢ 0 grupo dos minciros, inspiradores do “Manifesto”, como Milton Campos, 0s Mello Franco, Bilac Pinto, Luis Camilo, Magalhaes Pinto, entre ou:ros. Ao grupo paulista, tradicionalmente anti-getulista, pertenciam os egressos do Partido Constitucionalista, ou seja, os ex-combatentes de 32 e os remanescentes do Partido Demo. ctitico e que se reuniram na UDB (Unido Democrética Brasileira) em toro da cundidaturu frusirada de Armando de Salles Oliveira, Do an- tigo Partido Democratico (fundudo em 1926), irdo militar na UDN professores da Fuculdade de Direito como Ernesto Leme ¢ Waldemar Ferreira; jornalistus ligudos a0 O Estado de S, Paulo, como Jilio de Mesquita Filho e Plinio Barreto; membros da aritocracia rural, como Fabio da Silva Prado, e ant gos politicos como Henrique Baima e AU- relao Leite. Aliaram-se, por motivos estritamente locais, aos iberais urmandistus, dissidentes do velho PRP (cuja maioria ingressou no 0 PSD), ou seja, a facgdo liderada por Ataliba Leonel. O grupo flumi- ‘nense era composto por bacharéis como Raul Fernandes, Prado Kelly e Soares Filho, em sua ala conservadora, e por intelectuais e jornalis- tas vinculudos ABDE (Associagio Brusileira de Escritores) e & UTI (Unio dos Trabathadores Intelectuais), em sua ala mais liberal, quan- do ndo de esquerde. Entre estes destacam-se Graciliano Ramos, Eva- risto de Morais Filho, Origenes Lessa, Frarcisco de Assis Barbosa, Pompeu de Souza, Mario Martins, Franklin de Oliveira, Raimundo Magalhaes Jt. ¢ Pedro Nava, Em seu estudo sobre a UDN Otévio Dulei lembra, ainda, a forte corrente catdlica que havia no Rio de Jax neiro ligada 20 Centro Dom Vital (Alceu de Amoroso Lima, Edgar di Matta Machado, Sobral Pinto) ¢ que conseguiu evoluir de uma posi- fo reaciondria para apoiar a linha mais progressista da UDNe acan- didatura do Brigadeiro (1977, p. 77). ©) As esquerdas: esta categoria compde-se de trés grupos: os politi- 08 ¢ intelectuais, de tendéncias socialistas, que formariam a Esquerda Democratica, surgida, publicamente, dois meses depois da fundacdo da UDN, com um manifesto de apoio ao Brigadeiro*, com Hermes Lima e Jodo Mangabeira, € 0 antigo militanteda ANL, Domingos Ve- lasco; 0s comunistas dissidentes da linha oficial do partido ~ represen- tada pela CNOP (Comissdo Nacional de Organizacdo Proviséria) que Pregava uma aproximagdo com Getilio - como Silo Meirelles, Astro gildo Pereira e 0 professor maraista anti-stalinista Lednidas Rezend 0s estudantes ou recém-egressos do movimento estudantil, igualmente de tendéncias socialistas, cuja militancia, desce 1942, era especialmen- te atuunte na Faculdade de Dircito de So Paulo, em Minas Gerais, no Rio de Janeiro e em Pernambuco. E importante deixar claro, no entanto, que a Esquerda Democré- tica no pode ser confundida com uma faccdo ou uma ala dissidente da UDN, como geralmente acontece. A ED nunca pertenceu & UDN, isto é, como grupo organicamente integrado ao partido, mas apenas se compés com ela, para consolidar a frente tinica de oposigdo & ditadu- ra. "A prova disso € que, por ocasi8o das eleigbes para a Constituinte Federal a ED apresentou candidatos préprios, embora em chapa con- Junta sob a sigla UDN-ED, elegendo Hermes Lima e Domingos Velas- £0, O equivoco se justifiea por dois motivos 1) ~ membros notérios da ED, como Hermes Lima, Domingos Velas- co, Osorio Borba, Jurandir Pires Ferreira e Jodo Mangabeira, 2 Os Manifestos da Esqueréa Democritica e o da Unifo Democrétic Socialists fo ‘am pablicados por Edgat Carone em 4 Terceira Repiblea, Sto Paulo, DIFEL, 1976, p33 c segs 2A Unido Socilista Popular, fundada em 1945, tambim partsipou da Frente nica, vinculada & Esquerda Democrtiea, FY articiparam, efetivamente, da criagio da UDN e assinaram a tata de fundagio do partido, Esses nomes, portanto, podem ser considerados dissidentes da UDN, mas no a ED enquanto gru- po 2) ~ ulém da causa maior, a redemocratizagdo, tanto a UDN quanto ‘a ED, tinham outros interesses nessa alianga, A ED contava com reduzida capacidade de mobilizagao eleitoral e como a nova lei, de 28/5/45, exigia, para registro de partidos*nacionais, © mit mo de dez mil assinaturas de eleitores em pelo menos cinco esta- dos, tornava-se indispensivel a formagdo de chapas conjuntas UDN-ED. Pelo lado da UDN era ainda mais interessante contar com 0 upoio dos setores de esquerda, 0 que contribuia para dis- solver a aura conservadora que marcava o partido, No que se refere a defesa das liberdades democraticas a ED se identificava com o programa da UDN (nessa época os udenistas tam- bém defendiam, por exemplo, a autonomia sindical e 0 direito de gre- vve); mas, pelo lado da politiea econdmica e propostas a longo prazo, a ED apresentava uma disting3o fundamental, que se revelaria crucial para 0 afustamento da UDN e a conseqilente identificagao com o Par- tido Socialista. A ED, ao contririo da UDN, insistia na transforma- $20 do regime