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Universidade Federal do Rio de Janeiro

O que conta como mérito no processo


de seleção de gerentes e executivos
no Brasil
- uma análise baseada na oferta de
empregos nos anúncios classificados

Karla von Dollinger Régnier

Rio de Janeiro
Agosto de 2006
ii

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS SOCIAIS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SOCIOLOGIA E ANTROPOLOGIA

O QUE CONTA COMO MÉRITO NO PROCESSO DE SELEÇÃO


DE GERENTES E EXECUTIVOS – uma análise baseada na
oferta de empregos nos anúncios classificados

KARLA VON DOLLINGER RÉGNIER

Tese de Doutorado apresentada ao Programa de


Pós-Graduação em Sociologia e Antropologia
(PPGSA) do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais
da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como
parte dos requisitos necessários à obtenção do título
de Doutor em Ciências Humanas (Sociologia).

Professora Orientadora: Doutora MARIA LIGIA DE OLIVEIRA BARBOSA

Rio de Janeiro

Agosto de 2006
iii

O QUE CONTA COMO MÉRITO NO PROCESSO DE SELEÇÃO DE GERENTES E


EXECUTIVOS – uma análise baseada na oferta de empregos nos anúncios
classificados

Karla von Dollinger Régnier


Orientadora: Maria Lígia de Oliveira Barbosa

Tese submetida ao Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Antropologia da


Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ - como parte dos requisitos
necessários à obtenção do título de Doutor em Ciências Humanas (Sociologia).

Aprovada por:

Presidente, Profa. Dra. Maria Lígia de Oliveira Barbosa, UFRJ

Profa. Dra. Gláucia Kruse Villas Boas, UFRJ

Profa. Dra. Maria Helena de Magalhães Castro, UFRJ

Prof. Dr. Roberto Grün, UFSCAR

Prof. Dr. Simon Schwartzman, IETS

Rio de Janeiro
14 de agosto de 2006
iv

Régnier, Karla von Dollinger.

O que conta como mérito no processo de seleção de


gerentes e executivos / Karla von Dollinger Régnier. – Rio de
Janeiro: UFRJ/IFCS, 2006.

xii, 327 f.: il; 31cm.

Orientadora: Maria Lígia de Oliveira Barbosa

Tese (Doutorado) – UFRJ / Instituto de Filosofia e


Ciências Sociais – IFCS / Programa de Pós-graduação em
Sociologia e Antropologia, 2006.

Referências Bibliográficas: f. 306-318.

1. Meritocracia. 2. Mérito. 3. Gerentes. 4. Recrutamento.


5. Sociologia do Trabalho. – Teses. I. Barbosa, Maria Lígia
de Oliveira (Orient.). II. Universidade Federal do Rio de
Janeiro, Instituto de Filosofia e Ciências Sociais, Programa
de Pós-graduação em Sociologia e Antropologia. III. Título.
v

Para Claudio,
Porto onde queimei minhas velas...
vi

Agradecimentos

A meus pais, Roberto e Erna, pelo trabalho minucioso na estrutura, talhada na


medida certa para dar a base e ao mesmo tempo deixar livre o espaço para a
ação.

A Maria Lígia Barbosa, que com doçura e mão firme acreditou, apostou,
incentivou e corrigiu os rumos de cada etapa do trabalho. Mais que orientadora,
tornou-se amiga.

A José Ricardo Ramalho e Luis Antônio Machado da Silva, grandes mestres


cujos ensinamentos carregarei por toda a vida.

A meus irmãos Martha e André, e às amigas Wânia e Teresa, cujo convívio


ficou comprometido durante a elaboração da tese. Agora presto contas e
espero que me desculpem.

A Aluísio Guimarães, grande ‘guru’, sabedoria acumulada e compartilhada em


torno de inúmeras xícaras de café.

A Edda Campanella, em cujo divã desfiz, pouco a pouco, as mortalhas que me


paralisavam.

A Márcia Pietroluongo, que com o perfeito domínio do idioma francês, me


ajudou a atravessar o oceano de textos, tantas vezes árduos, que se
colocavam pelo caminho.

Àqueles que gentilmente cederam seus tempos em entrevistas, particularmente


Juliana Paris e Marcelo Maia, contribuindo para que eu pudesse melhor
compreender a dinâmica e as relações de força entre empresas recrutantes,
candidatos e anúncios.

À CAPES e FAPERJ, pelo apoio concedido por meio de bolsas de estudo


tornando o trabalho de pesquisa viável.

À Bruninha, Rafael e Kel, cuja doce evocação me acompanhou dia-a-dia, com


esperança de que, quando ingressarem na vida adulta, encontrem um País
menos desigual.

A Claudio Porto, que acompanhou a gênese, leu várias vezes cada página,
escutou e discutiu as dúvidas, criou todos os ambientes favoráveis à reflexão e
impediu que a inibição metodológica me dominasse. Minha gratidão, admiração
e amor são incomensuráveis. Sem sua presença nada disso teria sido possível,
e meu mundo, por certo, seria em tons de cinza.
vii

Resumo

RÉGNIER, Karla von Dollinger. O que conta como mérito no processo de


seleção de gerentes e executivos: uma análise baseada na oferta de
empregos nos anúncios classificados. Rio de Janeiro, 2006. Tese (Doutorado
em Sociologia) – Instituto de Filosofia e Ciências Sociais, Universidade Federal
do Rio de Janeiro, 2006.

Estudo sobre as transformações na substância do mérito a partir da


perspectiva das empresas que utilizam anúncios de classificados de empregos
para a contratação de gerentes e executivos no Brasil durante os anos de 1990
e 2005. Sendo o mérito um princípio legitimo para o processo de
hierarquização social nas sociedades ocidentais modernas e democráticas, o
seu conteúdo não pode ser desconectado daqueles elementos específicos que
a cada momento histórico e a cada configuração societal determinada são
valorizados como indicadores de desempenhos superiores. Usualmente a
pesquisa sociológica e econômica no campo da educação toma apoio na
demanda por credenciais escolares como proxi na mensuração do avanço da
meritocracia. Diante de contextos onde o incremento e a diversificação da
oferta de profissionais titulados geram incertezas quanto à ‘qualidade’ do
profissional buscado, outros parâmetros de sinalização são utilizados. Com
isso, o desenho do perfil dos candidatos torna-se cada vez mais elevado,
complexo e detalhado, tanto no que diz respeito à formação educacional, mas
também quanto ao tipo e natureza da trajetória profissional, a posse de
conhecimentos específicos (idiomas, informática, técnicos) assim como de
capacidades e competências. Ainda que boa parte destas exigências possa ser
interpretada como possuindo um fundo meritocrático (dentro da versão de
mérito ‘alargado’) e portanto moralmente sancionadas, tais configurações
permitem que se identifique a criação de novas cláusulas de barreira que
atuam no sentido de manter as ditas posições ocupacionais protegidas da
invasão dos sujeitos ordinários.

Palavras-chave: mérito, meritocracia, gerentes, anúncios de emprego,


mercado de trabalho, recrutamento.
viii

Abstract

RÉGNIER, Karla von Dollinger. O lugar do mérito no processo de seleção


de gerentes e executivos: uma análise baseada na oferta de empregos nos
anúncios classificados. Rio de Janeiro, 2006. Tese (Doutorado em Sociologia)
– Instituto de Filosofia e Ciências Sociais, Universidade Federal do Rio de
Janeiro, 2006.

This paper studies transformations in merit substance from the perspective of


enterprises that used job classified advertisements for recruiting managers and
executives in Brazil, in 1990 and 2005. Since merit is a legitimate principle of
social hierarchizing process in modern and democratic occidental societies, its
contents cannot be disconnected from specific elements that, in particular
historical moments and social configurations, are deemed valuable indicators of
higher performance. Usually, sociological and economic research in the
educational field uses education credentials as a proxy for determining
advances in meritocracy. In contexts where the numerous and diversified offer
of certified professionals might bring some uncertainness about the
professional's ‘quality’, other signaling parameters are sought-after. This way,
candidate profiling gets higher, more complex and detailed, not only with regard
to formal education but also considering the kind and nature of professional
trajectory, specific knowledge (foreign languages, computer literacy, technical
knowledge), skills and competences. While most of those requirements may be
regarded as meritocratic-based (within a ‘broader’ merit definition) thus morally
sanctionable, such configurations allow the identification of new barrier clauses
that keep those occupational positions protected from the invasion of ordinary
individuals.

Keywords: merit, meritocracy, managers, job advertisement, job market,


recruitment.
ix

Sumário
Introdução ................................................................................................................. 13

Parte 1 – Os fundamentos........................................................................................ 28

Capítulo 1 – Mérito e educação – uma abordagem contemporânea e controversa ........29

1.1. Mérito e meritocracia – a atualidade da questão ...............................................................29


1.2. Mérito e educação – a perspectiva do funcionalismo ........................................................33
1.3. O aprofundamento do funcionalismo – a teoria do capital humano e suas críticas ............41
1.3.1. A Teoria da Sinalização ou do Filtro....................................................................50
1.3.2. A Teoria da Fila (ou a concorrência pelos postos) ...............................................53
1.3.3. Além da produtividade – a reprodução social na abordagem credencialista.........57
1.4. Outros desafios às perspectivas funcionalistas – o reprodutivismo e os efeitos perversos da
expansão educacional ..................................................................................................58
1.4.1. Samuel Bowles e Herbert Gintis..........................................................................59
1.4.2. Pierre Bourdieu e Jean Claude Passeron ............................................................60
1.4.3. Raymond Boudon ...............................................................................................64
1.5. Educação e renda – alguns elementos do caso brasileiro.................................................67
1.6. Voltando ao início – o mérito relativizado na contribuição de Goldthorpe ..........................72
Resumo do capítulo ................................................................................................................76

Capítulo 2 – O que conta como mérito – a vocalização da demanda dos empregadores a


partir dos anúncios de emprego ..........................................................................................79

2.1. Anúncios de empregos: possibilidades e limitações na sua utilização...............................85


2.2. Resultados de pesquisas recentes ...................................................................................97
2.2.1. Empregadores do setor terciário: um estudo brasileiro ......................................98
2.2.2. O que conta no recrutamento dos ‘quadros’: um estudo português..................100
2.2.3. O mérito ampliado: contribuições dos estudos ingleses ...................................103
2.2.4. A ação dos intermediários: as investigações francesas e estudos comparativos
.................................................................................................................................109
Resumo do capítulo ..............................................................................................................118

Capítulo 3 – Aproximando do objeto: considerações sobre a categoria sócio-profissional


dos gerentes .......................................................................................................................122

Resumo do capítulo ..............................................................................................................140

Parte 2 – A pesquisa............................................................................................... 142

Capítulo 4 - Questões metodológicas: a composição da amostra e a elaboração do


banco de dados...................................................................................................................143

4.1. A composição da amostra ..............................................................................................143


4.1.1. Composição da amostra dos anúncios de emprego veiculados em jornais ......145
4.1.2. Composição da amostra dos anúncios de emprego veiculados na Internet......148
4.2. A elaboração do banco de dados e definição das categorias de classificação dos anúncios
.............................................................................................................................................156
Resumo do capítulo ..............................................................................................................177
x

Capítulo 5 – O mérito capturado nos anúncios de emprego voltados a gerentes e


executivos brasileiros.........................................................................................................179

5.1. Quem são os empregadores anunciantes e como eles se apresentam? .........................180


5.2. Como são apresentados os postos de trabalho ? ...........................................................186
5.3. Qual o perfil dos gerentes que é valorizado ? .................................................................198
5.3.1. Características adscritas e posse de bens.......................................................198
5.3.2. Experiência e trajetória profissional .................................................................203
5.3.3. Formação acadêmica e outras qualificações ...................................................219
5.3.3.1. Formação acadêmica....................................................................220
5.3.3.2. Outras qualificações e certificações...............................................224
5.3.3.3. Conhecimentos genéricos de informática e domínio de idiomas ....226
5.3.3.4. Conhecimentos técnicos específicos .............................................232
5.3.3.5. A sobreposição das demandas .....................................................234
5.3.4. Competências e/ou capacidades específicas ..................................................238
5.3.4.1. Categoria 1: Capacidades de mobilidade e disponibilidade de horário
..................................................................................................................242
5.3.4.2. Categoria 2: Capacidades de comunicação e relacionais ..............244
5.3.4.3. Categoria 3: Capacidades empresariais e de gestão .....................250
5.3.4.4. Categoria 4: Capacidades de desenvolvimento e implicação com o
trabalho .....................................................................................................257
5.3.4.5. Categoria 5: Capacidades ou competências pessoais,
comportamentais e sociais.........................................................................259
5.4. Os anúncios para gerentes estão mais meritocráticos ? .................................................262
5.5. Considerações adicionais – a ação dos ‘intermediários’..................................................285
Resumo do capítulo ..............................................................................................................293

Conclusões ............................................................................................................. 296

Referências Bibliográficas ..................................................................................... 306

Anexos..................................................................................................................... 319
xi

Lista de Figuras

Pág.
1. Razões de médias de rendimentos por escolaridade 69
2. Efeitos da interação O-E-D 81
3. Posse de celulares, computadores e acesso à Internet – Brasil – 1990-2005 144
4. Anúncio de vagas para Trainees (n. 1) 194
5. Anúncio de vagas para Trainees (n. 2) 195
6. Anúncio de vagas para Trainees (n. 3) 215
7. Matriz de exigências nos anúncios 238

Lista de Quadros

Pág.
1. Fontes de recrutamento segundo canais utilizados 91
2. Amostra de anúncios coletados em Jornais 148
3. Amostra de anúncios coletados em ‘sites’ de emprego 155
4. Currículos que apresentam descritores de experiência internacional (banco de 216
currículos Saad Fellipelli)
5. Currículos que apresentam descritores de experiência internacional (banco de 218
currículos Grupo Prime)
6. Correspondência entre atributos relativos ao Mérito - Estreito e Estendido 263
7. Correspondência entre atributos relativos ao Não Mérito 263

Lista de Gráficos

Pág.
1. Anúncios do tipo ‘aberto’ 180
2. Informações sobre a empresa recrutante: setor, porte e nacionalidade 182
3. Informações sobre o posto de trabalho ofertado 188
4. Demanda por características adscritas e posse de bens 200
5. Demanda por experiência 207
6. Demanda por experiência de domínio preciso 210
7. Demanda por formação acadêmica 222
8. Demanda por conhecimentos genéricos de informática 227
9. Demanda por domínio de idiomas 228
10. Quantidade de idiomas demandados 229
11. Demanda por conhecimentos técnicos 234
12. Demanda por formação acadêmica E outras qualificações 235
13. Demanda por competências/capacidades (segundo grandes categorias) 240
14. Demanda por mobilidade e disponibilidade de horário 244
15. Demanda por capacidades de comunicação e relacionais 245
16. Demanda por capacidades empresariais e de gestão 251
17. Demanda por capacidades de gestão – detalhamento 253
18. Demanda por capacidades de desenvolvimento e implicação com o trabalho 257
19. Demanda por capacidades pessoais, comportamentais e sociais 260
20. Densidade das solicitações por atributos de mérito estreito 271
21. Densidade das solicitações por atributos de mérito estendido 272
22. Densidade das solicitações por atributos de mérito geral 273
23. Densidade das solicitações por atributos de não mérito 274
24. Quantidade de atributos demandados por categoria - mérito geral e não mérito 275
25. Grau de exigência dos anúncios 278
26. Demanda por formação acadêmica e outras qualificações segundo o anunciante 289
responsável
27. Demanda por nível de formação acadêmica segundo anunciante responsável 289
28. Distribuição do grau de exigência entre anúncios de intermediários e das 290
empresas
29. Quantidade de atributos demandados de mérito geral e não mérito segundo 291
responsável pelo anúncio
xii

Lista de Tabelas

Pág.
1. Meios utilizados para a contratação de executivos 93
2. Anúncios para presidentes e diretores com filtros para currículos 116
3. Principais fatores considerados na contratação de executivos - 2005 117
4. Pessoas de 10 anos ou mais de idade por grupamentos ocupacionais do trabalho 123
principal
5. Anúncios que apresentam informações sobre porte das empresas 183
6. Anúncios que apresentam informações sobre nacionalidade das empresas 183
7. Anúncios com registros de valorização das empresas 185
8. Quantidade de registros de valorização das empresas apresentados nos anúncios 185
9. Anúncios que apresentam pelo menos 1 elemento de valorização do posto 188
10. Anúncios que apresentam informações sobre remuneração 189
11. Anúncios que apresentam informações sobre benefícios 190
12. Anúncios que apresentam informações sobre a descrição das atividades, 191
atribuições, tarefas
13. Fatores que influenciam negativamente na contratação de executivos 202
14. Anúncios que solicitam pelo menos 1 elemento discriminante (sexo, idade, 203
aparência, posse de bens ou local de residência)
15. Anúncios que solicitam experiência de duração precisa 208
16. Anúncios que solicitam experiência de duração precisa E de domínio preciso 209
17. Anúncios que solicitam experiência de domínio preciso 212
18. Anúncios que solicitam formação acadêmica 220
19. Anúncios que solicitam formação acadêmica por nível de formação 221
20. Anúncios que solicitam formação acadêmica (nível técnico e superior) segundo 223
tipo de referência à formação
21. Anúncios que solicitam formação acadêmica (nível pós-graduação) segundo tipo 223
de referência à formação
22. Anúncios que solicitam qualificação / certificação 225
23. Anúncios que solicitam outras qualificações e certificações 226
24. Anúncios que solicitam domínio de idiomas segundo tipo de idioma e natureza da 230
indicação de proficiência
25. Característica dos graduandos segundo o nível de proficiência em línguas 231
estrangeiras
26. Anúncios que solicitam qualificações e/ou certificados 236
27. Anúncios que solicitam capacidades e competências 241
28. Anúncios que solicitam capacidades empresariais e de gestão 252
29. Anúncios que solicitam capacidades de gestão 256
30. Evolução das demandas por atributos de mérito estreito 265
31. Evolução das demandas por atributos de mérito estendido 266
32. Evolução das demandas por atributos de mérito global 266
33. Evolução das demandas por atributos de não mérito 267
34. Distribuição das categorias de classificação nos anúncios 269
35. Densidade dos anúncios que exigem mérito estreito 270
36. Densidade dos anúncios que exigem mérito estendido 271
37. Densidade dos anúncios que exigem mérito geral 272
38. Densidade dos anúncios que exigem não mérito 274
39. Análise fatorial – dados 1990 280
40. Análise fatorial – dados 2005 282
41. Distribuição da amostra segundo o tipo de recrutador 288
13

Introdução

Gerente da Qualidade

Sobre a empresa:
Nosso cliente é uma empresa multinacional de grande porte, de origem alemã, com filiais em
mais de 20 países. Localizada em Belo Horizonte, atua no Brasil há mais de 15 anos e é
reconhecida como líder em seu segmento. Atualmente encontra-se em fase de expansão de
suas linhas de negócios.

Principais atribuições:
Responder pelas atividades do departamento de controle da qualidade, desenvolver e
implantar normas, procedimentos e sistemas de trabalho, coordenação dos processos de
análise dos defeitos identificados, avaliação de auditoria de fornecedores externos.

Perfil do candidato buscado:


Você deve ter formação em engenharia, administração ou economia, com pós-graduação ou
MBA. Deve ter experiência mínima de 5 anos em função similar, obtida em empresas de
grande porte e com vivência nos segmentos eletroeletrônico, microeletrônico,
microinformática/ti, telecomunicações ou Contract Manufacturing. Conhecimentos específicos:
ferramentas de desenvolvimento humano e organizacional; conhecimentos de eletrônica básica
/ conhecimentos da norma ISO-9000 ou equivalente / conhecimentos de ferramentas de
qualidade / conhecimentos de Cep, Fmea, PPAP, APQP. Deverá comprovar total domínio do
idioma inglês para contatos internacionais. Noções de espanhol e francês são desejáveis.
Vivência internacional será considerada como plus. Imprescindível possuir rede de
relacionamentos e amizade com lideranças de empresas no mesmo segmento. As
competências desejáveis são: inovação/renovação, foco em resultados, iniciativa, cooperação
pró-ativa, liderança, criatividade, bom relacionamento interpessoal e excelentes habilidades
empreendedoras e de comunicação verbal. Necessário ter disponibilidade para viagens
freqüentes e para mudanças de residência.

Se você se encaixa neste perfil, encaminhe seu currículo para intermediárioX@empresaA.com.


ou cadastre-se no site www.intermediárioX.com.

O texto apresentado acima não é real embora seja verdadeiro, no sentido de


representativo. Com efeito, ele foi montado a partir de fragmentos recolhidos em
diversos anúncios de emprego para gerentes e executivos, divulgados em jornais
brasileiros e na Internet durante o ano de 2005.

É um exemplo ‘típico’ que introduz a questão central que me propus abordar ao longo
desta tese, expressa da seguinte forma:

(1) Os empregadores (ou seus representantes), durante o processo de pré-


seleção de pessoas para as vagas de gerentes e/ou executivos no Brasil,
estão solicitando em maior intensidade características ou atributos que
14

podem ser classificados como meritocráticos (passíveis de serem


adquiridos via esforço ou empenho individual)?

Dado que o mérito é o único critério moralmente aceito para a distribuição das
posições sociais e para o acesso às recompensas derivadas, seria o caso de
investigar em que medida estaríamos nos aproximando ou nos afastando do ‘ideal
meritocrático’, no qual há uma total simetria entre as habilidades possuídas e a
ocupação obtida; e onde o peso das origens sociais não deveria influenciar os
destinos ocupacionais – o que equivale dizer que todas as pessoas têm iguais
chances de se tornarem ‘desiguais’.

Consequentemente, a segunda questão elaborada, e diretamente derivada da anterior,


ficou expressa da seguinte forma:

(2) Como se comportam as demandas por atributos não meritocráticos


(obtidos via herança, situação de classe, gênero, ou outros) nos anúncios?
Elas aumentam, diminuem, permanecem estáveis ao longo do tempo ou
ainda se transformam assumindo novas conotações?

Caso estas demandas não se reduzam, estaríamos nos afastando do ideal de justiça
social proposto na meritocracia, com conseqüências na manutenção das restrições em
torno das possibilidades de mobilidade social.

Ocorre que para identificar se estaria ou não havendo uma adequada equiparação
entre as ocupações obtidas e as habilidades possuídas faz-se necessário o
estabelecimento de algum critério capaz de mensurar estas variáveis, colocando-as
em relação. Tradicionalmente, as pesquisas sociológicas e econômicas voltadas à
analise da evolução da mobilidade e/ou do avanço das práticas meritocráticas
atribuem às ‘credenciais escolares’ esse papel; ou seja, nelas o nível educacional
atingido passou a ser a variável de mediação entre as classes de origem e destino,
sendo uma proxi para o mérito.

Ademais, os analistas das sociedades pós-industriais, informacionais, ou do


conhecimento apostam no incremento contínuo da demanda por educação uma vez
que a transformação dos processos produtivos estaria imprimindo alterações nas
profissões tradicionais bem como levando à criação de um maior número de funções
para as quais o trato com informações e as habilidades cognitivas e intelectuais seriam
15

essenciais. Os certificados escolares, vistos como prova da aquisição de tais


habilidades e competências, seriam assim cada vez mais requisitados. E a maior
cobertura dos sistemas escolares propiciaria melhoria na igualdade de condições para
que os indivíduos tivessem acesso a estes certificados, reduzindo as desigualdades
nas disputas relativas ao ingresso no mercado de trabalho, bem como permitindo uma
maior mobilidade social.

Porém, como Goldthorpe bem nos lembra, não há uma relação necessária entre a
distribuição das posições na hierarquia social e os diplomas escolares. Estes somente
terão valor se os empregadores os considerarem nas suas decisões (quando tratam
de contratar, promover ou demitir os trabalhadores), nem que seja como um ‘sinal’ que
indica que outras características buscadas podem estar presentes, ou ainda como
princípio de organização da ‘fila’, permitindo baixar os custos com treinamento. Nesse
sentido, a meritocracia baseada na educação seria muito mais um mito do que uma
faceta da realidade. (GOLDTHORPE: 1991; JACKSON E GOLDTHORPE: 2001;
NICHOLAS: 1999)

Mas como foi se construindo esta afinidade eletiva entre mérito e credenciais
escolares? A partir de qual encadeamento lógico esta idéia foi tomando força? E quais
são suas limitações?

Pressupostos teóricos - a frágil afinidade entre mérito e educação

Nas sociedades modernas, democráticas e igualitárias há um consenso de que o


único critério legítimo para a ocupação das diversas posições sociais é o mérito
individual. Nenhuma outra variável, tal como sexo, raça, riqueza, religião, relações
consangüíneas ou sociais pode vir a sobrepujar o empenho e esforço que cada um
comprove ser capaz de mobilizar, ao longo de sua vida, para obter suas conquistas e
realizações, especialmente quando se trata da vida profissional.

Segundo esse princípio seriamos uma ‘sociedade aberta aos talentos’, onde a
meritocracia - compreendida como “um conjunto de valores que postula que a posição
dos indivíduos na sociedade deveria ser conseqüência do mérito de cada um” - opera
como uma ideologia globalizada, parodiando Lívia Barbosa. As desigualdades
decorrentes seriam portanto mais justas e moralmente justificáveis uma vez que não
16

estariam associadas a qualquer tipo de privilégio hereditário ou outro tipo de


discriminação. Consequentemente, quanto mais próximos do ‘ideal meritocrático’
estivermos, mais democrática seria a sociedade no plano político, e maiores também
seriam as possibilidades de mobilidade na estrutura social.

Portanto, para saber se estamos nos aproximando ou afastando deste ideal, seria
preciso criar algum tipo de medida que nos permitisse fazer qualquer tipo de afirmação
a esse respeito. E é neste ponto que surgem as divergências. Em que consiste o
mérito? O que caracteriza um desempenho superior? Será que todos os atores
sociais têm a mesma compreensão acerca dos seus significados?

Em qualquer dimensão que se privilegie (profissional, educacional, política) fica latente


que, quando se trata de delimitar a substância do mérito, encontramos muito mais
divergências do que convergências. Não apenas as pessoas estabelecem múltiplas
interpretações, muitas vezes antagônicas, sobre o que seria o talento, o esforço, a
habilidade, como também estas são bastante variáveis no tempo e espaço.

Entretanto, há uma tendência nas nossas sociedades contemporâneas de associar as


posições mais elevadas à mobilização do intelecto - em oposição, por exemplo, à
destreza manual ou engenhosidade que predominavam em períodos históricos
anteriores. Neste particular, podemos inferir que a evolução da divisão social do
trabalho e da racionalização foi propiciando os fundamentos para que esta perspectiva
fosse, paulatinamente, se consolidando; o que resultou na maior valorização das
posições de comando, técnicas e especializadas, com equivalência no acesso às
recompensas mais elevadas.

Acresce que o desenvolvimento das capacidades cognitivas e a aquisição dos


conhecimentos relacionados às ocupações deste tipo não ocorrem ‘no vazio’, e
tampouco são transmissíveis de uma geração a outra. É necessária a passagem por
um sistema escolar que fornece os meios para sua aquisição, avalia os desempenhos
e os sanciona conferindo certificados que habilitam os indivíduos para o pleito das
posições sociais ao longo da hierarquia, fundando o que Weber denominou, em seu
tempo, por ‘aristocracia dos diplomas’, a qual viria a substituir a linhagem e a
propriedade como fatores de atribuição de status.
17

Os ‘certificados’ se tornam assim a ‘prova’ cabal do esforço e empenho do indivíduo


(ou um sinal do seu mérito), uma conquista pessoal, intransferível e necessária para a
disputa em torno de diversas posições, as quais, por sua vez, também guardariam
correspondência com o nível ou grau do diploma obtido. Quanto mais complexas as
tarefas a serem desenvolvidas ou quanto mais responsabilidades envolvam, maior
deveria ser o tempo necessário de aquisição dos conhecimentos e habilidades. Em
paralelo, quanto mais elevado o nível do diploma, mais produtivo seria o indivíduo e
portanto maiores seriam as recompensas (ou os lucros econômicos e simbólicos) que
cada um poderia vir a obter através da sua posse.

Ao mesmo tempo, o crescimento e a maior cobertura dos sistemas educativos (ou a


chamada ‘revolução educacional’) veio reforçar a aceitação da desigualdade dos
estatutos com ênfase no desempenho, uma vez que seus resultados permitiriam
assegurar a ‘igualdade de chances’ tanto na obtenção dos títulos escolares, quanto,
posteriormente, no pleito às posições sociais.

Esta posição, defendida por um conjunto de teóricos funcionalistas (ver


particularmente as análises de Davis e Moore), a despeito das críticas que suscitou,
ganhou reforço e fôlego com o desenvolvimento da teoria do capital humano. Segundo
seus propagadores, as transformações tecnológicas e organizacionais no sistema
produtivo demandariam sistematicamente uma elevação no padrão de qualificação
dos trabalhadores. Sua produtividade, por sua vez, seria determinada prioritariamente
pelo nível educacional alcançado. Seria de se esperar portanto que uma elevação
deste último implicasse em uma maior produtividade, com reflexos da renda e na
redução das desigualdades quanto mais educação fosse fornecida à população. Ao
mesmo tempo, as posições hierarquicamente mais privilegiadas seriam cada vez mais
dependentes do nível de escolaridade atingido. Assim, quanto mais a posição obtida
por um indivíduo fosse explicada por suas aquisições educacionais e não por sua
origem, mais estaríamos avançando em direção ao ideal meritocrático. E no plano
prático, os indivíduos e governos seriam tentados a investir cada vez mais em
educação porque isso melhoraria seus rendimentos futuros e reduziria o ‘fosso de
desigualdade’.

Ao mesmo tempo em que esta perspectiva se dissemina, vai-se construindo sua


crítica. A teoria da sinalização ou do filtro (Arrow), da fila (Thurow) e do credencialismo
18

(Collins) procuram mostrar que os empregadores usam os diplomas como indicador de


outros atributos que vão muito além da posse de conhecimentos técnicos e
habilidades cognitivas específicas. Assim, credenciais escolares serão tão mais
consideradas quanto mais elas indiquem que o seu portador possui outros atributos,
para além ou ao invés dos conhecimentos específicos, que são igualmente ou mais
valorizados, sejam eles relativos a competências comportamentais ou outras não
diretamente observáveis.

Ocorre que quanto mais o diploma se torna um bem mais acessível, menos ele atua
como diferenciador, e seu poder de ‘sinalização’ reduz-se, aumentado a incerteza no
julgamento que o empregador possa vir a fazer sobre os futuros empregados, o que os
incita a lançar mão de outros recursos que possam fazer a vez de ‘sinais’.

Dessa forma, quando se tem um cenário que apresenta uma constante ampliação no
número de egressos do sistema escolar, acrescido pela constante diversificação e
diferenciação dos títulos, um dos resultados possíveis é o comprometimento da
‘qualidade’ que outrora se ‘sabia’ estar assegurada por determinado patamar de
educação. Assim, o diploma, que pode ter sido, em épocas pretéritas, a ‘cláusula de
barreira’ mais relevante para determinadas ocupações, ao ser atravessado por
imprecisões, estimula os empregadores a tornar explícitas, em seus processos
seletivos, as referências a capacidades que até então poderiam ser inferidas pela
composição da trajetória escolar.

Disso tudo, pode-se afirmar que a ‘substância’ do ‘mérito’, ao apresentar variações e


imprecisões crescentes ao longo do tempo, coloca sob suspeita o sonho liberal da
meritocracia baseada na educação, que permitiria a reconciliação da justiça social e
da eficiência.

Tal constatação, no entanto, não impede que nos questionemos sobre a força das
credenciais escolares na obtenção das posições sociais mais elevadas, especialmente
quando acompanhadas por outros atributos ou capacidades que até então restavam
menos visíveis.

Metodologicamente optei por investigar estas relações a partir dos anúncios de


emprego destinados a gerentes e executivos.
19

Delimitando o objeto – o breve olhar pousado na categoria sócio-profissional dos


gerentes

Visando analisar as transformações na substância do mérito no momento de pleito às


vagas abertas no mercado de trabalho, optei por fazer o recorte na categoria sócio-
profissional dos ‘gerentes’, ainda que a utilizando como ‘artefato estatístico’, por duas
razões principais.

A primeira devido ao fato de que, em tese, no campo das hierarquias profissionais eles
ocupam uma posição elevada - ainda que possam se situar, em determinados
contextos ou em relação ao status, abaixo dos profissionais liberais; porém encontram-
se acima dos trabalhadores manuais.

A segunda razão se justifica pelo fato de que, na medida em que gerentes e


executivos não se constituem como um grupo profissional no sentido estreito (como o
são os médicos, engenheiros e advogados, que entre outras coisas controlam a sua
formação), poderíamos perceber como os processos seletivos, iniciados a partir dos
anúncios, estariam lidando com a tensão entre os dois caminhos distintos para a
ocupação dos cargos: a via rápida, onde os indivíduos se qualificam fora do mercado
profissional (acumulo de títulos escolares), e a via lenta, que incide sobre o acúmulo
da experiência, como sublinhado por Boltanski (1982) e reforçado por Grün (1995).

Acresce ainda que vários são os estudos que afirmam que os gerentes se constituem
como uma das categorias que mais têm sofrido os efeitos das transformações
econômicas e organizacionais recentes (Falcoz: 2003; Huet: 2001, Melo: 1999), com
conseqüências tanto na sua representação simbólica e identitária quanto nas suas
possibilidades de carreira, de atribuição de status e recompensas.

Boltanski e Chiapello (1999) chegam a afirmar que eles são os principais portadores
(receptores, divulgadores e, acrescentamos, também produtores) da nova ideologia
(‘espírito do capitalismo’) que visa dar um sentido ao conjunto de mudanças recentes
na esfera econômica e às suas repercussões nas demais instâncias da vida social. A
literatura produzida por e para este grupo, também conhecida sob a alcunha de ‘neo-
managerismo’, é fértil em apresentar os diagnósticos parciais dos principais problemas
20

que estariam sendo enfrentados no campo econômico e, complementarmente, em


fornecer um receituário moral que orienta as condutas para ter sucesso no novo
cenário delineado. Dissemina-se um novo léxico que mapeia qual conjunto de
atributos, competências e capacidades seriam ‘necessários’ e até mesmo
‘imprescindíveis’ de serem adquiridos para fazer frente às mudanças vivenciadas.
Flexibilidade, nomadismo, trabalhar sob pressão, inserção em redes, desenvolvimento
de capital social, são alguns exemplos típicos deste enquadramento.

Isso posto, além das questões anteriormente apresentadas focadas na captura dos
atributos que permitem colocar em evidência os avanços e retrocessos em relação ao
mérito propriamente dito (e ao não mérito), emergiu um terceiro grupo de
interrogações que também foi considerado na pesquisa. Dado que, nos últimos 15
anos, de um lado o Brasil tanto consolidou seu processo de abertura econômica
quanto intensificou as transformações organizacionais no setor produtivo, e de outro
lado promoveu a segunda grande onda de expansão das matrículas no ensino
superior (e a diferenciação no sistema1), seria o caso de investigar:

(3) Em que medida esses elementos podem ter repercutido no desenho dos
perfis dos executivos e gerentes buscados, alterando a relação entre a ‘via
lenta’ (experiência) e a ‘via rápida’ (formação escolar)? Além disso, será
que as exigências em relação às capacidades e competências, estariam
aumentando, diminuindo ou sendo explicitadas a partir de novos formatos,
mais afeitos ao léxico que permeia o discurso do ‘neo managerismo’?

1
Tomando apenas o período entre 1994-2003, as matrículas no ensino superior brasileiro mais que
dobraram, passando de 1,6 milhões para quase 3,5 milhões (MEC-Edudata Brasil). Parte deste
incremento se deveu às pressões dos níveis anteriores: no ensino médio as matriculas cresceram de 4,5
milhões para 9 milhões no mesmo período. Silva (2003) afirma que a expansão do sistema educacional,
associada à melhoria da situação social das famílias, tem contribuído para uma “redução generalizada
das desigualdades educacionais brutas”, seja entre regiões, grupos de cor, gêneros ou estratos de renda.
(p. 109). Entretanto, quando se trata do ensino superior, este diagnóstico não se confirma da mesma
forma. Em que pese a sua maciça expansão, as desigualdades de acesso permanecem expressivas.
Segundo Schwartzman (apud GÓIS, 2002), no período entre 1992 e 1999, neste nível de ensino, a
presença de estudantes que pertencem ao estrato dos 10% mais ricos da população subiu de 45,6% para
48%, em contraposição à presença dos 50% mais pobres, que decresceu de 8,5% para 6,9%. Por outro
lado, o sistema de ensino superior brasileiro vem apresentando um quadro de diversificação crescente.
Os cursos seqüenciais, que no inicio do ano 2000 contavam apenas com 13.430 matrículas, após 3 anos
somavam mais de 50 mil alunos – um crescimento da ordem de 260%. Nos cursos de graduação a
distância o incremento é ainda mais forte: em 2000 apenas 1.682 alunos estavam cadastrados nesta
modalidade; porém em 2003 as matrículas somavam mais de 49 mil. As estatísticas referentes à pós-
graduação lato sensu, que até o momento de conclusão desta tese ainda não estavam disponíveis,
impedem de dar uma idéia precisa do seu incremento, no entanto, basta uma rápida olhada nos jornais,
revistas e outdoors que povoam as grandes capitais para se estimar o volume de seu crescimento. A pós
stricto sensu, por seu turno, não foge à regra, mostrando um dinamismo capturado pelo seu crescimento
também relevante, embora em menor proporção que as modalidades anteriores. As matrículas nos
cursos de mestrado cresceram 45% e no doutorado 113% no período de 1994-2003. (PORTO &
RÉGNIER: 2002)
21

Escolhas metodológicas - capturando o mérito a partir da leitura dos anúncios de


classificados de emprego

Classificados de empregos são uma fonte pouco utilizada na pesquisa sociológica,


especialmente no Brasil. No entanto, o recurso a este material empírico permite a
elaboração de várias leituras que incidem não apenas sobre as transformações em
uma determinada profissão, mas também podem revelar aspectos muito interessantes
no que diz respeito ao funcionamento do ‘mundo do trabalho’ de uma forma mais
ampla.

Em mercados de trabalho com acesso pouco formalizado, como é o caso do brasileiro,


onde as vagas tendem a ser ocupadas prioritariamente pelo acionamento de canais
informais, os anúncios de emprego podem parecer, à primeira vista, como tendo
pouca valia. Entretanto, mesmo que a eficácia deste meio seja baixa no que diz
respeito ao seu uso como instrumento facilitador do estabelecimento do contado entre
os candidatos e as vagas, isso não significa que eles sejam uma fonte de baixa
relevância para a pesquisa, especialmente em torno dos temas que nos propusemos a
investigar.

Isso porque os anúncios, veiculados na imprensa ou na Internet, permanecem como


uma das principais fontes de informação para os candidatos. E ainda que os
conteúdos ou as exigências que apresentem em relação ao perfil dos profissionais
procurados não contenham todos os elementos que são considerados pelas empresas
em seus processos seletivos, ao menos uma parte das principais exigências estará ali
apresentada. E uma vez que a publicação de um anúncio envolve um determinado
montante de investimento por parte das empresas (na redação do texto, na seleção
dos meios, na ‘aquisição’ do espaço para publicação, etc.), é de se esperar que estas
informações devam ser levadas ‘a sério’ pelos candidatos. Até porque, esta é a
primeira base sob a qual será feita a triagem dos interessados.

Os anúncios de empregos estão sujeitos a determinadas normas jurídicas e


convenções sociais que delimitam o seu formato e sobretudo o seu texto. Critérios que
possam ser interpretados como discriminadores, tais como referências em relação a
sexo, idade, aparência, ou outros, estão vetados por força de lei (ao menos na mídia
22

impressa). Por outro lado, informações sobre salário ou outros benefícios (que são
cada vez menos presentes) ou a descrição das atividades a serem desenvolvidas (que
inversamente se mostram muito mais detalhadas) quando aparecem nos anúncios
para os postos de gerentes e executivos são muito mais produto de convenções
sociais que regulam as buscas de emprego entre os indivíduos deste grupo.

Assim, o acompanhamento deste material ao longo do tempo permite que se mapeie


as principais mudanças nos seus formatos, conteúdos e linguagem como também na
natureza dos suportes que são utilizados, marcado por uma grande diferenciação e
diversificação dos meios. Pode-se perceber, por exemplo, em que medida vai sendo
alterada tanto a forma usualmente utilizada para o estabelecimento do contato entre o
candidato e as empresas recrutantes (mais distantes e impessoais, mediatizadas pelo
avanço da informática), como também a quantidade e a natureza dos critérios de
seleção que são utilizados para a descrição do perfil dos candidatos: mais numerosos,
complexos e exigentes.

Além disso, resta evidente que hoje em dia os anúncios são cada vez menos um
simples “precisa-se de” seguido por “dirija-se a”. Para muitas empresas eles passaram
a fazer parte de sua estratégia de marketing, de ‘venda’ do posto e da relação de
trabalho, com a presença marcante de um discurso de desafio e de instigação que
apresenta a vaga não como um ‘emprego’, mas sim como uma oportunidade de
desenvolvimento pessoal para aqueles que lograrem passar nas provas de seleção.

Acresce ainda que a análise dos classificados de emprego também possibilita colocar
em destaque a presença dos intermediários do mercado de trabalho: agências de
comunicação, head-hunters, empresas de recrutamento e seleção, consultores, são
exemplos dos atores que, com o avanço da racionalização do processo de busca, vão
se colocando entre as vagas e os candidatos, incidindo na formatação dos perfis
ótimos destes últimos e, consequentemente, na suas chances de obtenção das vagas.

A ação dos ‘intermediários’ pode ser percebida não apenas pela complexificação da
definição da ‘qualidade’ do candidato ideal, mas também, e sobretudo, pelo recurso a
termos e expressões mais ‘modernas’ para descrever as empresas, as vagas e os
perfis. Além disso, é uma ação que embute um modo certo de busca, que define o
‘como’ se busca, ‘onde’ se busca, ‘o quê’ e ‘quem’ se busca. E sendo o próprio campo
23

de recrutamento e seleção também um espaço de concorrência, onde a racionalidade


expressa pela eficiência, eficácia e reputação das empresas são capitais caros, elas
também se distinguem entre si, também criam hierarquias e ocupam posições que por
sua vez “aderem” aos clientes (empresas) que utilizam seus serviços. A diferenciação
de linguagem, a forma de apresentação e de estruturação dos anúncios, o tipo de
informação apresentada, são expressões objetivas dessa disputa e diferenciação ao
mesmo tempo em que indicam a segmentação dos mercados em que atuam. Decorre
portanto que a ação destes intermediários sobre a estrutura do mercado de trabalho
está longe de ser neutra.

Esta constatação acabou dando origem ao último bloco de questões a ser tratado na
pesquisa, a saber:

(4) Em que medida a racionalização do processo de recrutamento e


seleção, e o uso mais recorrente dos serviços prestados pelos
intermediários do mercado de trabalho, poderia estar contribuindo para a
elevação do perfil dos gerentes e executivos? Estes estariam se
aproximando mais dos atributos tidos como meritocráticos?

Para responder às questões apresentadas, montamos dois conjuntos de amostras de


anúncios de emprego destinados a postos de gerentes e executivos no Brasil: o
primeiro, contendo 100 casos, foi recolhido nos arquivos de jornais cariocas e
paulistas relativos ao ano de 1990. O segundo, contendo 300 casos, foi recolhido
igualmente nos jornais cariocas e paulistas (100 casos) e em dois sites de emprego na
Internet (‘job boards’ - 200 casos) no ano de 2005. Totalizando portanto 400 anúncios
de emprego.

Cada anúncio foi codificado e inserido em bancos de dados, montados em planilhas


eletrônicas, de forma a possibilitar o tratamento das diversas variáveis. O esquema de
classificação dos dados foi inspirado nas pesquisas realizadas por Jackson (2001) e
por Marchal e Torny (2001), embora o resultado final em relação à formação das
categorias seja bastante diverso dos modelos por eles elaborados.

A estrutura da tese

A tese está organizada em duas partes. A primeira, denominada “Fundamentos”,


contém três capítulos, que vão permitindo uma aproximação sucessiva, teórica e
24

metodológica, das questões que serão tratadas na pesquisa. A segunda parte,


contendo dois capítulos, descreve em detalhes a metodologia e apresenta os
resultados da pesquisa.

Cada capítulo abrange as seguintes questões:

No primeiro capítulo - ‘Mérito e Educação – uma abordagem contemporânea e


controversa’ – procura-se discutir o mérito associado à educação como a referência
para a distribuição das posições ocupacionais nas nossas sociedades
contemporâneas. Apresenta as principais idéias presentes nas teorias funcionalistas e
a introdução da variável ‘econômica’ na mensuração dos benefícios da educação para
o setor produtivo explicitada na teoria do capital humano, assim como as diversas
críticas que se sucederam, tais como a teoria da fila, da sinalização e do
credencialismo. Segue-se com uma rápida referência às teorias que concebem a
educação dentro de uma ótica reprodutivista bem como à perspectiva de efeitos
perversos da sua expansão. Finalmente, fechando o círculo, retoma-se a questão do
mérito, desta vez buscando relativizá-lo, ou seja, colocando sob suspeita a sua
‘objetivação’ em torno das credenciais escolares e inserindo o processo de escolha
dos empregadores como elemento fundamental na sua definição.

O capítulo 2, intitulado ‘O que conta como mérito: a vocalização da demanda dos


empregadores a partir dos anúncios de emprego’, aborda a forma com que o mérito é
definido pelos empregadores no momento em que elaboram os anúncios de
empregos. Primeiramente são feitas breves considerações sobre as possibilidades e
limitações no uso deste tipo de fonte como material empírico para a pesquisa
sociológica e as evoluções que apresenta ao longo do tempo. Em seguida são
apresentados quatro estudos recentes, um brasileiro, um português, um inglês e um
francês, que fazem uso dos classificados de emprego, destacando, em suas
conclusões, os diferentes pesos atribuídos às credenciais escolares vis-à-vis os
demais requisitos que são solicitados aos candidatos.

O terceiro capítulo, denominado ‘Aproximando do objeto: considerações sobre a


categoria sócio-profissional dos gerentes’, encerra a primeira parte da tese focalizando
as grandes transformações que têm incidido sobre esta categoria. Destaca-se como o
credencialismo vai paulatinamente se legitimando como variável essencial à ocupação
25

dos postos, ainda que não elimine o peso da experiência. Apresentam-se ainda as
mutações nas relações de trabalho dos gerentes e executivos e suas conseqüências
sobre a identidade, status e perspectiva de carreira. Aspectos como ‘banalização’ da
categoria, perda de suas referências hierárquicas ‘enquadrantes’, fragmentação e
diversificação, inflação nominal, distanciamento da empresa e dos grandes centros de
decisão, ênfase na ‘empregabilidade’ e valorização do ‘nomadismo’ são abordados
como indicativos do novo cenário que abarca estes profissionais. Finalmente comenta-
se sobre as explicações e justificativas que são difundidas no âmbito do discurso no
‘neo managerismo’.

O capítulo 4 – ‘Questões metodológicas: a composição da amostra e a elaboração do


banco de dados’ – abre a segunda parte da tese. Nele se descreve detalhadamente o
processo de seleção das fontes de dados (suportes dos anúncios), a elaboração das
amostras e a montagem do banco de dados, conforme indicado no título. Apresentam-
se todas as categorias que foram utilizadas para a classificação do material,
agrupadas em 4 grandes blocos: informações sobre os anúncios, informações sobre
as empresas, informações sobre os postos de trabalho e informações sobre o perfil
dos candidatos. Para cada variável definida são apresentados exemplos do tipo de
material que contém.

Finalmente, o capítulo 5 – ‘O mérito capturado nos anúncios de emprego voltados a


gerentes e executivos brasileiros’ – apresenta os resultados da pesquisa empírica.
Encontra-se dividido em cinco partes, cada qual abordando uma temática específica.

Na primeira parte procura-se mapear quem são os empregadores anunciantes. Assim,


o foco recai sobre as variáveis que são utilizadas como elementos de identificação dos
contratantes. A presença (ou ausência) de informações relativas ao nome da empresa,
porte, nacionalidade, setor de atuação e outros registros de valorização despontam
como o campo de investigação.

A segunda parte destina-se à análise dos postos de trabalho. Procura-se identificar o


modo com que os contratantes descrevem as contrapartidas ofertadas (benefícios,
remuneração, carreira) e os demais elementos que se associam à qualidade das
vagas (ambiente de trabalho, jornada e natureza do vínculo) tendo em vista a
valorização das mesmas. Destaque especial é dado à forma com que descrevem as
26

funções ou tarefas que esperam que os candidatos venham a desempenhar caso


sejam contratados.

A terceira parte contém o cerne da pesquisa: a descrição do perfil dos profissionais. As


exigências que aparecem nestes perfis são apresentadas segundo quatro classes de
atributos: (a) características adscritas e posse de bens; (b) experiência e trajetória
profissional; (c) formação acadêmica e outras qualificações; e (d) competências ou
capacidades específicas. Para cada conjunto de exigências é feita uma análise
individual, e no final é apresentada uma visão de conjunto.

Na quarta parte retoma-se à macro questão que orientou a pesquisa, qual seja,
verificar se, com o passar do tempo, os anúncios de emprego para gerentes e
executivos no Brasil estão se tornando mais meritocráticos. É feito um grande
‘apanhado’ dos tópicos anteriores e uma consolidação das conclusões a partir do uso
de indicadores (densidade e grau de exigência) desenhados com esta finalidade,
seguidos por uma analise fatorial comparando o peso e a formação dos fatores nos
dois períodos (ano de 1990 e 2005).

A quinta e última parte introduz a figura dos ‘intermediários’ no contexto. Em um


exercício exploratório, procura-se mapear as conseqüências da ação destes atores no
tipo de exigência que é feita aos candidatos, tornando o processo de pré-seleção
operado a distância, pelos anúncios de emprego, mais complexo e exigente.

Dessa forma, as questões de número (1), (2) e (3) apresentadas em destaque


(negrito) no decorrer desta introdução encontram-se sumariamente respondidas no
item 5.4, sendo que parte da questão (3), especialmente no que tange ao novo léxico
utilizado nos anúncios também está diluída nos itens anteriores (5.1; 5.2 e 5.3). Já a
questão de número (4), que foca a ação dos intermediários, é abordada no item 5.5.

As conclusões, apresentadas ao final do trabalho, recuperam rapidamente os


principais resultados obtidos bem como delineiam as possibilidades de continuidade
da pesquisa, especialmente enfatizando suas abordagens complementares.

Dois comentários adicionais em relação ao formato da tese: (1) ao fim de cada


capítulo foi inserido um pequeno resumo resgatando as principais questões tratadas,
27

de modo a facilitar a leitura e o encadeamento entre os assuntos; (2) sempre que


possível e pertinente procurou-se ‘ilustrar’ os temas tratados por meio da inclusão de
‘boxes’ com extratos de matérias ou reportagens, colhidas em jornais e revistas de
grande circulação, ou ‘fragmentos’ de livros de auto-ajuda, que tratam da questão do
ingresso e do funcionamento do mercado de trabalho, voltados aos aspirantes a
cargos de gerentes e executivos ou àqueles que desejem se ‘re-inserir’.

Espero com este estudo ter contribuído para fazer avançar o conhecimento sociológico
das fronteiras, plásticas e mutáveis, da aplicação do conceito de mérito nos processos
de seleção para as posições de gerentes e executivos no Brasil. A limitação do seu
uso como elemento explicativo para a mobilidade social deve-se não apenas ao fato
de que os empregadores consideram outras variáveis para além das credenciais
escolares como proxi do ‘talento + esforço’, mas sobretudo porque, mesmo mantendo-
se dentro desta equação, o patamar educacional e de ‘habilidades’ exigido é cada vez
mais elevado e diferenciado.

A análise detalhada dos requisitos expressos nos anúncios de emprego possibilita


trazer à tona outros elementos que usualmente não são quantificados na investigação
sobre a meritocracia mas que, no entanto, fazem parte da dinâmica de ‘abertura’ ou de
‘fechamento’ das vagas e, portanto, delimitam as possibilidades dos indivíduos virem a
ocupá-las. Tal é o caso das referências detalhadas em relação ao tipo de ambiente
empresarial no qual o indivíduo deve ter construído sua trajetória profissional, as
menções à vivência internacional, a fluência em vários idiomas, a inserção em redes
de relacionamento específicas, apenas para citar os mais evidentes.

Acredito ainda que o recurso a este material como fonte de pesquisa sociológica
permite que se faça, no nível micro, uma leitura interpretativa das grandes
transformações que se colocam nos níveis meso e macro da estrutura social.
.
28

Parte 1 – Os fundamentos
29

Capítulo 1 – Mérito e educação – uma abordagem


contemporânea e controversa

1.1. Mérito e meritocracia – a atualidade da questão

De tempos em tempos reacendem-se as disputas sociais em torno do que consiste o


mérito - e por extensão a amplitude e legitimidade da meritocracia - organizadas em
torno das propostas que são construídas para os problemas sociais e econômicos
emergentes.

A busca da redução das desigualdades sociais de um lado, e da eficiência econômica


de outro, atravessam a grande maioria destas disputas, desenhando um cenário onde
estão presentes argumentos tanto políticos quanto econômicos.

É o caso, por exemplo, do atual debate em torno da política de cotas para o acesso ao
ensino superior, que inflama tanto os defensores quanto seus críticos. Aqui, os
princípios meritocráticos associados à recompensa pelo desempenho e esforço
(medidas idealmente universais para o ingresso e permanência no sistema escolar)
são atravessados pela dimensão relativa à mitigação das desigualdades, resultando
na criação de dispositivos que permitam a integração de uma população que
historicamente esteve alijada deste nível de educação devido à sua situação de
desvantagem originada pela posição de classe social e/ou de etnia.

Em outro contexto, o mérito é igualmente chamado à cena para delimitar as práticas


de nepotismo que teimam em se fazer presentes entre os poderes legislativo e
judiciário. Aqui a dimensão ‘profissional’ – leia-se capacidade técnica para o exercício
do cargo – é contraposta à dimensão da ‘confiança’, artifício utilizado para encobrir a
permanência das vantagens obtidas via relações de parentesco e de amizade.

Da mesma forma, no segmento produtivo privado, a busca da competitividade e o


enfrentamento da concorrência crescente entre as empresas tornaram mais fértil o
terreno para a consolidação da retórica (e das práticas) em torno da ‘profissionalização
da gestão’, desafiando principalmente as empresas familiares a enfrentar a questão da
sucessão que se dava prioritariamente com base em critérios de consangüinidade.
30

Ainda em paralelo se desenvolvem inúmeras técnicas e métodos para testar e avaliar


‘objetivamente’ as capacidades e contribuições dos empregados, recompensando o
talento e o esforço ao mesmo tempo em que atesta o ‘fracasso’, tornando-o assim
legítimo e conseqüência de uma ‘inapetência’ individual.

Não há dúvidas de que nas nossas sociedades democráticas contemporâneas o


mérito cumpre o papel de ser, ao mesmo tempo, um principio legitimado de justiça
social (igualdade de direitos nas disputas pelas posições sociais, que pressupõe a
conquista pela via do esforço e não pela herança atribuída) e de eficiência (permitindo
a alocação da pessoa ‘certa’ no cargo ‘certo’). Dessa forma, é possível afirmar que se
há um acordo consolidado em torno da dimensão ideológica do mérito como sendo o
principal critério (mais eficiente e legítimo) para a hierarquização social, ao mesmo
tempo são grandes e profundas as divergências em relação à sua substância e
maiores ainda as diferenças quanto aos dispositivos capazes de aferi-la.

Sen (2000), um economista ganhador do prêmio Nobel, ao refletir sobre a questão da


meritocracia associada às desigualdades econômicas, chama a atenção para o fato de
que qualquer análise em torno do que consiste o mérito deve partir de um nível de
generalidade amplo. Segundo ele, a ‘substancia’ do mérito reflete concepções em
torno do que é considerado, em cada momento histórico, como sendo uma sociedade
“boa e justa”. Dessa forma, a concepção geral acerca do mérito estaria
necessariamente condicionada ao que consideramos como boas ações ou ações
corretas do ponto de vista da construção de uma sociedade idealizada2. Como estas
percepções não são absolutas, a capacidade de julgamento das ações tidas como
meritórias também não o é. Para ele, o conteúdo preciso do mérito (sua substância),
especialmente no seu aspecto normativo, deve ser identificado tendo como princípio
orientador os termos pelos quais se julga que uma sociedade é bem sucedida. Em
outras palavras, o que será considerado como meritório em um dado contexto reflete e
espelha os valores referenciais tidos como mais importantes para uma determinada
sociedade (ou uma combinação dos mesmos). Ou seja, se a medida de sucesso é a
inclusão social, as ações tidas como meritórias deverão considerar este componente.
Por outro lado, se a medida de sucesso é o crescimento econômico, a definição
substantiva do mérito deverá conter uma boa dose de conteúdos associados à

2
O autor ressalta ainda que existem duas percepções ou visões do mérito que concorrem entre si. Uma
representada pelo posicionamento funcionalista, prioriza a ‘visão de incentivo do mérito’. Porém uma outra
percepção vê o mérito como uma ‘propriedade da ação’.
31

eficiência e ao bom uso dos recursos existentes. O critério de justiça seria assim
resultante de um projeto político de configuração societal.

Em uma outra perspectiva, Barbosa (1999) ressalta que as divergências em relação às


dimensões interpretativas da meritocracia (entendida como uma matriz ideológica que
postula que as posições dos indivíduos na sociedade devem ser resultantes do mérito
de cada um) situam-se em torno da concepção do tipo ‘afirmativo’ e não do tipo
‘negativo’. Segundo ela, na dimensão negativa, existe um consenso na rejeição de que
as variáveis adscritas, (tais como origem de classe, poder econômico ou político,
relações consangüíneas e outras semelhantes) possam ser utilizadas como fatores
para a concessão de privilégios na obtenção de posições ou direitos sociais. Ao
menos no plano das representações, não há, em nossas sociedades, conflitos
relativos a este aspecto. No entanto, quando se trata da dimensão ‘afirmativa’ o
mesmo não pode ser dito. Esta, derivada da anterior, consiste na tentativa de se
conferir ‘substância’ ao mérito; e é neste momento que as divergências aparecem. Em
outras palavras, se há aceitação da formula geral da equação que define o
desempenho como sendo o resultado do somatório de “talento + habilidades +
esforço”, inversamente há grandes disputas em relação ao significado de cada um
destes termos individualmente, que se manifestam igualmente nas diferenças em
relação às formas ‘corretas’ de mensurá-los ou avaliá-los.

Porém, fato é que se hoje entendemos a meritocracia quase que exclusivamente como
associada a uma sociedade de talento, de intelecto, e legitimada por diplomas
escolares, isso decorre de uma configuração histórica específica das sociedades
modernas na qual o status, renda e direitos estariam mais afinados com as
identidades profissionais, as quais são garantidas pelas credenciais educativas.
Assim, a formação escolar representaria um dos principais alicerces para a
distribuição das posições sociais.

Weber, no fim do século XIX, ao discorrer sobre o avanço do capitalismo e da


burocracia, já apontava para o surgimento de uma ‘aristocracia de diplomas’ baseada
no prestígio social dos títulos educacionais. Dizia ele:

“Hoje, os diplomas são o que o teste dos ancestrais foi no passado – um pré-
requisito para a igualdade de nascimentos, uma qualificação para um canoninato
e para o cargo estatal.” (WEBER: 1982, p. 168)
32

O avanço da racionalização da sociedade implicaria na maior exigência por técnicos e


profissionais especializados, o que sustentaria a importância da qualificação. Ao
mesmo tempo ele alerta para a produção de novas desigualdades na medida em que
os tais títulos poderiam conferir outros tipos de privilégios aos seus detentores (basta
pensar, no caso da sociedade brasileira, no direito de cela especial outorgado aos
portadores de diplomas universitários) e portanto se instalaria uma disputa em torno
do seu monopólio e dos dispositivos que possibilitam a atribuição dos certificados3.

Esta análise de Weber em torno das disputas permanece bastante atual,


especialmente quando se considera a expansão recente da cobertura dos sistemas
educativos, incluindo o ensino superior. Podemos pensar na produção das hierarquias
que no Brasil organizam os diplomas e nas disputas que são travadas entre os seus
detentores (e entre as instituições que os conferem) para garantir e melhorar suas
posições no campo. É o caso, por exemplo, das valorações diferenciadas que são
conferidas ao nível do diploma (cursos técnicos/tecnológicos x cursos de graduação;
licenciaturas x bacharelado), e ao tipo de instituição (aqui um leque de pólos de
oposição podem ser identificados, com destaque para: pública x privada;
comunitária/confessional x empresarial; instituição ‘de ensino’ x instituição ‘de
pesquisa’). Da mesma forma podemos pensar sobre as disputas em torno dos
instrumentos e práticas que contribuem para organizar tais disputas e com isso atribuir
novos valores aos diplomas, basta ver os posicionamentos e jogos de interesse por
trás dos sistemas de avaliação da ‘qualidade’ da formação universitária: Provão x
Enade.

No entanto, quando se considera a vinculação entre status e renda e as possibilidades


de mobilidade social com base na posse de diplomas, a situação atual se configura
como bastante distinta da que havia sido prevista. Conforme nos aponta Paiva (1998;
2002) as transformações recentes na dinâmica de acumulação capitalista tiveram,
entre outras conseqüências, a capacidade de alterar substancialmente a gestão da
força de trabalho, rompendo com a antiga equação que igualava alta qualificação a

3
Weber ainda acrescenta que o desenvolvimento dos diplomas levaria à formação de uma camada
privilegiada nos escritórios e repartições, e que os certificados dariam apoio às pretensões de seus
portadores de obtenção de vantagens nas mais diversas dimensões da vida social: de intermatrimônios
com famílias notáveis, de serem admitidos em círculos que seguem a ‘códigos de honra’, de remuneração
respeitável ao invés de remuneração pelo trabalho realizado, de progresso garantido e pensões na
velhice, e acima de tudo de monopolizar cargos economicamente vantajosos. (1982, p. 168)
33

elevados salários e elevado status social (como no caso dos médicos e diversas
especializações das engenharias). Segundo esta autora, estaríamos assistindo a uma
‘refeudalização’ do mercado de trabalho, já identificada por Kern & Schumman em
1984, com o retorno de práticas não meritocráticas nos processos de seleção e
promoção da força de trabalho. Capacidades e competências cuja aquisição por
excelência seria atribuída à origem de classe ou ao meio familiar, tais como o ‘bom’
domínio dos códigos de comunicação verbal, ‘boa apresentação’ e outras, estariam
concorrendo com os conteúdos técnicos capazes de serem apreendidos nas
instituições escolares, e muitas vezes até mesmo sobrepujando estes últimos.

Assim, mesmo em um contexto de expansão do acesso ao ensino (ou até por isso), o
que se observa é a geração de novas formas de hierarquização e de exclusão, que
afeta os indivíduos de diferentes maneiras a partir de referenciais que não se prendem
apenas às qualificações, mas que também incluem dimensões de gênero e
geracionais4.

A ‘universalização’ do profissional, que havia sido conquistada por meio da objetivação


do diploma caminha agora, par-e-passo, com a ‘localização’ das competências, sendo
estas definidas situacionalmente e fortemente sujeitas a julgamentos subjetivos5.
Como conseqüência, a substancialização do mérito na sua definição de habilidades,
talentos e esforço torna-se cada vez mais complexa e problemática.

1.2. Mérito e educação – a perspectiva do funcionalismo

Se há uma aceitação de que todas as sociedades humanas são estratificadas de


alguma maneira (na medida em que apresentam uma distribuição desigual de direitos
e obrigações), caberia então perguntar o porquê, nas sociedades modernas, a
estratificação se organiza em torno das credenciais educacionais6. Tomando de

4
Para Castel (1995), as transformações nas relações de trabalho afetam especialmente os indivíduos que
se situam nos dois extremos da pirâmide etária: exclui os mais novos por não terem ainda a experiência
desejada para o bom desempenho nos cargos, e os mais velhos por tê-las em excesso.
5
Em minha dissertação de mestrado abordei o sentido da transformação do conceito de qualificação para
o de competências e suas conseqüências para os trabalhadores. Ver: Régnier, Karla. “Qualificações e
Competências – um estudo de caso no setor serviços” Dissertação de Mestrado apresentada ao
programa de pós-graduação em sociologia e antropologia do IFCS – UFRJ. 1998.
6
Para uma discussão mais ampla sobre as teorias de estratificação ver, entre outros: Velho, Otávio
Guilherme et alli. Estrutura de Classes e Estratificação Social. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1974.
Tumin, M. Estratificação social – as formas e funções da desigualdade. São Paulo: Livraria Pioneira
Editora, 1970
34

empréstimo as palavras de Lahire (2003: p. 983), restaria argüir sobre quais foram as
condições históricas nas quais as diferenças de percursos escolares começaram a ser
interpretadas em termos de desigualdades.

É notório que o pensamento liberal, desde seus primórdios, repudia a organização


social em torno de direitos adquiridos (seja por herança familiar, situação de classe ou
outras). Rousseau, em seu célebre manifesto intitulado ‘A origem da desigualdade
entre os homens’, se levantava contra as desigualdades ‘morais ou políticas’, produto
da ação humana e pelos homens autorizada, a qual permitia que uns gozassem de
certos privilégios em detrimento de outros. Para ele esta era a principal fonte de
injustiças7.

Na perspectiva de eliminar os privilégios transmitidos por herança, pertencimento de


classe ou grupo social, era o mérito, representado pelo esforço individual em uma
sociedade com iguais oportunidades, que despontava como o principio estruturante
mais legítimo. No entanto, não havia ainda uma coincidência entre credenciais
escolares e hierarquização social. Como exemplifica Barbosa, na sociedade
americana do século XVIII e XIX, o mérito se definia a partir de outras categorias,
como a engenhosidade compreendida pela habilidade prática manual e mecânica
(1999; p. 24). Passeron, na mesma linha, afirma que no século XVIII a educação
escolar não era significativa na demarcação das fronteiras sociais: “com pouca ou
nenhuma escolarização, as pessoas de alta condição social mal se distinguiam das do
povo pela linguagem: isso atesta o caráter secundário da legitimação letrada da classe
social.” (PASSERON: 1991; apud LAHIRE: 2003, p. 985). Ou seja, as diferenças no
acesso à educação não se convertiam em desigualdades, uma vez que sua privação
não era tida como uma deficiência ou uma injustiça inaceitável.

Porém, com o avanço da modernidade e a acentuação da divisão social do trabalho


(Durkheim), da burocracia e da democracia (Weber), entra em cena o ‘especialista’, o
indivíduo que domina determinas técnicas e conhecimentos aplicáveis ao sistema

7
Rousseau apontava para dois tipos de desigualdades: uma ‘natural ou física’ que consiste na “diferença
das idades, da saúde, das forças do corpo e das qualidades do espírito ou da alma”. Esta seria uma
desigualdade sobre a qual o homem não poderia atuar e portanto estaria livre de julgamento moral e que
se contrapõe a outro tipo de desigualdade, caracteriza por ser de natureza ‘moral ou política’:
“estabelecida ou pelo menos autorizada pelo consentimento dos homens. Esta consiste nos diferentes
privilégios de que gozam alguns em prejuízo dos outros, como ser mais ricos, mais honrados, mais
poderosos do que os outros”. Esta última, produto da ação humana, é por ele interpretada como injusta.
(ROUSSEAU; s.d.; p. 27)
35

produtivo. Esta capacitação – transferida e certificada pelo sistema escolar - lhe


conferia prestígio e direitos de monopólio no exercício da profissão, que ao mesmo
tempo podiam ser convertidos em vantagens econômicas e de status.

O sistema escolar, à luz do pensamento dos sociólogos funcionalistas que se


desenvolveu desde então, tornou-se o lócus onde se daria a preparação dos
indivíduos para ocupar posições sociais hierarquizadas.

Foi Durkheim quem primeiro apontou para o papel da educação tendo em vista a
manutenção da ordem social e a diferenciação funcional dos indivíduos. Em sua
conhecida definição da educação, ele ressalta seu papel na promoção da adequação
entre as disposições (estados) que deveriam ser desenvolvidos na criança e os meios
aos quais ela se destinará8. No entanto, ele não se ocupa em analisar as relações que
se estabelecem entre a educação e os processos de estratificação social e nem com
as disputas que se travam em torno dos seus determinantes (DIAS DA SILVA; 2002).

Posteriormente, Parsons também reconhece o papel socializante da educação


(herança durkheiniana) assim como a sua relevância para a diferenciação seletiva dos
indivíduos. Mas acrescenta que a aceitação das desigualdades fundadas no acesso a
este tipo passagem pelo sistema educativo só é possível de ser estabelecida porque a
modernidade, além das revoluções industrial e democrática, também é acompanhada
pela ‘revolução educacional’. Ou seja, a possibilidade de extensão do acesso à
educação a todos legitima a aceitação da desigualdade dos estatutos com base no
desempenho.

Em seu funcionalismo-estrutural, Parsons desenvolve a idéia de que, se de um lado é


a escassez de determinadas competências ou habilidades no mercado o que permite
aos indivíduos que as possuem a aferirem maiores recompensas, por outro lado as

8
Durkheim define a educação como sendo “a ação exercida pelas gerações adultas, sobre as gerações
que não se encontram ainda preparadas para a vida social. Têm por objeto suscitar e desenvolver, na
criança, certo número de estados físicos, intelectuais e morais, reclamados pela sociedade política, no
seu conjunto, e pelo meio especial a que a criança, particularmente, se destine.” (DURKHEIM: 1955, p.
32). Por certo ele foi um dos sociólogos que mais se dedicou à análise da educação, e ao longo de sua
obra ressalta a função educativa tendo em vista a manutenção da ordem social, na medida em que ela
contribui decisivamente para a interiorização dos valores hegemônicos em cada momento histórico.
Afirma que nas sociedades contemporâneas, a educação teria três funções complementares: inculcar a
disciplina, desenvolver o senso de pertencimento ao grupo social e promover a autonomia, embora esta
última, entendida como o desenvolvimento de habilidades e potencialidades de cada indivíduo, seja a
menos reconhecida por seus críticos, que tendem a se concentrar mais nos aspectos relativos à
adequação funcional da educação às ‘necessidades da sociedade’. (DIAS DA SILVA: 2002)
36

chances de aquisição destas competências seriam ampliadas pela própria ampliação


do sistema educativo (tese que seria aprofundada pela teoria do capital humano). Este
autor elabora uma visão bastante otimista quanto ao futuro da ‘nova sociedade’ no que
se refere aos componentes de base da estratificação, afirmando que se os privilégios
hereditários não desapareceriam totalmente, ao menos na sociedade meritocrática
eles estariam mais ‘limitados’, e para que isso ocorresse, a revolução educacional
desempenharia um papel fundamental9. Cuidando para que o ideal de igualdade
política total permaneça no plano das utopias, ele todavia não descarta a
transformação dos padrões fixos de desigualdade e no fortalecimento da cidadania:

“(...) o foco da nova fase é a revolução educacional, que num certo sentido
sintetiza os temas das revoluções industrial e democrática: igualdade de
oportunidades e igualdade de cidadania. A ‘habilidade nativa’ do indivíduo de
atingir uma posição justa diretamente por intermédio da competição no mercado
não é mais a questão. Em vez disso, a estratificação por habilidade é
reconhecida como mediada por uma série complexa de estágios no processo de
socialização.” (PARSONS: 1971, apud DOMINGUES: 2001, pág. 89).

A igualdade de oportunidades não se traduz em igualdade de desempenho, entretanto


a sua assunção fortalece o princípio do mérito.

Extensões da abordagem funcionalista são encontradas na obra de dois outros


autores americanos: Davis e Moore, os quais em meados da década de 1940
aprofundaram a relação entre educação e desenvolvimento social na corrente teórica
que ficou conhecida como tecnofuncionalismo. Para estes autores, a estratificação é
uma conseqüência da divisão do trabalho. Em seu enquadramento teórico-analítico, a
diferença das posições ocupacionais ou dos empregos, seja em termos de
remuneração ou de status, deve ser explicada a partir da combinação de três critérios:
o primeiro aponta para a importância que cada função tem para a sociedade (em que
medida ela é vital); o segundo refere-se ao grau de complexidade da função e sua
exigência de qualificações ou talentos especiais que são demandados para o seu
desempenho; e o terceiro consiste no grau de ‘agradabilidade’ do trabalho realizado.

9
De certa forma, a revolução educacional ao mesmo tempo em que ampliou o acesso ao sistema escolar,
criou as bases de constituição das desigualdades no acesso à mesma. O desenvolvimento da crença
coletiva na possibilidade de acesso ao sistema educativo tornou a escola um ‘bem’ desejável’ e injusta a
situação de não acesso. Nas palavras de Lahire, “terá sido preciso que uma população inteira seja
escolarizada e submetida à obrigação escolar para que, num contexto econômico em que o acesso às
posições profissionais mais privilegiadas dependia cada vez mais da obtenção de um diploma elevado, as
diferenças de percursos escolares sejam coletivamente interpretadas em termos de desigualdades
escolares.” (LAHIRE: 2003. p. 992)
37

Seriam estes os critérios que operariam como princípios de hierarquização e que


ordenariam, em cada momento histórico, as posições ou funções existentes nas
sociedades10. Acrescentam que esta diferenciação é funcional ou necessária, pois,
para que a sociedade possa se manter em operação, é preciso que exista a
diferenciação das funções (diferenciação estrutural). No entanto, os autores afirmam
ainda que é no plano das recompensas e na sua distribuição diferenciada que se
consolida o mecanismo de estratificação (e de desigualdade) e não nos planos
anteriores: “As recompensas e sua distribuição tornam-se uma parte da ordem social,
e assim dão origem à estratificação.” (DAVIS & MOORE: 1971, p. 116)

Analiticamente, o sistema de recompensas concebido por Davis e Moore corresponde


ao instrumental motivacional que cada sociedade lança mão para fazer com que os
indivíduos ocupem as posições profissionais que lhe cabem e para que cumpram com
as tarefas associadas a estas. O esquema funcional proposto pelos autores assenta-
se no par correspondente da ‘pessoa certa’ no ‘lugar certo’, sendo que as
recompensas diferenciadas premiam, também diferenciadamente, as diversas
posições ocupadas pelos indivíduos na estrutura social (e ainda levam em conta
aspectos relativos à escassez diferencial de pessoal11).

Por sua ênfase no sistema de recompensas receberam várias críticas, entre elas a
exposta por Cherkaoui (1995) que pondera que Davis e Moore, ao centralizarem a
estratificação nesta dimensão, negligenciaram o fato de que a hierarquização das
posições e a definição das competências e talentos necessários para ocupá-las,
embora a princípio pareça ser um processo ‘neutro’, quando envolve juízos de valor
permite a edificação de desigualdades; e que portanto a estratificação, em sua face de
geração de desigualdade, localiza-se anteriormente ao sistema de recompensas – ou
seja, nos planos da diferenciação, hierarquização e avaliação:

“A hierarquização revela a diferença entre os talentos naturais dos indivíduos ou


as qualificações adquiridas por experiência ou aprendizagem. (....) a
desigualdade não existe a este nível de análise. A hierarquização não implica

10
Cabe assinalar que estes princípios não são absolutos, ou seja, dependendo da evolução da divisão do
trabalho, do estágio de desenvolvimento cultural, da relação de uma sociedade diante das demais
(situação de paz ou de guerra por exemplo) e do tamanho da sociedade (soma dos seus membros), a
definição de importância associada às posições (e conseqüentemente sua hierarquização) poderá sofrer
alterações profundas (configurando sistemas de estratificação diferenciados em relação a cada um destes
aspectos).
11
Posições facilmente preenchidas não precisam ser muito recompensadas – o que nos faz pensar na
desvalorização dos diplomas pela democratização do ensino superior.
38

logicamente qualquer juízo de valor: podemos considerar uma função mais difícil
do que outra, um indivíduo fisicamente mais dotado ou psicologicamente mais
sutil do que um outro sem que por isso fiquemos autorizados a afirmar que é
melhor. A hierarquização é um processo neutro. Mas a partir do momento em
que se admita ou se estabeleça a existência de uma escala de valores relativos
às posições, pende-se para a desigualdade. Parece, portanto, difícil apoiar
inteiramente Davis e Moore quando afirmam que a estratificação é gerada pela
gratificação.” (CHERKAOUI: 1995, p. 113)

Outra fragilidade na construção teórica de ambos provém das dificuldades de


estabelecer critérios de ordenação das posições socioprofissionais a partir de sua
importância “funcional”: “Em que advogados, professores primários, médicos ou
bancários são mais importantes uns do que os outros?” interrogam Boudon e
Bourricaud (2002, p. 218).

Em Davis e Moore encontramos implicitamente a defesa dos critérios de êxito ou de


aquisição como sendo mais eficientes do que os critérios adscritos12 ou atribuídos /
herdados para o bom funcionamento das sociedades industriais. Se os últimos foram
compatíveis com sociedades tradicionais, com o desenvolvimento dos sistemas
produtivos perderam sua capacidade ordenadora. A racionalidade técnica e
econômica determinaria que fosse mantida uma estreita relação entre o grau de
importância funcional das diversas ocupações profissionais e a qualificação de seus
titulares. A alocação dos indivíduos aos cargos seria assim orquestrada em acordo
com o que cada um demonstra efetivamente ‘saber fazer’ e não mais por sua origem
social. A desigualdade resultante “encontraria legitimidade – ao contrário da
desigualdade herdada – pelo fato de que ela contribui para o funcionamento eficiente
da sociedade como um todo e que ganhos superiores, por refletirem êxito superior,
são merecidos”. (GOLDTHORPE: 1997, p. 664 – tradução própria, grifo do autor).

12
Na língua inglesa são utilizados dois termos para expressar os atributos ou competências que seriam
‘herdados’ – ascription – e que se diferenciam dos que podem ser adquiridos – achievement – com base
no esforço de cada indivíduo. Estas palavras não encontram correspondência direta em termos
conceituais na língua portuguesa, sendo necessária a sua adaptação. No nosso caso estamos utilizando
adscrição e aquisição, respectivamente, como tradutores, embora imprecisos, de tais conceitos. Estes
dois conceitos são amplamente difundidos na literatura sociológica, especialmente por meio da
contribuição a Parsons, entre outros. Em sua acepção mais ampla, ascription e termos derivados
representa “um processo de alocação de status onde a posição social do indivíduo é basicamente
herdada a partir de suas características familiares e/ou individuais, tais como status socioeconômico dos
pais, nível educacional dos pais, raça, gênero, estrutura familiar, local de nascimento, etc.” Já
achievement e termos derivados representa o “processo de alocação de status no qual a posição social
do indivíduo é basicamente construída a partir de suas características adquiridas ao longo da vida, como
a educação, primeiro emprego, etc.” (FERNANDES: 2004, p. 5)
39

Esta é uma construção lógica a qual Cherkaoui contesta veementemente, afirmando


que a pretensão de associar um determinado perfil ‘ideal’ a um determinado posto de
trabalho é falha em pelo menos três dimensões:

(1) os critérios utilizados para definir o conjunto de competências que devem


ser possuídas pelos candidatos às posições não são neutros ou objetivos e,
além disso, o processo real de seleção nunca se dá com base apenas nestes
critérios;

(2) existem outros princípios de seleção que rivalizam com a estratificação


puramente meritocrática e que são fartamente utilizados, como por exemplo, o
pertencimento ou vínculo a grupos étnicos e religiosos, a inclinação sexual,
entre outros;

(3) o princípio de estratificação constrói uma explicação do comportamento


individual “em termos de necessidade ou de interesses da sociedade”; no
entanto aqui se encontra um erro lógico, porque o comportamento individual só
se explica por meio das motivações pessoais: “as necessidades sociais só
poderão afetar o comportamento individual desde que se traduzam em
motivações individuais” (CHERKAOUI: 1995; p. 114).

A despeito das críticas que receberam, as posições funcionalistas desenvolvidas por


Davis e Moore inspiraram (e continuam inspirando) outros teóricos no âmbito da
sociologia da educação e do trabalho. A substituição de atributos adscritos pelo êxito
como fonte para a seleção social e para a distribuição da recompensa (simbólica e
monetária) foi tendo aceitação crescente quanto mais a sociedade evoluía do
industrialismo rumo ao ‘pós-industrialismo’ (ou à recente chamada ‘sociedade do
conhecimento’). Em paralelo, no campo da economia, se desenvolvia a “teoria do
capital humano”, que fortalecia ainda mais a dimensão educacional associada à
produtividade e ao desenvolvimento econômico. O crescimento do setor serviços e a
consolidação da burocracia pública e privada foram criando as condições para que a
“meritocracia” fosse sendo assumida, cada vez mais, como uma tendência inexorável
e necessária para o bom ‘funcionamento’ econômico e moral das sociedades
ocidentais contemporâneas (BOUDON & BOURRICAUD: 2002; p. 219). É nesse
sentido que Daniel Bell, ainda da década de 1970, se permitia afirmar que:
40

“A sociedade pós-industrial, em sua lógica, é uma meritocracia. Status e salários


diferenciados são baseados em habilidades técnicas e educação superior, e
poucos cargos altos estão abertos a quem não possui tais qualificações.” (BELL:
1972 apud GOLDTHORPE: 1997, p. 665 – tradução própria).

A associação entre educação e a hierarquização dos indivíduos em posições sociais


parecia assim estar fadada à cristalização na sociedade que se descortinava. Isso
somado à disseminação das teorias econômicas que colocavam os investimentos em
educação como essenciais para o crescimento econômico reforçaram a colocação da
educação no centro dos debates das políticas de redução das desigualdades. Como
apontam Carrilo e Iranzo, neste momento começou a ser produzido e disseminado um
discurso no âmbito de organismos internacionais (tais como UNESCO, Banco Mundial
e Banco Interamericano de Desenvolvimento) e cada vez mais endossado por
governos e empresários, no qual se assume como verdadeiro que é “sólo a través de
la elevación de la calificación de los recursos humanos será posible acompañar los
incrementos en la productividad y la competitividad de las empresas y, de esta
manera, aumentar los ingresos de la población trabajadora.” (CARRILO & IRANZO:
2000, p. 195)

Indo além, assume-se que é por meio da provisão do acesso amplo da população aos
níveis mais elevados da escolaridade que se poderia obter a redução das
desigualdades sociais:

“A educação passa a ser encarada como a principal determinante da reversão da


pobreza estrutural e o único fator que pode ser verdadeiramente responsável por
vencer o ‘círculo de ferro da exclusão’, formulado com base na asserção
evidente de que, de outro modo, a pobreza socializa inevitavelmente para a
continuação da pobreza.” (CARNEIRO: 1995)

Dessa forma, já na década de 1960, estava sendo criada uma afinidade eletiva que
justificava as políticas que associavam os investimentos na expansão dos sistemas
educativos com os ideais de igualdade e de incremento da mobilidade; afinidade esta
que, a despeito das inúmeras críticas que enfrentou desde então, ressurge renovada
no final do século XX.
41

1.3. O aprofundamento do funcionalismo – a teoria do capital humano e


suas críticas

Durante os anos 1960, a explicação da diferenciação educacional em termos


‘funcionais’ de atendimento às necessidades (explicitas ou latentes) da sociedade
ganha novos matizes com a continuidade do desenvolvimento das sociedades
industrializadas. O progresso da tecnologia produtiva e o crescimento econômico
colocam em evidência o problema das novas necessidades de mão-de-obra
qualificada (FORQUIN: 1995, p. 57). A nova sociedade estaria baseada no
desenvolvimento e generalização das competências, o que sustentava a convergência
do funcionalismo tecnológico com a concepção da educação como investimento
produtivo. Esta convergência foi capturada e desenvolvida pelos economistas teóricos
do ‘capital humano’.

Para a ciência econômica, a educação não era um tema novo. De fato, desde os seus
fundadores já se encontravam referências ao papel das credenciais escolares tanto na
composição das estratificações sociais quanto na promoção da eficiência do trabalho e
do capital. Adam Smith, em seu clássico livro ‘A Riqueza das Nações’, afirmava que o
homem bem educado poderia ser comparado a uma máquina cara e, assim como
essa, ele deveria poder recuperar o capital investido na sua formação. Esta
recuperação dos investimentos seria realizada a partir da aferição de melhores
salários. No entanto a estratificação seria resultante de mecanismos de mercado (das
leis de oferta e procura). Os salários (e status correspondente) seriam variáveis
dependentes da oferta e da demanda por determinadas ocupações. O “valor” da
oferta, por seu turno, estaria associado à dificuldade ou ao tempo de aprendizagem
das tarefas correspondentes a cada função.13

13
Para Smith, um outro elemento relevante diz respeito à natureza das tarefas que se tem por cumprir, o
que estabelece uma diferenciação / hierarquização entre profissões com igual tempo de aprendizagem.
Atividades equivalentes em termos de tempo de aprendizagem são hierarquizadas de forma desigual
segundo a natureza (valoração social) das tarefas. Assim, as remunerações simbólicas e materiais
resultam tanto das leis de mercado quanto da valoração social diferenciada das atividades envolvidas em
cada profissão. Lixeiros e carteiros, ou sociólogos e administradores, podem ter o mesmo tempo de
aprendizagem, mas seu prestígio será diferenciado. Ele ainda aponta para as “imperfeições” no
funcionamento do mercado de trabalho que se refletem na distribuição da renda, como a existência dos
monopólios profissionais, a maior ou menor presença dos sindicatos, etc. (BOUDON & BOURRICAUD:
2002 - Estratificação Social). Referências à educação também são encontradas nas obras de outros
autores clássicos da teoria econômica, tais como John Stuart Mill e Alfred Marshall. Para Stuart Mill, um
teórico de referência do liberalismo inglês, a educação, além de poder ajudar na transformação dos
hábitos de vida da população, também possibilitaria o incremento da eficiência econômica, embora não
deixasse muito claro a forma com que isso se dava: “uma coisa ainda não bem compreendida e
reconhecida é o valor econômico da difusão geral da cultura e da instrução entre a população.” (MILL:
42

Apesar dessas referências pontuais de origem, o fato é que o paradigma econômico


neoclássico que se desenvolveu durante a primeira metade do século XX deixou de
fora a variável educação como matriz explicativa para o desenvolvimento econômico.
Os ganhos de produtividade tendiam a ser explicados a partir do crescimento
populacional, da capacidade gerencial, da intensificação do trabalho, da eficiência da
política econômica ou ainda da incorporação do progresso técnico. Apenas nos anos
1960 é que três economistas americanos, David Becker, Jacob Mincer e Theodore
Schultz, colocam o conhecimento, formalizado pela educação, no centro do processo
de crescimento econômico com a elaboração da ‘Teoria do Capital Humano’14. Desde
então, além de capital econômico, trabalho e equipamentos, a riqueza e capacidade
competitiva das nações passou a ser vista como dependente da ‘qualidade’ de seus
recursos humanos (sendo a educação um componente decisivo na formatação desta
‘qualidade’), e os salários incorporaram o fator qualificação na sua determinação. Os
desdobramentos desta concepção foram analisados sob diversas perspectivas,
incluindo, além do crescimento econômico, a busca de explicações para as
desigualdades na distribuição de renda, na dispersão de salários e nos níveis de
pobreza.

Grosso modo, o arcabouço da teoria sustenta-se em duas perspectivas associadas: a


primeira, entende que a melhor capacitação dos trabalhadores é um fator de aumento
de produtividade (como anunciado anteriormente). E portanto, o incremento da
‘qualidade’ dos recursos humanos depende do acesso e da abrangência da formação
escolar e profissional, que por sua vez potencializa a capacidade de trabalho e conduz
ao aumento da produção, fechando o círculo. A segunda perspectiva concentra-se na
análise dos investimentos em educação (para além da educação compulsória) como
decorrente do paradigma da maximização da utilidade individual. Cada indivíduo,

1983; apud WALTENBERG: 2002, p. 20) Já Marshall, outro economista inglês sucedâneo de Mill,
identificava a educação como uma das fontes de crescimento econômico e considerava os investimentos
em educação como extremamente relevantes na perspectiva macroeconômica: “o mais valioso de todos
os capitais é o que se investe em seres humanos.” (MARSHALL, 1982; apud WALTENBERG: 2002, p. 22)
Paralelamente à identificação da correlação entre educação e crescimento econômico, Marshall também
percebia as dificuldades que os pais de famílias pobres enfrentavam para educar seus filhos e por isso
defendia o financiamento da educação por parte do estado, o que minimizaria o “desperdício de talentos.”
(WALTENBERG: 2002, p. 20)
14
Apesar dos três autores mencionados terem se referido ao conhecimento como sendo definido
essencialmente pela escolaridade, não se abstiveram em reconhecer que a escola não é a única fonte de
geração e transmissão de conhecimento. Várias outras instituições fazem parte desse processo. Se de
um lado se tem o conhecimento formal, monopolizado pelas escolas, de outro se tem o conhecimento
informal, adquirido nas relações familiares, experiência de trabalho, etc.
43

capaz de tomar decisões de forma livre e racional, avaliaria os gastos e os possíveis


retornos com seus investimentos (uma análise de custo-benefício) e com isso tomaria
as decisões pertinentes na constituição do seu ‘capital pessoal’.

Este arcabouço foi sendo elaborado aos poucos. Em um primeiro momento, Mincer,
em 1958, se propôs a analisar a desigualdade de renda pessoal, redirecionando a
“análise econômica para a função de produção por meio de um modelo no qual
diferenciais de ganhos intra-ocupacionais seriam explicados com base no investimento
em capital humano”. (MORETTO: 2002, p. 29). Posteriormente, visando medir o
impacto da educação nos retornos em termos de remuneração, ele formula uma
equação (human capital earnings function, elaborada na década de 1970 e que veio a
ser conhecida pelo seu nome) em que sustenta a hipótese de que os anos de
escolaridade têm uma influência linear sobre o salário; ou seja, quanto mais tempo de
escolaridade uma pessoa possui, maior será o seu rendimento salarial. E além disso,
cada ano subseqüente de escolaridade possui o mesmo impacto na formação da
renda. Já a experiência profissional teria um padrão quadrático (e não linear) na
formação dos rendimentos - o que significa que o salário do trabalhador sobe na
medida em que aumenta a sua experiência (e a sua idade) até certo ponto, a partir do
qual entra em trajetória descendente (IOSCHPE: 2004, p. 40).

