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FACULDADE DE JORNALISMO
Editorial, comentário e artigo
MELO, José Marques de. Jornalismo opinativo. 3 ed. Campos do
Jordão : Mantiqueira, 2003, p. 101-128
O editorial
Editorial é o gênero jornalístico que expressa a opinião oficial da
empresa diante dos fatos de maior repercussão no momento. Todavia, a sua
natureza de porta-voz da instituição jornalística precisa ser melhor compreendida e
delimitada.
Popularmente se diz que o editorial contém a opinião do dono ou da emissora
de radiodifusão. isso é verdade nas organizações de porte médio ou nas pequenas
empresas, onde o Controle financeiro fica nas mãos de um proprietário ou de Sua
família.
Precisando o conceito de editorial diz Raúl Rivadeneira Prada que, ao lhe atribuir
o sentido de "opinião da empresa". torne-se indispensável caracterizar as "relações de
propriedade" da instituição jornalística. Pois, nas sociedades capitalistas, o
editorial reflete não exatamente a opinião dos seus proprietários nominais,
mas o consenso das opiniões que emanam dos diferentes núcleos que
participam da propriedade da organização. Além dos acionistas majoritários, há
financiadores que subsidiam a operação das empresas, existem anunciantes que
carreiam recursos regulares para os cofres da organização através da compra de
espaço, além de braços do aparelho burocrático do Estado que exerce grande
influência sobre o processo jornalístico pelos controles que exerce no âmbito fiscal,
previdenciário, financeiro.
Assim sendo, o editorial afigura-se como um espaço de contradições.
Seu discurso constitui uma teia de articulações políticas e por isso representa um
exercício permanente de equilíbrio semântico. Sua vocação é a de apreender e
conciliar os diferentes interesses que perpassam sua operação cotidiana.
Mas se o editorial expressa essa opinião das forças que mantêm a instituição
jornalística, torna-se necessário indagar para quem se dirige em sua argumentação. A
resposta poderia ser tranquila: a opinião contida no editorial constitui um indicador que
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Para isto, todos os setores da redação e sucursais do JB por todo o país mandam as
informações mais recentes sobre os fatos queDE
FACULDADE estão acontecendo, ajudando assim na
JORNALISMO
atualização dos editarialistas - que já devem estar a par das notícias através da leitura
nela só do JB, mas também de outros jornais, para que a visão dos acontecimentos
seja a mais ampla possível. Os assuntos são todos anotados e debatidos, ouvindo-se a
opinião dos presentes para chegar-se a uma conclusão, que é então submetida à
Diretoria, responsável pela linha do jornal, para o tratamento do assunto.
O número de editoriais por edição nela é fixo, mas a maior constante é de três. Os
temas são repartidos entre os editorialistas, nunca ocorrendo de vários deles fazerem o
mesmo editorial. Cada um é escalado para estudar o seu tema e quando ele é somente
um, um único editorialista se encarrega dele.
Assim que os editoriais ficam prontos são nOl'amente submetidos à Diretoria que os
aprova ou então indica a melhor linha a ser tomada de modo a mio prejudicarem
aquela seguida pelo jornal.
Para sua melhor atualização e seu maior conhecimento nos assuntos de ordem geral,
os editorialistas costumam ter; uma vez cada semana, reuniões com personalidades
especializadas em assuntos de interesse não muito imediato, mas que funcionam como
informação num processo de esclarecimento confidencial off the record.
Observa-se então que cada editorial, numa grande empresa jornalística, passa por um
sofisticado processo de depuração dos fatos, de conferência dos dados, de checagem
das fontes. A decisão é tomada pela diretoria, funcionando o editorialista, que
se imagina alguém integrado na linha da instituição, como intérprete dos
pontos de vista que se convenciona devam ser divulgados. Além disso, o
contacto com personalidades externas à organização significa a sintonização com as
forças de que depende o jornal para funcionar ou cujos interesses defende na sua
política editorial.
Está distante aquela prática de redação dos editoriais nos velhos jornais e
revistas, cuja tarefa era desempenhada pelo "dono", ou seja, pelo jornalista-
proprietário. Como hoje as empresas jornalísticas pertencem a grandes corporações ou
são gerenciadas por pessoas que nem sempre emergiram profissionalmente do
jornalismo, é compreensível que precisem apelar para redatores tarimbados que fazem
a mediação entre a opinião institucional e a mensagem estampada nos editoriais.