capitlista de produgio eno ideal de uma sociedade sem 03 MANIFESTOS, OS INTELECTUAIS DANTES “Depois de tumanhas dores de tdo duro cativeiro, a8 maos dos interventores, que quer 0 Brasil inteiro? © Brigadeirot Brigadeiro da esperanga Brigadeiro da lisura, Que hi nele que tanto afiance a sua candidature? Alma purl Abuixo a politicalhat ‘Abuixo 0 poltiqueiro! Votemos em quem nos valha. ‘Quem nos vale, brasileiro? © Brigadeiro!” Manuel Bandeira, 1945 * 4 Sobee Esquerda Democriticn ver os livros de Hermes Lima, (1974) ede Francisco Mangshiea (1979). Ver, tmbén, 0 vetbete da autore pare 0 Disiondrio Histérico- Biggratico ds CPDOC (ao pres) "Publicado em Paulo Pico Chagas, ©. Brigadeiro da Liberdade, Rio, Zlio Vale vere, 1955, ” A efervescéncia generalizada de varios grupos sociais contra o Es- tado Novo, naturalmente convergentes na camoanha do Brigadciro, permite considerar 0 movimento que desembocaria na criagio da UDN como um movimento da sociedade civil, das eamadas médias para cima‘. A mobilizagdo é intensa j& nos primeiros anos da década de 40. Criaram-se associagdes e reativaram-se asd existentes: manifes- tos, jornais clandestinos, congressos, manifestagdes estudantis, tudo contribui para a construcéo de uma especial conjuntura, consolidada ‘em 1945 como 2 redemocratizagéo, cujo climax sera a deposicéo de Getilio a 29 de outubro ~ ¢ 0 fatal anti-climax a derrota do Brigadeiro nas eleigdes de dezembro. ‘As manifestagdes estudantis intensificaram-se a partir de 1942, sob a lideranga da UNE (Unido Nacional dos Estudantes), ¢ suas se Ges estaduais, sobretudo no Rio de Janeiro, em Sao Paulo e em Per- nambuco. Na tradicional Faculdade de Direito co Largo de Sao Fran- cisco (SP) destacava-se 0 grupo militante que reania liberais ¢ esquer- distas ~ esiudantes vinculados & Unido Democratica Socialista ~ publicava, a partir de 1944, o jornal clandestino Resisténcia (descen- dente do Folha Dobrada, de 1939) . O grupo miaeiro também editava um semanario clandestino, o Liberdade, o qual chegou a ter vida publica apés a queda de Getilio. O primeiro semestre de 1943 serd marcado pelo VI Congresso da UNE e pela Semana Anti-Fascista, fo- runs igualmente radicais na dendincia de um regime ditatorial interno, quando 0 pais combatia o fascismo na Europe, ‘Congregando setores liberais-conservadores surgem associagdes como a “Liga da Defesa Nacional”, que reine civis e militares (egres- sos da FEB e antigos tenentes) ¢ a “Sociedade Amigos da América”, que seria fechada em 1944, provocando o afas:amento do chanceler ‘Oswaldo Aranha do governo, seu rompimento com Getilio ¢ sua pos- terior adesio & candidatura do Brigadeiro. Do lado dos liberais de es- querda encontram-se os intelectuais que ingressariam, na Esquerda Demoeritica; a Legido Cinco de Julho, qye congregava jornalistas, como Mauricio de Lacerda, ¢ militares de linha racionalista, como Fe- licissimo Cardoso; a Associacdo Brasileira de Escritores (ABDE) ¢ @ 5 Fernando Henrique Cardoso sugere que a UON pauls “er, junto talvez com 0 PDC, o que existia como organizacio polica da classe média que viv fora do aparetho ddo Estado. Neste sentido, continha de ato germes que‘ habiitavar,formalmente, user lm partido uue ayregava interezes da Sociedade civil”. “Patides e Deputados em Sto Paulo”, in Lamouniet © Cardoso, 1975, p. 54 @ No "Bale das Américas" desta Faculdade, realizado a 10 de outubro de 1843, reci- tavase a setlha: “Oh! Herdico Legiondrio/ do Corpo Expedicionério/ Por que vais Tatae a camo2/ Se a uta é cruentae fria/ € pela Democracia/ Vamos lutar aqui mes- mol” Ver Almeida Jinior, 1965, p. 295 e seg 3 Unido de Trabalhadores Intelectuais (UTI), esta de duracdo efémera, Porém muito ativa, gragus uo “eomité de agdo” formado por jornalis. {as profissionais. Tais associagdes apoiaram, integralmente, a campa- nha do Brigadeiro; a elas acrescente-se a Liga Eleitoral Catdlica (LEC), & qual pertencia, por exemplo, Alceu de Amoroso Lima’ e 0 Comité Feminino Pré-Democracia (as brasileiras obtiveram o direito ‘40 voto em 1932, ¢ votariam pura a presidéncia da Republica pela pri- meira vez em 1945). Em linhas zerais, pertanto, € posstvel afirmar que, exeluindo-se ©8 setores populares, todos os grupos representativos da sociedade ci Vil, dos liberais-conservadores aos socialistas, pasando pelos intelec- tuais “enggjados”, upoievam ow mesmo militavam na campanha do Brigudeiro. Os setores populares, organizados em sindicatos ou asso- ciagdes afins, permaneceram, via de regra, figis a politica trabalhista iniciada por Getilio ou vinculados & palavra de ordem dos comunis- lus, fiderados por Prestes. A campanha do Brigadeiro nfo contou com ‘apoio popular, mas o crescimento do movimento sindical, e sobretudo a cfervescéncia das greves, reforgaria o clima da “democratizagao”, Provocando, em contrapurtida, uma forte repressio no governo Du. tra’, ‘A oposigdo liberal-conservadora teria seu ponto alto com a atua- gio dos bucharéis - a comegar pelo "Manifesto dos Mineiros” ~ ea oposigdo liberul-de-esquerda com a militincia dos estudantes, dos es- critores e jornalistas. 