Às descobertas de Mincer somam-se, em um primeiro momento, as formulações de


Schultz, e posteriormente as de Becker15, que elaboraram com acuro as contribuições
da educação na estimação das fontes de crescimento econômico e no retorno dos
investimentos em educação, formalizando a concepção teórica que veio a ser
conhecida como Teoria do Capital Humano (TCH).

Ainda na década de 196016, Schultz defendia que quanto mais qualificado


(escolarizado ou educado) fosse um indivíduo, mais produtivo ele seria: o processo
educacional não apenas trazia enriquecimento cultural aos que por ele passavam, mas
sobretudo deixava contribuições duradouras no seu aumento de produtividade – e
como conseqüência nos seus rendimentos potenciais. No nível individual, aqueles que
mais investissem em educação teriam maior probabilidade de aferir melhores

15
Que inclusive lhes renderam prêmio Nobel: em 1992 para Becker e 1979 para Schultz.
16
Em 1961 W. Schultz publica “Investment in Human Capital”. Neste artigo ele introduz sua teoria do
Capital Humano onde argumenta que tanto conhecimento quanto habilidades são formas de capital, e que
a sua aquisição é resultado de um ‘investimento deliberado’ dos indivíduos.
44

rendimentos (e as desigualdades de salário seriam explicadas pelas diferenças de


produtividade decorrentes dos investimentos diferenciados em formação); e no nível
agregado, argumentava-se que uma sociedade composta por indivíduos mais bem
providos de capital humano teria maior potencial de crescimento do que as que não
compartilhassem desta característica17.

Vários são os fatores enumerados por Schultz que contribuem para a melhoria do
capital humano, sendo a educação formal um deles (outros fatores são: o treinamento
no emprego, os recursos destinados à saúde, etc.). Mas fazendo uso de sua
racionalidade, os agentes investem conscientemente em educação buscando uma
determinada taxa de retorno. Nos casos em que se observam disfunções neste
investimento, as justificativas podem ser buscadas na ausência de informações
(informação imperfeita) e que deveriam ser corrigidas pelo Estado.

Becker incrementa e leva adiante o utilitarismo racional de Schultz. Para ele o


montante de investimentos julgado como adequado por cada indivíduo é diferenciado,
uma vez os indivíduos são desigualmente dotados na sociedade (seja em termos de
idade, de sexo, de renda, etc.). Para uns os gastos (monetários, psíquicos, etc.) com
educação são mais elevados do que para outros, podendo mesmo chegar ao ponto
em que estes se tornem superiores às estimativas de retorno futuro. Quando isso
ocorre, o indivíduo racional tenderia a suspender seus investimentos: “Continuar ou
não os estudos seria portanto uma decisão pessoal. Cada indivíduo investiria até o
limite no qual o investimento deixasse de ser rentável”.18 (BECKER: 1962; 1975; 1981;
apud CATTANI: 1999).

17
O conceito de capital humano para Schultz, e que o diferencia dos demais capitais, é descrito da
seguinte forma: “A característica distintiva do capital humano é a de que ele é parte do homem. É humano
porquanto se acha configurado no homem, e é ‘capital’ porque é uma fonte de satisfações futuras, ou de
futuros rendimentos, ou ambas as coisas. Onde os homens sejam pessoas livres, o capital humano não é
um ato negociável, no sentido de que possa ser vendido. Pode, sem dúvida, ser adquirido, não como
elemento de ativo, que se adquire no mercado, mas por intermédio de um investimento próprio no
indivíduo. Segue-se que nenhuma pessoa humana pode separar-se a si mesma do capital humano que
possui.” (SCHULTZ: 1973, p. 53)
18
As expectativas de retorno propostas por Becker foram utilizadas para explicar diversos tipos de
comportamento econômico, sendo os investimentos em capital humano um deles. Os outros foram: o
comportamento da família no tocante à alocação do tempo no trabalho doméstico ou no mercado, o crime
e a punição, a discriminação nos mercados de trabalho e de bens e serviços (MORETTO: 2002, p. 32). A
visão do indivíduo racional em uso de suas plenas capacidades cognitivas e de liberdade deu origem ao
que Ioschpe (2004) entende como sendo a extensão do modelo explicativo de Becker para dar conta
tanto das diferenças de investimento educacional entre gerações (os jovens investem mais em educação
porque o retorno deste investimento é maior quanto mais longo for o período de ‘aplicação’. Assim, como
os jovens tem toda uma vida pela frente, as possibilidades de obterem retornos mais elevados e
consistentes são maiores do que as que são apresentadas aos mais idosos) quanto dos movimentos
migratórios, da distribuição das ocupações entre gêneros e das alocações profissionais das minorias
45

O investidor em capital humano é, para Becker, um homem econômico racional, que


maximiza sua utilidade individual em termos de aquisição de educação e que toma
suas decisões, ainda que com margem de erros. Este indivíduo seria

“capaz de prever todos os possíveis estados de mundo associados à aplicação


dos conhecimentos adquiridos, a partir do(s) curso(s) que escolheu como
preferido(s) entre o conjunto de meios de formação ou instrução possíveis. Isso
porque esse indivíduo teria à sua disposição informações sobre o mercado de
trabalho e a sinalização de que um maior nível de escolarização corresponde a
um maior nível de rendimento” (MORETTO: 2002, p. 33).

Do ponto de vista da produtividade (que se reflete na remuneração), Becker sustenta


que se de um lado o desempenho dos indivíduos no mercado de trabalho depende de
seus conhecimentos e escolaridade formalmente atestados, de outro não se pode
negligenciar o espaço reservado para o esforço atitudinal:

“(...) la productividad de los empleados depende no solo de su aptitud y de la


inversión que se realiza em ellos, tanto dentro como fuera del puesto de trabajo,
sino también de su motivación y de la intensidad de su esfuerzo....” (BECKER:
1983; apud RIOS: 2003, p. 2)

Os trabalhos de Mincer, Schultz e Becker sumarizados na TCH tiveram impactos


expressivos sobretudo nos países do ‘terceiro mundo’. O aporte da teoria, no que se
refere ao desenvolvimento dos sistemas educativos, chegou a ser considerado como
uma “alternativa para se alcançar o desenvolvimento econômico, para se reduzirem as
desigualdades sociais e para aumentar a renda dos indivíduos.” (FRIGOTTO, 1995;
apud CATTANI: 1999).

étnicas: “pelo mesmo raciocínio também podemos entender um pouco melhor os movimentos migratórios:
é mais fácil perceber que jovens são mais propensos a mudar do que velhos não apenas por fatores
relacionados à disposição física e tolerância ao risco de um ou outro, mas sim pelo fato de que a maioria
dos migrantes se dirige a zonas onde os salários são mais altos que em suas zonas de origem, e o jovem
terá mais tempo para colher os resultados do que um velho – e portanto maiores retornos. Também fica
mais fácil compreender por que, até a emancipação feminina, as mulheres preferiam uma educação que
lhes ensinasse atividades como cozinha, costura, etc.: como as portas do mercado de trabalho lhes
estavam fechadas, só fazia sentido investir na aquisição de competências úteis ao ‘mercado’ em que elas
trabalhariam, no caso o lar. Da mesma forma, minorias étnicas discriminadas no mercado de trabalho
tenderão a investir menos do que a média em competências para mercados em que serão discriminadas
e mais naqueles em que possam obter retorno igual ou maior do que a média da população”. (IOSCHPE:
2004, p. 35 e 36)
46

No Brasil, a TCH foi introduzida nos anos 1960/70 por meio, principalmente, dos
trabalhos de Carlos Langoni, Claudio de Moura Castro e Mario Henrique Simonsen19.
Cabe ressaltar que esta visão, amplamente disseminada ao longo deste período, e
que retorna sob várias roupagens nos anos 1990 (inclusive com o patrocínio de
agencias internacionais como BID e Banco Mundial para a elaboração de estudos
empíricos voltados à estimação dos retornos em educação – tanto individuais quanto
coletivos (PAIVA: 1998, p.10)), tem apresentado vários desdobramentos no que se
refere à formulação de políticas públicas que visam a distribuição de renda e a
redução das desigualdades econômicas.

Nesse sentido, exemplar é a assertiva de Barros et al (2002) ao afirmarem que no


caso brasileiro “a sustentabilidade do desenvolvimento socioeconômico está
diretamente associada à velocidade e à continuidade do processo de expansão
educacional” (BARROS et al.: 2002, p.1). Esta associação se estabelece pela conexão
de dois processos distintos: o primeiro está calcado no pressuposto de que a
expansão educacional contribui para a melhoria da qualidade do trabalho, e por
conseqüência, interfere positivamente na formação dos salários, contribuindo dessa
forma tanto para o desenvolvimento econômico (produtividade) quanto para a
diminuição da pobreza (salários). O segundo baseia-se no entendimento de que tal
expansão atua na redução das desigualdades e na maior mobilidade social, “na
medida em que a condição de ‘ativo não transferível’ faz da educação um ativo de
distribuição mais fácil do que a maioria dos ativos físicos.”20 (ibid., id.).

Nos dias atuais, o valor da educação apontado pela teoria do capital humano encontra
forte aderência ideológica com a perspectiva funcionalista de incremento da demanda
por profissionais mais escolarizados devido aos requerimentos funcionais da
sociedade (ou tecnofuncionalismo, conforme apontado no tópico anterior). Esta
abordagem é revitalizada sob a égide da ‘sociedade do conhecimento’ e pelas
propostas de valorização dos recursos humanos (ou ‘talentos humanos’ presentes nas
teorias de gestão). A contribuição da força de trabalho, que no âmbito do paradigma

19
Destacando: (a) de Carlos Langoni: As causas do crescimento econômico no Brasil. Rio de Janeiro,
Apec, 1974.; (b) de Claudio de Moura Castro: Investimento em educação no Brasil: um estudo sócio-
econômico de duas comunidades industriais. Rio de Janeiro: IPEA/INPES, 1973 e Educação e Renda:
quando tudo o mais não permanece constante. Estudos Econômicos. São Paulo: IPE/USP, v. 4 n. 1,
1974; e (c) de Mario Henrique Simonsen: Brasil 2002. Rio de Janeiro; Apec, 1969.
20
A concepção por trás de ativo não transferível refere-se ao fato de que o capital humano acumulado
pelos indivíduos não pode ser separado – vendido, ou cedido – da sua própria pessoa, conforme
definição de Schultz apresentada em nota anterior (de número 17).
47

taylorista-fordista de produção era subestimada, ressurge tal qual fênix, e ganha a


pecha de ser o maior ‘ativo’ produtivo em tempos de internacionalização do capital,
acirramento da concorrência e disseminação da cultura de qualidade. Mas isso não
sem que antes o setor produtivo tenha passado por processos de ‘enxugamento’ e
downsizing, que entre outras conseqüências trouxe o rompimento da relação entre
comprometimento (o ‘vestir a camisa’, o sacrifício) e garantia de emprego (o que se
obtinha em troca).

Mas ao mesmo tempo em que a TCH encontrava seus porta-vozes, resultando na


criação de um novo campo de conhecimento (a economia da educação), também ia se
estruturando a sua crítica, tanto no plano nacional quanto internacional, elaborada
tanto por economistas quanto por sociólogos e educadores. Estas críticas, grosso
modo, dirigiam-se às insuficiências empíricas presentes na fundamentação da teoria e
também às concepções da constituição do sistema escolar e aos limites da
racionalidade e do livre arbítrio na composição do ‘capital pessoal’ dos indivíduos
(CATTANI: 1999).

No Brasil, os trabalhos de Wagner Rossi (“Capitalismo e Educação”) e Bárbara Freitag


(“Escola, Estado e Sociedade”), publicados em 1975 e 1978 respectivamente, e de
Claudio Salm (“Escola e Trabalho”) e Gaudêncio Frigotto (“A produtividade da Escola
Improdutiva”) nos anos 1980 (publicados em 1980 e 1984), são representativos do
levante contra os efeitos políticos da aplicação da TCH, especialmente no que se
refere à subordinação da educação aos objetivos do desenvolvimento econômico e à
manutenção das relações de exploração capitalistas21.

Contra a visão do homem econômico racional, assumido por Schultz, ponderou-se


que, no limite, esta perspectiva coloca sob o indivíduo todo o ônus das suas chances
de vir a ser ‘educado’, de encontrar emprego e de vir a ser um sujeito produtivo na
sociedade. É a crítica que Kagan (2000) enfatiza quando afirma que:

21
Saviani (1984) afirma que a primeira leva de trabalhos foi inspirada na tendência crítico-reprodutivista
que emergia à época. Estes buscavam evidenciar que a subordinação da educação ao desenvolvimento
econômico representaria tornar a educação funcional ao próprio sistema capitalista. Ao colocar a
educação a serviço dos interesses das classes dominantes, “o processo educativo concorria para o
incremento da produção da mais-valia, reforçando, em conseqüência, as relações de exploração”
(SAVIANI: 1984, p. 3). Já a segunda leva de estudos, iniciada nos anos 1980, visava superar os limites da
visão reprodutivista que havia informado os trabalhos anteriores.
48

“A teoria subentende que se o individuo não obtêm sucesso é por sua culpa (i.e.
ele é muito preguiçoso, não é suficientemente inteligente, etc.), por oposição a
um ‘bias’ do sistema. Isto é um tremendo desvio porque para muitos sua
inabilidade para encontrar trabalho se deve a fatores que estão fora de seu
controle (i.e., status sócio-econômico, etnia, gênero, etc.), e não
necessariamente por sua má-vontade ou inabilidade.” (KAGAN: 2000 – tradução
própria)

Kagan acrescenta ainda que os conhecimentos e habilidades obtidos no processo de


educação formal não são necessariamente aqueles que contam para os
empregadores. Para estes, características tais como obediência e responsabilidade,
que se desenvolvem ao longo e através do processo educativo, podem ter mais valor
do que conhecimento e competências específicas (este ponto será abordado em
detalhes nas formulações teóricas condensadas nas teorias da sinalização e da fila,
apresentadas nos próximos tópicos).

Para além da crítica de fundo contra o caráter ideológico da teoria, também foram
formuladas diversas ressalvas aos aspectos metodológicos, aos axiomas e às
conclusões derivadas, bem como às suas possibilidades de generalização.

Schwartzman (1991), por exemplo, enfocando a associação entre investimento


educacional, rentabilidade salarial e produtividade, ressalta que a perspectiva
assumida pelos teóricos do capital humano é controversa ao menos sob dois
aspectos: o primeiro provêm do fato de que as rendas do trabalho podem depender de
outros fatores para além da sua produtividade, como por exemplo a existência ou não
de oligopólios profissionais, a segmentação social e étnica do mercado de trabalho e
outros. Acresce ainda que os rendimentos dos profissionais de nível superior não se
restringem à sua forma salário, sendo muitas vezes representado por retornos de
atividades empresariais “que dependem de forma significativa da existência de capital
individual ou familiar prévio, ou de acesso a determinados círculos sociais exclusivos”
(SCHWARTZMAN: 1991, p. 3). Em segundo lugar, pontua que é problemático passar
do “cálculo da rentabilidade individual dos investimentos em educação a ilações sobre
sua produtividade social e agregada.” (ibid., id.).

Enguita (1990) introduz a dimensão de gênero e de etnia para apontar os limites


explicativos da teoria. Se maiores investimentos em formação realmente significassem
melhor produtividade e maiores ganhos, as mulheres não receberiam salários
menores no mercado, dado que em muitas sociedades elas apresentam níveis
49

educacionais mais elevados do que a população masculina. Como isso não ocorre, a
perspectiva de paralelismo entre nível de educação e nível de ingressos no mercado
de trabalho é falha porque, em ultima instância, o que pesa nessa relação é a classe
social, a etnia e o gênero. Dessa forma, prover igualdade de formação não significa
caminhar rumo à igualdade de chances de ingresso e manutenção no mercado.

Hinchliffe (1987), na mesma linha, destaca o elemento da promessa não cumprida da


teoria. Ao analisar as evoluções do mercado de trabalho americano conclui que,
apesar de ter havido um forte incremento da oferta educacional, persistem, e em
alguns casos tornam-se mais agudos, os problemas relativos à pobreza e
desigualdade de renda; além de haver um contínuo aumento das qualificações que
são exigidas para o ingresso no mercado de trabalho e a constante discriminação de
certos grupos sociais nas suas chances de obter emprego (MORETTO: 2002, p. 36).

Blaug (1992), por sua vez, aponta que a TCH, quando submetida ao teste empírico,
apresenta um conjunto de ‘deficiências’, com destaque especial para: (a) o fato de
que nos estudos empíricos a determinação da renda é muito mais associada à
escolaridade e à experiência de trabalho e menos às habilidades inatas e ao ambiente
familiar - há uma ambigüidade nos resultados no que se refere à medição destes
fatores; e (b) em relação aos cálculos das taxas de retorno privados da educação
(equação de Mincer), os resultados empíricos apresentam contradições: alguns
estudos concluíram que mesmo quando as taxas de retorno privadas eram negativas,
ainda assim as pessoas continuavam demandando educação daquele determinado
tipo. (WALTENBERG: 2002, p. 27)

No que se refere à relação entre educação e mercado de trabalho, Bouchard (1998)


preocupa-se em desmontar algumas das suposições presentes na concepção da
teoria: (1) Contra a afirmativa de que o capital humano é um investimento no futuro,
ele pondera que é impossível prever, de forma acurada, quais serão as necessidades
futuras do mercado de trabalho. (2) No que tange à crença de que mais treinamento
leva ao incremento das habilidades / competências profissionais, argumenta que as
organizações valorizam habilidades específicas que se transformam com o tempo e
que essas não são necessariamente as “melhores” habilidades, mas tão somente as
que se casam com os objetivos da organização em um determinado corte temporal.
(3) Para a suposição de que os trabalhadores precisam incrementar suas habilidades,
50

há a relativização de que em muitas situações, não é o trabalho que estaria se


tornando mais complexo (em alguns casos, com os avanços tecnológicos estaria até
se tornando mais ‘fácil’) e a necessidade de desenvolver as habilidades não decorre
necessariamente de requerimentos do trabalho, mas sim do fato de que os
trabalhadores precisam competir no mercado com pessoas que em muitos casos são
superqualificadas. (4) Finalmente, quanto à suposição de que treinamento aumenta a
empregabilidade e pode compensar as deficiências de habilidades, Bouchard
argumenta que muitos indivíduos não têm acesso a treinamento e assim mesmo tem
acesso aos empregos, enquanto outros, mesmo tendo recebido treinamento, não
conseguem ascender nas organizações; além disso, o que se verifica não é a
deficiência de habilidades, mas sim habilidades inadequadas, o que significa que, por
razões diversas (dentre as quais se destacam a dinâmica do mercado de trabalho, a
discriminação estrutural e a auto-seleção dos empregadores), indivíduos providos de
habilidades ‘adequadas’ não conseguem encontrar um posicionamento no mercado.
(KAGAN: 2000)

Para nossos propósitos, são as críticas mais estruturadas que deram origem às teorias
ditas “crendencialistas”, como a da sinalização ou do filtro (Arrow e Spencer), e a
teoria da fila (Thurow) complementada pelos “grupos de status” ou do credenciamento
(Collins), que possuem maior relevância, na medida em que ressaltam as formas de
uso da educação por parte dos empregadores no momento da contratação.

Uma questão essencial que se coloca aos críticos é explicar por quê o fato estatístico
do aumento nos níveis de estudo da população (e a redução relativa das
desigualdades em educação) não se traduz necessariamente na redução das
desigualdades econômicas. Veremos a seguir, em grandes linhas, em que consiste
estas teorias.

1.3.1. A Teoria da Sinalização ou do Filtro

Nos anos 1970 o pensamento econômico foi atravessado pela influência das teorias
de escolha sob incerteza e da economia da informação, com conseqüências na
economia da educação. Inspirado por estas novas correntes, Kenneth Arrow
51

apresenta, em 197322, um estudo em que contesta a existência de ligações positivas e


imediatas entre educação e produtividade e entre educação e salários, elementos que
caminham juntos na TCH.

Partindo do pressuposto de que a contratação de trabalhadores é essencialmente um


problema de seleção de compradores e vendedores em um mercado caracterizado por
informações imperfeitas, os empregadores desenvolvem estratégias que visam reduzir
ao máximo o seu risco – no caso, contratar indivíduos pouco produtivos. Para isso
lançam mão de dispositivos que os auxiliam em tal empreendimento, sendo o diploma
um destes dispositivos – um ‘filtro’ que atesta que o indivíduo passou com êxito em
certas provas que colocam em evidência a posse de características que são, estas
sim, valorizadas pelos empregadores, tais como a inteligência, a perseverança, a
capacidade de trabalho e a disciplina.

Desta forma, o valor aferido ao diploma não recai sobre o que ele representa em
termos de conhecimentos ou saberes que possam ser imediatamente aplicados ao
sistema produtivo (até porque tais conhecimentos específicos podem, inclusive, ser
adquiridos no curso do trabalho ou em treinamentos na própria empresa), e sim no
quanto que ele informa sobre o potencial futuro dos trabalhadores em relação aos
outros atributos valorizados. Uma vez que tais atributos não são facilmente
observáveis e a sua identificação por meio de testes específicos seria demasiado
custosa em termos de tempo e recursos monetários para os empregadores – que
teriam que proceder caso a caso - estes utilizam formas indiretas de garantir a sua
aquisição. As credenciais escolares seriam o melhor indicador de que o postulante à
vaga deteria tais capacidades.

A função do sistema escolar seria de realizar diversos níveis de ‘filtragem’ (e não de


transmitir conteúdos profissionais específicos) e fornecer informações sobre isso (uma
vez que detêm o monopólio da concessão dos diplomas), para que os empregadores
selecionem os futuros trabalhadores a partir de suas evidências.

22
Kenneth Arrow também foi agraciado com prêmio Nobel em 1972. O artigo em que desenvolve sua
‘teoria do filtro’ foi publicado em 1973: “Higher Education as a Filter” – Jornal of Public Economics, vol. 2
n. 3. Além de Arrow, outro autor que contribuiu para a difusão da teoria do filtro foi Michal Spence, em
estudo publicado no mesmo ano: “Job Market Signaling”. In: Quarterly Jornal of Economics, 87:3, p. 355-
374. Para ele, o benefício social do investimento em educação provém do fato de que haveria uma
eficiência no processo de seleção no mercado de trabalho na medida em que o empregador estaria
melhor informado sobre as possibilidades de produtividade dos futuros empregados, o que acarretaria na
redução das chances de desencontro (IOSCHPE: 2004, p. 54)
52

Ainda segundo esta estrutura argumentativa, pode-se inferir que os “sinais” a serem
interpretados referem-se não apenas à presença ou ausência dos diplomas em si, mas
se desdobram a partir de interpretações das suas modalidades (graduação,
tecnólogos, seqüenciais, pós lato e stricto, etc. – tomando como exemplo o ensino
superior no caso brasileiro) como também no tipo de instituição em que o profissional
foi formado. Assim, graduar-se em uma escola ou universidade tida como ‘de primeira
linha’ indicaria aos futuros empregadores um conjunto de outros atributos que não
possuem, a principio, relação direta com o exercício da profissão, incluindo os que são
provenientes de situações familiares, de rede de relações e de classe (ver depoimento
descrito no quadro a seguir).

O Executivo Brasileiro

“O contratante não aceita fracasso; a empresa é elitista e prioriza o candidato cuja estratégia
de carreira foi desenvolvida desde o berço familiar, em colégios que não aceitam repetência,
têm ensino acurado e aferido internacionalmente e atraem alunos com capacidade de absorção
de informações e elevado grau de disciplina para o trabalho de pesquisa.
(...) O diretor jurídico de um banco multinacional, com vaga para advogado especializado em
contratos financeiros, negou-se a receber currículo de candidatos que não fossem oriundos de
uma das cinco faculdades listadas por ele previamente.
(...) Ainda que no mercado existam profissionais excelentes, que vieram de famílias humildes,
sem a possibilidade de freqüentar faculdades conceituadas (não só pelo elevado custo da sua
preparação prévia ou da própria faculdade, mas devido ao horário diurno que exige tempo
integral para os estudos), para o contratante, não interessa. Sua resposta e decisão são frias e
categóricas: - As faculdades conceituadas fazem a seleção natural, forjam o carisma,
estimulam o exercício da negociação e dão livre trânsito de relacionamento a quem passa por
elas, e é deste talento que a empresa precisa.”

Adissi, Mirian Sion. Executivo Brasileiro – como os bastidores do poder decidem contratações e carreiras. São
Paulo: Makron Books; 1997. Págs. 129, 130, 131.

Acresce ainda que a expansão dos sistemas educativos, para os teóricos da


sinalização, não acarretaria em outra coisa que não no incremento das exigências em
termos de credenciais escolares, uma vez que o maior número de profissionais
titulados levaria à perda do elemento ‘sinalizador’. Este tenderia a ser buscado a partir
de níveis de escolaridade cada vez mais elevados ou em outras fontes (domínio de
idiomas, experiência internacional, etc.).

Dessa forma, no que se refere às possibilidades de mobilidade, os indivíduos


deveriam estudar cada vez mais para manterem-se na mesma posição relativa na
53

hierarquia dos diplomas e o esforço de cada um para obter maior êxito reduziria as
possibilidades de sucesso do restante. Portanto, um dos efeitos da ‘democratização’
da educação seria tornar os diplomas cada vez menos rentáveis23, jogando o nível da
disputa sempre mais ‘para cima’ (concepção também desenvolvida por Collins e
Boudon em sua análise dos efeitos perversos).

Por fim, cabe lembrar que ainda que os mentores da teoria da sinalização apresentam
divergências em relação à TCH no que diz respeito ao papel das credenciais escolares
na determinação dos salários, eles compartilham do pressuposto de que são as
capacidades ou competências que os trabalhadores oferecem ao mercado (sejam
estas adscritas ou adquiridas) que determinam a sua produtividade.

1.3.2. A Teoria da Fila (ou a concorrência pelos postos)

Uma outra vertente de crítica à TCH, focando especialmente a relação entre as


credenciais escolares e o processo de seleção no mercado de trabalho, foi elaborada
por Lester Thurow24 em meados da década de 1970, originando a que ficou conhecida
como ‘teoria da fila’.

Apesar de chegar a resultados parecidos com os que são apontados por Arrow,
Spencer e outros, Thurow parte de um pressuposto totalmente distinto. Para ele, a
produtividade é uma característica dos postos de trabalho e não dos trabalhadores
que se candidatam aos mesmos. Conseqüentemente as remunerações são
dependentes do tipo de emprego ofertado e não das qualificações de quem o ocupa (a
remuneração diz respeito ao posto e não à pessoa). Os empregos nos setores de
‘ponta’, que lidam com modernas tecnologias são os mais produtivos, e portanto os
mais atraentes. Nestes, os trabalhadores fazem ‘fila’ esperando a sua colocação.

Thurow sustenta ainda que as destrezas cognitivas que são necessárias para tornar o
trabalhador compatível com a produtividade exigida pelo posto são aprendidas ‘in
loco’, em processos de treinamento formais ou informais. Portanto, o que conta para

23
Goldthorpe (2002) acrescenta que a expansão e diversificação dos sistemas escolares e das formas de
credenciais inserem ‘ruídos’ nos dispositivos que auxiliam as escolhas que são feitas pelos empregadores
nos processos seletivos. Na medida em que o diploma se torna cada vez mais acessível, ele perde o seu
poder de ‘sinalização’ e novos dispositivos vão sendo criados para substituir esta perda.
24
Para detalhes ver: Thurow, L. Generating Inequality – Mechanisms of Distributions in the U.S.
Economy. Basic Books, New York: 1975; e Thurow, L; Lucas, R. The American Distribution of income: a
structural problem. Washington. USA (1972).
54

os empregadores na hora da seleção ou contratação, é a identificação daqueles


indivíduos que potencialmente apresentariam menor custo de aprendizagem (ou de
treinamento) (RIOS: 2003, p. 4).

O fuzil de ouro

“As pessoas acham que é o currículo que decide uma contratação, mas ele não passa de uma
referência. Afinal, o que compramos é o futuro do profissional, não seu passado. Se vou montar
um time de futebol hoje, não vou contratar o Pelé. É melhor levar o Viola, pois as chances de
que ele faça gols são maiores. O que conta num profissional é a distância de visão, quanto ele
é capaz de se imaginar à frente, quanto investe para chegar lá. É essa a importância do MBA,
o tão prestigiado curso de especialização para executivos. Não pelo diploma em si, mas porque
é um indício de que o sujeito tem distância de visão, é capaz de ter um prejuízo momentâneo
para apostar no lucro lá adiante.”

Trecho da entrevista com o consultor Robert Wong; “52 anos, é um dos mais destacados caçadores de talentos no
Brasil” - Revista Veja, 24 de janeiro de 2001 – páginas amarelas

Os trabalhadores concorrem entre si disputando as oportunidades de emprego e,


nesta disputa, os recursos que possuem em termos de qualificação e atributos
(formação, idade, gênero, experiência) configuram o seu ‘portfólio’ e definem as suas
chances de ingresso no mercado. Nesse momento as credenciais escolares são o
‘sinalizador’ que informam aos contratantes sobre os antecedentes e as qualidades de
cada indivíduo quanto à sua capacidade de aquisição das competências especificas
necessárias ao bom desempenho da função. Em outras palavras, a educação serve
para elevar a probabilidade de ocupar um posto, uma vez que informa aos
empregadores “sobre qualidades mais gerais do indivíduo, em particular, qualidades
de adaptabilidade e educabilidade: portanto, promessa de que o indivíduo poderá ser
formado com menores custos”. (FORQUIN: 1995, p. 59)

O critério fundamental que orienta a lógica dos empregadores na estruturação da ‘fila’


é portanto a racionalização sobre as possibilidades e os custos de ‘treinamento’ dos
candidatos aos empregos. O primeiro lugar na fila será dedicado àqueles que gerem
menor dispêndio com a sua formação.

Em um mercado de trabalho onde a concorrência se dá em torno dos postos, a chance


de ingresso de cada indivíduo irá depender tanto da sua posição relativa na ‘fila’ (os
primeiros colocados encontram maiores chances que os últimos) quanto da
quantidade de oferta de vagas. O equilíbrio no mercado de trabalho se dá a partir de
55

características da contratação e não dos salários (indivíduos com idênticas


características pessoais não aferem, necessariamente, a mesma renda): quando o
setor produtivo demandar menos trabalhadores, ele poderá aumentar as qualificações
que são exigidas pelos candidatos; quando ele necessitar de mais trabalhadores,
poderá reduzir suas exigências. Assim, a composição da fila e o lugar relativo ocupado
por cada um, portanto, não é absoluto. Como conseqüência, os indivíduos podem ser
levados a investir em educação dentro de uma estratégia defensiva – garantir os seus
rendimentos. Porem, o efeito perverso da estratégia individual é que, na medida em
que se incrementa oferta de trabalhadores mais escolarizados, mais os empregadores
podem elevar o nível de suas exigências pagando os mesmos salários.

Piore e Doeringer (1985) acrescentam que, nesta perspectiva, o aumento no nível de


qualificação exigido pelos empregadores não significa necessariamente uma
transformação substantiva no conteúdo dos postos de trabalho (que estariam se
tornando mais complexos); ao contrário, pode refletir tão somente o resultado do
aumento geral no nível de formação da sociedade25.

A questão que resta em aberto, seja na teoria da sinalização ou da fila, consiste em


explicar o que gera as preferências dos empregadores por determinados atributos
(que o sistema educativo ‘atestaria’) e como estes são variáveis no tempo. Ao se
inserir ainda a noção dos mercados de trabalho segmentados ou duais, tem-se que a
‘porta de entrada’ não é definida da mesma forma. Para os trabalhadores ‘centrais’,
atitudes como autonomia, iniciativa, capacidade de coordenação e comunicação, entre
outras, podem nos dias atuais, serem centrais. Já para os trabalhadores ‘periféricos’,

25
Piore e Doeringer afirmam que os empresários distribuem os postos de trabalho existentes segundo
suas preferências em relação à contratação. Os trabalhadores mais solicitados são os primeiros da fila, e
os menos solicitados não encontram posição no mercado de trabalho central, restando a estes os postos
menos desejáveis e os setores marginais da economia, ou ainda a situação de desemprego: “Por
definição, os desfavorecidos que são os que mostram menor nível de empregabilidade ou tenham
realizado menores investimentos em capital humano, se encontram situados no final da fila de trabalho e
tem acesso limitado às oportunidades de emprego mais solicitadas.” (PIORE & DOERINGER: 1985, p. 4)
Em uma perspectiva de análise do mercado de trabalho tida como estrutural, onde o mesmo não poderia
ser analisado como um todo homogêneo mas sim como segmentos, Piore o concebe dentro de uma
dualidade estabelecida em torno de um setor primário e um setor secundário. Neste desenho, os
benefícios da educação são apropriados diferenciadamente pelos indivíduos conforme eles se situem um
ou em outro pólo. O setor primário se caracteriza, principalmente, por conter relações de trabalho mais
estáveis, melhores salários e condições de trabalho, perspectivas de carreira e baixa rotatividade. O setor
secundário apresenta características opostas. Os aportes das credenciais escolares nas chances de
obtenção das vagas são maiores no setor primário, onde “existe um mercado interno e onde as condições
de trabalho facilitam ao maior desenvolvimento das qualificações e da formação no trabalho”. (DICKENS
& LANG: 1985; apud SOLÉ et al.: 2001 p. 251) No setor secundário, a produtividade permaneceria como
atributo dos salários.
56

disciplina, respeito, pontualidade ou assiduidade ainda seriam os elementos que


contam.

O maior concurso do país - Espera-se 1,5 milhão de candidatos para as


provas de seleção de vagas do Banco do Brasil

O Banco do Brasil abre as inscrições para o maior concurso já realizado no país. Calcula-se
que 1,5 milhão de pessoas preencham ficha para disputar uma das 9.000 vagas que o banco
está oferecendo. (...) São 170 candidatos por vaga, quatro vezes mais do que o vestibular para
medicina na Universidade de São Paulo, um dos mais disputados do país. O candidato
interessado em participar da megaprova deve ter no mínimo 18 anos, possuir 2º grau completo,
o chamado ensino médio, e conhecimento de inglês e informática. O salário inicial é de 700
reais por mês e os selecionados irão trabalhar como escriturários. Ou seja, vão ser atendentes
do banco. Isso significa dar expediente numa agência e, entre outras atividades, vender
seguros, providenciar a emissão de cartões de crédito ou encaminhar os clientes a uma
conversa mais demorada com um gerente.

(...) Apesar de o edital exigir ensino médio dos candidatos, o departamento de recursos
humanos do banco acredita que chegue a 60% o total de vagas preenchidas com pessoas de
nível universitário ou até mesmo com pós-graduação.

Há várias explicações para isso. A mais imediata e evidente é o desemprego. (...) Outra
explicação para a invasão das vagas de ensino médio é que a educação está melhorando no
Brasil. Nos anos 50, metade da população acima de 15 anos não sabia ler nem escrever.
Aplicada à população atual, é como se 54 milhões de brasileiros fossem analfabetos. Naquele
tempo, um diploma de ensino superior poderia levar alguém diretamente para a diretoria da
firma. Hoje, com a taxa de analfabetismo em 14%, o mercado de trabalho sofreu uma alteração
imediata. As vagas não mudaram de padrão, porém os candidatos melhoraram muito. Os
supermercados Wal-Mart e a rede de lanchonetes McDonald's exigem que alguns funcionários
estejam cursando ou já tenham concluído o 2º grau. "Pode-se argumentar que um empregado
que vá fritar batatas não precise de diploma, mas o fato é que ele não está vendendo batatas,
está vendendo responsabilidade. E, para isso, é preciso muita educação", diz o economista
Claudio de Moura Castro. Na Europa e nos Estados Unidos é comum encontrar um garçom
bacharel ou uma faxineira com diploma de 2º grau. Em muitos casos, estão apenas fazendo
um bico para pagar os estudos, em outros, foi a melhor colocação que conseguiram. No Brasil,
o fenômeno começa a se tornar visível agora e dá a todos uma grande lição. A educação
formal não é mais suficiente para garantir o futuro de ninguém. Não basta ter diploma, nem
saber mexer no computador, nem mesmo falar inglês.
In: Pinheiro, Daniela. Revista Veja , 11 de 8 de 1999. Obtido em: http://veja.abril.com.br/110899/p_040.html

Como se percebe, as duas grandes correntes econômicas críticas à teoria do capital


humano apresentadas conferem aos conhecimentos específicos transmitidos e
adquiridos por meio da educação uma capacidade residual, para não dizer quase nula,
na determinação da produtividade e nos retornos que possam ser obtidos a partir
desta. Operando como ‘sinal’ ou como passaporte para a ocupação do lugar na fila,
pouco acrescenta de valor ao sistema produtivo.
57

1.3.3. Além da produtividade – a reprodução social na abordagem credencialista

Uma outra interpretação sobre a falta de relação direta entre produtividade e


educação, bem como dos efeitos restritivos que a generalização da educação pode
aportar na transformação da estrutura social, é apresentada por Randall Collins em
seu livro intitulado “A Sociedade Credencialista”26. Em uma perspectiva tida como neo-
weberiana, ele sustenta que o que explica a relação positiva entre educação,
empregos e status não é o uso que no mercado de trabalho se faz dos conhecimentos
técnicos específicos que são adquiridos na escola (como apregoa a perspectiva
funcional), mas sim o fato de que a educação transmite uma cultura particular (sistema
de valores, estilística, padrões de comportamento, etc.) própria ao grupo social que,
em cada momento particular, controla o próprio sistema educativo. A dominância deste
grupo consiste, entre outras coisas, do fato de conseguir impor sua própria cultura ao
restante da sociedade como se esta fosse universal e ‘legítima’. Decorre daí que os
indivíduos que conseguem obter sucesso no seu percurso escolar são os mesmos
que, de alguma forma, demonstram afinidade com determinados códigos culturais que
são certificados pelo sistema escolar.

Por outro lado, no mercado de trabalho, os empregadores utilizam o diploma como


‘sinal’ para a seleção dos futuros trabalhadores. Para Collins, o empregador, “ao
privilegiar os critérios educacionais, está sinalizando que reconhece menos
importância às competências técnicas do trabalhador do que à sua identidade cultural”
(FORQUIN: 1995, p. 61). Em outras palavras, na ótica do contratante, o que conta são
os atributos culturais que se fazem acompanhar dos diplomas e não os conhecimentos
efetivamente apreendidos. Há assim uma correspondência entre a estratificação que
se desenvolve no sistema escolar e a estratificação social, uma vez que o acesso aos
empregos depende das credenciais que são outorgadas por um sistema que
previamente seleciona (e estratifica) os alunos.

Paralelamente, os grupos de status dominante possuem a capacidade de cercear a


entrada dos demais no mercado de trabalho e com isso garantem o valor de seus
próprios títulos e monopólio das posições que ocupam. E o fazem seja por meio do

26
Collins, Randall. The Credential Society. New York: Academic Press, 1979
58

estabelecimento de elevados critérios de ingresso aos postos, seja pela ‘limitação’, via
credenciais escolares, do acesso a atividades que anteriormente eram ‘livres’ (o
trabalho político de ‘fechamento’ de uma profissão). A resultante é que os grupos
menos privilegiados, ao se verem excluídos do jogo, passam a exigir mais educação
para que possam pleitear o seu reingresso e, conseqüentemente, ascender aos
grupos de status superior. Estabelece-se assim uma ‘corrida por diplomas’; e quanto
mais tais necessidades são atendidas, mais se chega no fenômeno conhecido como
‘inflação escolar’, que significa a abundância de credenciais que deixam de ser
sinalizadores dos elementos culturais aos quais anteriormente estavam conectados.
Para manter sua posição, os grupos privilegiados tudo farão para se distinguir dos
demais, elevando incessantemente as credenciais de ingresso, e com isso resistindo
às invasões e mantendo seu ‘direito de monopólio meritocrático’ das posições. Em
suma, o que gera a abundância de credenciais educativas é exatamente esta disputa
pelo monopólio em torno das posições sociais superiores (e pela sua restrição), e não
como se poderia supor, a complexificação do trabalho ou as transformações
tecnológicas per si.

Finalmente cabe registrar que Collins avança na visão que Thurow estabelece em
relação às credenciais escolares na definição do lugar que cada indivíduo pode vir a
ocupar na fila. Enquanto para Thurow a educação define o lugar na fila, transmutado
em estimativas de custos de formação, para Collins a relação positiva entre educação
e códigos culturais dominantes não se restringe ao momento de ingresso no mercado,
mas atravessa toda a vida profissional do sujeito, definindo suas chances de
promoção e de carreira a longo prazo.

1.4. Outros desafios às perspectivas funcionalistas – o reprodutivismo e


os efeitos perversos da expansão educacional

A perspectiva de que a expansão educacional por si acarretaria redução das


desigualdades de classe, seja para o ingresso no sistema educativo ou no mundo do
trabalho, também é contestada por outros autores, como Bowles e Gintis, Bourdieu e
Passeron e Boudon, apenas para citar alguns dos mais expressivos no campo da
pesquisa e teoria sociológica.
59

Bowles e Gintis e Bourdieu e Passeron elaboram explicações que vieram a ser


classificadas como ‘reprodutivistas’ em relação à função da educação nas sociedades
capitalistas modernas27. De forma bastante resumida pode-se afirmar que seu
argumento situa-se na assertiva de que o sistema escolar reproduz a hierarquia social
vigente na sociedade por meio da premiação das diferenças em capital cultural que os
estudantes aportam dos seus ambientes familiares. A isso acresce o fato de que a
escola, no exercício da sua função de socialização, se incumbe de treinar pessoas
oriundas de classes sociais distintas na absorção de valores também diferenciados, e
aos filhos dos trabalhadores os valores que são passados seriam compatíveis com
sua posição de classe subordinada (SILVA: 2003, p. 119). Já Boudon estabelece um
diálogo mais íntimo e crítico com a teoria da escolha racional apropriada pelos
funcionalistas, enfatizando os efeitos perversos que as ações racionais individuais
podem trazer para o coletivo.

1.4.1. Samuel Bowles e Herbert Gintis

Bowles e Gintis publicam, em 1976, um livro intitulado “Schooling in Capitalist


America”, onde refutam o ideal de que a educação pública seria o grande equalizador
das diferenças de classes nos Estados Unidos. Em uma análise afinada com a teoria
marxista, entendem que a educação (organizada no sistema escolar) está vinculada
indissoluvelmente à base econômica da sociedade e é uma das várias instituições
que, ao agir no plano da superestrutura, contribui para a manutenção da ordem
econômica e social existente.

Sustentam ainda que a expansão dos sistemas educativos consiste no principal


dispositivo pelo qual o sistema capitalista reproduz o antagonismo de classe,
realizando a seleção e treinamento dos indivíduos para a ocupação de posições
profissionais que refletem suas posições de origem (ou as posições sociais de suas

27
Estamos cientes de que esta rotulagem é por demais reducionista e não faz jus à teoria desenvolvida
por Bourdieu e que de certa forma inaugura um novo modo de pensar a educação, especialmente por se
dedicar ao seu estudo no nível micro – na abertura da caixa preta que representa os processos que
ocorrem no interior das escolas (e que posteriormente vieram a ser campo de trabalho de autores
afinados com o interacionismo simbólico). Catani et alli (2001) chamam a atenção para o fato de que a
apropriação da obra de Bourdieu no Brasil em um primeiro momento se deu de forma ‘incidental’, com
suas idéias quase sempre associadas a outros autores (como Baudelot e Bowles e Gintis) e com um
modo classificatório tido como ‘reprodutivista’. Se aqui estamos incorrendo no tipo de ‘desvio’ apontado,
deve-se especialmente por restrições – e concessões – ao objeto que está sendo tratado, qual seja, a
emergência das teorias funcionalistas que sancionam o mérito associado às credenciais escolares e suas
críticas.
60

famílias). O acesso de cada indivíduo aos conhecimentos disponibilizados pela escola


depende, sobretudo, das condições sócio-econômicas e educacionais de seus pais.

O que a escola, seus currículos e seu modo de funcionamento faz é produzir ‘bons
trabalhadores’ que serão aproveitados diferenciadamente por um sistema ocupacional
estratificado. Sua ação contribui para manter (e não para reduzir) as desigualdades de
classe em benefício da produção capitalista. O sistema escolar atua em
correspondência com as relações capitalistas de produção. Em suas palavras:

"O sistema educativo ajuda a integrar os jovens ao sistema econômico através


da correspondência estrutural entre suas relações e as relações de produção. A
estrutura das relações sociais na educação não somente acostuma o estudante
à disciplina no local de trabalho, mas também desenvolve os tipos de
comportamento pessoal, formas de auto-apresentação, imagens de si mesmo e
identificações de classe social que são ingredientes cruciais para a adequação
ao posto. Especificamente, as relações sociais da educação – as relações entre
administradores e professores, professores e estudantes, estudantes e
estudantes e estudantes e seu trabalho – são uma réplica da divisão hierárquica
do trabalho. As relações hierárquicas estão refletidas nas linhas de autoridade
verticais que vão dos administradores aos professores e estudantes.” (BOWLES
& GINTIS: 1976, p.131 – tradução própria)

Assim, o sucesso sócio-econômico dos indivíduos depende da formação e seleção de


traços de personalidade que o sistema econômico considera como desejáveis à sua
perpetuação. A escola realiza esta ‘domesticação’ na medida em que reproduz as
relações hierárquicas e prepara os jovens para a divisão de trabalho. Esta por sua vez,
para que seja considerada como legítima (e não imposta à força), necessita de uma
ideologia que lhe dê suporte. A ideologia meritocrática escolar cumpre este papel,
levando “a crer que é a desigualdade dos talentos ou de sucesso entre os indivíduos
aos quais foram dadas oportunidades iguais ‘no início’ que tornam necessária a
hierarquização das tarefas e a desigualdade dos estatutos”. (BOWLES & GINTIS:
1972; apud FORQUIN: 1995, p. 62)

1.4.2. Pierre Bourdieu e Jean Claude Passeron

Já a teoria da reprodução desenvolvida por Bourdieu e Passeron, apesar das


aparentes semelhanças com as conclusões de Bowles e Gintis, parte de pressupostos
distintos, afastando-se da perspectiva marxista especialmente porque concede ao
sistema de ensino uma autonomia relativa frente ao sistema produtivo. A lógica
61

específica do primeiro permite que este se organize visando a sua própria reprodução,
resultando, muitas vezes, em uma defasagem dos seus ‘produtos’ face às
‘necessidades’ do sistema econômico28 (BORDIEU & BOLTANSKI: 1975, p. 131). Ao
mesmo tempo em que esta ‘independência’ se coloca como ‘ideologicamente
necessária’ para que se sustente a ilusão meritocrática de equidade e universalidade,
ela não obstante contribui para a reprodução do capital cultural e com ele da estrutura
do espaço social (BOURDIEU: 1998(1989) p.125).

Sua maior preocupação é em explicar a persistência das desigualdades educacionais


(já indicadas por pesquisas empíricas realizadas à época) que iam contra a predição
do paradigma funcionalista (e que eram tratadas no âmbito do mesmo como
‘anomalias’), trazendo para dentro de seu constructo a relação entre desempenho
escolar e origem social.

A pedra angular de sua teoria consiste exatamente em alçar o capital cultural (seja em
seu estado incorporado, objetivado ou institucionalizado), para o centro do processo
de reprodução da estrutura social (e portanto da geração de desigualdade), ao mesmo
tempo em que define a família (transmissão doméstica) ou o habitus de classe, como
sendo canais privilegiados de transmissão deste capital.

28
É com base no conceito de autonomia relativa que podemos compreender, por exemplo, a construção
de hierarquias que se estabelecem ‘tacitamente’ entre as instituições universitárias e que valem para o
meio acadêmico, mas que não são necessariamente igualmente valorizadas pelo ‘setor produtivo’. Assim,
universidades que desenvolvem pesquisas e que contenham programas tidos como de ‘excelência’ em
seus respectivos campos, podem ter seus ‘produtos’ (egressos) menos valorizados ou até mesmo
estigmatizados em certos segmentos do mercado de trabalho, por serem ‘teóricos’ demais, ou
‘acadêmicos’ demais. Entretanto, permanece uma árdua disputa entre as instituições e seus atores para
conquistar posições superiores no campo específico (ou preservá-las) e ao mesmo tempo obter com isso
vantagens em outros campos (econômico, político, etc.) – visando inclusive a conversão de capitais. Daí
esta independência não ser total. As estruturas e as regras que estabelecem as hierarquias e que
definem quem ou o que está em jogo são constantemente objeto de disputa. Em determinados momentos
ou contextos históricos específicos cujo cenário estabelecido não depende necessariamente da ação
direta dos atores interessados, eles podem encontrar brechas para inverter tais hierarquias. Um exemplo
é que quando socialmente a ‘responsabilidade social’ das organizações começa a ganhar dimensões
amplas e a ser um elemento de valorização das ações institucionais, universidades ou faculdades que
dispõem de menor capital no campo educacional específico (cursos menos prestigiados, baixa produção
acadêmica, etc.) podem adotar a estratégia de concentrar esforços no desenvolvimento de atividades de
extensão (atendimento a comunidades, população carente, etc.) compensando de um lado as suas
deficiências e ao mesmo tempo pleiteando uma inversão ou uma nova forma de estabelecimento de
hierarquias onde seus capitais próprios sejam valorizados e convertidos em retornos úteis (mais alunos,
mais verbas, etc.). O mesmo raciocínio pode ser aplicado aos cursos ‘voltados ao mercado’ (seqüenciais
por exemplo) – desprestigiados no meio acadêmico por não possibilitarem a ação educacional de forma
ampla ou por conterem uma perspectiva de curta duração e de aplicação imediata de técnicas, podem
interessar a segmentos específicos do mercado pelos mesmos motivos.
62

Para esses autores, o que os funcionalistas negligenciam é que as desigualdades de


percurso e de êxito escolar não podem ser explicadas exclusivamente em termos de
diferenças naturais (dom, aptidão ou talento29) ou ainda de desigualdades econômicas
(e que eliminam paulatinamente os menos favorecidos). É preciso incluir a ação do
privilégio cultural nesta explicação; e neste sentido, faz-se necessário conceber as
instituições escolares como locais por excelência de transmissão da cultura erudita
(modo de expressão, estilística, etc.) e de valorização de tipo de ‘savoir-faire’ próprio,
que é compartilhado por uma elite (mas não reconhecido como tal – o que permite
falar de ‘violência simbólica’).

A escola, ao tratar como “‘iguais de direito’, indivíduos ‘desiguais de fato’, isto é, que
foram preparados de forma desigual pela respectiva cultura familiar, para assimilar a
‘mensagem pedagógica’” (FORQUIN: 1995, p. 63) atua, por intermédio de seus
mecanismos de seleção, para a reprodução das desigualdades sociais30. Mas isso se
dá de forma sutil, e é esta ‘indiferença face às diferenças’ que possibilita a
‘legitimação’ do dom ou da aptidão como sendo ‘natural’ e não como produto social.

Ao mesmo tempo não fica claro que os percursos escolares (desigualdades diante da
seleção) e as escolhas que vão sendo feitas pelos indivíduos (desigualdades de
seleção) refletem a incorporação deste ‘dom predestinado’ e com isso contribuem para
que se estabeleça uma predisposição frente ao futuro diferenciada, que se associa a
determinados ethos de classe. Desse modo, os menos favorecidos tenderiam a
‘investir menos’ na educação ou em formas específicas menos valorizadas desta
(escolha das profissões, das instituições, etc.) porque antecipam o seu porvir em
conformidade com a expectativa do presente (o futuro possível dentre os futuros que

29
Bourdieu critica duramente os teóricos funcionalistas que vêem o dom ou a aptidão como atributos
‘naturais’ - que seriam desenvolvidos e/ou aprimorados pela escola de forma neutra - e também o
resultado do trabalho escolar (o diploma) e sua correspondência na conquista de posições sociais ou
profissionais. Afirma ele: a “suas interrogações (dos economistas) sobre a relação entre a ‘aptidão’
(ability) para os estudos e o investimento nos estudos provam que eles ignoram que a ‘aptidão’ ou o ‘dom’
são também produtos de um investimento em tempo e em capital cultural (...) O rendimento escolar da
ação escolar depende do capital cultural previamente investido pela família e o rendimento econômico e
social do certificado escolar depende do capital social – também herdado – que pode ser colocado a seu
serviço”. (BOURDIEU: 1998 (1979) p. 73 e 74)
30
Nogueira e Nogueira (2002) afirmam que a grande contribuição de Bourdieu para a sociologia da
educação consistiu em virar de ponta cabeça as idéias correntes à época. Rompendo com o paradigma
funcionalista, Bourdieu se utiliza dos conceitos positivos que circulavam à época dentro de uma nova
conotação, como ocultadores ideológicos do processo de reprodução social: “onde se via igualdade de
oportunidades, meritocracia, justiça social, Bourdieu passa a ver reprodução e legitimação das
desigualdades sociais. A educação, na teoria de Bourdieu, perde o papel que lhe fora atribuído de
instância transformadora e democratizadora das sociedades e passa a ser vista como uma das principais
instituições por meio da qual se mantêm e se legitimam os privilégios sociais.” (NOGUEIRA &
NOGUEIRA: 2002, p. 17)
63

se apresentam no curto prazo) e contribuiriam com isso para a sua própria reprodução
de desvantagem. Dado que o futuro de longo prazo como projeto individual, implica na
ampliação da antecipação dos ‘futuros possíveis’, estes só são factíveis quando as
condições para tanto estejam asseguradas: “o esforço para dominar o futuro não pode
ser realmente empreendido senão quando as condições indispensáveis para que seja
assegurado um mínimo de probabilidades de sucesso sejam efetivamente oferecidas.”
(BOURDIEU: 1979, p. 107) E isso também é atravessado por um determinado
patamar de capital cultural desigualmente distribuído.

Daí depreende-se que a simples expansão da cobertura do sistema escolar não dá


conta da redução das desigualdades, ao contrário, pode trazer uma maior frustração
para os jovens que, mesmo tendo acesso a níveis educacionais mais elevados, não
conseguem convertê-los em melhores posições no espaço social.

Acresce ainda que a expansão da cobertura do sistema escolar desencadeia um


intenso processo de concorrência pela posse do título, o qual por sua vez tem como
resultado obrigar

“as frações de classe, cuja reprodução era assegurada principal ou


exclusivamente pela escola, a intensificar seus investimentos para manter a
raridade relativa de seus diplomas e, correlativamente, sua posição na estrutura
de classes; nesse caso, o diploma, e o sistema escolar que o confere, tornam-se
assim um dos objetos privilegiados de uma concorrência entre classes que
engendra um crescimento geral e contínuo da demanda por educação e uma
inflação de títulos escolares” (BOURDIEU: 1998(1978), p. 148)

Assim, em uma estrutura ocupacional que não cria na mesma proporção novas vagas
para os detentores de diplomas, estes passam a ocupar postos que até então eram
abertos aos não diplomados, os quais, por sua vez, vêem suas chances de ingresso
no mercado de trabalho mais reduzidas:

“Com efeito, a desvalorização do diploma acompanha-se da extensão


progressiva do monopólio dos detentores de títulos escolares sobre posições até
aí abertas a não diplomados, o que tem como efeito limitar a desvalorização dos
diplomas limitando a concorrência, mas ao preço de uma restrição de
oportunidades de carreira ofertadas aos não diplomados” (Ibidem, p. 151).

A relação entre o diploma e o cargo, especialmente no tocante a muitas das ‘novas


profissões’ torna-se cada vez mais dependente do ‘capital cultural’ acumulado, onde a
64

“competência técnica conta menos do que a familiaridade com a cultura da classe


dominante e o domínio de signos e emblemas de distinção e do gosto” (Ibidem, p.
158), ao mesmo tempo em que as chances de ingresso no mercado de trabalho
tornam-se mais e mais dependentes do ‘capital social’ acumulado31.

1.4.3. Raymond Boudon

A questão da permanência das desigualdades de renda e da constância relativa das


taxas de mobilidade social ao longo do tempo, a despeito da redução – ainda que
lenta – das desigualdades educacionais, é a questão que intriga Boudon no início dos
anos 1970. Este aparente paradoxo, não explicado pelas correntes funcionalistas, se
coloca no ponto de partida no desenvolvimento de sua teoria, apresentada em um livro
intitulado “A Desigualdade de Oportunidades”.

Fugindo das interpretações simplistas que relacionam credenciais escolares,


mobilidade social e renda, Boudon faz questão de frisar que entre estas variáveis não
há uma ligação mecânica. A desigualdade social, em termos de possibilidades de
ocupação de determinadas posições sociais se relaciona com a desigualdade
educacional (e manutenção da herança social) de modo muito mais complexo. E o
mesmo vale para a desigualdade de renda - se assim não fosse, não haveria
dissonância entre os destinos alcançados no sistema escolar, especialmente em seu
nível superior, e as ocupações e retornos que são obtidos.

Buscando exemplificar seu raciocínio, Boudon sugere que imaginemos uma sociedade
onde a quantidade de vagas disponíveis para as ocupações hierarquicamente
superiores fosse reduzida mas, ao mesmo tempo, o acesso ao sistema de ensino
fosse muito amplo. Neste caso, haveria um bom número de estudantes que não
poderia pleitear o ingresso àquelas ocupações, um conjunto formado tanto pelos que
são menos favorecidos quanto pelos mais abastados. Inversamente, pode haver
situação em que o número de vagas hierarquicamente disponíveis seja maior do que o
total de pessoas formadas pelo sistema educativo. Neste caso, mesmo havendo
desigualdade de oportunidades no que consiste ao acesso ao ensino, seria legítimo
supor que uma proporção razoável de pessoas oriundas das classes menos
favorecidas venha a preencher as ocupações hierarquicamente superiores. Assim, as

31
O conceito de capital social formulado por Bourdieu encontra-se descrito no capítulo 5 desta tese.
65

supostas ‘necessidades’ do sistema sócio-econômico podem produzir respostas muito


distintas em termos de chances de mobilidade e que vão além dos efeitos de ‘herança’
que comumente marcam as desigualdades educacionais32.

Podemos inferir, a partir daí, que a substancialização do mérito, no que diz respeito a
sua associação às credenciais escolares, é contingente, e sua maior ou menor
incidência ou a ‘chance de sucesso’ de cada sujeito dependerá de correlação de
múltiplos fatores, incluindo o desenvolvimento econômico (intensidade e natureza dos
postos de trabalho criados), fatores demográficos, etc.

Para dar conta das relações complexas entre mobilidade, desigualdades e educação,
Boudon desenvolve uma perspectiva analítica que ficou conhecida como “abordagem
sistêmica” de interação de fatores, na qual relaciona: (a) os aspectos relativos à
estrutura social no que se refere à hierarquia sócio-profissional (tratadas como
variáveis exógenas), incluindo a concorrência entre os indivíduos para ocupá-los e
suas chances relativas segundo critérios de origem social e nível escolar; e (b) o
processo individual de tomada de decisão (espaços decisórios) relativo aos
investimentos em escolaridade, que leva em conta a posição que cada um ocupa na
estrutura social.

Das diversas conclusões a que chega, algumas merecem destaque:

1. A redução das desigualdades perante o ensino não implica na redução de


desigualdades sociais: “a estrutura das oportunidades ligada a cada nível
escolar em dado período depende da estrutura social e da distribuição dos
indivíduos em função do nível escolar” (BOUDON: 1981, p. 257), como
decorrência, “se a estrutura social (distribuição das posições sociais) se
desloca menos rapidamente que a escolar (distribuição dos indivíduos em
função do nível escolar), modifica-se no tempo a estrutura das oportunidades
ligadas a cada nível escolar” (ibidem, id.). Ao contrário, como demonstram
32
Becker, de forma similar, chama atenção para o fato de que a possibilidade de mobilidade também é
determinada pela existência (ou não) de espaços a serem ocupados na estrutura social. E que portanto a
relação educação – mobilidade é uma relação datada, presente em nossa sociedade contemporânea
ocidental atual (com seus valores e instituições determinados) e não tem a mesma relação para outras
sociedades como por exemplo as coloniais, onde não há posições disponíveis e serem ocupadas nos
estratos mais altos ou quando estas não são acessíveis pelo mérito (mas sim por herança ou outras
transferências): “se não há posições disponíveis nos estratos mais altos, se não há formas de ganhar a
vida com prestígio adequado, a escolarização não produz mobilidade, mas somente frustra o desejo: ela
não tem efeito sobre o sistema de status” (BECKER: 1977, p.38).
66

alguns estudos comparativos internacionais, podem-se ter casos em que maior


escolarização venha acompanhada de mobilidade descendente (em termos de
renda e de status).

2. O que determina a demanda por educação são, sobretudo, fatores endógenos


(concorrência que os indivíduos estabelecem para não ver suas esperanças
sociais de ascensão reduzidas), ainda que fatores exógenos também
encontrem seu peso explicativo.

3. As escolhas individuais racionais que resultam no aumento geral da demanda


por ensino, quando agregadas, pode se revelar contra produtiva, gerando os
‘efeitos perversos’ onde os investimentos precisam ser cada vez mais altos e
os benefícios (retornos) não são garantidos: “o aumento geral da demanda de
ensino resulta em que o indivíduo deve pagar, de um período ao outro, um
preço, mensurado em tempo de escolaridade, mais elevado por um bem
(esperanças sociais) de valor constante” (ibidem, p. 258). No entanto, é ainda
uma escolha racional, porque o acesso às posições e ao status, nas
sociedades industriais, passa necessariamente pela etapa “meritocrática”,
ainda que variáveis de herança mantenham seu peso.

4. Mas em termos de bem coletivo, o aumento ou democratização do ensino,


ainda que a um custo cada vez maior para cada individuo singular, traz
benefícios para o conjunto da sociedade (como, por exemplo, a melhoria das
condições de vida, e até mesmo as bases para o crescimento econômico).
67

1.5. Educação e renda – alguns elementos do caso brasileiro

Tomando por base as diversas teorias críticas à abordagem funcionalista e do capital


humano em relação ao uso das credenciais escolares nas chances de obtenção de
melhores posições sociais, temos como resultante a constatação de que o diploma
não garante empregos, nem tampouco assegura melhores rendimentos ou impede a
mobilidade descendente, especialmente em contextos societais nos quais se encontra
uma abundância de força de trabalho ‘qualificada’ ou ‘diplomada’.

Entretanto, isso não significa que os benefícios sociais da ‘democratização’ da


educação possam ser mitigados. Como já ressaltado por Boudon, a educação não
serve apenas à vida econômica, inclusive guardando face a esta certa autonomia, mas
ela também se apresenta como essencial ao exercício da vida social, na participação
política, e ao exercício da cidadania, preparando os indivíduos para enfrentar os
desafios do mundo contemporâneo, dentro e fora do mercado de trabalho.

Mas é fato que a nova dinâmica de acumulação capitalista admite, como nos mostra
Paiva (1998), a composição de ‘mixes’ que combinam “elevada escolaridade,
sofisticação e complexificação da formação com baixos salários e status declinante”
(PAIVA: 1988, p.11). A resultante é que a inclusão no mercado formal de trabalho
passa a depender de critérios adicionais ao mérito, ou seja, “ela regride ao nível do
capital social (e político) dos envolvidos e sua posição na escala social, indicando uma
reorganização complexa porém restritiva das possibilidades de mobilidade social
vertical” (ibidem, id.).

Exemplo disso pode ser encontrado nos estudos realizados por Pochmann (2003)
sobre os impactos do por ele chamado ‘ciclo de financeirização’ no mercado de
trabalho, com conseqüências em termos de mobilidade descendente a qual atinge,
sobretudo, a classe média e os portadores de diplomas de ensino superior (ver quadro
a seguir).
68

Diploma não garante emprego, revela estudo

“Um em cada quatro brasileiros que se formaram no ensino superior de 1992 a 2002 não está
empregado. No país onde ter diploma de nível superior já foi garantia de emprego fácil, um
estudo da Secretaria do Desenvolvimento, Trabalho e Solidariedade do município de São
Paulo mostra que passar pelo estreito funil do vestibular já não é mais a maior dificuldade do
jovem.

Dados do MEC (Ministério da Educação) mostram que, na década de 90, esse funil foi alargado
com a expansão do ensino superior, principalmente privado, no país. No entanto, o crescimento
da economia no período não foi suficiente para gerar emprego para os milhares de recém-
formados que chegaram ao mercado.

Para chegar a essa conclusão, o secretário municipal do Trabalho de São Paulo, Marcio
Pochmann, pesquisou, a partir da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) do
IBGE, a situação dos 3,3 milhões de brasileiros que se formaram no ensino superior de 1992 a
2002.

Desse total, 2,5 milhões estão empregados (74%), mas 123 mil (4%) estavam procurando
emprego em 2002, e 738 mil (22%) estavam fora do mercado de trabalho (não haviam
procurado emprego no período da pesquisa, mas não estavam ocupados).

Outra tabulação feita no estudo mostra que uma parcela significativa dos brasileiros com
diploma trabalha em atividades abaixo de sua qualificação (8% dos ocupados com nível
superior). São pessoas que, apesar do diploma, acabaram empregadas como açougueiros e
empregadores na indústria alimentícia (19,1%); droguistas, floristas, galinheiros, lenheiros,
peixeiros e sorveteiros (17,8%); ou atendentes (12,6%).”

Folha de S.Paulo – 11/10/2004

Se os empregadores deixam de considerar as credenciais escolares como dispositivo


por excelência de indicação da produtividade futura dos trabalhadores, seja por conta
da massificação da educação e/ou diversificação de suas credenciais (que estariam
inserindo ruídos no processo de tomada de decisão), o que explicaria a permanência e
até mesmo a consolidação da crença social no poder da educação para a mobilidade
social e o incremento da sua demanda? Se as taxas de retorno dos investimentos
educativos são cada vez mais incertas para os sujeitos individuais, como justificar, nos
parâmetros racionais, o montante de investimentos monetários e psicológicos?

No que se refere ao caso brasileiro, Barros et alli (2002) insistem em apontar a


educação como sendo o principal determinante da desigualdade de renda no Brasil,
mais do que as diferenças de raça, de região, de setor, de gênero ou de experiência
acumulada33. Ainda que também seja relevante para a explicação dos diferenciais de

33
Para estes autores, caso houvesse a possibilidade de eliminação da heterogeneidade educacional
existente no Brasil, obter-se-ia uma redução de 40% na desigualdade salarial, “mostrando que a
69

renda o fator de segmentação do mercado (seja entre setores produtivos ou entre


seus segmentos formais e informais), estes permanecem inferiores ao que se projeta
em termos de diferenças imputadas à educação. Seriam as defasagens, absoluta e
relativa, da escolaridade da população que explicariam, “de modo significativo, a
intensa desigualdade de renda do país. Especificamente no que se refere ao mercado
de trabalho, observamos que a heterogeneidade da escolaridade entre os
trabalhadores e o valor atribuído aos anos de escolaridade adicionais representam os
principais determinantes da desigualdade salarial.” (BARROS et al.: 2002, p. 1)

Silva (2002), de forma similar, utilizando os dados do IBGE, demonstra que um


indivíduo com 15 anos de estudo (em tese o tempo que uma pessoa levaria para
completar o ciclo de estudos que inclui o ensino superior) chega a ganhar quase 4
vezes mais do que um individuo que tem apenas o ensino fundamental (8 anos de
estudos) e mais que o dobro daquele que possui o ensino médio (12 anos de estudo).

Figura 1
Figura - Razões de Médias de Rendimentos por Escolaridae - Base: Escolaridade zero

12

10

8
Razão

1995
6
1999

0
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15
Anos de Escolaridade
Fonte: Silva,, Nelson do Valle. Gráfico elaborado com base nos dados dos Censos do IBGE e apresentados em palestra sobre
desigualdade social no IFCS/UFRJ em dezembro de 2002

Schwartzman (2001), considerando os diferenciais de rendimento para os portadores


de diploma de ensino superior, acrescenta que no Brasil este montante chega a ser
mais expressivo do que o verificado nos países desenvolvidos, e que entre nós, a
conclusão de um curso superior ainda está fortemente associada a uma grande
mobilidade ascendente para as populações de baixa renda. Cita como exemplo o fato

educação corresponde por 2/3 de todas as fontes que somos capazes de identificar para explicar a
desigualdade observada”. (BARROS et al.: 2002, p. 3)
70

de que metade dos pais de estudantes de nível superior teve no máximo nove anos de
educação. Além disso, afirma que “a contribuição proporcional das pessoas à renda
familiar cresce com sua educação, indo de 36% para os que têm educação básica e
média para 52% dos que têm nível superior”. (SCHWARTZMAN: 2001, p. 14)

“Há uma percepção crescente das famílias, principalmente as de classe média, do valor
inestimável de uma boa formação. A educação é um fator determinante de mobilidade e
ascensão social. Você vê pessoas que topam pagar 3.000 reais ao ano por um curso não
porque sejam ricas, mas porque acreditam em melhores oportunidades.”

(Revista Exame. O Meganegócio da Educação. Ano 36, n. 7, 3 de abril de 2002. pág. 37)

Enquete realizada pela Secretaria do Desenvolvimento, Trabalho e Solidariedade do


Estado de São Paulo junto a trabalhadores recém empregados em 2004 (POCHMAN:
2004) revela que para estes, cursar uma faculdade ocupa o terceiro lugar entre o
‘sonho de consumo no curto prazo’, atrás apenas de comprar um automóvel e comprar
uma casa ou apartamento e à frente de pagar dívidas acumuladas, comprar móveis ou
eletrodomésticos (POCHMAN, op. cit., p. 8), demonstrando a permanência da
disposição de investir em educação. É a esta crença que McNulty (1980) se refere
quando afirma que “indivíduos e famílias sacrificam o consumo presente em favor dos
retornos à educação, seja devido aos valores tradicionais e vantagens a eles
associados, seja devido àquelas vantagens de ‘filtro’ ou de ‘efeito diploma’ que ela
pode conferir” (MCNULTY: 1980 apud. MORETTO: 2002, p. 38).

Mas a demanda por educação, para além do nível obrigatório, também se relaciona
com outras variáveis não necessariamente econômicas mas que são relevantes para
os indivíduos e seus familiares (variáveis psicológicas, sociais, culturais, familiares,
etc.). Derouet (2002), por exemplo, privilegia as transformações na concepção da
juventude e no lugar do jovem na sociedade para justificar a permanência da demanda
por educação. Tomando como exemplo o caso francês, ele pondera que, se nos anos
1960 os jovens encontravam facilmente lugar no mundo do trabalho e os que
prosseguiam os seus estudos constituíam uma exceção, já nos anos 1980 o cenário
se revela totalmente distinto: “já não há lugar para um jovem, a não ser na escola.
Aqueles que não a freqüentavam aparecem, invariavelmente, quase como marginais”
(DEROUET: 2002, p. 7). Mas isso não se dá sem um custo social, que é a própria
71

mudança no sentido que se tinha da escola, que se descola das esperanças de


mobilidade social. Acrescenta que na medida em que a proporção de detentores de
diplomas se torna maior do que os cargos superiores disponíveis, a promessa de
mobilidade se torna cada vez mais remota, e o risco velado é de que a “o aumento da
oferta perca seu sentido, deixando a engrenagem funcionando no vácuo”. (ibidem, p.
6)34.

Finalmente Moretto (2002), focando o ensino superior, vai ainda mais longe e levanta
a hipótese de que o crescente número de pessoas interessadas em fazer um curso
superior, sobretudo nos países desenvolvidos, pode ser também (ou até melhor)
explicado por motivos culturais antes que econômicos. “Podemos até arriscar uma
previsão de que a cultura atual em relação ao ensino superior torna-o mais um bem de
consumo do que um investimento” (MORETTO: 2002, p.54), afirma ela. Após uma
determinada saturação no nível de atendimento às demandas educacionais básicas
que tem valor no mercado, o que estaria movendo os indivíduos para a busca de
maiores níveis educacionais antes de ser compreendida a partir do seu caráter de
investimento, com expectativa de retorno no médio / longo prazo, deve considerar a
vertente de que a continuidade dos investimentos em educação abarca também a
construção de uma ‘imagem de si’.

Estar constantemente em processo de atualização, renovação e busca de novas


credenciais é ser “moderno”, e a educação torna-se também um produto de consumo
para aqueles que podem se dar ao luxo35. Assim, a freqüência a um determinado
curso, em uma determinada universidade, não deixa de ser um elemento de formação
de identidade pelo consumo de um bem, antes que uma escolha racionalmente
justificada visando retornos futuros36.

34
Para ele, o discurso técnofuncional que argumenta que os trabalhos atuais demandam maior conteúdo
cognitivo também não é muito mobilizador, na medida em que se pede aos jovens que façam mais
sacrifícios para conseguir as mesmas posições que as gerações anteriores haviam obtido com menos
esforço - diagnóstico já efetuado por Boudon.
35
A observação das estratégias de concorrência entre várias instituições privadas de ensino superior
deixa evidente que o foco da ‘diferenciação’ permite que se desenvolva vários elementos de ‘sedução’
que ultrapassam substancialmente as atividades educacionais ou a aquisição de saberes stricto-sensu.
Na luta pela captação de alunos, muitas universidades apresentam-se como ‘clubes’ com amplos espaços
de lazer, esportes e vida cultural. Nos programas de marketing encontra-se desde motes que associam o
esforço universitário com a obtenção de melhores espaços no mercado de trabalho (como o ‘por aqui se
chega lá’; ‘o caminho para o sucesso’; ‘a melhor porta para o futuro’; ‘vá além da sala de aula’; ‘estudar dá
trabalho’) até os que apontam para a vida acadêmica como um momento de desfrute juvenil (como o
‘venha passar conosco os melhores dias de suas vidas’).
36
Em uma entrevista que realizei junto a estudantes universitários de uma determinada instituição privada
de ensino superior, obtive a seguinte resposta à questão ‘o que determinou a sua escolha de fazer
72

1.6. Voltando ao início – o mérito relativizado na contribuição de


Goldthorpe

Como visto até aqui, a definição das hierarquias sociais (o que vale mais em termos
de status, prestígio e remuneração) envolve diferentes redes e sub-redes de
significado, as quais fazem usos distintos das credenciais escolares. O que em um
momento, sob determinadas circunstâncias é tido como desvalorizado, pode, em um
momento subseqüente, sofrer uma forte inversão em função de novas variáveis que
são incorporadas ao contexto. A título de exemplo, podemos apontar para
determinados processos de valorização de carreiras tipicamente ‘femininas’ que, por
conta do aumento das taxas de desemprego, começam a ser ocupadas por homens, e
com isso passam por processos de revalorização social (muitas vezes sofrendo
pequenas alterações no conteúdo das tarefas ou na sua nomenclatura)37. O mesmo
raciocínio pode ser estendido para carreiras mais ou menos valorizadas tendo como
base critérios que remetem à idade / geração ou à raça. Inúmeros estudos produzidos
nas áreas de sociologia e economia que evidenciam as desigualdades de
remuneração em um mesmo cargo/função segundo a raça e/ou o gênero de seu
ocupante corroboram a afirmativa de que não é neutro o processo de construção das
hierarquias que ordenam a vida social – evidente no âmbito da seleção / remuneração
no trabalho, mas também atuante na seleção escolar entre outros.

Diante destas constatações, torna-se difícil assegurar que a meritocracia ou a prática


de reconhecer, classificar e valorizar as pessoas tendo por base estritamente o
desempenho relativo de cada um (eliminando tudo aquilo que aponte para atributos
adquiridos com base em herança, relações pessoais ou consangüíneas, privilégios
corporativos, poder econômico ou político, pertencimento a classe, etc.) está se
tornando o critério dominante para a seleção daqueles que estarão no ‘topo’ das
hierarquias sociais.

vestibular para esta universidade?’: “Vim pra cá (sic.) porque todos os meus amigos vieram. É a minha
turma desde que eu era pequena. Todos estão aqui, então eu não pensei em fazer vestibular para
nenhum outro lugar. Foi minha primeira e única opção”.
37
Bourdieu aponta também o movimento inverso no que tange à desvalorização dos diplomas: “o
crescimento muito rápido evidenciado pela escolarização das meninas participou da desvalorização dos
títulos escolares.” (BOURDIEU: 1998(1978) p. 150)
73

Para Goldthorpe (1997) esta é uma questão fundamental que se coloca às sociedades
contemporâneas, e ele a formula da seguinte maneira: Em que medida seria correto
afirmar que a meritocracia está se tornando central nos processos seletivos (educação
e trabalho) – em substituição aos atributos de classe, origem, etc. – que vigoram nas
sociedades pós industriais?

Como já foi exaustivamente apresentado nos tópicos anteriores deste estudo, este
questionamento é resultante de um diálogo com a corrente funcionalista - que atribui
ao mérito ou ao ‘êxito’ a legitimidade para a ordenação social - e em especial com
Daniel Bell, interlocutor privilegiado de Goldthorpe, para quem a lógica intrínseca de
funcionamento da sociedade pós-industrial seria meritocrática uma vez que as funções
mais relevantes demandam habilidades técnicas e educação superior.

Tomando o mérito a partir de uma perspectiva objetivista, Goldthorpe procura


identificar se a hipótese IMS (increasing merit selection38), que postula que as relações
entre a classe de origem (O) dos indivíduos, a classe de destino (D) e as conquistas
educacionais (E) estariam se transformando ao longo do tempo, encontra sustentação
empírica. Para tanto passa em revista vários estudos produzidos ao longo do século
XX (tais como: Blau e Duncan, 1967; Featherman e Hauser, 1978; Halsey, 1977;
Jonsson, 1992; Heath et all, 1992; Ganzeboom et all, 1992) que tiveram como objeto a
avaliação da relevância e do peso da educação versus da origem (classe e familiar) na
configuração do destino dos indivíduos.

Em suas conclusões afirma que os resultados produzidos por tais estudos são pouco
claros e que, portanto, não é possível nem afirmar nem negar nenhuma hipótese em
torno da grande questão que consiste em saber se nossas sociedades estariam se
tornando mais meritocráticas. Acrescenta que, não raro, tais estudos também
apresentam falhas de interpretação quando enfatizam o crescimento da importância
da escolaridade na definição do destino dos indivíduos, e que na verdade isso poderia
estar encobrindo outras práticas, como já enunciadas nas teorias da fila, da
sinalização e do credencialismo. Além disso, outros erros de interpretação que
segundo ele podem ser depreendidos de tais estudos consistem em:

38
Conceito definido por Jonsson, em 1992 e apresentado em “Towards the Merit-Selective Society? –
Swedish Institute for Social Research, Univ. of Stockholm. (GOLDTHORPE: 1997, p. 665).
74

(1) Associar o crescimento da ênfase na qualificação formal nos processos


seletivos a uma maior igualdade de oportunidades na sociedade. O que vale
dizer que se as carreiras de maior sucesso dependem de maiores
qualificações, as famílias de maiores posses irão investir mais recursos em
educação para defenderem sua parcela de mercado e manter o monopólio dos
cargos mais cobiçados. E que portanto não estaria havendo, necessariamente,
uma redução das desigualdades de classe no acesso aos cargos
hierarquicamente superiores.

(2) Deduzir, com base no crescimento da educação, que na sociedade do


conhecimento as habilidades cognitivas sejam mais essenciais do que outras
habilidades (como, por exemplo, as que se dirigem aos aspectos
comunicacionais, emotivos e outros).

(3) Crer que a educação seja o único ou o meio por excelência capaz de fazer
aflorar o talento e, com isso, permitir a conquista do mérito.

No entanto, se tais resultados podem produzir dúvidas e até mesmo contradições, a


explicação para tanto residiria na dificuldade de determinar como o mérito deve ser
entendido nas sociedades empíricas para além de sua indexação segundo o nível
educacional. Nesse ponto, Goldthorpe retoma seu argumento central – a volatilidade
do conceito – acrescentando as dificuldades que se enfrenta quando se tenta utilizá-lo
como orientador ou balizador das pesquisas empíricas. A consistência do mérito, diz
ele, não pode ser definida ‘a priori’, senão caso a caso, situacionalmente. Isso implica
em considerar que a substância do mérito poderá ser formada a partir de um leque
múltiplo de variáveis, que simultaneamente são escolhidas e também criadas e
recriadas pelos atores sociais aos quais recai a responsabilidade de arbitrar em
relação a quem tem e quem não tem ‘valor’ para o setor produtivo, quem tem ou quem
não tem as ditas competências que ‘casam’ com o cargo ou com as vagas que estão
disponíveis. Segundo suas palavras:

“Nas sociedades industriais ou pós-industriais que possuem economia de


mercado e política pluralística, o conceito de mérito, mesmo que largamente
aplicado, não pode ser especificado de maneira consistente e objetiva, mas, ao
contrário, precisa ser definido em grande parte ‘situacionalmente’ e de maneira
que necessariamente envolva um julgamento subjetivo.” (GOLDTHORPE: 1997,
p. 670 – tradução própria)
75

A subjetividade, a ação seletiva e as margens de negociação possíveis, assumem


assim, na configuração do mérito, um papel determinante. Eymard-Duvernay e
Marchal (1997) radicalizam esta proposição quando afirmam, em relação às
competências dos trabalhadores, que elas não existem anteriormente ao julgamento
daqueles que possuem o poder de fazê-lo. É no processo interacional que se coloca
entre os atores que julgam (envolvendo suas próprias competências, experiência,
etc.), incluindo os dispositivos de informação que utilizam para apoiar suas escolhas, a
situação em que o julgamento se realiza (com maiores ou menores constrições legais,
etc.) e os sujeitos que são julgados, que o mérito se ‘revela’. Assim, é o julgamento
que contribui para a formação da competência: a competência é por sua vez, uma
construção que resulta de uma convenção, de um acordo que se firma sobre a
mesma.

Dessa forma, torna-se mais fácil aceitar as colocações de Jenks (apud FORQUIN:
1995, p. 66) de que em sociedades submersas em rápidos e imprevisíveis processos
de criação de diferenças, as desigualdades não são principalmente transmitidas ou
reproduzidas, mas incessantemente criadas e modificadas. É o que pode ser
observado nas reportagens destinadas aos jovens ou aos buscadores de emprego que
povoam as mídias, especializadas ou não, bem como nos conselhos dos
‘especialistas’ em empregabilidade que colocam, lado à lado, como recursos na
disputa por uma vaga no mercado de trabalho, a clássica formação educacional, mas
também o domínio de idiomas, e, eis a novidade, a experiência internacional e até
mesmo a ação voluntária.
76

Faça um currículo eficiente

“Experiência Internacional – citar algum tipo de experiência adquirida no exterior, ou mesmo


cursos que aparentemente não tenham relação com a vaga, porém que possam justificar uma
melhora de performance em alguma área, é de extremo bom gosto. Pode ser algo como: um
processo de intercâmbio cultural, mesmo que ocorrido há muitos anos, uma experiência de
trabalho no exterior, etc. Tais vivências, além de reforçar o domínio do idioma descrito no
currículo, demonstram outras virtudes do profissional como: conhecimento de outras culturas,
maior visão do mercado em nível global, adaptabilidade, etc.”.

(...) “Informações adicionais – informações pessoais como, por exemplo, a participação em


trabalhos voluntários, projetos comunitários, ações filantrópicas, entre outras, devem ser
relacionadas e podem destacá-lo como um diferencial para o mercado. Estes tipos de
experiências são bem vistos nos dias de hoje, pois além do fato de as empresas estarem cada
vez mais engajadas em processos sociais, dão alguns indícios do perfil e dos valores do
candidato em questão.”

(In: Scistowski, Luiz. Como Conquistar e Manter seu Emprego. Rio de Janeiro: Palavra e Imagem,
2002. Pág. 125 e 126.)

Resumo do capítulo

Abrimos este capítulo afirmando que os debates em torno do mérito e da meritocracia


se colocam como bastante atuais na sociedade brasileira.

Recorremos a Lívia Barbosa para compreender como, embora haja um acordo social
em torno da dimensão ideológica da meritocracia, o mesmo não se pode dizer das
suas possibilidades concretas de aplicação.

Fizemos uma rápida retomada de Weber e de sua ‘aristocracia dos diplomas’ para
explicar a centralidade da educação na conformação do mérito no mundo industrial.
Em seguida, desenvolvemos este conceito recorrendo às teorias funcionalistas,
especialmente as que estiveram presentes na produção norte-americana desde
Parsons. Passamos por Davis e Moore e seu tecnofuncionalismo, para quem a
estratificação, conseqüência da divisão do trabalho, necessita de pessoas com
formações diferenciadas para assumirem as várias funções sociais. Começamos aqui
a inserir a dimensão da estratificação como conceito paralelo nos estudos que
abordam o mérito. Afirmamos que esta visão ‘funcional’ ganhou novas colorações com
77

o desenvolvimento da teoria do capital humano, que coloca a educação no centro do


processo de desenvolvimento das nações.

Recuperamos as principais idéias dos ‘pais fundadores’ da TCH – Mincer, Schultz e


Becker – e, na seqüência, apresentamos as críticas mais estruturadas às suas
premissas, que deram origem às teorias da ‘sinalização ou filtro’ (Arrow), da ‘fila’
(Thurow) e do ‘credencialismo’ (Collins), e que afirmam que os diplomas revelam aos
empregadores outros atributos que não a posse de conhecimentos técnicos
específicos que podem se converter diretamente em maior produtividade. Ainda para
complementar tais teorias críticas, abordamos outros autores centrais que se
dedicaram à análise dos processos de desigualdade no acesso à educação e na
relação entre esta e as posições sociais.

Assim, passamos rapidamente em revista o ‘reprodutivismo’ nas versões de Bowles e


Gintis e de Bourdieu e Passeron. Incluímos Boudon e sua análise dos efeitos
perversos da expansão da escolarização para demonstrar, mais uma vez, que não há
uma relação imediata entre aumento dos níveis educacionais e redução das
desigualdades de renda, ou ainda das chances de ocupar postos hierarquicamente
superiores.

Para contrabalançar as teorias críticas, apresentamos alguns dados do contexto


brasileiro, onde a associação entre nível educacional e desigualdade de renda revela-
se forte, o que não nos permite eliminar alguns princípios da TCH, embora a relação
entre educação, renda, status e mobilidade ascendente seja cada vez menos
assegurada.

Finalmente retomamos a questão inicial que implica nas dificuldades de se definir de


forma objetiva o mérito e com isso afirmar se estaríamos ou não caminhando rumo a
uma sociedade mais meritocrática. Para tanto lançamos mão de Goldthorpe para
relativizar o conceito de mérito como equivalente das credenciais escolares, inserindo
uma grande volatilidade ao mesmo. Além disso, há que se levar em conta que a
análise da substancia do mérito deve ser buscada situacionalmente, o que coloca no
centro da questão da produção das desigualdades no acesso às vagas que são
criadas no mercado de trabalho a natureza do processo decisório dos empregadores
78

ou daqueles que agem em seu nome (incluindo os dispositivos que utilizam para
tanto).

No próximo capítulo iremos examinar como os empregadores têm definido o mérito


usando como base de investigação os anúncios de emprego. Iremos apresentar
algumas pesquisas que utilizaram esta fonte, tanto no Brasil quanto no exterior, e as
principais conclusões a que chegaram. Daremos destaque às comparações e aos
pesos relativos dos atributos ‘adquiridos’ face aos atributos ‘adscritos’. Antes porém
apresentaremos as possibilidades e limitações de se trabalhar com anúncios de
emprego como material empírico para a captura do ‘sentido’ do mérito.
79

Capítulo 2 – O que conta como mérito – a vocalização da


demanda dos empregadores a partir dos anúncios de emprego

O mérito é um princípio que hierarquiza os indivíduos na estrutura social e sua


substância varia ao longo do tempo. Nas sociedades democráticas ocidentais, as
credenciais escolares fazem a vez desta substância e, na medida em que, ao menos
em tese, sejam acessíveis a todos segundo o seu esforço e empenho, legitimam-se
como um princípio também justo para a hierarquização. Mas quando o diploma se
torna realmente um bem cada vez mais acessível, ele perde a sua capacidade de
diferenciação e os sujeitos tornam-se mais homogêneos.

De fato, o peso da educação sobre as possibilidades de mobilidade, e portanto sobre a


classe de destino dos indivíduos – o lugar que podem vir a ocupar na hierarquia social
- parece estar perdendo fôlego ao longo do tempo, especialmente quando se
considera as economias avançadas. É a essa conclusão que Goldthorpe (2003) chega
quando examina a sociedade britânica a partir de dois coortes de indivíduos: o
primeiro com pessoas nascidas em 1958 e o segundo com pessoas nascidas em
1970. Para o primeiro grupo, os efeitos da educação são mais evidentes do que para o
segundo na determinação de suas chances de mobilidade.

Isso estaria ocorrendo, entre outras coisas, devido ao fato de que, em um contexto
social de incremento da distribuição das credenciais escolares, elas estariam
perdendo o seu efeito de ‘sinalização’ para os empregadores. O resultado é que esses
precisariam buscar outras fontes de informação para ocupar o lugar que até então
cabia quase que exclusivamente ao diploma como identificador das competências ou
habilidades que são desejadas e com isso permitir a redução dos riscos envolvidos no
processo de contratação. A ‘inflação’ dos diplomas teria levado à progressiva perda de
confiança nos mesmos, seja como ‘sinal’ ou como ‘credencial’, e novas formas de
definição do mérito estariam sendo construídas ou re-atualizadas.

Ocorre que a importância que os empregadores conferem às qualificações formais é


muito variável, seja em função da natureza do posto de trabalho, do ramo ou setor de
atividade da empresa, da sua composição de capital ou outras (ver quadro a seguir).
Para muitas ocupações, as habilidades cognitivas ou técnicas são menos relevantes
80

do que as características físicas ou comunicacionais; ou pelo menos estariam


concorrendo com estas em condições bem próximas.