Mas além desse traço político-social, o editorial como gênero jornalístico
tem sua identidade redacional. Fraser Bond diz que se trata de um ensaio
curto, embebido do senso de oportunidade. "O editorial do jornal hodierno tem
emergido como uma forma jornalística peculiar. Seu primo literário mais próximo é o
ensaio. Mas o editorial difere do ensaio, em sua brevidade e também porque insiste em
sua natureza contemporânea".
Esse perfil do editorial na imprensa norte-americana corresponde em grande
parte à sua feição brasileira. Juarez Bahia o confirma: "Parente literário do ensaio, o
editorial é, no jornal, no rádio ou na televisão, a palavra do editor, a opinião do veículo
ou da empresa. Antigamente essa opinião tinha o nome de artigo-de-fundo ou
comentário".
Mas o que constitui atributo específico do editorial? Beltrão aponta quatro:
impessoalidade (não se trata de matéria assinada, utilizando portanto a terceira
pessoa do singular ou a primeira do plural); topicalidade (trata de um tema bem
delimitado, mesmo que ainda não tenha adquirido configuração pública);
condensalidade (poucas idéias, dando maior ênfase às afirmações que às
demonstrações); plasticidade (flexibilidade, maleabilidade, não dogmatismo ).
Retomemos esses atributos e os analisemos brevemente. A impessoalidade
tem suas raízes na própria transição das instituições jornalísticas, que
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Comentário
Gênero só recentemente introduzido no Brasil, o comentário atendeu a uma
exigência da mutação jornalística que se processou através da rapidez na di vulgação
das notícias (rádio e televisão). informado rapidamente e resumidamente dos fatos
que estão acontecendo, o cidadão sente-se desejoso de saber um pouco mais e quer
orientar-se sobre o desenrolar das ocorrências.
Há muito tempo o comentário era cultivado no jornalismo norte-americano,
onde se privilegiavam certas figuras de relevo (oriundas da própria profissão), cujo
espaço cultivado permitiu que se convertessem em opinion-makers.
O comentarista é geralmente um jornalista com grande experiência e
tirocínio, que acompanha os fatos não apenas na sua aparência, mas possui dados
sempre disponíveis ao cidadão comum. Trata-se de um observador privilegiado, que
tem condições para descobrir certas tramas que envolvem os acontecimentos e
oferecê-las à compreensão do público.
Quase sempre bem remunerado, o comentarista é um profissional que
possui farta bagagem cultural, e portanto tem elementos para emitir opiniões
e valores capazes de credibilidade. Atua assim como líder de opinião. Seus juízos e
apreciações merecem respeito não só dos receptores, mas também dos personagens
do mundo da notícia.
Contudo, o comentarista não é um julgador partidário, alguém que faz
proselitismo ou doutrinação. É um analista que aprecia os fatos, estabelece conexões,
sugere desdobramentoS, mas procura manter, até onde é possível, um distanciamento
das ocorrências. isso não quer dizer que seja neutro. Ao contrário, trata-se de um
profissional participante, que possui opinão propria, mas atua como agente da notícia e
não procura exercer sua função para extrair vantagens posteriores (cargos
públicos/ascensão política). Em síntese, assume-se como juiz da coisa pública. Orienta
sem impor. Opina sem paixão. Conduz sem se alinhar.
O comentário surgiu como tentativa de quebrar o monopólio opinativo do
editorial. Esse monopólio era consequência da unidade ideológica que possui o
jornalismo pre-industrial. Mas, quando as instituições jornalísticas tomam caráter
mercantil, seus dirigentes deparam-se com a inevitabilidade das concessões sociais.
Concessões ao Estado, que mantém sua espada legal permanentemente afiada;
concessões aos grupos econômicos, que controlam o fluxo financeiro através da
compra de espaço/tempo para os anúncios, concessões à audiência, da qual dependem
para justificar os próprios investimentos publicitários. Por isso, tomou-se incômodo
manter o monopólio opinativo que expressava, através do editorial, o ponto de vista
das forças diretamente responsavels pelo funcionamento da empresa jornalística.