2.1 - © “Munilesto dos Mineiros” © “Munifesto dos Mineiros" (Jatudo de 24 de outubro de 1943) pussou 4 Histéria como um dos elementos decisivos para @ queda de Gettilio ¢ o fim do Estado Novo, embora nao apresentasse qualquer Proposta de avdo concrete para a deirubada do regime. O manifesto foi importante por ser « primeira manifestagdo ostensiva, coletiva e as- sinad, organizada por membros das elites liberais, até ento ausentes em qualquer contestagio publica, Do dngulo das raizes udenistas 0 Manifesto é da maior importén- cia € ndo apenas como reliquia histérica, sempre lembrada nas efemé- 7 Alecu Amoroso Lima confi mari, mats atde, “a lrismio” da eampanha de Brigae ciro nis eonfessria seu propr o esencasto com © desprepuro e Eduardo Gomes Pu © Lato des questdes Socias. Apu Landers, 1974, p42 ¥ Sobre o niovimntu operiric na eonjanturu de demovraticagZo ver os teabulhos de . Wetfort (1972, 1973), BIL de Almeida CE, Martins (1973), A. Catlos Bernardo (1974), 1, Werneck Vianns (1975), R. Maranhdo (1979) € J, Almino de Souea Filho (1979), entre outros, M rides, mesmo com o perigo de acentuar os descaminhos autoritérios dos liberais que o assinarem . Para a hist6ria da UDN 0 Manifesto éa pedru fundumental, resultado da conspiragdo iniciada a partit do Con- gresso Juridico Nacional, realizado no Rio de Janeiro (convocado elo Instituto dos Advogados Brasileiros) em agosto de 1943, A tese sobre as liberdades piblicas apresentada pela bancada mineita, com apoio dus delegagdes cariocu buiana, é saboiada por elementos go- vernistus e os oposicionistas abandonam 0 Corgresso, surgindo, dal, a idéia do Manifesto. Seus principais inspiradores ~ Pedro Aleixo, Mil- ton Campos, Virgilio de Mello Franco, Luis Camilo de Oliveira Neto, Afonso Arinos, Dario de Almeida Magulhaes ¢ Odilon Braga - foram também fundadores da UDN, nela militando ativamente no plano es- tadual ou federal. Ao lado da crOnica udenista hd que perceber o signi- ficado regional do Manifesto, cuja subscrigio foi limitads wos minei- ros, contundo-se 92 assinaturas de personulidades da vida piiblica, in- telectual (professores e jornalistas) e econdmics, sobretudo um grande numero de advogados, em geral consultores juridicos ou diretores de bancos. Tratava-se de uma resposta “A espoliagio do poder politico de Minas Gerais a partir da ascensio de Getilio Vargas”, que “‘traira a Alianga Liberal” A motivagdo politica mais profunda para a elaboragdo do Mani- festo apresenta um aspecto mais realista, sendo oportunista, embora no discreto estilo das artes mineiras: tratava-se de recuperar a iniciati- vva politica em face das pretensdes democratizantes de Gevilio Vargas, cujas posigdes teriam comegado a mudar com as perspectivas da vité- tia dos Aliados contra o Eixo. Essa motivayao, em geral desapercebida os comentiirios sobre 0 Manifesto, surge claramente nas alirmagdes de Virgilio de Mello Franco, ainda em 1946: "cesvendando a transpa~ rente intengdo do consul, os homens da resisténcia democratica, espe- cialmente os de Minas, conspiraram, a bem dizer, em segredo, para elaborur um Manifesto que logo se tornou conhecido com a denomi- ago de Manifesto dos Mineiros... quando comegou 4 mudar a sorte as batalhas e 0 iménso poderio militar ¢ industrial americano passoy # pesar na balanga, o plano de nosso pequeno Napoledo III tornou-se de uma clareza meridiana. Ele surpreenderia o pais com a mesma ma- nobra de 1937, porém pelo avesso: no sentido da democracia” (1946, pl) O Manifesto foi, portanto, um elemento sutil de luta pelo poder; defendia-se todas as liberdades individuais ¢ a instauragdo de um esta 9 A sobrevivéneia putea de alguns wdenistashistéricos devese, as veces incdmo- dos paradoxos:o liberal Magalhdes Pinto do Manifesto de 1943 €0 mesmo signtario do sinistto arbitrio do AL. 5, de 1968 35 do de bem-estar, mas, principalmente, reivindicava-se maior participa- io politica e econdmica para as proprias elites. Varios entre os signa- trios do Manifesto sofreram sangdes, como demissdes ou aposenta: dorias de cargos em instituigdes geralmente vineuladas ao Estado, mas nenhum tipo de sangio policial. Isso confirma a situagdo privilegiada Ue elite, pois prises e violEncias fisicas - como ocorre desde sempre na historia brasileira ~ eram reservudas aos membros das classes traba- Inadoras (comunistas, ararquistas, sindicalistus) e, em menor grau, ‘20s estuduntes. Gettlio Vargas referiu-se uma Gnica vez aos signaté- rigs do Manifesto, em velada ironia, ao criticar “os pruridos demago- gicos de alguns leguleios em férias”, Vale a pena reproduzir o trecho de seu discurso, na inaugaragdo do novo prédio do Ministério da Fa zenda, a 10 de novembro de 1943, pouco tempo