O diploma e o ingresso no mercado de trabalho

Louart (2001), não descarta o papel do diploma escolar na configuração das chances de
ingresso no mercado de trabalho. Ao contrário, afirma que diante de um cenário econômico e
produtivo crescentemente atravessado por incertezas e complexidades, os empregadores no
momento da contratação se apóiam nos títulos escolares como suporte para o seu processo de
tomada de decisão. E o fazem seja de forma direta, quando se verifica uma compatibilidade
entre os conhecimentos, atitudes e saberes que são obtidos no curso e que são efetivamente
julgados como relevantes para o desempenho do cargo, ou de forma indireta, como indicador
de outras competências mínimas que são buscadas. Nesse caso, a posse do título escolar é
usada como forma de pré-requisito, e sua ausência é muito mais um fator de rejeição para
certos candidatos do que um fator de escolha. Mas, ainda que os empregadores considerem
outras competências ou atributos como sendo mais significativas do que os saberes escolares,
a seleção do candidato dificilmente se dará a partir da supressão da ‘prova’ da escolaridade:

“Frente a um possuidor de diploma, os recrutadores esperam encontrar um conjunto de


qualidades (saberes, saber fazer, atitudes) que lhe foram exigidos ou inculcados durante
sua formação. Quanto mais estas qualidades forem prováveis e quanto mais eles as
julguem como necessárias para o emprego, mais o diploma pode desempenhar um papel
importante.

Em caso contrário, a ênfase é colocada na busca de informações complementares. Se o


diploma é percebido como oferecendo bases mínimas de competências, ele será
utilizado como uma prova de pré-requisito. Além disso, se estará atento às
características de experiência ou de personalidade que correspondem ao potencial
visado.

Mesmo se os decisores se aventuram a dizer que é a experiência ou a personalidade


dos candidatos que lhes interessa, e não o resto, isso não quer dizer que eles rejeitam os
diplomas, que eles não prestam atenção ou que eles não os colocam como uma
condição de recrutamento. Eles o vêem mais como um fator de rejeição (a não
existência levando a descartar uma candidatura) do que como um fator de escolha
(assumindo a preferência frente a outros critérios).” (LOUART: 2001, p. 9 e 10 – grifos do
autor; tradução própria)

No entanto, de forma geral pode-se afirmar que o ‘valor do diploma’ varia bastante segundo o
setor de atividade e segundo a cultura da empresa ou do meio em que ela está inserida. O uso
que é feito do certificado, por sua vez, pode cobrir um espectro que vai desde um indicativo da
posse de conhecimentos específicos e como classificador de capacidades adquiridas ou
potenciais, até como um fator de apoio ou um critério essencial para o recrutamento, o qual
também varia segundo a natureza da empresa conforme descrito no quadro a seguir.

Variedade de usos do diploma


Fator de complemento Condição mínima Critério essencial
Garantia de Setor privado (empregos Setor privado (empregos Empregos regulamentados
aprendizagem e não especializados) especializados)
classificação dos Função pública (empregos
especializados)
indivíduos
Classificação dos Setor privado (vagas de Função pública (empregos
indivíduos alto potencial) não especializados)
Fonte: Louart, Pierre "Comportement des employeurs face à l`accroissement d`éducation", Rapport final de la partie WP3 du projet
international EDEX, (Education Expansion and Labour Market, France, Allemagne, Espagne, Italie, U-K, USA), avril, 2001. Pág. 65.
Tradução própria.
81

Assim, o relacionamento entre classe de origem (O), classe de destino (D) e


aquisições escolares (E), ao invés de se comportar tal como previa a teoria da
meritocracia baseada na educação39, estaria sendo atravessado pelo ‘efeito interação’;
que aponta que a força da associação entre quaisquer dois componentes do modelo
irá variar segundo o nível atingido pelo terceiro (ver gráfico a seguir). Em outras
palavras, quanto maior o nível de educação obtido, menor será a associação entre
classe de origem e destino (A); da mesma forma, quanto maior (ou em mais
vantagem) a classe de origem, menor será a associação entre educação e classe de
destino (B). (GOLDTHORPE: 2003, p. 238).

Figura 2
Efeitos da interação no relacionamento O-E-D

Educational attainment
(E)

Class origin Class destination


(O) (D)

Fonte: Goldthorpe, J. The myth of education-based meritocracy. New Economy, v. 10, decembre 2003 pág. 238

Com isso, Goldthorpe visa demonstrar que as aquisições educacionais são mais
relevantes para a conformação da situação de destino entre aqueles que não dispõem
de outros tipos de capital (econômico ou cultural) que possam ser mobilizados.
Inversamente, o peso das credenciais educacionais tende a ser menor para os que
dispõem desta malha de proteção. Em suas palavras:

39
Segundo propõe a teoria da meritocracia baseada na educação, a relação entre a classe de origem do
indivíduo (O) e suas conquistas educacionais (E), seria cada vez mais reduzida ao longo do tempo (linha
pontilhada); por outro lado, a relação ente as realização educacionais e sua classe destino (D) seria
fortalecida: “social selection, in employment, as in education, has to be based increasingly on individual
achievement and, most importantly, on formal qualifications.” (GOLDTHORPE: 2003, p. 234)
82

“Crianças com ‘backgrounds’ menos vantajosos, fora a educação, contam com


poucas coisas que possam ajudá-las a ‘ir adiante ou prosperar’. Mas crianças
com backgrounds mais vantajosos, mesmo tendo resultados educacionais
apenas modestos, ainda contam com outros recursos disponíveis que podem
ajudá-las a manter sua posição de classe – incluindo recursos econômicos, mas
também recursos sócio-culturais que resultam da sua socialização e esses (...)
podem ter muito mais valor atualmente, na economia baseada em serviços, do
que tinham antes.” (GOLDTHORPE: 2003, p. 238 – tradução própria)

O que quer dizer, sumariamente, que o rendimento do diploma vai variar, bem como
os efeitos de sua desvalorização, segundo o montante de outros capitais que o
indivíduo disponha40. A possibilidade de reconversão de capital econômico em capital
educacional ou cultural, este último cada vez mais útil em certos segmentos do
mercado de trabalho, protege o seu portador da perda de posições sociais. O ‘valor’ do
diploma é um equivalente do ‘valor’ do seu portador, afirma Bourdieu:

“Fora do mercado propriamente escolar, o diploma vale o que do ponto de vista


econômico e social vale o seu detentor, sendo que o rendimento do capital
escolar depende do capital econômico e social que possa ser consagrado a sua
valorização.” (BOURDIEU: 1998(1978) pág. 152)

Lazuech (2000) ilustra esta hipótese com base em suas pesquisas e afirma que na
disputa por um posto de trabalho de alto nível ou de ‘cadre’41, candidatos com iguais
bagagens educacionais encontram chances distintas de inserção conforme
demonstrem a posse de certas qualidades comportamentais que, na sua maior parte,
não provêm de uma aprendizagem escolar mas que são, isso sim, oriundas de um
modo de transmissão familiar. Tal é o caso de atributos como ‘liderança’,

40
Nogueira (2002) em pesquisa voltada à identificação das estratégias de escolarização das famílias que
compõem as elites mineiras, conclui que a relação dessas com o sistema de ensino é peculiar, uma vez
que esses visam obter, da freqüência aos estabelecimentos escolares, algo bastante diferenciado da
excelência acadêmica ou de credenciais escolares específicas. Em suas entrevistas, a autora identifica
que o que orienta as escolhas na seleção dos estabelecimentos de ensino, mormente privados, não é
apenas ‘remediar’ ou ‘atenuar’ as conseqüências negativas de fracassos escolares, mas trata-se também,
e com maior ênfase, de ampliar o seu capital social por meio da expansão de suas redes de sociabilidade,
as quais poderão ser utilizadas nas trajetórias empresariais futuras dos rebentos e suas famílias. Dessa
forma, estes atores tendem a dar mais valor a instituições que apresentem uma dimensão moral do
processo pedagógico (‘abertura moderada’) e que sejam freqüentadas pelos pares: “esses pais optam por
instituições que imaginam oferecer um ambiente social seleto, homogêneo e consoante com os padrões
da família (“continuação da casa”).” (NOGUEIRA: 2002, p. 54).
41
Não existe, em português, uma tradução exata para a palavra ‘cadre’. Usualmente utilizam-se as
palavras ‘gerente’ ou ‘executivo’ como traduções, mas o conceito abrange mais do que isso. Pode-se
afirmar que os ‘cadres’ correspondem aos quadros de nível superior nas empresas, estejam eles
envolvidos em cargos de chefia ou em atividades técnicas de alto nível. A transformação dos ‘cadres’
franceses em ‘managers’, termo anglo-saxão, é um dos pontos centrais no estudo das mudanças que tem
ocorrido no âmago desta categoria sócio-profissional ao longo dos últimos 20 anos (Boltanski e Chiapello,
1999; Pochic 2004; Bouffartigue, 2001a, 2001b; Falcoz, 2003) e será aprofundada ao longo do próximo
capítulo desta tese.
83

‘adaptabilidade’, ‘senso do dever’ e outros, apontados pelos empregadores como


constituintes do perfil de um ‘bon cadre’ (LAZUECH: 2000, p. 8).

Em seu trabalho voltado à investigação dos fatores que são decisivos no processo de
contratação dos jovens egressos das escolas de engenharia e comércio, ele percebe
que no momento da análise do currículo, o que conta Como estar na mira das empresas
pontos para os empregadores não é o desempenho
“(...) os empresários não estão atrás
escolar ou o nome/reputação da escola em que o da experiência teórica de quem acaba
de sair da faculdade. Eles estão em
candidato se formou. Estes atributos não deixam de
busca da capacidade que esse jovem
ser um plus, mas só serão decisivos se forem tem de aprender. A única experiência
que conta nessa fase da vida, e ela
acompanhados por outros igualmente julgados como será conferida no currículo, está ligada
ao que se chama "vivência de ordem
relevantes, como, por exemplo, estágios e
pessoal". Vai fazer diferença se
participação em atividades associativas. Acrescenta durante anos o jovem treinou para
fazer parte do time de futebol da
que em relação ao estágio, o seu valor consiste em escola, pois o mercado interpreta isso
ser uma forma de pré-profissionalização (e que pode como indicação de alguém preocupado
com a disciplina e o trabalho em
reduzir os custos da aprendizagem no novo emprego). equipe. Vai levar vantagem sobre os
demais aquele que se preocupou em
Já a participação na vida associativa da escola dedicar algumas horas da semana a
também interessa ao empregador porque ela assegura algum tipo de trabalho comunitário.”

o dinamismo do candidato e sua capacidade de Revista Veja – Sua Carreira – edição especial
n. 1 ano 2000
organizar manifestações:

“Um estágio bem sucedido em uma empresa, um projeto associativo conduzido a


seu termo, o engajamento em uma atividade particular (esportiva, cultural, e até
sindical) são igualmente ‘sinais’ que conduzem os empregadores a pensar que o
candidato reúne as qualidades técnicas, comportamentais e sociais que fazem
dele uma pessoa recrutável.” (LAZUECH: op. cit., p. 7 – tradução própria)

Trata-se sem dúvida de transferir para o indivíduo (e para sua trajetória profissional
pretérita) os custos com a aquisição de competências sociais úteis no mundo do
trabalho bem como o domínio de códigos e conhecimentos que potencialmente
poderão vir a ser mobilizados. Como a disposição das empresas em investir recursos
nestas formações é cada vez menor, buscam-se atributos que possam fazer a vez de
seus equivalentes. Além dos já mencionados inclui-se também o caso da valorização
da vivência internacional como indicativo do domínio de idiomas estrangeiros, tanto
quanto da ‘capacidade de resolução de problemas e do enfrentamento de ambientes
sociais adversos’. Todos estes novos atributos não deixam de ser associados à posse
de capital cultural ou econômico de classe ou de fração de classe, deixando em
84

vantagem aquelas famílias que possuem condições de sustentar as ‘experiências’ de


seus rebentos, que serão posteriormente reconvertidas em competências profissionais
as quais têm valor diferenciado no mercado de trabalho.

Como desdobramento desse quadro, podemos lançar as seguintes perguntas: Que


outros atributos, para além, concomitantemente ou no lugar da educação formal
estariam sendo considerados como relevantes para os empregadores? É possível
identificar certas características que, da mesma forma em que a escolaridade, estejam
sendo julgadas como indicadores da competência dos indivíduos e passíveis de serem
adquiridas segundo o seu ‘esforço’, como pressupõe o conceito de mérito? Pode-se
inferir a presença de certos atributos como sendo universalmente demandados ou
estaríamos circunscritos a concepções de mérito fragmentadas, associadas a
mercados de trabalhos segmentados?

Uma boa fonte de referência para mapear o que os empregadores estão buscando
nos seus futuros empregados consiste na análise dos anúncios de emprego que são
publicados nas diversas mídias impressas (jornais e revistas especializadas) e
também, mais recentemente, nos ‘sites’ dedicados a este tema na Internet (‘job
boards’). Estudos utilizando esta fonte não são inéditos, embora sejam pouco
numerosos, especialmente no Brasil. O seu uso como material empírico para análise,
ao mesmo tempo em que abre novas possibilidades, apresenta algumas limitações,
como por exemplo o fato de cobrir apenas uma pequena parte das práticas de
recrutamento que são levadas a cabo pelas empresas. Estas e outras constrições,
relevantes para a nossa metodologia, serão exploradas a seguir.

Na seqüência, buscaremos mapear alguns estudos e pesquisas que, fazendo uso dos
anúncios, indicam quais as competências e qualificações são alvo da atenção dos
empregadores durante a pré-seleção, visando a contratação para um determinado
posto de trabalho.
85

2.1. Anúncios de empregos: possibilidades e limitações na sua utilização

Em geral as pesquisas que fazem uso de anúncios de emprego focam a questão das
transformações que se colocam sobre uma profissão, um setor econômico ou um
ramo de atividade. No entanto, esta fonte de dados, além de conter informações úteis
a este tipo de estudo e subsidiar a elaboração de programas de formação e
treinamento, permite que se façam outras leituras relevantes em torno do
funcionamento do mercado de trabalho. Isto porque, sob certos aspectos, os anúncios
refletem as regras jurídicas que estão em vigência (como por exemplo a limitação de
práticas discriminatórias segundo critérios de idade, sexo, raça, etc.; a necessidade de
diplomas para o exercício de certas profissões, etc.); as convenções que são
elaboradas em torno da ‘qualidade’ de certos trabalhos ou das formas de negociação
dos contratos e salários; e também permitem que se mapeie a presença e a força dos
atores que dividem e competem por espaços no mercado de recrutamento.

A redação de um anúncio demanda um determinado tipo de competência específica


que leva em conta os aspectos enumerados e que se traduz em um tipo de linguagem
que é socialmente aceita e considerada como adequada ao seu tempo; portanto é
uma ação que está longe de ser arbitrária (MARCHAL & TORNY: 2002; MARCHAL &
RIEUCAUL: 2004). Além disso, o trabalho de objetivação do anunciante deve resultar
em escolhas que recaem sobre: o uso e a seleção das abreviações; o recurso a
determinadas expressões e adjetivos; a inclusão ou supressão de certas informações
(como o salário por exemplo); o tamanho do anúncio; o meio ou suporte em que é
publicado, o tipo de recurso gráfico que será adotado; entre outros.

Cada um desses elementos comporta variações mais ou menos significativas


conforme o observador se movimenta de um país a outro ou ainda de um mercado de
trabalho local a outro. Da mesma forma, o candidato ao posto deverá dispor de
competências cognitivas capazes de traduzir e interpretar estas informações e fazer
suas próprias escolhas42, incluindo o julgamento de seu perfil em conformidade com

42
A não inclusão da remuneração em um anúncio pode indicar, por exemplo, que este aspecto será
objeto de negociações futuras ou, inversamente, que o salário é pouco atraente. Já a não identificação da
empresa que está contratando (denominados anúncios ‘fechados’) pode indicar, por exemplo, que a
empresa não quer se revelar frente aos seus concorrentes; que não quer ‘filas’ de candidatos em sua
porta; ou ainda que a vaga pode estar preenchida por algum trabalhador que será ‘desligado’ tão logo se
encontre um substituto.
86

as exigências que são solicitadas, para que possa candidatar-se ou não à vaga em
questão (ver quadro a seguir).

Como a empresa se refere ao candidato que quer atrair?

Oliveira (2000) elabora uma lista curiosa de expressões que normalmente são encontradas em
anúncios de emprego e apresenta suas respectivas ‘traduções’ ou seja, como elas devem ser
interpretadas pelo postulante à vaga. Eis algumas:

• “profissionais com garra” – prepare-se para trabalhar arduamente


• “profissionais que não tenham medo de novos desafios” – ter êxito no trabalho exigirá
vencer problemas e obstáculos
• “disponibilidade de horário flexível” – prepare-se para trabalhar à noite e nos fins de
semana
• “enviar currículo detalhado” – somente se candidate se tiver excelentes qualificações; a
frase significa: “estamos fartos de candidatos medíocres”
• “não atendemos candidatos sem experiência comprovada” – somente se candidate se tiver
como comprovar sua experiência em carteira de trabalho
• “iniciativa e produtividade” – normalmente é um trabalho como vendedor, que exige
esperteza, oportunismo, pensamento rápido e resposta pronta
• “maturidade profissional” – provavelmente o relacionamento interno é tenso e a empresa
quer alguém que seja paciente, político e flexível, não vá se tiver estopim curto
• “favor não comparecer pessoalmente” – a empresa não quer um enxame de candidatos na
porta; ela deseja ter a liberdade de chamar ou não o candidato apenas por aquilo que
consegue depreender do conteúdo do currículo; esmere-se em prepará-lo se quiser ter
chance
• “ambicioso” – provavelmente trata-se de um trabalho comissionado
• “senhores(as) de alto nível” – a aparência é o mais importante; não vá se não tiver uma
boa aparência; e dê um trato no visual antes de ir
• “benefícios de praxe” – espere simplesmente os benefícios que todos oferecem, nada mais
do que isso
• “salário compatível com a função” – a empresa remunera pela média do mercado ou
mesmo um pouco mais baixo
• “excelentes comissões” – ou não há salário fixo, ou ele é muito baixo; sua remuneração
dependerá quase que inteiramente do que você produzir.

OLIVEIRA, Marco A. E Agora José? Guia para quem quer buscar emprego, mudar de trabalho, montar um
negócio ou repensar sua carreira. São Paulo: Editora SENAC São Paulo; 2000. Pág. 261.

Na mesma linha, a transformação que se verifica ao longo do tempo no formato e no


conteúdo dos anúncios (incluindo o próprio título das vagas) deve-se menos a
necessidades funcionais do posto e da empresa que recruta (imputadas às
transformações tecnológicas e ao ambiente econômico e concorrencial das empresas)
do que à ação de intermediários que se localizam entre a vaga ofertada e os
candidatos, a qual está longe de ser passiva ou neutra. Sua influência pode ser
percebida nas variações que ocorrem nos anúncios (especialmente nos que são
87

destinados a cargos mais elevados), além do fato de que eles contribuem para a
formação de um ‘mercado de anúncios’, com suas regras, convenções, etc.43

As principais mudanças ocorridas neste campo, tendo em conta as últimas décadas,


podem ser sumarizadas da seguinte forma:

(1) Formatos – de pequenos e discretos, os anúncios evoluem para ocupar grandes


espaços, podendo chegar a publicações de páginas inteiras em jornais e
revistas44. Além disso, passam a contar com a maior presença de elementos
gráficos (tais como logomarca, desenhos, molduras, fotos45, etc.) e variações na
tipologia das letras (uso de fontes de caracteres diversos e de recursos de edição
de textos) - inovações possibilitadas pelo uso das tecnologias de informática
(softwares gráficos, editores, etc.).

(2) Conteúdos - de muito concisos como o eram nos anos 1960 (próximo a um
‘procura-se’ e ‘dirija-se a’), quase que predominantemente um instrumento para
informar como os candidatos poderiam entrar em contato com as empresas, os
anúncios se transformam em dispositivos de pré-seleção, contendo uma
quantidade cada vez maior de informações destinadas à ‘filtragem a distância’ dos

43
Marchal (2001) e Marchal e Torny (2002) explicam melhor esta situação quando afirmam que, no que
diz respeito às mudanças que se verificam ao longo do tempo nos conteúdos e linguagem dos anúncios
(incluindo as nomenclaturas dos postos e os atributos que são solicitados aos candidatos), estas não se
devem estritamente às ações dos empregadores isolados, visando atender às suas novas necessidades
produtivas. Antes, tais transformações são produzidas e/ou acentuadas pela ação dos diversos
profissionais do mercado de trabalho (diretores das áreas de recursos humanos, consultores de empresas
de recrutamento, agências de comunicação, responsáveis pelas publicações dos anúncios nos diversos
jornais, etc.) que fazem a ‘tradução’ das demandas das empresas para o ‘mercado’ dos profissionais, e
com isso contribuem para formatar os estilos de linguagem e os conteúdos próprios dos classificados de
emprego. Portanto, a redação de um anúncio deve ser entendida como um processo que se situa na
confluência de várias instituições que concorrem entre si, tanto para a sua produção quanto para a sua
divulgação ou difusão (seja ela na imprensa, na Internet, correios, etc.); sendo que todas elas contribuem
para a produção de informações que valorizam, diferenciadamente, as empresas contratantes e suas
vagas tanto quanto os possíveis candidatos. (BESSY et all: 1999). Cria-se uma espécie de ‘hierarquia’ no
campo dos classificados de emprego, onde o suporte de divulgação, os recursos gráficos, o tamanho dos
anúncios, a estilística da linguagem, entre outros, operam como ‘signos’ que permitem localizar (e
valorizar) as empresas contratantes, as vagas e a natureza da relação de trabalho que se pode esperar,
hierarquizando também os tipos de candidatos que são mais ‘adequados’ ou aceitáveis para as mesmas.
44
A literatura especializada informa que o tamanho de um anúncio normalmente reflete quatro elementos:
(1) o porte da empresa que está recrutando; (2) o grau de maturidade de sua área de recursos humanos;
(3) o nível do cargo a ser preenchido; (4) a importância que a empresa está dando ao processo seletivo. E
que portanto, como regra geral, “pode-se afirmar que empresas de grande porte costumam publicar
anúncios grandes, enquanto os anúncios pequenos, de uma ou duas colunas, tendem a ser publicados
pelas pequenas empresas. (...) Pode-se dizer também que as vagas para cargos mais difíceis de
preencher, mais técnicos e de nível salarial mais alto tendem a ser divulgadas em anúncios maiores”.
(OLIVEIRA: 2000; p. 251 e 252)
45
Segundo depoimento que colhi em entrevista com o responsável pelos anúncios do jornal O Globo, o
uso destes elementos (fotos e desenhos) muitas vezes é feito visando criar um ‘ambiente da empresa’,
para que o candidato se identifique com o meio que irá encontrar ou ainda com a cultura da organização.
88

candidatos (escolaridade, experiência, conhecimentos, etc.). Atualmente, além do


crescimento e diferenciação dos critérios que são utilizados para filtrar os
candidatos, os anúncios passam a conter também informações sobre a empresa
que recruta (posição no mercado, receita anual, porte, etc.)46. O que os torna
também uma peça de marketing, parte do processo de comunicação das
empresas e produzidos para consumo não apenas dos candidatos em potencial,
mas também dos concorrentes e da sociedade como um todo, uma vez que se
destinam a valorizar a empresa, o posto ofertado e, por analogia, também o
postulante.

AUX. ADM.
(3) Linguagem – de muito ‘cifradas’ e abreviadas,
demandando, dos que estão em busca de empregos, uma 1, locad. Autos, R$ 600 +
benef., micro c/ conh. 2º. G.
competência de tradução específica (ver exemplo no ou cursando sup., fem.,
25/35ª, p/Morumbi, comp.
quadro ao lado), a forma de expressão vai se tornando Traje social r. Xavier, 649,
mais discursiva, ‘completa’ e ‘profissional’, revelando a 1ª a. trazer CV c/foto.

ação de profissionais especializados na sua elaboração (extraído de: Oliveira, Marco A.


2000, pág. 252)
(empresas de comunicação e profissionais de
intermediação) e que vão definindo um novo estilo de linguagem e um modo
particular de ‘busca’. A ação das grandes empresas de recrutamento e seleção é
particularmente emblemática nessa transformação, conforme pode ser
depreendido do comentário de um especialista da área:

“Eles (as grandes empresas de recrutamento) dão um outro revestimento, uma


outra apresentação aos anúncios. Essa parte do conteúdo técnico, até de uma
redação mais elegante, digamos assim. Os anúncios da Michal Page são mais
completos na forma escrita do que os outros, muito mais telegráficos.
Antigamente os anúncios eram muito mais telegráficos, diretos, sobre as
exigências. Algo quase como um exigimos e oferecemos. Hoje se tem um texto
mais elegante, que talvez no fundo seja a mesma coisa, mas com uma escrita
mais bonita, uma apresentação de arte, com formatação gráfica, e até na própria
tipologia, porque com a computação se tem muito mais recurso. A apresentação
do anúncio é mais bonita.” (depoimento com especialista colhido em entrevista47)
46
A maior ou menor presença de informações sobre o posto e empresa recrutante, vis-à-vis as
informações que se portam sobre as características dos candidatos, pode indicar em que medida o
processo de pré-seleção, do qual os anúncios são um dispositivo de apoio, joga mais a favor dos
candidatos ou das empresas – em acordo com a hipótese da assimetria de informações. (BESSY et al.:
1999; MARCHAL & TORNY: 2002). Porém, é importante ressaltar que tanto o conteúdo quanto a
linguagem dos anúncios são constritos por regras jurídicas (que limitam as práticas de discriminação no
mercado de trabalho) e também por usos e convenções sociais que delimitam o montante mínimo de
informações que devem ser fornecidas, assim como os termos (palavras, abreviações) que são utilizados
para expressá-las. Essas convenções se modificam com o tempo e segundo os espaços que se
considera. (MARCHAL: 2001, p. 171).
47
Entrevista com coordenador da Equipe de Lojas do jornal O Globo realizada dia 21 de junho de 2005.
89

(4) Suportes – neste aspecto verifica-se dois eixos de transformações relevantes. O


primeiro incide sobre os suportes do tipo ‘tradicionais’, como jornais e revistas, e
o segundo recai sobre a emergência de novos suportes, como a Internet (e que
por sua vez produz impactos sobre os primeiros). Em relação aos suportes
tradicionais, especialmente os jornais de circulação ampla, o que se observa é a
crescente opção estratégica de transformar os anúncios de emprego em uma
‘linha específica de negócios’ (da mesma forma com que ocorre com
classificados de outra natureza, como por exemplo a compra e venda de imóveis,
automóveis, informática, etc.) conferindo-lhe uma maior relevância e visibilidade.
Este isolamento dos anúncios de emprego se dá através da criação de
suplementos especiais, como por exemplo o ‘Boa Chance’ no jornal O Globo
(criado em 1993), o ‘Vida Ganha’ no jornal Extra ou ainda o ‘Empregos’ no jornal
Estado de São Paulo48. Em paralelo com as transformações esboçadas nos 3
itens anteriores, o tratamento especial nos suportes midiáticos contribui para
tornar a oferta de empregos uma questão de ‘especialistas’ com mudanças no
foco do público alvo. Grandes empresas de recrutamento e seleção chegam
inclusive a publicar seus anúncios fora do espaço reservado a tanto, misturando
suas ‘mensagens’ aos conteúdos editoriais, especialmente nos suplementos de
economia. Com isso se visa chamar a atenção também dos profissionais que
estão empregados e que não tem por hábito consultar classificados (sendo estes
o foco preferencial dos anúncios). Novamente o depoimento colhido em
entrevista com um especialista da área é elucidativo neste sentido:

“As grandes empresas de recrutamento, como a Michal Page, tem feito o que é
uma tendência nova: anunciar no noticiário o anúncio de emprego. Isso não era
muito usual até um tempo atrás e fala em primeiro lugar do perfil do profissional
que eles querem contratar, que deve ter uma qualificação maior. Mas eles
também anunciam no noticiário porque eles querem dar uma exposição maior ao
anúncio. Porque com isso ele está fazendo duas coisas: ali ele está falando para
um público maior, que talvez até nem esteja procurando emprego, e que talvez
não fosse buscar lá no segmento de classificados o emprego. Às vezes a pessoa
está empregada, e vê ali uma oportunidade de contratação. E por outra ele está

48
Nestes ‘cadernos’, junto com a oferta de vagas, há a apresentação de diversas matérias de conteúdo
editorial que se ocupam da veiculação de tendências de transformação do mercado de trabalho e que
‘agregam valor’ a esta linha de produtos. Além disso, esta estratégia se desenvolve aproximando os
conteúdos ditos de interesse “profissional” com os conteúdos referentes à educação, mormente à
educação continuada. Percebe-se uma quantidade expressiva de anúncios de universidades e faculdades
(cursos de extensão, especialização, MBA´s, além das graduações) e de matérias jornalísticas que
conectam as necessidades do mundo do trabalho com as novas ocupações e o preenchimento dos
cargos. Cabe destacar que esta é uma tendência internacional.
90

vendo ali também a possibilidade de realizar a propaganda da própria empresa


contratadora. Por que isso? Porque se você está vendo ali uma empresa que
está contratando seis funcionários de nível gerencial top, você certamente vai
procurar esta empresa para disponibilizar o seu currículo. Então ela está falando
um pouco dela mesma e das empresas para as quais ela trabalha, mesmo
quando o anúncio é fechado (sem identificação da empresa que oferece a
vaga).” (depoimento com especialista colhido em entrevista49)

Já o segundo eixo de transformação, no que tange aos suportes, recai sobre o


uso da tecnologia da Internet e o desenvolvimento de sites de emprego –
grandes bancos de dados de vagas e currículos que dão vez a uma nova forma
de realizar a seleção: o e-recrutamento50. Uma das principais conseqüências dos
sites de emprego é a brutal ampliação do ‘campo de recrutamento’ e a sua
mudança de escala. Este deixa de ser local ou regional para tornar-se nacional,
continental ou internacional.

Mas se é verdadeiro que os classificados de emprego revelam muitos aspectos do


funcionamento do mercado de trabalho, o seu uso como material empírico para
pesquisas também sofre diversas críticas. A primeira delas, de cunho metodológico,
costuma ser dirigida à composição das amostras (representatividade dos suportes
escolhidos, quantidade de anúncios que são analisados, etc.), o que muitas vezes
culmina em conclusões pouco similares entre si.

A segunda, aponta para a baixa representatividade dos anúncios entre as ferramentas


que são utilizadas para os processos de seleção. De fato, os anúncios de emprego
correspondem a uma dentre várias modalidades possíveis de colocar em ação o início
do processo de recrutamento e seleção pelas empresas. Enquadram-se nos canais
formais que são utilizados quando se visa o recrutamento externo de trabalhadores
(ver quadro a seguir).

49
Entrevista com coordenador da Equipe de Lojas do jornal O Globo realizada dia 21 de junho de 2005.
50
Um dos efeitos dos bancos de empregos na Internet parece ter sido a redução substancial da
quantidade de anúncios presentes nos jornais. Tomando como exemplo o jornal O Globo, os classificados
de emprego apresentados no primeiro domingo do mês de março no ano de 1990 chegavam a somar 24
páginas. Já em 2005 tais anúncios não chegam a completar nem 5 páginas. Segundo o presidente do
grupo Catho, um dos primeiros a implantar um site de empregos no Brasil (com inclusão de vagas e
currículos), este é um resultado diretamente atribuído ao uso desta nova tecnologia: “Os donos de jornais
estão nos execrando” afirmou ele em entrevista. Acrescentamos no entanto que houve no período uma
maior diversificação das próprias mídias impressas, com criação de novos jornais e de muitas revistas
especializadas. Assim, os anúncios que antes se concentravam em poucos suportes, passam a ser
distribuídos segundo o seu público alvo de leitores. No caso de recrutamento de altos executivos por
exemplo, muitas empresas preferem a publicação em revistas especializadas, tais como Exame e Você
SA do que em jornais.
91

Quadro 1- Fontes de recrutamento segundo os canais utilizados


Canais Internos Externos
• agências de emprego oficiais (SINE)
• agências de emprego privadas
• divulgação das vagas • head-hunters e outros intermediários
na Intranet
• Internet (site da própria empresa)
• anúncios das vagas
fixados em painéis ou • Internet (sites de emprego)
Formais • imprensa (jornais e revistas nacionais,
em jornais internos
locais, setoriais e especializados)
• fóruns específicos
• candidaturas espontâneas
• cooptação interna • cooptação: redes de amigos,
(“boca-a-boca”) conhecidos (clientes, fornecedores,
• recurso a antigos prestadores de serviço)
trabalhadores • abordagem direta: universidades e
• contratação de faculdades
Informais estagiários • abordagem direta: trabalhadores de
• contratação de interinos outras empresas
ou terceirizados • redes de antigos alunos, outras redes
• organizações profissionais, etc.
Fonte: adaptado de Garner, Hélène. Survey des études et rechercehes réalisées sur le thème du recrutement.
Travail préparatoire à l ´enquête Offre d´emploi et recrutement. Rapport Final. Convention DARES-CERDOR. Août
2004. (pág. 67)

Ao que tudo indica, os anúncios de emprego são realmente mais eficazes como
dispositivo de auxilio ao processo de contratação em países onde os recrutadores
tendem a fazer mais uso dos canais formais, como é o caso da Grã-Bretanha, do que
informais, como na França. Neste último, em 2000, apenas 5% dos recrutamentos
foram realizados por meio de anúncios de oferta de empregos (dados da enquete
Emploi 2000, realizada pela APEC - Association pour l´emploi des cadres - apud
Garner, 2004, pág. 651). Já Grã-Bretanha cerca de 30% das contratações são
atribuídas aos anúncios de emprego (dados da pesquisa Labour Force Survey, ano de
1999, apud MARCHAL & RIEUCAU, 2005, p. 2)

51
E quanto mais elevado o posto, como por exemplo no caso dos ‘cadres’, mais relevante se torna o
papel das redes informais. O elemento geracional também tem influência: executivos mais jovens, com
menos de 35 anos, são mais facilmente recrutados via anúncios.
92

Responder a anúncios de emprego – uma forma pouco eficaz de inserção no mercado

Uma rápida consulta nos livros pop management (WOOD J. & PAES E PAULA: 2003 *) ou de
auto-ajuda para os profissionais que desejem se inserir no mercado de trabalho, deixa evidente
que os “gurus” da empregabilidade desconsideram a relação que se estabelece entre
empregadores e candidatos a partir dos anúncios como significativa no processo de “caça” às
vagas. Richard Bolles é um destes expoentes: em um livro recorde de vendas intitulado “As 5
melhores maneiras de conseguir um emprego”, afirma que “responder a anúncios de jornais
profissionais ou de negócios” e “responder a anúncios de jornais locais” fazem parte das 5
piores maneiras de procurar emprego, dado que a taxa de sucesso é baixa (no primeiro caso, a
taxa de retorno é de 7%, e no segundo, a taxa varia de 5 a 24%) (BOLLES: 2004, p.13). Essa
opinião é compartilhada pelos nossos “analistas de emprego” nacionais, embora sem a
apresentação de dados estatísticos: “a maioria das oportunidades de emprego não chega a ser
publicada nos classificados dos jornais, o que torna as chances de conquista de uma
colocação satisfatória entre os profissionais que utilizam apenas este método como fonte de
pesquisa de novas e melhores oportunidades ainda mais reduzidas” (SCISTOWSKI: 2002, p.
69).

(*) Os autores definem a literatura de pop-management como sendo “livros e revistas produzidos pela mídia de
negócios para consumo rápido dos leitores”. Acrescentam que este tipo de literatura tem “papel relevante na
disseminação de novas idéias e práticas gerenciais”.

No Brasil não parece que a situação seja substancialmente distinta da francesa. A


despeito da inexistência de fontes de dados oficiais que indiquem as formas que são
utilizadas para contratação por parte das empresas, podemos lançar mão de algumas
pesquisas não acadêmicas que são desenvolvidas pelos intermediários do mercado
de trabalho como base indicativa da nossa posição. Assim, a partir dos resultados de
enquete realizada pelo Grupo Catho junto a mais de 41 mil profissionais no ano de
2003, fica evidente que anúncios publicados em jornal ou em bancos de vagas na
Internet foram os meios utilizados para a contratação de 9,43% dos presidentes e
diretores (4,34% via anúncios e 5,07% via Internet) e de 14,48% dos gerentes
entrevistados (6% via anúncios e 8,48% via Internet). É um percentual pequeno
comparativamente a outros meios, como por exemplo a indicação de amigos (que
responde por 27,53% das contratações de presidentes e diretores e 40,17% dos
gerentes) e a abordagem direta da empresa (muito relevante na contratação de
presidentes e diretores – 39,13% e menos expressiva na de gerentes - 24,84%)52.

52
A análise comparativa das pesquisas realizadas pelo Grupo Catho nos anos de 1997, 2003 e 2005
indica algumas conclusões importantes, tais como: (a) a maior presença da Internet como ferramenta de
recrutamento (por oposição ao jornal); (b) um crescimento lento mas contínuo das redes de
relacionamentos (indicação de amigos); (c) um crescimento das práticas ativas de recrutamento por parte
das empresas contratantes (abordagem direta da empresa); (d) uma redução significativa do uso de
empresas de consultoria e head-hunters e de empresas de outplacement. A pesquisa de 1997 foi
realizada através do envio de questionário via mala direta e obteve 1.356 respostas. Já as pesquisas de
93

Usando os resultados destas pesquisas como estimativa, podemos inferir que entre
85% a 90% das vagas destinadas a estes estratos não chegam a ser anunciadas (ver
Tabela 1).

Tabela 1 - Meios utilizados para contratação de executivos em anos selecionados


1997 2002 - 2003 2004 - 2005
Meios Presidentes Presidentes Presidentes
Gerentes Gerentes Gerentes
e Diretores e Diretores e Diretores
Anúncio em jornal 14,11 3,42 3,80 7,50 4,34 6,0
Internet - - 4,70 7,60 5,07 8,48
Indicação de
amigos (de dentro
24,18 34,79 26,80 38,20 27,53 40,17
e de fora da
empresa)
Abordagem direta
da empresa 19,14 29,06 42,60 23,90 39,13 24,84
contratante
Empresa de
32,49 33,34 22,30 15,40 11,59 12,42
consultoria
Outplacement 8,82 8,55 4,6 1,4 3,62 2,49
Fonte: Grupo Catho. Pesquisas “A Contratação, A Demissão e a Carreira dos Executivos Brasileiros” anos 1997,
2003 e 2005. Elaboração própria

Aliás, o recurso às redes de relacionamento, que se faz presente de longa data,


assume nos tempos presentes características muito peculiares. Ao mesmo tempo em
que as ferramentas disponíveis para o recrutamento se tornam mais sofisticadas,
cresce a relevância das indicações. A blague do QI = quem indica, a tomar pelas
notícias que são veiculadas na mídia, nunca esteve tão forte. O ‘mérito’ objetivamente
mensurado estaria sendo suplantado por relações de proximidade e vínculos de
amizade, em um processo de crescente “nepotismo e refeudalização do mercado de
trabalho” como apontado por Paiva (2002; 200453).

No entanto, nos parece fundamental estabelecer algumas diferenças que são


importantes de serem marcadas em relação às indicações de outrora e as atuais. A
primeira delas se coloca em torno da sua legitimidade. Enquanto no modelo industrial

2003 e de 2005 foram realizada através do envio de questionários pela Internet e obteve-se mais de
41.000 respostas para 2003 e mais de 31 mil para 2005.
53
As transformações no mercado de trabalho, ao mesmo tempo em que amplia a parcela dos excluídos
do mercado formal e traz a intensificação do trabalho dos que logram se manterem incluídos, também
incide nos processos de recrutamento: “estamos, de fato, frente ao retorno de formas arcaicas que
também se manifestam num retrocesso da meritocracia em favor de uma ‘refeudalização’ do mercado de
trabalho, cujo acesso é favorecido pelo capital social de cada postulante em uma situação de abundância
de qualificação”. (PAIVA: 2002, p. 51)
94

de produção a ocupação de um posto de trabalho por meio do QI/indicação chegava a


ser motivo de vergonha para o seu postulante, algo a ser ‘escondido’ porque
descredenciava suas capacidades (e portanto o mérito), atualmente a situação é
distinta. A prática da indicação não apenas passou a ser estimulada, mas também se
torna ‘oficial’ em algumas empresas, sendo inclusive objeto de regulamentação e
formalização. De oculta, ela se torna visível, e por isso mesmo ganha crescente
legitimidade.

A segunda diferença a ser estabelecida é de que as redes sociais ganham um valor de


troca no mercado de trabalho. Esse valor pode ser realizado tanto diretamente, pela
obtenção de ganhos financeiros reais (como indicado na reportagem apresentada no
quadro a seguir), quanto indiretamente, pela formação de uma malha de proteção
contra as intempéries do futuro. O ato de ‘estar em contato’ com os demais, em suas
diversas dimensões, antes de ser uma atividade prazerosa ou de reciprocidade nos
relacionamentos do aqui e agora, assume um viés utilitarista e racionalmente
prospectivo: investir nas relações que podem render frutos em um futuro
inerentemente incerto54.

54
Este tipo de atividade – a formação e manutenção das redes com propósitos profissionais – é
conhecida, entre os profissionais de gestão (e disseminada na imprensa especializada), pela expressão
“networking” - neologismo importado da área de informática que designava as redes de computadores e
seus protocolos de comunicação. Não se trata apenas de uma nova atividade a ser desempenhada pelos
trabalhadores na dita sociedade do conhecimento, mas é também, e sobretudo, uma forma específica de
realizá-la, que alimenta as empresas de consultoria em RH e a produção editorial, com conselhos
diversos sobre como estruturar e manter ativa a rede de relacionamentos, incluindo protocolos de
etiqueta.
95

QI vale dinheiro- "Quem indica" novos funcionários


agora é premiado nas empresas

Antes sinônimo de apadrinhamento e antiprofissionalismo, o QI revelou-se uma técnica rápida


e eficiente de seleção, a ponto de ser adotada pelos departamentos de recursos humanos de
grandes companhias. Muitas estão dando prioridade explícita às recomendações dos
funcionários e só contratam quem tiver o aval de alguém da casa. Outras chegam a oferecer
prêmios aos que fazem indicações bem-sucedidas. O responsável pela sugestão pode
embolsar até 2.000 reais em bônus. A alternativa evita a perda de tempo e dinheiro ao
entrevistar uma multidão de gente não qualificada. "A rede de contatos dos funcionários é uma
arma poderosa para encontrar bons profissionais", diz o headhunter Marcelo Mariaca. "Pelo
menos metade das vagas pode ser facilmente preenchida dessa forma."

A consultoria Ernst & Young é uma das firmas que estão recompensando os empregados a
cada sugestão bem-sucedida. Os prêmios variam de 500 a 2.000 reais, dependendo do cargo
preenchido. (...) A Ernst já gastou quase 50.000 reais com bonificações, mas está fazendo um
grande negócio. Um processo de recrutamento com anúncios em jornais custaria três vezes
mais que esse valor. E um bom headhunter não cobra menos que 20.000 reais para caçar no
mercado um gerente de nível médio. A idéia ganha força nas empresas de tecnologia, setor em
que é muito difícil encontrar gente qualificada. A subsidiária brasileira da Hewlett-Packard
implantou um sistema da matriz, nos Estados Unidos. No exterior, 60% das vagas já são
preenchidas pelas indicações dos funcionários. O prêmio estabelecido para o Brasil é de 900
reais. Mas esse valor só será pago caso o indicado permaneça no mínimo seis meses no
emprego. "O bônus reforça o comprometimento de quem indica um nome, e a chance de
acerto aumenta ainda mais", acredita Cláudio Pierini, gerente de recursos humanos da Hewlett-
Packard.

Mesmo quando não oferecem bônus, algumas empresas dão prioridade explícita às
recomendações dos funcionários. Na linha de montagem da Fiat, na cidade de Betim, em
Minas Gerais, só é contratado quem tiver o aval de alguém da casa.
Revista Veja, 6 de setembro de 2000. Reportagem de Maurício Oliveira

Portanto, a reduzida eficácia do jornal frente aos demais meios de recrutamento seria
um impedimento para o uso dos classificados como subsídio para a pesquisa quando
se busca averiguar o que está sendo exigido / considerado como mérito pelos
empregadores? A esta interrogação crítica, Jackson, Goldthorpe e Mills (2004)
respondem que se é verdadeiro que uma boa parte das vagas não são divulgadas,
muitas o são, e este percentual não pode ser negligenciado, servindo como uma boa
fonte de referência para a pesquisa sociológica.

Acresce que mesmo que os anúncios de emprego se encontrem em contração, e com


isso possam vir a se tornar cada vez menos eficazes no preenchimento das vagas,
eles permanecem como uma das principais fontes de informação para os candidatos
(além de publicidade para as empresas). Um bom indício é o índice de leitura que os
anúncios que são publicados nos jornais atingem: Oliveira (2000, pág. 250), tomando
96

o caso da Folha de São Paulo, afirma que mais de 50% das pessoas que compram
este jornal aos domingos o fazem devido aos anúncios de classificados (segundo
pesquisa feita em 1995 pelo próprio jornal). Já no que concerne ao jornal O Globo, o
caderno Boa Chance atinge um público de 656.000 leitores, o que corresponde a 40%
dos leitores do jornal, estimado em 1.665.000 pessoas, entre 13 a 65 anos55 (dados
obtidos em entrevista com representante do jornal).

Outra ressalva que pode ser feita em relação aos anúncios, especialmente os que são
veiculados na mídia impressa, diz respeito à quantidade e à natureza das informações
que são apresentadas, que não cobrem o conjunto de exigências que realmente são
levadas em conta nos processos de seleção. O fator limitante seria, a princípio, o
custo financeiro envolvido no uso deste recurso, impondo parâmetros restritivos em
termos de tamanho e de quantidade de informações que são fornecidas aos
candidatos, tanto no que diz respeito às exigências de perfil quanto no que concerne
ao posto de trabalho e à empresa contratante (e quanto menor a empresa, mais
conciso o anúncio). A isso Jackson (2001) contra-argumenta afirmando:

“Somente porque o anúncio não solicita certas qualificações ou capacidades não


significa que o empregador não queira estas características no individuo que
eventualmente venha a ser empregado.” (JACKSON: 2001, p. 8 – tradução
própria).

É importante reconhecer esta limitação, mas isso não impede, entretanto, de


considerar os anúncios como suportes à criação de um “campo de empregados em
potencial”, e que os empregadores, ao redigirem os textos, estariam utilizando uma
racionalidade no sentido de fornecer sinais para a melhor criação deste campo:

“Enfim, dado o tempo e os custos envolvidos na publicação de um anúncio,


poderia parecer perverso que os empregadores não fornecessem ao menos
alguma informação sobre o que eles estão buscando nos empregados (mesmo
que os últimos estágios do recrutamento sejam influenciados por outros fatores).”
(ibidem; id.).

55
O que corresponde a 19% da população carioca na mesma faixa etária (estimada em 8.839.000
pessoas). Quando se trata do público de maior poder aquisitivo – classe A – se estima que o jornal tenha
uma penetração de 63% (420.000 leitores em uma população estimada de 665.000 pessoas na faixa
etária de 13 a 65 anos). O público leitor do Caderno Boa Chance, estimado em 656.000 pessoas é um
público inferior ao que consome o caderno de empregos do Extra – suplemento Vida Ganha – que atinge
a 951.000 leitores. 78% dos leitores do Boa Chance é composto por pessoas das classes A e B, contra
38% do Vida Ganha, que atinge a uma população das classes C, D e E. É de se esperar, portanto, que os
anúncios destinados aos cargos mais elevados tendam a ser apresentados em maior proporção no Globo
do que no Extra quando se considera que os critérios de seleção para o posto incluem também aspectos
de classe, e não apenas os restritos ao ‘mérito’ na sua acepção tradicional.
97

Portanto, seria razoável supor que guiados pela racionalidade econômica (uma vez
que estão pagando pela veiculação dos anúncios), os empregadores tornariam
públicas aquelas características que, a seu ver, seriam as mais imprescindíveis de
serem apresentadas pelos candidatos.

E além disso, os anúncios devem ser considerados como o primeiro passo no


processo de seleção, onde os empregadores comunicam o que na sua percepção é o
essencial ou, ao menos, o ideal em termos de requisitos que devem ser preenchidos
pelos candidatos. Por isso, ainda que os anúncios de emprego possam não conter
“tudo” o que será considerado no momento real da contratação (comportando inclusive
negociações quanto aos atributos desejados), é de se esperar que o que está descrito
deva ser levado a sério pelos candidatos. Nesse sentido, publicados na imprensa ou
na Internet, eles não deixam de ser uma ‘vitrine’ do mercado de trabalho, permitindo a
um conjunto de atores (candidatos, instituições e profissionais do mercado) lançar um
‘olhar’, ainda que parcial, sob os mesmos. (MARCHAL & TORNY: 2003)

Em suma, a despeito das limitações que possam estar presentes em torno do uso de
anúncios de emprego como suporte empírico à pesquisa, não se pode desconsiderar
que este material consiste em uma rica fonte para a pesquisa sociológica que se
debruça sobre as transformações no mercado de trabalho. Seu acompanhamento ao
longo do tempo revela transformações significativas em torno dos critérios que passam
a ser requisitados aos candidatos, da forma de apresentação das vagas, do modo
particular de descrever a relação de trabalho (onde o elemento da ‘sedução’ faz-se
cada vez mais presente) ou ainda da transformação nas maneiras de ‘colocar em
relação’ os candidatos e as empresas recrutantes.

2.2. Resultados de pesquisas recentes

A utilização de classificados de emprego como material empírico para o estudo das


transformações nas ocupações e nas relações sociais não é inédito, embora seja um
material ainda pouco explorado nos estudos sociológicos56. Marchal e Torny

56
Jackson, Goldthorpe e Mills chegam a afirmar que os anúncios de emprego são uma fonte
“negligenciada” nos estudos. (2002 – pág. 3).
98

inventariam algumas pesquisas que fazem uso de classificados de emprego e que, via
de regra, se debruçam na análise de alguma profissão ou setor em particular, como é
o caso dos trabalhos sobre a categoria dos ‘informáticos’ (Rivard et alli, 1979, 1982;
Todd et alli, 1995; Bessy et alii, 1999, 2000), dos responsáveis pela gestão de
recursos humanos e recrutamento (Haines, Arcand, 1997; Moulin, 1987) ou ainda dos
‘animadores’ (Akin, Douard, 1999) (MARCHAL & TORNY: 2002, p. 8). Afirmam que em
geral, estes trabalhos se propõem a mapear as transformações que ocorrem no
segmento ou profissão em questão ao longo de um determinado período de tempo.
Sob certos ângulos, os anúncios são considerados como ‘espelhos’ ou ‘tradutores
fiéis’ do mundo do trabalho, e os resultados das pesquisas são utilizados para propor
ajustes da formação profissional em questão (MARCHAL & TORNY: 2003).

Com o propósito de investigar o que os empregadores estão entendendo como mérito,


selecionamos alguns estudos específicos que se aproximam da abordagem
mencionada - como o de Gonzáles e Prado e o de Gracio – assim como outros que
possibilitam leituras mais amplas, seja a partir da proposição de uma nova forma de
mensurar o mérito – como na pesquisa de Jackson – ou ainda a partir da ênfase na
ação dos intermediários no mercado de trabalho – como nas pesquisas de Marchal e
Torny e Marchal, Torny e Rieucau.

2.2.1. Empregadores do setor terciário: um estudo brasileiro

Tomando como primeira referência um estudo brasileiro, podemos citar o trabalho


desenvolvido por Gonzales e Prado publicado em 200157 que visa avaliar as
demandas dos empregadores em relação aos perfis de trabalhadores do setor terciário
(comércio e serviços) a partir dos anúncios de empregos.

Para apoiar a pesquisa foi elaborado um banco de dados com os classificados de


empregos de 19 dos principais jornais das capitais nacionais durante os meses de
janeiro e fevereiro de 2001, totalizando 34.289 anúncios de ofertas de empregos das
mais diferentes áreas58. Diversas ocupações foram agregadas em grandes grupos
ocupacionais, e as demandas dos empregadores foram classificadas segundo suas

57
Gonzáles, Wânia R. C.; Prado, Lúcia R. S. da Silva. Banco de Dados: Trabalho e Emprego através
dos classificados dos jornais. In: Boletim Técnico do SENAC, Rio de Janeiro, v. 27, n. 2, maio/ago.,
2001. pág. 61-68
58
Cabe mencionar que em nenhum outro estudo que pesquisei foi encontrada uma base desta
envergadura.
99

referências a variáveis como sexo, experiência, escolaridade, conhecimentos de


informática, informações sobre remuneração, perfil, setor e forma de atuação.

A partir da análise do material levantado, as autoras concluem que há um


descompasso entre “o funcionamento real do mercado de trabalho e algumas das
representações teóricas (que são elaboradas) a seu respeito” (GONZALES E PRADO:
2001, p. 66). A visão do enriquecimento do trabalho como efeito derivado da
flexibilização da produção sobre o perfil dos profissionais, que acarretaria o aumento
das demandas por competências associadas à polivalência ou à capacidade de
trabalhar em equipe – uma variação da hipótese funcionalista e defendida pelos
teóricos da especialização flexível - não se coloca para o conjunto de trabalhadores.
Ao contrário, seria a tese da polarização das qualificações que encontraria maior
capacidade explicativa para os fenômenos em curso: “a exigência de um pequeno
número de trabalhadores altamente qualificados, enquanto a grande maioria é
desqualificada” (ibidem, id.).

Mas o que tem maior relevância na conclusão da pesquisa é a identificação da baixa


importância conferida à qualificação, entendida como posse de credenciais escolares,
para a ocupação dos cargos ofertados (e isso se dá a despeito do fato de que a
pesquisa tenha sido realizada após um forte incremento do ensino médio e superior no
Brasil). Segundo as autoras, embora a educação não possa ser negligenciada, o seu
peso é maior nas ocupações associadas às novas tecnologias, e mesmo nessas há
uma forte presença de atributos não meritocráticos:

“Conforme é observado na análise das ocupações mais procuradas nos


classificados dos jornais, verificamos que as exigências de qualificação são, de
fato, minimizadas, enquanto que em alguns casos os aspectos comportamentais
são mais valorizados. É importante observar que o que chama atenção em
nossos resultados não é apenas a valorização de características pessoais, mas
sim a quase total ausência de referências a qualquer tipo de exigência de
qualificação mais específica. Essa afirmação pode ser ilustrada a partir dos
elevados percentuais encontrados de não exigência de escolaridade na maior
parte das ocupações mais requisitadas pelo mercado de trabalho, como as de
vendedor, assistente comercial, modelo, professor, cozinheiro e costureira.
Paralelamente a este aspecto, encontramos uma valorização da apresentação
pessoal, da vontade de trabalhar, de dinamismo, de não fumantes, de facilidade
de relacionamento pessoal e até de crença religiosa.” (Ibidem, p. 66-67)

Em suma, não há evidências, para a grande maioria das ocupações que compõe o
setor terciário, de que os empregadores estariam dando primazia às qualificações
10 0

educacionais no momento de seleção dos trabalhadores. E apenas nas ocupações


ligadas à área da tecnologia da informação o peso da escolaridade superior se faz
presente com alguma significância (34,4% dos anúncios solicitam terceiro grau
completo ou em curso).

Sob certos aspectos, podemos inferir que para o setor de comércio e serviços
brasileiro, a tese funcionalista que apregoa que os cargos mais elevados
demandariam maior escolaridade encontra algum fundamento. A isso também se pode
acrescentar a concepção de mercados duais na qual, quando se trata dos setores
nucleares ou centrais da economia – onde os salários tendem a ser mais elevados, a
estabilidade é maior, assim como as condições de trabalho e as perspectivas de
promoção - o peso das credenciais escolares é maior do que quando se trata dos
setores periféricos (ou secundários, que possuem características opostas). Nestes
últimos, a maior produtividade permaneceria sendo buscada por meio dos salários.
Desse modo, como mais da metade das ocupações mais procuradas que foram
analisadas pelas autoras59 podem ser enquadradas na categoria de ‘setor secundário’
descrito por Piore e Doeringer (1971; 1985), não é de se estranhar que as referências
à escolaridade tenham menor incidência.

2.2.2. O que conta no recrutamento dos ‘quadros’: um estudo português

Nos estudos desenvolvidos no continente europeu, a produção de pesquisas que faz


uso de anúncios de emprego é mais numerosa. Em primeiro lugar, destacamos o
trabalho de Gracio, publicado em 200160, que lança mão dos anúncios de emprego
para avaliar as transformações no mercado de trabalho dos ‘quadros’61 em Portugal
durante os anos de 1989 e 1997. A partir da análise correlata das evoluções no
sistema de ensino superior que ocorreram naquele país (especialmente no tocante à
expansão da oferta privada) e do acirramento da concorrência entre as empresas, o
autor procura averiguar em que medida as estratégias de recrutamento sofreram

59
O conjunto de ocupações analisado é formado por: (1) vendedor; (2) operador de telemarketing; (3)
assistente comercial; (4) modelo; (5) atendente; (6) contador; (7) cozinheiro; (8) profissional de tecnologia
da informação; (9) professor e (10) costureira. Destas, entendemos que as de número 1, 2, 3, 5, 7 e 10
podem ser classificadas como pertencentes ao ‘setor secundário’.
60
Gracio, Sérgio. Sondagem ao mercado de emprego dos quadros, em 1989 e 1997. Sociologia,
Problemas e Práticas. [online]. nov. 2001, no.37, p.9-32.
61
O autor utiliza a palavra ‘quadros’ como equivalente no significante da palavra ‘cadres’ em francês, cujo
uso não é corriqueiro no Brasil, conforme já assinalado em nota anterior.
10 1

influências destes vetores de mudanças62. Para tanto, desenvolve um banco de dados


com 6.000 anúncios, recolhidos do semanário ‘Expresso’ durante os anos de 1989 e
1997, dirigidos aos ‘quadros e técnicos’.

Em sua análise, o autor divide as demandas sobre os candidatos em relação às suas


competências ou capacidades em três categorias: (1) competências informais (que por
sua vez se subdividem em: (a) ‘novas’, como autonomia e capacidade relacional – que
remetem a relações pós-tayloristas; (b) ‘tradicionais’, como responsabilidade,
orientação para a tarefa/empenho, capacidade racional/burocrática, capacidade
adaptativa e capacidade dirigente; e (c) ‘próximas das tradicionais’, como
competitividade e apresentação física); (2) competências técnicas (línguas,
informática, competências especializadas e genéricas) e (3) competências formais
(basicamente a formação escolar). A experiência prévia de trabalho complementa as
competências, sendo considerada como uma variável ‘de ligação’ entre as
competências formais e as não formais, e indica para os empregadores,
simultaneamente, a presença de competências técnicas (aprendidas na trajetória
profissional) e sociais (resultante da socialização no mundo do trabalho).

Sumariamente suas conclusões gerais são as seguintes:

 No que se refere às competências do tipo ‘informal’, ao longo do período


analisado, houve o crescimento da demanda por competências classificadas na
categoria de ‘novas’, e ‘próximas da tradicional’, mas isso sem detrimento
significativo das solicitações por competências classificadas como ‘tradicionais’.
Tal fato indica que os empregadores estão compondo suas exigências a partir do
somatório dos diversos vetores: “um bom testemunho da coexistência de
competências tradicionais com competências novas está no aumento simultâneo
dos pedidos de capacidade de autonomia e de capacidade racional/burocrática
para as atividades de apoio à direção da empresa.” (GRACIO, 2001, p.19).

62
Gracio também parte do pressuposto de que os anúncios de emprego funcionam de forma similar ao
‘mercado matrimonial’, onde as empresas, ao anunciarem, se colocam “numa relação de troca com os
potenciais candidatos. Nesse sentido (...) as empresas oferecem a quem pretendem recrutar vantagens
determinadas, procurando, face a eles, valorizar os seus recursos, apresentando nomeadamente os que
mais as favorecem. O objetivo é o de recrutar candidatos eles próprios detendo recursos determinados,
implicitamente considerados de nível semelhante ou equivalente ao da empresa no mercado em questão”
(GRACIO: 2001, p. 10).
10 2

 Já no que se refere às competências técnicas, apenas o domínio de informática


apresenta incremento para o conjunto dos dados. Já as demais sofrem redução
(ainda que setorialmente possa haver crescimento das demandas por idiomas por
exemplo).

 No tocante às competências formais (mensuradas pela formação escolar) verifica-


se “importantes alterações nas preferências das empresas anunciantes” (ibidem, p.
20). Entre estas possui destaque a elevação da demanda por licenciaturas e a
redução por bacharelados, que perdem espaço também para os detentores do 12º.
ano via de ensino. Segundo o autor, esse fato pode estar refletindo a “explosão do
número de licenciados pelo ensino superior entre as duas datas” (ibidem, id.), o
que pode ter incentivado aos empresários a elaborar estratégias de recrutamento
que combinam maior escolaridade e menores salários. Mas o que mais chama
atenção é a redução da indicação de demanda por escolaridade nos anúncios, que
cai de 70,4% dos casos em 1989 para 68,7% em 1997. Esta redução, por sua vez,
ocorre concomitante ao crescimento da demanda por qualidades pessoais e
conhecimentos de informática, acrescido ainda por um aumento, ainda que suave,
das exigências por experiência. Para Gracio, “estes resultados sugerem uma
evolução bastante moderada entre as duas datas em direção ao aumento da
importância das competências dos candidatos não escolarmente sancionadas,
face às competências escolares. (...) Contudo, deve assinalar-se que isto ocorre
num período em que aumenta pronunciadamente o volume de capital escolar
disponível.” (ibidem, p. 22)

Ao que tudo indica, as conclusões obtidas por Gracio na análise do que conta no
momento do recrutamento dos ‘quadros’ em Portugal caminham na direção já
apontada por Goldthorpe (1997; 2003), qual seja, ao mesmo tempo em que
credenciais escolares de níveis mais elevados tornam-se mais acessíveis aos
indivíduos, elas deixam de ser suficientes como ‘fonte de informação’ para os
empregadores. Na incerteza que atravessa o momento pré-contratação, atributos
pessoais ou qualificações não formais, sejam elas classificadas como novas ou como
tradicionais, passam a ser mais considerados como indicativos da capacidade
produtiva e adaptativa, ainda que o seu recurso venha acompanhado por um discurso
que as justifica como imprescindíveis face às transformações nos estilos de
concorrência entre firmas e na internacionalização da economia, na transformação na
10 3

natureza dos produtos e processos, na intensificação dos ritmos de trabalho, na


redução das hierarquias, e por tantas outras variáveis de mudanças que tem vez nos
processos produtivos. Não há dúvidas de que os empregadores na sua gestão das
qualificações e das competências, e portanto do que faz o mérito, buscam se adaptar
a estas mudanças, mas também não se pode negligenciar que estas possibilidades de
criação de exigências mais elevadas só se colocam quando há uma base consistente
e disponível de capital educacional a partir da qual as demais se sobrepõem.

2.2.3. O mérito ampliado: contribuições dos estudos ingleses

Outro estudo bastante relevante no que se refere à natureza da demanda dos


empregadores expressa através de anúncios de emprego foi desenvolvido por
Jackson e também apresentado em 200163. Empenhada em discutir a validade da
hipótese de seleção por mérito (MS) como principal elemento ordenador do
preenchimento das ocupações no mercado de trabalho, a autora analisa o conteúdo
de 955 anúncios de empregos veiculados nos jornais britânicos, recolhidos durante os
meses de fevereiro e março de 2000. A questão fundamental consiste em identificar
que fatores estão envolvidos na composição do ‘mérito’ tal como os empregadores o
definem.

O ineditismo do trabalho está na re-elaboração do conceito de mérito que, ao invés de


considerar apenas as credenciais escolares da forma como usualmente é feita pelos
estudos sociológicos que tratam da mobilidade, passa a incorporar também todos os
atributos ou capacidades que de alguma forma possam ser ‘adquiridos’ pelos
indivíduos64. Dessa forma, a autora formula duas definições de mérito: a primeira,
apresentada como “narrow merit selection hipoteses”, considera tanto as qualificações
educacionais formais quanto outras habilidades que possam ser classificadas como
medidas de habilidade e esforço (habilidades cognitivas e comprometimento com o
trabalho, por exemplo). A segunda definição amplia o conceito de mérito para o que
ela denomina de “broader merit selection hipoteses”, para dar conta de todos os
atributos ou capacidades que possam, de algum modo, vir a ser adquiridos pelos

63
Jackson, Michelle. “Meritocracy, Education and Occupational Attainment: What Do Employers
Really See as Merit?” Paper Number 2001-03. Sociology Working Papers.
64
Jackson parte da definição de mérito formulada por M. Young em seu clássico livro ‘The Rise of
Meritocracy’ (1958). Este livro, descrito como uma “ficção sociológica” ou ainda como uma sátira à
sociedade ordenada com base no mérito, inaugurou a elaboração do conceito de “meritocracia” tal como a
conhecemos hoje. Para Young, o mérito é resultante da soma de inteligência (QI) e esforço (E): QI + E =
M.
10 4

indivíduos (habilidades ou conhecimentos técnicos entram nesta categoria) mas que


usualmente não são consideradas nos estudos que tratam da mobilidade e do mérito
em sua forma mais restrita.

Isolados os atributos meritocráticos (tanto na sua acepção estreita quanto ampla),


cabe então investigar o lugar dos atributos não meritocráticos (que inclui experiência,
habilidades sociais e características pessoais) nos anúncios e identificar em que
medida os primeiros seriam mais relevantes do que os segundos para determinar as
chances de obtenção das vagas ofertadas.

A análise é feita comparando a distribuição destas variáveis ao longo de nove grupos


ocupacionais65 e o resultado geral a que a autora chega é de que, apesar de se
verificar que características adquiridas (qualificação e demais medidas de QI +
esforço) sejam demandadas por um número significativo de empregadores,
especialmente quando se trata dos postos mais elevados na classificação
ocupacional, isto não elimina a presença substancial dos critérios ‘não meritocráticos’
nas demandas: “Mesmo onde as características de mérito conquistado (achieved) são
enfatizadas, elas parecem ter valor em combinação com outros tipos de características
demandadas.” (JACKSON: 2001, p. 19 – tradução própria)

No processo de pré-seleção, o que os empregadores contam como ‘mérito’ não


corresponde necessariamente à definição que os sociólogos utilizam (conclusão
partilhada por Gonzáles e Prado, conforme visto anteriormente), especialmente
quando elaboram os estudos de mobilidade. Para diversas ocupações analisadas na
pesquisa, as qualificações educacionais têm pouca relevância. E mesmo para aquelas
que se situam no topo da pirâmide ocupacional, a demanda por qualificações
acadêmicas pode se mostrar bastante restrita nos anúncios de emprego estudados66.
É o caso, por exemplo, da categoria de gerentes (managers and senior officials), onde
as referências a qualificações formais de escolaridade estão presentes em apenas
15% da amostra.

65
São eles: (1) managers and senior officials; (2) professional occupations; (3) associate professional and
technical occupations; (4) administrative and secretarial occupations; (5) skilled trades occupations; (7)
sales and costumer service occupations; (8) process, plant and machine operatives; e (9) elementary
occupations.
66
Exceção apenas para as ocupações profissionais, onde 75% dos anúncios apresentam algum tipo de
exigência por qualificações acadêmicas. Para todas as demais categorias, este tipo de demanda não se
faz presente em mais do que 16% dos anúncios.
10 5

Os empregadores estariam conscientes de que as qualificações são apenas uma,


entre várias outras características que possuem valor de mercado, e em alguns casos
elas podem ser menos relevantes do que as outras. Mas o que vale ser ressaltado é o
fato de que certas competências ou habilidades sejam mais acessíveis a certos grupos
sociais do que a outros, por serem mais ‘herdadas’ ou atribuídas do que
‘conquistadas’:

“Por exemplo, qualidades de liderança são essenciais para as posições de


gerência, e tais qualidades são frequentemente orientadas através de padrões
específicos de criação, educação, e experiências de classe.” (JACKSON: 2001,
p. 20 – tradução própria)67

E continua reforçando o argumento:

“É possível que “os tipos de habilidade que resultam em sucesso ocupacional,


mas não adequadamente identificadas por medidas de educação, são possuídas
desproporcionalmente por aqueles que nasceram com relativa vantagem de
backgrounds de classe...”.” (MARSHALL et al. 1997; apud JACKSON: 2001, p.
20 – tradução própria).

Assim, se os empregadores consideram atributos não meritocráticos nos julgamentos


que fazem sobre os candidatos ao preenchimento das vagas abertas no mercado de
trabalho, isso poderia explicar, ao menos em parte, a persistência das desigualdades
de chances de mobilidade, mesmo após as crescentes ondas de democratização da
educação.

Jackson menciona, embora sem aprofundar, o aspecto relativo ao maior espaço


reservado à subjetividade dos recrutadores em contextos de recrutamento nos quais
os atributos não meritocráticos - especialmente aqueles que apontam para o
julgamento de características pessoais e habilidades de comunicação - passam a ter
valor. Esse fato pode contribuir para a maior incidência de ‘vieses’ que venham a
reforçar as posições de classe dos candidatos face às vagas, em conformidade com
as avaliações e com a situação de classe dos empregadores ou de seus
representantes (profissionais de RH, intermediários, ‘head-hunters’, etc.)68.

67
Conclusão idêntica à percebida por Lazuech (2000) no seu estudo sobre os ‘cadres’, como já visto
anteriormente.
68
Lazuech (2000) acrescenta que as qualidades que são requeridas ou desejadas pelos empregadores
em relação aos candidatos não são simplesmente um somatório de atributos. Entre elas se coloca uma
hierarquização ou uma modulação que varia segundo o posto de trabalho em questão. Mesmo aquelas
que são conectadas com a ‘personalidade’, a sua avaliação é sensível a uma hierarquização dos saberes
10 6

Os resultados obtidos por Jackson são posteriormente recuperados e ampliados em


sua análise, contando com a contribuição de Goldthorpe e Mills em 2002.69 Neste
novo paper o foco continua sendo colocar sob suspeita a visão de que, por ‘exigências
funcionais’, a distribuição dos indivíduos nas sociedades modernas seria cada vez
menos determinada pelas suas origens (adscrição), e mais pelo seu grau de
conhecimentos aplicáveis nos processos produtivos. Em uma sociedade baseada no
conhecimento, ou pós-industrial, a educação tenderia a jogar um papel determinante
das chances de inserção no mercado de trabalho e na composição do destino dos
sujeitos:

“Segundo a teoria, as exigências funcionais do progresso tecnológico e a


eficiência econômica nas sociedades modernas deverão conduzir ao
crescimento da mobilidade intergeracional, na qual a expansão e a reforma dos
sistemas educacionais têm um papel crucial.” (JACKSON, GOLDTHORPE,
MILLS: 2002, p. 3 – tradução própria).

No entanto, como demonstram os resultados de pesquisas anteriores realizadas pelos


autores (particularmente por Breen e Goldthorpe em 2001), os efeitos das
qualificações educacionais nas chances de obtenção das posições sociais vem se
reduzindo ao longo dos anos, contrariando a hipótese de seleção por mérito:

“Apesar dos efeitos das qualificações educacionais permanecem importantes,


eles não aumentam com o tempo, como a teoria liberal prediz, ao contrário eles
decrescem.” (ibidem, p. 10)

Em relação especificamente aos postos gerenciais (general managerial occupations e


managerial), encontra-se a presença de requerimentos associados a esforço,
experiência, habilidades sociais e características pessoais em maior proporção do que
os que apontam para as qualificações formais:

“Exemplos aqui devem incluir não somente as solicitações por habilidades atuais,
tais como “boa capacidade de comunicação”, “potencial de liderança” e
“habilidade para trabalhar em equipe”, mas também inclui atributos que se

e do ‘saber-fazer’ que se relaciona com o posto pretendido. Além disso, a própria avaliação não apenas
varia de um posto ao outro, mas também de um recrutador a outro, “porque cada um deles não têm
exatamente a mesma idéia do que é “destreza”, “motivação” ou “adaptabilidade”. (LAZUECH: 2000, p. 8 –
tradução própria)
69
Jackson, Michelle; Goldthorpe, John H.; Mills, Colin. “Education, Employers and Class Mobility”.
Paper prepared for the Oxford meeting of the International Sociological Association, Research Committee
28, Social Stratification and Mobility. April, 2002.
10 7

referem menos ao que os indivíduos podem fazer do que ao que eles parecem,
tais como ser “bem apresentado” ou “bom orador” ou tendo “boa aparência”,
“boas maneiras”, “caráter” ou “presença”.” (ibidem, p. 20 – grifo dos autores).

Diante destas evidências, a questão posta e por responder refere-se à busca de


explicações do por quê a educação falhou em proporcionar, de forma consistente, a
mediação para a mobilidade de classe. Neste ponto os autores consideram um fator
que normalmente é negligenciado nos estudos que tratam de mobilidade, qual seja, a
ação dos empregadores (e de seus agentes) como fundamental na determinação do
valor da educação e dos demais atributos que são considerados nos processos
seletivos.

Trazendo os empregadores e o peso que a educação ocupa nos seus processos


decisórios para o centro da dinâmica do mercado de trabalho e das chances de
mobilidade, caberia identificar: (a) de que forma a educação entra nas decisões
pessoais que são tomadas por eles em relação à contratação, promoção e demissão;
e (b) o que realmente importa nas condições sobre as quais tais decisões são
tomadas.

Em relação ao primeiro ponto, os autores recuperam os argumentos presentes nas


teorias da ‘sinalização’ e do ‘credenciamento’ para explicar a forma pela qual os
empregadores avaliam o mercado de trabalho. Assim, assume-se que se de um lado é
verdadeiro que para muitas ocupações um tipo específico de conhecimento ou de
expertise é necessária para o seu exercício (e o diploma neste caso seria a prova
cabal da capacidade do indivíduo para exercê-la), para muitas outras profissões ou
situações ocupacionais, o que está em questão é menos a capacidade “técnica”
objetivamente descrita, mas sim a posse de certos atributos que possam informar
sobre a capacidade produtiva futura dos trabalhadores:

“Por exemplo, alta motivação e perseverança, a capacidade de “mostrar


gratidão”, ou a habilidade para aprender rápido e comunicar-se bem. Em outras
palavras, o empregador pode estar interessado nos resultados educacionais dos
indivíduos não, ou não somente, por ter um valor produtivo neles mesmos, mas
antes como base para fazer inferências sobre outros atributos vistos como
desejáveis nos potenciais empregados.” (JACKSON, GOLDTHORPE, MILLS:
2002, p. 12 e 13).

Já no que concerne ao segundo ponto – a forma como são condicionados os usos da


educação pelos empregadores – o que aparece em causa é a relação entre a oferta
10 8

e a demanda educacional. A revolução educacional, fortemente orientada pela teoria


liberal de que o sistema produtivo demandaria pessoas mais qualificadas, logrou
tornar disponível uma força de trabalho qualificada em larga escala. Porém, a
demanda por educação da parte dos indivíduos acabou sendo superior à demanda
dos empregadores ou da estrutura de empregos. Como conseqüência, o papel jogado
pela educação na mobilidade de classe, ao invés de se fortificar, estaria tendendo ao
declínio porque,

“Nas condições correntes de oferta de educação e demanda dos empregadores


por ela, os empregadores têm boas razões para dar menos peso à educação do
que faziam anteriormente ao tomar suas decisões pessoais. Qualificações
educacionais têm, nesse sentido, menos uso para eles se tomadas como
significante de certificação ou sinalização.” (ibidem, p. 13).

O incremento expressivo da oferta de ensino teve como efeito reduzir o potencial


informativo das credenciais escolares para os empregadores. No máximo, o sinal hoje
é lido inversamente: na sua ausência como indicativa de uma menor chance de
inserção no mercado de trabalho (fator de rejeição antes que de escolha, como
apontado por Louart, 2001).

Ao mesmo tempo, a ampla diversificação da oferta de qualificações trouxe, para os


futuros empregadores, um problema de ‘confiança’ em relação às informações que se
atribuíam às credenciais como sinalizador. As diferentes modalidades de formação e
de níveis educacionais passam a ser interpretados como ‘ruídos’ que interferem na
avaliação dos atributos não observáveis que os empregadores desejariam em relação
aos seus futuros empregados. Dessa forma, se as credenciais escolares (ou a
qualificação) perdem seu valor como sinal, outros marcadores substitutos serão
buscados, e entre estes estão tanto os que se relacionam com a própria educação
(como, por exemplo, a exigência de um determinado tipo ou nível de escolaridade, de
certa área de conhecimento, de um determinado tipo de instituição) quanto os que
apontam para características adscritas (que indicam background sociais ou atributos
pessoais, sejam eles de natureza física, psicológica ou cultural).

Já o incremento da demanda dos indivíduos por educação reflete a convicção de que


esta seria o passaporte para o preenchimento das vagas criadas na nova estrutura
ocupacional – o que não deixa de ser verdadeiro em contexto de inflação de diplomas.
Ocorre que, ao contrário do que se supõe, ainda que as ocupações ligadas à
10 9

economia do conhecimento estejam crescendo (e estas exigem uma força de trabalho


mais educada e treinada), o que se observa é um maior incremento das ocupações
ligadas à provisão de serviços pessoais (atividades que envolvem o lazer, o
entretenimento, os cuidados com a saúde, vendas e serviços ‘personalizados’, etc.) e
nestas, o papel que a educação assume na certificação das competências relevantes
para o desenvolvimento das atividades freqüentemente é limitado. Para os
empregadores, mais importante do que o diploma, é a presença de atributos tais como
‘boa aparência’, ‘estilo de vida’, ou o ‘looking good and sounding right’ - capacidades
que são personificadas pelos indivíduos e que muitas vezes estão diretamente
associadas ao meio social de origem.

Diante deste quadro, o que os autores concluem é:

“Em suma, a atenção que os empregadores dão à educação em seu papel de


certificador tanto como de sinalizador parece estar sendo, nas sociedades
modernas, crescentemente variável. Para alguns tipos de ocupação,
qualificações formais serão cruciais. Mas para outros tipos – e as que estão
claramente em crescimento – tais qualificações terão menor significância e maior
relevância será atribuída ao conjunto de outros atributos, incluindo aqueles que,
ao menos a partir do ponto de vista da teoria liberal, devem ser vistos como
características ‘não-meritocráticas’: isto é, atributos que, mais do que adquiridos
através da habilidade e do esforço exibido no sistema educacional – ou em outro
lugar – são adquiridos em maior ou menor grau através da socialização na
família ou comunidade.” (JACKSON, GOLDTHORPE, MILLS: 2002, p. 16 – grifo
dos autores)

2.2.4. A ação dos intermediários: as investigações francesas e estudos


comparativos

Na tradição francesa da sociologia e economia das convenções, Marchal e Torny


(2002), debruçam-se sobre os anúncios de emprego com uma preocupação bastante
diferente das anteriores, embora seus estudos também forneçam material para que se
pense sobre a associação entre escolaridade, ingresso no mercado de trabalho e
novas concepções de mérito. Para eles, a questão fundamental a pesquisar consiste
na identificação das convenções que regulam o mercado de trabalho e na ação
decisiva dos intermediários na sua produção70, tendo como conseqüência a definição

70
A questão dos intermediários e seu papel no mercado de trabalho é abordada por Eymard-Duvernay F.
e Marchal E. em trabalhos anteriores, tais como Façons de recruter: le jugement des compétences sur
le marche du travail. Paris, Métailie 1997 e por Eymard-Duvernay F.; e Bessy, Christian. Les
intermédiaires du marché du travail. Presses universitaires de France, 1997.
11 0

de um modo determinado de pensar e de expressar a valorização do trabalhador e das


empresas recrutantes. Assumem que a competência dos indivíduos não é um dado
substantivo que se possa mensurar em sua totalidade. Antes, ela tem um “caráter
convencional e necessita, por esta razão, um acordo sobre o que faz seu valor, sobre
as pessoas e as ferramentas capazes de defini-lo e atestá-lo.” (MARCHAL &
RIEUCAULT: 2004, pág. 6 – tradução própria).

O segundo ponto de interesse da pesquisa consiste em verificar em que medida o


mercado de trabalho francês, nos seus processos seletivos, estaria se tornando mais
eqüitativo ao longo do tempo. Para tanto os autores elaboram séries históricas onde
recuperam anúncios desde os anos 1960 até 2000, publicados em 8 jornais franceses
de circulação nacional e local (totalizando 2.350 anúncios) e dissecam o seu texto e
forma de apresentação, identificando variações no que diz respeito a: (a) formato dos
anúncios (tamanho, presença de ícones gráficos, natureza da mensagem); (b) formas
de estabelecimento de contato entre os candidatos e as empresas; (c) posto de
trabalho e perfil dos candidatos; (d) competências e capacidades que são requeridas
dos candidatos e informações sobre as empresas recrutantes; e (e) nomenclatura dos
cargos que são propostos.

No que se refere às exigências que os contratantes fazem aos candidatos em relação


aos atributos que podem ser, de alguma forma, indicadores do mérito em sua
concepção mais estreita (experiência, escolaridade e conhecimentos de idiomas e de
informática), a pesquisa revela o seguinte:

 Com o passar do tempo, tem havido um aumento significativo nas demandas por
experiência prévia (em 1960 apenas 14% dos anúncios mencionavam este
aspecto, em 2000 chega a 66%), que é sobretudo expressa sob a forma de
experiência qualificada (primeira experiência, boa experiência, significativa) e
também a partir de uma duração determinada (definindo os anos de experiência
demandados).

 Paralelamente verifica-se também a maior exigência por formação escolar (em


1960 apenas 13% dos anúncios continham essa variável, em 2000 chega a 55%).
Sendo que esta é mais fortemente explicitada em termos de nível de formação
11 1

(secundária, superior, etc.) ou do tipo de diploma (diploma universitário, ‘grandes


écoles’, etc.71).

 Há um incremento contínuo de exigências que combinam a formação escolar e a


experiência e, em oposição, uma redução significativa de anúncios que não
demandam nem experiência nem formação (estes, em 1960 chegavam a três
quartos dos anúncios, e em 2000 somam pouco mais de 20%): “a comparação dos
corpus mais recentes (1990 e 2000) nos mostra que a formação e a experiência
são critérios de pré-seleção dos candidatos cada vez mais frequentemente
mobilizados.” (MARCHAL & TORNY: 2002, p. 65 – tradução própria)

 No tocante do domínio de línguas estrangeiras, após o ano de 1980 há um


incremento considerável dos anúncios que contêm essa variável (em 1960 apenas
9% dos casos faziam menção a essa questão, em 1980 o percentual passa para
19% e em 2000 chega a 27%), e o inglês é o idioma mais demandado.

 Em menor proporção observa-se a demanda por conhecimentos genéricos de


informática, que no ano 2.000 se faz presente em apenas 13% dos anúncios.

Marchal e Torny também fazem um levantamento das exigências que são feitas em
relação às características pessoais dos candidatos e que dificilmente podem ser
identificadas como meritórias. Afirmam que em relação a estas, a sua presença nos
anúncios é um fenômeno recente, que se mostra mais intenso em determinados
jornais (suportes) do que em outros. Além disso, são expressas em formatos muito
variados, que servem tanto para valorizar o posto quanto o candidato e mesmo a
empresa:

“Assim, certos anúncios listam as qualidades solicitadas aos candidatos após os


critérios de formação ou de experiência. Estas qualidades aparecem, então,
como exigências entre outras, vindo a se acrescentar ou a substituir os critérios
clássicos de seleção. No entanto, seu emprego não é sempre claro. Em outros
anúncios, as qualidades são apresentadas como características da cultura da
empresa que recruta ou das pessoas que lá trabalham. (...) Em outros ainda, as
qualidades são mencionadas para sinalizar ao candidato que ele dispõe de
perspectivas de evolução, caso ele se confirme capaz de mobilizá-las. As

71
Os autores apontam ainda que, no que diz respeito aos diplomas das ‘écoles’, os pedidos por
certificados das “escolas de engenharia estão regredindo bastante; já os das escolas de comércio e as
escolas ‘profissionais’ apresentam grande aumento em 1990 e sobretudo em 2.000.” (MARCHAL &
TORNY: 2002, p. 63 – tradução própria)
11 2

qualidades podem, portanto, ser citadas pela descrição direta do candidato


procurado ou, indiretamente, por intermédio da descrição do cargo ou das
pessoas da empresa. Elas servem tanto para formular exigências quanto para
valorizar a proposta de emprego.” (MARCHAL & TORNY: 2002, p. 72 – tradução
própria)

No que consiste ao conjunto de anúncios publicados em 2000, as cinco capacidades


mais citadas são: engajamento (13%); trabalho (11%); autonomia (10%); relacionais
(9%) e de cooperação (7%)72.

Ao longo do tempo, o que se observa é o crescimento do montante de anúncios que


demandam pelo menos uma capacidade: em 1960 eles não passavam de 16%, já em
2000 chegam a 61%. Esse incremento significativo resulta tanto das transformações
que incidem sobre o tamanho dos anúncios (quanto maiores, maior a quantidade de
exigências), como também reflete a presença da ação de intermediários na sua
elaboração (anúncios publicados por intermédio de empresas de recrutamento ou
agencias de comunicação tendem a ser mais exigentes em relação às qualidades
pessoais).

Por fim, o que os autores percebem é que há uma correlação positiva entre exigências
por capacidades pessoais e demandas por formação escolar; e uma correlação ainda
mais forte entre demandas por capacidades pessoais e por experiência. Ou seja,
anúncios que exigem formação e/ou experiência tendem a exigir também qualidades
pessoais. Em revanche, a ausência de exigências de formação e/ou de experiência é
inversamente correlacionada à citação das qualidades. As características pessoais,
portanto, não substituem os critérios mais objetivos de seleção dos candidatos
expressos pela formação ou pela experiência:

“Nós podemos, ao contrário, afirmar que a valorização dos candidatos pela


acumulação de qualidades vem, hoje em dia, se somar às exigências fundadas
em termos de experiência e formação.” (ibidem, p. 78).

Posteriormente (2003), Marchal e Torny, agora com a contribuição de Rieucau73, dão


continuidade à pesquisa utilizando uma nova fonte de veiculação de anúncios (ou

72
Outras categorias de capacidades que aparecem com menor freqüência são: deslocamento (6%),
experimentais (4%), empreendedoras (4%), de direção (4%), de inovação (3%), de análise (3%) e de
adaptação (2%).
73
Marchal, Emmanuelle; Rieucau, Géraldine; Torny, Didier. Des standards nationaux à l´épreuve
d´Internet – sites et offres d´emploi en France, Espagne et Grande-Bretagne. Rapport de Recherche
n. 12 – CEE. Septembre, 2003.
11 3

suporte): a Internet. Eles buscam neste recente trabalho desenvolver uma perspectiva
comparada dos anúncios que são apresentados em sites de emprego na França, na
Espanha e no Reino Unido. Uma de suas preocupações centrais consiste em avaliar
se a Internet estaria modificando a estrutura dos mercados de trabalhos locais,
levando ao desaparecimento progressivo dos mercados nacionais em prol de um
vasto mercado mundial (MARCHAL et all: 2003, p.9).

A partir da coleta de anúncios em diversos sites (ao todo são computados 1.200
anúncios, durante o ano de 2001, sendo 400 em cada país), a pesquisa visa
responder a esta questão, também considerando como fundamental a presença dos
sites como mais um dispositivo de mediação entre os candidatos e as vagas. Assim,
averiguar em que medida as informações que são apresentadas nos anúncios
veiculados na Internet seriam mais favoráveis aos candidatos (como por exemplo a
maior presença de informações detalhadas sobre os postos, as relações de trabalho,
salário, entre outras, comparativamente à imprensa) ou, ao contrário, estariam sendo
mais fortemente utilizadas para multiplicar as exigências sobre os candidatos
postulantes a favor da empresa é outra interrogação que atravessa a pesquisa.

As principais conclusões a que chegam os autores é de que, a despeito da aparente


semelhança entre os anúncios que são veiculados nos três países, especialmente no
que diz respeito ao seu formato relativamente padronizado (todos possuem campos
específicos de apresentação do título da vaga, da demanda por experiência, das
qualidades pessoais requeridas, etc.), a análise do conteúdo faz aparecer diferenças
que devem ser imputadas à natureza da organização dos mercados de trabalho locais
assim como às características institucionais de cada nação.

Na França, por exemplo, que se caracteriza pela predominância de um mercado


interno de trabalho, as exigências quanto ao perfil dos candidatos (especialmente no
que se refere à formação) estão significativamente mais presentes do que nos outros
dois países. Por oposição, na Grã-Bretanha, onde o mercado de trabalho é
caracteristicamente reconhecido como sendo do tipo externo, há uma menor exigência
quanto ao perfil dos candidatos e um maior detalhamento quanto ao conteúdo do
posto de trabalho, das vantagens ofertadas e dos conhecimentos necessários. Já na
Espanha, os critérios associados à identidade do candidato (sexo, idade) são
encontrados em maior proporção (enquanto estes estão quase ausentes na Grã-
11 4

Bretanha), assim como a demanda pelo domínio de idiomas (notadamente o inglês).


Nesse país a exigência por formação também é considerável, embora com menor
ênfase do que na França. Esta distribuição diferenciada indica que nos dois países
latinos há um forte trabalho na etapa de pré-seleção, que elimina de saída um
contingente determinado de candidatos; coisa que não se verifica na Grã-Bretanha
com a mesma intensidade. Tais resultados permitem inferir diferenças significativas
nos modos de seleção que são postos em ação em cada país:

“Que os Britânicos não se demorem a descrever o perfil dos candidatos nos


anúncios é algo que permite supor que eles recrutem de outra forma. A seleção
é deslocada no tempo; ela é mais frequentemente realizada por agências com
base em testes ou em entrevistas onde o candidato é colocado diante de
situações problema.” (MARCHAL & RIEUCAULT, 2004, p. 12 – tradução
própria).

Enquanto isso, no Reino Unido, critérios associados à identidade do candidato e


mesmo à formação são julgados como ‘incorretos ou impertinentes’, de forma que a
sua eliminação se coloca em momentos ulteriores74.

Por fim, acrescenta-se ainda que a comparação (realizada apenas para o caso
francês) entre os anúncios veiculados na imprensa com os que circulam na Internet,
revela que há uma maior presença de exigências formuladas sobre o perfil dos
candidatos (idade, formação, experiência, conhecimentos e qualidades pessoais)
quando os anúncios são apresentados na ‘rede’ do que quando são apresentados ‘em
papel’; concomitantemente há uma menor proporção de informações destinadas a
esclarecer as condições de emprego (salário, tempo de trabalho, benefícios, local da
vaga)75 quando os anúncios são ‘virtuais’.