Desta forma, o comentário emerge como gênero definido, realizando uma
apreciação valorativa de determinados fatos. A ótica utilizada não é necessariamente a
da empresa. Abre-se oportunidades para que o jornalista competente possa emitir
suas próprias opiniões, responsabilizando-se naturalmente por elas.
O artigo
A palavra artigo possui duas significações. O senso comum atribui-lhe o sentido
de matéria publicada em jornal ou revista. Qualquer que seja. É comum ouvirmos
popularmente: "Fulano, você leu tal artigo no jornal? Ou então: Mandei pôr um artigo
na revista". Não importa a natureza: todo texto divulgado na imprensa se chama
artigo.
Outra significação é aquela peculiar às instituições jornalísticas, que identificam
o artigo como um gênero específico, uma forma de expressão verbal. Trata-se de uma
matéria jornalística onde alguém (jornalista ou não) desenvolve uma idéia e apresenta
sua opinião.
Se no jornalismo brasileiro o artigo tem essa dimensão explícita, representando
aquele tipo de matéria geralmente escrita pelos colaboradores e que se publica nas
páginas editoriais ou nos suplementos especializados. isso não ocorre no plano
internacional.
É comum um uso mais amplo no jornalismo europeu e norte-americano. O
jornalismo anglo-saxão não utiliza exatamente a palavra artigo. A imprensa norte-
americana, por exemplo, inclui esse gênero dentro da categoria ampla de comment
(diferente da story: notícia). Já na imprensa britânica o nosso artigo corresponde ao
gênero que Afrânio Coutinho identificou como formal essay (e que, rigorosamente, nos
padrões do jornalismo brasileiro, não passaria de uma espécie do artigo, como
veremos adiante).
Tomando como referência o jornalismo espanhol, vamos encontrar o uso do
artigo quase no mesmo sentido empregado pelos norte-americanos: uma categoria
genérica para qualquer matéria editorial, ou seja, opinativa. Martínez Albertos diz que
o artigo se divide em duas categorias: o artigo editorial e o artigo comentário. Na
primeira categoria ele inclui a produção própria do jornal ou revista, sua palavra oficial
sobre os acontecimentos. Na segunda, reúne as matérias assinadas pejos jornalistas
ou colaboradores. O segundo tipo compreende algumas subespécies: artigo de humor,
artigo de costume, artigo doutrinário, artigo de divulgação.
Por sua vez, Martín Vivaldi caracteriza o artigo de modo mais abrangente, em
sentido mais próximo da significação específica que assume no Brasil. Eis o seu
conceito:
"Escrito, de conteúdo amplo e variado, de forma diversa, na qual se interpreta, julga
ou explica um fato ou uma idéia atual, de especial transcendência, segundo a
conveniência do articulista".
Nesse conceito de Vivaldi, dois elementos são específicos ao artigo jornalístico:
1) Atualidade - O articulista tem liberdade de conteúdo e de forma, mas ele deve
tratar de fato ou idéia da atualidade, coadunando-se com o espírito do jornal. É
claro que o sentido da atualidade não se restringe ao cotidiano. mas ao
momento hist(írico vivido. isso justamente diferencia o artigo do comentário.
Enquanto o comentário é produzido porjornalistas que analisam os fatos em
cima da sua ocorrência. o artigo é normalmente feito por colaboradores que
apreendem as dimensões menos efêmeras dos acontecimentos.
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sobre um determinado setor científico. Manuel Calvo Hernando chama a atenção para
a importância desse tipo de artigo FACULDADE
nos países de
DEfala espanhola, onde se lê muito
JORNALISMO
pouco livro e "o artigo de imprensa é a única leitura transcendente e séria para
milhares de homens e mulheres".
b) Artigo educativo - Destinado a convencer os leitores para a adoção de novos
conhecimentos e o emprego de novas descobertas. Juan Díaz Bordenave chama essa
unidade redacional de "artigo de convencimento direto", porque sua tarefa consiste em
ir apresentando ao leitor uma série de argumentos que o conduzam o aceitar a nova
descoberta ou ao uso de uma nova tecnologia.
Enquanto o artigo de divulgação se enquadra naquele setor da mformação de
atualidade rotulado como jornalismo científico, o artigo educativo situa-se no
segmento que se chama Jornalismo especializado.