depois da divulgagio do Manifesto: ‘Nio temos tempo pata desperdicar na interpretagdo de formulas ideoldgicas ¢ no exame das conveniéncias pollticas de simples fi- nalidades eleitorais. No fundo da nossa conscignecia sentirlamos re- ‘morso se contribuissemos para langar 0 povo brasileiro nos exces- sos de um ugitago partidaria com o fim de trangiilizar os pruri- dos demagdgicos de alguns leguleios em férias. E singular e merece Feparo irdnico que esses inquietos reformadores improvisados, sempre conhecidos no cenarios politico pelas suas tendéncias re- tardatirius, se erijam em profetas democrdticos, exatamente na ocasidlo em que os povos da velha estrutura representativa prefe- rem adiar as convocagdes a vontade popular e manter os cheles hos seus postos” Em termos de conteddo ideolégico — & parte a exaltagdo dus tradi- des dus lutas liberais ¢ dos herdis mineiros, como a Inconfidéncia e 0 movimento de Teéfilo Ottoni ~ 0 Manifesto exprime a defesa pura- mente formal das liberdades democraticus. Se chegu a sugerir 0 aban- dono aos temas do “liberalismo passivo” ¢ a defender "uma certa de- mneratizagin na economia”, no hé mengdo alguma as questder cru. ciais que uma nova democracia teria que enfrentar: o problema do tra- bulho, a umpliaglo na pa-ticipacdo politica dos setores populares e a liberdade sindical. Uma leitura atenta do Manifesto sugere, sem divi- da, preciosus pistes para a comprecnsdo das ambigiiidades na heranga liberal reclamuada pela UDN, questo a ser relomada em outra parte deste estudo " lo VARGAS, Geto ~ "A Nova Sede do Minstério da Fuzenda”, in 4 Nove Poll ct do Bras, vol X, Rio, Jest Olyspio, 1944, II Sobre © Manilesto’ Mine, ver, da uutora, 0 verbete no Diconério Histrico- ‘Mugrifiew Brusileire.do CPDOC (no pre). Para depoimentos ver, de Luis Camillo de Obiveira Neto, Mista, Culture Laberdade (1957). M6 2.2 ~ Os Intelectuais e a Esquerda As tentativas de se promoverem manifesios semelhantes na Bahia (por iniciativa de Jodo Mangabeira) ¢ no Rio Grande do Sul néo vin- guram, Os manifestos seguintes, de cardter cada vez mais contestat6rio 20 regime, revelavam uma nitida diferenga entre si no que se refere & questo da intervengdo das forcas armadas. A comparacio serd inevi- tavel: os politicos a reputam indispensavel, os intelectuais a ignoram. Quanto avs politicos, os manifestos de Armando de Salles Oliveira ¢ de Dario de Almeida Magalhdes constituem os melhores exemplos € entre os intelectuais destacam-se a Declaragio do 1 Congresso dos Eseritores ¢ 0 Manifesto dos professores da Faculdade Nacional de Direito. Em dezembro de 1943, Armando de Salles Oliveira, entdo exi- lado em Buenos Aires, divulga uma “Carta aos Brasileiros” (nos mol- des de sua “Carta aos Chefes Militares”, de 1937), na qual exorta a unido de liberais ¢ dos chefes militares em defesa da democracia: "do povo €o Exército a imagem, nestas fases de guerra mais do que nunca Do povo tem ele as qualidades € os defeitos.(...) A verdade € que 0 Exército sofre e, em certo sentido, € mais infeliz do que 0 povo. porque 1s galdes sfo antenas sensiveis, que devem recolher, desde muito lon- Be, 05 funestos pressdigios de humilhagdo da patria” * Em abril de 1944, Dario de Almeida Magalhaes, sob o pseudéni mo de Timandro ~ em homenagem a Torres Homem, (1811-1876) 0 “Timandro” do Libelo do Povo ~ escreve uma carta ao Ministro da Guerra, General Eurico Dutra, alertando-o sara o cumprimento dos “deveres das Forges Armadas em face da ditadura”, ou seja, para que “estabelegam, com 2 retirada do usurpador, um governo de concentra- ‘edo nacional” ®, 0 I Congresso Brasileiro de Escritores ndo fazia apelos a inter- vengdo militar, e também se diferenciava do Manifesto dos Mineiros por aglutinar, além dos liberais, membros des diversas tendéncias da esquerda. Como lembrou Anténio Candido “o congresso projetado visava 2 uma tentativa de congracamento de todos os apositores da Estado Novo, pasando por cima das divergéncias nao apenas entre ‘esquerda ¢ liberais, mas dentro da propria esquerda, o que geralmente & mais dificil (..) Foi, essencialmente, um movimento de frente nica das diversas correntes (...) O essencial era unir taticanente as forges contra a ditadura” (Opinido, 26/6/75). " Da comissio que redigiu a 12 Armando de Salles Oliveira - “Carta aos Brasileies”, Buenos Aires, 10/12/1983, = Folheto impresso, sem ouiras referéncas, 13 Publicada nos jornas cariocas em ubrl de 194, erepublicada pelo autor em Pag nas Avalsas. 