74
A intolerância a critérios discriminatórios deve ser vista também como resultante da eficácia do
aparelho jurídico de cada país. A ‘igualdade de oportunidades’ é uma questão que se coloca muito mais
para a Grã-Bretanha do que para a França ou a Espanha, a tal ponto que os anúncios chegam a conter o
sinal inverso de critérios de discriminação, como no exemplo a seguir: “Nós damos particular boas vindas
às candidaturas de negros e grupos de minorias étnicas e de pessoas com deficiências que são
correntemente sub representadas na força de trabalho.” (Jobs unlimited, 2001)”. (MARCHAL &
RIEUCAULT: 2004, p. 13 – tradução própria)
75
Os autores ressaltam que os anúncios na Internet, mais do que na imprensa, favorecem uma seleção
“a priori”, destinada a filtrar o máximo os candidatos, tornando o processo seletivo mais eficaz,
especialmente pela presença de rubricas ou de ‘campos’ que estruturam a entrada de informações sobre
as vagas (escolaridade, salário, idade, etc.). Dessa forma, a elevação quantitativa dos critérios de seleção
pode ser imputada ao menos parcialmente à presença destas rubricas, mais do que à necessidade real
do posto que está sendo ofertado. Nos sites franceses e espanhóis, a rubrica ‘formação’, por exemplo,
está presente na quase totalidade desses, o que não ocorre nos sites ingleses, o que indica a menor
pertinência que é dada a este indicador na avaliação das competências durante o recrutamento. Assim,
se a especificidade dos anúncios britânicos reside exatamente na menor intensidade dos critérios de
11 5

O que se pode inferir do trabalho dos autores é que a vocalização das demandas, no
que diz respeito às competências que podem ser adquiridas via esforço e que seriam
indicativas do mérito, também estão sujeitas à ação do que se considera justo ou
legítimo como critério de seleção (inclusão/exclusão) em cada sociedade e em cada
momento histórico.

Tanto as ‘provas de seleção’ que são utilizadas no processo de recrutamento (tais


como testes psicológicos, exames grafológicos, entrevistas, dinâmicas de grupo, etc.)
quanto as substâncias que atestam o mérito, são alvo de lutas sociais, que conferem
maior legitimidade a umas (como a formação escolar na França) e cerceia outras
(como as exigências de sexo e idade na Grã Bretanha, inclusive por meio de uma forte
regulamentação jurídica)76. Os contratantes (empregadores ou seus intermediários) ao
mesmo tempo em que estão sujeitos a estas regras também contribuem para a sua
produção e relativização, na medida em que buscam fazer valer os seus interesses.
Com isso, não raro, operam diversos processos de ‘deslocamento’ em relação às
provas instituídas (pela transformação nos dispositivos e suportes das provas), ao
mesmo tempo em que criam novas substâncias (demanda por experiência
internacional, trabalho associativo, domínio de idiomas, entre outros).

Assim, se os anúncios de emprego publicados na mídia impressa estão sujeitos à


fiscalização e não podem comportar qualquer critério que remeta à exclusão de grupos
sociais (sexo, idade, religião, residência, etc.), a possibilidade de veiculação das vagas
na Internet devido à criação de bancos de emprego (job boards) pode apresentar uma
brecha ou um ‘escape’ a esta regulamentação, comportando a existência de campos
de informação que resgatam critérios de composição do perfil dos candidatos que na
mídia impressa não são permitidos. Por outro lado, quando esses suportes também se
tornam alvo de regulamentações, o deslocamento pode se dar via inclusão de ‘filtros’
no recebimento dos currículos.

Um bom exemplo deste processo pode ser buscado em um caso brasileiro: em um


dos sites de emprego que pesquisamos, é parte da política da empresa (que se diz

formação, isto também reflete um determinado modo de funcionamento das relações de trabalho que são
vigentes neste país que se traduz, entre outras coisas, pela estrutura de entrada de dados do anúncio.
76
Na França o uso de testes grafológicos é muito mais disseminado nos processos seletivos, ao passo
que nos EUA este tipo de prova é desqualificada por ser pouco ‘científica’.
11 6

sujeita à fiscalização do Ministério do Trabalho) não permitir a veiculação, no corpo


dos anúncios, de nenhum critério que possa ser interpretado como discriminatório. No
entanto, os seus clientes insistem em incluir no perfil das vagas tais requisitos. Para
solucionar a questão, atendendo às solicitações dos anunciantes, foram criados ‘filtros’
para o envio de currículos de candidatos às vagas. Estes não são transparentes ao
candidato, que por sua vez não fica sabendo que o seu currículo foi recusado devido à
incompatibilidade de seu perfil (sexo, idade ou local de residência) com a vaga em
questão. Nas vagas ofertadas para diretores e gerentes, em início de agosto de 2005,
havia a seguinte distribuição de anúncios com filtros:

Tabela 2
Anúncios para executivos que possuem ‘filtros’ para recebimento de currículos
Categoria profissional
Tipo de filtro
Diretor Gerente
Filtro de sexo 1 (1%) 40 (1,6%)
Filtro de idade 10 (14%) 79 (3%)
Filtro de cidade 22 (31%) 285 (11,6%)
Total de anúncios 70 (100%) 2451 (100%)
Fonte: Grupo Catho. Informações referentes ao banco de dados ativo em 8 de agosto de 2005

A exigência pela residência em determinada localidade pode ser interpretada como


estratégia para o não dispêndio com custos de deslocamento caso o candidato venha
a ser selecionado. Já a exigência de filtros em relação à idade pode ser também
conectada ao menor custo dos profissionais mais jovens. Segundo informações
obtidas em entrevista junto ao diretor do Grupo Catho, um fenômeno bastante visível é
a contratação de pessoas mais jovens para ocupar o lugar de executivos que estão se
aposentando ou que estão sendo desligados. E isso não porque os mais jovens
cheguem no mercado com maior competência adquirida nos bancos escolares em
função de trajetórias educacionais mais longas (que incluem pós-graduação), mas sim
porque os seus salários são menores já que estão iniciando a carreira.77

77
Segundo pesquisa realizada pela empresa em julho de 1999 junto a 9.484 pessoas, cada 5 anos a mais
na idade corresponde ao acréscimo de R$ 572,23 na remuneração aferida pelo profissional enquadrado
como ‘executivo’. Em acordo com eles “o executivo maduro ganha de 50 a 100% a mais do que o
executivo jovem, no mesmo cargo e mesmo tamanho de empresa. Identificou-se que a verdadeira razão
pela discriminação da idade no mercado de trabalho é porque os executivos maduros são muito caros.”
(Grupo Catho. Fatores que influenciam a Remuneração dos Executivos. Julho de 1999. Obtido no site da
empresa. p. 2)
11 7

Fatores como idade, aparência, estabilidade familiar78 e relacionamento interpessoal,


que compõem as características pessoais, certamente não podem ser atribuídos ao
esforço ou à habilidade do indivíduo na sua aquisição. No entanto, são todos mais
relevantes do que as promoções obtidas ao longo da trajetória profissional – esta sim
indicadora do esforço e empenho dos sujeitos – na contratação de executivos no
Brasil. É a essa conclusão que se chega a partir da análise da tabela a seguir,
resultado da tabulação das respostas de mais de 31 mil questionários aplicados via
Internet em pesquisa voltada à contração de executivos.

Tabela 3 - Principais fatores considerados na contratação de executivos - 2005


(em ordem de importância média)
Média do fator
Fatores (quanto mais próximo
de 1, mais importante)
1. idade 2,83
2. experiência técnica anterior relacionada ao cargo 5,64
3. formação acadêmica 5,99
4. entusiasmo do candidato 6,39
5. relacionar-se bem com os outros 6,89
6. resultados alcançados anteriormente 7,67
7. reputação das empresas em que trabalhou 7,79
8. aparência pessoal 8,85
9. estabilidade empregatícia 8,99
10. experiência anterior em supervisão de pessoas 9,06
11. resultado nos testes 9,15
12. nível salarial 9,99
13. estabilidade familiar 10,44
14. fluência em inglês ou em outro idioma 10,58
15. capacidade de usar a Internet em seu local de trabalho 10,72
16. experiência em empresas multinacionais 11,28
17. número de promoções anteriores 11,42
Fonte: Grupo Catho - A Carreira dos Executivos Brasileiros - 2005 Pesquisa realizada entre maio e julho de 2005

Adissi (1997) afirma que em se tratando da seleção de executivos, as características


pessoais exigidas dos candidatos subiram, na escala de importância dos
recrutamentos, de 50% para 70% quando se compara os anos 1990 com a década de

78
A estabilidade familiar como um fator relevante para as contratações de executivos pode ser melhor
exemplificada a partir do depoimento de Miriam Adissi, para quem a instabilidade emocional que envolve
momentos de separação ou de crise representa, para o futuro contratante, sinais da possível falta de
capacidade de discernimento do candidato. Em suas palavras: “O fundador da Catho, há anos, aconselha
muita prudência à consultoria, para que nunca seja enviado ao contratante, para possível admissão,
candidato recém separado da esposa. A explicação é que o profissional, vivendo uma ruptura conjugal,
não terá cabeça para decisões importantes em sua carreira.” (ADISSI: 1997, p. 85). No entanto nesta fala
também se nota a forte ação dos intermediários, no caso da presidência da consultoria, em definir quem
tem e quem não tem chances de pleitear o cargo.
11 8

80, ao passo que a capacidade técnica, que segundo ela pode ser desenvolvida e
aperfeiçoada mais facilmente, passou a ter peso de 30 a 40% (pág. 49).

Portanto, quando retomamos as questões que foram apresentadas no início do


capítulo, qual seja, que atributos são relevantes para os empregadores, tomando
como referência os anúncios de emprego, podemos perceber com base nos estudos
mapeados que as características adscritas têm uma posição considerável, e que com
o passar do tempo, as competências que apontam para aquilo que reflete o que o
candidato ‘é’ está sendo mais solicitado no corpo dos anúncios. E isso se torna ainda
mais relevante quanto mais o anúncio é objeto da ação de intermediários do mercado
de trabalho (empresas de comunicação, agências de recrutamento, head-hunters).
Mas tal transformação não se dá à custa dos diplomas ou dos conhecimentos
técnicos, ao contrário, tende a ajustar-se e somar-se a estes. Acresce ainda que a
natureza do conteúdo substantivo que irá definir a forma de expressão dos elementos
adscritos está sujeita a regulamentações que são, por sua vez, resultantes de lutas
sociais em torno do que se considera como legítimo ou não. Cria-se e recriam-se
novas formas de desigualdade no acesso ao mercado de trabalho que vão muito além
do que ‘se sabe’ para situar-se no que se “é” e como se “está”.

Resumo do capítulo

Abrimos o capítulo afirmando que o mérito é um princípio que hierarquiza os


indivíduos na estrutura social e que a sua substância, nas sociedades democráticas
ocidentais contemporâneas é associada às credenciais escolares. Porém, com o maior
acesso ao sistema escolar por parte de contingentes crescentes da população, tais
credenciais estariam perdendo o seu peso na determinação da hierarquização, e
outros conteúdos que poderiam ser interpretados como indicadores do mérito estariam
sendo acionados. A questão então seria identificar quais outros atributos, para além,
concomitante ou no lugar da educação formal estariam sendo considerados como
relevantes para os empregadores.

Para respondê-la afirmamos que uma boa fonte empírica são os anúncios de emprego
publicados na mídia impressa e mais recentemente na Internet. Este é um material
pouco explorado nas pesquisas, especialmente no Brasil. O seu uso, ao mesmo tempo
11 9

em que abre novas possibilidades de investigação sobre o funcionamento do mercado


de trabalho (especialmente no que se refere à ação dos intermediários), também
apresenta algumas limitações, entre elas o fato de serem pouco representativos entre
as diversas fontes de recrutamento existentes (as redes de relacionamento, por
exemplo, são muito mais acionadas para o preenchimento das vagas do que os
anúncios) e o fato de serem muito sucintos no que diz respeito ao tipo de perfil que é
esperado dos candidatos. A despeito disso, os anúncios são uma fonte de informação
muito consultada pelos candidatos e, apesar da sua incompletude, as demandas que
colocam devem ser levadas a sério pelos postulantes.

Na seqüência apresentamos alguns estudos recentes que utilizam anúncios de


emprego como material empírico, destacando nas suas conclusões as interpretações
que são realizadas acerca do peso das credenciais escolares vis-à-vis os demais
requisitos. A primeira pesquisa analisada foi exatamente um estudo brasileiro, focado
no perfil dos trabalhadores para o setor terciário (comércio e serviços), desenvolvida
por Gonzales e Prado. Aqui se verifica que os contratantes fazem pouca menção à
educação, exceção para as ocupações classificadas como pertencentes à área de
tecnologia da informação.

A segunda pesquisa abordada foi desenvolvida por Gracio e se concentrou na análise


dos anúncios de emprego voltados aos “quadros” em Portugal. Para ele tem havido,
com o passar do tempo, um crescimento das demandas por competências do tipo
‘novas’ (como autonomia e capacidade relacional) e ‘próximas das tradicionais’ (como
competitividade e apresentação física), mas sem perda da relevância das
competências do tipo ‘tradicional’ (responsabilidade, orientação para a tarefa, etc.). No
que se refere à demanda por diplomas, o que tem ocorrido é, de um lado, a exigência
de níveis de formação mais elevados e, de outro, uma pequena redução dos anúncios
que fazem referências à formação acadêmica.

A terceira pesquisa considerada foi desenvolvida por Jackson e faz uso de anúncios
de emprego publicados em jornais ingleses. A autora se preocupa em testar a
hipótese de seleção por mérito e elabora para tanto dois conceitos que permitem
capturar a demanda dos empregadores: o primeiro é a versão estrita do mérito (narrow
merit selection), que inclui as qualificações educacionais e outras habilidades que
possam ser adquiridas via esforço; o segundo é uma versão de mérito ampliada
12 0

(broader merit selection) que abrange todas as capacidades ou atributos que possam
ser adquiridos e que normalmente não são considerados nas pesquisas. Conclui que
se de um lado as características que são classificadas como representativas do mérito
(em suas versões estreita e ampla) sejam demandadas por um número significativo de
empregadores, estas não eliminam a presença de critérios não meritocráticos. A
colaboração posterior de Goldthorpe e Mills à análise dos dados obtidos foca a ação
dos empregadores como elemento relevante para explicar o peso e o sentido da
educação no processo de contratação. Concluem afirmando que se para algumas
ocupações o papel dos conhecimentos técnicos (e da escolaridade como atestadora
do domínio destes) é relevante, para muitas outras ocupações do setor serviços o que
tem maior importância é a presença de atributos tais como ‘boa aparência’, ‘estilo de
vida’, etc., as quais não raro estão associadas ao meio de origem.

Finalmente, a quarta pesquisa considerada, desenvolvida por Marchal e Torny,


permite a comparação histórica dos anúncios publicados na imprensa francesa desde
os anos 1960 até o ano 2.000. Além da ação crescente dos intermediários na
transformação dos formatos e conteúdos dos anúncios, o que os autores destacam é o
incremento na quantidade de exigências que são feitas aos candidatos e na
complexificação das mesmas, tanto no que se refere à escolaridade, à experiência e
às competências pessoais. Estas últimas, no entanto, só se tornam mais visíveis a
partir dos anos 1980. Os resultados deste trabalho foram posteriormente utilizados
como base para comparação com uma outra pesquisa desenvolvida a partir dos
anúncios de emprego disponibilizados na Internet em três países: França, Espanha e
Reino Unido. A comparação dos resultados permite inferir que os anúncios, apesar de
terem muitos traços em comum, também revelam modos típicos de funcionamento dos
mercados de trabalho de cada nação, e demandas ou exigências que são feitas em
maior proporção em um determinado país não o são em outro.

Concluímos o capítulo apresentando os resultados de uma pesquisa não acadêmica


brasileira sobre os fatores que possuem relevância na contratação de executivos no
Brasil, evidenciando a força que os atributos não meritocráticos apresentam na
conquista das posições de gerentes, mesmo em situações onde as credenciais
educativas se tornam mais requisitadas.
12 1

No próximo capítulo iremos nos deter na análise das principais transformações pela
qual a categoria sócio-profissional dos gerentes vem passando ao longo dos últimos
anos, o que nos permitirá uma aproximação mais acurada do nosso objeto empírico.
Este mapeamento é de grande relevância uma vez que fundamenta os alicerces para
um discurso (e uma prática) que recompõe o sentido do mérito para este grupo
profissional, conferindo ao conceito novos significantes (sem no entanto abdicar dos
sentidos tradicionais).
12 2

Capítulo 3 – Aproximando do objeto: considerações sobre a


categoria sócio-profissional dos gerentes

Uma das grandes apostas dos analistas e teóricos da sociedade da informação, do


conhecimento ou pós-industrial, consiste na alteração da estrutura ocupacional em
favor dos profissionais mais qualificados. Além de Daniel Bell, já exaustivamente
citado, que indica que no mundo pós industrial as profissões dirigentes, técnicas e
científicas devem se multiplicar mais rapidamente que as demais, outros autores vão
na mesma direção. É o caso, por exemplo, de Manuel Castells (1999), que ao analisar
a estrutura do emprego nos países do G-7, conclui que entre as características
dominantes das ‘sociedades informacionais’ encontra-se:

“a eliminação do emprego rural, o declínio do emprego industrial, a rápida


elevação do emprego para administradores, profissionais especializados e
técnicos, o crescimento simultâneo dos níveis superior e inferior da estrutura
ocupacional e a valorização relativa da estrutura ocupacional ao longo do tempo,
com uma crescente participação das profissões que requerem qualificações mais
especializadas e nível avançado de instrução em proporção maior que o
aumento das categorias inferiores” (CASTELLS: 1999, p. 250 e 251).

No entanto, quando se examina o caso brasileiro, este fenômeno parece ocorrer de


forma muito lenta. Segundo os levantamentos da PNAD, os trabalhadores
classificados no nível superior da estrutura ocupacional (respectivamente os Dirigentes
em Geral e os Profissionais das Ciências e das Artes) experimentaram, ao longo do
período 1998-2004, um crescimento de menos de 1 ponto percentual na sua
representatividade global em relação ao total de trabalhadores ocupados, variando de
9,97% para 10,85% - o quê em números absolutos representa uma ampliação de
pouco mais de 2 milhões de postos de trabalho (ver tabela a seguir).
12 3

Tabela 4 - Pessoas de 10 anos ou mais de idade por grupamentos ocupacionais


do trabalho principal

Crescimento
Grupamentos ocupacionais 1998 2004
(2004/1998)

Dirigentes em geral 2.979.919 4,26% 4.075.008 4,82% 36,75%


Profissionais das ciências e
4.067.907 5,81% 5.102.017 6,03% 25,42%
das artes
Técnicos de nível médio 5.481.910 7,84% 5.957.015 7,04% 8,67%
Trabalhadores de serviços
5.712.122 8,17% 6.884.634 8,14% 20,53%
administrativos
Trabalhadores dos serviços 14.123.485 20,19% 16.772.637 19,83% 18,76%
Vendedores e prestadores de
6.582.866 9,41% 8.251.389 9,75% 25,35%
serviço do comércio
Trabalhadores agrícolas 12.287.711 17,56% 17.607.052 20,81% 43,29%
Trabalhadores da produção de
bens e serviços e de reparação 17.105.454 24,45% 19.236.995 22,74% 12,46%
e manutenção
Membros das forças armadas
600.485 0,86% 654.380 0,77% 8,98%
e auxiliares
Ocupações mal definidas ou
1.014.206 1,45% 55.167 0,07% -94,56%
não declaradas
Total 69.956.065 100,00% 84.596.294 100,00% 20,93%
Fonte: os dados de 1998 foram obtidos na Fundação Carlos Chagas e correspondem a estimativas baseadas no censo
demográfico de 2000. (http://www.fcc.org.br/mulher/series_historicas//tabelas/mteo7.html) Os dados de 2004 foram
obtidos no IBGE, com base na Pnad de 2004.

Estas seriam as posições ou os postos “por excelência” a serem ocupados pelos


profissionais de nível superior – os titulados de longo tempo e os recém formados.
Somente para nos atermos a estes últimos, em acordo com os levantamentos feitos
pelos Censos do Ensino Superior (INEP/MEC) no mesmo período, podemos observar
que o crescimento no número de concluintes foi substantivamente maior do que o
número de postos típico-ideais gerados para estes profissionais: entre 1998 e 2003,
mais de 2 milhões e 400 mil alunos receberam seus diplomas. Deste modo, mesmo
que hipoteticamente todas estas novas vagas fossem ocupadas pelos recém formados
(um recrutamento exclusivamente centrado no mercado externo), ainda assim haveria
um déficit de mais de 400 mil vagas, o que nos leva a concluir que estes profissionais
estão buscando sua inserção nos demais grupos ocupacionais.

Acresce que apesar de localizados no alto da estrutura ocupacional, entre os postos


que são classificados como de “dirigentes em geral” , o credencialismo não se impõe
como uma barreira de entrada instransponível - tal como ocorre para boa parte das
12 4

profissões ligadas às ciências – o que torna a disputa pelos novos cargos mais
acirrada, ainda que não pautada essencialmente nas credenciais escolares.

A este respeito, Helal (200579) analisando o mercado de trabalho dos gerentes no


Brasil, afirma estar em curso, após 1982, a redução do “efeito escolaridade” nas
chances de um indivíduo vir a ocupar um cargo gerencial (mas ressalta que esta
redução é menor do que a ocorrida nas chances de um indivíduo ocupar um emprego
formal). Por outro lado, salienta que o peso do capital social (pertencer a uma ou mais
associações) viu-se acrescido no período. Esta conclusão é corroborada pelas
pesquisas não acadêmicas, como a já mencionada pesquisa realizada pelo Grupo
Catho, que revela que no ano de 2004, 40% dos gerentes e 28% dos diretores de
empresas brasileiras entrevistados conseguiram seus empregos graças à força de
suas relações sociais80.

A incompleta determinação do diploma como credencial de acesso aos cargos de


gestão também pode ser observada na descrição das ocupações e famílias
ocupacionais constante na nova versão da Classificação Brasileira de Ocupações
(CBO-2002). Seguindo o padrão definido pela OIT e apresentado na CIUO 88
(Classificação Internacional Uniforme de Ocupações), a nova CBO evita definir um
nível de competência associado às credenciais escolares para as ocupações que
integram o GG1 (Membros superiores do poder público, dirigentes de organização de
interesse público e de empresa e gerentes), ao contrário do que ocorre em relação aos
demais grandes grupos81.

79
Com base nos dados da PNAD, o autor conclui que durante o período 1973-1982, o efeito da
escolaridade nas chances de se obter um cargo gerencial experimentou elevação (passando de 24,3%
para 25,1%), mas que a partir do ano 1982 começa a cair. Assim, em 1996, o incremento de um ano a
mais de educação nas chances de ocupabilidade gerencial cai para 22,5%. (HELAL: 2005, p. 39).
80
Grupo Catho. Pesquisa “A Contratação, A Demissão e a Carreira dos Executivos Brasileiros” ano 2005.
81
Há quatro níveis de competências associados à CBO 2002. O nível 4 reúne os profissionais de nível
superior constantes do GG 2 (profissionais das ciências e das artes). O nível 3 refere-se aos técnicos e
profissionais de nível médio, constantes do GG 3 (técnicos de nível médio). Os GGs 4, 5, 6, 7, 8 e 9
(respectivamente: Trabalhadores de serviços administrativos; Trabalhadores dos serviços, vendedores do
comércio em lojas e mercados; Trabalhadores agropecuários, florestais, da caça e pesca; Trabalhadores
da produção de bens e serviços industriais; Trabalhadores da produção de bens e serviços industriais e
Trabalhadores de manutenção e reparação ) majoritariamente referem-se aos trabalhadores de nível 2.
Os trabalhadores elementares (nível de competência 1) encontram-se identificados em algumas famílias
dos GGs 4, 5, 6 e 9. Assim, há dois grandes grupos para os quais não são associados níveis de
competência, dada a sua heterogeneidade: o que se refere aos dirigentes (grande grupo 1) e o que se
refere às forças armadas, bombeiros e polícia militar (GG 0). (Fonte: Classificação Brasileira de
Ocupações, 2002. Brasil - MTE)
12 5

Portanto, ainda que o GG1 agrupe os “empregos que compõem as profissões que
estabelecem as regras e as normas de funcionamento do país, estado e município,
organismos governamentais de interesse público e empresas, além de reunir os
empregos da diplomacia” (CBO 2002, p.12) não há uma definição do nível de
competência associado à escolaridade que possa ser aplicado a estes empregos, pelo
fato de “os dirigentes terem escolaridade diversa e, portanto, níveis de competência
heterogêneos.” (ibidem, p. 11)

Dessa forma, embora seja verdadeiro que na descrição da maior parte das famílias
ocupacionais que compõem o GG1, se faça presente o peso da posse das credenciais
escolares de nível superior como requisito mínimo para o ingresso no posto, existem
casos em que o acesso não é vedado para os portadores de títulos do ensino básico
incompleto (como na família 1414 – gerentes de operações comerciais e de
assistência técnica), do ensino médio (como na família 1415 – Gerentes de operações
de serviços em empresa de turismo, de alojamento e de alimentação), ou do ensino
superior incompleto (família 1421 – Gerentes administrativos, financeiros e de risco).
Há ainda casos nos quais as condições de acesso descritas revelam ainda a
presunção de existência de um mercado interno de trabalho, em que a dimensão
educacional encontraria peso secundário (como por exemplo a descrição da família
1424 – gerentes de suprimentos e afins, onde se lê: “o acesso às ocupações
gerenciais nesta área pode se dar por ascensão de carreira pessoal de compras da
empresa, com ou sem escolaridade de nível superior” – MTE;CBO 2002)82.

A ambigüidade que as fontes estatísticas oficiais apresentam para a definição dos


requisitos de ingresso para os postos de nível gerencial, justificadas pela constatação
da grande “heterogeneidade” da categoria, contribui para reforçar a tese de que os
gerentes se configuram como uma ‘categoria fragmentada’, pouco homogênea, de
contornos difusos e de difícil apreensão pelas ciências sociais - que encontra uma
grande dificuldade tanto para definir conceitualmente a categoria quanto para analisar
as transformações e rupturas que são vivenciadas pelos seus membros.

Nesse sentido, Bouffartigue (2001b) sublinha as dificuldades de se pensar esta


categoria, especialmente quando se considera as mudanças que lhe atravessam,

82
Para detalhes quanto à distribuição dos níveis de competência por família ocupacional, ver Quadro –
Descritores de formação e experiência por famílias ocupacionais constituintes do Grande Grupo 1,
apresentado em Anexo.
12 6

ressaltando que se apesar de tudo em seus trabalhos ele ainda persiste utilizando a
palavra gerente (cadre), isso não se dá sem que se tenha presente a consciência da
miríade de signos que, de todas as partes, apontam para a sua ‘perda de substância’.
(BOUFFARTIGUE: 2001b, p. 233).

Quando se trata de circunscrever a categoria, é conhecida a afirmação de Boltanski


(1982) que em seu estudo ‘clássico’ no campo, prefere ater-se aos aspectos relativos
à luta simbólica e ao trabalho político de busca de representação que historicamente
foi definindo a categoria do que estabelecer os seus contornos: “nem grupo
homogêneo nem sujeito coletivo, nem simples artefato estatístico, a categoria dos
gerentes (cadres) resulta de um trabalho de construção ou de intervenção social,
política, institucional e simbólica”. Para este autor, o que define a categoria é mais o
seu critério identitário, o sentimento de pertença daqueles que se reconhecem como
‘quadros’, o que permite pensá-los como categoria “objetivamente heterogênea e
simbolicamente homogênea”.

Bouffartigue (2001d), por sua vez, se levanta criticamente à esta visão de ‘grupo
social’ elaborada por Boltanski. Tomando apoio nas pesquisas de Benguigui e
Monjardet, ele aponta que para se sair do impasse total em que se caiu com os
estudos que focam as representações, é preciso retornar à prática dos indivíduos para
compreender e delimitar suas ações. Assim, para se definir a categoria deve-se partir
não da pergunta ‘quem são os quadros’, mas sim ‘o que os fundamenta’. Em outras
palavras, a delimitação do grupo, antes de considerar aspectos relativos ao estatuto
(denominação dos cargos pelas empresas) ou das nomenclaturas oficiais das funções,
deverá tomar apoio na estrutura com que os indivíduos empregam seu tempo, porque
é essa a variável que reflete melhor o trabalho de enquadramento, transcendendo
tanto as divisões estatutárias quanto as funcionais. (BOUFFARTIGUE: 2001d, p. 483)

83
Bouffartigue identifica 9 tipos de papeis sociais distintos tendo como base as diferenças no emprego do
tempo dos gerentes. Estes tipos podem ser agrupados em dois conjuntos: em um preponderam as
atividades relacionais (onde os indivíduos se ocupam prioritariamente da manipulação das relações e da
distribuição de ordens) e no outro predominam as atividades técnicas. Esta separação indica a divisão,
que também atravessa a categoria, entre ‘trabalho manual’ e ‘trabalho intelectual’, ainda que ela não seja
evidente nas divisões estatutárias e hierárquicas correntes. Tendo como referência esta clivagem é
possível extrapolar e compreender as variações em termos de atitudes e opiniões que opõe os indivíduos
conforme eles se situem mais no ‘pólo político’ (relacional) ou mais no ‘pólo técnico’. (BOUFFARTIGUE:
2001d, p. 4)
12 7

Estas divergências são recuperadas por Roussel (2004) que, ao passar em revista os
trabalhos e pesquisas de diversos autores sobre os gerentes, afirma que o problema
em torno da construção mesma do objeto (‘cadre’) resta em suspenso:

“De fato, tudo se passa como se a produção sociológica sobre os gerentes


(cadre) fosse simultaneamente determinada pela tomada de consciência da
dificuldade de pensar este objeto e estruturada pela tomada de posição
metodológica e teórica posta em ação para enfrentá-la.” (ROUSSEL: 2004, p. 77
– tradução própria)

No entanto, a despeito das dissonâncias existentes, é possível perceber que existem


dois paradigmas dominantes nas ciências sociais quando se trata dos estudos que
focam os gerentes (CORDEIRO, 2001; GADEA; 2001). O primeiro se origina na
análise das classes sociais e categorias sociais, e se debruça particularmente sobre
as “novas classes médias”. Esta foi uma abordagem que se impôs com bastante
ênfase dos anos 1960 a 1980. A partir de então ganha força uma outra perspectiva,
que circunscreve os gerentes no âmbito das problemáticas afins à sociologia das
profissões e dos grupos profissionais.

Foge ao escopo deste trabalho aprofundar as origens e o desenvolvimento destas


linhas teóricas. Aqui cabe apenas registrar, de forma sucinta, as transformações
recentes que atingem aos gerentes e que poderão nos ajudar a delinear melhor nosso
campo de trabalho e lançar luzes explicativas sobre as mudanças que se verificam nas
solicitações dos atributos relativos aos postos de gestão presentes nos anúncios de
emprego – que consiste em nosso material empírico.

Antes porém vale assinalar que na origem das possibilidades de um indivíduo vir a se
tornar gerente encontra-se uma disputa que opõe duas vias de acesso - conforme
sublinhado por Boltanski (1982) e reforçado por Grün (1995): de um lado tem-se a ‘via
lenta’, onde o trabalhador ingressa em posições hierárquicas inferiores e, através da
experiência que vai adquirindo, se qualifica para ocupar funções de status mais
elevado. Esta via é característica do tipo de recrutamento que se dá no mercado
interno84 e que pressupõe que a experiência adquirida ou competência não seja

84
As principais características do mercado interno podem ser sumarizadas da seguinte forma: a relação
de trabalho se inscreve em uma perspectiva de longo prazo; a entrada na empresa se faz com base em
determinadas funções ou postos iniciais; a evolução se dá por meio da promoção interna, onde o “tempo
de casa” faz diferença; os salários são definidos por regras internas e não se alinham com os preços
praticados no mercado externo. Piore & Doeringer lembram ainda que uma das condições de
12 8

transferível de uma empresa a outra e nem transmissível de um profissional a outro


(PIORE & DOERINGER: 1971, 1985), o que limita as possibilidades de externalização
dos custos de qualificação. De outro lado, tem-se a ‘via rápida’, onde a qualificação se
dá fora do mercado de trabalho, notadamente nos bancos escolares, e é assegurada
pela posse do diploma. A difusão desta última como “princípio de excelência legítimo
para o mundo executivo” (que não se dá sem que antes se trave uma luta simbólica
entre a ‘prata da casa’ - portadora da ‘cultura da empresa’ e os ‘acadêmicos’ que
conhecem as coisas ‘no papel’) de um lado se sustenta a partir da importação dos
ideais do ‘management’ de origem norte americana, e de outro se faz possível pela
proliferação dos cursos superiores e MBA´s que se ocuparão de ‘alimentar’ o mercado
com os novos candidatos (GRÜN: 1995, p. 5)85.

Mas ao mesmo tempo em que a ‘via rápida’ vai se impondo como dominante, tornando
as credenciais escolares cada vez mais necessárias, a categoria ‘gerentes’
experimenta fissuras de tal magnitude que leva alguns estudiosos a antever a sua
extinção enquanto categoria social, dada a sua ‘banalização’ ou aproximação efetiva
aos demais trabalhadores assalariados, perdendo assim o seu estatuto diferenciado86.

De todas as grandes categorias profissionais, os gerentes têm sido apontados como


uma das que mais tem sofrido os efeitos das transformações econômicas e
organizacionais recentes (FALCOZ: 2003; HUET: 2001).

Segundo Bouffartigue (2001a; 2001b; 2002), até aos anos 1980 a situação de trabalho
do gerente se caracterizava pela segurança no emprego com uma perspectiva de
carreira ascendente associada; por certa autonomia que lhe conferia margem de
manobra para suas decisões; pela diversificação de suas atividades; pelo acesso
privilegiado a informações estratégicas da empresa; por uma jornada de trabalho
extensa; pela obrigação de fidelidade e obediência aos dirigentes e patrões; e por um

funcionamento do mercado interno é a própria expansão dos empregos. Em momentos de recessão, esta
lógica se desestabiliza. (PIORE & DOERINGER: 1971)
85
Bouffartigue (2001a) complementa esta abordagem afirmando que as duas vias de reprodução dos
gerentes (a via da aquisição escolar das capacidades especializadas e certificadas e a via da promoção
no seio das organizações) também se distinguem no tocante à maior dependência ou autonomia do
profissional diante das empresas particulares e do Estado. A lógica da profissionalização, afirma ele, visa
o controle, garantido pelo Estado, das vias de acesso e dos modos de exercício da profissão, ao passo
que a lógica da promoção implica na dependência da empresa. (BOUFFARTIGUE: 2001a, p.13)
86
Preocupação que se manifesta no título de livros tais como os de P. Bouffartigue: (2001), Les cadres.
Fin d’une figure sociale (Paris, 2001 – Ed. La Dispute) e Cadres, la grande rupture (Paris, 2001 - La
Découverte Recherches) ; e ainda de C. Falcoz: Bonjour les managers, adieu les cadres (Paris, 2003,
Editions d´Organization.
12 9

contrato de trabalho de natureza mais ‘moral’ do que ‘econômica’. Estes atributos, que
conformam a sua situação de ‘assalariado de confiança’, lhe conferiam prestígio e
status, distinguindo-o e afastando-o dos assalariados comuns.

No entanto, após os anos 1990, a situação dos gerentes (como do restante da força
de trabalho) se altera substancialmente. Os fenômenos descritos como mundialização
do capitalismo, as mudanças nos padrões de gestão dos recursos humanos (equipes
de trabalho, gestão participativa, trabalho por projetos, individualização dos processos
de avaliação e de remuneração, individualização das carreiras profissionais), as
práticas de downsizing e a concentração em pequenas unidades de produção (ou
unidades de negócios, ou centros de lucro), aliadas à busca de flexibilidade e às
ondas de terceirização, atingem duramente a esta categoria. Além de experimentar,
como nunca antes, o fenômeno do desemprego e da precarização do trabalho, os
gerentes vêem os fundamentos de sua identidade serem transformados.

As empresas não mais se responsabilizam por suas carreiras, a proximidade e o


sentimento de pertença diante dos centros de decisão são afetados, e a representação
simbólica da categoria – o que os diferenciava dos demais assalariados – vê-se
corroída. Convocados a produzir mais mediante uma retribuição menor (seja em
termos salariais ou de garantias), os gerentes são alvo de exigências crescentes em
relação à sua disponibilidade e mobilização, ao mesmo tempo em que as
contrapartidas caem condicionadas às diferentes avaliações de performance, com um
forte componente subjetivo como é mister ocorrer nas avaliações de competências
(ARAÚJO: 2005). Estas avaliações, se não abdicam totalmente do aspecto relativo à
presença da ‘lealdade’, não mais o colocam no centro do processo87. Igualmente, as
promessas de ‘carreira ascendente’ são suplantadas pelas promessas de

87
Cabe assinalar que por trás do contrato social no qual é possível que a lealdade se estabeleça como
bem corporativo, encontra-se a pressuposição de que as gerações mais jovens (e mais produtivas)
aceitem aferir menores salários no início de suas carreiras em prol das gerações mais velhas que
capturam os ganhos mais elevados; antevendo que, quando chegar a sua hora, eles também serão
beneficiados pelos jovens que serão contratados no futuro. No entanto, quando esta dinâmica é rompida,
a conseqüência é que as empresas passam a privilegiar o talento jovem (e sua remuneração inferior) em
detrimento dos mais experientes, mais caros e também mais críticos. O que equivale dizer que neste
ambiente que se instala, “na medida em que aumenta a experiência, ela perde o seu valor” (SENNETT:
2006, p. 93), culminando no reforço da dimensão geracional como fator de exclusão. Para detalhes sobre
como este elemento aparece nos anúncios de emprego, ver artigo de Marchal e Rieucau (2005) intitulado
“Candidat de plus de 40 ans, non diplôme ou débutant s´abstenir”. Para um panorama sobre as
conseqüências das práticas, ferramentas e políticas de gestão sobre a população trabalhadora de mais
de 50 anos, ver relatório de pesquisa de C. Falcoz (2004) intitulado “Parcours professionnel et
employabilité des 50 ans et plus”.
13 0

‘empregabilidade’, onde a contrapartida do compromisso ofertado se faz, se tanto, via


o aporte voltado à formação continuada.

São vários os impactos que tais ondas de mudança trouxeram sobre os gerentes,
sendo que os mais significantes podem ser sumariamente descritos da seguinte forma:
banalização da categoria; perda de referências hierárquicas ‘enquadrantes’;
fragmentação e diversificação; inflação nominal na titulação dos postos;
distanciamento em relação à empresa; o indivíduo como gestor de sua carreira e
empregabilidade; e valorização do ‘nomadismo’.

Vejamos sucintamente cada um destes pontos em separado:

a) A “banalização” da categoria

As demandas por polivalência e autonomia que se difundem em direção ao conjunto


de assalariados, alteram as formas clássicas de subordinação do trabalho e as
fronteiras entre os ‘trabalhadores de execução’ e os ‘responsáveis pelo
enquadramento’88 (BOUFFARTIGUE: 2001a; HUET: 2001). Acresce que as
dimensões da implicação com o trabalho e de imputação de responsabilidade também
deixam de ser atributos próprios ou essencialmente característicos dos estratos
hierárquicos superiores (variando, no entanto, a intensidade desta demanda).

Nesta linha, Champy (1995) lembra que após a disseminação da reengenharia, as


atribuições que envolvem responsabilidade e autoridade foram amplamente
distribuídas pelas organizações como um todo, e o resultado foi que “praticamente
todos se transformaram em gerentes, mesmo que apenas do seu próprio trabalho”
(CHAMPY: 1995, apud MELO: 1999, p. 5). Da mesma forma, a difusão das práticas de
gestão por projetos veio a contribuir para colocar em xeque as lógicas hierárquicas
verticais (Falcoz, 2003), tornando difícil a identificação da pessoa com um cargo
específico reconhecido como de ‘gerência’.
88
Por responsáveis pelo enquadramento, inspirados em Wolff (2005), estamos nos referindo àqueles
indivíduos que se encontram em situação de autoridade hierárquica, ou seja, em condições de dar
‘ordens’ a outros. (WOLLF : 2005, p. 8). Mispelbom (2003) amplia esta referência e percebe o
enquadramento como um processo de trabalho, afirmando que “enquadrar consiste em traduzir a política
dos dirigentes da empresa em quadros operacionais, que são os compromissos sociais principais
elaborados a partir de um trabalho de palavra.” (MISPELBOM: 2003, apud ARAÚJO: 2005, p. 29) A
função do enquadramento é, neste sentido, acima de tudo uma atividade relacional, voltada para “traduzir,
em soluções técnicas, as intenções econômicas e financeiras dos patrões ou dirigentes da empresa”
(ibidem, p. 30).
13 1

b) A perda das referências hierárquicas ‘enquadrantes’

Esta talvez seja a mais relevante mudança que se colocou aos gerentes ao longo dos
últimos 20 anos. Antes de ter origem nas transformações organizacionais e
econômicas, o repúdio à autoridade, derivada da ocupação de um determinado posto
ou cargo, guarda relação com o que Boltanski e Chiapello (1999) descrevem como
sendo a ‘recuperação da crítica artística’ no âmbito das teorias e práticas de gestão.
Esta natureza de crítica, a qual os autores apontam como sendo fortificada após os
movimentos de maio de 1968 na França, denuncia a alienação da vida cotidiana pela
aliança entre o ‘capital’ e a ‘burocracia’. A hierarquia é assim vista como o espelho, no
interior da empresa, da burocracia ou da dominação do capital, devendo portanto ser
banida em prol da autonomia dos indivíduos e da sua livre expressão, estas
identificadas positivamente com a liberdade de escolha e com o individualismo
crescente. A incorporação desta crítica pelos teóricos em gestão, se de um lado reúne
os argumentos que fazem a denuncia do caráter alienante das relações hierárquicas
piramidais, por outro lado enfatiza o aspecto relativo à sua baixa eficácia econômica
para a empresa, na medida em que inibem a criatividade e a iniciativa.

O que se coloca em questão aqui é essencialmente a necessidade de substituição das


práticas constritoras pela cooperação dos subordinados, ou ainda pelo
estabelecimento de relações de confiança entre estes e a direção das empresas.
Diante de assalariados cada vez mais autônomos (autonomia esta também fundada
na elevação do nível de escolaridade, que tornaria as pessoas mais propensas ao
exercício da crítica) e que aceitam cada vez menos o comando direto, a autoridade
necessita ser justificada: a hierarquia deixa de ser aceita como legítima e a justificativa
(legitimidade) para o exercício do comando precisa ser buscada em outras fontes que
não na simples ocupação de um determinado posto ou função (que caracterizam uma
posição no organograma). Acresce porém que as bases de construção de uma
‘relação de confiança’ também se encontram abaladas: o ‘enxugamento’ das
empresas, as terceirizações, entre outras suprimem a ‘moeda de troca’ que o gerente
poderia oferecer em termos de esperanças de carreira para os demais assalariados.
Destituído de poder formal, tendo que se legitimar diante dos seus pares, superiores e
subordinados, o gerente conta apenas com seu carisma, com suas ‘competências
manageriais’, com a eficácia de sua rede pessoal de relações que lhe proporciona
13 2

informações e ajuda, e com a pujança de sua ‘visão’ para mobilizar seus


‘colaboradores’. Boltanski e Chiapello (1999) resumem assim esta situação:

“É de suas qualidades pessoais que eles tiram a autoridade que faz deles
‘líderes’, e não de uma posição estatutária qualquer. Aliás, eles refutam os ‘sinais
de poder’ (tais como muitas secretárias, elevador ou sala reservada em
restaurantes, escritórios suntuosos). A autoridade que eles adquirem diante de
suas equipes está ligada à ‘confiança’ que lhes é atribuída graças a suas
qualidades de ‘comunicação’ e de ‘escuta’, que se manifestam nas relações face
a face com os outros.” (BOLTANSKI & CHIAPELLO: 199, p. 122 – tradução
própria)

Desse modo, o gerente não mais impõe ou manda, ele agora negocia e convence. A
“autoridade autorizada” é substituída pelo carisma, que deve ser acionado para ‘fazer
aderir’. Roussel (2003) lembra que, ao se colocar em prática este eufemismo,
consegue-se “esvaziar os termos que possam evocar a noção de poder” (ROUSSEL:
2003, p. 49), e a resultante é que se acaba por privar os indivíduos dos conceitos e
das categorias que tradicionalmente são utilizados para se pensar a dominação.

c) A crescente fragmentação e diversificação da categoria

A fragmentação e a diversificação são acompanhadas por mudanças morfológicas na


constituição da categoria: maior em números absolutos e relativos (especialmente no
que tange à média gerencia); mais ‘aberta’ às mulheres; e com maior presença de
portadores de diplomas de ensino superior (BOUFFARTIGUE: 2001a; 2002).

Além da heterogeneidade, que sempre caracterizou o grupo, tem-se uma


fragmentação que opõe, de um lado, um pequeno número de executivos dirigentes,
“amplamente remunerados por meio de ‘stock options’ e alimentados pelo viveiro
estreito dos ‘altos potenciais’, geralmente diplomados pelas grandes escolas e com
menos de quarenta anos de idade” (BOUFFARTIGUE: 2002, p.7). e, de outro lado,
uma massa de “pequenos executivos, com poucos ou sem diplomas e a maioria dos
quais se aproxima dos cinqüenta anos de idade” (ibidem, id.). Mas a diversificação
também é atravessada pelo crescimento no número quantitativo dos especialistas e
dos gerentes sem responsabilidade por pessoal.

Ao mesmo tempo, dado os processos de externalização e terceirização de muitas


funções estratégicas das empresas, emerge uma nova figura profissional: o gerente
13 3

autônomo, prestador de serviço, contratado por tempo determinado, para cumprir uma
função ou ‘missão’ específica, temporalmente circunscrita (BERTON: 200189; MORIN:
2002).

d) A inflação nominal no que diz respeito à titulação dos postos e às formas de


referência à natureza do trabalho dos gerentes

Como conseqüência da fragmentação e diversificação da categoria observa-se uma


pluralidade de formatos que são utilizados pelas empresas para fazer referência à
posição de gerente ou executivo: sênior, top manager, coordenador, analista, auditor,
manager, controler, executive, supervisor, coacher, líder de projetos, animador de
equipes,...90. Não raro, os nomes tornam-se uma moeda de troca simbólica que
esconde a desvalorização real sofrida pela categoria, cada vez mais próxima dos
demais ‘empregados’. Acresce ainda que esta ‘inflação nominal’ transborda para as
formas de se fazer menção à natureza específica do trabalho dos gerentes: estes
passam a ter ‘missões’, ‘responsabilidades’ e ‘desafios’. Segundo Boltanski e
Chiapello (1999), essa situação faz parte do discurso ‘moderno’ que dá os contornos
da nova identidade e do lugar do gerente associado à transformação nos referenciais
‘enquadrantes’ e na auto-gestão da carreira:

89
Berton (2001) afirma que nesta situação, a identidade do gerente passa a ser muito mais vinculada ao
seu metier do que à organização – ele se aproxima dos profissionais liberais, e concorrem nos moldes
dos ‘mercados profissionais’. Ao contrário do que caracteriza o funcionamento dos ‘mercados internos’,
em um mercado do tipo profissional, a qualificação do trabalhador é transferível de uma empresa a outra,
o que lhe possibilita uma mobilidade horizontal entre organizações utilizando uma mesma qualificação, e
a partir desta mobilidade vai-se compondo uma trajetória profissional e uma carreira do tipo ascendente.
Por outro lado, esta possibilidade de transferência exige uma “padronização da qualificação a fim de que
as empresas conheçam a natureza e a qualidade dos conhecimentos dos assalariados, donde a
necessidade do desenvolvimento de diplomas profissionais de diferentes níveis.” (BERTON, 2001, pág. 2
– tradução própria). Há portanto uma contradição entre as situações que são experimentadas pelos
gerentes: ao mesmo tempo em que se constata a diversificação da categoria na definição de suas
funções e responsabilidades e a pluralidade de denominações que as empresas lançam mão para
classificar seus postos (em conformidade com um funcionamento do tipo ‘interno’), há também o apelo à
mobilidade entre-empresas como elemento fundamental na composição da competitividade do gerente.
Mas este tipo de mobilidade, por seu turno, depende da existência de mecanismos que possibilitem a
universalização do trabalhador, e com isso possibilita a sua transferência, a partir de formatos que sejam
minimamente equivalentes, de uma situação de trabalho para outra.
90
Vale lembrar que a despeito das classificações oficiais de ocupações, as empresas são livres para
definir suas estruturas organizacionais assim como para nomear, da forma que lhes interessar, os seus
quadros. Essa nomenclatura diferenciada ou ‘exclusiva’ faz parte do jogo e das lutas simbólicas que se
travam entre as empresas e seus funcionários, e costuma ser uma forte moeda de troca no sentido de
valorizar os ocupantes dos cargos. Isso no entanto se reverte em uma ‘particularização’ do ocupante ou
do postulante, opondo-se à sua universalização. Essa singularização é uma queixa comum das
consultorias de head-hunter que lidam com clientes que insistem em buscar, ‘no mercado’ profissionais
para cargos cujas fronteiras são de difícil identificação, tornando mais árduo o trabalho dos intermediários
no que consiste na formatação da demanda e na apresentação de soluções (GAUTIÉ et al: 2005, p. 389).
13 4

“A própria palavra gerente (cadre) que sugere a hierarquia e o estatuto é


considerada como um arcaísmo. Os termos ‘manager’, ‘chefe de projeto’,
‘responsável por um centro de lucro’, ou ‘coach’, salientam antes a idéia de uma
missão temporária, de um especialista. O indivíduo não deveria mais esperar da
empresa um plano de carreira, ao contrário, deveria elaborar seu projeto de
desenvolvimento pessoal no âmbito de atividades assalariadas, liberais ou
mesmo beneficentes.” (BOLTANSKI & CHIAPELLO: 1999, p. 150 – tradução
própria)

Em uma perspectiva complementar, Roussel (2004) aponta que a inflação das


referências nominais corresponde ao processo de diversificação da categoria, e isso
acarreta, para os indivíduos que nela se situam, numa perda de referências que se
obtinham no seu interior, ao mesmo tempo em que conduz à perda da sua
especificidade tendo em vista as metáforas pelas quais se sustentavam exteriormente
(estas transformadas pelas mudanças nos modos de produção). Os ‘novos nomes’
confundem, embaralham e dificultam o acesso às ferramentas cognitivas que os
gerentes dispunham para se pensarem como tal:

“Sob o impacto de uma difusão generalizada ao conjunto dos assalariados de


recomposições plurais dos modos de produção torna-se, portanto, cada vez mais
delicado falar da singularidade do gerente (cadre) como categoria. A categoria,
naquilo que ela pode ter de específico, é pois atacada em dois ângulos, do
interior, mas também pelas transformações do exterior.” (ROUSSEL: 2004, p. 81
– tradução própria)

e) O distanciamento em relação à empresa

Com a financeirização, internacionalização de capitais, fusões e concentrações de


empresas e a sua fragmentação em pequenas unidades ou centros de lucro, a
organização como um todo se torna cada vez mais ‘opaca’ a um número crescente de
gerentes que são afastados dos grandes centros de decisão e de formulação das
estratégias de longo prazo das organizações (“quem é a empresa? os acionistas, os
trabalhadores, os produtos, os mercados?” questionam Baron et al. - 2001, p. 59). O
modelo ‘integrado’ (COUSIN, 200391) que caracterizava a relação entre o gerente e a
empresa, fundamentado no sentimento de pertencimento e de lealdade recíproca
(associando fidelidade à perspectiva de desenvolvimento da carreira) se rompe e é

91
Cousin (2003) define o modelo integrado como um sistema fechado que repousa na noção de lealdade
recíproca no qual quanto mais os quadros são fieis às empresas, mais esta lhes oferece garantias de
ascensão e carreira, e reciprocamente, quanto mais as empresas se ocupam das gestão da carreira de
seus quadros, mais estes buscam a integração. (COUSIN: 2003, p. 7 e 8)
13 5

suplantado pela lógica da ‘desinstitucionalização’, onde a ‘saída’ (no sentido apontado


por Hirschman - 197392) se coloca como o substituto à ‘lealdade’.

A nova lógica que glorifica o risco e a instabilidade, além de acarretar um


distanciamento dos gerentes em relação às suas organizações, os incita a buscar
alternativas para a reciprocidade rompida. Assim, a busca de mobilidade externa,
entre empresas, aparece como uma resposta a esta inusitada situação.

f) O indivíduo como gestor de sua carreira e a busca da ‘empregabilidade’

Como há o enfraquecimento da integração, a gestão da carreira, outrora atributo da


empresa, torna-se uma atividade do indivíduo, onde a integração apresenta-se como
um ‘obstáculo’ ao seu bom desenvolvimento (COUSIN: 2003). O cálculo que deverá
balizar a adesão ou a perpetuação de vínculos com as empresas (ou com projetos)
deverá levar em conta, como variável-chave, o quanto tal situação poderá contribuir
para aumentar as chances de ‘empregabilidade’ de cada pessoa – a empresa torna-se
então um ‘trampolim’ visando à inserção em projetos futuros. Desse modo, a gestão
da carreira passa a ser vista a partir da ótica de um ‘projeto pessoal’, no qual a
mobilidade entre-empresas ocupa um lugar privilegiado.

A busca incessante por manterem-se competitivos conduz os gerentes a agirem como


empreendedores de si mesmos (‘employeur de son propre travail’), como se a sua
pessoa fosse uma ‘empresa individual’93, independente da situação de trabalho (ou de
não trabalho) que ocupem. Estar ‘conectado’, disponível e inserido em redes é a
alternativa à redução das garantidas de segurança. A re-atualização e a reinvenção de
si precisam ser tratadas como atividades rotineiras (GORZ: 200394) uma vez que são

92
Hirschman (1973) afirma que a opção de ‘saída’ corresponde a uma solução que é buscada no campo
da economia: “o cliente que insatisfeito com o produto de uma empresa, muda para o de outra, usa o
mercado para defender seu bem-estar ou para melhorar sua situação” (HIRCHMAN: 1973, p. 25). Já a
‘voz’ é o seu oposto, e situa-se do campo da política: “voz é ação política por excelência”. (ibidem, p. 26).
93
A este respeito, Aubrey (1996), define que a ‘empresa individual’ é composta pelo somatório de
diferentes ‘capitais’, cujos componentes são descritos como: educação, formação e cultura; talentos e
competências; sabedoria e experiência; posicionamento no mercado de trabalho; portfólio profissional;
base de clientela; propriedade intelectual; dinheiro e ativos; família e rede social; energia e saúde;
qualidades pessoais e talentos.
94
Gorz afirma que há um descolamento entre o trabalho individual de produção de si, o qual se configura
como um componente do capital humano social, e o trabalho na empresa. A produção de si se torna
autônoma em relação ao trabalho propriamente dito, porém, as empresas se apropriam gratuitamente
deste ‘trabalho individual’, de forma a atender suas necessidades particulares sem que se preocupem
com a oferta das contrapartidas. Atividade que se prolonga ao curso de toda a vida, a produção de si
abrange situações e contextos os mais diversos, passando pelas atividades lúdicas, esportivas, artísticas,
13 6

essenciais para que se conquiste a ‘empregabilidade’, objetivamente traduzida pela


possibilidade de estar sempre participando de novos ‘projetos’ (BOLTANSKI &
CHIAPELLO: 1999). Para ‘estar na rede’, cada pessoa deverá arcar com os custos
relativos à manutenção de seus diversos ‘capitais’ (saúde, vínculos sociais,
qualificações, etc.). No entanto, como ressalta Cousin (2003), as chances de sucesso
não se definem apenas pelo voluntarismo nem pela energia gasta nos investimentos
pessoais. Estas começam a se desenhar bem antes, no espaço e na natureza da
trajetória escolar, filtro primeiro sobre o qual se erguem os demais:

“A carreira não é somente o resultado de um investimento pessoal, ela


permanece muito fortemente condicionada pelo nível de formação inicial e pelo
tipo de diploma obtido. Assim, ainda que os gerentes (cadres) reivindiquem o
mérito do esforço, seu itinerário será balizado por antecipação, segundo um
esquema sobredeterminado por sua escolaridade. Quando se fala de carreira
profissional, deveria ser integrada esta etapa inicial discriminatória que é a
carreira escolar.” (COUSIN: 2003, p. 13 – tradução própria)

g) A valorização do “nomadismo”

Face à ausência de perspectiva de carreira, a mobilidade dos gerentes passa a ser


pensada a partir da elaboração de novos quadros conceituais voltados à construção
de percursos profissionais.95 Estes incluem tanto a circulação nos mercados
profissionais quanto a experimentação do trabalho independente em uma lógica da
intermitência (BOUFFARTIGUE & POCHIC: 2001; POCHIC: 2001), a qual é inspirada
no modelo das profissões liberais. A figura do ‘gerente nômade’ que se sobrepõe ao
‘gerente estatuto’ (estável, homogêneo), aproxima esses indivíduos dos
empreendedores no que diz respeito ao compartilhamento dos atributos de mobilidade
e risco – que caracterizam as formas de comportamento mais adequadas e

culturais e associativas, que possibilitam o desenvolvimento de saberes e competências tais que não
cessam de ganhar importância. Neste jogo, afirma Gorz, a estratégia patronal de gestão dos recursos
humanos se desloca da dominação direta circunscrita ao trabalho em direção a uma dominação no
trabalho de produção de si; invade e confunde as fronteiras entre o trabalho e a vida privada: “ou seja,
sobre o alcance e a divisão das capacidades e saberes que os indivíduos devem adquirir, e sobre as
condições e modalidades de sua aquisição. A dominação se estenderá, portanto, acima e abaixo do
trabalho direto. Ela vai se alargar em direção ao tempo de não trabalho, para as possibilidades de
planejar e organizar o tempo fora do trabalho. A vida inteira se encontra submetida às imposições dos
horários e ritmos de trabalho flexíveis e imprevisíveis que fragmentam os tempos, introduzindo
descontinuidades e colocando obstáculos às atividades sociais e familiares.” (GORZ : 2003, p. 35 –
tradução própria)
95
Tradicionalmente os estudos sobre a carreira dos gerentes opõem de um lado a ‘mobilidade escolhida’
e de outro a ‘mobilidade sofrida’ (ARAÚJO: 2005). A primeira, positivamente valorizada, insere-se na
perspectiva de enriquecimento das competências e na aquisição de experiência e se faz acompanhar da
ascensão na carreira, da obtenção de sucesso profissional e material e da busca de uma satisfação
pessoal. Já a segunda se caracteriza pela mobilidade imposta, pela ausência de escolha, e traz a marca
da trajetória errante que tanto pode incluir a mobilidade horizontal quanto a declinante.
13 7

valorizadas no ‘novo espírito do capitalismo’ (BOLTANSKI & CHIAPELLO: 1999). Este


novo padrão de gestão das carreiras que se funda, de um lado, na lógica da
empregabilidade (tendo em conta a busca incessante de novas oportunidades de
emprego e/ou trabalho), e de outro, na lógica das competências (individualizadas e
psicologizantes), configura-se como um dos componentes do discurso do
‘managerismo96’, nomeando e dividindo/classificando o mundo entre dois pólos: um
positivo, onde se encontra o gerente móvel, internacional e conectado, e outro
negativo, onde residem os ‘produtores fixos’, ‘sedentários’ e ‘desconectados’. Neste
universo simbólico, o deslocamento se apresenta como “uma forma de vida, uma
forma de organização social, e portanto a expressão mesma das normas de riqueza
consideradas como distinção.” (GÓMES: 1999, p. 119 – tradução própria).

Wolff (2005) ao analisar esta dimensão simbólica, expande a noção de mobilidade


para além da questão que a circunscreve no âmbito de fronteiras geográficas, de
forma a incluir também neste conceito as possibilidades de rompimento com as
‘amarras’ derivadas de pertencimentos profissionais ou culturais. O gerente se
apresenta então como o ‘homem das redes’, capaz de estabelecer facilmente contatos
com todos, incluindo indivíduos que lhe sejam muito distantes - tanto profissional
quanto espacial e socialmente. Todo o esforço do gerente será dirigido no sentido de
manter seus vínculos ativos, porque é isso que determinará o seu sucesso na inserção
em novos projetos. Desta forma, o ‘nomadismo’, antes de ser uma transformação
objetiva, a qual não raro os dados empíricos teimam em contradizer97, caracteriza-se

96
Chanlat (2002) define o ‘managerismo’ como sendo o “sistema de descrição, explicação e interpretação
do mundo a partir das categorias da gestão privada”. Afirma que as manifestações da disseminação do
‘managerismo’ no tecido social são diversas. Em primeiro lugar, ela se manifesta no nível lingüístico, com
a invasão de termos como ‘gerir’, ‘gestão’, ‘management’, ‘gestionário’ nas trocas do dia-a-dia (gerencia-
se os sentimentos, as relações, etc.). Em segundo lugar, no nível das organizações, percebe-se a
disseminação de princípios administrativos oriundos da empresa privada (como eficiência, produtividade,
desempenho, produto, marketing, qualidade total, excelência, etc.) que são incorporados por instituições
que até então estavam fora deste circuito – como escolas, hospitais, igrejas, etc. Assim, o discurso e
saberes próprios dos ‘managers’ ou dos gerentes penetra em várias dimensões da vida social, colocando
esta categoria como uma das “figuras centrais da sociedade contemporânea” (CHANLAT: 2002, p. 2)
Boltanski e Chiapello lembram que na França o vocábulo de ‘manager’ se impôs tardiamente, cumprindo
o papel de opor-se ao chefe hierárquico. Disseminado neste país a partir dos anos 1980-1990, o
‘manager’ passa a designar os assalariados que manifestam sua excelência na animação de uma equipe,
opondo-se aos engenheiros cuja competência reside no manejo das técnicas.
97
Bouffartigue e Pochic (2001), a partir da analise de dados empíricos sobre a mobilidade dos ‘cadres’
franceses, concluem que a difusão prática do modelo do gerente nômade se revela bastante limitada,
sendo mais encontrada entre os jovens que se situam nas profissões de serviço ou nas empresas de
informática. Além disso, constatam que de modo geral os gerentes ainda permanecem relativamente
protegidos da ‘flexibilidade de mercado’, e somente aqueles que são mais fragilizados (em termos de
formação, idade, etc.) é que são levados a renunciar à situação de emprego estável e assalariado. No
entanto, os autores fazem questão de enfatizar que isso não retira do modelo a sua eficácia prática, uma
vez que numerosos são os profissionais que se ocupam ativamente da gestão de suas carreiras, incluindo
a consulta aos classificados de emprego, a atualização de currículos, etc. Mas há aqui uma distinção que
13 8

por ser um componente de uma mudança cognitiva, um elemento neste novo princípio
ordenador da estrutura social onde as mudanças que afetam a categoria sócio-
profissional do gerente passam a ser percebidas como dominantes ou universais. Com
a imposição deste enquadramento para o conjunto dos sujeitos sociais, são aqueles
indivíduos mais representativos ou ‘típicos’ da categoria que irão conseguir obter maior
quantidade de vantagens na distribuição dos produtos sociais, sejam econômicos ou
simbólicos (GRÜN: 1995, p. 123).

Finalmente, cabe lembrar que o trabalho de mobilização simbólica que permite aos
indivíduos darem um sentido e uma positividade a este conjunto de transformações é
particularmente elaborado no interior dos textos que compõe a chamada literatura de
gestão (conforme enunciado por Boltanski e Chiapello: 1999 e reforçado por
Bouffartigue e Pochic: 2001). Voltada a oferecer uma ‘radiografia’ dos novos contornos
do mundo (o que mudou e porque mudou) e ao mesmo tempo apresentar, fazendo
uso de exemplos tipificados ou casos particulares, um receituário moral e normativo
que orienta as condutas e ações rumo ao ‘sucesso’98, este tipo de material encontra
público cativo entre os gerentes e seus postulantes mas também, e porque não
afirmar, entre os pesquisadores e professores no campo da gestão (e mesmo na
sociologia do trabalho99).

se coloca entre os que estão empregados, cuja postura ativa visa a busca de novos espaços no interior
das empresas, e os que estão em situação de desemprego. Para estes últimos, o modelo do nomadismo
tem “o mérito de sustentar sua mobilização material e psicológica em uma conjuntura de existência
frequentemente difícil. E se for levada em conta a realidade estrutural e a desvalorização relativa dos
gerentes (cadres) em fim de carreira, face inversa do modelo positivo do ‘jovem gerente (cadre) com
potencial’, pode-se questionar se a maior parte dos atores atualmente não estão interessados em cultivar
um mito que contribui para ocultar uma dificuldade que a maioria deles será levada a enfrentar mais cedo
ou mais tarde.” (BOUFFARTIGUE & POCHIC: 2001, p. 57 – tradução própria).
98
Barbosa (2002) entende que boa parte desta ‘literatura de gestão’ compõe o que ela denomina por
‘cultura de negócios’, conceito que pode ser definido como sendo “uma série de fluxos culturais –
repertórios de imagens, valores, símbolos e significados – que permeiam o discurso e a atividade
empresarial e gerencial das empresas transnacionais, multinacionais ou globalizadas” (BARBOSA: 2002,
p. 107), o qual, por meio da invenção ou apropriações semânticas, visa dar um sentido ao universo
empresarial e organizacional. Fazendo uso de seus repertórios de imagens, lógicas, discursos e valores,
este ‘pacote’ de idéias é trazido à cena para justificar o que mudou, explicar porque isso ocorreu e
informar o que deve ser feito para que a empresa ou organização continue sobrevivendo e obtendo
sucesso. E continua afirmando que um dos principais traços constitutivos desta ‘cultura’ é a ênfase no
pragmatismo, na possibilidade de aplicação de qualquer tipo de conhecimento independentemente da sua
origem ou da origem do seu produtor. E é isso que permite que se encontre, no universo dos negócios e
das empresas, “saberes e personagens das mais diferentes procedências” convivendo lado a lado,
formando um caldo onde se observa desde “o conhecimento científico da física quântica e da matemática
do caos até abordagens trazidas por psicólogos, antropólogos, rabinos, poetas, administradores,
engenheiros, astrólogos e numerólogos, entre muitos outros.” (ibidem, p. 108).
99
Wood Jr e Paes de Paula (2003) definem este conjunto de textos como pertencentes literatura de ‘pop
manager’, e reforçam que esta é consumida não apenas pelos executivos, mas que também é
comumente encontrada na mesa de professores e pesquisadores.
13 9

Seus conteúdos, idéias e proposições também são divulgados por outro conjunto de
atores que atuam tanto como porta-vozes desta nova configuração do mundo quanto
como produtores desta ideologia100: trata-se dos profissionais responsáveis pelas
áreas de recursos humanos das empresas, os consultores e conselheiros de carreira,
os ‘head-hunters’, e os diversos intermediários do mercado de trabalho (agências de
comunicação, sites de emprego, periódicos especializados, etc.). Ao fazê-lo operam
um trabalho duplo: de um lado justificam a sua própria existência como uma
‘necessidade’, tornando-se cada vez mais ‘imprescindíveis’; e de outro contribuem
para a consolidação deste conjunto de idéias, ou desse ‘espírito’, a partir de um
referencial profissional universal, que não se restringe à categoria profissional dos
‘gerentes’. Assim, o modo de ser, os valores, as práticas gerenciais ou executivas
pouco a pouco transbordam para além do seu berço de origem, tornando-se “o”
princípio válido para instituições públicas e privadas, grandes e pequenas, de capital
nacional e internacional, e que devem ser seguidas pelos ‘líderes’ e pelos
‘colaboradores’, pelos profissionais ‘empregados’ e pelos que ‘estão em busca de
novas oportunidades’. Por fim, vale lembrar que sua força mobilizadora advém do fato
de que este quadro de referentes se apresenta como alternativa às ‘grades de ferro da
burocracia’, que encerram o indivíduo à organização. Ao promover a flexibilidade, a
autonomia, o individualismo, este novo conjunto de proposições vai de encontro às
críticas que denunciaram, nos momentos anteriores, o trabalho ‘taylorizado’,
‘fragmentado’ e ‘padronizado’ e a ‘hierarquia burocrática’, na qual os gerentes faziam a
vez de representantes do capital.

Portanto, podemos afirmar que é calcado nesta ambiência que se tecem os contornos
das exigências que serão feitas aos gerentes a serem recrutados no mercado externo
(e que nos ocuparemos nos próximos capítulos); onde o ‘anúncio de emprego’ se
revela como uma pequena amostra desse conjunto de idéias que atravessa os atores
sociais – tanto os que são encarregados da sua elaboração quanto os que são os

100
Grün (1999) lembra que no mundo econômico a relação entre o discurso e a prática deve considerar
as possibilidades de interpenetração entre instâncias que usualmente se toma como separadas: a
retórica, longe de ser um jogo de palavras vazio, é algo que “modela as práticas”, produzindo e
circunscrevendo o número de alternativas possíveis para a decisão dos agentes. (GRÜN: 1999, p. 126)
Assim, ainda que a ‘prática’ possa em determinados momentos se afastar dos discursos, tal como visto
em nota anterior relativa às conclusões de Bouffartigue e Pochic ao investigarem o nomadismo, é a força
deste último que permite, inclusive, que se desenvolvam novos produtos no campo econômico. Tal é o
caso dos sites de emprego na Internet (job boards) que comercializam seus serviços de vagas e
currículos cobrando ‘assinaturas’ mensais, semestrais e ainda anuais. A força de venda deste ‘produto’
reside no discurso que se difunde e configura uma disposição (antes que uma prática real) para o
comportamento do tipo nômade (tendo em vista a troca de empregos) o que por sua vez permite a
aquisição de tais serviços pelos atores sociais.
14 0

seus ‘consumidores’ (os quais necessitam de determinadas ferramentas cognitivas


apropriadas para fazer a adequada leitura do que é apresentado nos textos, seja em
termos do que é ‘dito’, mas também do que é ‘ocultado’). Assim, esse ‘micro-mundo’
dos classificados reflete, em sua linguagem e em seu conteúdo, o ‘espírito’ de uma
época e o jogo de forças dos atores que nele interagem (empresas contratantes,
intermediários, agencias de comunicação, candidatos aos postos, etc.), cada qual
buscando fazer valer seus capitais específicos.

Resumo do capítulo

Neste capítulo nossa preocupação foi de inventariar, de forma breve, as grandes


transformações que tem ocorrido em torno da categoria sócio-profissional dos
gerentes. Embora apontada pelos teóricos da sociedade pós-industrial como uma das
categorias profissionais que encontraria maior crescimento, há que se ver com
ressalvas esta possibilidade. Por outro lado, o credencialismo, que até então estava
afastado como determinante na ocupação de postos desta natureza (onde a via lenta
ou da experiência também tinha a sua vez), pode estar ganhando legitimidade,
representando uma via alternativa – ou via rápida – para o acesso dos indivíduos a
este grupo. Para tanto joga a favor a elevação na oferta de profissionais diplomados e
a imposição dos princípios no ‘managerismo’ de origem anglo-saxônica.

Dentre as diversas categorias profissionais existentes, o grupo dos ‘gerentes e


diretores’ é apontado como sendo um dos contingentes de profissionais que mais tem
sofrido o impacto das transformações econômicas e organizacionais recentes. Sua
condição de ‘assalariado de confiança’ que lhe assegurava uma perspectiva de
carreira associada a um determinado status e remuneração, afastando-o dos demais
assalariados, encontra, ao longo dos anos 1990, fraturas profundas em suas bases, a
tal ponto que os estudiosos da categoria chegam a questionar as suas possibilidades
de sobrevivência. As empresas passam a não mais se comprometer com a gestão das
carreiras no longo prazo e, assolados por uma situação de desemprego e de
precarização do trabalho, os gerentes vêem os fundamentos de sua identidade ser
transformados.
14 1

Diante de ‘empresas enxutas’, trabalhando em ‘redes’, organizadas por ‘projetos’ e


orientadas para a satisfação do cliente, aos gerentes resta a possibilidade de lançar
mão de seus atributos pessoais para fazer valer a sua ‘visão’ de líder, e conseguir
através dela a adesão consentida dos seus colaboradores.

As principais transformações em torno do trabalho dos gerentes e de sua


representação simbólica e identitária podem ser descritas a partir dos seguintes eixos:
(a) a banalização da categoria; (b) a perda das referências hierárquicas
‘enquadrantes’; (c) a crescente fragmentação e diversificação da categoria; (d) a
inflação nominal no que diz respeito à titulação dos postos e às formas de referência
ao trabalho dos gerentes; (e) o distanciamento diante da empresa; (f) o indivíduo como
gestor de sua carreira e a busca da ‘empregabilidade’; e (g) a valorização do
‘nomadismo’.

Nos próximos capítulos iremos nos ocupar da apresentação da metodologia utilizada


na pesquisa empírica e nos resultados da análise dos dados coletados nos anúncios
de emprego voltados para gerentes e executivos no Brasil. Veremos como as
variações nos formatos e conteúdos dos anúncios permitem identificar as mudanças
nos perfis dos profissionais que são mais valorizados em cada período (anos de 1990
e 2005), e como o discurso do novo ‘management’, abordado neste capítulo, é
incorporado nesses dispositivos.
14 2

Parte 2 – A pesquisa
14 3

Capítulo 4 - Questões metodológicas: a composição da


amostra e a elaboração do banco de dados

4.1. A composição da amostra

Para compor a amostra de classificados de emprego optou-se por coletar o material


em dois cortes temporais que permitissem elaborar comparações relativas à evolução
das demandas que são feitas pelas empresas quanto ao perfil dos gerentes que
desejam contratar. Assim definiu-se os anos de 1990 e 2005 como base.

A opção pelo ano de 1990 deveu-se a dois motivos. Em primeiro lugar, ele antecede à
segunda grande fase de expansão das matrículas no ensino superior brasileiro (que
ganha vulto somente a partir da segunda metade da década). Em segundo, é uma
data-chave que possibilita captar o princípio das grandes transformações estruturais
experimentadas pela categoria gerencial (enumeradas no capítulo anterior) mas que
não estavam ainda consolidadas. Nesta ocasião, o Brasil não conhecia a estabilidade
monetária e apenas vislumbrava o início de seu processo de abertura. A
modernização do parque produtivo nacional ocorria forma seletiva e pontual
(ABRAMO: 1990) e, no que concerne à gestão de recursos humanos, o discurso do
desenvolvimento das ‘competências’ como substituto à qualificação ainda
engatinhava; porém já demonstrando seu fôlego (contrariando os que apostavam se
tratar apenas de mais um ‘modismo’ passageiro – RÉGNIER: 1998). Além disso, a
pós-graduação stricto sensu ainda era bastante restrita, os MBA´s praticamente
inexistentes, e as matrículas no ensino superior somavam pouco mais de 1,5 milhões
de alunos.

Uma década e meia depois, o cenário brasileiro é muito diferente. A inflação está
controlada e a economia brasileira definitivamente exposta ao jogo competitivo
internacional, o que levou vários setores produtivos a implantar um processo de
modernização acelerada visando acompanhar os níveis de produtividade e qualidade
dos produtos concorrentes (PORTO et al: 2001, p. 35). A produtividade média da
economia brasileira cresceu significativamente ao longo da década de 90, mas deixou
como saldo um forte impacto no nível de empregos: somente entre 1991 e 1999, mais
14 4

de 3 milhões de postos de trabalho formais foram fechados na indústria (MATTOSO:


1999). No campo do ensino superior, os MBA´s e os cursos de especialização
explodiram e, ainda que não se possuam dados oficiais sobre o crescimento desta
modalidade, é sabido que a grande maioria das instituições tem apostado na sua
expansão. Além disso, em 2004 as matrículas no ensino superior já haviam
ultrapassado a casa dos 4,1 milhões.

No que diz respeito às tecnologias de comunicação e informação, a Internet,


inexistente em 1990, em 2005 atingiu a quase 20% da população – praticamente o
mesmo contingente de pessoas com acesso a computadores (ver gráfico) - tornando
viável o desenvolvimento de ‘bancos de empregos’ virtuais (job boards), que passaram
a concorrer com as mídias tradicionais na veiculação de anúncios de empregos e
também na oferta de profissionais via difusão dos currículos dos candidatos.

Portanto, na definição da Figura 3


Brasil – posse de celulares, computadores e acesso à Internet 1990-2005
composição da amostra optou-se
Quantidade % da população
brasileira
por levar em conta esta última Milhões

90 50
Celulares
variável, incluindo este novo 80

40
70
suporte além dos tradicionais. Se
60
30
em 1990 o suporte ‘jornal’ era a 50

40
melhor forma de colocar em 30
20

computadores
relação os ofertantes de vagas e 20
10
Internet
10
os candidatos, após uma década e 0 0
1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

meia, o que se observa é uma Fonte: Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) / CGI Brasil / Anatel

grande diversificação e
diferenciação dos canais: jornais (genéricos e especializados), revistas, sites de vagas
e currículos, sites das próprias empresas, correio eletrônico, mala direta, etc.

Porém, antes de apresentar os resultados da composição da amostra, é importante


salientar que a opção foi elaborar uma amostra qualitativamente significativa mas não
quantitativamente representativa. Ou seja, não se pode generalizar os percentuais
obtidos com os casos coletados em cada ano-base para o conjunto da população de
anúncios de emprego, nem no que se refere aos anúncios de jornal nem da Internet.
14 5

Tendo em vista captar (1) as variâncias no perfil dos candidatos considerando o


intervalo de tempo definido e (2) as variâncias nas informações conforme o anúncio
seja veiculado em um ou outro tipo de suporte (jornais e Internet) que poderiam jogar
mais a favor dos contratantes ou mais a favor dos postulantes101; compôs-se uma
amostra com anúncios divulgados tanto em jornais de circulação nacional quanto na
Internet, neste caso considerando ‘sites’ que fossem bastante diferenciados entre si
(incluiu-se aqui o critério de diferenciação entre sites que apresentam os anúncios em
formato ‘fechado’, onde os campos de informação são pré-definidos, e os que o fazem
em formato ‘aberto’, onde o texto não é limitado por estes campos).

A seguir são descritas as fases e as decisões que foram tomadas na elaboração das
amostras.

4.1.1. Composição da amostra dos anúncios de emprego veiculados em jornais

Etapa 1 – definição das mídias impressas a serem consultadas

Os critérios de seleção previamente estipulados para a definição das mídias impressas


que seriam consideradas na pesquisa foram os seguintes:

(a) jornais de circulação nacional;


(b) que tivessem classificados de emprego;
(c) que tivessem mais de 15 anos de existência, permitindo a comparabilidade
com o ano de 1990; e
(d) que fossem de consumo privilegiado pelas classes “A” e “B” (grupo no qual
os recrutantes tendem a buscar mais os candidatos).
101
Especialmente considerando em que medida as informações presentes em cada um destes suportes
poderia ‘jogar’ mais a favor dos candidatos ou das empresas, seguindo as pistas da teoria da assimetria
de informações. Nesse sentido, é importante salientar que um dos argumentos de ‘venda’ dos sites de
emprego é a não limitação de espaço em relação à quantidade de informações que podem ser
apresentadas. Ao contrário das mídias impressas, onde o custo de publicação leva em conta a
quantidade de caracteres ou de palavras que compõem um anúncio, podendo atuar como um fator
restritivo em relação ao montante de informações disponibilizadas (tais como o detalhamento do posto, o
perfil do profissional que está sendo buscado, a própria empresa e as condições de trabalho), a
publicação de um anúncio na Internet não apresenta este limitador. Inclusive em alguns sites a divulgação
do anúncio é gratuita, incidindo a cobrança sob os demais serviços de intermediação (armazenamento
dos currículos recebidos, triagem dos mesmos, estabelecimento de contatos, etc.). Assim, para os
economistas que trabalham com o conceito de ‘informação imperfeita’, a expansão da Internet poderia
jogar a favor dos candidatos melhorando a qualidade de suas escolhas, uma vez que a quantidade de
informações disponíveis seria maior. Ou seja, na ‘rede’ a transparência seria mais evidente. Além disso, a
Internet permitiria a redução dos custos de transação que recaem sobre ambas as partes. (MELLET:
2004, MARCHAL et al.: 2005)
14 6

Três alternativas foram identificadas, levando em conta também a sua acessibilidade


pela pesquisadora: jornal ‘O Globo’; jornal ‘Folha de São Paulo’ e jornal ‘O Estado de
São Paulo’102. Por questões de natureza operacional, para a composição da amostra
relativa ao ano de 2005, descartamos a Folha de São Paulo103, que foi incluída na
amostra de 1990 no lugar do Estadão104.

Em relação à quantidade de anúncios, os jornais paulistas possuem um contingente


de anúncios expressivamente mais volumoso do que os jornais cariocas, o que é
condizente com a maior concentração do volume de emprego no estado de São Paulo
comparativamente ao Rio de Janeiro, e conseqüentemente com a oferta de vagas.105

Arbitrou-se que a consulta a dois periódicos em cada ano-chave seria suficiente para
que se pudesse captar as principais tendências de transformações nas variáveis que
nos interessava.

Etapa 2 – definição dos critérios de seleção dos anúncios

O primeiro critério estipulado para a seleção dos anúncios que seriam analisados
consistiu no seu formato: tomando inspiração na metodologia adotada por Marchal e
Torny (2002), foram considerados apenas os casos apresentados em formato ‘quadro’
(que corresponde aos anúncios ‘em altura’ na nomenclatura especializada), o que
eliminou a grande miríade de pequenos anúncios que são publicados em ‘linha’. Esta
decisão foi corroborada por depoimento colhido em entrevista junto a um especialista
em classificados de emprego de um dos jornais selecionados, que afirma que as
vagas mais “atrativas” são sempre apresentadas em altura, e nunca em linha:

“Você nunca vai encontrar um anúncio de emprego para executivos em linha. Os


anúncios que são apresentados em linha são sempre de empresas pequenas,

102
O ‘Jornal do Brasil’, que poderia ser incluído como uma opção, foi descartado devido à sua perda de
espaço frente aos demais jornais.
103
O jornal ‘Folha de São Paulo’ que é comercializado no estado do Rio de Janeiro, nossa base de
pesquisa, não disponibiliza o suplemento de empregos.
104
Na ocasião da pesquisa, o acesso aos arquivos do jornal ‘O Estado de São Paulo’ estava
comprometido, o que não ocorreu em relação ao jornal ‘Folha de São Paulo’.
105
Segundo o IBGE, a PEA de São Paulo é 44% maior do que a do Rio de Janeiro: em junho de 2005, a
PEA de SP estava estimada em 9.392.000 pessoas, e a do Rio em 5.304.000 pessoas. (Fonte: PME
junho de 2005 – pessoas de 10 anos ou mais de idade, ativas na semana de referência – IBGE / SIDRA)
14 7

com cargos menos significativos”. (entrevista com responsável pelos anúncios de


emprego do Jornal ‘O Globo’106).

O segundo critério foi o título da vaga: o anúncio deveria apresentar, no título da


vaga, alguma referência à posição hierárquica que pudesse identificá-lo como
pertencente à categoria de ‘gerentes’ ou ‘executivos’107. Eliminaram-se todos os casos
dos ‘supervisores’, mas foram incluídos os ‘chefes’, ‘manager’, ‘gerentes’,
‘subgerentes’, ‘assessores’, ‘assistent’, ‘director’, ‘diretores’, ‘executive’, ‘executivos’,
‘coordenador’, ‘controller’, ‘líder’, ‘superintendentes’, ‘analistas’, e suas variações.

Dois outros cuidados adicionais tomados em relação à seleção dos anúncios foram os
seguintes:

• Vários postos em um mesmo anúncio: sempre que um mesmo anúncio


apresentava mais de uma vaga para postos diferentes (uma mesma empresa
selecionando vários gerentes por exemplo), procurou-se considerá-lo apenas
uma vez, fazendo a seleção do caso a ser adotado por sorteio simples; exceto
nas situações em que os requisitos de demanda dos profissionais fossem
muito distintos e nos casos em que o anúncio pertencia a empresas de
recrutamento e seleção; e

• Anúncios repetidos: em alguns casos, o mesmo anúncio era publicado em


datas diferentes e em jornais diferentes (ex: o mesmo anúncio veiculado nos
jornais O Globo e Estadão). Nessa situação, o anúncio foi contabilizado apenas
uma vez.

106
É interessante perceber neste depoimento a avaliação que o entrevistado faz da categoria de
executivo. Não há aqui uma adequação entre o título do posto e a categoria: a presença do termo
‘gerente’ ou ‘diretor’ no título não é para ele um elemento relevante, o que define o executivo é o
candidato e a empresa contratante e não o posto ou as funções que desempenha.
107
Estamos cientes de que ao fazê-lo incorremos no risco de delinear a categoria por suas referências
estatutárias, e com isso tanto incluímos como excluímos casos de ofertas de vagas que poderiam ser
consideradas como destinadas aos gerentes e executivos caso optássemos por outros tipos de recortes,
como por exemplo o de grupo social apresentado por Boltanski (1982), ou da partição do tempo de
trabalho utilizado por Bouffartigue (2001d) (ver detalhes no capítulo 3). Entretanto, como o foco de nossa
tese não é a discussão da ‘categoria gerentes’, mas sim como a substância do mérito é construída pelos
empregadores no momento de pré-seleção dos candidatos aos postos de gerencia, acreditamos que os
ganhos ao fazer este tipo de recorte são maiores do que as perdas.
14 8

Etapa 3 – definição da quantidade de anúncios a coletar

Mais uma vez, baseado na metodologia adotada por Marchal e Torny (2002), arbitrou-
se que 50 casos por suporte seria uma quantidade razoável para compor a amostra e
identificar o conteúdo das variáveis relevantes. A partir desta definição foi preciso
coletar anúncios publicados em datas diferentes até que se preenchesse o número
estabelecido segundo os critérios definidos de triagem.

Dessa forma, a amostra final relativa aos anúncios de empregos publicados nos
jornais ficou assim constituída:

Quadro 2 - Amostra dos anúncios coletados em jornais

Suporte Total de anúncios coletados Data da coleta


Ano-base 1990
Jornal “O Globo” 50 11 de março
11 de março = 16 casos
4 de novembro = 3 casos
Jornal “Folha de São
50 11 de novembro = 14 casos
Paulo”
18 de novembro = 8 casos
25 de novembro = 9 casos
Ano-base 2005
6 de março = 23 casos
Jornal “O Globo” 45 13 de novembro = 9 casos
27 de novembro = 13 casos
6 de março = 21 casos
Jornal “Estado de
55 13 de novembro = 13 casos
São Paulo” (*)
27 de novembro = 21 casos
Total Geral - 200 casos
(*) a diferença de mais 5 casos a favor do jornal Estado de São Paulo corresponde a anúncios repetidos que foram
contabilizados a favor deste jornal.

4.1.2. Composição da amostra dos anúncios de emprego veiculados na Internet

Etapa 1 – definição dos ‘sites’ de emprego a serem consultados

Para fazer a seleção dos sites de emprego foram feitas inúmeras pesquisas na
Internet, entrevistas informais junto a profissionais de perfil executivo (perguntando
quais os sites de emprego que conheciam ou que já tinham ouvido falar), consulta à
literatura de auto-ajuda em obtenção de emprego / empregabilidade e consulta à
14 9

Fenasett (Federação Nacional das Associações e Sindicatos das Empresas de


Prestação de Serviços de Colocação e Administração de Mão-de-obra e trabalho
temporário).

Estas consultas tiveram o propósito de identificar os principais sites de emprego


genéricos (que não fossem destinados a uma única categoria profissional ou ramo de
atividade, como, por exemplo, os sites para a área de informática). Isso porque, ao
contrário de outros países como a França, por exemplo, onde existem sites
específicos para executivos (como o cadres.com.fr), o Brasil ainda não apresenta esta
alternativa (o que facilitaria o trabalho de seleção).

Elaborou-se uma ampla lista contendo todas as indicações de sites de empregos


fornecidas pelas diversas fontes consultadas. De posse desta listagem, deu-se início a
uma minuciosa pesquisa na Internet, entrando em todos sites enumerados, verificando
quais ainda estavam em funcionamento (muitos já haviam encerrado suas atividades)
e o seu modo de ação. Cabe registrar que no Brasil, ao contrário de outros países
onde o e-recrutamento encontra-se mais avançado, não existe uma listagem completa
de todas as empresas que oferecem este tipo de serviço e nem do seu nicho de
atuação. Nem mesmo a ABRH (Associação Brasileira de Recursos Humanos)
apresenta um cadastro confiável. Seus dados tendem a ser incompletos e por vezes
desatualizados no que diz respeito às empresas que atuam nessa área, o que pode
ser explicado pela ausência de regulação específica relativa à atividade de
recrutamento on line. Dessa forma, foi necessário recorrer a diversas fontes para
poder montar uma listagem que fosse minimamente representativa. Ao todo,
chegamos a inventariar mais de 60 sites de agencias de emprego, head hunters,
bancos de currículos, serviços temporários, orientação de carreira e oferta de vagas.

A etapa seguinte consistiu na classificação dos ‘sites’ em categorias geradas a partir


da consulta e análise do material. Estabelecemos 3 modalidades típicas de sites de
empregos, (embora haja casos em que um mesmo site pode ser enquadrado em mais
de uma modalidade) levando em conta a sua origem e forma de funcionamento:108

108
Uma outra forma de classificação dos sites de emprego corresponde ao tipo de tecnologia que
utilizam. Poulain (2005) os mapeia segundo 6 gerações, com foco no candidato que busca vagas: (1) a
primeira corresponde aos sites de emprego corporativos, onde os candidatos podem depositar o currículo
e o recrutador os imprime; (2) a segunda permite o depósito de currículos em base de dados dotadas de
sistema OCR de reconhecimento de caracteres, o que possibilita uma busca por palavras no corpo dos
CV. A base de dados é gerenciada pelo recrutador; (3) na terceira, o candidato inclui seu currículo em
15 0

A primeira modalidade compreende os sites de empresas de recursos humanos que


atuam com recrutamento e seleção e que disponibilizam, em suas próprias páginas, as
vagas referentes às empresas para as quais estão prestando serviços. Nestes casos a
oferta de vagas tende a ser pequena em volume. Como exemplo podemos citar, para
o segmento executivo, as empresas Lens & Minarelli; Michal Page; DBM; Saad
Fellipelli, Mariarca, entre outros. A maior parte aceita a inclusão de currículos de
candidatos (quer sejam associados às vagas ofertadas ou os que visam colocações
futuras), que por sua vez irão alimentar seus bancos de dados de currículos. Não é
raro que estas empresas também façam uso dos serviços dos sites genéricos de
emprego para anunciarem as vagas que estão administrando. A inclusão de
currículos, quando existe, tende a ser gratuita e os serviços que prestam (e pelo qual
são contratados) são voltados ao preenchimento efetivo das vagas e não à sua
veiculação.