Cada espécie de artigo tem suas próprias características redacionais. Não há um
padrão uniforme para a sua concepção. Depende da natureza do veículo em que se
publica. Beltrão todavia defende a idéia de que a estrutura narrativa do artigo é
semelhante à do editorial, contendo os seguintes elementos: a) títulos; b) ítrodução;
c) discussão/argumentação; d) conclusão. Martín Vivaldi posiciona-se de outra
maneira, dizendo que no artigo a forma flui do fundo"; seu estilo é o "estilo do
articulista".
A verdade é que, sendo colaboração espontânea ou solicitação nem sempre
remunerada, o artigo confere liberdade completa ao seu autor. Trata-se de liberdade
em relação ao tema, ao JUiZO de valor emitido, e também em relação ao modo de
expressão verbal.
Seja qual for a estrutura dada ao artigo, o processo de elaboração não muda.
Martín Vivaldi diz que ele passa por três momentos fundamentais: invenção, disposição
e elocução. Inventar significa tirar do mundo, da vida; do mundo dos fatos e das
ideias. Implica em buscar na atualidade a motivação suficiente para justificar o
encontro com os leitores. Não basta porém identificar uma ideia, um argumento; é
preciso que o articulista avalie sua capacidade de desenvolvê-lo. Dispor significa
colocar as idéias em ordem. Anotá-las, na medida em que surgem, ordená-las, quando
vão crescendo. A disposição é o equilíbrio entre a inspiração e a ordem. Nem arrastar-
se pela imaginação desenfreada, nem barrar o caminho da reflexão com critérios
excessivamente fechados. A elocução corresponde à expressão escrita das idéias já
planejadas. É o momento de dar forma definitiva ao pensamento. O que não significa
apenas escrever, mas pressupõe também rever, corrigir. E corrigindo, abreviar.
suprimir, substituir.
Esse é o processo ideal de criação. E talvez possa ser tomado pelos articulistas que
escrevem sem a pressão do tempo. Aqueles que não pertencem aos quadros das
instituições jornalísticas. Que escrevem descompromissados das rotinas da produção
industrial. Pois aos jornalistas profissionais nem sempre é facultado seguir tal
esquema, proceder de acordo com os momentos da criação preconizados por Vivaldi.
Quem escreve artigos no jornalismo brasileiro? Tanto pode ser um jornalista,
pertencente aos quadros regulares da instituição noticiosa, quanto pode ser um
colaborador - escritor, professor, pesquisador, político, profissional liberal- convidado a
escrever sobre assunto da sua competência.
A segunda hipótese mostra-se mais provável, sobretudo em face da atual
legislação que regulamenta a profissão de jornalista. O colaborador é definido como
não-jornalista, alguém que presta, sob forma remunerada, seja de modo contínuo ou
esporádico, serviços eventuais à empresa jornalística. Tanto assim que as
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organizações noticiosas precisam manter livro apropriado para registro dos seus
colaboradores, indicando inclusive os FACULDADE
seus pseudônimos.
DE JORNALISMO
A presença do articulista na imprensa brasileira tem papel significativo, pois
contribui para dinamizar a vida do jornal ou da revista, superando as limitações
naturais que perfazem a sua fisionomia informativa ou opinativa. Estando menos
dependente dos ângulos de observação da realidade que aqueles circunscritos ao
ambiente jornalístico, o articulista introduz diferentes prismas para analisar a
conjuntura e traz novas informações e idéias para completar a crítica do cenário
sociopolítico.
Nomes como Tristão de Athayde, Barbosa Lima Sobrinho, Raimundo Faoro, Gilberto
Freyre tornaram o processo jornalístico mais ágiL trazendo em seus artigos
concepções, valores e propostas capazes de transformar a realidade. São autênticos
representantes de uma sociedade civil que luta por se afirmar e reduzir a onipresença
do aparelho estatal.
O artigo é o gênero que democratiza a opinião no jornalismo, tornando-a não um
privilégio da instituição jornalística e dos seus profissionais, mas possibilitando o seu
acesso às lideranças emergentes na sociedade. É claro que essa democratização
constitui uma decorrência do espírito de cada veículo: sua disposição para abrir-se à
sociedade e instituir o debate permanente dos problemas nacionais.