1987 14.0 artigo de Antonio Cundido foi re-publicado em seu recente livo Teresina, et Rio, Pus e Tecra, 1980, com o titulo "O Congreso dos Exeritore”, 7 “Declaragao”, varios membros participariam da fundago da UDN como Arnon de Melo, Carlos Lacerda, Homero Pires, Hermes Lima e Prado Kelly. O texto continha reivindicugdes expressas pela “legalida- de democratica como garantia da completa liberdade de expressio de pensamento, da liberdade de culto, da seguranca contra 0 temor da violencia © do direito a ums existéncia digna” e pelo “sistema de go- verno eleito pelo povo mediante sufrdgio universal, direto e secreto” A Declaragao, inicialmente distribuida em volantes, foi publicada nos jornais somente a 4 de margo, depois das entrevistas de José Américo, Prado Kelly © Francisco Campos, todas sem censura. O “Manifesto dos Mineiros” nao chegou a ser publicado na imprensa (Antonio Can- dido, idem). Em margo de 1945 os professores da Faculdade Nacional de Di- reito subscrevem um manifesto (redigido por San Tiago Dantas) no qual acentuum a falta de legitimidade da Carta de 37 e sugerem a en- trega da chefia du Nagdo ao Judicidrio, como efetivamente ocorreu 29 de outubro. ® ‘A esquerda paulista teve importante papel nas tentativas de apro- ximagdo entre liberais e esquerdistas. Este grupo congregava os membros da Unido Democritica Socialista (UDS) como Antonio Candido de Melo ¢ Souza, Antonio Costa Correa, Aziz Simo, Febus Gikovate, Paulo Emilio Salles Gomes ¢ Renato Sampaio Coelho e os comunistas dissidentes da CNOP, como Caio Prado Junior, Mario Schemberg Tito Batini. Germinal Feijé era o lider do grupo, que consolidava 0s contatos, tanto com os liberais quanto com os comu- nistas. Caio Prado Junior articulava os entendimentos com os conspi- radores no Rio de Janeire , os futuros udenistas. O nome Unidio De- moeritica Nucional foi sugerido por Caio Prado, que insistia no termo ‘democritico”, enuunto que para os comunistas ortodoxos a sila deveria ser apenas “Unido Nacional” *, Caio Prado, no entanto, 20 contririo do que jé foi dito, jamais pertenceu a UDN, restringindo sua participagdo as atividades conspiratérias contra a ditedura, no plano rai geral, e de oposigio & linha stalinista e getulista da CNOP, em particular *. 15 Revive Juric, vol. 8, 1944/1945, Faculdade Nacional de Ditto. Jo Sewundo depoimentos, autora, de Antonio Candido de Melio © Souza (20/12/1976) de Paulo Emiio Salles Gomes, este publicado na Revista de Cultura Cone tenyporinea, CEDEC, 12, 19% 17 Use ponto deve ser eseluecido pois, ao eontririo do que wfirma Héio Silva, em 1945: Pongue Depuseran Vargas (p. 120) Caio Prado niko chegov & ingressat na UDN, ‘mboru outres comunisas tenhuin purticipado de sua fundagdo. Em 1945 Caio Prado tiers unis entrevista com o Drigadeiro e ficara mal impresionsdo com seu antic ‘comunismo viruento e por ouvir apenas digressbes sobre origensfulizes (a genealo- ‘ia dos Prado, por exemplo), «aaa sobre us questées poliicusconetelas ou as diver ws Um poema de Guilherme de Figueiredo, que ingressaria na Es- querda Democratica, de abril de 1945, exemplifica essa participacdo os intelectuais ¢ reflete o clima politico da época. Em versos moder- nistas o autor langa um apelo a todos - militares, juristas, cristdos e até 20 “homem pequenino que mora numa priséio" (Luis Carlos Prestes) para que salvem o pais que estd se afogando. Os inimigos s4o todos pe- as da maquina getulista: os Institutos, 0 DIP, a Coordenagdo, ete POEMA DA MOA CAIDA NO MAR i Mario de Andrade, depresse A moga eaiu no mar ‘A MOGA CAIU NO MAR! Nao esto ouvindo vocés? Vamos todos, vamos todos, Venhis quem quer ajudar. Murilo pde na vitrole Um concerto de Mozart Sobral Pinto mande eartas Brigadeiro desga do ar, General chame os amigos Que u moga eaiu no mar A moga caiu no mar Ja sente 0 gosto de sal Seus cabelos estio frios Chamai Tristio para rezar. Vam os peixes fluorescentes Comer-Ihe os dedos da mio Vem doutor Getulio Vargas Devorar-Ihe 0 coragao \Vam os peixinhos do DIP Os peixes dos Institutos Peindes da Coordenagzo. incias ideoldgicas entre liberals ¢ comunists (Eatrenste & autora. So Paulo, 22/03/1977), Caio Prado Jr. epoiava, entretant, u candicatura do Brigade por set othomem capac, neste momento, detealizat a unddade nacional.) par o tesubele mento du democrucia e das liberdades piblices". Didvio Carioca de 2/3/48, ctado por Pereira da Silva, 1945, p. 184 wv Chico Campos, Goes Monteiro Receitam constituigdo de 37 ~ nio, nao! Se ela no morrer afogada Morreri dessa podo, Marcondes Filho ofereve Uma complementayio Oh! que vontade que eu sinto de dizer um palavrio um Amigos por que esperais? ‘A moga caiu no mar Palimércio, Palimércio Trace a tua lexido, Ressuscits Rui Barbosa Ressuscita Custro Alves Vejam todos quantos sio. Joo que chame Maria Maria chame Joie Venha 0 homem pequenino Que mora numa prisio Meu pai, vocé nem precisa Fazer mais revoluglo.” Afonso Pena Junior, insinuando a “virada"* de Prestes recém- anistiado, para © apoic a Getilio, assim respondeu: *Nio foi possivel, no foi Tirar a moga do mar porque © homem sequenino que morava na prisio fe gente botou nar para entrar no mutirdo carregou para outra banda os cablocos do arrastio. E a moga afogou no mar. Nosso Senhor lhe perdoe que ev nio lhe perd3o ndo pois deixou morrer a mo E acabousse a