A segunda consiste nos sites de emprego genéricos que são criados pela extensão,
ao mundo virtual, das empresas que tradicionalmente lidam com recursos humanos,
mas que ganham vida própria como uma unidade de negócios em separado. É o caso,
por exemplo, dos sites da Catho, Manager, Empregos e Frontti, que operam em larga
escala, atendendo ao público em geral, e que não tem vínculo com as vagas que são
operadas por suas unidades específicas de ‘searching’ (no caso da Catho, a Case
Consultores). Em suma, são sites criados a partir de uma empresa que opera com
atividades ligadas à área de RH mas que se distanciam e conquistam autonomia
frente à mesma. Estes costumam cobrar para a inclusão de currículos e/ou das vagas.

bases de dados que contêm formulários com campos pré-fixados de preenchimento. Nesta geração, a
base de dados permanece de propriedade e gerenciamento do recrutador; (4) a quarta geração consiste
em sistemas mais orientados sobre o perfil do candidato: o site solicita que o candidato se posicione
sobre um conjunto de questões associadas ao gerenciamento de sua busca. Criam-se ambientes
pessoais de gestão dos perfis, e a tecnologia do tipo ASP (‘application service provider’) é o símbolo da
novidade. Isso permite ao recrutador externalizar a estocagem e o tratamento dos dados na base, além
de possibilitar buscas mais eficazes segundo os campos de competências dos candidatos; (5) a quinta
geração de sites disponibiliza ao candidato um serviço de pré-pesquisa dos postos que seriam adequados
ao seu perfil (aqui a imagem do candidato como ‘pesquisador’ de empregos ganha reforço). O site solicita
que o candidato se pronuncie sobre as ofertas existentes. Ao mesmo tempo permite ao recrutador de
fazer uma classificação das adequações posto-candidato; (6) a última geração permite que se consagre a
re-materialização da relação entre candidatos e recrutadores – até então substantivamente isolados. As
bases de dados ASP passam a ser equipadas com ferramentas de “data mining”, o que possibilita que a
relação entre o candidato e o recrutador se dê em tempo real: o recrutador é imediatamente informado se
um candidato que se adapta ao perfil da vaga encontra-se disponível. O avanço desta tecnologia, com o
uso de webcam permite que recrutador e candidato entrem em contato para entrevistas à distância.
15 1

A terceira modalidade é a que envolve os sites que são totalmente virtuais, sem
nenhum tipo de correspondência com as atividades de RH. Consistem em ferramentas
tecnológicas desenvolvidas com propósitos específicos de gerenciamento de amplas
bases de dados e de gestão de pessoas, que podem ser utilizados pelas empresas
nos seus processos seletivos. Não têm atuação no “mundo real” e são focados no
desenvolvimento da ferramenta, sem a preocupação de oferecer serviços adicionais
(testes, cursos, etc.) como costuma ser feito nos sites que compõem a modalidade
anterior. Este é o caso, por exemplo, dos sites do Vagas, Elancers e Curriculum. Não
cobram pela inclusão dos currículos, e podem ou não cobrar pela inclusão das vagas,
porém, sua fonte de arrecadação é no uso da ferramenta que gerencia, para as
empresas, os bancos de vagas e currículos (são os sites que disponibilizam tecnologia
ASP – ‘apllication service provider’, considerados de geração tecnológica mais
avançada – conforme descrito em nota).

Para auxiliar o processo de seleção, foi levantado um conjunto de informações sobre


os 8 sites que consideramos como sendo os mais relevantes do ponto de vista da
quantidade de vagas que disponibilizam e da sua visibilidade a partir das citações na
imprensa e na literatura especializada. Estas informações visaram mapear os sites em
relação ao volume de vagas; criação; forma de acesso aos dados; modo de
funcionamento; identificar as formas de busca de vagas; e caracterizar as informações
que são disponibilizadas sobre as vagas ofertadas109 (os quadros comparativos
elaborados encontram-se nos Anexos).

Uma vez feito este mapeamento, foram adotados três critérios para a seleção do site:

1. volume de vagas ofertado, que deveria ser significativo;


2. existência de oferta de vagas para diretores e gerentes, categoria profissional
que elegemos como alvo; e

109
Cabe lembrar que a presença de campos específicos para a inclusão de informações é uma forma de
atuação direta das empresas de intermediação no mercado de recrutamento. Mesmo que os campos
sejam de preenchimento não obrigatório (tais como escolaridade, sexo, idade, etc.), a sua existência
reflete as características que tais empresas ‘traduzem’ como sendo relevantes para o processo de
seleção operado pelas empresas que dispõem das vagas, estabelecendo assim uma ‘filtragem’ que
enfatiza certos tipos de perfis e competências. Marchal et. al (2005) ressaltam que ao fazê-lo, os sites de
emprego aumentam o poder dos contratantes e intensificam a pré-seleção operada à distância. Para o
caso brasileiro é ainda importante mencionar que tais sites (job boards) não são considerados, pela
legislação vigente, como meio de comunicação nos moldes dos demais. E portanto, as regras que
regulam a mídia impressa no tocante à não publicidade de elementos discriminatórios não são totalmente
seguidas no mundo virtual, o que permite que se crie, por exemplo, campos relativos à inclusão de
exigências quanto ao ‘sexo’ ou à ‘idade’.
15 2

3. gratuidade na consulta aos anúncios, dado que em vários sites a consulta só é


aberta para os assinantes.

Além desses, a facilidade de consulta às vagas também foi um elemento definido


como relevante.

Considerando estes critérios, optamos por escolher dois sites, sendo um da categoria
de site genérico (modalidade 2) e outro da modalidade de gerenciamento de bancos
de vagas e currículos (modalidade 3). A seleção recaiu sobre os seguintes:
“catho.com.br” (um dos mais conhecidos e citados na mídia) e “vagas.com.br”.

Etapa 2 – definição dos critérios de seleção dos anúncios e da quantidade a ser


coletada

Diferentemente da mídia impressa, onde os formatos de apresentação dos anúncios


são bastante variados, os sites de emprego costumam disponibilizar as vagas
segundo formatos padronizados, que consistem em campos pré-definidos ou ‘labels’
(e que é a opção da maioria dos sites investigados) ou em ‘texto livre’, como no caso
do site vagas.com.

Além disso, cada site possui um determinado conjunto de ‘chaves de busca’ para o
acesso aos anúncios, o que permite que cada caso possa ser resgatado a partir da
ativação de critérios distintos de pesquisa.

No caso do site da catho.com, as chaves de busca disponíveis, e que podem ser


acionadas isoladamente ou em combinação, são:

• Ramo da empresa110

110
As opções são as seguintes: Administração e Participação;Advocacia;Agricult., Pecuária e
Silvicultura;Agências de Propaganda;Aparelhos e Instr. Prof. e de Precisão;Armazenagem (Silos,
Armazens Inds.);Arrendamento Mercantil (Leasing);Artefatos Têxteis e Tecidos;Artefatos de Vidro e
Cristal;Artigos de Vestuário;Autopeças e Carrocerias;Aviões e Outros Veículos;Açucar e Álcool;Bancos
Comerciais Oficiais;Bancos Comerciais Particulares;Bancos de Desenvolvimento;Bancos de
Investimento;Bebidas e Refrigerantes em Geral;Borrachas e Artefatos Sintéticos;Café;Caixas
Econômicas;Cal e Cimento;Calçados;Carnes Frigorif. Indus. (Frigoríficos);Cerâmicas e Artefatos de
Gesso e Amianto;Com. Atac. Gen. Alim., Tec. e Outros;Com. Ext. (Imp/Exp/Trading Cies);Com. Mat.
Constr., Ferr. Eq. Agric.;Com. Varej. Lojas Deptos. Util. Dom.;Com. Varej. Produtos
Alimentares;Companhias Corretoras de Seguro;Construção Naval;Construção em Geral
(Construtoras);Consultoria de Contabilidade;Correios e Telecomunicações;Couros e Peles (Curtimento e
Tratamento);Distribuidoras de Títulos e Valores;Diversões (Cinemas, Parques);Eletrodom. Art. Dom. Mat.
15 3

• Local: Estado e Cidade (todos os Estados da Federação e seus respectivos


municípios)
• Faixa Salarial111
• Nível hierárquico112
• Área profissional113
• Data de entrada da vaga no banco de dados114
• Palavra-chave (que pode ser buscada no título da vaga ou nos seus
descritores)

Já no caso do site do vagas.com, a busca é mais estruturada, e segue a três passos


seqüenciais. No primeiro momento, a seleção incide sobre o nível ocupacional mínimo
e máximo visado (os níveis são classificados em: diretoria, gerência,
supervisão/coordenação, sênior, pleno, junior-trainee, estágio e técnico). Na seqüência
opta-se pela ‘área’ da busca (que guardam mais relação com as áreas profissionais do

Com. Geral;Emissoras de Rádio e Televisão;Engenharia Consultiva;Entidade de Ensino;Fabricantes


Diversos;Fiação e Tecelagem;Fumo e Produtos de Fumo;Gráficas e Editoras;Gás de
Petróleo;Hospital/Clínica;Imobiliárias e Adm. de Imóveis;Informática;Inst. de Cred. Imob. (Cad.
Poupança);Inst. de Créd., Financ. e Invest.;Jornais;Laticínios e Derivados;Madeiras (Compens.,
Laminados e Artefatos);Maq. Eq. Inst. p/Escrit.(Incl. Computador);Maq., Motores (Incl. Elet) Eq.
Indis.;Material Elétrico;Material Ferroviário;Metalurg. Geral (Lam., Forja, Fund.);Metalurgia dos Não
Ferrosos;Minerais Metálicos;Mineração dos Não Metálicos;Moinhos;Móveis e Artefatos de
Decoração;Oleos Vegetais (Industrialização);Outros Produtos de Minerais Não Metálicos;Outros Ramos
do Comércio Varejista;Papel e Papelão;Pescados (Pesca e Industrialização);Petróleo (Exploração e
Industrialização);Plásticos e Derivados;Prod. Alimentares Diversos;Prod. Farmac., Medic. e
Veterinarios;Prod. Perf., Toucador e Hig. Dom.;Química e Petroquímica;Recursos Humanos;Revended.
Veíc., Pecas e Similares;Serviços Diversos;Serviços Portuários e Aeroportuários;Serviços Técnico-
Administrativos;Serviços de Eletricidade;Serviços de Hotelaria;Serviços de Planej. e Desenvolv.;Serviços
de Água, Esgoto e Gás;Siderurgia;Sindicatos e Associações;Sociedades Corret. Tit. e
Valores;Supermercado/Hipermercado;Transp. Ferrov. Carga e Passageiros;Transp. Marit., Fluv. e
Lacustres;Transporte de Cargas rodoviarias;Transportes Aéreos;Transportes Rodoviarios de
Passageiros;Tratores, Maq. Terrap. Implem. Indis.;Veículos Automotores
111
As opões são: Combinar;Até R$ 500,00;De R$ 501,00 a R$ 1.000,00;De R$ 1.001,00 a R$
2.000,00;De R$ 2.001,00 a R$ 3.000,00;De R$ 3.001,00 a R$ 4.000,00;De R$ 4.001,00 a R$ 5.000,00;De
R$ 5.001,00 a R$ 6.000,00;De R$ 6.001,00 a R$ 7.000,00;De R$ 7.001,00 a R$ 8.000,00;De R$ 8.001,00
a R$ 9.000,00;De R$ 9.001,00 a R$ 10.000,00;Acima de R$ 10.000,00
112
O nível hierárquico disponível para a busca varia conforme o ‘Perfil Profissional’ escolhido. Estes são
os seguintes: (1) Perfil = profissional: níveis hierárquicos: diretoria, gerencia, supervisão / chefia,
profissional especializado com curso superior, ensino médio / profissionalizante, outros; (2) Perfil =
Presidentes e Diretores: níveis hierárquicos: presidente, vice presidente, diretor; (3) Perfil = Recém-
formado: sem níveis hierárquicos; (4) Perfil = estagiário: sem níveis hierárquicos; (5) Perfil = educação:
sem níveis hierárquicos; (6) Perfil = saúde: sem níveis hierárquicos; (7) Perfil = Informática: níveis
hierárquicos: presidente, diretor, gerente, supervisor / chefe, consultor, operador, analista, administrador,
programador, especialista, instrutor, webmaster, designer, técnico, estagiário, outros; (8) Perfil = Mural de
Vagas (operacional): sem níveis hierárquicos; (9) Perfil = Hotéis, Restaurantes e Turismo: níveis
hierárquicos: diretores e gerentes, supervisores / coordenadores, secretárias / assistentes, cargos
operacionais; (10) Perfil = Telecom, níveis hierárquicos: presidente, diretor, gerente, supervisor / chefe,
profissional especializado-curso superior, profissional especializado-curso técnico, instrutor, especialista,
estagiário, outros.
113
São elas: profissional, recém formado, estagiário, informática, educação, saúde, Telecom, mural de
vagas (operacional), Hotéis, Restaurante e Turismo, Presidentes e Diretores
114
Com as seguintes opções: há um dia, há dois dias, há três dias, na ultima semana, há 15 dias, há um
mês e há 45 dias.
15 4

que com os setores das empresas115). Por fim, no terceiro momento se escolhe o
espaço territorial de interesse (determinado município, região, Estado, ou todo o
País)116.

Em comum, os dois sites apresentam a possibilidade de resgatar as vagas a partir da


posição hierárquica, a despeito do fato de que cada um desenvolve sua própria
padronização acerca do que vem a ser a posição hierárquica. Definiu-se que esta
seria a chave de busca.

Ao mesmo tempo, arbitrou-se que seria em número de 100 o total de anúncios a ser
coletado em cada site. Para tanto, se necessário fosse, seriam feitas várias consultas,
em períodos diferentes, até atingir a meta definida.

Na pesquisa no site catho.com, acionou-se primeiro como chave de busca a


composição “perfil = profissional + nível hierárquico = presidentes e diretores”,
obtendo-se, após triagem onde foram eliminados os anúncios repetidos e os que não
se adequavam aos critérios (como por exemplo um anúncio para secretária), um total
de 54 casos que representam o conjunto de vagas disponíveis na data em questão.

Em um segundo momento acionou-se a composição de busca “perfil = profissional +


nível hierárquico = gerência”, o que resultou em um universo de mais de 4 mil vagas.

115
O site disponibiliza 108 áreas para a busca, a saber: administração de empresas; advocacia/direito;
agronomia; arquitetura/urbanismo; arquivologia; artes cênicas, artes gráficas; artes plásticas; atendimento
a clientes bares e restaurantes; atendimento a clientes comércio; atendimento a clientes –
telefonistas/recepcionistas; atendimento a clientes – telemarketing/call center; atendimento a clientes;
auditoria; bancos; biblioteconomia; biologia/ciências biológicas; biomedicina; ciências sociais; cinema;
comércio exterior; comunicação; construção civil; contabilidade; controladoria; culinária; decoração;
desenho industrial; design gráfico; ecologia/meio ambiente; economia; enfermagem; engenharia de
alimentos; engenharia civil; engenharia eletrônica; engenharia eletrotécnica; engenharia mecânica;
engenharia de produção; engenharia química; engenharia – outras; ensino superior e pesquisa; ensino-
outros; entretenimento, esportes; farmácia; filosofia; finanças; física; fisioterapia; fonoaudiologia;
geografia; geologia; gestão empresarial; história; hotelaria; informática TI; Internet; jornalismo; letras;
logística; manutenção industrial; marketing; matemática/estatística; medicina hospitalar; metrologia; moda;
museologia; música; nutrição; oceanografia; odontologia; organização de eventos/produção cultural;
organização e métodos; produção e fabricação; propaganda; psicologia; qualidade; química; radialismo e
televisão; recursos humanos; relações internacionais; relações públicas; secretariado; segurança no
trabalho; segurança patrimonial; seguros; serviço social; serviços administrativos; serviços domésticos;
serviços gerais; serviços técnicos – elétricos; serviços técnicos – mecânicos; serviços técnicos – outros;
suprimentos; telecomunicações; terapia ocupacional; terceiro setor / projetos sociais; tradução /
interpretação; transportes aéreos; transporte marítimo; transporte terrestre; turismo; vendas; vendas
técnicas; veterinária; web designers; zoologia; zootecnia.
116
Neste ponto há um ineditismo frente aos demais sites de empregos que é a possibilidade de
selecionar, a partir de um desenho do mapa do Brasil, uma determinada região de interesse. Selecionada
a região, esta aparece ampliada na tela do computador contendo todos os municípios que a compõe. A
busca pode ser então a partir de uma determinada cidade ou do seu entorno (em um raio de 25, 50, 75,
100, 125 ou 150 km da cidade escolhida).
15 5

Montou-se uma tabela com a sua distribuição segundo as áreas e subáreas em que se
encontravam as vagas (totalizando 18 áreas e 69 subáreas), identificou-se a
proporção de vagas em cada uma e se distribuiu a coleta das 45 vagas que faltavam
ponderadas por esta proporção. Na seqüência, a seleção dos anúncios foi feita por
sorteio simples no interior de cada subárea.

Já para o vagas.com, a coleta das vagas usou como critério de busca a seguinte
definição: ‘nível hierárquico mínimo = gerencia + nível hierárquico máximo = diretor +
localidade = todo Brasil”. Esta chave de pesquisa foi aplicada a cada uma das 108
áreas cobertas pelo banco de dados. Na primeira consulta, obteve-se um total de 83
anúncios (após a triagem onde foram eliminados os anúncios repetidos). Verificou-se
que destes, 40% eram publicados pelas próprias empresas contratantes e 60% eram
anúncios publicados por empresas de recrutamento e seleção, em nome de seus
clientes.

Para complementar os casos que faltavam, repetiu-se em outra data o mesmo critério
de busca, e por sorteio simples foram obtidos os 17 anúncios restantes, mantendo a
mesma proporção verificada anteriormente (40% próprias empresas e 60%
intermediários).

Dessa forma, a amostra final relativa aos anúncios de empregos publicados em sites
na Internet ficou assim constituída:

Quadro 3 - Amostra dos anúncios coletados em ‘sites’ de emprego

Ano-base 2005
Suporte Total de anúncios coletados Data da coleta
23 de fevereiro = 54 casos
Site 1- “catho.com.br” 100
24 de novembro = 46 casos
1 de maio = 83 casos
Site 2 - “vagas.com.br” 100
2 de dezembro = 17 casos
Total Geral - 200 casos
15 6

4.2. A elaboração do banco de dados e definição das categorias de


classificação dos anúncios

Uma vez isolados 400 anúncios que compuseram a amostra, deu-se início à
elaboração do banco de dados, montado em planilha eletrônica Excel.

Primeiramente foi desenvolvido um banco de dados para cada suporte em separado, e


análises e relatórios parciais foram produzidos tendo em conta as informações
coletadas.

A montagem do banco de dados foi inspirada nas classificações desenvolvidas por


Marchal e Torny (2002) e por Marchal, Torny e Rieucau (2003), adaptada por um
processo de ‘engenharia reversa’ e expandida para a análise dos casos brasileiros.
Definiu-se quatro grandes blocos de conteúdos: (1) informações gerais sobre o
anúncio; (2) informações sobre as empresas; (3) informações sobre o posto de
trabalho; e (4) informações sobre o perfil do candidato buscado. Na definição das
categorias deste último bloco também serviram como referência as classificações
elaboradas por Jackson (2001). No entanto, o resultado final é uma composição
bastante distinta da proposta por ela, especialmente no que se refere à ordenação das
capacidades e competências.

A seguir é apresentado o esquema geral de classificação de cada bloco, com suas


variáveis e princípios de codificação.

Bloco 1 - Informações sobre o anúncio

1.1. Idioma do anúncio


(português / inglês)

1.2. Presença de recursos gráficos no anúncio (sim / não)


(logomarcas, desenhos)

1.3. Responsável pelo anúncio


(própria empresa contratante / empresa de recrutamento e seleção)
15 7

1.4. Presença de agências de comunicação (sim / não)


(aplicável apenas nos anúncios em jornal)

Bloco 2 - Informações sobre a empresa:

2.1. Identificação da empresa (sim / não)


(nome da empresa)

2.2. Nacionalidade da empresa contratante117


(nacional / multinacional / internacional / sem informação)

2.3. Porte da empresa contratante


(pequeno / médio / grande / sem informação)

2.4. Setor da empresa contratante118


(industria, comércio, serviços, construção civil, sem informação)

2.5. Registros de valorização da empresa

o 2.5.1. Informações numéricas / quantitativas


Inclui informações apresentadas relativas a: quantidade de funcionários;
volume de vendas; quantidade de filiais; quantidade de produtos;
quantidade de locais de atuação; tempo de existência; etc. Exemplos:
‘grupo 100% nacional’; ‘opera em 165 países’; ‘está no mercado há 36
anos’; ‘4,4 milhões de clientes’; ‘6.000 funcionários’; etc.

o 2.5.2. Importância e qualidade


Inclui informações que valorizam positivamente a empresa contratante
segundo seu posicionamento frente aos concorrentes e qualidade de seus

117
As informações referentes ao porte da empresa e à sua nacionalidade também podem ser
interpretadas como registros de valorização, uma vez que, à exceção do Site 1- Catho, que conta com um
campo específico de entrada destes dados, nos demais suportes este tipo de informação normalmente é
utilizada para chamar a atenção sobre a importância da empresa.
118
A classificação do setor da empresa contratante foi feita com base nas informações explicitas quanto à
sua área de atuação ou inferidas a partir da sua identificação (nome da empresa, grupo, etc.) Este foi o
único caso em que a codificação não seguiu os parâmetros de restringir-se ao que era explicitamente
informado.
15 8

processos ou produtos. Exemplos: ‘empresa líder’; ‘com forte atuação em


seu segmento’; ‘multinacional’; ‘empresa de grande porte’; ‘eleita como uma
das melhores empresas para se trabalhar’; ‘certificada ISO e CNM3’; etc.

o 2.5.3. Expansão
Inclui informações que evidenciam processos de crescimento da empresa
contratante. Exemplos: ‘empresa em fase de expansão’; ‘visando ampliar
seus quadros’; ‘abrindo nova unidade’; etc.

Bloco 3 - Informações sobre o posto de trabalho

3.1. Título da vaga (quantidade de termos)

3.2. Local da vaga (sim / não / sem informação)

3.3. Menção à urgência no preenchimento da vaga (sim / não)


(Exemplos: ‘contrata com urgência’; ‘para contratação imediata’; etc.)

3.4. Informação sobre a remuneração (sim / não):

o 3.4.1. Referência qualificada


(Exemplos: ‘salário atrativo’; ‘remuneração / salário compatível com o
mercado’; ‘ótima remuneração’; ‘salário será discutido pessoalmente’; etc.)

o 3.4.2. Referência quantificada


(Explicita o valor da remuneração ou a faixa salarial. Exemplos: ‘salário de
R$ 13.000’; ‘salário de R$ 5.001,00 a R$ 6.000,00’; ‘salário: em torno de
R$10.000 a R$12.000; etc.)

o 3.4.3. Remuneração composta


(Demonstra os diversos fatores que entram na composição da
remuneração, exceto benefícios. Exemplos: ‘participação nos lucros’; ‘stock
options’; ‘bônus’; etc.)

3.5. Informações sobre benefícios (sim / não):


15 9

o 3.5.1. Referência à existência de benefícios


(Informa a existência de benefícios sem enumerá-los. Exemplos:
‘benefícios atrativos’; ‘excelente pacote de benefícios’; ‘benefícios
compatíveis com o mercado’; ‘benefícios adequados à importância do
cargo’; ‘benefícios serão discutidos pessoalmente’; ‘benefícios de uma
empresa de porte’; etc.)

o 3.5.2. Descrição dos benefícios


(Explicita os benefícios que são ofertados. Exemplos: ‘auxilio alimentação’;
‘auxílio residência’; ‘assistência médica’; ‘assistência odontológica’; ‘plano
de pensão’; ‘seguro de vida’; ‘transporte pago’; ‘auxílio combustível’; ‘carro’;
‘celular’; etc.)

3.6. Informações sobre carreiras / treinamentos (sim/não)


(Exemplos: ‘oportunidade de desenvolvimento profissional’; ‘perspectiva de
evolução profissional’; ‘treinamento contínuo’; ‘acompanhamento da evolução
profissional’; etc.)

3.7. Informações sobre ambiente de trabalho (sim / não)


(Exemplos: ‘ótimo ambiente de trabalho’; ‘infra-estrutura de apoio’; ‘eleita como a
melhor empresa para se trabalhar’; etc.)

3.8. Informações sobre jornada de trabalho (sim / não)


(Exemplos: ‘horário integral’; ‘de 9:00 às 18:00h’; ‘exige-se disponibilidade de
horário’; ‘sistema de plantão’; etc.)

3.9. Informações sobre a natureza do contrato de trabalho (sim / não)


(Exemplos: ‘empresa oferece vínculo CLT’; registro em carteira’; ‘exige-se que seja
pessoa jurídica’; ‘irá trabalhar como autônomo’; ‘contrato de 6 meses’; etc.)

3.10. Descrição das atividades a serem desempenhadas (sim / não):

o 3.10.1. Descrição sucinta (descrição contendo até 20 palavras)


16 0

(Exemplos: ‘para atuar na área acadêmica’; ‘irá atuar na direção do


hospital’; etc.)

o 3.10.2. Descrição ampla (descrição contendo mais de 20 palavras)


(Exemplo: ‘para atuar com planejamento de materiais, logística,
administração sobre as atividades de inventário, gestão do forecast de
vendas, gestão dos custos de matéria-prima, gestão de contratos,
desenvolvimento de compras internacionais, negociação estratégicas com
fornecedores, desenvolvimento de ferramentas de integração com
fornecedores, importação e exportação, monitoramento de indicadores de
satisfação junto ao cliente’; etc.)

Bloco 4 - Informações sobre o perfil do candidato buscado

4.1. Características gerais dos candidatos (atributos adscritos)

Inclui exigências que apontam para os atributos adscritos, assim como as referências
à posse de capital econômico (posse de bens) por parte dos candidatos.
Tradicionalmente são as características apontadas como sendo as mais
‘discriminadoras’. Subdividem-se em:

o 4.1.1. Sexo (sim / não)


Inclui tanto as referências explicitas à dimensão de gênero – ex. ‘sexo
masculino’, ‘sexo feminino’ – quanto as referências implícitas – ex:
‘diretora’, ‘diretora pedagógica’, ‘dinâmica’, ‘desembaraçada’ – nestes
casos somente é possível capturar as referências relativas ao fechamento
das vagas para as mulheres.

o 4.1.2. Idade (sim / não)


Inclui as referências explicitas em relação à idade ou à categoria
geracional. Exemplos: ‘faixa etária a partir dos 35 anos’; ‘entre 35 e 40
anos’; ‘jovens’; ‘jovens talentosos’; ‘idade mínima de 21 anos’; ‘idade entre
25 e 30 anos’; etc.

o 4.1.3. Apresentação (sim / não)


16 1

Inclui as referências explicitas em relação à apresentação ou que podem


ser entendidas como tal. Exemplos: ‘boa / excelente aparência’; ‘boa
apresentação’; etc.

o 4.1.4. Local de residência (sim / não)


Inclui as referências explicitas em relação à restrição quanto aos locais de
residência. Exemplos: ‘com residência em São Paulo ou cidade próxima’;
‘que resida na região do ABC ou proximidades’; ‘residir preferencialmente
na região Oeste’; ‘que resida na região, que resida em Campinas’; ‘vaga
apenas para moradores da região’; etc.

o 4.1.5. Posse de bens (sim / não119)


Inclui as referências explicitas em relação à posse de bens ou ao seu
acesso. Exemplos: ‘ter veículo próprio’; ‘ter condução própria’;
‘disponibilidade de veículo’; ‘computador próprio com Internet’; ‘celular’; etc.

4.2. Qualificações

Inclui todas as exigências que são feitas em relação às qualificações dos candidatos,
sejam elas adquiridas a partir de processos educativos formais (escolaridade);
informais ou não acadêmicos; ou ainda referidas pela posse de determinados
conhecimentos. Subdivide-se em:

o 4.2.1. Qualificações incorporadas (sim / não)


Inclui as referências à qualificação sem descrevê-las . Exemplo: ‘exige-se
profissional qualificado’.

o 4.2.2. Qualificações acadêmicas (sim / não)


Inclui as referências explicitas quanto às demanda por formação
acadêmica. Subdivide-se em:

119
Estas exigências explicitamente apontam para a presença do capital econômico dos candidatos, ainda
que possam ser associados ao exercício das tarefas.
16 2

 4.2.2.1. Nível da formação (categorias elaboradas a partir dos


dados)120:
• Nível médio
• Nível técnico
• Nível médio ou superior
• Nível técnico ou superior
• Superior em curso
• Superior em curso ou completo
• Superior
• MBA em curso ou completo
• Pós-graduação ou MBA ou especialização

 4.2.2.2. Área da formação:


• Genérica (exemplos: ‘profissionais com curso superior’;
‘formados’; ‘com diploma’; etc.)
• Específica (exemplos: ‘com curso de engenharia’; ‘formado em
direito’; etc.)
• Alternativa (exemplo: ‘com curso de engenharia, ou economia,
ou administração’)

o 4.2.3. Outras qualificações (sim / não)


Inclui as referências explicitas em relação à posse de qualificações do
tipo cognitivas. Exemplos: ‘raciocínio lógico e aritmético’; ’bom
português’ e ‘conhecimentos gerais’.

o 4.2.4. Certificações específicas (sim / não)

120
Algumas decisões metodológicas que foram tomadas em relação à classificação dos níveis de
formação foram: (1) quando o descritor da formação era apenas do tipo “exige-se formação acadêmica”,
contabilizou-se como “formação superior completa” (2 casos registrados); (2) sempre que nas exigências
feitas em relação à formação acadêmica apareceram os qualificadores “é desejável que”; “é interessante
que”; ou “será um diferencial” , o nível de formação contabilizado foi o mais elevado, (no caso a pós-
graduação ou especializações); (3) quando a exigência foi de “formação em contabilidade”, sem explicitar
se de nível técnico ou superior, foi contabilizada como “nível técnico ou superior”. Nota-se que a
introdução dos qualificadores citados no item 2 implica no não fechamento da vaga aos que por ventura
não disponham de tais certificados; entretanto é evidente que a prioridade será conferida aos que os
possuam. Entretanto, a explicitação desses qualificadores pode ser interpretada como: (a) indicador da
consciência, por parte dos contratantes, de que no mercado o perfil que está sendo buscado pode ser
escasso ou raro; ou ainda (b) das dificuldades de contratação dos perfis desejados tendo em conta as
contrapartidas que estão sendo oferecidas (salariais, de condições de trabalho, de benefícios ou outras).
16 3

Inclui as referências explicitas quanto à necessidade de outros


certificados, acadêmicos ou não. Exemplos: ‘que tenha realizado curso
pelo Detran ou CETEC’; ‘que tenha certificação em metodologia PMI’;
‘certificações Windows e linux’; ‘certificação PMP’; ‘curso de ótica
prática’; etc.

o 4.2.5. Registro em órgãos de classe (sim / não)


Inclui as referências explicitas quanto à necessidade de registros
profissionais. Exemplos: ‘CRC ativo’; ‘registro na OAB’; ‘que seja auditor
certificado’; etc.

o 4.2.6. Domínio de idiomas (sim / não)


Inclui as referências explicitas em relação ao domínio de outros idiomas
que não o português.

 4.2.6.1. Quantidade de idiomas requisitados121:


• um idioma
• dois idiomas
• três ou mais idiomas

o 4.2.7. Conhecimentos genéricos de informática (sim / não)


Inclui as referências explicitas em relação ao domínio de ferramentas
genéricas de microinformática. Exemplos: ‘domínio da área de
informática’; ‘conhecimento como usuário de microinformática’;
‘conhecimentos de uso do microcomputador’; ‘domínio do ambiente
Windows’; ‘conhecimentos de Excel’; ‘domínio do pacote Office’; etc.

o 4.2.8. Conhecimentos técnicos específicos (sim / não)


Contempla tudo o que foi indicativo de conhecimentos técnicos descritos a
partir de “conhecimento de” ou “domínio de”. Subdivide-se em:

121
Não se fez a distinção quanto à intensidade ou o grau de domínio do idioma que difere em alguns
casos, como por exemplo: exige-se inglês fluente ou exigem-se noções de inglês. Sempre que a demanda
por um segundo idioma foi acrescida de qualificadores (é desejável, é um plus, etc.) contabilizou-se na
quantidade superior (exemplo no caso da demanda: ‘exige-se inglês fluente, sendo desejável o domínio
de francês’, contabilizou-se como dois idiomas).
16 4

 4.2.8.1. Conhecimentos de ferramentas transversais


Inclui todos os conhecimentos que podem ser classificados como
transferíveis, independente do tipo de empresa ou setor. Exemplos:
‘normas de qualidade ISO e QS’; ‘Corel’; ‘Illustrator e Photoshop’;
‘aplicativos de multimídia’; ‘habilidade em elaboração de budget
anual de vendas’; ‘conhecimentos de E.R.P. (SAP,
Microsiga)’,’’conhecimentos da norma ISO-9000 ou equivalente’;
‘conhecimentos de ferramentas de qualidade’; etc.

 4.2.8.2. Conhecimentos específicos relativos ao domínio do objeto


Inclui os conhecimentos que são relativos a um tipo de empresa ou
setor ou ao exercício de uma determinada função. Exemplos:
‘conhecimentos em recrutamento e seleção, treinamento e
desenvolvimento, administração de pessoal e legislação’; ‘conhecer
o mercado de ERP do ponto de vista comercial’; ‘conhecimentos
técnicos relativos a tudo que envolve um ERP’; ‘conhecimentos do
mercado varejista serão considerados como "plus"’; ‘tecnicamente
deverá comprovar fortes conhecimentos em contencioso, consultoria
e planejamento tributário, envolvendo impostos e indiretos’; etc.

4.3. Experiência

Compreende tudo o que for indicativo de demanda por experiência por parte dos
candidatos e que normalmente é descrita a partir dos qualificadores “vivência em” e
“experiência”. Subdivide-se em:

o 4.3.1. Experiência incorporada122


Inclui as referências à experiência sem complementações ou sem
especificações. Exemplos: ‘com experiência’; ‘sólida experiência’; ‘com
prática’; ‘com experiência comprovada’; etc.

o 4.3.2. Experiência de duração precisa

122
Considerou-se aqui somente os casos que não se fazem acompanhar do detalhamento da
experiência.
16 5

Inclui as referências à demanda por experiência circunscritas em


determinada dimensão temporal. Exemplos: ‘com 3 anos de experiência’;
‘entre 3 e 5 anos de experiência’; etc.

o 4.3.3. Experiência de domínio preciso


Inclui as demanda por experiência detalhadas segundo suas fontes ou
formas de aquisição. Desdobra-se em:

 4.3.3.1. Tipo de empresa ou setor


Inclui a demanda por experiência circunscrita a um determinado
ambiente de aquisição. Exemplos: ‘no segmento de varejo’; ‘crédito
ao consumidor, seguros, crédito pessoal’; ‘em agência de
propaganda’; ‘nos segmentos eletroeletrônico, microeletrônico,
microinformática/ti’; ‘em telecomunicações’; ‘em empresas de grande
porte’; ‘em empresas expressivas no mercado nacional’; etc.

 4.3.3.2. Na função ofertada


Inclui a demanda por experiência relativa ao mesmo posto que está
sendo ofertado. Exemplos: ‘experiência na função’; ‘na posição’; ‘no
cargo’.

 4.3.3.3. Em função anterior ou em seu ambiente de aquisição


Inclui as referências a experiência que apontam para funções
anteriormente exercidas ou em áreas onde possa ter se dado a sua
aquisição. Exemplos: ‘experiência em gestão de áreas de Produção’;
‘posição de liderança na área industrial/produção’; ‘área de
inteligência de mercado’; ‘como Gerente de Produtos’; ‘vivência no
gerenciamento da área de Recursos Humanos’; ‘em áreas de
desenvolvimento’; ‘real state ou desenvolvimento de mercados’; ‘em
área financeira/controladoria’; etc.

 4.3.3.4. Na aplicação de conhecimentos


Inclui as referências a experiência que circunscrevem a aplicação de
conhecimentos específicos. Exemplos: ‘experiência em gerência de
integração de software’; ‘engenharia de teste/campo’; ‘vasta
16 6

experiência em gerência de equipes’; ‘conhecimento de


metodologias de projetos, gerenciamento de serviços’; ‘experiência
em administração de redes Lan, experiência em roteadores’;
‘experiência em projetos nas áreas de petróleo, química,
petroquímica ou offshore’; etc.

4.4. Capacidades ou competências

A classificação das capacidades e competências impôs um tipo de dificuldade


bastante distinta da que se apresentou em relação aos itens anteriores, o que justifica
uma rápida digressão em torno do conceito.

Sua importância é tal que a definição do que é (são) competência(s), suas referências
e formas de classificação tem inspirado a elaboração de diversas teses tanto na área
da educação quanto na sociologia do trabalho.123 Esse esforço é resultante,
principalmente, da tentativa de mapear as conseqüências, sobre os trabalhadores, da
alternância entre o paradigma produtivo de base taylorista-fordista em direção à
especialização flexível descrita por Piore & Sabel (1984), e suas variantes, tais como a
neo-industrialização diagnosticada por Kern & Schumann (1989) ou o toyotismo
abordado por Coriat (1994). A tônica recai sobre as possibilidades de reconhecimento
da subjetividade dos indivíduos e do uso efetivo de suas capacidades de autonomia e
criatividade no novo ambiente empresarial, atravessado por inovações tecnológicas e
organizacionais.

Mello Silva (2004), afirma que o ‘modelo da competência’ corresponde a um dos


arcabouços interpretativos que se desenvolvem com o intuito de responder

123
Ver, por exemplo, os trabalhos de (a) Helena Hirata (1998 - Competências e Divisão Social do
Trabalho no Contexto dos novos paradigmas produtivos – in: Seminário Internacional de Educação
Profissional, trabalho e competências – Anais. Rio de Janeiro, Senai-DN/CIET; 1994 – Da Polarização
das Qualificações ao Modelo de Competência. In: Tecnologias Trabalho e Qualificação – um debate
multidisciplinar. Org. Ferretti, Celso et alli. Petrópolis, RJ: Ed. Vozes); (b) de Elenice Monteiro Leite (1994
– O Resgate da Qualificação. Tese de Doutorado apresentada ao Departamento de Sociologia, da
Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP); (c) de Claude Dubar (1996 – La sociologie
du travail vis-à-vis la qualification e la compétence. In: Sociologie du Travail, Ed. Dunod, n.2); de
Gootings, Peter (1994 – Da qualificação à Competência – do que estamos a falar ? In: Formação
Profissional, Revista Européia. CEDEFOP, n. 1); (d) de P. Zarifian (1998 – A Gestão da e pela
Competência. in: Seminário Internacional de Educação Profissional, trabalho e competências – Anais.
Rio de Janeiro, Senai-DN/CIET; 2001 – Objetivo Competência: por uma nova lógica, São Paulo, Ed.
Atlas); (e) e de Karla Régnier (1998 – Transformações organizacionais, Qualificações e
Competências – um estudo de caso no setor serviços. Dissertação de Mestrado. Programa de pós-
graduação em sociologia e antropologia da UFRJ)
16 7

teoricamente ao imperativo da flexibilidade que se coloca aos processos produtivos e


mapear seus efeitos na organização do trabalho. Neste modelo, a ênfase da forma de
articulação entre os níveis ‘macro’ (ambiente e regulação) e ‘micro’ (empresas) recai
sobre os modos operatórios do trabalho e os aspectos sociais e subjetivos envolvidos.
Em oposição a esta perspectiva se encontram os estudos baseados na escola
regulacionista, que tomam por objeto de análise privilegiado a relação salarial como
instância de mediação entre as mudanças observadas nos dois níveis. Em suas
palavras:

“Grosso modo, e de maneira reconhecidamente parcial com respeito a uma série


de questões, pode-se dispor os dois modelos interpretativos mencionados diante
do dado da flexibilidade da seguinte maneira: enquanto a análise baseada no
“novo modelo produtivo” se mostra bastante crítica, acentuando sobretudo o
aspecto desorganizador de solidariedades coletivas consagradas, o modelo da
competência vê aí uma oportunidade de mudança em um sentido progressista,
uma vez que a ênfase, nessa última abordagem, recai na superação da lógica do
posto de trabalho, característica do taylorismo.” (MELLO SILVA: 2004; p. 57)

A adoção da noção ou do conceito de competência representaria a tentativa de


incorporar teórica e empiricamente outras dimensões para além do conhecimento
técnico específico que caracterizava as qualificações e o uso do trabalho típico do
modelo taylorista, valorizando o ‘ser capaz de’ ou ainda o ‘saber ser’, que configuram
certos comportamento e atitudes que denotam um tipo de engajamento subjetivo com
os objetivos da empresa. (RÉGNIER: 1998).

De Luiz (1995), preocupada com a questão da formação para o trabalho, busca


‘traduzir’ o conceito de competência de forma a poder operacionalizá-lo em um
processo metódico de formação. Segundo ela, são em número de cinco os níveis de
competências que precisariam ser desenvolvidos124 nos programas formativos: as
competências técnicas-intelectuais; competências organizacionais ou metódicas;
competências comunicativas; competências sociais e competências comportamentais
(DE LUIZ: 1995, p. 179-181).

De qualquer forma incide, sobre vários destes níveis, uma grande imprecisão. As
competências comunicativas por exemplo, que em acordo com De Luiz se traduzem
pela “capacidade de expressão e comunicação com seu grupo, superiores

124
Estes níveis de competência recaem sobre a dimensão profissional da formação, e não sobre a
dimensão política também integrante do processo de formação.
16 8

hierárquicos ou subordinados, de cooperação, de trabalho em equipe, de diálogo e de


comunicação interpessoal” (ibidem, p. 199), enfrentam problemas sérios de
circunscrição exata do seu significado: o que quer dizer exatamente ‘ser
comunicativo’? Para cada situação que se coloque, ou para cada empresa em
particular, a conotação pode ser diferenciada.

Parte deste debate e das preocupações decorrentes foi incorporado pelos teóricos em
gestão, que desenvolveram novas ferramentas de avaliação dos trabalhadores
centradas em competências, extrapolando, inclusive, do nível do indivíduo para o
coletivo, gerando o do conceito de ‘competências essenciais da empresa’, adequado
às políticas de enxugamento, busca de ‘foco’ e downsizing em voga.125 Segundo Mello
Silva (op. cit.), neste plano o desafio prático que as empresas enfrentam consiste em
traduzir um atributo abstrato, como a capacidade de comunicação, em componentes
objetivos que possam ser cruzados com os ‘saberes’ ou com os ‘conhecimentos’
profissionais que são por elas requeridos, institucionalizando e formalizando seus
sistemas de classificação ou de avaliação. Com isso reduzir-se-ia a imprecisão do
conceito, o qual, via de regra, recai sobre disposições de caráter individual ou de
traços de comportamento.

Mas a rigor, em um modelo genérico de competências, seria factível incluir todo e


qualquer adjetivo ou qualificador que possa ser utilizado para designar os traços de
uma pessoa (sejam eles ‘inatos’ ou tipicamente atributos de personalidade, ou ainda
oriundos das diversas instâncias de socialização, tanto da vida privada quanto
profissional), desde que estes pudessem ter algum tipo de valor ou serem passíveis de
mobilização em situações concretas de trabalho.

Assim, em tese, na abordagem de competências haveria o reconhecimento das


contribuições que as diversas esferas da vida trazem para a dimensão do trabalho
(dando visibilidade aos ‘saberes’ que até então permaneciam ocultos nos modelos
125
No âmbito das teorias de administração, as competências são invocadas como elemento que embasa
e respalda as estratégias de competitividade das empresas. A competência essencial da empresa
corresponde à sua ‘vocação’, ao que ela nela ‘faz a diferença’ em relação aos seus concorrentes. Já os
modelos de gestão por competência representam uma evolução nas teorias de gestão de recursos
humanos, e assume-se que as pessoas são as ‘competências essenciais da organização’ (e não mais
fatores de produção, como no modelo de administração de recursos humanos; ou seres sociais, como no
modelo de gestão do comportamento humano; e nem ativos estratégicos da organização, como no
modelo de gestão estratégica de recursos humanos). Trata-se fundamentalmente da identificação de
pessoas capacitadas para atuar no setor / mercado da organização (GUIMARÃES: 2003). Para tanto se
desenvolveram diversos instrumentos com o propósito de medir em que posição os indivíduos ou equipes
se encontram, tais como balanço de competências, portfólio de competências, etc.
16 9

focados na descrição pura e simples do posto de trabalho, característicos do


taylorismo), como por exemplo, os casos relativos à valorização das ações voluntárias
ou das vivências internacionais citados anteriormente.

Porém, como Mello Silva nos lembra, o que não fica claro no modelo é em que medida
se dá essa articulação entre os ‘mundos vividos’ e a ‘vida privada’ e o exercício da
competência profissional propriamente dita (ibidem, p. 61).

Acrescentamos ainda que esta opacidade se estende para o escamoteamento da


forma pela qual esta subjetividade (e imprecisão) pode ser utilizada quando se visa
estabelecer novas fronteiras no acesso aos empregos, resultando na discriminação
e/ou de exclusão de grupos, classes ou segmentos de pessoas. Há que se ter
presente também o fato de que as competências não são cumulativas, como o é a
experiência, a qualificação ou a formação. Por hora, tal como são concebidas, elas só
existem em contexto, não havendo instâncias externas ou dispositivos que as
sancionem, atestem ou universalizem, tal como é o caso dos diplomas, da experiência
comprovada ‘em carteira’, etc126. Em outras palavras, a competência ou o indivíduo
‘competente’ só existe em (inter) ação, e não faz sentido fora desta. A sua ‘atestação’,
subjetiva, também reflete relações de força desiguais entre o contratante (ou seus
intermediários) e os candidatos. E a valorização destes elementos pelo discurso do
‘neo-management’ coloca a problemática do recrutamento como uma questão que
também se debruça sobre a mobilização da vida privada, antes que somente sobre as
qualificações objetivas. Nas palavras de Boltanski e Chiapello:

“Geralmente, ao enfatizar a polivalência, a flexibilidade do emprego, a aptidão de


aprender e de se adaptar a novas funções, mais do que a posse de uma
profissão e as qualificações adquiridas, ou as capacidades de engajamento, de
comunicação, e as qualidades relacionais, o ‘neo-management’ se dirige para
aquilo que cada dia mais frequentemente se chama de ‘saber ser’ (savoir-être),
em oposição ao saber (savoir) e ao saber-fazer (savoir-faire). Os recrutamentos
se fundam sobre uma avaliação das qualidades mais genéricas das pessoas (...)
mais do que sobre as qualificações objetivadas, tornado-se difícil fazer a
distinção entre a operação que visa a engajar colaboradores para cumprir uma

126
Por isso Mello Silva (2004) afirma que, embora à primeira vista a abordagem de competência possa
remeter ao conceito de ‘profissão’ ou de metier, embutindo uma revalorização dos indivíduos, não se trata
exatamente desse caso. Não há, no uso do conceito de competência, uma aproximação com a sociologia
das profissões, tal como esta é entendida na tradição da história da sociologia: “enquanto essa última
carrega um forte matiz institucionalista, a abordagem da competência é preferencialmente
fenomenológica, já que é dada ênfase à situação de interação entre o profissional e o seu trabalho,
compreendendo o ambiente, os instrumentos e a cooperação, de forma ampla.” (MELLO SILVA: 2004: p.
93).
17 0

determinada tarefa e aquela que consiste em se ligar a seres humanos porque


eles lhes são convenientes, a título pessoal.” (BOLTANSKI & CHIAPELLO:
1999 ; p. 151 – tradução própria)

Não cabe, no escopo desta tese, aprofundar ainda mais essa discussão, bastando,
para nossos propósitos, assinalar que estes elementos que comumente se definem
como ‘competências’ ou ‘capacidades’ se fazem presentes nos anúncios de emprego
e apresentam variações significativas ao longo do tempo.

Além disso, o que também se percebe é que as categorias, adjetivos e substantivos


que são utilizadas pelos empregadores para explicitá-los permanecem tanto
heterogêneos quanto genéricos, o que revela a carência de um acordo social em torno
da ‘substância competência’ (tal como ocorre por exemplo em relação à formação
acadêmica), que permita que tanto avaliador quanto avaliado estabeleçam um
consenso ou acordo que satisfaça ambas as partes.

Desse modo, tais competências, mais do que a experiência profissional ou a formação


acadêmica, por permanecerem imprecisas, jogam muito mais a favor do avaliador em
uma situação de seleção ou contratação, reforçando seu poder de veto ou aprovação
em acordo com suas próprias interpretações, subjetivas, da personalidade e
disposições dos candidatos.

Por outro lado, é a valorização destes atributos diversos, mais até do que as
formações acadêmicas propriamente ditas ou mesmo da experiência profissional
acumulada, que Goldthorpe (1997) aponta como sendo o fator que estaria sendo
privilegiadamente considerado nos processos de seleção para um conjunto diverso de
ocupações, especialmente para aquelas que se localizam no setor serviços (nos
subsetores de entretenimento e lazer, cultura, cuidados com a pessoa, etc.).

Marchal e Torny (2002) afirmam que a explicitação de tais competências, por eles
chamadas de ‘qualidades’, entre os anúncios de emprego franceses é um fenômeno
recente, mais incidente em determinados suportes do que em outros e que se
apresenta em formatos bastante distintos, servindo tanto para selecionar os
candidatos quanto para valorizar as vagas e as próprias empresas recrutantes. Eles
identificam 12 categorias de qualidades ou de capacidades, sem no entanto se
preocuparem com a referência à sua origem (se proveniente do ambiente social,
17 1

inatas ou outras). São elas: qualidades de engajamento; de trabalho; de autonomia;


relacionais; de cooperação; de deslocamento; experimentadas; empreendedoras; de
direção; de inovação; de análise; de adaptação.

Já Jackson (2001) mapeia o conjunto de competências ou capacidades que são


anunciadas pelos empregadores nos classificados de emprego a partir de outra ótica,
e com isso constrói classificações distintas que remetem mais diretamente à sua fonte
de origem e que os contrapõe segundo suas possibilidades de aquisição x adscrição
(excluídas aqui as categorias definidas como qualificações, experiência e habilidades
e conhecimentos técnicos). São elas: habilidades cognitivas; características de
comprometimento com o trabalho; habilidades sociais; e outras características
pessoais. As duas primeiras seriam integrantes de seu modelo de mérito alargado
(descrito no capítulo 2), podendo portanto serem ‘adquiridas’, enquanto das duas
últimas seriam indicativas da permanência da valorização de atributos adscritos e da
herança social.

Para dar conta do conjunto de capacidades, competências, habilidades ou disposições


diversas que aparecem nos anúncios de nossas amostras, procuramos considerar
estes dois mapeamentos (elaborados por Marchal e Torny e por Jackson). No entanto
erigimos uma categorização que se apresenta substancialmente distinta das duas
anteriores, e compreende cinco grandes grupos, a saber:

o 4.4.1. Capacidades de comunicação e relacionais


Exprimem a demanda por atributos que apontam para o bom desempenho
nos processos de comunicação e na inter-relação com outros indivíduos,
sejam colegas, superiores, empregados ou clientes. Engloba também os
atributos que indicam a boa performance do candidato (comprovada ou
latente) no exercício de posições que envolvam a liderança (e que remetem
ao carisma, ao ‘espírito de líder’ mas não necessariamente eliminam a
presença de conhecimentos técnicos que facilitem o desempenho); e as
demandas relativas à inserção em determinadas redes de relacionamento,
seja ela resultante de atividade profissional anterior ou convívio social
específico. Subdivide-se em:

• 4.4.1.1. Capacidades de comunicação


17 2

(Exemplos: ‘comunicativo’; ‘boa comunicação verbal e escrita’; ‘redação


própria’; ‘fluência comunicativa’; ‘facilidade de comunicação’;
‘capacidade de comunicação com todos os níveis da empresa’; etc.)

• 4.4.1.2. Capacidades relacionais


(Exemplos: ‘bom relacionamento interpessoal’; ‘competência na
interação com pares e superiores’; ‘interpersonal skills’; ‘good
relationship with people’; etc.)

• 4.4.1.3. Liderança
(Exemplos: ‘líder’; ‘espírito de liderança’; ‘líder participativo’; ‘perfil de
liderança’; ‘habilidade em liderança’; ‘liderança consolidada em
processos de mudança’; ‘teamleader experiences’; ‘liderança de
equipes’; etc.)

• 4.4.1.4. Redes de relacionamento127


(Exemplos: ‘candidato que tenha contato com fornecedores no ramo de
telecomunicações’; ‘que tenha criado amizades sólidas e duradouras,
assim como construído sólidos relacionamentos com seus pares
diretores e seus pares clientes fornecedores’; ‘ter posição e visibilidade
no meio empresarial mineiro’; ‘rede de contatos com empresas’; ‘deverá
ter bom relacionamento com o mercado financeiro em geral’;
‘profissional com carteira de clientes’; etc.)

o 4.4.2. Capacidades empresariais e de gestão


Conjunto de capacidades que apontam para o exercício de funções que
envolvem o uso de saberes e técnicas associadas à administração (como
foco em resultado e visão estratégica) e ao exercício de funções
propriamente gerenciais e de enquadramento (como gestão de pessoas e
equipes e outras). Inclui ainda as referências ao bom desempenho em
processos de negociação e também a ‘vocação’ empresarial. Muitas destas
capacidades compõem o novo léxico associado ao ‘managerismo’
(CHANLAT: 2002). Subdividem-se em:

127
Este conjunto de exigências aponta para valorização do capital social dos candidatos. Também pode
ser interpretado como compondo as características pessoais dos mesmos.
17 3

• 4.4.2.1. Empreendedorismo
(Exemplos: ‘empreendedorismo’; ‘postura empreendedora’;
‘empreendimento’; ‘facilidade em desenvolver e alavancar novos
negócios’; ‘habilidade de buscar novas oportunidades e operacionalizar
as mesmas’; etc.)

• 4.4.2.2. Negociação
(Exemplos: ‘habilidade negocial’; ‘habilidade para negociar’; ‘hábil em
negociações complexas’; ‘habilidade de negociação e persuasão’; etc.)

• 4.4.2.3. Gestão
Este agrupamento, muito heterogêneo, é composto por outros
subconjuntos específicos de habilidades, a saber:

o 4.4.2.3.1. Gerais
(Exemplos: ‘gestão comercial’; ‘gestão financeira’; ‘estilo de gestão
agregado’; ‘hábil em gestão’; ‘visão generalista em RH’; ‘visão
orçamentária’; ‘competência no planejamento’; ‘trabalhar com metas
ambiciosas’; ‘olhar empresarial’; ‘capaz de fazer com que a
informação flua de forma eficiente e eficaz entre os stakeholders do
projeto’; ‘hábil em gestão’; ‘managerial reporting skill’; ‘capacidade
administrativa’; ‘administração por objetivos’; ‘capacidade de
analisar e tomar decisões em problemas técnicos e humanos’; etc.)

o 4.4.2.3.2. Estratégica / visão estratégica


(Exemplos: ‘estratégico’; ‘ter capacidade de direcionar a melhor
estratégia para atingir objetivos’; ‘capacidade no planejamento
estratégico’; ‘visão estratégica’; ‘visão estratégica no mercado’;
‘visão de futuro e capaz de traçar estratégias para atingir esta visão’;
‘visão empresarial e estratégica’; ’visão estratégica e de negócios’;
etc.)

o 4.4.2.3.3. Foco em resultados


17 4

(Exemplos: ‘foco em resultados’; ‘orientação para resultados’; ‘with


excellent drive for results’; ‘gerência por resultado’; ‘administração
de recursos visando resultados’; ‘comprometimento com resultados’;
etc.)

o 4.4.2.3.4. Gestão de pessoas e equipes


(Exemplos: ‘facilidade na coordenação de equipes’; ‘gerenciamento
de equipes’; ‘orientação de professores e profissionais
administrativos’; ‘habilidade na formação e motivação de equipes’;
‘motivador’; ‘facilidade de alinhar, motivar e inspirar pessoas’;
‘capacidade de dirigir um quadro funcional de vendedores e
administrativos’; etc.)

o 4.4.3. Capacidades associadas ao desenvolvimento e implicação com o


trabalho
Engloba os atributos mais subjetivos que favorecem a realização do
trabalho, passando pelas disposições para se relacionar com equipes, pelo
recurso à autonomia e iniciativa e pelo comprometimento com a atividade e
com a empresa. Subdivide-se em:

• 4.4.3.1. Trabalho em equipe


(Exemplos: ‘trabalho em equipe’; ‘espírito de equipe’; ‘habilidade para
trabalhar em equipe’; ‘focado em trabalho de equipe’; ‘team player’;
‘cooperação’, etc.)

• 4.4.3.2. Iniciativa, autonomia e flexibilidade


(Exemplos: ‘iniciativa’; ‘flexibilidade’; ‘pró-ativo’; ‘fácil adaptação a
mudanças’; ‘resolução rápida de problemas’; ‘facilidade em detectar
problemas e resolve-los’; ‘iniciativa para tomar decisões’; etc.)

• 4.4.3.3. Comprometimento e envolvimento


(Exemplos: ‘comprometimento de longo prazo’; ‘perfil voltado para
constante atualização e investimento pessoal na área’; ‘responsável’;
‘pontual’; ‘disciplina’; ‘auto-motivado’; ‘cumprir prazos’; ‘ser presente’;
17 5

‘atuante’; ‘organizado’; “hands-on”; ‘que faz acontecer’; ‘que veste a


camisa’; etc.)

o 4.4.4. Capacidades de mobilidade e de disponibilidade de horário


Este conjunto de capacidades remete a condições objetivas do indivíduo
para dispor de seu tempo (flexibilidade de modo a não se restringir às
jornadas de trabalho do tipo ‘padrão’) e para realizar deslocamentos de
diversas naturezas em função das atividades a desempenhar, além da
disponibilidade para mudanças. Subdivide-se em:

• 4.4.4.1. Disponibilidade de horário


(Exemplos: ‘o candidato deve ter disponibilidade de horário’; ‘exige-se
disponibilidade de horário’; etc.)

• 4.4.4.2. Disponibilidade para mudança de residência128


(Inclui as referências explicitas em relação à mobilidade para mudança
de endereço. Exemplos: ‘disponibilidade para morar em Belo Horizonte /
Bahia’; ‘para residir em Pirassununga / no Paraná/ no interior de São
Paulo’; ‘total disponibilidade para mudanças’; etc.)

• 4.4.4.3. Disponibilidade para viagens


(Exemplos: ‘disponibilidade para viagens’; ‘disponibilidade para viagens
nacionais e internacionais’; ‘disponibilidade para viagens eventuais’; ‘ter
disponibilidade para viajar diariamente’; etc.)

o 4.4.5. Capacidades ou competências pessoais, comportamentais e sociais


Este último agregado de capacidades engloba todas as referências aos
atributos que remetem a fatores como subjetividade, personalidade,
capacidade de empatia, aspectos físicos e sociais dos indivíduos.
Subdivide-se em:

• 4.4.5.1. Subjetividade

128
Esta variável pode ser evidência de que o processo de recrutamento ultrapassa as fronteiras locais
onde está situada a vaga.
17 6

(Exemplos: ‘criatividade’; ‘inovação’; ‘talentoso’; ‘saber trabalhar sob


pressão’; ‘garra’; ‘vontade de aprender’; ‘desembaraçada’; ‘atitude
determinada’; etc.)

• 4.4.5.2. Personalidade
(Exemplos: ‘persistente’; ‘ambicioso’; ‘entusiasta’; ‘bem humorado’;
‘agregador’; ‘desinibido’; ‘perfeccionista’; ‘personalidade marcante’;
‘franco’; ‘direto’; etc.)

• 4.4.5.3. Aspectos físicos


(Exemplos: ‘dinamismo’; ‘energia’; ‘força’; ‘ativo’; ‘ágil’; ‘boa saúde’)

• 4.4.5.4. Aspectos sociais129


(Exemplos: ‘formação cultural / nível cultural’; ‘identificação com a
marca’; ‘discernimento pessoal’; ‘desenvoltura política’; ‘boa postura’;
‘maturidade para relacionamento social’)

• 4.4.5.5. Referências morais e de capacidade de empatia


(Exemplos: moral – ‘integridade’; ‘empatia’ – ‘sensibilidade em questões
de gênero’; ‘socialmente sensível’; ‘interesse pelos necessitados’).

• 4.4.5.6. Outras
(Inclui as referências a outras características pessoais não classificadas
anteriormente. Exemplos: ‘condições técnicas e humanas de assumir
posição de diretoria’; ‘estabilidade no emprego’.)

129
Incluem-se aqui as referências explícitas a atributos que normalmente são adquiridos a partir do
pertencimento a grupos sociais específicos, que remetem a uma forma ‘certa’ de se apresentar e se portar
socialmente.
17 7

Resumo do capítulo

Neste capítulo descrevemos como foi elaborado o processo de definição da amostra


de anúncios de emprego captados em jornais e na Internet. Elegemos dois cortes
temporais – o ano de 1990 e o ano de 2005 – permitindo o estabelecimento de
comparações tanto no que se refere ao formato e linguagem dos anúncios quanto no
tipo de exigência que é feito em relação aos candidatos.

O ano de 1990 foi escolhido por anteceder à segunda onda de expansão das
matrículas no ensino superior e por conter o gérmen, ainda não consolidado, das
grandes transformações estruturais experimentadas pela categoria gerencial.

Para esse ano a amostra estipulada foi de 100 anúncios, todos obtidos em jornais,
sendo 50 oriundos de jornais cariocas e 50 de jornais paulistas. A definição do
montante de casos em cada jornal tomou apoio na metodologia utilizada por Marchal e
Torny (2002) em sua pesquisa desenvolvida na França.

Para o ano de 2005 foram selecionados 300 anúncios, sendo 100 em jornais (45 de
jornais cariocas e 55 de jornais paulistas) e 200 em bancos de vagas na Internet (100
em cada site).

O processo de escolha dos suportes (jornais e Internet) levou em conta critérios de


acessibilidade, volume de anúncios, gratuidade de consulta (no caso da Internet), e
abrangência da cobertura (para os jornais).

A análise dos diversos sites de emprego existentes no Brasil permitiu sua classificação
segundo 3 modalidades ‘típicas’, levando em conta a sua origem e forma de
funcionamento: (a) empresas de recursos humanos que atuam com recrutamento e
seleção e que disponibilizam as vagas que estão administrando em suas próprias
páginas; (b) sites de empregos genéricos que são associados a empresas de
recrutamento e seleção mas cujo escopo se distancia das atividades que são
desenvolvidas por estas; (c) sites de empregos genéricos totalmente virtuais, onde o
principal negócio é a administração de bases de dados. A escolha dos sites a serem
pesquisados recaiu sobre as duas últimas modalidades.
17 8

Apresentamos também qual foi o esquema utilizado para a classificação dos dados.
Aqui, em um processo de engenharia reversa, também se fez uso da metodologia de
classificação utilizada de Marchal e Torny (2002) acrescida das categorias elaboradas
por Jackson (2001) que foram tomadas como fonte de inspiração. Porém o resultado
final foi um enquadramento substantivamente diferenciado de ambos, contendo vários
elementos não considerados por estes autores além de estabelecer um esquema
singular no que compete à classificação das competências.

Foram criados quatro grandes blocos para a classificação dos dados:

Bloco 1 – Informações sobre o anúncio (contendo: idioma, recursos gráficos,


responsável pela divulgação).

Bloco 2 – Informações sobre a empresa contratante (contendo: identificação da


empresa, nacionalidade, porte, setor de atividade, registros de valorização).

Bloco 3 – Informações sobre o posto de trabalho (contendo: titulo da vaga, local,


urgência no preenchimento, remuneração, benefícios, carreira, ambiente de trabalho,
jornada, natureza do vínculo, descrição das atividades).

Bloco 4 – Informações sobre o perfil do candidato buscado (contendo: (a)


características gerais do candidato – sexo, idade, apresentação, local de residência,
posse de bens; (b) qualificações – incorporadas, acadêmicas, certificações
específicas, registro em órgãos de classe, outras, idiomas, conhecimentos de
informática, conhecimentos técnicos específicos; (c) experiência – incorporada, de
duração precisa, de domínio preciso; (d) capacidades e competências – de
comunicação e relacionais, empresariais e de gestão, associadas ao desenvolvimento
e implicação com o trabalho, de disponibilidade de mobilidade e horário, e pessoais,
comportamentais e sociais.

No próximo capítulo apresentaremos os resultados que obtivemos com a análise dos


anúncios, utilizando, principalmente, o conjunto de classificadores que foram
trabalhados no Bloco 4.
17 9

Capítulo 5 – O mérito capturado nos anúncios de


emprego voltados a gerentes e executivos brasileiros

Este capítulo apresenta os resultados obtidos com a análise dos anúncios de emprego
voltados a gerentes e executivos no Brasil durante os anos de 1990 e 2005. Está
organizado em 5 partes, cada qual abordando uma temática específica.

Na primeira, o foco recai sobre os empregadores. Busca-se identificar as variáveis que


estes utilizam para ‘se mostrarem’ ou se identificarem diante dos futuros candidatos, e
com isso atrair sua atenção. A presença (ou ausência) de informações relativas ao
nome da empresa, porte, nacionalidade, setor de atuação e outros registros de
valorização despontam como o campo de investigação.

Na segunda parte, a atenção se volta para a apresentação dos postos de trabalho.


Partindo de princípios de análise semelhantes aos adotados anteriormente, busca-se
captar como os contratantes descrevem as contrapartidas ofertadas (benefícios,
remuneração, carreira) e os demais elementos que se associam à qualidade das
vagas (ambiente de trabalho, jornada e natureza do vínculo) tendo em vista a
valorização das mesmas. Destaque especial é dado à forma com que descrevem as
funções ou tarefas que esperam que os candidatos venham a desempenhar caso
sejam contratados.

A terceira parte representa o cerne da pesquisa: o perfil dos profissionais desejados,


conforme aparece indicado no texto dos anúncios. As demandas estão separadas em
4 grandes blocos de exigências: características adscritas e posse de bens; experiência
e trajetória profissional; formação acadêmica e outras qualificações; e competências
ou capacidades específicas. Para cada conjunto de exigências é feita uma análise
particular, verificando as transformações nas diferentes variáveis que o constitui.

Na seqüência (quarta parte) busca-se retornar à questão original, qual seja, verificar
se os anúncios de emprego estão mais meritocráticos com o passar do tempo. Dessa
forma, consiste em um ‘resumo conclusivo’ das partes anteriores.
18 0

A quinta e ultima parte introduz a figura dos ‘intermediários’ no contexto. Em um


exercício exploratório, procura-se mapear as conseqüências da ação destes atores no
tipo de exigência que é feita aos candidatos, tornando o processo de pré-seleção
operado a distância, pelos anúncios de emprego, mais complexo e exigente.

No geral os gráficos e tabelas elaborados apresentam os dados relativos ao ano de


2005 isolados por suporte (sites 1 e 2 e jornais), permitindo a comparação entre eles,
além do total.

5.1. Quem são os empregadores anunciantes e como eles se apresentam?

O primeiro elemento que contribui para a identificação dos empregadores anunciantes


é menção ao nome da empresa. Quando isso ocorre, o anúncio é considerado como
do tipo ‘aberto’, por oposição ao anúncio ‘fechado’, onde esta informação não é
disponível.

Na comparação entre os dois anos base, chama atenção a redução significativa do


volume de anúncios ‘abertos’. (Gráfico 1)

Gráfico 1
Anúncios do tipo 'aberto' (%)
- 2005 por suporte e totais 1990 e 2005 -

40,00%

35,00% 35,00%

30,00%

26,00%
25,00%

20,00%
16,33%

15,00% 15,00%

10,00%
8,00%

5,00%

0,00%
Site 1 Site 2 Jornais (2005) Total 1990 Total 2005
18 1

A literatura especializada (CHIAVENATO: 1999; OLIVEIRA: 2000) descreve este


recurso como parte de uma estratégia que é acionada quando a empresa quer manter
os candidatos à distância ou quando não tem interesse em se mostrar nem aos
concorrentes e nem aos seus quadros internos (especialmente nos casos em que o
recrutamento se dá para a substituição de profissionais em postos que ainda estão
ocupados).

De qualquer modo, essa ‘falta’ representa a privação de um elemento relevante para o


processo decisório dos candidatos, uma vez que o nome da empresa se faz
acompanhar de referências simbólicas positivas ou negativas que implicitamente
ajudam a compor um quadro de julgamento da organização, dos seus produtos, do
ambiente de trabalho, da relação com os funcionários, etc.

Esta lacuna poderia ser preenchida a partir da indicação de outros elementos que
possibilitassem a compensação do que é ocultado pela ausência do ‘nome’, como, por
exemplo, informações relativas ao porte da empresa, ao setor ou segmento em que
atua, ou ainda à sua nacionalidade.

De fato, considerando estas três variáveis, percebe-se o incremento da quantidade de


anúncios que as tornam disponíveis. Á exceção das referências ao setor de atuação,
que foram inferidas a partir de diversos elementos informacionais apresentados130, e
que praticamente mantêm a mesma representatividade, as demais (porte e
nacionalidade) se encontram explicitamente mencionadas nos diversos corpus e
crescem em volume131. (Gráfico 2)

130
Como por exemplo o nome da empresa, o tipo de produtos ou mesmo o título da vaga. Exemplo: para
o posto apresentado com o título de ‘gerente de loja’, é evidente que se trata de uma empresa que atua
no setor terciário (comércio e serviços).
131
No caso do Site 1, durante o processo de cadastramento das vagas, são apresentados campos
específicos para que o anunciante inclua informações referentes ao seu porte, nacionalidade e setor de
atuação; o que justificaria a maior presença destes elementos quando comparado com os outros dois
suportes (Site 2 e Jornais).
18 2

Gráfico 2
Informações sobre a empresa: setor, porte e
nacionalidade (%)
- 2005 por suporte e totais 1990 e 2005
90,00%
84,00%

83,00%
80,00% 80,00% 75,00%
72,00%
68,00%
70,00%
73,00%

60,00% 60,67%

54,00%
50,00%
45,00% 44,67%
40,00%

32,00%
30,00%

22,00%
20,00% 20,00%

19,00%
10,00%

0,00%
Site 1 Site 2 Jornais (2005) Total 1990 Total 2005
setor porte nacionalidade

Este movimento pode ser interpretado a partir da perspectiva de uso dos anúncios
como peças de marketing (ver capítulo 2), sendo assim tratados como recursos que
ajudam a compor um quadro de valorização das empresas e das vagas. O propósito
seria de ‘chamar a atenção’ dos futuros candidatos graças à explicitação de atributos
que as diferenciam do conjunto ordinário formado pelas ‘demais empresas’, e com isso
marcar uma posição própria na hierarquia do ‘campo do recrutamento’. Assim, visando
atrair os melhores candidatos, os anunciantes apresentariam aquilo que mais os
favorece, à semelhança do que ocorre no mercado matrimonial.

Isso se torna especialmente mais evidente quando se detalha as variáveis de porte e


nacionalidade: em 2005, das empresas que apresentaram informações sobre o seu
porte, mais da metade pertence ao tipo ‘grande porte’ (Tabela 5) – e quando
excluímos o Site 1 do conjunto (eliminando a influência da existência de campo
específico para a entrada deste tipo de dado), percebe-se que nos outros 2 suportes
não há registro de nenhum caso classificado como de tipo ‘pequeno porte’.
18 3

Tabela 5 - Anúncios que apresentam informações sobre o PORTE das empresas: total e
por tipo de porte - 2005 por suporte e totais 1990 e 2005

Porte identificado
Suportes e Totais Total de casos Tipo de porte (%) (*)
N % pequeno médio grande
Site 1 80 80,00% 45,00% 26,25% 28,75%
Site 2 32 32,00% 0,00% 9,38% 90,63%
Jornais 22 22,00% 0,00% 13,64% 86,36%
Total 2005 (N=300) 134 44,67% 26,87% 20,15% 52,99%
Total 1990 (N=100) 20 20,00% 5,00% 35,00% 60,00%
(*) calculado em relação ao total de casos que identificam o porte

O mesmo vale para a referência à nacionalidade, onde as empresas ‘internacionais’ ou


‘multinacionais’ estariam, no registro da hierarquia das valorizações, acima das
empresas ‘nacionais’. Também excluído o Site 1 pelas mesmas razões já indicadas,
observamos de ¾ das referências à nacionalidade nos demais suportes ressaltam a
atuação internacional da empresa, o que poderia aparecer, aos olhos dos candidatos,
como um equivalente simbólico da existência de melhores condições de trabalho,
melhor remuneração ou ainda maior estabilidade.

Tabela 6 - Anúncios que apresentam informações sobre a NACIONALIDADE das


empresas: total e por tipo de nacionalidade - 2005 por suporte e totais 1990 e 2005

Nacionalidade identificada
Suportes e Totais Total de casos Tipo de nacionalidade (%) (*)
N % Nacional Multinacional / internacional
Site 1 83 83,00% 86,75% 13,25%
Site 2 54 54,00% 24,07% 75,93%
Jornais 45 45,00% 24,44% 75,56%
Total 2005 (N=300) 182 60,67% 52,75% 47,25%
Total 1990 (N=100) 19 19,00% 31,58% 68,42%
(*) calculado em relação ao total de casos que identificam a nacionalidade

Quando a referência é feita explicitando o atributo de ‘empresa nacional’, a busca da


valorização aparece seja pela transformação da ‘brasilidade’ em um diferencial
positivo (na linha do ufanismo) e/ou pelo acréscimo de outras variáveis ou registros
que, no conjunto, fortalecem a posição da empresa tornando-a relevante, como nos
exemplos apresentados a seguir.
18 4

• Grupo do segmento de bebidas 100% nacional, com 6 fábricas e 25 centros


de distribuição em todo o país, composto de aproximadamente 6.000
funcionários e em contínua expansão. (Site 2 – anúncio n. 33 – Gerente
Operacional de Vendas)

• RM Sistemas, empresa 100% brasileira de desenvolvimento de sistemas


integrados de gestão, eleita pelo 5º ano consecutivo como uma das 100
Melhores Empresas para se Trabalhar (Guia Exame) (Site 2 – anúncio n. 39 –
Gerente de Filial)

• Empresa de grande porte, integrante de sólido grupo nacional (Jornal (2005)


– anúncio n. 40 – Gerente de Contas a Receber)

Finalmente, as empresas também fazem uso de outros recursos no sentido de se


tornarem ‘atraentes’ ou de se ‘valorizarem’ diante dos candidatos. Marchal e Torny
(2002) destacam que estes registros são destinados “a situar a empresa em relação
aos seus concorrentes, a colocar em evidência seu potencial de desenvolvimento, a
qualidade de seus produtos, a importância de sua clientela...” (MARCHAL & TORNY:
2002, p. 81 – tradução própria).

Classificamos este conjunto de informações em 3 unidades distintas de registros de


valorização:

(a) informações quantitativas sobre a empresa (volume de vendas, quantidade de


funcionários, faturamento, países em que opera, tempo de existência, etc.);
(b) informações sobre a expansão da empresa (‘em ampliação’, ‘em expansão’,
‘para sua nova unidade’, etc.); e
(c) informações que apontam para a importância da empresa ou de seus produtos
e serviços (‘líder em seu segmento’, ‘reconhecida’, ‘importante’, ‘certificada
ISO’, etc.)132.

O resultado da análise comparativa do conjunto é pouco favorável aos casos


coletados em 2005 comparativamente a 1990, o que se deve principalmente pela sua
menor incidência nos suportes ‘sites’.

Porém, quando se examina esse conjunto isolando cada uma das variáveis - registros
quantitativos, de importância e de expansão - percebe-se que a grande queda se dá

132
Nesse agregado pode-se observar que as empresas valorizam suas qualidades de maneira muito
subjetiva e heterogênea, lançando mão de diversos recursos. Aos tipos de informação destacadas
poderíamos acrescentar aquelas que são relativas ao porte e nacionalidade, como já mencionado.
18 5

entre estes últimos, ou seja, em 1990 as empresas enfatizavam mais a ‘expansão’ de


suas atividades como argumento de atração dos candidatos. Inversamente, os
registros de valorização de natureza quantitativa ou numérica assim como aos de
importância experimentam ligeiro crescimento. (Tabela 7)

Tabela 7 - Anúncios que apresentam REGISTROS DE VALORIZAÇÃO das empresas: total


e por tipo de registro - 2005 por suporte e totais 1990 e 2005

Registros de valorização da empresa


Registros
Suportes e Totais Total de registros (quantitativos + Registros Registros de
de
importância + expansão) quantitativos importância
expansão
Ocorrências (*) N % (%) (%) (%)
Site 1 21 18 18,00% 3,00% 16,00% 2,00%
Site 2 23 17 17,00% 9,00% 11,00% 3,00%
Jornais 59 45 45,00% 9,00% 33,00% 17,00%
Total 2005 (N=300) 103 80 26,67% 7,00% 20,00% 7,33%
Total 1990 (N=100) 42 34 34,00% 5,00% 19,00% 18,00%
(*) um mesmo anúncio pode apresentar mais de uma ocorrência

Por outro lado, verifica-se que o volume das empresas que não se apresentam com
base em nenhum tipo de informação (seja relativa ao porte, à nacionalidade, às
suas cifras quantitativas, à sua expansão ou à importância) perde terreno. Em 1990,
metade dos casos da amostra encontrava-se nessa situação; já em 2005 esse
percentual cai para 23%. Além disso, nota-se o incremento expressivo da quantidade
de anunciantes que fazem uso de mais de um qualificador.

Tabela 8 - QUANTIDADE de REGISTROS DE VALORIZAÇÃO das empresas apresentados


nos anúncios - 2005 por suporte e totais 1990 e 2005

Quantidade de registros de valorização da empresa Total de


Suportes 0 registro 1 registro 2 registros 3 registros e + anúncios

N % N % N % N % N %
Site 1 15 15,00% 3 3,00% 69 69,00% 13 13,00% 100 100,00%
Site 2 29 29,00% 45 45,00% 19 19,00% 7 7,00% 100 100,00%
Jornal 25 25,00% 43 43,00% 19 19,00% 13 13,00% 100 100,00%
Total 2005 69 23,00% 91 30,33% 107 35,67% 33 11,00% 300 100,00%
Total 1990 50 50,00% 25 25,00% 20 20,00% 5 5,00% 100 100,00%

Em suma, embora nos dois períodos considerados as empresas se apresentem


menos nominalmente, verifica-se que elas têm feito uso de outros recursos para
compor a sua ‘imagem’ frente aos candidatos e demais públicos, com destaque para
18 6

informações relativas à nacionalidade e porte, que podem ser categorizadas como


indicativas da ‘importância’ do recrutante, em substituição às referências mais
presentes em momento anterior, como a ‘expansão’ por exemplo.

5.2. Como são apresentados os postos de trabalho ?

O mesmo raciocínio empregado na análise das informações que são destinadas à


valorização das empresas pode ser aplicado frente à descrição dos postos de trabalho
ofertados. Nessa linha, as variáveis ‘clássicas’ que permitiriam antever a ‘qualidade’ do
posto são:

(a) salário / remuneração;


(b) benefícios;
(c) perspectiva de carreira ou de desenvolvimento do profissional; (d) ambiente de
trabalho;
(d) jornada de trabalho; e
(e) natureza do vínculo empregatício.

A análise dos dados permite constar que, ao mesmo tempo em que as empresas se
mostram mais estimuladas a ampliar a quantidade de informações que as
valorizam diante dos candidatos, inversamente elas se preocupam menos em
fornecer elementos que possibilitem aos candidatos avaliar as contrapartidas
que lhes são ofertadas.

Duas hipóteses complementares podem ser levantadas para explicar esta situação. A
primeira é de que, de fato, estaria havendo uma contração (e concentração) nas
contrapartidas ofertadas (ver Box a seguir). E a segunda é de que tais benefícios
estariam sendo interpretados como pertencentes a um referencial de valorização que
aponta para uma visão ‘tradicional’ das relações de trabalho, e portanto sua
explicitação seria cada vez menos relevante como fator de atratividade para os
candidatos. Isso porque, na medida em que ganha força a perspectiva de que cada
indivíduo é o único sujeito responsável por sua própria trajetória, é o elemento relativo
ao ‘desafio’ ou ainda a descrição das atividades que serão desempenhadas que
deverão permitir ao candidato avaliar a adequação daquela oferta singular (da qual o
18 7

anúncio é expressão) aos seus projetos pessoais em termos de desenvolvimento de


sua trajetória profissional, ou de seu ‘portfólio de experiências’. Estes sim fariam parte
do discurso ‘moderno’ em relação à descrição dos postos de trabalho.

Previdência privada – o benefício que mais cresce

“Segundo a base de dados da consultoria Hay Group, a adesão das empresas aos planos de
previdência privada cresceu exponencialmente nos últimos tempos. (...) O levantamento mostra
ainda uma profunda mudança na grade de benefícios. Algumas das políticas adotadas pelas
empresas no passado estão minguando de ano para ano. O seguro de vida, por exemplo, está
entre os benefícios que mais encolheram nas empresas brasileiras na última década. (...) O
mesmo se observa com a cobertura de viagens particulares que, embora nunca tenha sido
oferecida pela maioria das empresas, entrou no rol dos benefícios em extinção. (...) Escolas
para os filhos dos executivos hoje é assunto praticamente fora de questão. Entre os benefícios
tradicionais, o único que se mantém ao lado dos planos de saúde é a cessão de automóveis,
que avançou além da presidência e da diretoria e se tornou ainda mais comum entre a alta
gerência.”
Revista Exame, 24 de maio de 2006 – p. 29

Assim, simbolicamente, os mesmos elementos que outrora valorizavam a vaga


tornando-a mais atraente, podem estar adquirindo, no campo de ‘busca de empregos’,
sinal inverso. Acresce que na ‘ética’ do business, negociações salariais e tudo o mais
que ela envolve somente devem ser iniciadas após o acerto em torno do que será
realizado, do que é esperado do profissional. E ao se apresentarem como ‘objeto de
negociação’, as partes envolvidas buscarão fazer valer seus recursos e sua força
visando a obtenção de vantagens. Tudo se passa então como se os elementos que
‘fixariam’ o posto/vaga e que o mapeariam frente aos demais em relação aos
benefícios que o candidato poderia esperar, fossem hierarquicamente rebaixados em
prol de um ‘projeto’ individual de carreira, cuja mobilização primeira deve incidir sobre
a análise das funções que lhe serão confiadas e que lhe permitirão (ou não) avançar
neste projeto, e não da ‘rigidez’ das contrapartidas pré-definidas.

É a partir desta perspectiva que se pode interpretar, de um lado, a redução na


quantidade global de anúncios que se ocupam de informar ao menos um dos
componentes por nós definidos como sendo os que valorizariam os cargos e, de outro,
a elevação na quantidade de anúncios que mencionam as atividades que deverão ser
desempenhadas pelos candidatos (Tabelas 9 e 12).
18 8

Tabela 9 - Anúncios que apresentam pelo menos 1 elemento de valorização do posto -


2005 por suporte e totais 1990 e 2005

Suportes e Totais N %
Site 1 28 28,00%
Site 2 14 14,00%
Jornal 30 30,00%
Total 2005 (N=300) 72 24,00%
Total 1990 (N=100) 51 51,00%

No que concerne particularmente às informações sobre remuneração e benefícios,


que em 1990 estavam presentes em quase 40% dos anúncios estudados, em 2005
são identificadas em apenas 17% (remuneração) e 12% (benefícios) dos casos. Da
mesma forma, a menção à perspectiva de carreira na empresa ou de desenvolvimento
profissional via treinamento e outros, embora presente em menor proporção, também
acompanha a mesma tendência de queda. (Gráfico 3)

Gráfico 3
Informações sobre o posto de trabalho ofertado (%)
- 2005 por suporte e totais 1990 e 2005
45,00%

40,00%
39,00%
37,00%
35,00%

30,00%

25,00%
24,00%

20,00% 20,00%
17,33%
15,00% 15,00% 15,00%
12,00% 12,00% 12,33%
10,00% 10,00%
8,00%
6,00% 6,00% 6,00%
5,00% 5,00%
4,00% 4,00% 3,33%
3,00% 2,67%
2,00% 2,00% 2,00% 1,67%
0,00% 0,00%
Site 1 Site 2 Jornais Total 1990 Total 2005

Remuneração Benefícios Treinamento/carreira progressão


Ambiente de trabalho Jornada de trabalho Tipo de contrato

É interessante notar que mesmo no Site 1, que conta com campo específico para
entrada de dado destinado à inclusão da remuneração (campo ‘faixa salarial’), a
presença de casos que lhe faça alusão é significativamente inferior à verificada nos
jornais em 1990. Por outro lado este é o suporte que apresenta em maior proporção a
18 9

descrição do montante da remuneração (valores exatos ou faixa salarial). Em todos os


demais suportes, as referências à remuneração são dominantemente de natureza
qualitativa (ex: remuneração compatível com o mercado / com a função, remuneração
atrativa, ótima remuneração, etc.) (Tabela 10). Já a alta incidência deste fato no ano
de 1990 pode ser atribuída ao forte processo inflacionário presente à época, que
impossibilitava a fixação de valores mesmo em uma perspectiva de curto prazo133.

Tabela 10 - Anúncios que apresentam informações sobre REMUNERAÇÃO: total e por


formato da indicação - 2005 por suporte e totais 1990 e 2005

Remuneração
Suportes e Composição da Remuneração Remuneração
Totais Total
remuneração quantificada qualificada
N % % % %
Site 1 24 24,00% 5,00% 22,00% 2,00%
Site 2 8 8,00% 3,00% 1,00% 7,00%
Jornal 20 20,00% 7,00% 3,00% 17,00%
Total 2005
52 17,33% 5,00% 8,67% 8,67%
(N=300)
Total 1990
37 37,00% 6,00% 1,00% 35,00%
(N=100)

No que compete aos benefícios, entre os poucos anúncios que os mencionam em


2005, a tendência predominante em é de fazê-lo de forma genérica (‘benefícios
compatíveis com a função / cargo’, ‘benefícios de praxe’, ‘benefícios’, etc.) ou seja, o
contratante informa sobre a sua existência sem detalhar a sua substância (exceção no
Site 1). Esta tendência, que já estava presente nos anos 1990, permanece. (Tabela
11)

133
Marchal et alli (2003), ao estudarem a menção à remuneração nos anúncios veiculados nos sites de
empregos destinados aos ‘gerentes’ na França - respectivamente ‘Cadremploi’ e ‘CadreOnline’ – verificam
no primeiro suporte a total ausência de informações, e no segundo uma presença bastante reduzida
quando comparado com outros sites. Para explicar esta situação, afirmam que, particularmente no caso
do ‘Cadremploi’, é a forte presença de empresas de recrutamento e seleção como responsáveis pelos
anúncios que age no sentido de tornar estes dados ‘ocultos’: “a passagem por estes intermediários tem o
efeito de ocultar informações sobre os salários.” (MARCHAL et al: 2003, p. 34). Na nossa pesquisa, entre
os dois sites estudados, o Site 2 se caracteriza por ter a maior quantidade de anúncios produzidos por
agências de recrutamento (61% da amostra), e ao mesmo tempo é o suporte que apresenta a menor
quantidade de casos com informações relativas à remuneração (apenas 8%). Nesse sentido, podemos
tomar por hipótese que a situação identificada por Marchal et alli encontra paralelo com este caso
específico.
19 0

Tabela 11 - Anúncios que apresentam informações sobre BENEFÍCIOS: total e por


formato da indicação - 2005 por suporte e totais 1990 e 2005

Benefícios
Suportes e Benefícios qualificados (ou
Totais Benefícios discriminados
N % indicação genérica da sua
(ou detalhados)
existência)
Site 1 12 12,00% 4,00% 8,00%
Site 2 10 10,00% 6,00% 4,00%
Jornais 15 15,00% 10,00% 5,00%
Total 2005
38 12,33% 6,67% 5,67%
(N=300)
Total 1990
39 39,00% 21,00% 18,00%
(N=100)

A presença de elementos que remetam à carreira, treinamento e progressão, também


merece destaque. Já pouco identificada em 1990, diminui ainda mais em 2005,
estando totalmente ausente no Site 1 e quase nula no Site 2. O comentário de Adissi
(1997), uma especialista em recrutamento e seleção de executivos, é ilustrativo neste
aspecto, e reforça os argumentos apresentados por Bouffartigue (2001a; 2001c) que
apontam as fraturas na relação das empresas com seus ‘assalariados de confiança’134:

“A empresa de hoje deixou de ser percebida como responsável pelo


monitoramento da evolução da carreira do profissional; não mais é responsável
pelo seu treinamento, desobrigou-se inclusive de suportar financeiramente a sua
formação acadêmica, aperfeiçoamento em idiomas e tecnologia, pelo que
recebia em troca a fidelidade do profissional à organização.” (ADISSI: 1997; p.
126)

Na contramão da redução da quantidade de informações indicativas dos elementos


que valorizam os postos encontra-se o incremento de referências voltadas à
descrição das atividades, atribuições, funções ou tarefas que deverão ser
executadas pelos candidatos caso venham a ser contratados. Nesse sentido, pode-se
afirmar que os anúncios estão muito mais ‘completos’ do que no passado quando se
trata de permitir a avaliação do que se espera do profissional.