Um dos casos mais recentes de estímulo a essa participação de personalidade da
vida pública - parlamentares, dirigentes sindicais, autoridades religiosas, juristas,
cientistas sociais - na crítica das questões suscitadas pelo momento político tem sido o
da Folha de S. Paulo, através da seção "Tendências/Debates", onde desfilam temas e
personagens que mobilizam a sociedade para a busca de alternativas institucionais e
de soluções para os problemas fundamentais do país.
O artigo é um gênero jornalístico peculiar à imprensa. Sua expressão não ocorre no
rádio e na televisão. pela natureza abstrata que possui, mesclando fatos e idéias, mas
trabalhando sobretudo os argumentos. Nos veículos audiovisuais, o papel que cumpre
a intelectualidade através dos artigos de jornal é suprido por intermédio da entrevista.
Não é raro que um artigo publicado, defendendo ponto de vista inovador ou tese
polêmica, motive o pauteiro de um radiojornal ou telejornal a incluir uma entrevista
numa de suas edições.
Já dissemos anteriormente que o artigo, por sua concisão e oportunidade, presta-
se mais à publicação no jornal sob o risco de ter os seus argumentos superados pela
própria evolução dos acontecimentos. Enquanto isso, o ensaio, por ser mais longo e
exigir argumentação documentada, figura geralmente nos cadernos culturais ou
científicos (cujo compromisso com a atualidade não é tão rigoroso), tendo lugar mais
apropriado nas revistas especializadas ou nos periódicos cuja circulação é espaçada.
Discute-se, por exemplo, se o ensaio pode a rigor ser considerado gênero
jornalístico. A questão não é simples. O fato de uma matéria ser publicada em jornal
ou revista não lhe confere caráter jornalístico. isso advém da sintonização que
apresenta em relação ao ritmo de vida (Groth) apreendido pelo veículo.
Assim sendo, um ensaio publicado em jornal ou revista pode ser um gênero do
jornalismo opinativo, mas também pode ser uma forma de expressão da literatura. Por
isso, Afrânio Coutinho faz questão de distinguir o ensaio do estudo. O ensaio
apresenta-se como gênero tipicamente jornalístico de acordo com o seu sentido
britânico original: tentativa. O estudo, tendo caráter menos provisório, assume a
feição de uma produção literária ou científica, sendo mais compatível com o livro ou os
periódicos não-jornalísticos.
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Essa visão de Afrânio Coutinho não é, porém, muito tranquila. Talvez corresponda
à tipicidade da produção literária inglesa. Pois, noDE
FACULDADE caso francês, encontramos o termo
JORNALISMO
étude como sinônimo de ensaio. Diz André Boyer que "um estudo é um artigo longo,
bem documentado e aprofundado, sobre um tema em geral complexo".
Admitindo, no entanto, para fins metodológicos, a diferenciação de Afrânio
Coutinho, é importante registrar que o essay inglês possui duas variantes: o ensaio de
apreciação (descritivo, impressionista, pessoal, que corresponde mais à nossa crônica)
e o ensaio de julgamento (regular, metódico, dentro de uma estrutura formal de
explanação, discussão e conclusão, em linguagem austera, que se aproxima mais do
nosso artigo ou do nosso ensaio, ou talvez, da nossa resenha literária).
De qualquer maneira, o artigo (ou sua espécie, o ensaio) publicado na imprensa
tem mais potencialidades para vir a ser considerado uma produção literária. Beltrão
explica bem: "Articulistas e cronistas são autênticos literatos, e, não tendo. como o
profissional do dia-a-dia, de submeter-se à maior pressão do tempo reduzido da
produção coercitiva diária, podem burilar suas matérias não raro tornando-as
antológicas e conferindo-lhes aquela perenidade que constitui exceção no exercício da
atividade jornalística".
Se, no passado, o espaço aberto para a colaboração dos intelectuais era maior, na
imprensa brasileira, hoje ele se reduz, pela própria tendência que assume o jornalismo
impresso de se pautar por modelos industriais de eficiência e profissionalismo. Os
artigos enviados espontaneamente por colaboradores (remunerados ou não) passam
por um processo mais seletivo, privilegiando a atualidade do tema debatido ou
capitalizando o prestígio do seu autor naquele momento. Não é de estranhar que Luiz
Beltrão tenha observado em jornais de diferentes cidades brasileiras a transferência da
"colaboração espontânea, gratuita" para a "seção opinativa do leitor".