geragio ..." " 18 Cituado por Alveu Amoroso Lima, em eiscurso na ABL. Diseursos Aeadémices, ol NHI, 1948-1955, p. 8 40 ‘A maior parte dos intelectuais no comprometidos nem com 0 Estado Novo, nem com a linha oficial do Partido Comunista, partici- pava, portanto, da frente ampla em torno da futura UDN # Muitos deles, especialmente os socialistas da Esquerda Democritica, fizeram severas criticus Aquela adesdo, porém ou mu'to mais tarde ou justifi- cando # necessidade imperiosa de uma ynido contra “o inimigo co- ‘mum, O Professor Fernando de Azevedo, sera uma excegao, a0 criti car a iluséria ulianga, jd em margo de 1945, quando a maioria de seus colegas paulistas se envolvia na euforie democratizante e, sobretudo, nos ideais romanticos da conciliagdo nacional. A 10 de margo de 1945 (um més antes da fundugdo oficial da UDN), escreve Fernado de Aze- vedo a Paschoal Leme, reafirmando a “solidez de suas conviegdes S0- cialistas” e ulertando para males de uma ficticia “uniao nacional” que poderia resullar numa “reagdo conservadora que traz em si mesma 0 germen das forgas reuciondrias que hoje desfraldam, nu oposigdo, a bandeira democrdtica, para a entolarem amanha, conquistado 0 po- er ~ se convier a seus interesses de dominagio - mediante os estados de sitig ou de guerra montados para @ opressdo das minorias.” (Arqui- vo Fernando de Azevedo, 1.E.B., USP). A linha golpista, mais tarde assumida por setores infigis & liberal UDN de 45, daria razdo ao ceti- ‘clsmo do professor sovialista, praticamente solitirio em seu desencan- to com a democracia que entdo se armava. 3. A “CAMPANHA DO LENCO BRANCO” “Quem nao se lembra da célebre eleigio desse ano de 1860, ‘em que Otaviano, Saldanha e Oitoni derribaram as portas da Camara dos Deputados 4 fora de pena e de palavras? O len- cinho branco de Ottoni era a bandeira dessa rebelido, que pds na linha dos suplentes de eleitores os mais ilustres chefes conservadores”. Machado de Assis (“Gazeta de Neticias") 1892 A cundidatura do Brigadeiro resultara de uma decisio do movi- mento conspiratério de ciipula, ou seja, das articulagdes de dois pollti- cos de expressio nacional, ambos de raizes tenentistus: Virgilio de Mello Franco e Juraci Magalhiies. Depois de varias hesitagdes ¢ até ‘mesmo recusus (“nao seria melhor esperar pe 0 Cédigo Eleitoral?” ria sugerido wo José Américo), Eduardo Gomes assume sua candida- 19 Sobre os itelestuai ea lta pela democrascagde du culture (.), que permit a aprosimayio de posigdes nem sempre prOuintas no entardecer do Lado Novo", ver, de Cirios Guilherme Mots: devloga da Cultura Brasileira 1933-1974), Sio Paulo, Av, wir tura como uma missdo hist6rica ¢ se prepara, como militar, como re volucionrio e até como cristo, pura a luta que seria conhecida como a “campanha dy libertagio” ou a “eampanha do lengo branco”. A I? de abril de 1945, exonera-se da Diretoria das Rotas Aéreus e inicia seu novo papel; ndo serd, jamais um verdadeiro politico, mas um chefe (no sentido militar) ¢ seu nome permanece vinculado 4 UDN que se torna- 14, para muitos, "o partido do Brigadeiro”. Para us oposigdes coligadas tratava-se do candidato ideal: tinha um alto posto militar, uma legenda de heréi e uma tradigdo de lutas demoeraticas aliada # um “nome limpo”, em todos os sentidos. Dos idealistas revoluciondrios contra o regime “carcomido” da Repdblica Velha, Eduardo Gomes era, sem dvida, 0 primus inter pares: 0 com batente de 22 e o sobrevivente dos "18 do Forte” (mais tarde revelaria, discretamente, serem apenas dez), © organizador do Correio Aéreo Nacional ¢ 0 articulador da defeta aérea do Atlantico na Segunda Guerra Mundial. Surgia, também, como o candidate perfeito para fatrair as simpatias das classes médias que aplaudiam o ideal morali- zante, encarnado na figura exemplar de virtudes cristis e civieas do an- tigo tenente, Eduardo Gemes era, enfim, aquele que reunia as condi- ges indispensaveis para a primeira tentativa de “unio nacional” con- tra 0 Estado Novo. Outro militar, o ex-tenente (¢ admirador confesso do “Cavaleiro du Esperanga”) Cordeiro de Farias, contava, igualmen- te, com grade prestigio entre as Forgus Armadas; mas, embora rompi- do com Getiilio, seu nome era invidvel, pois guardava o estigma de ter sido interventor no Rio Grande do Sui, o que dificilmente reuniria as forgas politicus nuquele estado, ® Av desembarear do exilio, em muio de 1943, Otivio Mangabeira reforga o carisma militar do Brigadeiro ~ “pertence, cem por cento, a uma das ragas mais caras @ estima do puts, 1a dos Caxias e dos Deodoros” - ea exaltagdo du campanka, enfatizan- do que “a causa € maior que a da aboligdo dos escravos: € a da reden- a nacional. O chefe & Eduardo Gomes. Para tal causa, tal chefe!”” (Oliveira, Yves; 1971, p. 190). [AS arliculigoes pura & efetivagao da campanha comegarart est fins de Fevereiro de 45, com virias reunides preparatorias na casa do socialista Joio Mangabeira, ou no escritério de Virgilio de Mello Franco, que mantinha contatos em quase todos os estados, Para os conspiradores - José Américo, José Augusto, Prado Kelly, Adauto Livzio Cardoso, Luis Camilo de Oliveira Neto, entre outros ~ tornava~ se oportuna @ emergéncia do movimento clandestino. Do “Manifesto 20 Lm depoimenio ao vu de Sie Paulo Cordeiro de Farias revelou ter sido © iniermiehiio entre Eduardo Goines © Getolo, este the teria do que apoiaria us eanci- Uaturas de Salgado Tilho, Ges Monteiro, Joie Alberto « do proprio Cordeiro (07/0079. 