Não apenas se eleva a quantidade global de casos que apresentam informações desta
natureza como também as descrições, quando apresentadas, são muito mais
detalhadas. (Tabela 12)

134
Para detalhes, ver capítulo 3.
19 1

Tabela 12 - Anúncios que apresentam informações sobre DESCRIÇÃO DAS ATIVIDADES:


total e por formato da indicação - 2005 por suporte e totais 1990 e 2005

Suportes e Descrição das atividades, atribuições, tarefas


Totais N % Descrição sucinta (%) Descrição ampla (%)
Site 1 35 35,00% 14,00% 21,00%
Site 2 60 60,00% 9,00% 51,00%
Jornal 27 27,00% 10,00% 17,00%
Total 2005
122 40,67% 11,00% 29,67%
(N=300)
Total 1990
31 31,00% 18,00% 13,00%
(N=100)

Assim, em 1990, do total de anúncios que apresentavam informações sobre as


atividades (31 casos), 58% deles o faziam de forma sucinta, ou seja, utilizando no
máximo até 20 palavras. Com isso se privava os candidatos de uma referência de
peso para a elaboração de seus julgamentos - tanto no que diz respeito às atividades
a desempenhar quanto à correspondência de seu perfil face as mesmas. Abaixo são
apresentados alguns exemplos típicos desta situação retirados dos classificados de
1990:

• Irá ser responsável pela unidade da instituição. (jornal 1990 - anúncio n. 29 –


Diretor Administrativo)
• Para atuar na coordenação das áreas de produto, processos e produção.
(jornal 1990 - anúncio n. 37 – Diretor Industrial)
• Para atuar como gerente de vendas (jornal 1990 - anúncio n. 58 – Gerente de
Vendas)

Em 2005, entre os anúncios que se ocupam da descrição das atividades, a tendência


predominante é de fazê-lo modo mais detalhado: do total de anúncios que descrevem
as atividades (122 casos), apenas 27% o faz resumidamente. E isso ocorre mesmo no
suporte jornal, onde o custo do anúncio depende da quantidade de palavras que são
veiculadas. Na Internet, onde não há este tipo de restrição, torna-se mais comum
encontrar descrições das atividades que fazem uso de mais de 100 palavras, podendo
até mesmo chegar a totalizar 434, como no exemplo apresentado a seguir:

• RESPONSABILIDADES: Coordenar as ações da Qualidade conforme as necessidades


da organização, bem como definir prioridades, e implementar soluções para o
atendimento ou antecipação às expectativas das áreas da empresa; Promover e
garantir a utilização dos Sistemas da Qualidade QMS (Quality Management System) e
LIMS (Laboratory Information Management System), conforme os padrões pré-
estabelecidos pelo Grupo, visando assegurar qualidade e eficiência compatíveis às
necessidades da empresa; Desenvolver, implementar e analisar os Índices de
19 2

Qualidade, visando medir a iniciativa de melhoria na empresa; Prover e garantir a


segurança dos processos produtivos e dos produtos, através do desenvolvimento e
aplicação das normas GMP (Good Manufacturing Practices) e HACCP (Hazard
Analysis and Control Critical Points) nas áreas operacionais; Como represente da
direção em relação a qualidade, é responsável por desenvolver e garantir a
implementação do Sistema da Qualidade – ISO 9001, através do envolvimento do
todos os Gerentes de Qualidade locais, recebendo sugestões, avaliando estratégias,
definindo prioridades nas soluções, propiciando a todos a filosofia e os princípios da
Qualidade Total, bem como obtenção da eficácia na Implantação e Manutenção da ISO
9001; Assegurar que todos os materiais comprados, produzidos e vendidos estejam de
acordo com as Normas e Políticas Corporativas e as legislações nacional e
internacional; Estabelecer condições para o efetivo cumprimento das atribuições na
Área de Administração da Qualidade, suprindo-a com informações e suportes
necessários, visando o cumprimento dos resultados estabelecidos; Administrar o
processo de reclamações de Clientes através da avaliação das mesmas, levantando os
pareceres das áreas envolvidas, avaliando as causas e acompanhando as ações
corretivas necessárias, visando a elaboração do parecer técnico à Área de
Atendimento ao Cliente; Administrar processos de produtos não-conformes levantando
os pareceres e avaliando as causas junto às áreas envolvidas, visando a resolução e
conclusão dos mesmos; Proporcionar a constante atualização e evolução técnica à
equipe de trabalho de Serviços da Qualidade, mediante treinamentos, participação em
cursos e seminários e trocas de experiências, visando mantê-los em sintonia com as
novas tecnologias disponíveis e promover a motivação dos mesmos; Definir o
orçamento e as despesas da Área de Serviços da Qualidade, monitorando os
resultados atingidos a curto e médio prazo, de forma a tomar ações corretivas, quando
necessário ao cumprimento dos objetivos propostos; Manter-se atualizado quanto às
mudanças ocorridas na área de atuação, através de leitura de publicações
especializadas, participações em cursos, seminários, congressos ou feiras, visando o
aperfeiçoamento profissional e o conhecimento de inovações tecnológicas;
Responsabilizar-se e comprometer-se pelo bom ambiente de trabalho, de modo que
todos possam participar e contribuir para a otimização dos resultados propostos;
Atender e realizar outras atividades correlatas e inerentes ao cargo, conforme
orientação e solicitação do Superior imediato. (Site 2, anúncio n. 11 – Gerente de
Administração da Qualidade)

Adicionalmente, um outro elemento que ganha destaque quando se trata da descrição


das atividades é a mudança no vocabulário que é utilizado para demarcá-las. Os
termos ‘atividades’ e ‘responsabilidades’, comuns nos anos 1990, dão lugar a
‘missões’, ‘desafios’, e ‘objetivos’ – vocábulos inexistentes anteriormente e em
conformidade com o novo léxico que se dissemina no campo da gestão. Ao invés de
‘dirigir’, ‘chefiar’, ‘comandar’, o novo profissional deverá ‘coordenar’, ‘gerir’, ‘negociar’,
como nos exemplos a seguir.

• Missão do cargo: Liderar negociações de contratos de interconexão e serviços


associados a interconexão; Coordenar a gestão de contratos de interconexão e
serviços associados a interconexão através do exercício de direitos e cumprimento de
obrigações contratuais da Telemar; Maximizar as receitas e minimizar as despesas
relacionadas à interconexão de redes; Cumprimento das metas quantitativas e
qualitativas de negociação de contratos. (Site 2 – anúncio n. 42 – Gerente de
Negócios)
19 3

• A missão deste profissional é desenvolver novas oportunidades de negócios através


da venda de soluções customizadas às necessidades dos clientes voltadas para
serviços de inspeção, avaliação e conformidade e auditorias (jornal 2005 – anúncio
n. 35 – Gerente Comercial)

• Principal Desafio: Responsável por uma equipe composta por, aproximadamente, 25


profissionais. Planejar e gerir o orçamento e o plano estratégico da área de Recursos
Humanos. Gerenciar as principais áreas de RH: Treinamento e Desenvolvimento,
Recrutamento e Seleção, Remuneração e Benefícios, Relação com Sindicatos, Serviço
Médico e Assistência Social. (Site 2 – anúncio n. 64 – Gerente de Recursos
Humanos)

Tais termos também refletem o aspecto ‘instigante’, que se associa ao ‘correr riscos’ e
à realização do self que marcam o individualismo nas relações de trabalho, elementos
que Boltanski e Chiapello (1999) identificam como sendo constitutivos da ‘cité par
projet’. Vê-se aqui a expressões que caracterizam a linguagem moderna da gestão,
que aciona não mais prioritariamente os atributos de perenidade ou longevidade dos
contratos, mas sim a sua capacidade de mobilizar e diferenciar os profissionais.
Enquanto as tarefas ou funções remetem a processos, ao cotidiano e à repetição, os
desafios remetem aos ‘projetos’, à inovação e à curta duração.

Há que se acrescentar ainda que este tipo de discurso é particularmente enfatizado


quando se trata de atrair aqueles que serão os ‘futuros executivos’ que iniciam a
carreira como trainees. Diante de um público jovem, recém formado, mais afeito ao
apelo dos ‘desafios’ e debutando na vida profissional, a empresa se apresenta como
um espaço onde suas aspirações individuais podem vir a ser alcançadas, onde o
‘sucesso’ poderá ser obtido e o sujeito poderá se identificar com a elite dos
‘ganhadores’; enfim as vagas nessas empresas aparecem como um espaço a ser
conquistado por aqueles que ‘podem’ e que dispõem de recursos para tanto.

O exemplo de anúncio para trainees apresentado a seguir (Figura 4), extraído de uma
revista destinada ao consumo pelo público executivo, é ilustrativo desta situação.
19 4

Figura 4 – Anúncio de vagas para Trainees (n. 1)

Fonte: Revista Exame ano 38, n. 10, 26 de maio de 2004135

Mas nos anúncios também se pode observar a presença de uma outra vertente do
discurso que, partindo dos mesmos princípios estruturantes, apela para outros
elementos de mobilização. Nesses a ênfase é no ‘bem comum’ e, assim, se alinham
com a onda de valorização da ‘atuação social’ ou da ‘responsabilidade social das
empresas’. Aqui o que se encontra em destaque é a apresentação da organização
como um lócus privilegiado, que permitirá aos indivíduos ‘fazer diferença’ ou ainda ‘dar
um sentido maior’ à sua existência. Dessa forma, ao invés de aparecer como um
espaço típico de valorização do capital, do lucro e do sucesso individual, a empresa se
mostra também como sendo um ambiente voltado, antes de tudo, para a melhoria das

135
Texto do anúncio: “queremos novos talentos, dispostos a vestir nossa camisa, conquistar posições e
atuar num TIME DE CRAQUES. BV Financeira, uma empresa jovem, em franco desenvolvimento,
modernamente estruturada, com participação das mais expressivas no segmento financeiro, integrante do
grupo Votorantim, um grande conglomerado empresarial, reconhecido por sua solidez, tradição e
seriedade, é o lugar ideal para jovens criativos, determinados, empreendedores, interessados em dar um
impulso à sua evolução profissional”.
19 5

condições de vida e das relações sociais das diversas comunidades. Um exemplo


característico desta disposição é apresentado a seguir136. (Figura 5)

Figura 5 – Anúncio de vagas para Trainees (n. 2)

Fonte: Revista Exame ano 37, n. 19, 17 de setembro de 2003137

136
Boltanski e Chiapello (1999) identificam, na literatura de gestão dos anos 1990, a necessidade de
proporcionar um ‘sentido’ ao engajamento que não se reduza ao lucro, uma vez que este não seria um
motivo suficientemente mobilizador. Para tanto citam Genelot (1992) e afirmam: “aussi l´entreprise doit-
elle “devenir um lieu de construction de sens, de finalités partagées, où chacun peut à la fois développer
son autonomie pernonnelle et contribuer au projet collectif” » (GENELOT : 1992, apud BOLTANSKI &
CHIAPELLO : 1999, p. 102). Se no momento anterior (segundo espírito do capitalismo), as razões
verdadeiras para o engajamento eram buscadas na promoção do desenvolvimento da nação (tendo as
grandes empresas como parte propulsora), neste novo quadro de referentes o que se buscaria é, além
destes, a ocupação dos espaços ‘vazios’, onde o Estado se faz ausente. Deste modo, as questões
ecológicas, a problemática da infância, saúde, educação são nichos ‘por excelência’ na formação destes
novos sentidos.
137
Texto do anúncio: “Nutrir a vida com direito a sonhar e superar desafios. Eis a essência da Parmalat,
uma empresa moderna, líder de mercado, reconhecida pela força de sua marca e pela qualidade de seus
produtos. Queremos ter ao nosso lado jovens talentosos, empreendedores, interessados em compartilhar
da nossa essência para, juntos, construirmos um amanhã melhor. (...) Construir uma vida saudável, uma
sociedade justa, um ser humano em harmonia com a vida, uma empresa visionária. Fazer isso com
emoção e entusiasmo é uma questão de paixão. Paixão de ser Parmalat.”
19 6

Acresce que este elemento de ‘valorização da responsabilidade social das empresas’


tende a ser decodificada pelos candidatos que, com apoio da mídia e da literatura de
gestão, a interpretam como equivalente à seguinte máxima: empresas socialmente
responsáveis são formadas por indivíduos socialmente engajados. Nesse sentido, o
trabalho voluntário, até então representativo de uma questão de foro íntimo, ganha
destaque como uma nova competência, tornando-se uma nova moeda de troca na
disputa dos indivíduos pelas vagas no mercado de trabalho. A atividade altruísta
finalmente pode representar a possibilidade de obtenção de um ganho econômico (e
não apenas simbólico) real para os candidatos, na medida em que ela é vista também
como uma ‘proxis’ para outros elementos que são valorizados pelas empresas, tais
como a capacidade de relacionamento, de trabalho em equipe e até mesmo de
‘organização do tempo’. (Ver extrato de reportagem a seguir)

Trabalho voluntário, já

O trabalho voluntário começa a ter novo efeito colateral no Brasil — neste caso, no mercado
profissional. É que desenvolver projetos sociais, além de fazer muito bem à sociedade, começa
a contar pontos para o currículo. Isso porque as empresas identificam nesses profissionais
características tidas como importantes num funcionário: capacidade de trabalhar em equipe,
espírito de solidariedade e habilidade de administrar o tempo.

Para se ter uma idéia, na Sul América e na PricewaterhouseCoopers, participar de ações


sociais pode ser o critério de desempate entre dois candidatos. E em fichas de processos de
seleção de empresas como Magazine Luiza, General Electric e Shell, o candidato já precisa
declarar se é voluntário de projetos sociais.

Segundo Vera Cavalcanti, professora da Escola Brasileira de Administração Pública e de


Empresas da Fundação Getúlio Vargas (Ebape/FGV), já passou o tempo em que ter
voluntários na equipe era assunto para a área de marketing, ou seja, uma questão de imagem
da empresa. Hoje, trata-se de tema para o departamento de Recursos Humanos: — É possível
intuir que os voluntários têm valores humanitários, o que é, sim, um tópico para se destacar no
currículo.

Jornal O Globo, 19/04/2004

É com base nesse tipo de interpretação e na busca de obtenção de vantagens na


disputa pelas vagas que podemos compreender a presença de tais elementos nos
resumos dos currículos de candidatos a empregos os mais diversos, conforme pode
ser observado nos exemplos apresentados a seguir, extraídos de um banco de
19 7

empregos na Internet de acesso público e gratuito138, onde os candidatos além de


descrevem sua experiência profissional, sua formação e competências, incluem entre
estas, o seu diferencial pautado pelo engajamento em ações sociais.

• R. S. O. – candidata para a área industrial: “(...) Visitas e organização de festas


para as crianças do Orfanato Lar Santa Terezinha de Mairiporã em datas
especiais, com a participação de amigos e funcionário da Lojas Nissei. Aulas de
reforço em fins de semana para crianças carentes. Word, Excel, Power Point,
Access, Internet. Brasileira, 30 anos, Solteira.”

• D. F. S. – candidata para a área de atendimento ao cliente: “(...) Trabalho


Voluntário; Iquique – Chile (Janeiro de 2002) Trabalho Voluntário; Ciudad de
Panamá – Panamá (Maio de 2002) Congresso Metodista; Sahsa – Nicarágua
(Maio a Agosto de 2003) Trabalho de Voluntariado em uma comunidade indígena
na região Atlântica Norte do País; New York – USA – 1a. Semana de Maio e
Agosto de 2003 – Treinamento e avaliação do Programa Voluntários de Justiça
Global na Nicarágua; Bacharel em Turismo – 2001; Inglês Fluente; Espanhol
Fluente; Italiano Fluente; Em informática usuária de Word, Internet, Excel, Power
Point; Brasileira, 25 anos, Solteira.”

• P. A. S. P. – candidato para a área de Marketing: “ (...). Integrante ativo do grupo


de Responsabilidade Social da Cásper Líbero, grupo que tem suas atividades
voltadas para o lado social, bem como, voluntário em muitas ações sociais. (...)
Windows, Photoshop e, Pagemaker, bons conhecimentos de Corel Draw e Access
e, conhecimentos Intermediários de MS Project. Brasileiro, 41 anos, Casado.”

Para concluir, podemos resumir o que foi exposto afirmando que, ao mesmo tempo em
que rareiam os elementos que tradicionalmente tornariam as vagas mais atraentes
para os candidatos (tais como remuneração, benefícios, perspectiva de carreira,
condições de trabalho, etc.), cresce tanto a quantidade quanto o detalhamento das
atividades que as empresas esperam ser desenvolvidas pelos profissionais. Mas a
menção às atividades, por seu turno, é cada vez mais manifesta com base em
vocábulos que fazem apelo à subjetividade dos sujeitos, especialmente quando se
trata de ‘despertar’ neles o desejo pelo que a ‘oportunidade’ pode trazer em termos de
‘agregar valor’ ao seu ‘projeto’ pessoal na composição do seu ‘portfólio’ profissional e
pessoal.

138
Exemplos extraídos do site www.grupoprime.com.br, em 3 de fevereiro de 2005. Os nomes das
pessoas foram ocultados, permanecendo apenas as letras iniciais.
19 8

5.3. Qual o perfil dos gerentes que é valorizado ?

As referências que as empresas utilizam para desenhar o perfil do candidato que está
sendo buscado podem ser agrupadas em 4 grandes blocos de tipos distintos de
requisitos ou de exigências, a saber:

• Tipo 1 - requisitos gerais associados às características adscritas e de posse de


bens;
• Tipo 2 - requisitos associados à experiência e trajetória profissional;
• Tipo 3 - requisitos associados à formação acadêmica e outras qualificações;
• Tipo 4 - requisitos associados à posse de competências e/ou capacidades
específicas.

As variações ao longo do período considerado, tendo em conta cada um destes tipos,


são analisadas nos itens que se sucedem.

5.3.1. Características adscritas e posse de bens

Por características adscritas estamos nos referindo às exigências que são feitas em
relação aos candidatos que se situam no plano dos atributos não ‘mutáveis’ por força
da vontade do indivíduo, tais como sexo e idade139. Mas também ampliamos o
conceito para dar conta de outros atributos que podem ser associados a algum tipo de
pertencimento a grupos sociais ou a classe social, como é o caso das referências a
‘aparência’. Tradicionalmente, estas 3 variáveis (acrescidas de cor e religião),
conformam o ‘núcleo duro’ ou o mais evidente da discriminação no mercado de
trabalho.

Fortemente denunciadas e combatidas por diversos movimentos sociais


(especialmente a demanda por ‘aparência’ que se revela excludente em relação às
populações de baixa renda e aos negros), estas referências foram finalmente objeto

139
O conceito de atributos adscritos e adquiridos pode ser consultado em nota no capítulo 1 (nota de
número 12). Para detalhes, ver trabalho de Fernandes (2004), intitulado ‘Estratificação Educacional,
origem socioeconômica e raça no Brasil: as barreiras da cor’.
19 9

de regulamentação específica140, que as proíbe de aparecer nos anúncios de


emprego.

Este fato por si só já explicaria tanto a redução da sua presença nos dois momentos
considerados, quanto a maior incidência de critérios do tipo ‘paritários’ em relação ao
sexo (ex: advogado (a); contador (a)....) - que se tornam ‘politicamente corretos’ e
somam pontos à imagem da empresa.

Adicionalmente, duas outras variáveis podem ser incluídas a este conjunto, embora se
afastem da discriminação do tipo ‘tradicional’. São elas: a ‘posse de bens’ (exemplos:
‘com veículo próprio’, ‘com telefone’, ‘com computador e internet’, etc.), que é
indicativa da presença de um determinando patamar de capital econômico; e o local
de residência, devendo este último ser abordado com ressalvas uma vez que é
também indicativo de um tipo de recrutamento que ultrapassa as fronteiras locais.
Portanto a questão de residir em um determinando município ou região pode tanto ser
um fator que restringe o universo dos candidatos, quanto ser uma forma de transferir a
estes os custos com a mudança de residência caso eles se interessem pelas vagas.

De todos os elementos enumerados, apenas a demanda por ‘local de residência’


cresce no período. (Gráfico 4) Para os demais a situação é inversa, o que pode ser
imputado ao cumprimento da regulamentação (pelas empresas e pelas mídias
responsáveis pela divulgação dos anúncios).

140
Desde julho de 2003 os jornais cariocas (O Globo, Extra, O Dia e Jornal do Brasil) estão proibidos de
veicular anúncios de emprego que empreguem termos que possam restringir o ingresso de pessoas no
mercado de trabalho devido a atributos tais como sexo, idade ou cor. Também deixaram de ser
veiculadas palavras e expressões que possam denotar qualquer tipo de discriminação, como por exemplo
“boa aparência” e “boa apresentação”. Na ocasião, foi assinado um Termo de Compromisso de
Ajustamento de Conduta entre o Ministério Público do Trabalho e os referidos jornais, que passaram a
publicar, na sua seção de classificados, o seguinte texto: “De acordo com o art. 5º. Da CR/88 c/c art. 373-
A da CLT, não é permitido anúncio de emprego no qual haja referência quanto a sexo, idade, cor ou
situação familiar, ou qualquer palavra que possa ser interpretada como fator discriminatório, salvo quando
a natureza da atividade assim o exigir”.
20 0

Gráfico 4
Tipo 1 - Demanda por Caracteristicas adscritas e posse de bens (%)
- 2005 por suporte e totais 1990 e 2005 -

25,00%

21,00%
20,00%

16,00%
15,00%

12,00%
11,00% 10,67%
10,00%
9,00% 9,00%

5,67%
5,00% 5,00%
4,00% 4,00% 4,00%
3,00% 3,00% 3,00% 3,00%
2,00% 2,00% 2,33%
2,00%
1,00% 1,00% 1,00%
0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00%
Site 1 Site 2 Jornais (2005) Total 1990 Total 2005

TOTAL DA CATEGORIA sexo idade apresentação residência posse de bens

As referências a ‘aparência’ por exemplo, já pouco presentes em 1990, desaparecem


totalmente em 2005, ainda que se saiba que ‘de fato’ este segue sendo um fator
considerado pelos empregadores em seu processo decisório no momento da
contratação e promoção dos profissionais. O mesmo ocorre com a variável ‘idade’ que,
presente em 16% dos casos em 1990, faz-se notar em apenas 3% dos anúncios na
amostra de 2005 (ver quadro a seguir).
20 1

Beleza e juventude em alta nos currículos

Como você reagiria ao saber que sua concorrente a uma vaga de emprego é tão, tão bonita quanto
Gisele Bündchen? Se acha que não daria a mínima para a beldade é porque desconhece que beleza e
juventude também estão sendo levadas em conta — e muito — num processo de seleção. Pelo menos é
o que diz pesquisa patrocinada pela Universidade Estácio de Sá, em que mais da metade dos
recrutadores ouvidos (54,96%) prefere contratar candidatas que considera bonitas. Ah, sim, e
competentes também.

Há setores conhecidos por exigir boa aparência de seus profissionais, como o de vendas, que chega a
pedir fotos dos candidatos. No entanto, o resultado da pesquisa — que ouviu 413 recrutadores e 820
trabalhadoras — surpreende porque atinge áreas que não dependem desses atributos.
Espanto para uns, descrédito para outros. É que, para alguns consultores de RH, beleza não poderia ser
critério num processo de seleção. Até porque, continuam, as empresas estão cada vez mais exigentes em
relação a características que não dependem da estética, como qualificação e capacitação profissionais.

Mas a coordenadora da pesquisa, Cintia Salomão, é taxativa: — o estudo mostra claramente que as
empresas buscam um padrão, apesar dessa exigência não ser declarada. Esse padrão seleciona uma
candidata. E, se seleciona, exclui outras. E, segundo Cintia, esse grau de importância é percebido pelas
trabalhadoras: 62,2% das consultadas acham que, se forem consideradas bonitas pelo recrutador, terão
mais chance de ser bem-sucedidas. Diante disso, 34% delas admitiram já terem alterado algo do corpo a
fim de melhorar na carreira — como pintar ou alisar o cabelo, emagrecer e até se submeter à cirurgia
plástica. — Já dentro do universo de recrutadores exigentes, 50% desejariam ter funcionárias magras.
Num desempate entre duas competentes, beleza e juventude acabam sendo critérios decisivos.

(...) Os dados da pesquisa mostram ainda que 46,71% das empresas entrevistadas declararam
preferência pelas jovens. (...) Especificamente no quesito idade, a consultora Irene concorda. Ela diz que,
muitas vezes, as empresas buscam profissionais mais jovens.

Fabiana Ribeiro – Jornal O Globo, 16 de novembro de 2003.

Dados obtidos com pesquisa não acadêmica, realizada pelo grupo Catho e já
mencionada anteriormente (capítulos 2 e 3), fazem o contraponto desta evidência,
revelando que a ‘idade’ é sim um elemento decisivo para no processo de contratação,
mesmo que não seja explicitada como tal. Profissionais acima de 60 anos ou próximo
disso (55 a 59 anos) ocupam, respectivamente, o terceiro e o sexto lugar no ‘ranking’
dos fatores de influenciam negativamente a contratação de um profissional141. De
acordo com a mesma pesquisa, registros que podem ser associados à aparência
(como obesidade) e aos hábitos (fumante) são igualmente discriminantes, sendo este
último o mais relevante dentre todos (Tabela 13). Por outro lado, o fator ‘idade’ e
‘aparência’ ocupam o primeiro e o oitavo lugar entre os principais fatores que são
considerados no julgamento que é feito tendo em conta a contratação de
executivos142.

141
Inversamente, a exigência por experiência e a sua fixação em patamares de anos elevados exclui os
profissionais mais jovens, conforme será abordado no tópico seguinte.
142
Ver Tabela 3, apresentada no final do capítulo 2.
20 2

Tabela 13 - Fatores que influenciam negativamente na contratação de executivos


(respondentes ocupam cargos de presidentes e diretores)
% dos que se declaram
Fatores
com muita objeção
Fumante 44,07
Profissionais que possuem negócio próprio em paralelo
37,74
ou de seu conjugue
Profissionais que estão acima dos 60 anos 35,91
Profissionais que ficam curto período nos empregos
33,11
(menos de 2 anos)
Profissionais que já sejam aposentados 26,35
Profissionais que estão na faixa de 55 a 59 anos 18,13
Profissionais que estão trabalhando como consultores
13,24
independentes
Obeso 11,91
Profissionais que estão na faixa de 50 a 54 anos 7,30
Mulheres com filhos pequenos 6,36
Profissionais que lecionam no período noturno 3,36
Profissionais que estão deixando um negócio próprio 3,25
Profissionais que estão desempregados há mais de 6
2,30
meses
Profissionais que estudam no período noturno 1,63
Profissionais que estão na faixa de 45 a 49 anos 1,49
Profissionais desquitados / divorciados 0,54
Fonte: Pesquisa A contratação, a demissão e a carreira dos executivos brasileiros – edição 2003 Grupo Catho
(resultado de pesquisa realizada em janeiro de 2003 com 41.395 respondentes)

Porém, quando se examina estritamente o texto dos anúncios de 2005, percebe-se


que há uma menor propensão, por parte das empresas, a incluir fatores que possam
ser associados mais diretamente à discriminação comparativamente ao que ocorria
em 1990 (Tabela 14). E isso a despeito do fato de que na ‘realidade’ eles possam
tanto continuar em vigor quanto se deslocar para incorporar outros termos que façam
a vez de constritores no lugar daqueles que são eliminados (como por exemplo
exigências do tipo ‘ser enérgico’, ‘vontade de vencer’ e outros que circunscrevem
perfis mais comumente associados às gerações mais novas).
20 3

Tabela 14 - Anúncios que solicitam pelo menos 1 elemento discriminante (sexo, idade,
aparência, posse de bens ou local de residência) - 2005 por suporte e totais 1990 e 2005

Suportes e Totais N % Total de ocorrências (*)


Site 1 11 11,00% 14
Site 2 12 12,00% 15
Jornal 9 9,00% 10
Total 2005 (N=300) 32 10,67% 39
Total 1990 (N=100) 21 21,00% 27
(*) um mesmo anúncio pode apresentar mais de uma ocorrência (ex: idade + local de
residência; posse de bens + sexo, etc.)

5.3.2. Experiência e trajetória profissional

O segundo conjunto de atributos que define o perfil dos candidatos aos cargos de
gerentes e executivos consiste na referência e no detalhamento da experiência
profissional.

A experiência representa o que Grün (1995) concebe como característica definidora da


‘via lenta’ para o ingresso na profissão, onde o indivíduo vai se habilitando para o
exercício das atividades gerenciais no decorrer de sua trajetória profissional. Esta se
opõe à ‘via rápida’, que comporta o conjunto de saberes atestado pelo diploma
escolar. A questão da maior ou menor legitimidade destas duas vias é objeto de fortes
disputas sociais que transbordam para a definição das fronteiras da categoria e para a
natureza das tarefas que são realizadas.

É este o sentido em que caminha a defesa enfática do valor da experiência feita por
Mintzberg (2006), um dos principais teóricos de gestão da atualidade e dos mais
citados internacionalmente, que se opõe frontalmente à possibilidade de ascender ao
cargo pelo percurso exclusivo da ‘via rápida’. Em suas análises, ele se mostra taxativo
em afirmar que não há outra possibilidade de aprendizado da gestão que não a partir
de uma base experimental. Pondera ainda que a gerência ou a gestão não se
caracteriza como uma ‘profissão’ nos moldes clássicos, uma vez que seu conteúdo
não se presta a uma formalização ou a uma decodificação, procedimentos essenciais
para a transmissão do conhecimento. É a prática que antecede a possibilidade de
reflexão e não o contrário:
20 4

“Tentar ensinar gestão a alguém que nunca gerenciou é como tentar ensinar
psicologia a alguém que nunca viu outro ser humano. As organizações são
fenômenos complexos. Gerenciá-las é um negócio difícil, cheio de nuanças,
exigindo todos os tipos de conhecimentos tácitos que só podem ser obtidos no
contexto. (...) Se a administração fosse uma ciência ou uma profissão, poderia
ser ensinada a pessoas sem experiência. Ela não é uma coisa nem outra (...)
Junte um punhado de habilidade artesã a certa porção de arte e um pouco de
ciência e você terá que uma atividade que acima de tudo é uma prática. Não
existe ‘uma melhor forma de administrar’; tudo depende da situação.”
(MINTZBERG: 2006, p. 20 e 21).

Dessa forma, apenas aqueles que contam com uma experiência prévia seriam
capazes de aprender sobre os ‘segredos’ da gestão a fim de melhor exercê-la, o que
elimina os que trazem como bagagem apenas os certificados escolares e,
indiretamente, restringe também o acesso aos muito jovens, incluindo aqui a dimensão
geracional que por vezes fica oculta. A gerência pressupõe portanto um acúmulo
sistemático de conhecimentos tácitos e é isso que irá garantir, ao seu portador, o
direito de pleitear o seu reconhecimento como pertencente a um determinado grupo
sócio-profissional. Esse é um dos lados da contenda.

Mas as disputas que envolvem a caracterização da trajetória profissional dos gerentes


não se restringem às perspectivas antagônicas que incidem sobre sua ‘porta de
entrada’. Elas se estendem também em direção à legitimidade da construção das
trajetórias profissionais ou das carreiras. Se de um lado temos os apelos ao
‘nomadismo’, à construção de carreiras do tipo ‘portfólio de investimentos’ que são
características de mercados do tipo ‘profissionais’, tentando se impor como paradigma
para a categoria dos gerentes, de outro temos a defesa dos princípios de vinculação,
que apontam para a impossibilidade do exercício da profissão de outra forma que não
pela sua associação ao contexto (o gerente está ‘preso’ ao contexto). O deslocamento
transversal de saberes e competências seria assim uma falácia, pois estes não
existem de forma desvinculada da situação. Assim, não há ‘o gerente’, mas somente o
gerente ‘em ação’. Mais uma vez recorremos às palavras de Mintzberg para
exemplificar este tipo de defesa, que se revela tão expressiva da luta simbólica que
atravessa a categoria (seriam os gerentes um grupo profissional?) quanto àquelas que
ocorrem em torno da legitimidade das vias de ingresso:

“Como os professores de ensino fundamental podem facilmente levar suas


habilidades de uma sala de aula para outra, eles podem ser chamados de
profissionais. Mas não os gerentes, que dificilmente podem levar suas
habilidades de uma função para outra dentro da mesma empresa, muito menos
20 5

entre empresas e setores. Em outras palavras, o conhecimento sobre o contexto


não é tão portátil em administração como o é em educação, engenharia ou
medicina. (...) Imagine um gerente convidado. A idéia parece absurda. Como
alguém pode entrar e simplesmente gerenciar algo? O gerente deve ter uma
profunda compreensão do contexto. Entretanto aceitamos professores
substitutos para assumir salas de aula por um dia e médicos sem fronteiras que
instalam hospitais em horas. Mas gerentes temporários?” (MINTZBERG: 2006,
pág. 23).

Ainda que indiretamente, estes pontos podem ser captados nos anúncios por meio da
análise da natureza das exigências que são feitas aos candidatos em relação à
experiência anterior. Nas nossas amostras, esta dimensão (da experiência) assume
valores mais expressivos do que qualquer outro atributo situado nas demais categorias
analisadas143.

Jackson (2001) não considera a trajetória profissional como integrante do conceito de


mérito estendido, embora reconheça que esta poderia ser tomada como meritocrática.
No entanto, ela entende que esta variável é mais uma proxi que os empregadores
utilizam para reduzir os custos de treinamento e para avaliar outras capacidades que,
estas sim, seriam relevantes. Em suas palavras:

“Se um empregador solicita garçonete com experiência, ele pode estar usando
esta experiência como uma evidência de que ela é atraente e amigável com os
clientes, mais do que confirmando que ela é qualificada a executar as
habilidades técnicas necessárias no trabalho.” (JACKSON: 2001, p. 14 –
tradução própria)

A experiência seria, tanto quanto as certificações educacionais, um ‘sinal’ para os


empregadores, ou ainda mais um recurso para que estes organizem a ‘fila’. Por este
caráter dúbio, Jackson nem a inclui entre as variáveis meritocráticas e nem assume
que esta seria parte integrante do conjunto de variáveis não-meritocráticas144.

Posição semelhante é defendida por Gracio (2001), que concebe a experiência como
sendo uma variável que se encontra ‘na fronteira’ entre as competências formais
(como educação) e as não formais (como capacidades e competências). Ele
reconhece que os empregadores ou os dirigentes das empresas atribuem à
143
Como já mencionado no capítulo anterior, somente se considerou como demanda por experiência o
que era descrito a partir dos qualificadores “vivência em” e “experiência”.
144
De todas as categorias profissionais analisadas por Jackson, é entre os ‘managers and senior officials’
que a demanda por experiência se dá em maior intensidade. No conjunto de anúncios por ela coletado,
86% dos casos desta categoria demandam experiência. Um percentual muito próximo do que
encontramos em nossos anúncios.
20 6

experiência o valor de indicador simultaneamente, de “competência técnica e de


competência social. Sendo esta última a que é relevante e valorizada no mundo social
em questão, ela resulta no essencial e evidentemente da socialização no próprio
mundo das empresas.” (GRACIO: 2001, p. 15)

No nosso corpus, já em 1990, esta era uma exigência que se fazia presente em quase
90% dos casos. Passados 15 anos, o patamar não se reduziu, a despeito de ter
havido, ao longo do período, um grande incremento na disponibilidade de profissionais
titulados em condições de ascender ao cargo exclusivamente pela ‘via rápida’.

Mas o que chama atenção não é a permanência desta demanda genericamente


definida, mas sim as transformações que ocorrem na sua especificação. Assim,
quando detalhamos a experiência em subcategorias, podemos observar com maior
nitidez as direções que são introduzidas nas exigências, bem como a sua crescente
complexificação.

Portanto, com base na codificação proposta por Marchal e Torny (2002), criamos 3
subclasses de referências no que diz respeito à experiência: (a) experiência do tipo
‘incorporada ou qualificada’; (b) experiência do tipo ‘duração precisa’; e (c) experiência
do tipo ‘domínio preciso’.

Nossos dados apontam para a permanência no montante de exigências relativas do


tipo ‘duração precisa’, uma queda no volume do tipo ‘incorporada ou simplesmente
qualificada’, e um incremento significativo (mais de 14 pontos percentuais) na
demanda pelo tipo ‘domínio preciso’. (Gráfico 5)
20 7

Gráfico 5
Tipo 2 - Demanda por Experiência (%)
- 2005 por suporte e totais 1990 e 2005 -

100,00% 93,00%
89,00% 89,00% 90,33%
88,00%
90,00% 91,00%
84,00% 85,33%
80,00% 81,00%

70,00% 71,00%
71,00%
60,00%

50,00% 57,00% 58,00%


53,00%
50,00%
40,00%

30,00%

20,00%
9,00%
10,00% 3,00% 1,00%
0,00% 0,00%
0,00%

Site 1 Site 2 Jornais (2005) Total 1990 Total 2005

TOTAL DA CATEGORIA (exigem experiência) experiência incorporada ou qualificada


experiência de duração precisa experiência de domínio preciso

A experiência ‘incorporada’ ou simplesmente ‘qualificada’ é a expressão mais modesta


da demanda por experiência. Indica apenas que o empregador valoriza este atributo,
sem entretanto incluir nenhuma complementação que a circunscreva temporal ou
espacialmente. É o caso dos exemplos a seguir:

• exige-se experiência anterior (jornal, 2005, anúncio 22 – Gerentes)


• profissionais com experiência (jornal 2005, anúncio 38 – Gerente de Vendas)
• com experiência (jornal 2005, anúncio 76 – Gerente de Contas)
• profissionais com experiência comprovada (jornal 1990 – anúncio 13 – Diretor
Comercial)

Este tipo de demanda, presente em 9% dos casos em 1990, praticamente


desapareceu em 2005.

Já a experiência de duração precisa, que é o tipo formado pela identificação de uma


quantidade específica de anos ou de faixa temporal que delimita normalmente o
patamar ‘mínimo’ de experiência que deve ser possuída pelos postulantes às vagas,
não apresenta variações consideráveis no período. No entanto, quanto se observa a
quantidade de anos que é solicita, percebe-se que os anúncios estão mais exigentes:
há uma redução da representação dos casos que fixam o intervalo de um a três anos
20 8

como ideal e, inversamente, o crescimento nas empresas que solicitam mais de sete
anos de experiência145. (Tabela 15)

O caso do Site 2 é singular, uma vez que dos 3 suportes analisados em 2005, é o que
apresenta a demanda por experiência em uma temporalidade mais elevada, o que
inclusive ‘puxa’ para o alto a média do ano.

Tabela 15 - Anúncios que solicitam EXPERIÊNCIA DE DURAÇÃO PRECISA: total e por


quantidade de anos - 2005 por suporte e totais 1990 e 2005

Experiência de duração precisa


Outras
Suportes e Um a três Quatro a seis Sete anos ou
Total (descrita em
Totais anos anos mais
faixas)
N % % % % %
Site 1 50 50,00% 23,00% 17,00% 9,00% 1,00%
Site 2 71 71,00% 18,00% 37,00% 14,00% 2,00%
Jornal 53 53,00% 16,00% 23,00% 12,00% 2,00%
Total 2005
174 58,00% 19,00% 25,67% 11,67% 1,67%
(N=300)
Total 1990
57 57,00% 24,00% 26,00% 7,00% 0,00%
(N=100)

Normalmente a experiência de duração precisa é acompanhada por outros descritores


que a complementam, referentes ao seu contexto de aquisição. Estes foram
classificados na subclasse ‘domínio preciso’, e contribuem decisivamente para tornar
as exigências mais detalhadas, incrementando o processo seletivo que é feito à

145
Gracio (2001) percebe nos anúncios de empregos destinados aos gerentes e executivos em Portugal
uma situação distinta. As maiores taxas de crescimento estão situadas entre os anúncios que demandam
de 1 a 3 anos (que passam de 9,3% em 1989 para 11,9% em 1997) e de 3 a 5 anos (que se elevam de
8,8% para 10,2% no mesmo período). Já os anúncios que solicitam mais de 5 anos caem um pouco
(passando de 5,5% para 5,0%). A explicação para tanto é atribuída ao fato de que os menores valores de
anos de experiência (1 a 3) seriam destinados aos candidatos que iriam ocupar postos ou funções
polivalentes e estudos técnicos e planejamento, e não os postos de comando ligados às funções de
produção. Já as funções hierárquicas mais elevadas (chefias e funções de enquadramento) tenderiam a
atrair os candidatos com mais de 3 até 5 anos de experiência, indicando que a experiência também é
usada como um dispositivo de seleção que atua sobre as gerações: “o que mostra a importância da idade
na definição pelas empresas do trabalho de enquadramento. A função a desempenhar pelos candidatos
orienta assim claramente as preferências das empresas quanto às suas idades.” (GRACIO: 2001,p. 23).
Além disso, a empresa faz uso da experiência como dispositivo que lhe permite tirar proveito das
vantagens do recrutamento externo, especialmente quando se trata de um melhor posicionamento nas
negociações salariais com as gerações mais novas: “O próprio intervalo 1 a 3 anos de experiência parece
indicar que tudo se passa como se fosse necessário um contato suficientemente prolongado com o
mundo econômico para conhecer o essencial de seu funcionamento. Mas um contato, ao mesmo tempo,
não demasiado prolongado, para que os candidatos não estejam já moldados por uma cultura
determinada de empresa (Sainsaulieu, 1997: 234-63), logo, em condições de serem devidamente
socializados pela empresa anunciante. Além disso, 1 a 3 anos de experiência seria também favorável à
empresa em termos negociais.” (GRACIO: 2001, p. 24)
20 9

distância (Tabela 16). Aqui também há um destaque especial para a elevada


proporção de casos presentes no Site 2 comparativamente aos demais suportes.

Tabela 16 - Anúncios que solicitam EXPERIÊNCIA DE DURAÇÃO PRECISA E DE


DOMÍNIO PRECISO - 2005 por suporte e totais 1990 e 2005

Suportes e Totais N %
Site 1 46 46,00%
Site 2 69 69,00%
Jornal 48 48,00%
Total 2005 (N=300) 163 54,33%
Total 1990 (N=100) 49 49,00%

Considerando apenas as referências às demandas enquadradas no tipo ‘domínio


preciso’, tem-se que essas ainda podem ser subdivididas em relação à natureza deste
domínio. Assim temos os seguintes grupamentos:

(a) tipo de empresa ou setor;


(b) na função ofertada;
(c) em função anteriormente desempenhada ou em seu contexto de aquisição; e
(d) de aplicação de conhecimentos.

Como demonstrado no Gráfico 6, a tendência é de incremento das demandas que são


feitas em todos os grupos de domínios, sendo que a descrição do tipo de empresa ou
setor na qual a experiência deve ter sido adquirida é o fator que apresenta o maior
crescimento (mais de 15 pontos percentuais).
21 0

Gráfico 6
Demanda por Experiência de DOMÍNIO PRECISO (%)
- 2005 por suporte e totais 1990 e 2005 -
60,00%

52,00% 51,00%
50,00%
48,67%

43,00% 42,00% 41,33%


40,00% 39,00% 38,00%
35,00% 35,33%
33,00% 34,00%
30,00% 29,00%

20,00% 20,00%

12,00%
10,00% 9,00%
7,00% 8,00%
6,00%

0,00%
Site 1 Site 2 Jornais (2005) Total 1990 Total 2005

tipo de empresa ou setor na função ofertada


em função anterior e/ou seu contexto de aquisição aplicação de conhecimentos

Os formatos utilizados para definir o tipo de empresa ou setor em foco são bastante
diversificados, mas sinteticamente pode-se afirmar que eles privilegiam a descrição de
atributos como o porte da empresa, sua nacionalidade146, seu setor de atuação, e
também elementos que identificam genericamente a importância da empresa como
sendo os mais relevantes para fixar o ambiente de aquisição da experiência que é
valorizado. Estes elementos tanto podem aparecer isoladamente quanto em
combinações múltiplas, como nos exemplos a seguir:

146
Segundo pesquisa realizada pelo grupo Catho, já exaustivamente citada, do ranking de 17 fatores que
são considerados como os principais na contratação dos executivos, 7 estão associados à experiência
tendo em conta o seu domínio de aquisição ou sua natureza (ver Tabela 3). São eles: em segundo lugar –
experiência técnica anterior relacionada ao cargo; em sexto lugar – resultados alcançados anteriormente;
em sétimo lugar – reputação das empresas em que trabalhou; em nono lugar – estabilidade empregatícia;
em décimo lugar – experiência anterior na supervisão de pessoas; em décimo sexto lugar – experiência
em empresas multinacionais e em décimo sétimo lugar – número de promoções anteriores. Chama
particularmente atenção a posição ocupada pelo fator ‘estabilidade empregatícia’, que ressalta a
longevidade do vínculo com a empresa, um dos traços que caracteriza o ‘assalariado de confiança’
descrito por Bouffartigue (2001a) e que, a princípio, estaria sendo suplantado no âmbito do discurso
moderno da gestão pela valorização do ‘nomadismo’. No caso específico dos anúncios, em apenas dois
registros se identificou referências que valorizam este tipo de vínculo: anúncio jornal 2005 n. 100 –
Controller (boa estabilidade nas empresas); e anúncio jornal 1990 n. 51 – Gerente Comercial (estabilidade
empregatícia).
21 1

• Setor + importância: “ser oriundo de empresas do setor alimentício, de


preferência líderes no mercado” (Site 1, anúncio n. 49 – Diretor de Marketing)

• Setor + porte: “empresa de grande porte (acima de 500 funcionários),


preferencialmente no setor de telecomunicações” (Site 1 – anúncio n. 47 –
Vice-presidente / Diretor)

• Setor + nacionalidade: “empresa multinacional fabricante de compressores,


turbinas ou grandes equipamentos” (Site 1 – anúncio n. 69 – Gerente
Comercial)

• Setor + nacionalidade + porte + importância: “atuando em multinacionais de


grande porte, escritórios de advocacia de renome ou empresas de
auditoria/consultoria tributária ‘Big-Four’” (Site 2 – anúncio n. 46 – Diretor
Jurídico-Tributário)

“O item faturamento é crucial (no que se refere à composição da experiência). Já


desenvolvemos posição, com candidato recusado, apesar de quatro idiomas, 32 anos de
idade, excelente formação acadêmica e profissional, experiência em controladoria,
finanças, negociações e mercado interno. Aconteceu que o candidato sempre trabalhou
em empresas que faturavam em torno de U$ 20 milhões anuais e o recrutamento que
estávamos fazendo era para posição num grupo com negócios superiores a U$ 200
milhões por ano.”
(Adissi, 1998. pág. 130-131)

Entretanto, é no lócus do campo da ‘aplicação dos conhecimentos’ e das ‘funções


anteriormente desempenhadas ou em seu contexto de aquisição’ que se concentra o
maior volume de exigências que detalham a experiência de domínio preciso, sendo
que estas são expressas de maneira muito heterogênea, dificultando o seu
agrupamento. Mas com base nesta evidência, pode-se levantar a hipótese de que as
empresas estariam de fato apostando na possibilidade de transferência do
conhecimento tácito adquirido pelos profissionais para outros ambientes e contextos.

Finalmente, o que se percebe nos anúncios em relação à demanda por experiência do


tipo ‘domínio preciso’ é que os empregadores estão mais propensos a especificar a
natureza da trajetória profissional do candidato buscado a partir de múltiplas
referências combinadas entre si, já que os anúncios que fazem uso deste recurso
(estabelecem a natureza do domínio a partir de duas ou mais indicações) estão
significativamente mais presentes na amostra de 2005 do que o eram em 1990.
(Tabela 17)
21 2

Tabela 17 - Anúncios que solicitam EXPERIÊNCIA DE DOMÍNIO PRECISO: total e por


quantidade de tipos de domínio - 2005 por suporte e totais 1990 e 2005

Experiência de domínio preciso


Definida em três
Suportes e Definida em um Definida em dois
Total tipos de domínios
Totais tipo de domínio tipos de domínios
ou mais
N % % % %
Site 1 84 84,00% 47,00% 32,00% 6,00%
Site 2 91 91,00% 42,00% 35,00% 14,00%
Jornal 81 81,00% 49,00% 24,00% 8,00%
Total 2005
256 85,33% 46,00% 30,33% 9,33%
(N=300)
Total 1990
71 71,00% 46,00% 23,00% 2,00%
(N=100)

Em suma, se o volume total de anúncios que exigem experiência anterior não


apresenta variações expressivas nos dois cortes temporais analisados, há por
outro lado uma alteração considerável na forma de exprimir a natureza desta
experiência que em 2005 aparece com muito mais detalhe, particularmente em
relação ao tipo de empresa ou setor onde foi adquirida, mas também na descrição do
tipo de função anteriormente desempenhada ou em seu contexto de aquisição e na
sua definição a partir de áreas de aplicação de conhecimento. O exemplo apresentado
a seguir é ilustrativo desta multiplicação de exigências:

• “Experiência mínima de 10 anos (duração precisa) em posição Executiva


(função anteriormente ocupada) em empresas de pequeno/médio porte, no
segmento de Construção Civil Predial (residencial e/ou comercial); (tipo de
empresa ou setor) Liderança consolidada em processos de mudança e
gerência por resultados; Vivência na formulação e implantação de planos
estratégicos e de modelos gestão, tendo em vista o propósito de perenização
da empresa (de aplicação de conhecimentos); Efetiva vivência em posição
de liderança” (Site 2 – anúncio n. 1 – Diretor Presidente)

Trata-se de novos referenciais de valorização do conteúdo substantivo da experiência


que não se restringem à simples identificação da sua presença ou ausência (como no
caso da experiência do tipo ‘incorporada’). Mais seletivos, os anúncios de emprego
contemporâneos combinam diferentes critérios de ‘filtragem’ dos profissionais, ao
mesmo tempo em que aumenta o volume de candidatos uma vez que os
recrutamentos deixam de estar limitados às fronteiras locais. Neste ambiente, a
21 3

delimitação da natureza da experiência anterior e da sua temporalidade joga um papel


fundamental na etapa de pré-seleção feita à distância.

A experiência internacional

Há um outro aspecto relativo à demanda por experiência que passa quase que
desapercebido nos anúncios (apenas 2 casos em 2005) mas que é fortemente
revelador da inclusão de um novo eixo de orientação na formatação das exigências - e
que se situa no meio do caminho entre a bagagem profissional e a bagagem
‘vivencial’. Trata-se da dimensão internacional da experiência, que diferencia não
apenas profissionalmente os postulantes, mas também estabelece um corte cultural
entre os profissionais com “trânsito global” e portanto capazes de se adaptar às
exigências do novo mundo internacionalizado dos business e os cidadãos “locais”,
presos em suas raízes.

Nos exemplos que recolhemos, este tipo de exigência tende a ser apresentado como
componente integrante da trajetória profissional, como descrito a seguir:

• “Profissional que já tenha atuado como vice-presidente ou diretor executivo em


empresa de grande porte (acima de 500 funcionários), preferencialmente no
setor de telecomunicações. / indispensável experiência em desenvolvimento e
implantação de estratégias de start ups e comprovação de metas alcançadas
em área comercial e marketing. / expertise em gerencia organizacional /
desejável vivência profissional no exterior” (Site 1 – anúncio n. 47 – Vice
Presidente / Diretor)

• “The position requires (spoken English and Spanish) and some international
experience. Mainly in the food/pharmaceutical/chemical industries.” (Site 2 –
anúncio n. 31 – Marketing Experts)

Embora esta dimensão não tenha destaque em termos quantitativos, não se pode
afirmar que esteja ausente nas relações que passam a vigorar no mercado de trabalho
brasileiro, aparecendo como relevante tanto no lado das empresas contratantes
quanto por parte dos candidatos aos postos, que decodificam, ao seu modo, estas
novas valorações.

Paiva et alli (1989), ao refletirem sobre as transformações no mundo do trabalho e sua


relação com a formação de novas identidades, afirmam que, se no período moderno o
21 4

que caracterizava a identidade dos indivíduos eram traços territoriais e mono


lingüísticos, o que se observa neste novo século são identidades que emergem
trazendo a marca da transterritorialidade e do multilingüísmo. Ser moderno, ou “pós-
moderno” é ser cidadão do mundo, dominar diversos códigos lingüísticos, incluindo a
linguagem da informática e das tecnologias. E isso tem um apelo especial quando se
trata das gerações mais jovens.

Essa demarcação cultural que hierarquiza os indivíduos no campo simbólico e os


classifica como “inseridos” na nova cultura ou excluídos da mesma, começa
paulatinamente a aparecer de forma objetivada, substantiva, no processo seletivo que
opera no mundo do trabalho.

A literatura de gestão, os meios de comunicação bem como os livros de auto-ajuda,


direcionados àqueles que estão para começar a vida profissional ou que precisam
reinserir-se na mesma, chamam a atenção para este aspecto, tornando a
transterritorialidade (e o ‘nomadismo’) - não importa se adquirida ao longo do percurso
ou trajetória profissional do sujeito ou se adquirida por meio de oportunidades
educacionais e de lazer - um elemento que em si é portador de valor, e portanto objeto
de troca no mercado, como pode ser observado no trecho a seguir, extraído de um
destes manuais:

“A experiência multicultural é outro ponto que vem se tornando requisito


fundamental em face das novas demandas do mercado de trabalho. Com a
globalização da economia rompendo todos os tipos de fronteiras comerciais, a
necessidade de interagir com profissionais de outras culturas e de atuar em
diferentes ambientes mercadológicos e organizacionais é, atualmente, uma
realidade incontestável. Segundo um recente estudo efetuado com conceituados
empresários, ficou constatado que uma boa experiência no exterior pode ser
mais significativa, no que diz respeito a uma contratação, do que uma pós-
graduação ou, até mesmo, um MBA cursado no país de origem. (...) Assim, se
você tem condições de investir nesse tipo de aperfeiçoamento, é importante
deixar claro que qualquer tipo de experiência, seja um curso de inglês, seja uma
mera temporada em contato com uma diferente cultura – desde que conte com
uma atividade de curta duração – é extremamente válida como sendo um
diferencial competitivo ante a atualidade.” (SCISTOWSKI: 2002, p. 28 e 29)
21 5

Operando como mais uma “competência” a O que mais chama a atenção das companhias
ser comercializada, a experiência no histórico de um candidato?

internacional facilita a inclusão no mercado 1º Domínio de dois idiomas estrangeiros


2º Experiência de intercâmbio fora do país
de trabalho, especialmente entre aqueles que 3º Pós-graduação
4º Bom desempenho na faculdade
dispõem de capital econômico para investir
Revista Veja, 6 de setembro de 2000 – Como estar
na sua aquisição, protegendo as vagas, na mira das empresas
principalmente as novas vagas, para os “bem
nascidos”.

Um exemplo típico deste caso é encontrado no anúncio a seguir, voltado para o


processo seletivo de ‘trainees’ em uma renomada indústria automobilística, onde a
vivência / experiência internacional não está necessariamente vinculada à dimensão
profissional. (Figura 6)

Figura 6 – Anúncio de vagas para Trainees (n. 3)

147
(Anúncio publicado na Revista Exame / Você S/A – Janeiro de 2005 – Edição 79)

147
Texto do anúncio: “Requisitos: - curso superior concluído entre julho de 2002 e janeiro de 2005; -
desejável prática profissional de até 2 anos e experiência internacional; - fluência no idioma português e
inglês; - conhecimento intermediário do alemão; - disponibilidade para trabalhar em outras regiões,
inclusive no exterior; - (se estrangeiro) possuir autorização de trabalho expedida pelo Ministério do
Trabalho e Emprego.” (grifo nosso)
21 6

Se a objetivação desta nova experiência/competência ainda é pouco explicitada nos


anúncios, o mesmo não pode ser dito em relação aos currículos que os profissionais
elaboram quando estão se candidatando às vagas. Informados pelos diversos textos
que circulam nos meios de comunicação e ainda aconselhados pelos agentes de
intermediação do mercado de trabalho, os indivíduos que buscam sua inserção ou
novas oportunidades de trabalho lançam mão dos recursos que possuem neste
campo, sinalizando a sua “diferença”, subentendida aqui como “maior valor”.

Para exemplificar este aspecto, apresentamos dois conjuntos de extratos de currículos


que contêm elementos que caracterizam a experiência internacional, retirados de dois
bancos de currículos de acesso público de empresas de outplacement.

É também interessante notar que as variações entre a forma de expressão das


competências revelam também diferenças que incidem tanto na natureza quanto na
intensidade da atuação destes intermediários. No primeiro conjunto, retirado da
empresa ‘Saad Fellipelli’148, (Quadro 4) pode-se notar a presença de marcas de
diferenciação de viagens internacionais a partir de um formato de explicitação
particular, mais inserido na linguagem do business.

Quadro 4 - Currículos que apresentam descritores de experiência internacional –


exemplos extraídos do Banco de currículos da Saad Fellipelli

Área Foco do candidato Descritor da experiência internacional


Vivência internacional com atuação profissional na Europa,
Estados Unidos e diversos países da América Latina,
Gestão de Negócios / Operações /
demandando alto nível de adaptação e capacidade de
Administração
relacionamento em ambientes multiculturais e cenários
complexos.
Experiência em negociação com órgãos governamentais e
Diretoria de Unidade de Negócio vivência internacional, tendo morado nos Estados Unidos e
Europa.
Diretor Financeiro/Controller/Diretor Vivência internacional intensa.
Administrativo Financeiro
Gerente Geral / Diretor de Unidade de
Orientação global e experiência em trabalhar em ambientes
Negócios
multiculturais, organizações matriciais e reporte ao exterior.

Diversas viagens internacionais aos Estados Unidos, Inglaterra,


Administrativa / Gerenciamento de
Alemanha, Argentina e Chile para reuniões de trabalho e
Contratos / Facilities
participação em grupos globais.
Executivo Sênior, orientado a resultados, com experiência
CEO/ Diretor Geral
nacional e internacional

148
Dados coletados no banco de currículos em 5 de fevereiro de 2005 no site www.rightbrasil.com.br
21 7

Quadro 4 - continuação
Área Foco do candidato Descritor da experiência internacional
Experiência internacional adquirida em várias viagens para
Comercial/ Novos Negócios reuniões de planejamento, treinamentos e convenções nos
Estados Unidos, México, Argentina, Costa Rica e Bahamas.
Posição Executiva na Indústria de
Intensa experiência internacional.
Telecomunicações/ Tecnologia
Customer Service / Suporte Técnico ao Vivência em viagens internacionais para Suporte Técnico local a
Cliente clientes na América do Sul / Central e Ásia .
Forte relacionamento com editoras nacionais e internacionais,
Comercial e Marketing agentes literários e autores. Participação em diversas feiras
internacionais de negócios.
Experiência internacional com a finalidade de troca de know-how e
atualização tecnológica com os Centros Mundiais da Europa
Comercial - Técnica
(Alemanha / Espanha / França), EUA / Canadá / México e América
do Sul (Colômbia, Argentina e Uruguai).
Participação de viagens internacionais e em diversos cursos de
Comercial / Gestão de Estratégia de vendas, marketing, incluindo gerenciamento, liderança e
Negócios desenvolvimento de equipes de venda, produto/ Serviço e
laboratório.
Experiência internacional desenvolvendo contatos internacionais
em viagens de negócios e para participação em seminários,
Desenvolvimento de Negócios / congressos, reuniões estratégicas e do Board de Diretores, em
Internacional países como EUA, Holanda, Curaçao e Inglaterra, bem como ao
telefone na negociação de condições para a tomada de recursos
em moedas estrangeiras e operações de trade finance.

Já no segundo conjunto, extraído do banco de currículos do Grupo Prime149, (Quadro


5) o que se observa é que tanto a forma de expressão da experiência internacional,
quanto a sua substância efetiva são bastante diferentes, e não raro desconectados da
dimensão profissional. Em alguns casos fica evidente que os candidatos, conscientes
deste novo elementos de diferenciação e com poucos recursos acumulados que
possam ser apresentados em seu favor, elaboram uma estratégia para lançar mão de
tudo aquilo que poderia ser classificado como tal e portanto somar pontos como
diferenciador, nem que se trate apenas de viagens a lazer. Com isso buscam se incluir
no seleto grupo dos ‘nômades’, internacionalmente conectados, culturalmente
globalizados.

149
Dados obtidos em 3 de fevereiro de 2005 no site do grupo: www.grupoprime.com.br
21 8

Quadro 5 - Currículos que apresentam descritores de experiência internacional –


exemplos extraídos do Banco de currículos do Grupo Prime -

Identificação do candidato / Área Descritor da experiência internacional


Diversas viagens internacionais com foco acadêmico e lazer.
Intercâmbio de um ano nos Estados Unidos. Vivência de nove
F. C. B. - Marketing meses na Espanha e de um ano na França. Outros países já
visitados: Argentina, Chile, México, Alemanha, Itália,Suíça,
Áustria, Holanda, Bélgica e República Tcheca.
A. S. A. - Tecnologia Diversas Viagens Internacionais.
Viagens Internacionais: Treinamento técnico em Montreal –
M. L. M. G. - Arquitetura Canadá, para desenvolvimento de Layout com base logística.
Realizei visitas ao Uruguai e Paraguai onde pude negociar a
A. T. - Vendas venda de peças com clientes e distribuidores.
Viagens: Italiano (Accademia Leonardo, Itália), duração de
C. R. T. - Vendas Técnicas 120 horas (05 e 06/2003). Viagem de 2 meses e meio para
Salerno, vizinho a Napoli na Itália.
Viagens Internacionais: Argentina: em 1991, prospecção e
negociação de Empresas parceiras para o fornecimento de
I. M. - Marketing produtos supergelados de origem animal, visando o projeto de
ampliação da linha de produtos marca Supergelados CAC.
Viagens Internacionais: Aperfeiçoamento no idioma inglês –
MILLS COLLGE – São Francisco USA/ 1995; Curso de Direito
R. P. A. - Jurídica de Família no Direito Canônico – UNIVERSITTÁ
URBANIANA- Roma/1997.
Participação na equipe mundial de gerenciamento da
qualidade tendo realizado viagens com objetivo de
L. A. C. - Qualidade conhecimento das melhores práticas e transferência de Know-
how em países como Espanha, Alemanha e Portugal. Outras
viagens internacionais: Argentina, México, USA e Canadá.
Viagens aos EUA (Miami e Atlanta) para cursos de
aperfeiçoamento em Estatística Industrial. Viagens a Portugal
V. A. R. - Logística e Espanha para aperfeiçoamento em softwares de distribuição
(ASW).
Viagens Suíça, Alemanha e Áustria direcionadas à
A. S. - Comercial treinamento e integração de equipes técnicas e comerciais e
de logística na Suíça, Alemanha e Áustria.
Viagens á Alemanha, EUA, França, Suíça, Espanha com o
objetivo de realizar a transferência de novas tecnologias e
A. N. C. - Industrial processos; e realização de reuniões de negócios e
treinamentos.
Viagens nacionais e internacionais (Estados Unidos, Europa e
H. R. F. - Manutenção América Latina) recebendo e ministrando treinamentos,
realizando apoio técnico e coordenando grandes projetos.
Viagens Internacionais para Inglaterra, EUA, Itália, Escócia,
França, República Tcheca, Eslováquia, Áustria, Hungria,
T. M. P. - Administrativa Alemanha, Holanda, Bélgica, México, Caribe, e países da
América do Sul. Realizando visita a empresas e indústrias
como JOHNY WALKER, BALLANTINES e outras.
Viagens Internacionais para Nova Zelândia e Boston/USA
J. L. A. - Financeiro viagens para Estudo da Língua Inglesa.
Viagens Internacionais Argentina e Paraguai visita Filial
R. C. A. M. - Financeiro Empresa.
21 9

5.3.3. Formação acadêmica e outras qualificações

Para captar a presença das demandas por qualificações nos anúncios elaboramos
uma categorização que toma apoio principalmente na classificação de Jackson (2001)
que divide, de um lado, as qualificações acadêmicas formais e, de outro, o que ela
denomina por ‘outras qualificações’ e ‘habilidades técnicas’.

A formação acadêmica é o indicador utilizado pelos pesquisadores como proxi para a


mensuração do mérito. A ele Jackson agrega, na formulação de seu conceito de
mérito alargado (broad merit selection hypoteses), todas as demais características que
não podem ser imputadas à origem de classe ou às capacidades inatas dos
indivíduos. Especial atenção é dada à posição da educação e das demais
qualificações, uma vez que estas seriam, em uma sociedade meritocrática, o
‘passaporte’ para o acesso às posições mais elevadas. Assim, quanto mais relevante
o papel jogado pelas qualificações acadêmicas, mais uma sociedade poderia ser
caracterizada como pautada na seleção por mérito. Em sua pesquisa, além das
qualificações acadêmicas formais, Jackson inclui outras qualificações, que define
como: qualificações profissionais; qualificações vocacionais/técnicas; e qualificações
subentendidas.

Já o conjunto formado pelos conhecimentos técnicos e/ou de informática ela classifica


como pertencente ao grupo ‘habilidades técnicas’ (que se subdivide em: habilidades
de computação e secretariado; outras habilidades técnicas específicas do trabalho;
habilidades de leitura e aritmética (literacy/numeracy); e habilidades subentendidas), e
também o considera como elemento integrante do conceito de mérito alargado.

Optamos por trabalhar com estas variáveis de forma agregada, definindo o grande
grupo denominado por ‘formação acadêmica e outras qualificações’, que permite uma
melhor visão de conjunto sem entretanto perder a oportunidade de analisar cada
variável individualmente. Incluímos ainda a dimensão do domínio de línguas
estrangeiras, não considerada por Jackson, e estabelecemos uma divisão bastante
singular na classificação dos conhecimentos técnicos: conhecimentos transversais e
conhecimentos associados ao objeto do exercício do cargo.
22 0

Nosso grupo ficou assim composto150:

• Formação acadêmica
• Qualificação incorporada ou subentendida
• Outras certificações (não acadêmicas ou não formais)
• Outras qualificações
• Registros em órgãos de classe
• Domínio de idiomas
• Conhecimentos de informática
• Conhecimentos técnicos específicos

A seguir passaremos em revista cada um destes pontos individualmente para ao final


fornecer uma visão do seu agregado.

5.3.3.1. Formação acadêmica

A exigência por formação acadêmica não chega a ser tão dominante quanto o que se
verificou em relação à experiência, mas é considerável a sua evolução nos dois
períodos, especialmente se fizermos a comparação entre os jornais de 1990 e os
jornais de 2005 (variando de 65% para 78%). (Tabela 18)

Tabela 18 - Anúncios que solicitam FORMAÇÃO ACADÊMICA - 2005 por suporte e totais
1990 e 2005

Suportes e Totais N %
Site 1 65 65,00%
Site 2 74 74,00%
Jornal 78 78,00%
Total 2005 (N=300) 217 72,33%
Total 1990 (N=100) 65 65,00%

No entanto, é o detalhamento do nível de formação que nos permite ter uma melhor
visão da natureza das mudanças em relação às demandas que são feitas pelos
empregadores no tocante à escolaridade.

150
A definição do que foi considerado em cada subclasse encontra-se detalhada no capítulo 4 desta tese.
22 1

A Tabela 19 apresenta o nível de formação classificado tal qual aparece nos anúncios,
que em algumas situações apresentam o nível de formação de maneira alternativa
(médio ou superior; superior em curso ou completo....). A partir da sua leitura fica
evidente uma tendência à redução nas incidências de solicitações voltadas a níveis de
formação do ensino médio e o incremento nas exigências por pós-graduação.

Tabela 19 - Anúncios que solicitam FORMAÇÃO ACADÊMICA por nível da formação -


2005 por suporte e totais 1990 e 2005

Nível da formação exigida


superior
Suportes pós em pós
nível nível médio ou técnico ou superior em curso superior
curso ou graduação
médio técnico superior superior em curso ou completo
completa (*)
completo
Site 1 1,00% 0,00% 1,00% 0,00% 1,00% 2,00% 45,00% 0,00% 15,00%
Site 2 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 1,00% 1,00% 45,00% 1,00% 26,00%
Jornais 3,00% 2,00% 0,00% 5,00% 0,00% 2,00% 59,00% 0,00% 7,00%
Total 2005
1,33% 0,67% 0,33% 1,67% 0,67% 1,67% 49,67% 0,33% 16,00%
(N=300)
Total 1990
3,00% 1,00% 3,00% 3,00% 0,00% 2,00% 52,00% 0,00% 1,00%
(N=100)
(*) a pós graduação refere-se aos cursos lato e stricto sensu

Para facilitar a análise, consolidamos as diversas menções ao nível de formação em 3


grupos:

• Grupo 1 (exigências inferiores ao curso superior completo. Agrega as


demandas por nível médio; nível técnico; nível médio ou superior; nível técnico
ou superior; superior em curso; e superior em curso ou completo);
• Grupo 2 (exigências inferiores à pós-graduação completa. Agrega as
demandas por superior completo; e pós em curso ou completa);
• Grupo 3 (exigências relativas à pós-graduação e especializações).

Observa-se daí que enquanto o grupo 2 permanece praticamente estável no período,


o grupo 1 cai quase para a metade e o grupo 3 demonstra um crescimento expressivo.
(Gráfico 7) A explicação para este movimento não pode desconsiderar o forte
incremento das matrículas nos cursos de graduação e também nos de pós-graduação,
tanto stricto quanto lato sensu, que ocorreu com maior ênfase a partir de meados /
final da década de 1990151.

151
O número de matrículas nos cursos de mestrado passou dos 40.026 em 1994 para 65.044 em 2002;
nos cursos de doutorado o crescimento foi ainda mais significativo em termos percentuais, passando de
17.351 matrículas em 1994 para 37.400 em 2002 (dados CAPES/Mec). Para a pós-graduação lato sensu,
22 2

Mais do que associado às necessidades específicas para o exercício do cargo, a


demanda dos empregadores pode estar sendo pautada pela oferta de profissionais
mais bem titulados no mercado, e assim o critério ‘formação acadêmica’ seria utilizado
como um instrumento de corte, tal como descrito pelas teorias da sinalização ou do
filtro.

Gráfico 7
Demanda por formação acadêmica (%)
- 2005 por suporte e totais 1990 e 2005 -
90,00%

80,00%
78,00%
74,00% 72,33%
70,00%

65,00% 65,00%
60,00%
59,00%
52,00%
50,00% 50,00%
45,00% 46,00%
40,00%

30,00%
29,00%

20,00%

15,00% 16,00%
12,00% 12,00%
10,00%
7,00% 6,33%
5,00%
0,00%
2,00% 1,00%
Site 1 Site 2 Jornais (2005) Total 1990 Total 2005

TOTAL grupo 1 grupo 2 grupo 3

Uma forma de nos aproximarmos desta hipótese é inventariando, de um lado os


anúncios que especificam uma área de formação ou curso determinado (ex: “formação
superior completa em engenharia mecânica”; “com MBA e especialização na área
financeira”) ou aqueles que apresentam uma área ou curso de forma alternativa (ex:
“com curso superior em administração ou economia”) e, de outro lado, os que não o
fazem, referindo-se apenas ao nível da formação de modo genérico (ex: “formação
superior completa”; “desejável pós-graduação”).

até a conclusão desta tese, ainda não havia sido disponibilizado os dados do primeiro censo da pós lato
que permitiria ter uma idéia das sua magnitude. No entanto, é de ‘conhecimento público’ o quanto as
instituições de ensino superior vêm investindo nesta modalidade.
22 3

Em relação à demanda por formação técnica ou superior, percebe-se que em 1990, a


metade nos anúncios as exigia faziam-no na forma genérica. Já em 2005, apenas 36%
estão nesta situação. (Tabela 20)

Tabela 20 - Anúncios que solicitam FORMAÇÃO ACADÊMICA (nível técnico e superior)


segundo tipo de referência à formação - 2005 por suporte e totais 1990 e 2005

Natureza da referência à formação acadêmica nos anúncios (nível técnico e superior)


Suportes e formação técnica ou formação técnica ou formação técnica ou
Totais superior GENÉRICA superior ESPECÍFICA superior ALTERNATIVA
N % N % N %
Site 1 27 27,00% 16 16,00% 20 20,00%
Site 2 24 24,00% 17 17,00% 32 32,00%
Jornais 24 24,00% 31 31,00% 19 19,00%
Total 2005
75 25,00% 64 21,33% 71 23,67%
(N=300)
Total 1990
31 31,00% 14 14,00% 17 17,00%
(N=100)

Já em relação à pós-graduação a situação é bastante distinta. Praticamente ausente


em 1990, assume, em 2005, o mesmo padrão que a graduação apresentava
anteriormente, ou seja, praticamente a metade dos anúncios que a exige (49%) o faz
no formato genérico, e um número pouco maior (51%) ainda acrescenta os
qualificadores de diferencial (“será um plus”; “é desejável”; etc.) quanto à posse deste
tipo de certificado por parte dos candidatos. (Tabela 21)

Tabela 21 - Anúncios que solicitam FORMAÇÃO ACADÊMICA (nível pós-graduação)


segundo tipo de referência à formação - 2005 por suporte e totais 1990 e 2005

Natureza da referência à Pós-graduação


Pós-graduação Pós-graduação Pós-graduação
Suportes
GENÉRICA ESPECÍFICA ALTERNATIVA
N % N % N %
Site 1 9 9,00% 6 6,00% 1 1,00%
Site 2 12 12,00% 10 10,00% 4 4,00%
Jornais 3 3,00% 4 4,00% 0 0,00%
Total 2005 (N=300) 24 8,00% 20 6,67% 5 1,67%
Total 1990 (N=100) 0 0,00% 0 0,00% 1 1,00%

Portanto podemos inferir que o mesmo tipo de papel jogado pela graduação no início
da década de 1990, quando a oferta de profissionais com este tipo de formação ainda
era restrita, se repete agora em relação à pós-graduação. Isso pode ser indicativo de
que os empregadores, no momento presente, estão valorizando muito mais um
22 4

determinado conjunto de pré-disposições ou ainda o capital cultural que se faz


acompanhar dos diplomas deste nível do que propriamente as capacidades cognitivas
ou os conhecimentos específicos que possam ter sido desenvolvidos pelos indivíduos
em sua passagem pelos programas de pós. Uma vez que os diplomas de graduação
já se tornaram mais ‘massificados’, seria o caso de buscar outras formas de manter as
vagas protegidas para uma determinada elite (aqueles que podem, e conseguem,
concluir a pós-graduação).

Por fim vale assinalar que, em 2005, dos anúncios que exigem pós-graduação, apenas
2 mencionam a pós stricto sensu (mestrado e/ou doutorado), e ambos para vagas na
área acadêmica (Diretores de Faculdade). Todos os demais descrevem as demandas
como ‘pós-graduação’ (17 casos); ‘especialização’ (12 casos); MBA (9 casos); pós-
graduação ou MBA (8 casos); e pós-graduação ou especialização (1 caso).

5.3.3.2. Outras qualificações e certificações

Neste grupo incluímos todas as exigências que são feitas relativamente a:

• Qualificação incorporada ou subentendida


• Outras certificações (não acadêmicas ou não formais)
• Outras qualificações
• Registros em órgãos de classe

Estes casos são pouco freqüentes nos anúncios, e na sua maioria se somam às
solicitações por formação acadêmica. (Tabela 22 – coluna c) Exceção para as alusões
à ‘qualificação incorporada ou subentendida’, já que estas se referem às demandas
simplesmente descritas por “profissionais qualificados”, sem entretanto detalhar a
formação ou acrescentar nenhum outro atributo que a circunscreva. Em 1990
identificamos 2% da amostra nesta situação, e em 2005 sua presença é irrisória.
(Tabela 23)
22 5

Tabela 22 - Anúncios que solicitam QUALIFICAÇÕES/CERTIFICAÇÕES (total, sem


acrescentar formação acadêmica, e que acrescentam formação acadêmica) - 2005 por
suporte e totais 1990 e 2005

(B)
(A) (C)
Anúncios que exigem apenas
Total de anúncios que Anúncios que exigem
Suportes e qualificações /certificações e
exigem qualificações qualificações /certificações e
Totais não exigem formação
/certificações (*) formação acadêmica
acadêmica
N % N % N %
Site 1 6 6,00% 3 3,00% 3 3,00%
Site 2 8 8,00% 1 1,00% 7 7,00%
Jornal 3 3,00% 0 0,00% 3 3,00%
Total 2005
17 5,67% 4 1,33% 13 4,33%
(N=300)
Total 1990
1 1,00% 0 0,00% 1 1,00%
(N=100)
(*) excluídos os casos de ‘qualificação incorporada ou subentendida’

No que diz respeito ao grupo de ‘outras certificações’ (não acadêmicas), nota-se que
em 1990 não foi registrado nenhum caso, e em 2005 ele abrange pouco mais de 2%
da amostra (8 casos) (Tabela 23). É um percentual pequeno mas que pode ser
indicativo do reconhecimento, pelo ‘mercado’, do valor dos diplomas obtidos em
cursos promovidos por empresas de tecnologia ou de gestão (ex: ‘certificados
Windows e linux’; ‘metodologia PMI’; ‘certificado PMP’). No entanto, apenas em 2
casos estas certificações podem estar substituindo a formação acadêmica; nos demais
elas se ajuntam aos pedidos por escolaridade formal.

Já o registro em órgãos de classe aparece como um requisito solicitado principalmente


aos contadores (registro no CRC – Conselho Regional de Contabilidade). Em apenas
um caso foi pedido registro na OAB (Ordem dos Advogados do Brasil). Também era
uma demanda ausente em 1990 e após 15 anos aparece em 2,3% da amostra.
(Tabela 23)

No que compete a outras qualificações, apenas dois casos foram registrados:


raciocínio lógico e aritmético (jornal, 1990, anúncio n. 49 - Chefes de Equipe de
Produção) e bom português e conhecimentos gerais (Site 1 – anúncio n. 36 - Diretor
de arte Junior).
22 6

Tabela 23 - Anúncios que solicitam OUTRAS QUALIFICAÇÕES E CERTIFICADOS


segundo tipo - 2005 por suporte e totais 1990 e 2005 -

Outras qualificações e certificados


Suportes e Qualificação Outras Registros em Outras
Totais incorporada certificações órgãos de classe qualificações
% % % %
Site 1 0,00% 4,00% 1,00% 1,00%
Site 2 1,00% 1,00% 6,00% 0,00%
Jornal 0,00% 3,00% 0,00% 0,00%
Total 2005
0,33% 2,67% 2,33% 0,33%
(N=300)
Total 1990
2,00% 0,00% 0,00% 1,00%
(N=100)

5.3.3.3. Conhecimentos genéricos de informática e domínio de idiomas

Diferentemente do que se poderia supor, as solicitações por conhecimentos genéricos


de informática, apesar de haver crescido em quase 100% no período, não chega a ser
muito representativa no total de anúncios. (Gráfico 8) Entretanto, é sabido que
especialmente para as funções hierarquicamente mais elevadas, o microcomputador é
uma ‘ferramenta básica de trabalho’, e a capacidade de utilização de softwares
genéricos (editores de texto, internet, planilha eletrônica), ao menos no nível de
usuário, faz parte do dia-a-dia desses profissionais. E tanto maior precisa ser a sua
proficiência e autonomia neste campo quanto mais se reduz o staff intermediário e
administrativo (secretárias, assessores) que se encontrava à sua disposição em
momentos anteriores às ondas de downsizing e enxugamento das empresas.

Portanto era de se esperar que houvesse uma maior demanda em torno destas
capacidades, o que não ocorre. Levantamos a hipótese de que essa ausência pode
ser devido a certa ‘naturalização’ de tais competências a um ponto tal que se tornaria
desnecessário explicitá-las, uma vez que elas estariam deixando de ser indicadoras de
uma diferença. Assim, somente valeria a pena incluir como exigência uma capacidade
que não fosse universalmente possuída pelos indivíduos.152 Dito de outra forma: no

152
Por exemplo; exigir de um profissional que fale português em um país de língua portuguesa a princípio
poderia parecer uma redundância. No entanto, quando o processo de seleção ultrapassa as fronteiras
geográficas do país ou ainda quando se inclui entre os possíveis candidatos estrangeiros residentes no
país, este tipo de demanda passa a fazer sentido.
22 7

que concerne aos conhecimentos de informática, os empregadores estariam


priorizando a explicitação de demandas voltadas para o domínio de softwares e
hardwares que caracterizam alçadas específicas (como CAD, softwares de gestão,
etc.).

Gráfico 8
Demanda por conhecimentos genéricos de informática (%)
- 2005 por suporte e totais 1990 e 2005 -
25,00%

20,00% 20,00%
18,00%
17,33%
15,00%
14,00%

10,00% 10,00%

5,00%

0,00%

Site 1 Site 2 Jornais (2005) Total 1990 Total 2005

Situação muito diferente ocorre quando se foca as exigências por idiomas. De todas
as qualificações consideradas, a demanda por fluência em um segundo idioma é, sem
dúvida, a que apresentou crescimento mais expressivo no período. Presente em 18%
dos casos de 1990, chega em 2005 sendo solicitada em 50% dos anúncios153. (Gráfico
9)

153
Gracio (2001) identifica em Portugal uma situação diversa. Em sua análise dos anúncios de emprego
destinados aos ‘quadros’ no período de 1989 e 1997, ele percebe um arrefecimento na demanda por
línguas (que cai de 44,5% para 42,7%) e um incremento nas exigências por conhecimentos de informática
(que se eleva de 34,6% para 42,6%). No entanto ele não explicita se os conhecimentos em informática
são do tipo ‘genéricos’ ou se envolvem também o domínio de softwares específicos, os quais
classificamos na categoria de ‘conhecimentos técnicos específicos’.
22 8

Gráfico 9
Demanda por domínio de Idiomas (%)
- 2005 por suporte e totais 1990 e 2005 -
70,00%

60,00% 61,00%

50,00%
50,00%
49,33%
44,00% 45,00%
42,00%
40,00%

30,00%

20,00%
18,00%
15,00%
13,00%
10,00%
11,33%
6,00%
4,00% 3,00% 2,67%
0,00% 1,00% 1,00%
Site 1 Site 2 Jornais (2005) Total 1990 Total 2005

Total que exige idiomas ingles espanhol outros (frances, alemão ou japonês)

O inglês é o segundo idioma universalmente mencionado154, mas as referências ao


espanhol também se mostram em franco incremento. Em parte isso pode ser imputado
ao processo de maior comercialização e expansão das empresas brasileiras
direcionada aos países vizinhos, ou ainda pela entrada, ainda que pequena, das
empresas desses em território nacional (como a Repsol, de origem espanhola, no
setor petróleo e gás) e também devido à aquisição de grandes empresas brasileiras
por companhias espanholas (como a Telesp, adquirida pela Telefônica, e o Banespa,
comprado pelo Santander155).

Quando se trata de exigências por outros idiomas que não estes (casos do francês,
alemão, japonês), observa-se que as vagas em questão localizam-se em
multinacionais com tais nacionalidades, e a fluência nos seus idiomas ‘nativos’ visaria
facilitar a comunicação entre os quadros nacionais e os estrangeiros.

Mas o interessante é perceber que além do incremento genérico na demanda de


idiomas, há também uma transformação das solicitações que aponta para uma maior
complexidade e diversificação deste quesito. Isso pode ser evidenciado pela

154
Em apenas dois casos a exigência por um segundo idioma não recaiu sobre o inglês mas sim sobre o
espanhol (site 1 anúncio n. 11 - Diretor Social) e francês (site 1, anúncio n. 64 - Gerente Administrativo /
Financeiro).
155
Em 1998, o Brasil chegou a representar 27% de todo o investimento direto realizado pela Espanha ao
redor do mundo, o que lhe assegurou um lugar relevante na internacionalização da economia espanhola.
(In: Boletim Sobeet – Sociedade Brasileira de Estudos de Empresas Transnacionais e da Globalização
Econômica. Ano III, n. 31 – janeiro de 2005)
22 9

observação da quantidade de idiomas requisitados: em 1990, apenas 2% da amostra


exigiam mais de um idioma; já em 2005 esse montante chega a 13%. E usualmente é
o idioma espanhol que ocupa o lugar da ‘terceira língua’. (Gráfico 10)

Gráfico 10
Quantidade de idiomas demandados (%)
- 2005 por suporte e totais 1990 e 2005 -
50,00%

45,00% 45,00%
40,00%

36,00% 37,00%
35,00%

30,00% 30,00%

25,00%

20,00%

15,00%
16,00% 16,00%
14,00% 13,00%
10,00%
9,00%
5,00%
2,00%
0,00%

Site 1 Site 2 Jornais (2005) Total 1990 Total 2005

um dois ou mais

Por outro lado, pode-se aventar que a maior oferta de profissionais no ‘mercado’ com
o domínio do inglês faz com que ocorra aqui um fenômeno semelhante ao verificado
em relação à exigência por diplomas de nível superior; qual seja, de marcador de
diferença transmuta-se em requisito indispensável. Dessa forma, enquanto em 1990 o
nível de proficiência na língua podia ser mais baixo (se fazia acompanhar por
qualificadores ‘fracos’, tais como: “com conhecimentos em inglês”; “desejável prática”;
“noções em”; “será um diferencial”; etc.), em 2005 a maior parte dos anúncios solicita
total domínio do idioma (o que é demarcado via qualificadores fortes, tais como:
“fluência em inglês”; “english is mandatory”; “inglês avançado”).

No entanto, o mesmo não ocorre quando se trata do idioma espanhol. No geral as


empresas ainda aceitam uma performance inferior por parte dos profissionais e a
maior parte dos anúncios que exigem espanhol o faz baseado em qualificadores mais
fracos de proficiência (como os já mencionados: “desejável conhecimento de”; “será
um diferencial”; “espanhol básico”; “noções de”; etc.). (Tabela 24)
23 0

Tabela 24 - Anúncios que solicitam DOMÍNIO DE IDIOMAS segundo tipo de idioma e


natureza do indicador de proficiência - 2005 por suporte e totais 1990 e 2005

Domínio de idiomas
Inglês Espanhol
Suportes e
Totais Indicadores Indicadores Indicadores Indicadores
Total FORTES de FRACOS de Total FORTES de FRACOS de
proficiência proficiência proficiência proficiência
Site 1 42,00% 33,00% 9,00% 15,00% 4,00% 11,00%
Site 2 61,00% 45,00% 16,00% 13,00% 4,00% 9,00%
Jornal 45,00% 36,00% 9,00% 6,00% 2,00% 4,00%
Total 2005
49,33% 38,00% 11,33% 11,33% 3,33% 8,00%
(N=300)
Total 1990
18,00% 8,00% 10,00% 1,00% 0,00% 1,00%
(N=100)

Essas diferenças indicam que quando uma nova exigência está começando a se
impor, o nível de proficiência aceitável é mais baixo. E somente quando se dispõe de
uma quantidade razoável de indivíduos capazes de responder às demandas
específicas é que se pode defini-las a partir de um ‘patamar mínimo’, e com isso, o
que era diferença pode ser transmutado em desigualdade no que diz respeito ao
acesso ao mercado de trabalho. O domínio de um segundo idioma, ao se transformar
em uma condição sine-qua-non para o pleito às vagas, abre as portas que para se
possa, a partir de então, reivindicá-lo como um direito a ser garantido a todos.
Enquanto isso não ocorre, a diferença, como ocorre no caso do domínio do espanhol,
é tratada exatamente como isso: como um ‘plus’, um ‘a mais’, um ‘diferencial’, e não
um ponto de corte excludente por princípio.

Este desequilíbrio na disponibilidade de profissionais com domínio no idioma inglês


comparativamente ao espanhol pode ser ilustrado a partir dos resultados do exame
nacional de cursos de 2003 (vulgo ‘Provão’), tomando por seleção os cursos que
certificam os profissionais nas formações mais requisitadas nos anúncios de emprego
por nós analisados: administração; economia; ciências contábeis e as engenharias.

Com base no perfil dos alunos levantado na ocasião do exame, observa-se que mais
de 60% dos egressos das engenharias156 possuem uma proficiência boa ou razoável

156
Entre as engenharias, os egressos do curso de engenharia civil são os que apresentam menor
proporção de graduados com boa proficiência em inglês: apenas 46% deles lê, escreve e fala bem ou
razoavelmente inglês; contra 68% da engenharia elétrica; 64% da engenharia mecânica e 63% da
engenharia química.
23 1

no inglês; seguidos pelos egressos da economia (41%); administração (38%); e, muito


distante, as ciências contábeis (22%).

Mas quando se trata do domínio do idioma espanhol, a grande maioria dos egressos,
em todos os cursos considerados, tem uma performance fraca (ou lê, mas não
escreve e nem fala ou os conhecimentos são praticamente nulos). (Tabela 25)

Tabela 25 - Características dos graduandos segundo o nível de proficiência em línguas


estrangeiras – cursos selecionados (respostas com maiores percentuais)
Conhecimento de língua
Conhecimento de língua inglesa
espanhola
Área
Lê, escreve e Lê, mas não Lê, mas não
Lê, escreve e Praticamente Praticamente
fala escreve e escreve e
fala bem nulo nulo
razoavelmente nem fala nem fala

Administração 11,5 26,4 18,2 33,9 27,4 46,3


Ciências
3,7 18,8 18,4 50,1 25,2 59,2
contábeis
Economia 14,4 26,6 18,0 32,3 33,2 42,8
Engenharia
15,1 31,2 20,6 23,1 37,1 42,9
civil
Engenharia
28,2 39,2 15,3 6,4 40,4 35,4
elétrica
Engenharia
24,2 40,0 15,7 8,6 41,6 37,3
mecânica
Engenharia
23,0 40,8 16,3 7,8 43,4 28,3
química
Fonte: Relatório do Exame Nacional de Cursos 2003 – Volume 1. MEC-INEP – Tabela 29 – pág. 147.

Diante deste cenário, seria legítimo supor que se os empregadores estabelecerem


patamares de ingresso muito elevados, correm o risco de inviabilizar o processo de
seleção157. Daí o recurso de lançar mão de qualificadores que permitam fazer presente
um determinado tipo de exigência ao mesmo tempo em que a relativizam.

Em síntese, no que se refere aos conhecimentos genéricos de informática e ao


domínio de idiomas, enquanto os primeiros não apresentam incrementos
consideráveis nem grandes variações no período, o mesmo não ocorre em relação
aos segundos. Neste caso há tanto um crescimento expressivo no montante dos
casos que citam este tipo de exigência quanto uma maior complexificação das
mesmas, que pode ser descrita pelo acumulo de idiomas solicitados (mais de um
idioma) e pela elevação no nível de proficiência exigido.

157
Ainda que as vagas que analisamos não sejam destinadas exatamente aos recém graduados,
acreditamos que podemos extrapolar os resultados que esses demonstram atingir, no tocante ao domínio
de idiomas, para o conjunto mais amplo de profissionais.
23 2

5.3.3.4. Conhecimentos técnicos específicos

Na rubrica ‘conhecimentos técnicos específicos’ consideramos todas as exigências


presentes nos anúncios precedidas pelos descritores “domínio de” ou “conhecimento
em”.

Este tipo de demanda é marcadamente característica de recrutamentos do tipo


externo, onde as empresas priorizam os profissionais que já acumularam, em suas
trajetórias, determinados tipos de conhecimentos e experiências que possibilitam a
redução dos custos com a formação interna. Embute portanto uma perspectiva
positivamente associada à possibilidade de transferência desses saberes ou
competências entre empresas e entre setores produtivos diversos, o que facilitaria a
mobilidade destes profissionais.

Apesar de serem manifestados em formato muito heterogêneo, tais conhecimentos


técnicos podem ser agrupados em duas grandes categorias. Uma mais genérica, que
denominamos por ‘conhecimentos em ferramentas transversais’, aponta para o
domínio de ferramentas de gestão, de qualidade, de informática e de determinados
softwares que são mais facilmente transferíveis entre as empresas, setores e funções.
No geral são saberes que podem ser adquiridos fora do ambiente profissional (por
meio de vias diversas: formação continuada, auto-aprendizado, educação formal,
etc.). São exemplos deste caso:

• aplicativos de multimídia
• conhecimento de normas de qualidade, ISO e QS
• conhecimentos de E.R.P. (SAP, Microsiga)
• conhecimentos da norma ISO-9000 ou equivalente / conhecimentos de
ferramentas de qualidade /
• ferramentas de gestão como planejamento, organização e controle e tomada
de decisões
• conhecimentos e práticas de gerência de projetos, conhecimentos e utilização
comprovada das melhores práticas de gerência de projetos em acordo com o
PMI. conhecimentos e experiência na utilização do MS Project.

Já a segunda categoria, que denominamos ‘conhecimentos do objeto específico do


cargo ou do setor de atuação da empresa’, engloba os saberes e competências que
são normalmente mais associados à experiência tácita, ao exercício da função ou ao
tipo de trajetória empreendida pelo profissional. São mais ‘particularizados’ que os
23 3

anteriores e mais difíceis de serem adquiridos fora do ambiente profissional (embora


esta não seja a regra exclusiva). São exemplos deste enquadramento:

• total compreensão do produto transações eletrônicas no segmento bancário,


cartão de crédito e saúde. / bons conhecimentos de marketing estratégico
(avaliação de mercado, produto, viabilidade e concorrência). / bons
conhecimentos de montagem de preços/propostas comerciais. /
Conhecimentos de CMMI
• ter profundos conhecimentos de métodos pedagógicos atuais em educação
• conhecimento em toda rotina da área comercial
• conhecimento em gestão financeira, elaboração de relatórios
• domínio de cargos e salários, diagnóstico de clima organizacional, avaliação de
desempenho, recrutamento e seleção
• sólidos conhecimentos em tributos e planejamento tributário (impostos diretos e
indiretos)
• domínio das áreas de suprimentos, financeiro, contábil, recursos humanos,
segurança e saúde ocupacional
• bons conhecimentos nas áreas jurídica
• bons conhecimentos do mercado de agronegócios
• ter grandes conhecimentos na área de investimentos, produtos bancários e
papéis no mercado acionário

Nos nossos dados verificamos que a demanda total por ‘conhecimentos técnicos
específicos’ apresenta um incremento ao longo do período, embora de forma bem
menos acentuada do que ocorre em relação, por exemplo, ao domínio de idiomas.
Este aumento se deve, sobretudo, aos casos que são encontrados nos suportes ‘sites’
(site 1 e especialmente no site 2), mantendo-se estável quando se considera os
suportes ‘jornais’. (Gráfico 11)

No entanto, quando analisamos a demanda a partir das duas categorias elaboradas,


verifica-se que é em torno dos ‘conhecimentos de ferramentas transversais’ que se
imprime a maior alta proporcional, passando de 6% em 1990 para 16% em 2005.
23 4

Gráfico 11
Demanda por conhecimentos técnicos (%)
- 2005 por suporte e totais 1990 e 2005 -
50,00%

45,00% 45,00%

41,00%
40,00% 40,00%
37,00%
35,00% 36,00%
34,00% 33,33%
33,00%
30,00%
29,00%
27,00%
25,00%

20,00% 20,00%

15,00%
16,00% 15,67%
12,00%
10,00%
11,00% 11,00%
9,00%
5,00%
6,00%
4,00%
2,00%
0,00%

Site 1 Site 2 Jornais (2005) Total 1990 Total 2005

TOTAL que exige conhecimentos técnicos Conhecimento de ferramentas transversais


Conhecimento do objeto Ferramentas + objeto

Levanta-se a hipótese de que isso pode indicar uma valorização dos perfis do tipo
‘profissional’, cujo conhecimento pode ser formalizado e portanto transferível, por
oposição ao ‘artesanal ou artístico’ que se define situacionalmente (MINTZBERG;
2006).

Porém há que se considerar com prudência a perspectiva de substituição de uma


categoria pela outra. O que pode estar ocorrendo, e que os casos da nossa amostra
apontam ainda que de forma incipiente, é uma sobreposição dos dois tipos de
conhecimento: as empresas estariam mais propensas a exigir conhecimentos de
ferramentas transversais e conhecimentos específicos do objeto, especialmente
quando o recrutamento se dá via Internet. Ou seja, um não necessariamente substitui
o outro. Deste modo, experiência tácita e formação (acadêmica ou não) se combinam
em um contexto de recrutamento que se torna mais exigente.

5.3.3.5. A sobreposição das demandas

Se considerarmos o conjunto de nossa categoria composta por ‘formação acadêmica e


outras qualificações’, perceberemos que há uma elevação de 8 pontos percentuais
nas demandas tendo por base os dois períodos considerados. Dentre seus
23 5

componentes, a formação acadêmica era e permanece sendo, de longe, o atributo


mais relevante nas solicitações, seguido, com certa distância, pelo domínio de outros
idiomas, que apresentou o maior crescimento proporcional no período, tornando-se
mais significativo do que os conhecimentos técnicos específicos. (Gráfico 12)

Gráfico 12
Tipo 3 - Demanda por Formação Acadêmica e Outras Qualificações (%)
- 2005 por suporte e totais 1990 e 2005 -
100,00%
93,00% 91,00%
89,00%
90,00%
83,00%
78,00%
80,00% 74,00% 75,00%
72,33%

70,00% 65,00% 65,00%


61,00%

60,00%
50,00%
50,00% 45,00%
44,00% 45,00%
40,00%
40,00% 41,00% 34,00% 33,00%

30,00%

18,00%
18,00%
20,00% 20,00%
14,00% 17,33%
6,00%
10,00% 10,00%
1,00% 3,00% 0,00% 2,67%
4,00% 2,33%
1,00% 1,00% 0,00% 1,00% 2,00%
0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,33% 0,33%
Site 1 Site 2 Jornais (2005) Total 1990 Total 2005

formação acadêmica outras certificações


registros em órgãos de classe qualificação incorporada
outras qualificações domínio de idiomas
conhecimentos de informática conhecimentos técnicos
TOTAL DA CATEGORIA (exige pelo menos uma variável)

Tanto há o crescimento quantitativo do total de anúncios que valorizam a ‘formação


acadêmica e outras qualificações’, quanto há, também, o incremento dos casos que
apresentam superposição de suas variáveis componentes. Enquanto em 1990, os
anúncios que faziam referência a apenas uma ou duas das variáveis consideradas158
somavam 84% do total, em 2005, este conjunto cai para 70% e, por oposição, atinge a
casa dos 30% o montante de anúncios que exigem três ou mais tipos distintos de
qualificações ou certificados. (Tabela 26)

158
A saber: (1) formação acadêmica; ou (2) domínio de idiomas; ou (3) conhecimentos técnicos; ou (4)
conhecimentos de informática; ou (5) registros em órgãos de classe; ou (6) outras certificações; ou (7)
outras qualificações. Não se considerou as qualificações incorporadas pelos motivos já expostos
anteriormente.
23 6

Tabela 26 - Anúncios que solicitam QUALIFICAÇÕES E/OU CERTIFICADOS: total e


segundo a quantidade de tipos distintos de elementos solicitados - 2005 por suporte e
totais 1990 e 2005

Anúncios que exigem qualificações e /ou certificados


um tipo de dois tipos de três ou mais tipos de
Suportes e
Total de casos qualificação ou qualificação ou qualificação ou
Totais
certificado certificado certificado
N % N % N % N %
Site 1 83 100% 29 34,94% 30 36,14% 24 28,92%
Site 2 93 100% 23 24,73% 37 39,78% 33 35,48%
Jornais 91 100% 33 36,26% 35 38,46% 13 14,29%
Total 2005
267 100% 85 31,84% 102 38,20% 80 29,96%
(N=300)
Total 1990
75 100% 35 46,67% 28 37,33% 12 16,00%
(N=100)

Portanto, o que parece ser a tendência nas estratégias voltadas aos processos de pré-
seleção levados a cabo pelos empregadores é de sobrepor os diferentes critérios de
exigência, e não apenas de investir no incremento de cada critério isoladamente. Em
outras palavras, não é apenas a formação acadêmica que se faz mais necessária,
mas é esta associada ao domínio de um segundo ou terceiro idioma, acrescida de
conhecimentos técnicos específicos, somada a registros em órgãos de classe ou à
posse de outros certificados, como no exemplo que se segue:

Nosso cliente, empresa multinacional do ramo químico, procura:

CONTROLLER

• É necessário possuir domínio e controle das áreas administrativa, financeira e contábil


(conhecimentos técnicos específicos)
• É imprescindível possuir fluência no idioma inglês, bons conhecimentos de espanhol,
desejável alemão avançado. (conhecimentos em idiomas)
• Domínio de informática (Windows e aplicativos; e-mail/internet; sistemas integrados de
grande porte) (conhecimentos genéricos de informática)
• Formação superior completa em Ciências Contábeis, Administração de Empresas ou
similar. (formação acadêmica)
• É necessário possuir CRC. (registro em órgãos de classe)

Site 2 – Anúncio n. 19

De qualquer modo, resta saber se, em se tratando da categoria sócio-profissional dos


gerentes, a situação brasileira engendraria particularidades no que diz respeito ao
23 7

uso/reconhecimento dos diplomas que a afastaria das tendências verificadas em


outros países. Para tanto estudos comparativos controlados precisariam ser feitos,
mas um esboço muito preliminar, tendo como referência as conclusões de Gracio
(2001), pode ser chamado à cena. Em Portugal, Gracio observa que no período entre
1989 e 1997, a indicação do nível escolar nos anúncios de empregos voltados a
gerentes apresentou uma ligeira redução, passando de 70,4% (1989) para 68,7%
(1997), enquanto a experiência profissional cresceu de 65,2% para 66,5% e as
competências em informática ampliaram-se de 34,6% para 42,6% no período159.

Segundo ele, estes resultados sugerem uma “evolução bastante moderada entre as
duas datas em direção ao aumento da importância das competências dos candidatos
não escolarmente sancionadas (especialmente experiência e informática), face às
competências escolares”. (GRACIO: 2001, p. 22); e isso ocorre em um contexto onde
aumentou consideravelmente o volume de capital escolar socialmente disponível. No
entanto, relativizando esta constatação, ele prossegue afirmando que “embora
desenhando-se com relativa nitidez, a evolução fica claramente aquém de uma
alteração marcante da relação entre as duas ordens de competências”. (ibidem, id.)

Nos nossos dados, o que pudemos perceber é que o já alto patamar de exigências em
relação à experiência que se verificava em 1990 (presente em 88% dos anúncios),
permanece com o passar dos anos. Entretanto, no período analisado, diferentemente
do constatado por Gracio, há o incremento na demanda por formação acadêmica
(atingindo 72% dos anúncios em 2005), além dos conhecimentos técnicos (40% dos
anúncios no mesmo ano) e, ainda mais incisivamente, do domínio de idiomas
(alcançando 50% da amostra).

Ou seja, a evolução se coloca tanto em relação às competências propriamente


escolares ou formais mas também pelas ‘não escolares’ e pelas ‘não formais’ (sejam
elas da ordem dos ‘conhecimentos técnicos’ ou das ‘capacidades específicas’,
conforme será detalhado no próximo tópico), o que nem de longe nos autoriza a afirma
que haveria indícios de uma inversão nas ‘duas ordens de competências’. (Figura 7)

159
Jackson (2001), por sua vez, identifica, nos anúncios de empregos destinados aos ‘managers and
senior officials’ (o equivalente funcional dos nossos ‘gerentes’) colhidos no ano 2000, a demanda por
qualificações acadêmicas em apenas 15% dos anúncios; enquanto a exigência por experiência se faz
presente em 86% dos mesmos.
23 8

Figura 7
Matriz de Exigências nos Anúncios

Competências não formalmente sancionadas


(experiência, conhecimentos técnicos,
idiomas, informática)

Aumento da incidência (+) Redução da Incidência (-)


Competências formalmente
sancionadas (Escolaridade)

incidência (+)
Aumento da

-+
++
(??)
Brasil
incidência (-)
Redução da

+- --
Portugal (??)

Acresce que como a expansão das matrículas no ensino superior brasileiro foi
bastante heterogênea, especialmente no que concerne à qualidade da formação
disponibilizada, pode-se levantar a hipótese de que apenas o recurso ao diploma
como ‘cláusula de barreira’ não estaria sendo suficiente para garantir, ao contratante,
que o tipo de competência ou de capacitação visado poderia ser assegurado. A
variação da ‘qualidade’ dos cursos de graduação seria então, além dos demais
elementos (como já mencionados da diversificação dos níveis de das fileiras
profissionais – capítulo 1) , mais um vetor que interfere na avaliação da ‘qualidade’ dos
futuros candidatos, inserindo ‘incertezas’ no processo decisório. Portanto, os
empregadores poderiam se sentir tentados a lançar mão, com maior ênfase, das
‘cláusulas de qualificação’ (conhecimentos técnicos, idiomas, etc.) para capturarem
mais claramente e explicitamente aqueles componentes da formação que poderiam
estar deixando de ser diretamente ‘assegurados’ pelos diplomas.

5.3.4. Competências e/ou capacidades específicas

O último conjunto de variáveis mapeadas que define o perfil dos gerentes e executivos
solicitado nos anúncios de emprego recai sobre o que denominamos por
‘competências ou capacidades específicas’.
23 9

Neste, incluímos todas as demandas referentes à posse de determinadas capacidades


por parte dos candidatos, estejam elas relacionadas à realização das funções, a
competências sociais e relacionais, a características pessoais e outras, e que não
foram consideradas nos grupamentos anteriores (experiência, formação ou
conhecimentos). Nossa estrutura ficou assim composta:

 Categoria 1 - Capacidades de disponibilidade de mobilidade e de horário


 Categoria 2 - Capacidades de comunicação e relacionais
 Categoria 3 - Capacidades empresariais e de gestão
 Categoria 4 - Capacidades associadas ao desenvolvimento e implicação com o
trabalho
 Categoria 5 - Capacidades ou competências pessoais, comportamentais e
sociais

A visão de conjunto permite identificar o incremento da quantidade de anúncios que


exigem ao menos uma capacidade em cada categoria, tomando os dois cortes
temporais definidos. (Gráfico 13)
24 0

Gráfico 13
Tipo 4 - Demanda por Competências/capacidades (segundo grandes categorias) (%)
- 2005 por suporte e totais 1990 e 2005 -

60,00%

50,00%
49,00%
47,00% 47,00%
45,00%

42,00%
40,00%

30,00%

25,00%
24,00%
21,00% 21,67%
22,00% 22,00%
21,00% 20,67%
20,00% 20,00% 20,00% 20,00% 20,00%
18,00%
17,00% 17,00%
13,00% 15,33%
14,00%
12,00% 12,67%
10,00% 11,00%
8,00%
7,00%

0,00%

Site 1 Site 2 Jornais (2005) Total 1990 Total 2005

comunicação e relacionais empresariais e de gestão


desenvolvimento e implicação com o trabalho pessoais, comportamentais e sociais
mobilidade e disponibilidade de horários TOTAL de casos que exigem ao menos uma competencia

Como cada categoria é composta por vários atributos distintos (capacidades), o que
também se observa é a tendência de elevação na quantidade de capacidades que são
solicitadas160. Em 1990, em 100 anúncios, registrou-se 101 ocorrências de demandas
relativas a capacidades; em 2005 o total de ocorrências foi da ordem de 135 para cada
grupo de 100 anúncios.

Ainda em relação a este ‘adensamento’, em 1990, 78,58% dos anúncios que exigiam
capacidades específicas o faziam sem ultrapassar o total de 3. Em 2005, este
montante reduz-se para 73,75%, crescendo a participação dos anúncios que exigem
mais de sete capacidades distintas. (Tabela 27)

160
Ao todo mapeamos 22 tipos de capacidades diferentes, que se distribuem pelas 5 categorias,
conforme descrito em detalhes no capítulo 4. São elas: Categoria 1 – capacidades: disponibilidade de
horário; disponibilidade para mudança de residência; disponibilidade para viagens; Categoria 2 –
capacidades: comunicação; relacionais; liderança; redes de relacionamento; Categoria 3 – capacidades:
empreendedorismo; negociação; gestão/gerais; gestão/estratégica; gestão/foco em resultados; gestão/de
pessoas e equipes; Categoria 4 – capacidades: trabalho em equipe; iniciativa, autonomia e flexibilidade;
comprometimento e envolvimento; Categoria 5 – capacidades: subjetividade; personalidade; aspectos
físicos; aspectos sociais; referências morais e de empatia; outras.
24 1

Tabela 27 - Anúncios que solicitam CAPACIDADES E COMPETÊNCIAS: total e por


quantidade de capacidades distintas - 2005 por suporte e totais 1990 e 2005

Quantidade de capacidades exigidas por anúncio Total de anúncios que


Suportes e exigem ao menos
Totais 1 a 3 capacidades 4 a 6 capacidades 7 capacidades ou mais uma capacidade
N % N % N % N %
Site 1 31 68,89% 7 15,56% 7 15,56% 45 100,00%
Site 2 39 82,98% 6 12,77% 2 4,26% 47 100,00%
Jornal 34 69,39% 10 20,41% 5 10,20% 49 100,00%
Total 2005
(N=300) 104 73,76% 23 16,31% 14 9,93% 141 100,00%
Total 1990
(N=100) 33 78,57% 8 19,05% 1 2,38% 42 100,00%

Os casos apresentados a seguir são exemplos típicos desta multiplicação de


exigências por competências distintas que incide sobre os candidatos:

• Profissional com forte capacidade no planejamento estratégico e gestão comercial,


preferencialmente em indústria ou distribuição de produtos de informática, com
experiência mínima de cinco anos no cargo de alta gerência ou diretoria comercial.
Habilidade em elaboração de budget anual de vendas, elaboração e acompanhamento
do plano de vendas, elaboração de relatórios gerenciais e análise de resultados, foco
em resultado e visão sistêmica e empreendedora. Identificação abordagem de
novos mercados, ampliação da base clientes, trabalhar com metas ambiciosas e
cumprir prazos, resoluções rápidas dos problemas, trabalhar com metas globais e
individuais para gerências e supervisões, avaliação de produtividade e rentabilidade e
habilidade de buscar novas oportunidades e operacionalizar as mesmas.
Desejável conhecimentos no idioma inglês. Ser presente, atuante, organizado,
entusiasta, dinâmico, motivador, estilo de gestão agregador, completam o perfil
desejado. (Site 1 – anúncio n. 30 - Diretor comercial)

• Que tenha trabalhado em grande corporação de qualquer ramo, na diretoria ou


presidência por mais de dez anos e que durante esse tempo, tenha criado amizades
sinceras e duradouras, assim como construído sólidos relacionamentos com seus
pares diretores e com seus pares clientes e fornecedores. Que tenha dinamismo e
iniciativa. Com facilidade em detectar problemas e resolvê-los. Que saiba remover
objeções e obstáculos com energia, força e vontade. Agressividade comercial,
amizade com estreito relacionamento, conhecimento e trânsito na presidência ou
diretoria das grandes corporações. Que tenha sólida formação acadêmica e cultural.
Visão estratégica. Habilidade para negociar. Empreendedor. Auto motivado. (Site
1 – anúncio 42 – Diretor de Novos Negócios)

• As competências desejáveis são: inovação/renovação, foco em resultados,


iniciativa, cooperação pró-ativa, criatividade, bom relacionamento interpessoal e
excelentes habilidades empreendedoras e de comunicação verbal /
disponibilidade para residir e morar em um destes Estados: São Paulo, Minas
Gerais e Espírito Santo. (Jornal 2005 – anúncio 11 - gerente de Produto)

A seguir veremos como os anúncios se comportam tomando cada categoria em


separado.
24 2

5.3.4.1. Categoria 1: Capacidades de mobilidade e disponibilidade de horário

Este primeiro conjunto de capacidades escapa das definições usuais de


competências, uma vez que remetem a condições de restrições / possibilidades reais
de cada pessoa para dispor da totalidade de seu tempo e do seu deslocamento
espacial (representado por ‘mudanças de residência’ e ‘viagens’). Nesse sentido, estas
capacidades não dizem respeito apenas ao indivíduo tomado isoladamente, mas
repercutem sobre o núcleo familiar e sua organização ou estruturação. Sob certos
aspectos, é um dos poucos conjuntos de atributos que possibilitam revelar as
diferenças que se estabelecem entre as dimensões de gênero e geracionais que
normalmente se mantêm ‘ocultas’ na disputa pelas vagas.

Por trás de exigências que se enunciam a partir da frase ‘disponibilidade de horário’,


encontra-se a imprecisão das fronteiras entre o tempo de trabalho e o tempo de lazer,
entre a vida profissional e a vida pessoal, e sobressai exatamente a valorização desta
ampla ‘cambialidade’. Sem dúvida, mães de família, com filhos pequenos que não
dispõem de um suporte doméstico ou familiar para o qual possam repassar os
cuidados com a prole e com a ‘gestão’ do lar, terão menos chances de ‘dispor dos
seus horários’ do que jovens solteiros (as). Da mesma forma, encontrarão mais
dificuldades para estarem ‘disponíveis para viagens’ ou ‘para mudanças’ do que seus
parceiros ou seus / suas ‘concorrentes’.

Em um contexto de trabalho onde o ‘nomadismo’ desponta como a referência


ideológica do ‘bom profissional’, os laços que possam vir a manter os indivíduos
atrelados a qualquer que seja o ambiente ou situação contam negativamente (como já
exposto no capítulo 3).

Bruschini e Puppin (2004), em pesquisa realizada junto a mulheres executivas,


identificam as restrições que estas enfrentam nas suas chances de promoção; e tais
restrições são tão ou mais relevantes quando se trata de etapas anteriores à
contratação. Em depoimento por elas colhido, uma executiva reflete sobre esta
questão:
24 3

“Como a empresa é muito grande, a gente percebe que quando você tem mais
disponibilidade para se locomover, suas chances de galgar cargos mais
relevantes são maiores. Pois nossa sede não é no Rio de Janeiro, é em Brasília,
onde estão os cargos de direção geral. Quando você aceita locomover-se a
proposta de promoção fica mais fácil. E isso para a mulher é mais difícil – pois
ela pode ser casada, ter filhos, aí não depende só dela: ou vai sozinha ou espera
que o marido mude de estado... Não existe discriminação no sentido estrito, mas
as promoções ocorrem com mais facilidade para aqueles que têm mais chances
de se locomover. Os cargos têm muito a ver com disponibilidade, pois formação
hoje em dia as mulheres têm tanta (se não até mais) quanto os homens (cursos,
capacitação). Estar disponível 24 horas por dia implica em atualização e menor
convívio com os filhos. Estar em eventos, reciclar-se, viajar, é difícil para quem
tem filhos pequenos.” (depoimento da gerente de recursos humanos das
Indústrias Gross). (BRUSCHINI & PUPPIN: 2004; p. 125)

Ainda que este tipo de exigência possa ser justificada por fatores decorrentes da
‘necessidade do trabalho’, como no caso das empresas que tem atuação transnacional
(e suas demandas por ‘disponibilidade para viagens’) ou ainda decorrentes de
contextos de recrutamentos alargados, que ultrapassam as fronteiras locais (e suas
solicitações por ‘disponibilidade para mudanças’), a sua incidência nos anúncios não
deixa de ser um fator que produz, ainda que de forma ‘não planejada’, um determinado
tipo de discriminação, que atua sobre as dimensões de gênero, de gerações e também
de classes sociais.

Das 5 categorias analisadas, esta é a que apresenta maior ocorrência de casos,


chegando a estar presente em 20% dos anúncios de 2005. E a disponibilidade para
mudanças é o fator que mais sofre aumento proporcional no período, o que também
pode revelar a disseminação de práticas de recrutamento não constritas
espacialmente. (Gráfico 14)
24 4

Gráfico 14
Categoria 1 - Demanda por mobilidade e disponibilidade de horário (%)
- 2005 por suporte e totais 1990 e 2005 -

30,00%

25,00% 25,00%

20,67%
20,00% 20,00%
18,00%
17,00%
15,00%

12,67%
12,00%
10,00% 10,00% 10,00% 10,00%
9,00%
8,00% 7,67%
6,00%
5,00%
4,00%
3,00%
2,00% 2,00% 2,33%
0,00% 0,00%
Site 1 Site 2 Jornais (2005) Total 1990 Total 2005

disponibilidade para mudanças disponibilidade para viagens


disponibilidade de horário TOTAL DA CATEGORIA

Em alguns anúncios é possível perceber a sobreposição de exigências por essas


capacidades, como no exemplo a seguir, embora esta não seja a regra.

• “ter disponibilidade de horário e para viagens / disponibilidade para morar em


Belo Horizonte” (Site 1 – anúncio n. 31 - Diretor nacional de vendas / industria
moveleiro / colchões)

5.3.4.2. Categoria 2: Capacidades de comunicação e relacionais

Neste conjunto consideramos as demandas por atributos que apontam para a boa
performance nos processos de comunicação e na inter-relação com outros indivíduos,
sejam colegas, superiores, empregados ou clientes. Diretamente associada a essa
está a habilidade em ‘liderança’, que remete ao carisma (o ‘espírito do líder’) e às
características pessoais do candidato que o legitimam diante dos subordinados, e não
tão somente à sua posição definida pelo estatuto hierárquico ou pelos conhecimentos
técnicos acumulados. Trata-se da capacidade de motivar e mobilizar as pessoas para
atingir aos objetivos propostos.
24 5

Nesta categoria também estão incluídas as referências à inserção em determinadas


redes de relacionamento, seja ela produto das atividades profissionais anteriormente
desempenhadas ou ainda do convívio social em ambientes/grupos específicos. É sem
dúvida, a categoria que mais diretamente remete à valorização do capital social dos
indivíduos.

Em 1990 este era o grupo de capacidades que apresentava o maior número de


incidências (20% dos anúncios faziam referência a pelo menos uma das competências
classificadas nesta rubrica), destacando-o diante de todos os demais. Passados 15
anos, sua proporção relativa nos anúncios permanece inalterada, indicando a
perenidade de sua relevância. (Gráfico 15) No entanto é importante ressaltar que tais
capacidades já estão rivalizando com as que são encontradas nas demais categorias,
como o agrupamento 1 analisado anteriormente (presentes em 20,67% dos casos) e o
agrupamento 3 – relativo às capacidades ‘empresariais e de gestão’ (presentes em
21,67% dos anúncios), conforme será abordado mais adiante.

Gráfico 15
Categoria 2 - Demanda por capacidades de comunicação e relacionais (%)
- 2005 por suporte e totais 1990 e 2005 -

25,00%

22,00%
21,00%
20,00% 20,00% 20,00%

17,00%
15,00%

13,00% 13,00%
12,00%
11,00%
10,00% 10,00% 9,67%
9,00% 9,00%
8,00% 8,00%
7,00% 7,00% 7,00%
6,00%
5,00%

3,00% 3,33%
2,00% 2,00% 2,00%
1,00%
0,00%

Site 1 Site 2 Jornais (2005) Total 1990 Total 2005

comunicação relacionais rede de relacionamentos liderança TOTAL DA CATEGORIA

Nesta categoria, as capacidades específicas conectadas aos processos de


‘comunicação’, se destacam das demais quando se considera o seu crescimento. Aqui
nota-se a presença de marcadores que apontam para competências lingüísticas que
não se reduzem ao domínio formal da língua, ou de suas estruturas gramaticais e
24 6

sintáxicas. O que se encontra em questão é muito mais as condições de aceitabilidade


da linguagem e do discurso, que envolvem a competência do locutor na avaliação da
situação do campo ou do ‘mercado’ onde será proferida a sua ‘fala’ (BOURDIEU:
1983a; 1983b).

Nesse sentido, trata-se sobretudo do bom manejo da ‘linguagem legítima’ que permite
o posicionamento em situações formais, tal como ocorre com as situações de trabalho,
e que, exatamente por englobar o correto domínio dos códigos dominantes, autoriza
ao indivíduo a ‘fazer concessões’ nas comunicações que precisam ser travadas com
‘todos os níveis da empresa’. Transitando em ambientes diferenciados que incluem
não apenas os ‘pares’ (eles portadores das mesmas competências), mas também
aqueles que são desprovidos de tal montante de capital lingüístico (e que por força da
situação se encontram em relação no ambiente de trabalho), as habilidades de
comunicação não se resumem à forma com que se diz (correção gramatical), nem ao
que se diz (lógica intrínseca e conteúdo), mas transborda para quem está autorizado a
dizer o ‘quê’ e em que ‘contexto’: é um falar certo e adequado onde aquele que “além
daquilo que diz, diz constantemente que o diz bem” (BOURDIEU: 1983a; p. 82).

Se esta demarcação associada aos processos comunicativos se faz presente no


momento de pré-seleção, como no caso das exigências encontradas dos anúncios, ela
ainda é mais relevante quando se passa à etapa posterior da contratação, ou seja,
quando os candidatos são avaliados em entrevistas. Nestas, os julgamentos que os
contratantes ou seus prepostos elaboram sobre os candidatos a cargos de gerência e
executivos se apóiam, sobretudo, nas ‘maneiras de ser’ (‘savoir-être’), onde as
capacidades de expressão jogam um papel determinante. Gautié et alli (2003), em
pesquisa centrada nas avaliações que são realizadas pelos ‘head-hunters’ sobre os
candidatos, verificam que neste novo contexto, onde os tempos destinados ao
processo de recrutamento são cada vez mais curtos e onde a verificação efetiva das
realizações que os candidatos afirmam colecionar é um processo delicado (que coloca
em questão inclusive a capacidade técnica do entrevistador), é no discurso ou na
narrativa que se constrói para trazer à tona a dimensão da experiência profissional que
os avaliadores se fiam prioritariamente. E nesta situação, a competência lingüística
joga um papel determinante:

“A escuta da experiência do candidato é também uma ocasião para fazê-lo falar


e julgar suas maneiras de fazer e suas maneiras de ser, a começar pela
24 7

expressão. As fortes ocorrências (nas fichas de avaliação dos head-hunters) de


‘BOA APRESENTAÇÃO’, ‘FALA’ (bem ou mal), ‘SE EXPRIME’, mostram que as
maneiras de falar, que são indissociáveis das competências sociais e das
competências técnicas e estratégicas no âmago da empresa, retêm uma atenção
particular.” (GAUTIÉ et alli: 2003, p. 3 – tradução própria)

Em suma, uma ‘relação de comunicação’ não é redutível ao ato de comunicar. O que


está em jogo é a capacidade de se acionar as competências lingüísticas que se dispõe
de forma a obter o ‘lucro’ visado. A relação de comunicação é assim, também, uma
relação econômica, onde é o valor de quem fala que está em análise, e este não é
dissociado nem do contexto no qual esta comunicação ocorre e nem das regras de
valorização mais amplas que se espelham no campo específico. No caso particular do
mercado de trabalho, o ‘bom comunicador’ não se desconecta das suas realizações e
posições profissionais anteriores, nem do seu capital cultural e educacional acumulado
ou da sua posição social, que fortalecem e lhe autorizam a ‘dizer certo o que quer que
diga’. Ou, como Bourdieu resume, de forma bastante elucidativa, ao tratar dessas
valorações:

“O que está em questão, quando dois locutores se falam, é a relação objetiva


entre suas competências, não apenas sua competência lingüística (seu domínio
mais ou menos completo da linguagem legítima), mas também o conjunto de sua
competência social, seu direito a falar, que depende objetivamente de seu sexo,
sua idade, sua religião, seu estatuto econômico, e seu estatuto social, assim
como das informações que poderiam ser conhecidas antes ou ser antecipadas
através de indícios imperceptíveis.” (BOURDIEU: 1983a; p. 84)

Nos anúncios por nós analisados podemos perceber ainda a explicitação da partição
destas competências: a lingüística propriamente dita, ou o domínio das regras da
língua; e a social, o domínio da situação da comunicação; como fica evidente no
exemplo a seguir:

• very good communication (domínio da situação da comunicação) / excellent


verbal and written communication skills in portuguese and english language
(domínio das regras lingüísticas) (suporte jornal 2005. Anúncio n. 75 -
Customer Service Analyst Jr.)

Além das capacidades lingüísticas, o segundo conjunto de habilidades contemplado


na categoria agrega as ‘capacidades relacionais’. Essas são explicitadas por meio de
sentenças tais como: ‘bom relacionamento interpessoal’, ‘competência na interação
com pares e superiores’, ‘interpersonal skills’, ‘good relationship with people’, entre
outras.
24 8

Ainda mais abstratas e genéricas do que as capacidades de comunicação, podem


muito bem englobar estas últimas e acrescentar, ao conjunto, certa ‘disposição para a
cooperação’ ou ainda uma ‘docilidade’ intrínseca. Portanto, o que define os focos
prioritários do ‘bom relacionamento interpessoal’, é a interpretação particular do
recrutante, o que faz com que sua avaliação / mensuração seja ainda mais
dependente de quadros valorativos subjetivos.

Nas nossas amostras há uma leve queda da demanda em relação a esta capacidade,
que passa de 11% em 1990 para 9% em 2005. Mas isso não nos autoriza a afirmar
que o seu ‘valor’ estaria sendo minimizado. (Gráfico 15)

Situação semelhante se dá em torno da capacidade de ‘liderança’, cuja queda no


período é mais acentuada. Mas será que podemos afirmar que a ‘liderança’ era mais
relevante anteriormente do que se faz hoje em dia? Não parece ser esse o caso. Se
tomarmos por apoio os textos produzidos para consumo desta categoria de
profissionais ou mesmo os artigos publicados na mídia comum, a temática da
liderança e do líder é extremamente pujante. No entanto, como Boltanski e Chiapello
(1999) já demonstraram, no novo receituário moral que estabelece os traços
relevantes do perfil dos gerentes modernos, o líder é aquele que tem a ‘visão’, e não
mais o chefe hierárquico de antigamente; é o que em saber-se portador da visão,
também sabe transmiti-la e sabe fazer com que os demais tomem aderência a ela; é o
que, sem recorrer à força, atribui um sentido ao trabalho de cada um (BOLTANSKI &
CHIAPELLO: 1999, p. 119).

Dessa forma, o que se pode aventar como hipótese é de que ao invés de estar em
curso uma redução real da relevância desta capacidade, estaria havendo um
deslocamento nos termos que são designados para explicitá-la. A ‘liderança’ assim se
encarna na ‘visão estratégica’, sendo esta anterior a ela própria. A visão estratégica
legitima a liderança, tornando-a menos dependente do carisma ou da capacidade de
inter-relacionamento. Portanto, ausente dos anúncios em 1990, a ‘visão’ e a
‘estratégia’ ganham terreno em 2005, o que poderá ser melhor observado na
descrição da próxima categoria.
24 9

Inversamente ao que ocorre com as duas capacidades analisadas anteriormente


(relacionais e liderança), percebe-se o crescimento das referências à posse de
relações específicas ou de ‘redes de relacionamento’ por parte dos candidatos. Ainda
que estas sejam ínfimas quando se considera o conjunto dos dados, elas merecem
uma atenção especial por serem a explicitação, sem mediações, do valor diferenciado
do capital social na disputa pelas vagas.

Para a melhor compreensão da questão vale trazer à cena o conceito de capital social
elaborado por Bourdieu, que coloca no seu centro as redes de relações e seus
acionamentos bem como o esforço por manter a durabilidade dos vínculos. Para ele, o
capital social é definido da seguinte forma:

“O capital social é o conjunto de recursos atuais ou potenciais que estão ligados


à posse de uma rede durável de relações mais ou menos institucionalizadas de
interconhecimento e de relações de inter-reconhecimento ou, em outros termos,
à vinculação a um grupo, como conjunto de agentes que não somente são
dotados de propriedades comuns (passíveis de serem percebidas pelo
observador, pelos outros ou por eles mesmos), mas também são unidos por
ligações permanentes e úteis. Essas ligações são irredutíveis às relações
objetivas de proximidade no espaço físico (geográfico) ou no espaço econômico
e social porque são fundadas em trocas inseparavelmente materiais e simbólicas
cuja instauração e perpetuação supõem o reconhecimento dessa proximidade. O
volume de capital social que um agente individual possui depende então da
extensão da rede de relações que ele pode efetivamente mobilizar e do volume
de capital (econômico, cultural ou simbólico) que é posse exclusiva de cada um
daqueles a quem está ligado”. (BOURDIEU: 1998, p. 67)”

Se é verdadeiro que o capital social joga um papel fundamental nas condições de


acesso às vagas161, sendo o recurso prioritário que é acionado em mercados de
trabalho mais informais (por oposição aos instrumentos e práticas formais), a sua
explicitação nos anúncios como componente do perfil a ser possuído pelos candidatos
atribui a este capital (agora ‘competência’) um outro nível de relevância, onde o
componente material das trocas é destacado. Com isso, se contextualiza este capital a
partir da possibilidade de agregação, aos portadores, de um valor não apenas
simbólico, mas efetivamente mais ‘real’, além de estabelecer uma demarcação em
relação ao tipo de capital social que tem relevância: não é o pertencimento a qualquer
rede de relações que está em questão, mas tão somente àquelas que venham a se
somar com os objetivos e os propósitos da empresa ou que possam fazer render suas

161
Como já foi abordado em momentos anteriores desta tese – ver final do Capítulo 2.
25 0

‘competências essenciais’. A empresa se apóia então no trabalho de manutenção das


redes que é feito por cada indivíduo, segundo os seus próprios recursos e custas, para
buscar o seu melhor posicionamento no mercado e/ou sua longevidade.

A novidade aqui não é a importância ou o peso acordado a este tipo de ‘competência’,


mas sim a sua passagem da esfera do não dito ou do subentendido para a total
visibilidade, como se esta estivesse começando a ser ‘naturalizada’ nos discursos dos
anúncios162. As ‘redes’ de agora vão muito além da ‘carteira de clientes’ de antão. Os
exemplos apresentados a seguir são emblemáticos desta situação:

• (que tenha trabalhado em grande corporação de qualquer ramo, na diretoria ou


presidência por mais de dez anos), e que durante este tempo tenha criado
amizades sólidas e duradouras, assim como construído sólidos
relacionamentos com seus pares diretores e seus pares clientes/fornecedores.
Amizade com estreito relacionamento, conhecimento e trânsito na presidência
ou diretoria das grandes corporações. (Site 1 – Anúncio 42 - Diretor de novos
negócios)

• largo networking pessoal e profissional dentro do ambiente empresarial, social


e governamental do Estado de Minas Gerais / indispensável ter posição e
visibilidade no meio empresarial mineiro (Site 2 – Anúncio n. 1 – Diretor
Presidente)

• desejável rede de contatos com empresas, visando ao estabelecimento de


convênios e novos contratos (Site 2 – Anúncio n. 2 – Gerente de
Relacionamento com clientes)

• é imprescindível para esta posição que o profissional já tenha relacionamento


com as principais montadoras do país; seja como cliente, fornecedor ou
colaborador (jornal 2005 – anúncio n. 90 - Gerente de Desenvolvimento de
Novos Negócios / Montadoras)

5.3.4.3. Categoria 3: Capacidades empresariais e de gestão

Este agregado é formado pelas capacidades que remetem à performance em


negociações, à ‘vocação’ empresarial e também às capacidades mais afeitas ao
exercício de funções propriamente gerenciais, que atravessam tanto a gestão de

162
O próximo passo desta ‘objetivação’ poderá ser o de atribuir a este capital um valor econômico que
reconheça, aos seus portadores, o esforço que fazem para se manterem conectados nas ‘redes’.
25 1

recursos humanos quanto o domínio de técnicas associadas à administração e gestão


lato sensu.

De todas as categorias analisadas é a que aparece com maior incidência nos anúncios
de 2005 (presente em 21,67% deles) e, juntamente com a categoria 1 (‘mobilidade e
disponibilidade de horário’), a que mais cresce proporcionalmente.

No conjunto, há o incremento de todas as variáveis consideradas na composição do


grupo – empreendedorismo, negociação e gestão – sendo que nas duas primeiras
este se dá de forma parcimoniosa, enquanto que na última é expressivo. (Gráfico 16)

Gráfico 16
Categoria 3 - Demanda por Capacidades empresariais e de gestão (%)
- 2005 por suporte e totais 1990 e 2005 -

30,00%

25,00%
24,00%
22,00% 21,67%
21,00%
20,00% 20,00%

17,33%
16,00%
15,00%
14,00%
13,00%

10,00%

8,00%
7,00% 7,00%
6,00% 5,67%
5,00%
4,00% 4,00% 4,33%
3,00% 3,00% 3,00%
2,00% 2,00%
1,00% 1,33%
0,00% 0,00%
Site 1 Site 2 Jornais (2005) Total 1990 Total 2005

empreendedorismo negociação Gestão Outras TOTAL DA CATEGORIA

Há também o crescimento na quantidade de ocorrências. Em 1990, em 100 anúncios


foram registradas 17 ocorrências. Já em 2005 esse montante sobe para 36 para cada
grupo de 100. (Tabela 28) Ou seja, os empregadores estão solicitando em maior
número as capacidades associadas à gestão por anúncio individual.
25 2

Tabela 28 - Anúncios que solicitam CAPACIDADES EMPRESARIAIS E DE GESTÃO: total


e quantidade de ocorrências - 2005 por suporte e totais 1990 e 2005

Capacidades empresariais e de gestão


Suportes e Totais Total de casos
Ocorrências
N %
Site 1 20 20,00% 34
Site 2 21 21,00% 34
Jornais 24 24,00% 41
Total 2005 (N=300) 65 21,67% 109
Total 1990 (N=100) 13 13,00% 17

Sobre as capacidades de negociação pode-se fazer uma análise semelhante à


elaborada no tópico anterior, referente às habilidades de comunicação. A competência
em ‘negociação’ inclui essencialmente o bom conhecimento do jogo e das regras do
jogo; ela é comunicação em ação, define o senso da oportunidade, o tomar a palavra
em situação de fala e a perspicácia para o recuo e para o bom uso do silêncio. Nesse
sentido, se é uma habilidade que pode se fortalecer com a experiência, ela é também
a presença de uma determinada competência social que se atualiza em diversas
situações: com clientes, com subordinados, com parceiros, com superiores, com
acionistas, etc. O processo da negociação seria fadado ao fracasso para aqueles que
não se sentem à vontade no contexto, ou em conjunturas onde as relações de força
são muito desiguais.

Já as capacidades denominadas por ‘empreendedorismo’, que crescem quase na


mesma proporção, poderiam representar, à primeira mirada, um contra-senso ou um
‘desvio’ do conceito. O termo ‘empreendedorismo’ ganha terreno e significância social
conjuntamente com a ‘empregabilidade’, com a redução dos ‘empregos fixos’, com a
necessidade que se impõe a cada um para ‘cuidar de si’, de ser uma ‘empresa
individual’, de mercantilizar o conjunto de capacidades de que se dispõe. Em
mercados de trabalho ‘flexíveis’, o empreendedor é o que consegue transitar entre
várias lógicas, tirando partido das oportunidades (ou criando as mesmas) segundo a
conjuntura que se apresente. A princípio, o empreendedor seria um ‘concorrente’
potencial das empresas estabelecidas, um possível criador de novos
empreendimentos. Nos anúncios de emprego, o termo empreendedorismo é utilizado
para designar a capacidade de ‘cavar novos negócios’, de ‘buscar novas
oportunidades’, e nesse sentido, é essencialmente associado a uma forte iniciativa e
autonomia colocada em prol da empresa contratante. Incorpora-se o ‘desvio’ fazendo-
25 3

o funcionar a seu favor. Dessa forma, o ‘empreendedor’ é totalmente compatível com o


perfil do novo ‘manager’.

Por fim, a rubrica de ‘gestão’ reúne um conjunto bem mais heterogêneo de


capacidades demandadas. Para fins de ordenamento, a fracionamos em quatro sub-
níveis: (1) capacidades gerais de gestão; (2) capacidades estratégicas / visão
estratégica; (3) foco em resultados; e (4) gestão de pessoas e equipes. Os de número
2 e 3 podem ser analisados como parte integrante do primeiro (capacidades gerais de
gestão), destacando as novas estratégias empresariais para lidar com a questão da
coordenação. Totalmente inexistentes em 1990, eles ganham terreno em 2005.
Optamos por tratá-los em separado exatamente para destacar esta mudança de
ênfase.

Gráfico 17
Demanda por Capacidades de Gestão - detalhamento (%)
- 2005 por suporte e totais 1990 e 2005 -

10,00%

9,00% 9,00%

8,00% 8,00% 8,00%

7,00% 7,00%
6,33%
6,00% 6,00% 6,00% 6,00%

5,00% 5,00% 5,00% 5,00%

4,00% 4,00% 4,00%

3,00% 3,00%

2,00% 2,00% 2,00%

1,00%

0,00% 0,00%
Site 1 Site 2 Jornais (2005) Total 1990 Total 2005

gerais visão estratégica foco em resultados gestão de pessoas

As capacidades ‘gerais de gestão’ corresponderiam ao que Gracio (2001) define como


expressão dos formatos ‘tradicionais’ da relação de trabalho, de matriz taylorista-
fordista, onde o problema da coordenação do conjunto das atividades das empresas
se dá pelo acionamento das linhas hierárquicas e ‘de cima para baixo’. Em 1990 estas
demandas eram mais claras e assumiam os seguintes formatos:
25 4

• capacidade administrativa (jornal, 1990, anúncio n.2 – Chefe de Departamento


de Pessoal)
• capacidade para gerenciar o escritório (jornal, 1990, anúncio n. 35 – Gerente
de Vendas)
• capacidade de analisar e tomar decisões em problemas técnicos e humanos
(jornal, 1990, anúncio n. 49 – Chefes de Equipe de Produção)
• capacidade de controle e planejamento (jornal, 1990, anúncio n. 53 – Gerente
de Dept. de Loja)
• administração por objetivos (jornal, 1990, anúncio n. 96 – Gerente de Contratos
/ obras)163

Passados 15 anos, as exigências desta natureza não desaparecem, mas se tornam


mais difusas, fragmentadas, além de trazem novos atores (stakeholders, clientes) para
dentro do contexto, como nos exemplos a seguir:

• gestão comercial
• trabalhar com metas ambiciosas / estilo de gestão agregador
• capaz de fazer com que a informação flua de forma eficiente e eficaz entre os
stakeholders do projeto / capaz de chegar a um acordo que não onere o
projeto em todos os aspectos
• habilidade em gestão
• competência no planejamento
• capacidade analítica
• olhar empresarial
• gestão financeira
• visão generalista em RH
• generalist and high performer HR professional
• visão orçamentária
• managerial reporting skill
• foco no cliente
• capacidade para elaborar plano estratégico de vendas / e garantir metas
• capacidade de planejamento e prevenção de problemas
• customer focus are required / time management
• focado em objetivos

Mas a virada substantiva nos conteúdos das exigências relativas às capacidades de


gestão se dá a partir do acionamento de outras capacidades que se delineiam com
maior nitidez: as capacidades estratégicas e o foco nos resultados. Percebe-se aí que

163
Boltanski e Chiapello (1999 – pág. 103-111) identificam na ‘gestão por objetivos’ uma das respostas
das empresas a duas questões distintas: de um lado o problema da coordenação devido ao crescimento /
agigantamento das empresas, e de outro, a possibilidade de responder às demandas dos gerentes por
maior autonomia e participação nos rumos da empresa, contestando o excesso de concentração do poder
nas mãos dos proprietários (a esta se somam a descentralização e a meritocracia como os outros eixos
de respostas). Se no entanto este é um tipo de solução que se esboça nos textos de gestão dos anos
1960, nós podemos perceber a sua contínua presença em anúncios dos anos 1990 – evidenciando um
hiato entre as representações e as práticas concretas.
25 5

a solução para a questão da coordenação, se não elimina os mecanismos anteriores


que tomam apoio no controle, normalização e posição hierárquica, começa a lançar
mão de novos dispositivos.

No plano das representações, para fazer frente a organizações mais competitivas,


conectadas em redes, com trabalhadores autônomos e trabalhando por projetos, é de
um lado a ‘visão’ estratégica a qualidade que dará o alicerce para a mobilização (e
para a legitimação do ‘líder’164); e de outro lado o foco / orientação para resultados que
permitirá a sua ancoragem - e que possibilitará mensurar / avaliar a eficácia desta
visão.

Estas duas sobressaem portanto dentre as novas competências de gestão que


passam a ser solicitadas. (Gráfico 17) Ao mesmo tempo elas se afastam das
capacidades mais tipicamente conectadas ao exercício clássico das funções de
enquadramento. Mesmo a ‘gestão de pessoas’, última das capacidades analisadas
nesta categoria, e que poderia ser o lócus substantivo da permanência das funções de
enquadramento, sofre a influência dos novos ‘paradigmas’, alterando a forma com que
as empresas se referenciam às competências necessárias ao exercício da função.

Assim, dos gerentes, ao invés de se esperar que sejam competentes para de ‘chefiar’,
‘dirigir’ ou ‘coordenar’ pessoas e equipes, tal como o era descrito em 1990 (termos que
hoje são tidos como ‘ultrapassados’ por remeterem ao ‘enquadramento’ e ao ‘dar
ordens’), demanda-se que sejam capazes, sobretudo, de ‘motivar’, ‘mobilizar165’, ‘gerir’,

164
Boltanski e Chiapello (1999) inventariam, nos textos de gestão destinados ao consumo dos gerentes,
algumas formulações em torno da relevância da visão estratégica que vale a pena resgatar: “Les visions
les plus riches et les plus mobilisatrices sont celles qui ont du sens, qui répondent à des aspirations.”
(Bellenger, 1992); «La vision confère du sens ; elle pointe l´avenir du doigt ; elle transcende les objectifs à
court terme en les insérant dans un tout. Enthousiasmante, la vision est non sseulement une mission,
mais aussi un puissant aimant. Comme les grands défis, la vision réveille la capacité collective.» (Crozier
et Sérieyx eds, 1994); «Le leader est celui qui est investi par le groupe, celui dans lequel, conscienmment
ou inconsciemment, chacun se retrouve. Grâce à son influence, à son art de la vision et à ses orientations,
il crée un courant qui invite chacun au dépassement, à la confiance et à l´iniciative.» (Cruellas, 1993) ;
«Les bons leaders savent stimuler les autres par la puissance et l´enthousiasme de leur vision et donner
aux hommes le sentiment qu´ils font quelque chose d´important et qu´ils peuvent être fiers de leur travail.»
(Moss Kanter, 1991) (apud BOLTANSKI & CHIAPELLO: 1999, p. 119)
165
A mobilização é o substituto mais ‘moderno’ à motivação. No discurso de gestão, indivíduos
emancipados, críticos e autônomos não precisam de fontes externas de motivação. Eles se auto-motivam:
a motivação é intrínseca e não extrínseca. O gerente deve, isso sim, ser capaz de ‘mobilizar corações e
mentes’ de todos em torno de um objetivo comum, e este usualmente é definido pela ‘visão’.
25 6

‘alinhar’, e ‘inspirar’, e ajudar no processo de desenvolvimento dos demais166, como


exemplificado a seguir:

• habilidade na formação e motivação de equipes (Site 1 – anúncio 27 - Diretor


executivo)
• com facilidade de alinhar, motivar e inspirar pessoas (Site 1 – anúncio 89 -
Gerente de Projetos em TI)
• competência na gestão de equipes (Site 2 – anúncio 58 - Gerente de
Controladoria e Finanças)
• coordenação e gestão de equipes (Site 2 – anúncio 93 - Gerente de Projetos)
• habilidade na gestão de pessoas (Jornal 2005 – anúncio 48 - Gerente
Industrial)
• capacidade de mobilização e motivação de equipe (Jornal 2005 – anúncio n. 61
- Gerente de Projeto / Project Manager)
• capacidade de formação de pessoas (Jornal 2005 – anúncio 59 - Gerente de
Produção)

Por fim, mais uma vez o que se nota é tanto o incremento no número absoluto de
anúncios que exigem as capacidades de gestão e, também, a superposição das
mesmas: em 1990, dos 100 anúncios analisados, havia apenas 9 ocorrências no
conjunto, em 2005, para cada 100 anúncios, o número de ocorrências se eleva para
17. (Tabela 29)

Tabela 29 - Anúncios que solicitam CAPACIDADES DE GESTÃO: total e quantidade de


ocorrências - 2005 por suporte e totais 1990 e 2005

Capacidades DE GESTÃO
Suportes Total de casos
Ocorrências
N %
Site 1 14 14,00% 22
Site 2 16 16,00% 23
Jornais 22 22,00% 29
Total 2005 (N=300) 52 17,33% 74
Total 1990 (N=100) 8 8,00% 9

O exemplo apresentado a seguir é emblemático desta sobreposição de exigências:

• Liderança, visão de futuro e capaz de traçar estratégias para atingir esta visão
(estratégia), com facilidade de alinhar, motivar e inspirar pessoas (gestão de
166
O desenvolvimento das competências e potenciais dos demais trabalhadores da organização se
coloca como sendo uma das atribuições do gerente ele mesmo, ou de um novo personagem: o ‘coach’.
Esta ‘habilidade’ em cuidar do desenvolvimento das habilidades alheias tem sido explorada pelos
intermediários do mercado como mais uma ‘linha de serviços’ ou de consultoria que se presta seja às
pessoas jurídicas (próprias empresas interessadas no desenvolvimento de seus quadros), seja às
pessoas físicas, preocupadas com o incremento de sua ‘empregabilidade’.
25 7

pessoas e equipes), capaz de fazer com que a informação flua de forma


eficiente e eficaz entre os stakeholders do projeto, solucionador de problemas,
ser hábil em negociações complexas (negociação) capaz de chegar a um
acordo que não onere o projeto em todos os aspectos (gerais), influência na
organização (outras). (Site 1 – anúncio n. 89 - Gerente de Projetos em TI)

5.3.4.4. Categoria 4: Capacidades de desenvolvimento e implicação com o


trabalho

Esta categoria é formada por três subconjuntos de atributos: capacidades de trabalho


em equipe; capacidade de iniciativa, autonomia e flexibilidade; e capacidades de
comprometimento com o trabalho.

Comparativamente com as demais categorias analisadas até aqui, esta é a que


apresenta menor incidência nos anúncios em 2005, além de agregar pouco
crescimento ao longo do tempo. (Gráfico 18) Porém, cabe assinalar que este resultado
é muito influenciado pela posição do Site 2, que ‘puxa’ para baixo os números obtidos
em 2005. Se não fosse por ele, o percentual de incremento entre os dois períodos
analisados seria um pouco maior, porém não significativamente distinto.

Gráfico 18
Categoria 4 - Demanda por Capacidades de desenvolvimento e
implicação com o trabalho (%)
- 2005 por suporte e totais 1990 e 2005 -
18,00%

17,00%
16,00%

14,00% 14,00%
12,67%
12,00% 12,00%
11,00%
10,00% 10,00%
9,00% 8,67%
8,00%

7,00% 6,67%
6,00% 6,00% 6,00%
5,00%
4,00% 4,00% 4,00%
3,00%
2,00% 2,00% 2,00%
2,00%
0,00% 0,00%
Site 1 Site 2 Jornais (2005) Total 1990 Total 2005

trabalho em equipe iniciativa, autonomia e f lexibilidade comprometimento TOTAL DA CATEGORIA


25 8

Jackson (2001) entende que, à exceção das habilidades para trabalho em equipe, as
demais fazem parte da categoria que ela define como ‘job commitment characteristics’,
as quais, por sua vez, são representativas do ‘esforço’ do indivíduo, e por isso compõe
o seu conceito de mérito alargado. Iniciativa, autonomia, flexibilidade e outros
aspectos que remontam ao comprometimento com o trabalho seriam habilidades
passíveis de serem adquiridas, e sobre estas o peso da ‘herança’, do capital social e
cultural e/ou do meio de origem seriam menos incidentes.

As referências às capacidades para ‘trabalho em equipe’ são bastante reduzidas no


nosso corpus, e cabe levantar a hipótese de que estas podem estar sendo preteridas
em prol das habilidades de liderança e relacionais, como já mencionado
anteriormente.

Mas o mesmo não pode ser dito em relação à demanda por iniciativa, autonomia e
flexibilidade, que em nenhum dos dois períodos considerados chega a ser significativa
para o conjunto dos dados das amostras. Embora o passar do tempo não tenha
contribuído para que se reduza o seu espaço, ao contrário, já que o que se verifica é
um leve incremento, esse porém permanece muito aquém do que seria de se esperar
se tomarmos por base os discursos que se constroem em torno da necessidade de
autonomia e de flexibilidade dos trabalhadores e gerentes.

Em termos de crescimento mais expressivo, o conjunto que se destaca é o formado


pelas capacidades de ‘comprometimento com o trabalho’, ainda que em números
absolutos permaneça abaixo dos demais. Gracio (2001) identifica nestas habilidades
traços do que ele denomina por competências do ‘tipo tradicional’, por oposição aos
dois conjuntos anteriores (trabalho em equipe e iniciativa e autonomia) que seriam
característicos das ‘novas competências’. Seria de se esperar que o núcleo
‘tradicional’ tivesse sua importância reduzida ao passo que as demais qualidades
seriam crescentemente requeridas pelas empresas, segundo ele devido,
essencialmente, “à pressão da internacionalização das economias, da intensificação
da concorrência e da transformação da natureza dos produtos, com ritmos acentuados
de inovação” (GRACIO: 2001, p. 8).

No entanto, o que nossos dados parecem aventar, ainda que muito incipientemente, é
que atributos como ‘responsabilidade’, ‘auto-motivação’, ‘organização’,
25 9

‘comprometimento’, ‘hands-on’ entre outros, que são utilizados para designar o núcleo
‘tradicional’ de competências, não parecem estar sendo preteridos em prol das ‘novas
tendências’. Até mesmo as mais tradicionais das demandas, como disciplina e
pontualidade, mantêm sua vez, contrariando os arautos que acreditam que o ‘novo’
elimina por completo o ‘velho’:

• Profissional pontual (Site 1 – anúncio n. 20 – Diretor de Arte)


• Cumprir prazos (Site 1 – anúncio n. 30 – Diretor Comercial)
• Profissional disciplinado (Jornal 2005 – anúncio n. 34 – Diretor Industrial)

Portanto, se há espaço para solicitações que versam em torno das competências mais
‘modernas’, também há permanências que teimam em resistir à passagem do tempo
(ou de novas abordagens).

5.3.4.5. Categoria 5: Capacidades ou competências pessoais, comportamentais e


sociais

Esta categoria busca dar conta do conjunto de capacidades ou de atributos solicitados


que apontam diretamente para fatores vinculados à subjetividade, personalidade,
aspectos físicos e sociais dos indivíduos. Corresponde à categoria que Jackson (2001)
nomeia por “outras características pessoais” (‘other personal characteristics’) que,
somada às características adscritas e de posse de bens (apresentadas no item 5.3.1.
deste capítulo) correspondem ao que mais diretamente aponta para a permanência da
influência da origem dos indivíduos nas suas chances de disputa pelas vagas.

Assim como ocorre com as características adscritas (cuja demanda nos anúncios
reduz-se de 21% para 10,67% entre os dois anos considerados, conforme já exposto),
o conjunto das capacidades pessoais, comportamentais e sociais também se
apresenta em queda. (Gráfico 19)

Duas classes de atributos – ‘referências físicas’ e ‘subjetividade’ – são as principais


responsáveis por esta redução (marcada sobretudo pela ação do Site 2), enquanto as
demais permanecem estáveis ou sofrem leve incremento.
26 0

Gráfico 19
Categoria 5 - Demanda por Capacidades pessoais, comportamentais e sociais (%)
- 2005 por suporte e totais 1990 e 2005 -

2 5,00%

22,00%

20,00% 20,00%

18,00%

15,00%
15,33%
14,00% 14,00%

10,00%
9,00%
8,00% 8,33%
7,00% 7,00%
6,00% 6,00%
5,00% 5,00% 5,33%

3,00% 3,00% 3,33%


2,00% 2,00% 2,33%
1,33%
1,00% 1,00% 1,00% 1,00% 1,00%
0,00% 0,00% 0,00%
Site 1 Site 2 Jornais (2005) Total 1990 Total 2005

referencias físicas caracteristicas sociais outras subjetividade


personalidade morais e empatia TOTAL DA CATEGORIA

No grupo denominado por ‘referências físicas’ encontramos atributos que são


descritos como: ‘dinâmico’, ‘dinamismo’, ‘pessoas ativas’, ‘ágeis’, e ‘boa saúde física e
mental’.

Já no grupo intitulado ‘subjetividade’ estão as demandas descritas a partir dos termos:


‘criatividade’, ‘espírito inovativo’, ‘inovação/renovação’, ‘talentoso’, ‘que saiba trabalhar
sob pressão’, ‘disposição para enfrentar desafios’, ‘assume riscos’, ‘auto-
conhecimento’, ‘atitude determinada’, ‘desembaraçada’, ‘garra’, ‘vontade de aprender’.
É interessante perceber que as solicitações relativas à criatividade e à inovação,
bastante valorizadas nos textos que descrevem o ‘novo funcionamento do mundo do
trabalho e o perfil dos trabalhadores mais requeridos’ eram pouco presentes nos
anúncios de 1990. Estes se fixavam mais em atributos tais como ‘garra’ e ‘vontade de
aprender’. Ao mesmo tempo, a questão da valorização da capacidade de ‘trabalhar
sob pressão’ era inexistente em 1990, vindo a se colocar como questão mais
26 1

recentemente, em paralelismo com a compressão do tempo, a urgência por resultados


e o acúmulo de atividades sob os auspícios da polivalência.

Atributos diretamente conectados à personalidade dos indivíduos, tais como ambição,


persistência, entusiasmo, perfeccionismo, bom humor, desinibição, integrador,
independente e pragmático, mantêm a baixa freqüência nos anúncios nos dois
períodos considerados.

Já as capacidades descritas como ‘morais e de empatia’, representam um elemento


‘novo’, que mesmo sendo pouco expressivo no conjunto, revela, de um lado, a onda
do ‘politicamente correto’ (como na demanda por um candidato que seja ‘socialmente
sensível’ – na vaga para Diretor Industrial – Jornal, 2005 anúncio 34) e, de outro lado,
a preocupação com a internalização do controle, especialmente após os ‘escândalos’
iniciados com o caso Enron (como na demanda por ‘integridade’ para as vagas de
Diretor Fiscal e de Diretor Jurídico-Tributário – Site 2 – anúncios 76 e 46
respectivamente).

Por fim, as características sociais que correspondem às demandas expressas nos


termos de: ‘formação cultural/nível cultural’; ‘identificação com a marca’; ‘discernimento
pessoal’; ‘desenvoltura política’; ‘boa postura’ e’ maturidade para relacionamento
social’; apresentam um leve incremento, o qual, se excluíssemos a ação do Site 2,
seria mais expressivo.

Desse panorama geral percebemos que a situação que encontramos em nossa


amostra difere radicalmente da encontrada por Jackson (2001) em sua pesquisa. Ela,
ao tomar o grupo dos ‘managers and senior officials’, verifica que 45,3% dos anúncios
apresentam ao menos uma requisição relativa às características pessoais, colocando-
as como muito mais relevantes do que as qualificações acadêmicas (que aparecem
em apenas 15,1% dos anúncios).

Estaríamos assim diante de uma situação que nos autorizaria a afirmar que, ao menos
no que diz respeito à etapa de pré-seleção caracterizada pela publicação de anúncios
destinados a gerentes, o ‘mercado’ brasileiro estaria se comportando de modo mais
‘meritocrático’? Ou que, com o passar do tempo, os anúncios de emprego estariam
dando maior importância ao resultado da equação ‘dom/capacidades inatas + esforço’
26 2

por oposição à herança atribuída e/ou à origem social (e suas incidências em termos
da posse de capital cultural e social específicos)?

No próximo tópico buscaremos analisar estas questões em maior detalhe, partindo


principalmente no enquadramento de mérito estreito e de mérito estendido proposto
por Jackson.

5.4. Os anúncios para gerentes estão mais meritocráticos ?

Os anúncios para gerentes e executivos estariam de fato dando maior relevância aos
atributos que são considerados como mais meritocráticos? Para responder a esta
questão, tomamos por base o quadro de análise desenvolvido por Jackson (2001) e
Jackson et alli (2002) que define um conjunto de atributos ‘típicos’ de mérito (mérito
estreito), acrescido de outros atributos que também podem ser caracterizados como
meritocráticos (mérito estendido), vis-à-vis os atributos que claramente ficam de fora
desta classificação.

Buscando estabelecer uma analogia entre o enquadramento elaborado por Jackson e


as categorias por nós trabalhadas, elaboramos 2 quadros de correspondência
apresentados a seguir (Quadros 6 e 7).
26 3

Quadro 6 - Correspondência entre atributos relativos ao MÉRITO - Estreito e Estendido

Atributos definidos por Jackson Nossos atributos correspondentes (*)


Mérito estreito (Narrow Merit)

Qualificações acadêmicas • Qualificações acadêmicas (4.2.2)


• Outras certificações (4.2.4)
• Registros em órgãos de classe (4.2.5)
Outras qualificações
• Qualificações incorporadas (4.2.1)
• Outras qualificações (4.2.3)
• Capacidades associadas à iniciativa, autonomia e
Habilidades cognitivas flexibilidade (4.4.3.2)
• Comprometimento e envolvimento com o trabalho
(4.4.3.3)
Esforço
• Capacidades associadas à subjetividade valorizadas no
trabalho (4.4.5.1)
• Domínio de idiomas (4.2.6)

Mérito estendido (Broad Merit)

Conhecimentos de informática (4.2.7)


• Conhecimentos técnicos (domínio do objeto) (4.2.8.2)
• Conhecimentos técnicos (ferramentas transversais)
(4.2.8.1)
• Capacidades empreendedoras (4.4.2.1)
Habilidades técnicas • Capacidades de negociação (4.4.2.2)
• Capacidades de gestão gerais (4.4.2.3.1)
• Capacidades vinculadas a estratégia/visão estratégica
(4.4.2.3.2)
• Foco em resultados (4.4.2.3.3)
• Capacidades de gestão de pessoas e equipes
(4.4.2.3.4)
(*) Os números entre parênteses correspondem à classificação apresentada no Capítulo 4 .

Quadro 7 - Correspondência entre atributos relativos ao NÃO MÉRITO

Atributos definidos por Jackson Nossos atributos correspondentes


• Sexo
• Idade
• Apresentação
• Residência
• Posse de bens (4.1.5)
• Disponibilidade de horário (4.4.4.1)
Características pessoais
Não mérito

• Disponibilidade para mudança de residência (4.4.4.2)


• Disponibilidade para viagens (4.4.4.3)
• Atributos de personalidade (4.4.5.2)
• Aspectos físicos (4.4.5.3)
• Referências morais e capacidade de empatia (4.4.5.5)
• Outras capacidades ou competências pessoais (4.4.5.6)
• Capacidades de comunicação (4.4.1.1)
• Capacidades relacionais (4.4.1.2)
Habilidades sociais • Liderança (4.4.1.3)
• Redes de relacionamento (4.4.1.4)
• Aspectos sociais (4.4.5.4)
26 4

Desse modo, o nosso conjunto relativo ao ‘mérito estreito’ ficou formado por 8
atributos (ou variáveis), o conjunto de ‘mérito estendido’ por 11 e o de ‘não-mérito’ por
17 atributos167.

Em seguida buscamos ver como os nossos anúncios se comportam em relação a


cada um destes agrupamentos, considerando os dois períodos temporais definidos
(anos de 1990 e 2005). Os resultados obtidos estão apresentados nas tabelas de
número 30 a 33.

As tabelas 30, 31 e 33 apresentam a evolução das demandas por cada atributo nas
amostras recolhidas nos dois anos considerados tendo em vista sua classificação
como mérito estreito, estendido e não mérito. A tabela 32 apresenta em separado os
resultados gerais obtidos com os anúncios que contêm ao menos uma incidência
relativa ao mérito estreito e ao mérito estendido (resultados obtidos pelas tabelas 30 e
31) acrescentando o que chamamos por incidências de ‘mérito geral’, que corresponde
aos anúncios que demandam atributos de mérito estreito e/ou de mérito estendido.

Em cada tabela os atributos que formam o conjunto específico são apresentados em


numeração seqüencial. A título de facilitar a leitura agregada, incluiu-se sub-totais
relativos a cada classe maior de atributos, que é apresentada com destaque em
vermelho.

Nota-se que tanto os sub-totais apresentados quanto o total final não correspondem
ao somatório simples das incidências (N) da coluna, uma vez que um mesmo anúncio
(caso) pode apresentar demandas em mais de um atributo. Por exemplo, na tabela 30,
tomando o ano de 2005, identifica-se 26 anúncios que exigem ao menos uma
incidência relativa ao atributo ‘capacidade de iniciativa, autonomia e flexibilidade’
(atributo n. 6); 20 casos que exigem ‘capacidade de envolvimento com o trabalho’ (n.
7); e 16 que demandam ‘capacidades associadas à subjetividade mobilizada para o
trabalho’ (n. 8). Porém o sub-total da classe ‘Capacidades relativas ao esforço e

167
Jackson não considera a experiência como atributo do mérito, Também optamos por excluí-la neste
momento uma vez que é uma variável que se encontra presente na quase totalidade dos anúncios
considerados (solicitada por 88% dos anúncios de 1990 e 90% dos de 2005). A sua inclusão, seja como
mérito ou como não mérito, poderia inserir um forte viés de interpretação. Para todos os efeitos,
assumimos que a exigência por experiência não explica as variações obtidas, embora a sua forma de
expressão tenha se tornado muito mais complexa, como já demonstrado anteriormente.
26 5

envolvimento com o trabalho’ (que contem os 3 atributos anteriores) contabiliza 39


anúncios – e não 62 – indicando que vários anúncios demandam a combinação de
dois ou mais dos atributos referidos. Da mesma forma, o total de anúncios que
apresentam demanda por ao menos um atributo de mérito estreito (ultima linha da
tabela 30) é de 226 casos, e não 263, (somatório dos sub-totais) já que existem
anúncios que demandam mais de um tipo de atributo, como indicado. O mesmo vale
para as tabelas de n. 31 e 33.

Tabela 30 - Evolução das demandas por atributos de MÉRITO ESTREITO nos anúncios -
1990-2005

Anúncios de 1990 Anúncios de 2005


(N=100) que (N=300) que
Atributos considerados apresentam pelo apresentam pelo
menos uma incidência menos uma incidência
N % N %
1. Qualificações acadêmicas 65 65,00 217 72,33
Qualificações acadêmicas (sub – total
65 65,00 217 72,33
atributo 1)
2. Demais qualificações – outras
0 8 2,67
certificações
3. Demais qualificações – registro em
0 7 2,33
órgãos de classe
4. Demais qualificações – qualificações
Mérito estreito

2 2,00 1 0,33
incorporadas
5. Demais qualificações - outras 1 1,00 1 0,33
Demais qualificações (sub-total –
3 3,00 17 5,67
atributos 2, 3 4 e 5)
6. Capacidades de iniciativa, autonomia e
6 6,00 26 8,67
flexibilidade
7. Capacidades de envolvimento com o
3 3,00 20 6,67
trabalho
8. Capacidades associadas à
subjetividade mobilizada para o 9 9,00 16 5,33
trabalho
Capacidades relativas ao esforço e
envolvimento com o trabalho (sub-
14 14,00 39 13,00
total- atributos 6, 7 e 8)
Total de anúncios que apresentam ao
menos uma incidência de demanda 69 69,00 226 75,33
por atributos de mérito estreito
26 6

Tabela 31 - Evolução das demandas por atributos de MÉRITO ESTENDIDO nos anúncio –
1990-2005

Anúncios de 1990 Anúncios de 2005


(N=100) que (N=300) que
Atributos considerados apresentam pelo apresentam pelo
menos uma incidência menos uma incidência
N % N %
1. Domínio de idiomas 18 18,00 150 50,00
2. Conhecimentos de informática 10 10,00 52 17,33
3. Conhecimentos técnicos (domínio do
29 29,00 100 33,33
objeto)
4. Conhecimentos técnicos (ferramentas
6 6,00 47 15,67
transversais)
Conhecimentos técnicos (sub-total –
33 33,00 120 40,00
atributos 3 e 4)
Mérito estendido

Conhecimentos (idioma e/ou,


informática e/ou técnicos) (sub-total- 48 48,00 212 70,67
atributos 1, 2, 3 e 4)
5. Capacidades empreendedoras 3 3,00 13 4,33
6. Capacidades de negociação 4 4,00 17 5,67
7. Capacidades de gestão gerais 5 5,00 19 6,33
8. Capacidades de gestão estratégica 0 0,00 18 6,00
9. Foco em resultados 0 0,00 12 4,00
10. Capacidades de gestão de pessoas
3 3,00 19 6,33
e equipes
11. Outras capacidades empresariais e
1 1,00 4 1,33
de gestão
Capacidades empresariais e de
gestão (sub-total – atributos 5, 6, 7, 8, 13 13,00 65 21,67
9, 10 e 11)
Total de anúncios que apresentam ao
menos uma incidência de demanda 54 54,00 229 76,33
por atributos de mérito estendido

Tabela 32 - Evolução das demandas por atributos de MÉRITO GERAL (ESTREITO E


ESTENDIDO) nos anúncios – 1990-2005

Anúncios de 1990 Anúncios de 2005


(N=100) com pelo (N=300) com pelo
Mérito Geral

CATEGORIAS DE MÉRITO menos uma incidência menos uma incidência


N % N %
Mérito estreito 69 69,00 226 75,33
Mérito estendido 54 54,00 229 76,33
Mérito estreito e/ou estendido 78 78,00 272 90,67
26 7

Tabela 33 - Evolução das demandas por atributos de NÃO-MÉRITO nos anúncios – 1990-
2005

Anúncios de 1990 Anúncios de 2005


(N=100) que (N=300) que
Atributos considerados apresentam ao menos apresentam ao menos
uma incidência uma incidência
N % N %
1. Sexo 3 3,00 7 2,33
2. Idade 16 16,00 9 3,00
3. Apresentação pessoal 4 4,00 0 0,00
4. Residência 1 1,00 17 5,67
5. Posse de bens 3 3,00 6 2,08
Características adscritas e outras
21 21,00 32 10,67
(sub-total – atributos 1, 2, 3, 4 e 5)
6. Disponibilidade de horário 0 0,00 7 2,33
7. Disponibilidade para mudança de
4 4,00 23 7,67
residência
8. Disponibilidade para viagens 10 10,00 38 12,67
Disponibilidades de deslocamento e
12 12,00 62 20,67
outras (sub-total – atributos 6, 7 e 8)
Não Mérito

9. Características de personalidade 3 3,00 10 3,33


10. Aspectos físicos 14 14,00 25 8,33
11. Referências morais e capacidade
0 0,00 4 1,33
de empatia
12. Outras capacidades e
1 1,00 3 1,00
competências pessoais
13. Atributos sociais 1 1,00 7 2,33
Competências e características
pessoais e sociais (sub-total – 17 17,00 40 13,33
atributos 9, 10, 11 e 12)
14. Capacidade de comunicação 2 2,00 22 7,00
15. Capacidades relacionais 11 11,00 27 9,00
16. Liderança 13 13,00 29 9,67
17. Redes de relacionamento 1 1,00 10 3,33
Capacidades de comunicação e
relacionais (sub-total – atributos 14, 20 20,00 60 20,00
15, 16 e 17)
Total de anúncios que apresentam
ao menos uma incidência de
44 44,00 137 45,67
demanda por atributos de não
mérito

As conclusões obtidas a partir da interpretação das tabelas anteriores podem ser


sintetizadas da seguinte maneira:
26 8

1. Crescimento suave (6 pontos percentuais) da demanda por atributos de mérito


estreito, sendo as credenciais acadêmicas o principal fator deste incremento;

2. Forte crescimento da demanda (12 pontos percentuais) por atributos de mérito


estendido, com forte destaque para o domínio de idiomas e conhecimentos
técnicos;

3. Estabilidade na demanda por atributos de não-mérito, sendo que no conjunto


reduzem-se significativamente as exigências por características adscritas e
elevam-se as solicitações por mobilidade.

Portanto a resposta à questão apresentada no início deste item é afirmativa: os


anúncios voltados a gerentes e executivos estão de fato se tornando mais
meritocráticos com o passar do tempo. Mas isso ocorre principalmente devido
às solicitações por atributos que caracterizam o mérito na sua versão estendida.
No entanto, verifica-se também que este incremento não se dá à custa da
redução da demanda por atributos classificados como não meritocráticos, que
permanecem estáveis.

Assim, se é verdadeiro que os empregadores estão dando mais importância às


credenciais escolares e aos demais conhecimentos que devem ser portados pelos
candidatos, nem por isso eles desconsideram a presença de fatores que remetem a
outras capacidades, sejam elas relativas à origem, classe, meio social ou outros.

Acresce ainda que o peso relativo das credenciais escolares e demais atributos que
compõem o mérito estreito como único agregado considerado pelos empregadores
anunciantes cai no período (passando de 24,00% em 1990 para 15,81% em 2005). Ao
mesmo tempo eleva-se o peso dos atributos que caracterizam o mérito estendido
como único elemento em torno do qual se situa a demanda (indo de 9,00% para
16,91% no período); assim como a combinação de mérito estreito e estendido
(variando de 45% para 61% nas mesmas datas). (Tabela 34). Dito de outra forma, o
diploma sozinho deixa de ser tão relevante quanto já foi no passado. Se o seu valor
26 9

cresce no mercado de trabalho, isso se dá em combinação com outros atributos ou


capacidades168.

Tabela 34 - Distribuição das grandes categorias de classificação do mérito dos anúncios


– 1990 e 2005

Anúncios de 1990 Anúncios de 2005


Categorias (N=100) (N=300)
N % N %
Somente mérito estreito 24 24,00 43 15,81
Somente mérito estendido 9 9,00 46 16,91
Somente não mérito 4 4,00 8 2,67
Mérito estreito e estendido 45 45,00 183 61,00
Mérito estreito e/ou ou estendido 78 78,00 272 90,00
Mérito estreito e/ou não mérito 78 78,00 251 83,67
Mérito estendido e/ou não mérito 70 70,00 258 86,00
Mérito estreito e/ou estendido e não
39 39,00 128 42,67
mérito
Mérito estreito e estendido e não
24 24,00 92 30,67
mérito
Nem mérito estreito, nem estendido,
17 17,00 18 6,00
nem não mérito

Por fim, observa-se que se reduz bastante a quantidade de anúncios que não
demandam nem atributos de mérito nem de não-mérito (de 17% para 6%), ou seja,
aqueles que se focam apenas na experiência ou nem nisso.

Ao que tudo indica, os anúncios estão se tornando não apenas mais meritocráticos,
mas também mais exigentes em relação à sobreposição de variáveis que são
solicitadas.

Para mensurarmos o quanto tem variado esta sobreposição de solicitações criamos a


variável ‘densidade’ descrita a seguir.

168
Isso vai ao encontro das conclusões obtidas por pesquisadores como Helal (2005) que identifica que
os efeitos da escolaridade na ocupabilidade de um cargo gerencial permanece bastante significativo, e
maior até do que os seus efeitos na ocupabilidade de uma vaga no mercado formal de trabalho. Ainda
que após 1982 o seu impacto comece a se reduzir, este não perde a sua relevância, mas não se coloca
necessariamente como o principal fator para a ocupabilidade gerencial: retirada a variável educacional do
modelo, os coeficientes da variáveis ligadas ao background familiar (ocupação do pai, escolaridade do pai
e escolaridade da mãe) tornam-se relevantes.
27 0

Variável densidade

A variável densidade corresponde ao número total de atributos que são demandados


por anúncio em relação ao total de anúncios de cada agregado. Com isso
conseguimos demonstrar a sobreposição de solicitações de demandas de atributos
por anúncio e para o conjunto.

A fórmula utilizada para o calculo da densidade (D) é a seguinte:

D= d1
d2
Onde:
d1 = número de atributos de mérito (ou não mérito) exigidos por anúncio
e
d2 = total de anúncios com exigência de atributos de mérito (ou de não mérito).

Para o conjunto de casos que demandam mérito estreito, a densidade máxima de


atributos corresponde a 8, uma vez que são 8 os atributos totais considerados no
conjunto. No entanto, o que se obteve com os dados foi uma demanda variando de 1
até 4 atributos, distribuídos da seguinte forma:

Tabela 35 - Densidade dos anúncios que exigem Mérito Estreito – total e por quantidade
de atributos demandados - 2005 por suporte e totais 1990 e 2005

Suportes e Densidade das solicitações por MÉRITO ESTREITO


Totais Total de anúncios Um atributo Dois atributos Três atributos Quatro atributos
70 50 11 8 1
Site 1
(100%) (71,43%) (15,71%) (11,43%) (2,00%)
78 66 9 3
Site 2 0
(100%) (84,62%) (11,54%) (3,85%)
78 61 11 4 2
Jornal
(100%) (78,21%) (14,10%) (5,13%) (3,28%)
Total 2005 226 177 31 15 3
(N=300) (100%) (78,32%) (13,72%) (6,64%) (1,69%)
Total 1990 69 56 9 4
0
(N=100) (100%) (81,16%) (13,04%) (5,80%)

Ou seja, em relação ao mérito estreito, não há no decorrer dos anos uma variação
significativa da densidade de atributos solicitados: em 1990, 81% dos anúncios desse
27 1

conjunto concentravam as demandas em apenas um atributo, e em 2005 a situação se


mantém, sendo apenas ligeiramente inferior. O gráfico 20 permite uma melhor
visualização desse fato.

Gráfico 20
'Densidade' das solicitações por atributos de MÉRITO ESTREITO
- quantidade de atributos demandados: 1990 e 2005 (%) -

90,00%

81,16%
80,00%
78,32%
70,00%

60,00%

50,00%

40,00%

30,00%

20,00%

13,72%
10,00% 13,04% 6,64%
1,33%
5,80% 0,00%
0,00%

1 atributo 2 atributos 3 atributos 4 atributos

Total 2005 (N=226) Total 1990 (N=69)

Já quando consideramos o mérito estendido, há uma transformação mais expressiva


na densidade. Nesta categoria, a densidade máxima corresponde a 11 atributos
distintos que poderiam ser solicitados nos anúncios. Nos dados obteve-se uma
variação de 1 até 8 atributos, distribuídos da seguinte maneira:

Tabela 36 - Densidade dos anúncios que exigem Mérito Estendido – total e por
quantidade de atributos demandados - 2005 por suporte e totais 1990 e 2005

Densidade das solicitações por MÉRITO ESTENDIDO


Suportes e
Totais Total de Um Dois Três Quatro Cinco Oito
anúncios atributo atributos atributos atributos atributos atributos
69 32 19 11 3 2 2
Site 1
(100%) (46,38%) (27,54%) (15,94%) (4,23%) (2,29%) (2,90%)
86 36 25 19 3 3
Site 2 0
(100%) (41,86%) (29,07%) (22,09%) (3,49%) (3,49%)
74 29 30 10 4 1
Jornal (100%) (39,19%) (40,54%) (13,51%) (5,41%) (1,35%)
0

Total 2005 229 97 74 40 10 6 2


(N=300) (100%) (42,36%) (32,31%) (17,47%) (4,37%) (2,62%) (0,87%)
Total 1990 54 35 14 4 1
0 0
(N=100) (100%) (64,81%) (25,93%) (7,41%) (1,85%)
27 2

Neste agrupamento, o montante de anúncios que demandam apenas um atributo


apresenta uma redução significativa (caindo de 64,81% em 1990 para 42,36% em
2005), ao mesmo tempo em que cresce a participação de anúncios que demandam
dois ou mais atributos, tornando a curva do gráfico mais suave (Gráfico 21).

Gráfico 21
'Densidade das solicitações por atributos de MÉRITO ESTENDIDO
- quantidade de atributos demandados: 1990 e 2005 (%) -
70,00%

64,81%

60,00%

50,00%

42,36%
40,00%

32,31%
30,00%

25,93%

20,00%
17,47%

10,00%
7,41%
4,37%
2,62%
1,85% 0,87%
0,00% 0,00% 0,00%
Um atributo Dois atributos Três atributos Quatro atributos Cinco atributos Oito atributos

Total 2005 (N=229) Total 1990 (N=54)

Finalmente, quando consideramos o mérito em geral (estreito + estendido), temos


que a densidade máxima que poderia ser obtida (somatório de demandas relativas ao
mérito estreito e ao mérito estendido) é de 19 atributos distintos. Nossas amostras
apresentaram uma variação de 1 até 10, assim distribuídos:

Tabela 37 - Densidade dos anúncios que exigem Mérito Geral – total e por quantidade de
atributos demandados - 2005 por suporte e totais 1990 e 2005

Densidade das solicitações por MÉRITO ESTREITO E MÉRITO ESTENDIDO


Suportes e
Totais Total de Um Dois Três Quatro Cinco Seis Sete Oito Dez
anúncios atributo atributos atributos atributos atributos atributos atributos atributos atributos

85 24 22 17 9 4 4 2 1 2
Site 1 (100%) (28,24%) (25,88%) (20,00%) (10,59%) (4,71%) (4,71%) (2,35%) (1,18%) (2,35%)
94 13 36 20 16 5 3 1
Site 2 (100%) (13,83%) (38,30%) (21,28%) (17,02%) (5,32%)
0
(3,19%) (1,06%)
0

93 25 25 24 9 4 2 4
Jornal (100%) (26,88%) (26,88%) (25,81%) (9,68%) (4,30%) (2,15%) (4,30%)
0 0

Total 2005 272 62 83 61 34 13 6 9 2 2


(N=300) (100%) (22,79%) (30,51%) (22,43%) (12,50%) (4,78%) (2,21%) (3,31%) (0,74%) (0,74%)

Total 1990 78 25 33 11 4 5
0 0 0 0
(N=100) (100%) (32,05%) (42,31%) (14,10%) (5,13%) (6,41%)
27 3

Aqui, de forma muito semelhante à registrada para o conjunto de mérito estendido, em


1990 os anúncios que exigiam mérito em geral o faziam com base em poucos
atributos, e a demanda por apenas um ou dois atributos concentrava 84% do conjunto.
Já em 2005 este montante cai para 53%, ao mesmo tempo em que se ampliam as
demandas por três atributos ou mais. (Gráfico 22)

Gráfico 22
'Densidade das solictações por atributos de MÉRITO TOTAL (Estreito e Estendido) -
quantidade de atributos demandados: 1990 e 2005 (%) -

45,00%

42,31%
40,00%

35,00%

32,05%
30,00%
30,51%

25,00%

22,79% 22,43%

20,00%

15,00%
14,10%
12,50%

10,00%

6,41%
5,00%
5,13%
4,78% 3,31%
2,21%
0,74% 0,74%
0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00%
um atributo do is atributo s tres atributo s quatro atributo s cinco atributos seis atributo s sete atributo s o ito atributo s dez atributo s

Total 2005 (N=272) Total 1990 (N=78)

Situação oposta é obtida no agrupamento que forma as demandas de Não Mérito.


Neste conjunto, a densidade máxima que poderia ser obtida é de 17, mas os nossos
dados apresentaram um patamar máximo de apenas seis atributos (variação de 1 a 6
atributos). Ou seja, os anúncios que exigem ‘não mérito’ o fazem com base em menos
qualificadores, comparativamente à quantidade de atributos que lançam mão para se
referenciarem ao mérito (especialmente em sua forma estendida, como já exposto).
27 4

Tabela 38 - Densidade dos anúncios que exigem Não Mérito – total e por quantidade de
atributos demandados - 2005 por suporte e totais 1990 e 2005

Densidade das solicitações por NÃO MÉRITO


Suportes e
Totais Total de Um Dois Três Quatro Cinco Seis
anúncios atributo atributos atributos atributos atributos atributos
50 27 14 4 3 1 1
Site 1
(100%) (54%) (28,00%) (8,00%) (6,00%) (2,00%) (2,00%)
40 24 10 3 3 0 0
Site 2
(100%) (60%) (25,00%) (7,50%) (7,50%)
47 25 13 9 0 0 0
Jornal
(100%) (53%) (27,66%) (19,15%)
Total 2005 137 76 37 16 6 1 1
(N=300) (100%) (55,47%) (27,01%) (11,68%) (4,38%) (0,73%) (0,73%)
Total 1990 44 16 16 10 2 0 0
(N=100) (100%) (36,36%) (36,36%) (22,73%) (4,55%)

Além disso, em 1990, 72% dos anúncios que solicitavam elementos de ‘não mérito’
concentravam suas exigências entre poucos atributos (1 ou 2). Já em 2005 este
montante eleva-se para 82%, indicando uma tendência de concentração e redução no
foco. Lembramos que um dos fatores desse agrupamento que mais tem apresentado
crescimento refere-se à ‘mobilidade’, como já indicado.

Gráfico 23
'Densidade' das solicitações por atributos de NÃO MÉRITO
- quantidade de atributos demandados: 1990 e 2005 (%) -
60,00%

55,47%

50,00%

40,00%
36,36% 36,36%

30,00%
27,01%
22,73%
20,00%

10,00%
11,68%
4,55%
4,38% 0,73% 0,73%
0,00% 0,00% 0,00%
um atributo dois atributos tres atributos quatro atributos cinco atributos seis atributos

Total 2005 (N=137) Total 1990 (N=44)

Em síntese, os empregadores têm lançado mão da combinação de um número maior


de qualificadores, que se adequam ao que os pesquisadores classificam como sendo
‘meritocráticos’, quando expressam suas exigências em relação ao perfil dos
27 5

candidatos buscados. Ao mesmo tempo concentram, em apenas um ou dois


qualificadores, as características que são associadas ao ‘não mérito’.