2 dos Mineiros” de outubro de 1943, uo 1% Congresso Brasileiro de Es- Gritores, em Fevereiro de 1945, o ensuio fra lorgo, muitus vezes labo- Fioso 0 apoio dos comunistas,o recurso aos militares? ~ marcado por adesdes ¢ ubandonos ao formidavel elenco, Na tealidade, a UDN comegara 2 ser pensada no exlio. Otévio Mangabeira, em Nova York, ¢ Armando de Salles Oliveira, em Bue- nos Aires, mantinham estreitos contatos com os conspiradores no Bra Si. Mungubeira especializouse em Manifestos: “Uma Sucinta Expost Gio dos Fatos” (nov. 1943), “Ainda uma Vez, Meus Companheiros” {hov-44) e “Pontos nos ji di Ditadura Brasileira" (margo 45), A cons- piragdo propriamente dita, segundo depoimento de Prado Kelly, come- ura ainda em setembro de 1943, quando, ao visitar Armando Salles Goente em Buenos Aires discutiu-se a criacio de um partido, nos mol- ties da Uniio Democritica Brasileira ~ ou seja, um partido nacional, ugrupando as oposiges estaduais, e em torn deuma candidatura ebmo em 37. A campanha, diz Prado Kelly, “seria langada ao estilo mericano, como tinh sido a de Armando Salles: comicios em praca piiblica, apoio de drgias de imprensa, como "0 Estado de Sto Paulo”, Endo se repetiria a sigla UDB para nao afaster os partidérios da can- didatura do José Américo. A criagdo de partidos nacionais era uma rnecessidade imperiosa pois seriam coluns uni:drias para a consolida- {Gio das instituigdes, como o Partido Republicano de Francisco Glicé- fio ou de Pinheiro Machado, que terminaram no anonimato; a nova Campanha se inspiraria nas de Rui Barbosa e na Reagdo Republicana com a preocupagio, porém, de atingir, com maior amplidio, a opinigéo publica. A campanba civilista, por exemplo, fizera apenas quatro comics!” * 'A candidatura do Brigadeiro, acertada desde fins de 1944 erevela~ a na imprensa apés us entrevistas de José Américo e de Prado Kelly (evereiro de 1945) passa a dominar o cendrio politico. & possivel que fo Brigudeiro afagasse a idéia de se tornar o lider de uma nova revolu- Gao, e ndo asumir 0 papel de um candidato formal; mas a eficente téti- Sb situacionista de aceitar o desaflo de cleigdes e apresentar seu cund Gato ~ e ndo por acaso um militer,¢ justamente 0 entio Ministro da Guerra ~ foreou & panicipago do eniigo teneate numa disputa eeito- ral euja vilria parecia garantida, porém com a armadilha de ser uma “campanha de espada contra espada”. O Brigadeiro contava, ¢ certo, com 0 upoio da Aerondutica, mas seria temerdrio-avaliar a situagio 21 Entrevista de Prado Kelly & autora, Rio 2/2/77. De acordo com o entrevistado, ‘Anttnd Salles teri, sinda, considerado'"s necesidade Ce se ctiar ao lado de um part> Goude centre democritico, un partido tabathista, no est To do trabelhismo inglés, id tprovetida por Seyadss Viana e Getlio Vargas 4B geral entre os militares. Outro antigo tenente, Gen. Juarez Tévora, atento as possiveis cisdes escreve ao Gen. Dutra em margo de 1945: “sua candidatura nfo unira o Exército; nfo sera de conciliagao, mas de combate, nao visou unir, mas dividir ... ameaga eriar um perigoso antagonismo entre Exéreito e Aerondutica® (TAvora, 1974, Il, p. 188). Em seu estudo sobre a atuagio do General Dutra em 1945, Os- waldo Triguciro do Valle salienta que ambos os candidatos defendiam © restabelecimento total do Estado de Direito e nao diferiam. pratica- mente, em termos de posigdes conservadoras. ® E bem verdade que, em relagio politica econémica (livre empresa, capital estrangeiro) 0s candidatos tinham propostas semelhantes; mas se 0 Brigadeiro con guistou 0 apoio das esquerdas e dos intelectuaisliberais, em contrapar- tida o apoio das finangas paulistas (Gastao Vidigal, por ex.) foi para o General Dutra que, acima de tudo, representava o poder. Em depoimento recente, 0 pessedista Emani do Amaral Peixoto reitera o fato de que Getilio apoiara Dutra por temer que uma vitéria do Brigadeiro significasse a perseguicéo aos seus partidarios, ex- interventores ¢ aliados (0 ESP, 30/8/78). Ha indicios, no entanto, de que Gettlio teria cogitado da eventualidade de apoiar, discretamente, a candidatura de Eduardo Gomes; a hipétese é confirmada por Daniel Krieger em suas memérias (1976, p. 136) ¢ por Juraci Magalhaes, que em reuniio da Comissio Executiva da UDN (14/6/48) declara ter ou- vido de Oswaldo Aranha "que nas eleig6es passadas Getilio Vargas te- ria credenciado companheiros para estudar a possibilidade de apoiar a candidatura do Brigadeiro” (Arquivo UDN). Nao se faz, é claro, anilises histéricas com "se" ~ 0 que no impede, todavia, uma sedutora indagacio sobre os rumos de nossa hisiéria politica caso triunfasse uma alianga entre getulistas e udenistas. A hipétese exdrixula teria al- gum significado nos primeitos anos sessenta, com a dissidéncia da “Bossa Nova", que, se ndo era getulista, aproximava-se do presidente Jodo Goulart Caleulos politicos & parte (no que se refere as manobras de basti- ores) importa ressaltar 9 estilo da campanha do Brigadeiro. De abril a outubro de 1945 0 lengo branco foi acenado pelo pals afora, em ho- menagem & luta de Tedfilo Ottoni. no Império, A semelhanca entre as duas campanhas é assinalada por Afonso Arinos: “O movimento liberal, ressurrecto sob a lideranga de Ottoni, nao se cristalizou logo no partido, nem se poderia cristalizar sem um periodo prévio de sedimentagio, O que predominava entdo era 0 impulso sentimenta, a paixdo confusa e indefinida, a alma da 22 Oswaldo Trgucro do Ville: 0 General Dura e a Redemeratacio de 4, Ro Civ, Brasileira, 1978, p, 76. ee 44 rua, O lengo branco do serrano adejava sobre as multid®es como uma asa de esperanga imprecisa. Mais de oitenta anos depois, ou- tro lengo branco, 0 de Eduardo Gomes, arrastaria novas multi= des na luta contra uma ditadura poderosa, sem que isso impli- casse também na formacdo imediata de uma firme consciéncia partidéria” (1974, p. 41). Nao houve, na verdade, “a formagdo de uma firme consciéncia partidéria", como no houve ~ 0 que é muito mais grave - efetiva par- licipagio popular. Na evocagdo de Prado Kelly “a campanha do lengo branco fora bela e inica, o momento de maior idealismo politico no Brasil, com a convergéncia de forcas adversas, desavindas até entio, porém com um objetivo superior em comum” (entrevista & autora, ci- tada), A campanha mobilizou é verdade, amplos setores dai camadas. médias, dos intelectuais, das Forgas Armadas, mas nao os trabalhado- res; este povo permaneceu parte da campanha [eita, pelo menos teo- ricamente, em seu nome. Lembre-se, por exenplo, o famoso Comicio do Pacaembii (16/6/45). em Sio Paulo, quando o Brigadeiro apresen- ta a plataforma da UDN, assim descrito por Hermes Lima: “Ao entrar no estidio fiquei aterrado. Repletas as sociais de um publico seleto, elegante mesmo, em que se destacava numeroso concurso de senhoras, de chanéu ¢ caigando luvas, mas as gerais, vazias. Era um espetaculo politicamente confrangedor, a enorme praga de esportes, metade morta, metade bem composta, até nas palmas com que saudou 0 candidato e Ihe aplaudiu o discurso” (1974, p.151). A Gnica nota popular, no Pacaembt. setia dada por membros da Unido Democritica Socialista que desfilaram com uma faixa reivindi- cando liberdade sindical e direito de greve (entrevista, & autora, de An- tonio Candido. um dos portadores da faixa, 20/12/76). O boicote de Adhemar de Barros. ainda membro da UDN, porém notoriamente afastado dos udenistas paulistanos - teria contribuido entre outros fa tores, para o insucesso do comicio, Um‘elemento importante para @ impopularidade dé campanha foi a divulgagio, pelos “queremistas”, de que o Brigadeiro desdenhava “o voto dos marmiteiros” (segundo Afonso Arinos a calinia fugira ao controle dos articuladores da cam- panha, que nio reagiram com a necessaria rapidez e energia). O briga- dciro passou a ser indentificado como 0 candidato dos gri-finos € & UDN como 0 “partido dos cartolas” *. 23 Ver oartiza de Pedro Gomes: “UDN: o partido dagravata edo lengo branco" 0 semanirio Como, de 17/1/1982 A evidente falta de apelo popular ne figura do Brigadeiro fae reise dz sua candidatura em 1950, eujo novo fracasso flomous um dos motives principals para 0 apoio a Janio Quadros, en 1960; Barbosa Lima Sobrinho retrate a rigidez impopular do Bri, gedciro:..o Brigadeito Eduardo Gomes surgia solene, om um jeito iedtico, que immpunha distancia, Tinhu-se a impressio de que nessen mais para estitua que paru cundidato a postos eletivos. A propris re, cordagdo da revolta do Forte de Copacabana concorris pare soto kin hum pedestal, que seria decisivo, se ele o convertesse em tribuna”, (Vornat do Brasil 23/10/77), Mas tribuna ele no conseguiu set, embo. fa tenha se tornado, para sempre, “o chefe espritual do partido". En- ubril e outubro de 1945 0 Brigtdcro partcipou ativamente da cam. panha, percorrendo cidades-chaves como Sao Paulo, Belo Horizont Salvador e Porto Alegre F nut imped mPait do Brigadeizo foi intensamente acompanhade pela immprensa i qual se deve sem divida, a consirugdo de uma imagem al nee postive, sobretudo, de um elim otimista em rlagdo d vit6- Fa nas eleigdes, Em Sdo Paulo 0 jomnal O Estado de S. Paulo, n0 Rio Janeiro 0 Correo da Manhd, 0 Didrio de Noticias eo Didro Cari.

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