O gráfico 24 fornece uma visão de conjunto da variação destas densidades para o


total de casos, incluindo aqueles que não demandam nenhum atributo, segundo cada
conjunto (não mérito e mérito geral).

Gráfico 24
Quantidade de atributos demandados por categoria – MÉRITO GERAL e NÃO MÉRITO
(1990 e 2005)

60,00%

Não Mérito 56,00% Mérito Geral (estreito e estendido)


54,33%

50,00%

40,00%

33,00%

30,00%

25,00% 27,67%
25,33%
22,00%

20,00%
20,67% 20,33%
16,00% 16,00%

11,00%
10,00% 12,33%
11,33%
10,00%
9,33%

4,00% 5,00%
5,33%
0,33% 2,00% 4,33%
3,00% 0,67%
2,00%
2,00% 0,67%
0,00% 0,33%
seis cinco quatro tres do is um nenhum nenhum um do is tres quatro cinco seis sete oito dez
atributos atributo s atributo s atributo s atributo s atributo atributo atributo atributo atributo s atributos atributo s atributo s atributo s atributo s atributo s atributo s

ano 2005 (N=300) ano 1990 (N=100)

Variável Grau de Exigência

A variável densidade é útil porque permite mostrar o quanto os anúncios estão


sobrepondo das diversas exigências em relação ao perfil dos candidatos buscados. No
entanto, ela nada informa sobre o quanto as demandas estão se tornando mais
‘elevadas’, ou o quanto os anúncios estão se tornando mais ‘seletivos’ ainda que
27 6

focando atributos que são essencialmente tidos como meritocráticos (e portanto mais
‘democráticos’).

Para ter uma primeira aproximação desta questão, criamos a variável ‘grau de
exigência’ (G).

Para o seu cálculo, em primeiro lugar foi preciso isolar aqueles atributos que
permitiriam estabelecer pesos objetivos e diferenciados em relação ao valor que
poderiam assumir.

No nosso esquema, dois atributos ou capacidades se prestam a tanto: (1) formação


acadêmica; e (2) domínio de idiomas.

Em relação ao primeiro (formação acadêmica), é lógico afirmar, por exemplo, que a


obtenção de um diploma de pós-graduação implica em um grau de esforço e de
investimento mais elevado do que a obtenção de um diploma de nível médio, ou de
nível superior. Portanto definimos os seguintes pesos:

Peso 1 – demandas por diplomas até nível superior incompleto


Peso 2 – demandas por diplomas de nível superior completo e pós-graduação
incompleta
Peso 3 – demandas por diplomas de pós-graduação

Já para o segundo atributo (domínio de idiomas), os pesos estabelecidos foram os


seguintes:

Peso 1 – demandas por um idioma


Peso 2 – demandas por dois idiomas
Peso 3 – demandas por 3 idiomas

Para os demais atributos não foi possível estabelecer uma escala que permitisse a
mensuração de diferenças de complexidade ou de esforço. Por exemplo, tomando a
variável ‘conhecimentos técnicos transversais’, não temos como afirmar que
‘conhecimento de normas de qualidade, ISO e QS’ sejam inferiores ou superiores,
mais fáceis ou mais difíceis de obter do que ‘conhecimentos de E.R.P. (SAP,
27 7

Microsiga)’, e que portanto teriam pesos diferentes. O mesmo ocorre em relação a


competências: é impossível afirmar que ‘liderança’ é superior ou inferior a ‘visão
estratégica’ - o máximo que poderíamos dizer sobre estes atributos é se eles são ou
não demandados, o que já foi calculado na variável densidade.

Por isso nos restringimos aos dois atributos enunciados. Vale ressaltar que nos
tópicos anteriores já demonstramos o quanto os anúncios mais recentes estão mais
exigentes quando tomamos cada um deles isoladamente: aumentou o volume de
solicitações por pós-graduação e também por domínio de dois ou mais idiomas.

A variável ‘grau de exigência’ nos permite demonstrar a combinação destas


exigências.

A sua formula de calculo é bastante simples, e se apresenta da seguinte forma:

G = g1 + g2

Onde:
g1 = peso do atributo ‘formação escolar’ no anúncio e
g2 = peso do atributo ‘idioma’ no anúncio
sendo os pesos definidos segundo relação explicitada.

Portanto, o valor máximo que a variável G poderia atingir seria 6 (o que equivale ao
somatório de peso 3 em formação escolar e peso 3 em domínio de idioma).

Os resultados obtidos foram os seguintes:

• Ao longo dos anos reduz-se bastante a quantidade de anúncios que não


apresentam nenhuma exigência em relação a escolaridade ou a domínio de
idiomas (grau de exigência 0);
• Permanece estável o montante dos que apresentam grau de exigência 1
(ensino superior incompleto ou domínio de um idioma);
• Reduz-se o montante dos que apresentam grau de exigência 2;
• Amplia-se de forma expressiva o volume dos que demandam grau de exigência
3 ou mais (passando de 18% em 1990 para 42% em 2005).
27 8

Em suma, se é verdadeiro que os anúncios estão exigindo mais atributos do tipo


meritocráticos do que o faziam em 1990, também é verdade que se tornaram
muito mais exigentes em relação ao grau ou nível de incidência destes atributos.
Não apenas se exige mais escolaridade, mas esta exigência se dá em níveis mais
elevados e associada à proficiência em um ou mais idiomas.

Gráfico 25
'Grau de Exigência' dos anuncios (escolaridade e idiomas)
(1990 e 2005)

40,00%

36,00%
35,00% 35,00%

30,00%
29,00%

25,00% 25,00%

20,00%

17,00%
16,00%
15,00% 15,00%
11,33%
10,00% 11,00%

5,00%

2,00% 2,67%
0,00% 0,00%
nenhum um dois tres quatro cinco

Total 2005 (N=300) Total 1990 (N=100)

Analise fatorial

Construímos uma série de variáveis (atributos) a partir dos perfis dos candidatos
apresentados nos anúncios, as quais, presumivelmente, têm impacto sobre as
chances dos indivíduos obterem sucesso na conquista das vagas. Essas variáveis
foram divididas conforme sua maior ou menor associação com o conceito de mérito,
formando conjuntos diferenciados que possibilitaram as análises até então elaboradas.
No entanto, não é totalmente evidente como esses atributos se associam mutuamente.

Um instrumento clássico para a análise de grandes conjuntos de variáveis é a análise


fatorial, que agrupa aqueles indicadores que mais se correlacionam entre si em um
número menor de fatores, possibilitando investigar a dependência de um conjunto de
variáveis manifestas em relação a um número menor de variáveis latentes.
27 9

Em outras palavras, a análise fatorial é um método que é utilizado para: (a) determinar
o número de fatores existentes em um conjunto de dados; (b) determinar quais
variáveis pertencem a quais fatores e em que extensão essas variáveis estão
saturados com o que quer que seja o fator.

Aplicamos a análise fatorial pelo método dos componentes principais com rotação
‘Varimax’169 para um conjunto de 12 variáveis as quais chamamos de variáveis ‘mães’,
a partir das quais todas as demais se desdobram170. Cada variável foi tratada como
dicotomia, em que ‘1’ caracteriza a sua presença, e ‘0’ a sua ausência. Este
procedimento foi realizado primeiro nos dados relativos ao ano de 1990 e depois ao
ano de 2005171.

Para cada ano considerado foi possível extrair 5 fatores. Tais constructos foram
posteriormente nomeados tendo em vista representar, da melhor forma possível, a
característica específica das variáveis que os compõem.

169
A rotação Varimax é um método de rotação ortogonal que minimiza o numero de variáveis que cada
agrupamento terá e simplifica a interpretação dos fatores. É o método mais comumente utilizado.
170
As variáveis mães são elas mesmas constructos, e agregam 44 variáveis distintas. Em um primeiro
momento procurou-se aplicar a análise fatorial para o conjunto completo (44 variáveis), mas os resultados
não foram satisfatórios, gerando, para o ano de 1990 16 fatores e, para o ano de 2005, 18 fatores, um
contingente alto e fracamente correlacionado. Portanto optamos pela aplicação da análise apenas nas
variáveis mães, que são constituídas da seguinte forma: variável mãe (I) ‘experiência’ de desdobra em:
(1) experiência incorporada; (2) experiência de duração precisa; (3) experiência de domínio preciso em
tipo de empresa ou setor; (4) experiência de domínio preciso na função ofertada; (5) experiência de
domínio preciso em função anterior ou em seu ambiente de aquisição; (6) experiência de domínio preciso
em tipo na aplicação de conhecimentos. A variável (II) ‘qualificações acadêmicas’ se desdobra em: (1)
qualificações acadêmicas do tipo 1; (2) qualificações acadêmicas do tipo 2; (3) qualificações acadêmicas
do tipo 3. A variável (III) ‘conhecimentos técnicos’, se desdobra em: (1) conhecimentos técnicos de
ferramentas transversais; (2) conhecimentos técnicos de domínio do objeto. A variável (IV) ‘idiomas’ se
desdobra em: (1) domínio de 1 idioma; (2) domínio de 2 ou mais idiomas. A variável (V) ‘certificados e
outras qualificações’ se desdobra em: (1) certificações específicas; (2) registros em órgãos de classe;
(3) outras qualificações; (4) qualificações incorporadas. A variável (VI) ‘informática’ é a única que não se
desdobra em nenhuma outra. A variável (VII) ‘capacidades de comunicação e relacionais’ se desdobra
em: (1) capacidades de comunicação; (2) capacidades relacionais; (3) liderança; (4) redes de
relacionamento. A variável (VIII) ‘capacidades empresariais e de gestão’ se desdobra em: (1)
empreendedorismo; (2) negociação; (3) gestão gerais; (4) estratégia/visão estratégica; (5) foco em
resultados; (6) gestão de pessoas e equipes. A variável (IX) ‘capacidades associadas ao
desenvolvimento e implicação com o trabalho’ se desdobra em: (1) trabalho em equipe; (2) iniciativa,
autonomia e flexibilidade; (3) comprometimento e envolvimento. A variável (X) ‘capacidades de
mobilidade e disponibilidade de horário’ se desdobra em: (1) disponibilidade de horário; (2)
disponibilidade para mudança de residência; (3) disponibilidade para viagens. A variável (XI)
‘capacidades ou competências comportamentais e sociais’ se desdobra em: (1) subjetividade; (2)
personalidade; (3) aspectos físicos; (4) aspectos sociais; (5) referencias morais e empatia; (6) outras. A
variável (XII) ‘características gerais’, se desdobra em: (1) sexo; (2) idade; (3) apresentação física; (4)
local de residência; (5) posse de bens.
171
Os resultados do teste estatístico de Kaiser-Meyer-Olkin (KMO), que indica a conveniência do modelo
fatorial (quando mais próximo de 1 maior é adequação, e abaixo de 0,5 é inaceitável), foi de 0,54 para o
ano de 1990 e de 0,66 para o ano de 2005, indicando a aceitabilidade da aplicação da análise fatorial nos
dados, embora o grau de ajuste para o ano de 1990 seja inferior ao verificado no ano de 2005.
28 0

Tomando em primeiro lugar o ano de 1990, observa-se que os fatores identificados


explicam 64,1% da variância total, conforme tabela a seguir.

Tabela 39 - Analise fatorial dos indicadores de perfil dos gerentes e executivos


– ano 1990 (rotação Varimax)

Fatores
1 2 3 4 5
1 - O Gerente em ação (16,8%) (*)
Capacidades de
,834 -,012 ,074 ,042 ,023
comunicação e relacional
Capacidades de
desenvolvimento e ,661 -,065 ,340 -,039 -,289
implicação com o trabalho
Capacidades
,650 ,144 -,285 -,019 ,256
empresariais e gestão
2 – Aprendizagens formais / ativos tangíveis (13,4%)
Domínio de Idiomas -,198 ,780 ,015 -,202 ,032
Qualificação Acadêmica ,285 ,759 -,071 ,127 -,124
3 – Heranças sociais e adscrição (13,3%)
Experiência ,004 ,113 -,715 ,079 ,166
Características adscritas
,015 ,320 ,629 ,055 ,364
e posse de bens
Capacidades pessoais,
comportamentais e ,507 -,064 ,591 ,101 ,112
sociais
4 – Skills e Capacidades instrumentais (11,3%)
Conhecimentos
,202 ,111 -,077 ,749 -,005
Técnicos
Capacidades de
mobilidade e ,158 ,283 -,022 -,701 -,117
disponibilidade de horário
Conhecimentos de
-,125 ,418 ,363 ,473 -,226
Informática
5 – Certificações (9,3%)
Certificados e outros ,039 -,112 ,003 ,033 ,845
(*) Percentagem da variância total explicada pelo fator. Os cinco fatores em conjunto explicam 64,1% da
variância total
Extraction Method: Principal Component Analysis.
Rotation Method: Varimax with Kaiser Normalization.

A interpretação desses dados deve ser feita considerando que os fatores são, por
definição, não correlacionados, e tendem a capturar o máximo de variância de cada
variável em cada fator. Os fatores são extraídos na ordem do mais explicativo para o
menos explicativo, portanto o fator 1 é mais explicativo do que o fator 5.
28 1

Como indicado na tabela, as variáveis ‘experiência’ e ‘capacidades de mobilidade e


disponibilidade de horário’, apesar de serem estatisticamente relevantes,
apresentaram coeficientes negativos, o que indica que sua influência é negativa em
relação aos respectivos fatores.

Esta ‘matriz de fatores’ pode ser interpretada da seguinte forma:

• O primeiro fator está relacionado com os indicadores mais diretos das


capacidades ou competências que o indivíduo deverá acionar quanto estiver
‘em ação’. São capacidades não acumuláveis, que serão continuamente
avaliadas conforme o contexto específico da atuação do indivíduo. Engloba as
variáveis que fazem parte dos constructos (ou classes) anteriores associados
às capacidades de comunicação e interação, acrescidas pelo
comprometimento com o trabalho e o seu bom desenvolvimento bem como
pelas capacidades empresariais e de gestão específicas. Contempla portanto
atributos de mérito estendido e de não mérito.

• O segundo fator abrange as variáveis ligadas às qualificações acadêmicas e ao


domínio de idiomas. São as aprendizagens formais e, pela sua essência,
também podem corresponder aos ‘ativos tangíveis’ dos indivíduos e que são
passíveis de comprovação anteriormente à ação. É o fator mais claramente
associado ao mérito estreito, mas com incidência do mérito estendido.

• Já o terceiro agrupa as variáveis mais evidentemente não meritocráticas,


relativas à adscrição e posse de bens e também as capacidades pessoais,
comportamentais e sociais (personalidade, subjetividade, atributos físicos,
entre outros). Nesse fator a variável experiência entra com sinal negativo,
reforçando o posicionamento não meritocrático.

• O quarto fator relaciona positivamente os conhecimentos específicos e o


domínio de informática no nível geral e, negativamente, a mobilidade, o que
nos autoriza a denominá-lo como skills e capacidades instrumentais. É
totalmente associado ao mérito estendido.
28 2

• Finalmente o quinto fator é composto pelo agregado das variáveis que compõe
os ‘certificados e outras qualificações’ de forma isolada, ou seja, sem estar em
forte interação com nenhum outro agrupamento de variáveis.

Para o ano de 2005, a aplicação da análise fatorial também resultou em 5 fatores que,
em conjunto, explicam 60,4% da variância total, conforme tabela a seguir.

Tabela 40 - Analise fatorial dos indicadores de perfil dos gerentes e executivos


– ano 2005 (rotação Varimax)

Fatores
1 2 3 4 5
1 – O Gerente em Ação (20,5%)(*)
Capacidades de
comunicação e ,744 ,140 -,003 -,049 -,161
relacional
Capacidades
,709 -,068 ,096 -,079 ,195
empresariais e gestão
Capacidades de
desenvolvimento e
,840 -,028 -,011 ,123 -,022
implicação com o
trabalho
Capacidades pessoais,
comportamentais e ,821 ,004 -,046 ,107 ,023
sociais
2 – Ativos Tangíveis (Comprováveis) (10,8%)
Experiência -,033 ,739 -,067 -,022 -,006
Qualificação Acadêmica ,055 ,749 ,131 ,099 ,002
3 – ‘Skills’ e Capacidades Instrumentais (10,2%)
Certificados e outros ,009 -,087 ,621 -,177 ,104
Conhecimentos
-,044 -,024 ,656 ,094 -,286
Técnicos
Conhecimentos de
,065 ,275 ,615 ,178 ,098
Informática
4 – Nomadismo (9,9%)
Domínio de Idiomas ,127 ,167 ,020 ,628 -,321
Capacidades de
mobilidade e
-,026 -,043 ,017 ,827 ,195
disponibilidade de
horário
5 – Adscrição e bens (9,3%)
Características adscritas
,030 ,020 -,014 ,011 ,901
e posse de bens
(*) Percentagem da variância total explicada pelo fator. Os cinco fatores em conjunto explicam
60,4% da variância total
Extraction Method: Principal Component Analysis.
Rotation Method: Varimax with Kaiser Normalization.
28 3

A comparação entre os dois anos considerados revela mudanças no que diz respeito
a: (a) ordem e saturação dos fatores; (b) característica das variáveis que estão
agrupadas em cada fator; (c) inversão do sinal das variáveis ‘experiência’ e
‘capacidades de mobilidade e disponibilidade de horário’; e (d) emergência de novos
fatores ‘latentes’, reunindo variáveis que não estavam agrupadas em 1990.

Os resultados obtidos com a última tabela, interpretada à luz da relação com a tabela
anterior (Tabela 39), podem ser descritos da seguinte forma:

• O fator que denominamos por ‘O gerente em ação’ permanece sendo o


primeiro apresentado, porém, não apenas ele se torna mais explicativo (20,5%
da variância em 2005 contra 16,8% em 1990) como também, além das
variáveis que agrupava, agora reúne as capacidades pessoais,
comportamentais e sociais. Ou seja, os atributos relativos à mobilização da
subjetividade, individualidade e personalidade passam a estar igualmente
relacionados com as capacidades e competências mais afeitas ao trabalho, ao
exercício da atividade e à capacidade de comunicação e relacionamento.
Neste fator são os elementos que compõem as categorias do mérito estendido
e algumas do não mérito que ganham destaque.

• O segundo fator, que designamos por ‘ativos tangíveis’, diferentemente do que


ocorria em 1990, agora passa a associar a formação acadêmica com a
experiência, sendo que essa assume sinal positivo. Devido a isso este fator
ganha uma nova conotação e peso, e é o que mais diretamente remete ao
mérito estreito.

• O terceiro fator expressa as ‘skills e capacidades instrumentais’ e relaciona os


certificados e outras qualificações (que antes estavam isolados no último fator)
aos conhecimentos específicos – técnicos e de informática. Corresponde ao
peso de atributos diretamente imputados ao mérito na sua versão estendida.

• O quarto fator emerge como uma novidade: indica a associação entre domínio
de idiomas e capacidades de mobilidade, que agora passa a ter sinal positivo.
28 4

Pela sua essência, esta é uma configuração que nos remete mais diretamente
ao ‘nomadismo’, singularidade que não se evidenciava no ano de 1990.

• O quinto e último fator deixa isoladas e em posição inferior as características


adscritas e posse de bens, totalmente associadas à categoria de não mérito.

Portanto, da ordem de apresentação dos fatores e das variáveis que estão em maior

associação podemos depreender que o maior peso é conferido à capacidade do

indivíduo em agir situacionalmente, não importando se as capacidades que mobiliza

sejam obtidas via esforço (especialmente aquelas que compõem o mérito em sua

versão estendida, tais como algumas capacidades empresariais e de gestão e de

envolvimento e implicação com o trabalho) ou que lhe sejam ‘atribuídas’, ‘herdadas’ ou

‘obtidas’ via ambiente social ou familiar (tais como capacidades de comunicação,

liderança, redes de relacionamento e outros). Essa constatação, que já estava

evidente em 1990 torna-se mais forte em 2005.

Assim, embora com o passar do tempo os anúncios a princípio se mostrem mais

meritocráticos pela maior incidência de exigência em torno de variáveis desta natureza

(como já observado em tópicos anteriores), nem por isso os atributos não

meritocráticos perdem seu peso, à exceção das variáveis que compõe a categoria

‘características adscritas e posse de bens’ (até porque a legislação atua mais

fortemente na limitação de sua explicitação). As variáveis que mais classicamente

indicam o volume de investimentos e de esforço dos sujeitos na construção de sua

trajetória profissional, tais como o acúmulo da experiência e as titulações acadêmicas,

também são relevantes, mas se manifestam após a avaliação da capacidade de ação.

O mesmo vale para as capacidades instrumentais e demais ‘skills’.


28 5

Por fim, cabe analisar o papel dos atores que se situam entre as vagas e os
candidatos na configuração destes contextos. Diversos estudos (Gautié et alli: 2005;
Bessy: 1997; Bessy e Larquier: 2002; Bureau e Marchal: 2005) atribuem à elevação e
maior seletividade que estaria ocorrendo no mercado de trabalho à ação mais
intensiva dos ‘intermediários’. Apresentar alguns indícios da possibilidade de
confirmação ou refutação desta hipótese é o propósito do próximo tópico.

5.5. Considerações adicionais – a ação dos ‘intermediários’

Parece-nos que a transformação do perfil dos candidatos requisitados, conforme visto


até aqui, está longe de ser simplesmente reflexo da introdução de inovações técnicas
e das novas formas de organização do trabalho que estariam puxando ‘para cima’ as
demandas, tal como pretendem os crédulos do determinismo tecnológico. Esta
elevação de perfil, apesar de ser apresentada aos atores sociais como decorrente da
‘globalização’, do acirramento da ‘concorrência’, da busca de ‘competitividade’, entre
outros, encobre relações de força que atuam no sentido de manter os nichos mais
atraentes do mercado de trabalho protegidos da invasão de sujeitos ordinários.

Dessa forma, ainda que mais meritocráticos em sua redação, os textos dos anúncios
de emprego, elaborados para colocar em relação preliminar as vagas e os candidatos,
também permitem demonstrar a permanência e/ou a invenção de atributos os quais,
mesmo que assumidos como integrantes do conceito de ‘mérito’ (em suas versões
estreita ou expandida), contribuem para manter os postos de trabalho ‘fechados’ a
todos os demais atores que, portadores de credenciais demandadas, não as possuem
no nível ou grau exigido. E esses estão sendo deslocados sempre a jusante: ou seja,
as chances nas disputas vêem-se reduzidas para aqueles que mesmo portadores de
experiência prévia, não lograram adquiri-la em um determinado tipo de empresa ou
setor ou durante um determinado período de tempo mínimo; para aqueles que
portadores de diplomas escolares, não atingiram um determinado patamar agora tido
como ‘mínimo’; ou para os que, embora bilíngües, não são ainda trilíngües (e assim
sucessivamente).

Há que se considerar aqui a influência, na formatação destas exigências, de um


conjunto de agentes que se situam entre as vagas/empregadores e os candidatos aos
cargos de gerência, o qual denominamos por ‘intermediários’. Este aglomerado é
28 6

formado por empresas que se ocupam das atividades de recrutamento e seleção e


que podem ser focadas exclusivamente no segmento de gerentes e executivos
(incluindo a sua variação mais especializada, substanciada na figura dos ‘head-
hunters’172), ou atuarem nos diversos níveis ocupacionais (alta e média gerencia,
estratos técnicos, pessoal de apoio, etc.). Também podem ser especializados em um
determinado setor da economia ou atenderem a vários setores ou áreas (financeira,
marketing, etc.) de forma mais transversal.

Conjunto difuso e de contornos pouco claros, que agrega desde grandes empresas
internacionais, passando por grandes e pequenas empresas nacionais (podendo até
mesmo chegar a consultores individuais173), age no sentido de estabelecer um modo
específico de organização das transações174 que ocorrem entre empresas que
possuem um determinado posto de trabalho ‘em aberto’ (recém criados ou que
precisam ser realocados) e o seu preenchimento, de modo a que o resultado lhes seja
favorável.

Dessa forma, sua atuação está longe de ser um vetor passivo de promoção da
adequação entre uma determinada oferta e uma demanda anteriormente constituídas.
Ao contrário, neste mercado específico, eles jogam um papel ativo na definição
mesma das trocas e na sua expressão, traduzindo-as em uma determinada natureza
de oferta, uma demanda específica e um preço. (GAUTIÉ et alli: 2005; p. 385). Ao
fazê-lo, acabam por contribuir para a construção de segmentações e de modos de
avaliação das competências onde algumas categorias ou grupos de trabalhadores
tornam-se mais valorizados ao passo em que outros podem vir a cair marginalizados
(BESSY: 1997, p. 103).

Bessy (1997) e Bessy e Larquier (2002) concebem uma divisão teórica dos
intermediários tendo como referência o grau de profundidade com que se colocam em
relação à pesquisa ou busca pelos candidatos: se esta é uma busca aprofundada,
172
Os ‘head-hunters’ ou ‘caçadores de cérebros’ se caracterizam principalmente por empreender uma
abordagem direta dos candidatos, enquanto as demais empresas de recrutamento e seleção podem
lançar mão com maior freqüência dos dispositivos de mídia tradicionais (anúncios em imprensa e Internet)
para atrair os potenciais candidatos.
173
Excluímos os serviços públicos, tal como o SINE, deste agrupamento por não atuarem com este tipo
de profissionais. Portanto estamos nos referindo aqui apenas aos atores privados e lucrativos que
intervêm no mercado de trabalho.
174
Transações que envolvem diversas etapas do processo, tais como: definição do perfil do cargo;
definição do perfil do candidato; realização das atividades de pré-seleção; realização dos testes
envolvidos nas etapas de seleção; apresentação dos candidatos potenciais às empresas; etc. Podendo
chegar até à etapa final da contratação.
28 7

‘intensiva’, o recurso prioritário a ser utilizado será a abordagem direta, e a qualidade


do recrutamento dependerá da intensidade do trabalho de prospecção do mercado.

Por oposição a esta, a outra modalidade consiste em um trabalho de prospecção do


mercado do tipo ‘extensivo’, e se caracteriza pelo maior recurso aos anúncios como
dispositivo voltado à suscitação das candidaturas; como decorrência, as operações de
avaliação aprofundada dos indivíduos, de suas trajetórias e singularidades, são menos
ativadas. A definição dos perfis dos candidatos toma apoio essencialmente nas
classificações que são apresentadas pelas próprias empresas, e não no conhecimento
mais aprofundado do mercado pré-existente ou que deverá ser construído pelo
intermediário, tal como ocorre na busca intensiva.

Acresce ainda que, na busca extensiva o papel dos intermediários se concentra muito
mais na promoção da associação entre uma descrição de vaga e um ou vários
candidatos que se adeqüem a ela (‘matchmaking’). Já na busca intensiva, o seu papel
como avaliador efetivo das competências (incluindo atributos de personalidade e
outros) e trajetórias é mais ressaltado (‘evaluation’). Estas diferenciações também
determinam, portanto, o seu grau de intervenção na empresa, o tipo de canais de
busca que serão acionados, a relevância e profundidade do conhecimento sobre o
mercado de trabalho e sobre os profissionais que nele circulam e, naturalmente, incide
sobre o preço a ser cobrado pelos serviços.

A pré-seleção ou a seleção operada a distância que caracteriza o recurso aos


anúncios é, desta forma, um dispositivo muito mais presente no modo de busca do tipo
extensivo, o qual por sua vez toma apoio em padrões de informação que permitam o
estabelecimento de associações entre vagas e candidatos mais padronizadas175.

A partir de nossas amostras realizamos um exercício bastante preliminar destinado a


verificar se realmente a ação dos intermediários, que se impõe nos conteúdos e
formatos dos anúncios, contribui para elevar o perfil das vagas voltadas a gerentes e
executivos, tornando-o mais complexo e/ou seletivo.

175
Bureau e Marchal (2005) mostram que o recurso a este tipo de atores e a esta natureza de busca mais
‘padronizada’ introduz um descolamento dos critérios de seleção que são acionados em relação aos
contextos profissionais específicos. A pré-seleção, operada a distância e baseada em critérios muito
genéricos, reforça o risco de exclusão de profissionais que possuem trajetórias muito singulares, difíceis
de serem captadas segundo tais variáveis gerais.
28 8

Para tanto, isolamos os anúncios que são originados de agências de recrutamento e


seleção dos que são ‘publicados’ pelas próprias empresas recrutantes, tendo o ano de
2005 como base176. Foi possível estabelecer esta diferenciação nas amostras de
anúncios de Jornais e no Site 2177, o que totalizou um conjunto de 200 anúncios,
sendo 39% destes relativos a empresas de recrutamento e seleção e 61% relativos às
próprias empresas. Sua distribuição foi a seguinte:

Tabela 41 - Distribuição da amostra de anúncios segundo o tipo de recrutador – por


suporte e total - 2005

Total de anúncios
Total de anúncios de
das próprias
Suportes empresas de Total de anúncios
empresas
recrutamento e seleção
recrutantes
Site 2 61 (78,21%) 39 (31,97%) 100
Jornais 17 (21,79%) 83 (68,03%) 100
Total 78 (100%) 122 (100%) 200
Nota: Todas as empresas de recrutamento e seleção identificadas na amostra são pertencentes a grupos privados. São elas: (1) no
Site 2: Across gestão de carreiras; Alfa-cs; Consultoria de recursos humanos; CS4 Consultoria em RH; Di Ferretti; DM executivos;
Específica S/C; InterAtiva; MP Consultoria; Oficina de Talentos Consultoria em RH; Personale; Reggianni Hunting; Resch; RH3; Rhelp;
Soulan; StautRH; Upside; VGS; Viva Talentos Humanos; Web Negócios AS; (2) em Jornais: Msarh; Manager; InterAtiva; MercuriUrval;
Palomeque Associados; Case Consultores.

O tratamento dos dados mostrou que se tomarmos apenas o conjunto formado


pelas qualificações acadêmicas e outras qualificações, acrescido dos
conhecimentos (técnicos, informática e idiomas), não se percebe que a ação dos
intermediários na definição do perfil do candidato buscado se diferencia de
forma expressiva da ação realizada pelas próprias empresas. Apenas no que diz
respeito às solicitações por domínio de idiomas sobressai uma diferença
marcante: 63% dos anúncios assinados por intermediários exigem proficiência neste
quesito, contra 47% dos anúncios assinados pelas próprias empresas. Para os demais
atributos a variação é bem menos ressaltada, e no caso dos conhecimentos técnicos,
são as empresas que os solicitam em maior proporção. (Gráfico 26)

176
Nos anúncios difundidos pelas próprias empresas, é o empregador que assume a responsabilidade
pelo conjunto do processo de recrutamento. Já nos anúncios que são difundidos pelas agências de
recrutamento e seleção ocorre o inverso. No entanto, o grau de ‘liberdade’ em relação à gestão de cada
etapa (definição do perfil do cargo, elaboração do texto do anúncio, etc.) dependerá da natureza do
contrato estabelecido entre ambas as partes.
177
Para o Site 1 não foi possível isolar os anúncios que são originados das empresas de recrutamento e
seleção dos demais. Nos anúncios de jornal, não consideramos a ação das empresas de comunicação,
que ‘assinam’ 38 casos da amostra.
28 9

Gráfico 26
Demanda por formação acadêmica e outras qualificações segundo
anunciante responsável (%) - 2005

90,00%

78,21%
80,00%
74,59%

70,00%
62,82%
60,00%

50,00% 46,72%
40,16%
40,00% 37,18%

30,00%

19,23%18,85%
20,00%

7,69%
10,00%
4,10%

0,00%

formação acadêmica outras certificações e idiomas informática conhecimentos técnicos


qualificações

intermediários (N=78) proprias empresas (N=122)

No entanto, quando detalhamos o nível da formação acadêmica que é exigido,


percebemos que são os intermediários que o definem em patamar mais elevado:
34% dos anúncios que exigem formação acadêmica estabelecem a pós-graduação
(MBA e especializações) como patamar desejado, contra apenas 13% dos anúncios
produzidos pelas próprias empresas. (Gráfico 27)

Gráfico 27
Demanda por nível de formação acadêmica segundo
anunciante responsável (% ) - 2005

80,00%
73,63%

70,00%
62,30%
60,00%

50,00%

40,00%
34,43%

30,00%

20,00%
13,19% 13,19%

10,00%
3,28%

0,00%

grupo 1 (até superior incompleto) grupo 2 (superior completo e pós grupo 3 (pós graduação)
incompleta)

intermediario (n=61) empresas (n=91)


29 0

Este aspecto se reflete, consequentemente, na diferença que se verifica em relação ao


grau de exigência, tornando-o mais elevado para os anúncios dos intermediários: 27%
dos casos deste grupo apresentam grau de exigência 4 ou superior, contra 14% dos
anúncios do grupo das próprias empresas.

Gráfico 28
Distribuição do grau de exigencia entre anúncios de
intermediários e das empresas - 2005 (%)

35

32,05
31,15
30

25 24,59
23,08 23,08

20
18,85

15
11,48
12,3
10
8,97
8,97

5
3,85
1,64
0
nenhum um dois tres quatro cinco

intermediários empresas

Da mesma forma, a ação dos intermediários se mostra diferenciada quando se trata


das demandas em torno de atributos classificados como pertencentes à categoria de
mérito e não mérito (conforme demonstrado no Gráfico 29), evidenciando que:

• o percentual de anúncios apresentados por intermediários que não faz


referência a nenhum atributo classificado como ‘não mérito’ é maior do que o
apresentado pelas próprias empresas (64% contra 52% respectivamente); e
quando os intermediários o fazem, utilizam menos variáveis para expressá-lo;
• inversamente, o percentual de anúncios que não demandam nenhum atributo
de mérito (em suas versões estreita ou estendida) é menor entre os
intermediários do que o verificado no caso das próprias empresas (2,56%
contra 9,02% respectivamente). Ao mesmo tempo, são eles que lançam mão
de mais variáveis para definir as demandas do tipo meritocrática (para os
29 1

intermediários, 47,4% dos anúncios exigem 3 ou mais atributos de mérito,


enquanto para as próprias empresas o valor é de 41,8%).

Gráfico 29
Quantidade de atributos demandados de MÉRITO GERAL e
NÃO MÉRITO - segundo responsável pelo anúncio - 2005

70,00%
64,10%
Não Mérito Mérito Geral (estreito e estendido)

60,00%

51,64%
50,00%

40,00%
35,90%

30,00%

27,05% 27,05% 24,36%

20,51%
22,13%
20,00% 20,49%
14,10%
11,54% 11,54%
13,11%
11,48% 7,69%
10,00%
8,20% 9,02%
2,56% 2,56% 2,56%
1,28% 1,28%
4,10%
1,64% 2,46%
0,00%
0,82% 0,82%
quatro tres do is um nenhum nenhum um do is tres quatro cinco seis sete oito
atributo s atributo s atributo s atributo atributo atributo atributo atributo s atributo s atributo s atributos atributo s atributo s atributo s

intermediários (N=78) empresas (N=122)

Portanto podemos afirmar que a ação deste conjunto de atores contribui


efetivamente para elevar o patamar dos perfis buscados dentro de padrões do
tipo meritocrático, sobretudo em relação à variável grau de exigência, acrescido de
um ligeiro, mas não muito dominante, incremento na sobreposição de atributos que se
coloca até à quantidade de 5 (a partir de então são as próprias empresas que
apresentam mais superposições).

Esta dominância em torno de atributos do tipo meritocráticos poderia parecer, à


primeira vista, um contra-senso, uma vez que o julgamento elaborado por estes atores
em relação à qualidade dos candidatos toma um apoio bastante intenso nas
características de personalidade, tal como demonstrado por Gautié et alli (2005).
Entretanto, como estes autores ressaltam, este julgamento não se dá ex ante, mas ele
é o resultado da interação que se desenrola, em um primeiro momento entre os
29 2

intermediários e seus clientes (empresas que abrem os postos de trabalho) e, em um


segundo momento, entre os intermediários e os candidatos.

Assim, na relação com os candidatos, a etapa anterior à interação direta consiste na


transformação da demanda do cliente em uma demanda ‘de mercado’; em outras
palavras, em uma demanda que seja suscetível de ser respondida pelos
intermediários contratados. Dependendo da natureza desta e da relação estabelecida
com o cliente, a busca poderá ser do tipo intensivo ou extensivo, conforme já apontado
na análise de Bessy e Larquier (2002). Uma vez que assumimos que o recurso aos
anúncios corresponde mais comumente ao modo extensivo de busca, a questão-
chave ou o desafio que coloca a estes atores é de ‘padronizar’ as variáveis que serão
utilizadas: quanto menor em quantidade e quanto mais objetivas na sua composição,
mais rápido será o processo de localização dos candidatos com os perfis almejados178.

Desse modo, podemos aventar a hipótese de que a ação de pré-seleção levada a


cabo pelos intermediários, no seu modo extensivo, se dá em torno de uma quantidade
relativamente menor de atributos (um campo mais limitado para a busca), além de
priorizar aqueles que sejam efetivamente mais ‘mensuráveis’ ou ‘objetiváveis’ (como
experiência, escolaridade, determinados conhecimentos, idiomas, etc.). E isso ocorre
não como decorrência exclusiva de necessidades efetivas impostas pelo cargo ou da
função que se encontra em aberto, mas também inclui o aspecto de que o uso deste
recurso lhes permite tornar esta etapa de pré-seleção mais rápida e eficiente,
deslocando para a etapa posterior, da entrevista ou da interação direta, o peso maior a
ser outorgado aos atributos do tipo não meritocráticos. Será neste momento que se
poderá verificar com maior nitidez o peso das demais condições (atributos) vis-à-vis os
certificados escolares que, até então, se colocam como uma condição necessária mas
não de todo suficiente para o acesso às vagas.

178
Bessy e Larquier (2002) lembram ainda que o recrutador (intermediário), irá ‘medir’ cada candidato de
acordo com o conjunto de normas ou atributos pré-definido, e deverá interromper sua busca assim que
um determinado perfil satisfaça a estes atributos. Acrescentam eles: “o recrutador não compara um
candidato contra outro no sentido de selecionar empregado mais adequado para a empresa. O candidato
que tem uma quantidade de qualidade satisfatória para o mercado, ele ou ela pode não ser o melhor para
o trabalho. Os custos de recrutamento para empregos padrão de curto prazo são obviamente reduzidos.”
(BESSY & LARQUIER: 2002, p. 9 – tradução própria)
29 3

Resumo do capítulo

Neste capítulo apresentamos os resultados obtidos com a análise dos anúncios de


emprego voltados a gerentes e executivos no Brasil durante os anos de 1990 e 2005.
Dividimos o trabalho em cinco partes.

Na primeira parte nos ocupamos de mapear as formas pelas quais os empregadores


se mostram para os candidatos. Percebemos que no período considerado há uma
redução significativa no volume de anúncios do tipo ‘aberto’, evidenciando que a
estratégia que os empregadores têm adotado passa pelo ‘ocultamento’ do nome das
empresas. Inversamente há o crescimento da quantidade de anúncios que
disponibilizam informações relativas ao seu porte e nacionalidade, que podem atuar
como elementos acessórios de valorização.

Na segunda parte focamos as formas pelas quais são apresentados os postos de


trabalho ou as vagas. Aqui, percebemos que as empresas estão menos inclinadas a
fornecer elementos que permitam aos candidatos avaliar as contrapartidas que são
ofertadas (remuneração, benefícios, carreira e desenvolvimento profissional) do que o
foram no passado. Por outro lado, há maior cuidado em disponibilizar informações
relativas à descrição das atividades, atribuições, funções ou tarefas que o profissional
deverá desempenhar. Estas inclusive, com o passar do tempo, tornam-se mais
extensas e detalhadas, além de incorporarem mudanças no vocabulário utilizado para
expressá-las.

A terceira parte teve por propósito apresentar as transformações no perfil dos gerentes
e executivos que as empresas desejam recrutar segundo quatro grandes blocos de
demanda. No que diz respeito às características adscritas e posse de bens,
identificamos que os atributos relativos a sexo, idade, apresentação e posse de bens
sofrem decréscimo, ao passo que as exigências quanto ao local de residência se
elevam. Indicamos que um elemento importante na explicação deste padrão de
comportamento é a legislação que incide sobre os suportes dos anúncios, proibindo a
inclusão de variáveis discriminadoras no texto dos classificados de emprego. Já em
relação à experiência profissional prévia, percebemos que não há variações
expressivas na quantidade de anúncios que a exigem; entretanto há grandes
29 4

mudanças na forma de exprimir a natureza desta experiência, particularmente no que


se refere às solicitações em torno do seu domínio de aquisição (tipo de empresa ou
setor) e também na aplicação de conhecimentos, função ofertada e função anterior
desempenhada. Quando se trata da formação acadêmica e outras qualificações,
percebemos que a primeira (formação acadêmica), além de estar sendo mais
requisitada do que outrora, também o é em patamares mais elevados (as exigências
por pós-graduação chegam a ocupar 16% dos anúncios de 2005 contra apenas 1%
em 1990). Dentre as outras qualificações investigadas, apenas o domínio de idiomas
merece destaque especial pelo seu incremento, revelando tanto um crescimento
expressivo no montante de casos que citam este tipo de exigência quanto uma maior
complexificação da mesma (acúmulo de idiomas solicitados e elevação no nível de
proficiência). Relativamente aos conhecimentos técnicos específicos, que crescem
pouco no período, o domínio de idiomas é mais valorizado. Já quando se analisa os
conhecimentos técnicos segundo seus conteúdos, percebe-se que os que apontam
para ferramentas transversais crescem mais do que os que circunscrevem algum
objeto ou domínio do campo de atuação. Também fica patente que os anúncios de
2005, mais do que os de 1990, se caracterizam por expor suas demandas a partir da
sobreposição de variáveis relativas à formação acadêmica e outras qualificações, e
não pelo crescimento de cada uma individualmente. Por fim, em relação às
competências ou capacidades específicas nota-se a redução das solicitações por
características pessoais e comportamentais e, inversamente, a elevação das
demandas por atributos empresariais e de gestão e pela disponibilidade de horário e
mobilidade. Já as competências de comunicação e relacionais bem como as de
desenvolvimento e implicação com o trabalho permanecem praticamente idênticas no
período.

Na quarta parte procuramos sumarizar os resultados obtidos focando a questão que


envolve identificar se de fato os anúncios de emprego estariam mais meritocráticos do
que há 15 anos atrás. Utilizou-se o modelo conceitual de Jackson relativo ao mérito
estreito e expandido adaptado para as classificações que construímos. Conclui-se que
de fato, com o passar do tempo, os anúncios estão se mostrando mais meritocráticos,
mas isso se dá principalmente devido ao incremento das demandas que se situam na
versão de mérito estendido. Ao mesmo tempo também se nota que esta situação não
se dá à custa da redução das solicitações por atributos não meritocráticos. Além disso,
com base nas variáveis ‘densidade’ e ‘grau de exigência’, pode-se afirmar que: (a)
29 5

quando se trata do ‘mérito geral’ (estreito e estendido), os empregadores lançam mão


da combinação de um maior número de qualificadores do que faziam no passado; já
quando se trata do ‘não-mérito’ a situação é inversa; e (b) além dos anúncios estarem
exigindo mais atributos do tipo ‘meritocrático’, eles se tornam muito mais exigentes em
relação ao grau ou nível de incidência destes atributos (particularmente no que diz
respeito à escolaridade e domínio de idiomas). Finalmente, a analise fatorial indica que
as variáveis que definem o que podemos chamar como ‘o gerente em ação’ se
associam fortemente entre si, e aparecem como o fator que explica a maior variância
entre os dados.

Para encerrar, na quinta e última parte fizemos um rápido ensaio voltado a identificar a
contribuição da ação dos intermediários do mercado de trabalho para a elevação das
demandas que são feitas aos candidatos. Tendo o ano de 2005 como base, isolamos
os anúncios que são produzidos por tais intermediários dos que são produzidos ou
que são de responsabilidade das próprias empresas contratantes. A comparação
desses dois conjuntos no tocante às demandas voltadas para formação acadêmica,
outras qualificações, idiomas, conhecimentos de informática e conhecimentos técnicos
demonstra que apenas no quesito domínio de idiomas os anúncios assinados por
empresas de recrutamento e seleção são mais exigentes do que os dos próprios
empregadores. No entanto, quando se trata do nível de formação acadêmica que é
exigido, os intermediários se destacam por fazê-lo em patamares mais elevados.
Dessa forma, não se pode negar que a ação deste conjunto de atores contribui
efetivamente para elevar o patamar, dentro de padrões do tipo meritocrático, dos perfis
dos candidatos para as vagas de gerentes e executivos. Infere-se que atributos não
meritocráticos ganham maior peso na etapa posterior à pré-seleção, qual seja, durante
as entrevistas.
29 6

Conclusões

E continua a dança das cadeiras179 ....

A tomar pela disposição dos indivíduos e de suas famílias de investir recursos de


diversas naturezas em educação, somos tentados a crer que estamos nos dirigindo
rumo a uma sociedade cada vez mais meritocrática, onde as credenciais escolares
têm primazia na determinação das chances de cada um em alçar posições sociais
mais valorizadas.

Como exposto ao longo deste trabalho, diversas são as críticas que relativizam o peso
da educação na composição das oportunidades de acesso a posições profissionais
elevadas. Segundo umas, para o empregador o diploma atuaria como ‘sinal’ de outras
capacidades passíveis de serem desenvolvidas pelo sistema escolar em seus diversos
níveis (estilística, comportamentos, disposições) as quais, mais que os conhecimentos
técnicos e científicos, teriam relevância. Em linha semelhante, outras indicam que a
educação seria o principal fator de ‘organização da fila’ para o ingresso no mercado de
trabalho, outorgando aos que possuem maiores credenciais os primeiros lugares,
porque para eles os gastos com treinamento seriam reduzidos. Há ainda aqueles que,
partindo de outros referenciais, afirmam que o crescimento das exigências em relação
à escolaridade seria resultante das disputas travadas pelos grupos sociais ou
segmentos de classe tendo em vista o fechamento e proteção das melhores vagas.
Nesse sentido, a demanda por ‘credenciais’ (e em níveis cada vez mais elevados)
seria uma forma de garantir a reprodução das estruturas e das desigualdades sociais.

É evidente que o valor que os diplomas podem vir a adquirir para os indivíduos,
considerando o momento de ingresso no mercado de trabalho, não é absoluto. E na
composição do seu ‘preço’ não se pode deixar de levar em conta as decisões que os
empregadores ou seus representantes tomam em relação ao mesmo. Para tanto
avaliam não apenas as oscilações entre oferta e demanda, mas também consideram a

179
Para aqueles que não conheceram a brincadeira ou que dela não se recordam, a dança das cadeiras é
um jogo de salão onde, no início, encontra-se disposta em círculos uma quantidade de cadeiras inferior
em uma unidade ao número de participantes. Coloca-se uma música para tocar e todos giram em volta
das cadeiras. Quando a música para, cada um tem que rapidamente tomar assento. O que não consegue,
ou ‘sobra’, sai imediatamente do jogo. A cada rodada, retira-se uma cadeira, e com isso os participantes
vão sendo eliminados gradualmente, tornando o jogo cada vez mais difícil. Ao final sobram apenas dois
jogadores, e ganha quem conseguir sentar-se mais rapidamente na última cadeira disponível.
29 7

produtividade através de outros atributos que compõem quadros maleáveis de


capacidades e competências que, não necessariamente obtidas por meio do ensino
formal, são igualmente tidas como relevantes para o exercício das funções. Neste
mapeamento também entram em cena as especificidades setoriais e as segmentações
de mercado, ou os focos diferenciados dos negócios. É nesse sentido que Goldthorpe
(1997) e Jackson et. al (2002) criticam a ênfase que as pesquisas sociais atribuem às
conquistas educacionais como indicador de mobilidade, especialmente porque para
boa parte das profissões que estão sendo criadas na nossa sociedade ‘informacional’
ou ‘pós-industrial’, e que se localizam nos setores de comércio e de serviços pessoais,
o que faz a diferença é o compartilhamento de códigos, linguagens, posturas,
condutas ou disposições que não necessariamente são obtidas em percursos
escolares.

Portanto, no que diz respeito ao mundo do trabalho, a equivalência entre mérito (como
princípio legítimo que organiza a distribuição dos indivíduos na estrutura social) e
educação precisa ser buscada no peso que os diversos atores com força no campo
atribuem a esta última, e que é variável segundo cada momento histórico e
configuração societal.

Considerando a estrutura ocupacional atual não resta dúvida que, ao menos por
enquanto, as posições gerenciais ainda se encontram no patamar superior da divisão
social do trabalho. Mesmo que muito diversas, difusas e nada homogêneas (seja em
relação à natureza do trabalho ou do perfil dos seus ocupantes) elas se colocam como
um espaço privilegiado para a análise da relação entre educação e os vários outros
elementos que são considerados nos processos seletivos.

Tradicionalmente, a gerência se configura muito mais como um espaço de atuação do


que como uma profissão (como a medicina, o direito ou a engenharia) que presume,
no sentido sociológico do termo, dentre os seus diversos atributos constitutivos (como
a questão do exercício da autonomia, do controle sobre o próprio trabalho e do
controle da jurisdição), a passagem por instâncias próprias de formação que
capacitam e legitimam os indivíduos para o exercício da prática. Assim, o ingresso
neste campo se encontra, em princípio, aberto aos mais variados perfis (escolares, de
trajetória profissional, etc.). As disputas que se sucedem em relação à legitimidade das
provas de ingresso não estão circunscritas a conjuntos totalmente ordenados e
29 8

universais de regras - ainda que juridicamente possa haver determinadas constrições


para grupos específicos (ver nos Anexos as descrições de formação para as diferentes
famílias ocupacionais apresentadas na CBO) – e por isso mesmo podem ser
situacionalmente definidas e negociadas, ainda que não se possa nem de longe
afirmar que exista uma autonomia desse aspecto frente a outras instâncias da vida
social (educacional, política, econômica) que interferem na formação dos julgamentos.

Consequentemente, por sua fluidez (que desafia os teóricos: grupo social? categoria
social? ocupação? profissão?) a gerência é um território que admite a acomodação
tanto dos portadores de credenciais mais elevadas (obtidas em instituições de renome
e em níveis de doutoramento, por exemplo), quanto dos que são formados ‘na escola
da vida’. É, portanto, um terreno ‘fértil’ para a análise do quanto as credenciais
escolares vêm sendo consideradas na definição que os empregadores tecem acerca
do candidato ‘ideal’ às vagas que são abertas.

Seguindo esta linha, a pesquisa realizada pretendeu exatamente colocar em evidência


os principais elementos que, na perspectiva dos contratantes, os candidatos aos
cargos de gerentes e executivos no Brasil deveriam possuir. Para tanto utilizamos
amostras de anúncios de classificados de emprego coletados em jornais e em ‘sites’
de emprego na Internet (job boards) durante os anos de 1990 e 2005, o que
possibilitou a análise em uma perspectiva diacrônica.

Ainda que boa parte das vagas não seja anunciada e que os anúncios de emprego
possam não conter todos os fatores que são levados em conta no processo de
decisão durante o recrutamento, eles representam um campo fértil para a pesquisa
sociológica, na medida em que incorporam um investimento que é feito no processo
de busca, e portanto os conteúdos que disponibilizam, mesmo que incompletos,
podem ser levados a sério.

Foram coletados 400 anúncios de emprego, sendo 100 relativos ao ano de 1990 e 300
ao ano de 2005 (desses, 100 foram captados em jornais e 200 na Internet). Os textos
dos anúncios foram dissecados em várias classes e subclasses de informação, tanto
no que diz respeito às empresas e ao modo como se apresentam, como no que se
refere aos postos de trabalho, tarefas e contrapartidas ofertadas e, principalmente, no
que consiste ao perfil dos candidatos buscados – foco prioritário da análise.
29 9

As principais conclusões que pudemos extrair deste trabalho são as seguintes:

Primeiro identificamos que com o passar do tempo, os anúncios de emprego para


gerentes e executivos no Brasil estão solicitando, em maior intensidade, atributos tidos
como meritocráticos (porque passíveis de serem adquiridos via esforço e empenho
individual). E isso ocorre devido tanto ao crescimento das demandas na categoria de
mérito estreito (com primazia das credenciais escolares) mas também, e
principalmente, pelo vigor desempenhado pela categoria de mérito estendido (com
destaque particular para o incremento dos pedidos relativos ao domínio de idiomas e
alta proporção mantida em relação aos conhecimentos técnicos).

Porém, isso não se dá à custa da eliminação da incidência das demandas por


características do tipo não meritocráticas, que permanecem estáveis no período, ainda
que variando significativamente na sua substância (menor presença de ‘atributos
adscritos’ e de ‘características pessoais’ e maior de atributos de ‘mobilidade’).

Percebemos também que as credenciais escolares, quando tomadas isoladamente (ou


seja, sem estar associadas a outros atributos), são menos significativas do que já o
foram em épocas idas. Em outras palavras: para o pleito às vagas analisadas, os
diplomas são cada vez mais necessários, mas ao mesmo tempo cada vez menos
suficientes.

Na seqüência, demonstramos que os empregadores estão se mostrando mais


exigentes em relação aos candidatos, e que isso ocorre no interior da acepção da
categoria ‘mérito’ no seu sentido amplo – estreito e estendido. De um lado, desenham
perfis que contêm um maior número de atributos combinados entre si, mais do que o
faziam no passado (especialmente em relação aos atributos de mérito estendido), e de
outro exigem níveis de desempenho cada vez mais elevados no tocante à formação
escolar e ao domínio de idiomas.

Em terceiro lugar, ao considerar as demandas por experiência (variável de maior


relevância na perspectiva dos empregadores), apontamos que sua já alta incidência
verificada em 1990 permanece com o passar dos anos, atingindo 90% dos casos. No
entanto, há uma grande diferenciação nos formatos que são utilizados para
30 0

contextualizá-la. As menções aos ambientes específicos que devem ter sido


percorridos na trajetória profissional dos futuros candidatos se faz cada vez mais
presente, circunscrevendo, além da temporalidade (anos de experiência requeridos),
os espaços que são valorizados.

Diante do exposto, se fosse preciso resumir em poucas palavras os resultados a que


chegamos, a respeito dos anúncios de emprego voltados a executivos diríamos que,
no período analisado, estes estão sim mais meritocráticos. E também tão mais
exigentes que tende a ser muito reduzida a quantidade de candidatos capazes de
apresentar simultaneamente todas as qualificações, capacidades ou competências
requeridas. Além disso, atributos não meritocráticos permanecem em igual
intensidade, mas com menor variedade e diferentemente valorizados.

Se aceitarmos como verdadeiro que, em contextos de expansão na oferta de


profissionais titulados, o diploma como sinalizador tende a perder relevância para os
empregadores, perceberemos que há um esforço destinado à constituição de outras
cláusulas de barreira, fundadas sobre credenciais que não são necessariamente
sancionadas pelas instâncias educacionais formais e que podem vir a ocupar o lugar
das sinalizações que se tornaram difusas nos dispositivos anteriores.

Quantitativamente se exige mais: mais anos de escolaridade, proficiência em maior


número de idiomas. E qualitativamente se pede diferente: experiência de determinada
natureza, formação em determinado campo, conhecimentos de tipos transversais,
capacidades de gestão estratégica e foco em resultados são alguns exemplos.
Dificilmente estas configurações podem ser imputadas tão somente a ‘necessidades’
das empresas ou a exigências funcionais. E quando postas em ação na esfera do
recrutamento e seleção para o ingresso no mercado de trabalho, percebe-se que elas
podem delimitar substantivamente o campo de candidatos em potencial, reduzindo as
chances de mobilidade de alguns grupos.

Além disso convém recuperar outros fatores que mesmo apresentados em baixa
incidência nos anúncios não podem ser excluídos devido ao potencial latente de
circunscrição que carregam. Tal é o caso das demandas por experiência/vivência
internacional ou por capital social materializado em redes de relacionamentos de
contornos muito específicos, cujas possibilidades de acesso não dispensam a posse
30 1

de capital econômico ou a ocupação de posições privilegiadas na estrutura social que


devem pré-existir à candidatura.

Por fim, verificamos também o quanto a ‘linguagem’ dos anúncios é afetada pelos
vocábulos oriundos do ‘neo-managerismo’, que situa e genericamente decodifica um
tipo específico de agir e de ser do profissional em alta conta no mundo contemporâneo
(o ‘grande’ na acepção de Boltanski e Chiapello: 1999). E que estes termos, utilizados
para fazer referência a pessoas, dispositivos, tarefas, etc., aos poucos se espraiam
para outras esferas da vida social, ‘naturalizando-se’ na medida em que conquistam
outros adeptos: ‘gerir’ os afetos, ‘administrar’ conflitos familiares, ‘agendar’ o próximo
encontro com os amigos, são exemplos das apropriações que acostumamos a ouvir.
Facetas da nova ‘convenção cognitiva’ (GRÜN: 1998), que apresenta o mundo como
uma grande rede interconectada, global, aberta, paulatinamente consolida-se o
consenso de que é neste ambiente que o indivíduo, livre, poderá exercer sua
autonomia e chegar, por seus méritos e esforço, ao ideal de manter-se incluído pelo
empenho contínuo na renovação da sua ‘empregabilidade’.

Para Boltanski e Chiapello (1999), os gerentes e executivos são os principais suportes


e divulgadores deste novo discurso, desse novo ‘espírito’, desse sistema simbólico
que reordena as posições e relações sociais. É a partir deles, para eles, com eles ou
mesmo contra eles (os gerentes ‘enquadrantes’) que vão sendo redesenhadas as
possibilidades de ‘sucesso’, as novas hierarquias sociais (e nesse sentido, porque não
dizer das chances de mobilidade), em uma sociedade orientada por projetos.

Por outro lado, este é um ‘grupo social’ em situação de transição, sujeito a perdas nos
pilares que outrora fundaram sua ‘identidade’ (‘assalariado de confiança’ no dizer de
Bouffartigue). Porém, nem por isso parece ter perdido a capacidade de ‘dizer como o
mundo deve ser’, de apresentar, sobrepondo às já difundidas perspectivas oriundas
das áreas da biologia, economia, mecânica, etc., um receituário próprio, de teor moral
que indica quais são os caminhos a seguir e a partir de quais fundamentos a vida
econômica, social e política deve ser analisada. Nesse sentido, a ‘má’ gestão é quase
sempre a origem dos problemas, e a ‘boa’ gestão a solução a ser aplicada, qualquer
que seja o ‘projeto’ (afetivo, profissional, financeiro, etc.).
30 2

Dessa forma, ainda que ‘escapando’ do enquadramento das profissões, especialmente


por não haver uma correspondência unilinear entre títulos universitários e posição
ocupacional, não se pode desconsiderar que as evoluções dos estudos sociológicos
em torno das profissões nos ajuda a pensar as disputas que atravessam as posições
gerenciais e a ação dos atores neste campo tendo em vista: (a) o convencimento de
contingentes crescentes da população da sua importância e ‘indispensabilidade’; e (b)
a criação de mecanismos de exclusão que ‘afasta’ do pleito os sujeitos ordinários
(dificultando a ‘dança das cadeiras’).

Nesse sentido somos levados a concordar integralmente com Barbosa (1998) quando
afirma que no momento atual, os pesquisadores devem abandonar as tentativas de
definir as profissões com base na identificação da natureza ou substância de sua
atividade ou pela forma legal da relação do trabalho. A questão central em pauta
consiste em identificar em que medida e em quais circunstâncias determinados grupos
sociais fecham espaços ou nichos do mercado de trabalho e definem as condições de
ingresso e de manutenção nos mesmos e como, ao fazê-lo, exercem algum tipo de
poder e modelam formas específicas de relações sociais.

E retomando o aspecto educacional relativo aos usos que os grupos sociais e os


empregadores fazem da universidade – títulos ‘nobiliárquicos’? – podemos indicar com
base em nossas análises que, de modo geral, quanto mais elevado o nível de
escolaridade exigido, menos relevante é a área ou fileira do curso (como as exigências
genéricas em relação à pós-graduação). Por outro lado, ao mesmo tempo em que isso
ocorre, a precisão nos níveis inferiores de escolaridade pode se colocar de maneira
mais exata (como as exigências por cursos de graduação específicos ou em um leque
delimitado de alternativas). Ou seja, para muitas vagas há clara preferência por
determinados tipos específicos de graduação (mormente as engenharias, a economia,
a administração e a contabilidade), mais do que ocorria no passado. Entretanto,
quando se trata da pós-graduação, parece que o ‘valor do diploma’ é antes atribuído à
posse do objeto em si, e não tanto ao que ele corresponde em termos de saberes ou
aprendizagens específicas obtidas. Havendo assim um deslocamento a jusante na
valorização da outorga.

Por fim, buscamos investigar, em um ensaio preliminar, se a ação dos intermediários


do mercado de trabalho exerce influência neste movimento de complexificação e
30 3

elevação dos perfis solicitados. Para tanto isolamos dois conjuntos de anúncios
(publicados em jornal e em um site de emprego na internet) tendo como variável chave
o responsável pela sua ‘publicação’: se as próprias empresas contratantes ou os
intermediários.

Percebemos que quando o anúncio é ‘assinado’ por esses últimos, as demandas pelo
nível de formação escolar e pelo domínio de idiomas são mais altas do que quando o
anúncio é de responsabilidade dos próprios empregadores. Mas, ao mesmo tempo os
intermediários lançam mão de uma menor quantidade de atributos para compor os
perfis, comparativamente às empresas que o fazem tomando apoio em mais variáveis.

Levanta-se a hipótese de que essa prática é decorrente do tipo de concorrência que


se estabelece entre os diversos intermediários e consequentemente da tentativa de
tornar seu ‘serviço’ mais eficiente (e prestado em menor tempo). Mas ao fazê-lo,
jogam um papel fundamental na definição de quem poderá ou não passar pelo
primeiro crivo da seleção, incluindo e excluindo do jogo profissionais ou categorias de
pessoas que não estão em acordo com os formatos padrões que utilizam nas suas
buscas, ou que desafiam as suas competências como recrutadores. Sem dúvida, eles
também são seres de peso na formação do ‘novo desenho do mercado de trabalho’ e
no perfil daquele que continuará (ou não) sendo conhecido (ou se reconhecendo) por
gerente e/ou executivo. E as falhas ou faltas também podem vir a ser ‘sanadas’ ou
‘mitigadas’ desde que os sujeitos se disponham a adquirir os serviços de
aconselhamento de carreira ou de ‘coach’, igualmente ofertados por vários nestes
profissionais de intermediação.

Questões em aberto: continuidades que pedem novas linhas de investigação

A despeito do fato dos anúncios de emprego ser um material ainda pouco explorado
pela pesquisa sociológica no Brasil, esperamos ter demonstrado a sua validade
empírica por conter elementos que, no nível micro, tem muito ‘a dizer’ sobre as
transformações (e permanências) que se colocam nos níveis ‘meso’ e ‘macro’ das
estruturas sociais. Além disso, permitem várias leituras que podem ser apropriadas
pelas pesquisas nos campos da educação, do trabalho e também da gestão.
30 4

Na França, Marchal e Torny desenvolveram uma base de dados com mais de 2.350
anúncios publicados na imprensa entre os anos de 1960 e 2000. Posteriormente, com
a contribuição de Rieucau, fizeram uma análise comparativa dos anúncios publicados
em sites de emprego franceses com os divulgados em sites na Espanha e Grã-
Bretanha, somando 1.200 anúncios. Com isso puderam traçar as grandes diferenças
entre estes países no tocante às solicitações feitas aos candidatos e, principalmente,
ressaltando as particularidades relativas à dinâmica dos mercados de trabalho locais.

Como utilizamos em nosso trabalho várias categorias por eles criadas, sugerimos que
com a ampliação da amostra, incluindo diferentes grupos ocupacionais, poderíamos
obter uma análise comparativa do caso brasileiro vis-à-vis tais países europeus. Seria
o ‘nosso’ mérito singular diante dos ‘méritos’ definidos além mar? Ou estaríamos nos
dirigindo para processos de seleção indiferenciados, mais uniformes e globais? Em
que, como e quando os nossos ‘títulos escolares’ adquirem diferenças
comparativamente aos ‘títulos escolares’ de outros países que dispõem de taxas de
escolaridade bem acima da nossa no tocante ao ensino superior? Essa seria uma
primeira linha de investigação a ser trabalhada.

Uma outra abordagem para a continuidade das investigações diz respeito ao


aprofundamento do papel dos intermediários como atores relevantes na determinação
das chances dos indivíduos ingressarem no mercado de trabalho. Nesse sentido, dois
caminhos complementares podem ser percorridos: em primeiro lugar destacamos a
necessidade de ampliação das amostras tomando por base a distinção entre
intermediários e empresas, com ênfase nos requisitos que são solicitados nos
anúncios (mapeando melhor os critérios que são usados nas buscas do tipo
‘extensivas’). Em segundo lugar apontamos para a realização de estudos de caso em
empresas de recrutamento e seleção previamente selecionadas, analisando os
‘dossiês’ ou ‘fichas de avaliação’ dos candidatos que são convidados a passarem pela
fase de entrevistas (a exemplo do trabalho realizado por Gautié et al.). Esta etapa
permitiria ir além da pré-seleção, que caracteriza a fase dos anúncios, para penetrar
mais a fundo na determinação das escolhas bem como nos fatores que condicionam
as rejeições. Levantamos a hipótese de que é neste momento que os atributos não
meritocráticos ganham vigor.
30 5

Além disso, acreditamos que esta fase se constitui como um campo ímpar para
investigar as disputas e as relações de força que se estabelecem entre os candidatos
a posições de gerencia e aqueles que têm o poder de afirmar (ou negar) o seu devir.

Se admitirmos que em algum nível os gerentes ‘falam sobre o mundo’, apontando


como ele é ou deverá tornar-se, antes de chegarem a tanto precisam passar por
diversas etapas nas quais, tendo em conta o recrutamento externo, deverão negociar
com outros atores que têm o poder (outorgado pelos empregadores) de dizer quem
poderá ocupar esta posição, incluindo aqui em primeira mão os psicólogos e toda uma
miríade de profissionais que atuam como ‘intermediários’.

Finalmente, em uma outra vertente de análise, caberia dar a voz aos candidatos aos
postos de gerentes e executivos. Em um movimento inverso, ao invés de examinar os
classificados de emprego extraindo destes os indicadores de mérito, seria o caso de
argüir aos indivíduos o que eles estão entendendo como valor para o mercado de
trabalho. Para tanto tomaríamos como material empírico os currículos dos candidatos
que se encontram disponíveis nos sites de emprego.

Partindo da mesma estrutura de classificação utilizada (experiência, formação escolar,


qualificações, competências, etc.) veríamos como os atores sociais decodificam os
requisitos que entendem ter valor para as empresas e as estratégias que desenvolvem
buscando ressaltar, nas suas trajetórias profissional e pessoal, os capitais que
estariam mais em acordo com estes requisitos.

Do breve ensaio que fizemos, visando captar as menções a experiência internacional


e participação em atividades voluntárias, pudemos perceber que este dispositivo
(currículos) é muito mais dinâmico do que os anúncios, e por não estar constrito a
nenhuma regulação específica, é mais permeável às valorações das características
‘adscritas’ que nos textos dos classificados de emprego restam ocultas. Gênero, idade,
situação civil, número de filhos, local de residência, entre outros, se somam à
experiência profissional e formação educacional para compor um retrato da ‘oferta’.

À semelhança do ‘mercado matrimonial’, se as empresas e suas vagas podem


corresponder ao lado do ‘noivo’, os candidatos e seus currículos entrariam fazendo a
vez da ‘noiva’. Resta saber como será a partilha do ‘bolo’.
30 6

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SCISTOWSKI, Luiz. (2002) Como Conquistar e Manter seu Emprego – tudo o que
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WALTENBERG, Fábio Domingues. (2003) Análise Econômica dos Sistemas


Educativos – uma resenha crítica da literatura e uma avaliação empírica da
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Recherche n. 29 – CEE (Centre d´Etudes de L´emploi), novembre. 127 págs.

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às Livrarias dos Aeroportos. Paper submitted to the Organizational Culture and
Symbolism Track of the Iberoamerican Academy of Management, to be considered for
presentation at the 3th International Conference, in São Paulo, Brazil, December. 27
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060603.pdf> Acessado em julho de 2005.

ZARIFIAN, P. (1998) A Gestão da e pela Competência. In: Seminário Internacional


de Educação Profissional, trabalho e competência. Rio de Janeiro, 1996. Anais... Rio
de Janeiro: Senai/DN-CIET
31 8

______. (2001) Objetivo Competência: por uma nova lógica, São Paulo, Ed. Atlas

JORNAIS E REVISTAS

Jornal Folha de São Paulo

• 27.05.2002 - Vagas não trazem pobres à universidade. GÓIS, Antônio.


• 11.10.2004 - Diploma não garante emprego.

Jornal O Globo

• 16.11.2003 - Beleza e Juventude em Alta nos Currículos – Reportagem de


Fabiana Ribeiro
• 19.04.2004 - Trabalho voluntário já.

Revista Exame

• 03.04.2002 - O Meganegócio da Educação. Ano 36, n. 7.


• 24.05.2006 – O Benefício que mais cresce. Cristiane Mano. Ano 40, n. 10, p.
28 e 29

Revista Veja

• 11.08.1999 - O maior concurso do país - Espera-se 1,5 milhão de candidatos


para as provas de seleção de vagas do Banco do Brasil. Reportagem de
Daniela Pinheiro.
• Como estar na mira das empresas - Sua Carreira – edição especial n. 1 ano
2000
• 06.09.2000 - QI vale dinheiro. Reportagem de Maurício Oliveira
• 24.01.2001 - Entrevista com o consultor Robert Wong– páginas amarelas

Sites de vagas e currículos (job boards)

• catho.com.br
• vagas.com.br
31 9

Anexos
32 0

Anexo 1
Descritores de formação e experiência por famílias ocupacionais constituintes do Grande Grupo 1 (Membros
superiores do poder público, dirigentes de organizações de interesse público de empresas, gerentes) – CBO 2002

Sub-grupo principal Sub-grupo Famílias Descrição – formação e experiência


(*)
Essas ocupações são exercidas por pessoas com escolaridade de nível superior. Podem participar
1210 - DIRETORES GERAIS
121 – Diretores Gerais de cursos de aperfeiçoamento durante a trajetória profissional. O preparo para funções de direção
geral ocorre após cinco anos de experiência em funções análogas.
Essas ocupações requerem, no mínimo, o curso superior completo, predominantemente nas áreas
1221 - DIRETORES DE PRODUÇÃO E de conhecimento da agronomia, zootecnia, veterinária, biologia, oceanografia ou engenharia de
OPERAÇÕES EM EMPRESA pesca. É desejável que os titulares das ocupações tenham experiência anterior por período superior
AGROPECUÁRIA, PESQUEIRA , a cinco anos, quando recrutados externamente; o acesso a essas ocupações pode se dar, também,
AQÜÍCOLA E FLORESTAL por intermédio de progressão na hierarquia, internamente à empresa. As ocupações podem, ainda,
ser exercidas por proprietários de empresas, com experiência no ramo de atividade, sem
requerimentos específicos de escolaridade.
1222 - DIRETORES DE PRODUÇÃO E Para o exercício das funções dessa família ocupacional requer-se profissionais com escolaridade de
OPERAÇÕES EM EMPRESA DA ensino superior completo e com cinco anos de experiência para o pleno desempenho das
INDÚSTRIA EXTRATIVA, atividades.
TRANSFORMAÇÃO E DE SERVIÇOS
12 - Dirigentes de DE UTILIDADE PÚBLICA
empresas e 1223 - DIRETORES DE OPERAÇÕES Para ingressar nesse emprego/ocupação é exigido curso superior completo. A formação profissional
organizações (exceto DE OBRAS EM EMPRESA DE é feita na prática, com cinco anos ou mais de experiência na área.
de interesse público) 122 – Diretores de CONSTRUÇÃO
Produção e Operações O exercício dessa ocupação requer escolaridade de ensino superior completo. A qualificação para o
1224 - DIRETORES DE OPERAÇÕES
desempenho pleno das atividades profissionais ocorre após o período de cinco anos de experiência
EM EMPRESA DO COMÉRCIO
em funções análogas.
1225 - DIRETORES DE OPERAÇÕES Essas ocupações são exercidas por pessoas com escolaridade de ensino superior acrescida de
DE SERVIÇOS EM EMPRESA DE programas de treinamento e especialização, correlatos às suas atividades. O pleno exercício das
TURISMO, DE ALOJAMENTO E DE atividades profissionais se dá após cinco anos de experiência.
ALIMENTAÇÃO
1226 - DIRETORES DE OPERAÇÕES Essas ocupações são exercidas por pessoas com ensino superior completo. O exercício pleno das
DE SERVIÇOS EM EMPRESA DE atividades profissionais se dá após cinco anos de experiência na área.
ARMAZENAMENTO, DE TRANSPORTE
E DE TELECOMUNICAÇÃO
1227 - DIRETORES DE OPERAÇÕES Essas ocupações são exercidas por pessoas com escolaridade de ensino superior, sendo desejável
DE SERVIÇOS EM INSTITUIÇÃO DE cursos de especialização em finanças. O desempenho pleno das funções ocorre após o período de
INTERMEDIAÇÃO FINANCEIRA cinco anos de experiência profissional.
Continua...
32 1

Continuação....

Sub-grupo principal Sub-grupo Famílias Descrição – formação e experiência


1231 - DIRETORES ADMINISTRATIVOS Essas ocupações são exercidas por pessoas com ensino superior completo. O exercício pleno das
E FINANCEIROS atividades profissionais se dá após cinco anos de experiência na área.
1232 - DIRETORES DE RECURSOS Essas ocupações são exercidas por pessoas com escolaridade de nível superior na área de
HUMANOS E RELAÇÕES DE ciências humanas ou em outras áreas, com especialização em administração de recursos humanos.
TRABALHO O desempenho pleno das funções se dá após quatro ou cinco anos de experiência na área.
1233 - DIRETORES DE Para o exercício dessas ocupações requer-se ensino superior completo. O exercício pleno das
COMERCIALIZAÇÃO E MARKETING atividades profissionais ocorre entre quatro e cinco anos de experiência na área.
1234 - DIRETORES DE SUPRIMENTOS Essas ocupações são exercidas por pessoas com ensino superior completo. O pleno desempenho
E AFINS das funções ocorre após o período de cinco anos de experiência na área.
123 – Diretores de Áreas 1236 - DIRETORES DE SERVIÇOS DE Para ingressar nesse emprego/ocupação, é necessário nível superior completo. A formação
de Apoio INFORMÁTICA profissional é feita na prática, onde exige-se mais de cinco anos de experiência profissional na área
de gerência.
1237 - DIRETORES DE PESQUISA E Dos profissionais da família espera-se que tenham concluído, no mínimo, o nível superior completo
DESENVOLVIMENTO ou freqüentado cursos de pós-graduação. É desejável que tenham experiência em função gerencial
por mais de cinco anos.
Essa ocupação é exercida por pessoas com escolaridade de ensino superior, podendo ser requerido
1238 - DIRETORES DE MANUTENÇÃO
curso superior de nível tecnológico (tecnólogo) em área correlata. O desempenho pleno das funções
ocorre após o período de cinco anos de experiência profissional.
1311 - DIRETORES E GERENTES DE Para o exercício dessas ocupações requer-se curso superior. O exercício pleno das funções ocorre
13 – Diretores e OPERAÇÕES EM EMPRESA DE após o período de cinco anos de experiência profissional.
gerentes em empresas 131 – Diretores e gerentes SERVIÇOS PESSOAIS, SOCIAIS E
CULTURAIS
de serviço de saúde, de em empresas de serviço de
1312 - DIRETORES E GERENTES DE Essas ocupações são exercidas por pessoas com ensino superior completo, acrescida de cursos de
educação ou de saúde, de educação ou de OPERAÇÕES EM EMPRESA DE especialização, com carga horária de duzentas a quatrocentas horas. O exercício pleno das
serviços culturais, serviços culturais, sociais SERVIÇOS DE SAÚDE atividades ocorre após o período de um a dois anos de experiência profissional.
sociais ou pessoais ou pessoais 1313 - DIRETORES E GERENTES DE Essas ocupações são exercidas por pessoas com escolaridade de ensino superior e o tempo
INSTITUIÇÃO DE SERVIÇOS requerido para o desempenho pleno das atividades é de mais de cinco anos de experiência
EDUCACIONAIS profissional.
1411 - GERENTES DE PRODUÇÃO E Para empresas de médio e grande porte, essas ocupações são acessíveis a pessoas com curso
OPERAÇÕES EM EMPRESA superior ou com cursos de administração da área específica de aproximadamente duzentas horas-
AGROPECUÁRIA, PESQUEIRA, aula. Quando recrutados diretamente para a função, normalmente é exigido entre quatro e cinco
AQÜÍCOLA E FLORESTAL anos de experiência na área de produção e operações do setor. A qualificação para o trabalho
também pode ser obtida por meio de vivência na área.
1412 - GERENTES DE PRODUÇÃO E Para ingressar nessa família ocupacional, o trabalhador necessita do curso superior completo.
OPERAÇÕES EM EMPRESA DA Normalmente são formados em engenharia plena ou de curta duração e afins. É recomendável mais
INDÚSTRIA EXTRATIVA, DE de cinco anos de experiência profissional. O Gerente de produção e operações está sempre em
14 - Gerentes 141 – Gerentes de TRANSFORMAÇÃO E DE SERVIÇOS busca de novas tecnologias e em constante reciclagem.
Produção e Operações DE UTILIDADE PÚBLICA
Essa ocupação é acessível a engenheiros civis, com cinco ou mais anos de experiência em obras;
1413 - GERENTES DE OBRAS EM
trabalham em equipe, normalmente na condição de assalariado. É crescente o número de gerentes
EMPRESA DE CONSTRUÇÃO
de obras que trabalham como autônomos. Podem trabalhar em grandes alturas e subterrâneos,
expostos a ruídos e estresse constante.
Continua...
32 2

Continuação....
Sub-grupo principal Sub-grupo Famílias Descrição – formação e experiência
Para o exercício das ocupações comerciante atacadista e comerciante varejista, requer-se
trabalhadores com escolaridade de quarta série do ensino fundamental e cursos básicos de
1414 - GERENTES DE OPERAÇÕES qualificação de até duzentas horas-aula. Para gerente de loja e gerente de operações de serviços
COMERCIAIS E DE ASSISTÊNCIA de assistência técnica, a escolaridade requerida é de ensino médio completo, acrescida de cursos
TÉCNICA de formação profissional em nível técnico. O desempenho pleno das funções ocorre, para
comerciantes atacadistas e varejistas, após período de um a dois anos de experiência profissional;
para gerentes de loja, após quatro ou cinco anos; para gerentes de operações de serviços de
assistência técnica, após cinco anos.
1415 - GERENTES DE OPERAÇÕES Os requisitos de acesso a essas ocupações variam conforme o porte e tipo de estabelecimento.
DE SERVIÇOS EM EMPRESA DE Como requisito mínimo tem-se o ensino médio, mais experiência de um a dois anos na área. Há
TURISMO, DE ALOJAMENTO E empresas que demandam profissionais formados em escolas técnicas profissionalizantes ou em
ALIMENTAÇÃO curso superior na área de hotelaria e turismo.
1416 - GERENTES DE OPERAÇÕES Para o ingresso nesses empregos/ocupações, exige-se nível superior completo, exceto para o
DE SERVIÇOS EM EMPRESA DE Gerente de operações – transportes, que tem como escolaridade mínima o ensino médio completo.
TRANSPORTE, DE COMUNICAÇÃO E A formação profissional é complementada por cursos especializados de duzentas a quatrocentas
DE LOGÍSTICA (ARMAZENAGEM E horas-aula para o Gerente de operações – transportes e mais de quatrocentas horas-aula para o
DISTRIBUIÇÃO) Gerente de logística. É recomendável mais de cinco anos de experiência profissional.
Essas ocupações são exercidas por profissionais com nível superior, acrescida de cursos básicos
1417 - GERENTES DE OPERAÇÕES
de qualificação, com mais de quatrocentas horas. O tempo de experiência profissional requerido
DE SERVIÇOS EM INSTITUIÇÃO DE
para o exercício pleno da função é de um a dois anos para Gerente de agência e mais de cinco
INTERMEDIAÇÃO FINANCEIRA
anos para as demais ocupações.
Para o exercício das ocupações de Gerentes administrativos e financeiros, a escolaridade varia em
função do porte da instituição empregadora: curso superior incompleto e cursos profissionalizantes
1421 - GERENTES ADMINISTRATIVOS,
de até quatrocentas horas até curso superior e de pós-graduação. Os requisitos para os Gerentes
FINANCEIROS E DE RISCOS
de riscos são mais elevados - curso superior mais pós-graduação na área e conhecimento do
negócio em que atua. Neste caso, o pleno desempenho das atividades ocorre em torno de cinco
anos gerenciando riscos em uma área específica.
As ocupações da família são exercidas por profissionais que tenham cursado, pelo menos, o nível
1422 - GERENTES DE RECURSOS
superior completo, formados em qualquer ramo do conhecimento, com experiência ou formação
HUMANOS E DE RELAÇÕES DO
complementar predominante nas áreas de psicologia ou administração. É desejável que as
TRABALHO
ocupações sejam exercidas por profissionais com quatro a cinco anos de experiência na área de
recursos humanos
1423 - GERENTES DE Essas ocupações são exercidas por profissionais com escolaridade de nível superior, do ensino
COMERCIALIZAÇÃO, MARKETING E regular ou cursos superiores de tecnologia (tecnólogos). O tempo requerido para o exercício pleno
COMUNICAÇÃO das funções é de quatro a cinco anos de experiência profissional.
O acesso às ocupações gerenciais nesta área pode se dar por ascensão de carreira de pessoal de
1424 - GERENTES DE SUPRIMENTOS
142 – Gerentes de Áreas compras da empresa, com ou sem escolaridade de nível superior. Para preenchimento de vagas
E AFINS
de Apoio com profissionais externos, normalmente, procura-se recrutar profissionais com nível superior
completo e cinco anos de experiência mínima anterior na função.
Essas ocupações são exercidas por pessoas com escolaridade de ensino superior, acrescida de
1425 - GERENTES DE TECNOLOGIA
curso básico com mais de quatrocentas horas, além de constantes cursos de especialização e
DA INFORMAÇÃO
aperfeiçoamento. O exercício pleno das funções, ocorre após o período de cinco anos de
experiência profissional.
1426 - GERENTES DE PESQUISA E Essa ocupação é exercida por pessoas com formação universitária, geralmente pós-graduadas, com
DESENVOLVIMENTO no mínimo cinco anos de exercício profissional na área de pesquisa.
1427 - GERENTES DE MANUTENÇÃO Para o acesso à ocupação, normalmente, requer-se formação em engenharia e cinco anos de
experiência anterior na área de manutenção.
(*)Excluído o sub-grupo 1.1 – Membros superiores e dirigentes do poder público
Fonte: Ministério do Trabalho e Emprego – CBO 2002
32 3

Anexo 2

Principais características dos Sites de Emprego brasileiros pesquisados


para o estudo
(informações coletadas em julho de 2005)

Site 1
Catho.com.br
N. de Vagas 150.431
N. de Currículos 97.021
Criação O site Catho on LIne é uma divisão do grupo Catho, criado em 1995. A Catho é
uma empresa de Recursos Humanos em serviços de Executive Search e Head
Hunting fundada em São Paulo em 1977. Tem atuação em âmbito nacional.
Forma de Acesso Inclusão de vagas é gratuita. Para a inclusão de currículos é preciso fazer
assinatura. Os planos de assinatura possuem as seguintes opções de
periodicidade: mensal, trimestral, semestral e anual, e as tarifas são diferenciadas
segundo a categoria profissional (profissional, estagiário, operacional, recém
formado e portador de deficiência. Ex: de assinatura para profissional = R$ 49,00
no plano mensal, R$ 123,00 no trimestral, R$ 235,00 no semestral e R$ 420,00 no
anual.
Observações O site da Catho é um grande portal de consulta a vagas, currículos e aos diversos
serviços prestados tanto para pessoas físicas quanto para pessoas jurídicas.
Alguns exemplos de serviços: (a) MBA on line; (b) consultor virtual; (c) currículo em
inglês; (d) pesquisa salarial; (e) Chat; (f) dicas para os profissionais de diversos
níveis; (g) análise de currículo; (h) elaboração de carta de apresentação; (i)
gerenciamento de estágios; (j) recolocação profissional; etc.

Site 2
Manager.com.br
N. de Vagas 107.871
N. de Currículos 60.859
Criação A Manager Online é uma divisão de Internet da Manager Assessoria em Recursos
Humanos. Fundada em 1975, a Manager presta serviços na área de Recursos
Humanos, incluindo Consultoria de Headhunting e Outplacement. Atua em âmbito
nacional e internacional. Com sede em São Paulo, tem mais 7 filiais próprias (não
franqueadas) e alianças estratégicas internacionais por meio da Arbóra Global
Career Partners.

Forma de Acesso Inclusão de vagas é gratuita. Para a inclusão de currículos é preciso fazer
assinatura. Os planos de assinatura possuem as seguintes opções de
periodicidade: mensal, trimestral e anual, e as tarifas são diferenciadas segundo a
categoria profissional (profissionais e estagiários). Ex: de assinatura para
profissional = R$ 47,00 no plano mensal, R$ 120,00 no trimestral, e R$ 389,00 no
anual.
Observações Detalhes das vagas somente para assinantes. O site é um grande portal onde são
oferecidos outros serviços, tais como testes (carreira, perfil), cursos, artigos, news,
etc.
32 4

Site 3
Empregos.com.br
N. de Vagas 72.206
N. de Currículos 850.000
Criação O site foi fundado em 1998 pelo Grupo Performance RH – empresa de
recrutamento e seleção, que atua há 26 no mercado brasileiro (São Paulo, Rio de
Janeiro, Santa Catarina e Rio Grande do Sul), na área de recrutamento e seleção,
serviços temporários, terceirização de pessoal e administração de estágios.
Forma de Acesso Possui planos corporativos (para a inclusão de vagas) e de pessoa física para a
inclusão de currículos. Neste último, o plano de assinatura possui as seguintes
opções de periodicidade: mensal, trimestral e anual, e as tarifas são diferenciadas
segundo a categoria profissional (profissionais ou estagiários). Ex: de assinatura
para profissional = R$ 29,00 no plano mensal, R$ 72,00 no trimestral, e R$ 270,00
no anual. A inclusão das vagas pode ser gratuita (apenas recebe os currículos por
e-mail); avulso (permite a publicação de 1 anúncio e a consulta a banco de
currículos e o uso de outras ferramentas – valor = R$ 35,00 anual); múltiplo
(permite a publicação de 15, 50 ou 100 anúncios e dá acesso a todas as
ferramentas de recrutamento on-line – valor para 100 processos = R$ 1.200,00
anual) ou corporativo (utilização ilimitada de buscas e anúncios. Valor = R$ 300,00
mês).
Observações O site da empregos é um portal onde são oferecidos outros serviços tais como:
guia de emprego; guia de currículo; dicas de emprego; pesquisa salarial;
informações sobre cursos e eventos, testes diversos, etc.

Site 4
Curriex.com.br
N. de Vagas Informação não disponível
N. de Currículos Informação não disponível
Criação Criado em 1998, em parceria com Interart Comunicação e Sistemas.
Forma de Acesso Inclusão de vagas é gratuita. Para a inclusão de currículos é preciso fazer
assinatura. Os planos de assinatura possuem as seguintes opções de
periodicidade: bimensal, trimestral, semestral e anual, e as tarifas são diferenciadas
segundo a categoria profissional (profissionais e estagiários). Ex: de assinatura
bimensal para profissional = R$ 40,00 no plano mensal, R$ 54,00 no trimestral, R$
84,00 no semestral e R$ 120,00 no anual.
Observações Consulta às vagas somente para assinantes. O site é um portal com oferta de
outros serviços, tais como testes, análise de currículos, dicas, links, etc.

Site 5
Fronttinet.com.br
N. de Vagas 20.153
N. de Currículos 2.155
Criação Unidade da Frontti Profissionais e Consultoria em RH – empresa com sede em São
Paulo. Sem informação sobre a data de criação do site.
Forma de Acesso Inclusão de vagas é gratuita. Para a inclusão de currículos é preciso fazer
assinatura. Os planos de assinatura possuem as seguintes opções de
periodicidade: mensal, semestral e anual, e as tarifas não são diferenciadas
segundo a categoria profissional. Valor das assinaturas: R$ 25,00 no plano mensal,
R$ 69,00 no semestral, R$ 95,00 no anual.
Observações Consulta às vagas somente para assinantes. O site possui somente serviços de
inclusão de vagas e currículos.
32 5

Site 6
Vagas.com.br
N. de Vagas Possui empresas parceiras, que utilizam o software de administração de vagas e
currículos. Não há informação sobre o volume de vagas.
N. de Currículos Mais de 800.000 cadastrados na base pública
Criação Criado em 1999 pela Vagas Tecnologia, empresa dedicada ao desenvolvimento do
software. É considerado um ASP – aplication service provider.
Forma de Acesso Gratuito para a inclusão de currículos. Quem paga pelo serviço são as empresas
que utilizam o sistema e acessam os softwares de gestão, que permitem
administrar o recrutamento.
Observações Consiste em ferramenta (software) de gestão para o processo seletivo de
empresas. Não possui campos pré-definidos de inclusão de vagas. Os anunciantes
são considerados parceiros. O foco é o desenvolvimento da ferramenta de gestão
de vagas e currículos, e não a acessória em RH.

Site 7
Curriculum.com.br
N. de Vagas 46.638
N. de Currículos 775.658
Criação Criada em 1998, por uma empresa especializada em desenvolvimento de web
sites. Considerado um ASP.
Forma de Acesso Gratuito para inclusão de currículos e para consulta a vagas.
Observações Administrador de currículos. O foco do site é na gestão do currículo e não da vaga.
Oferece poucos serviços no portal.

Site 8
Elancers.com.br
N. de Vagas Não há informações sobre as vagas, mas sim sobre os clientes: 94 Clientes da
solução ELANCERS CORPORATE e-Recruitment.
590 empresas usuárias do JobPost Elancers (anúncio de vagas e busca de
candidatos - gratuito)
N. de Currículos 160.000 cadastrados na base pública
Criação Matriz no Brasil - São Paulo - Fundada em 1999. É considerado um ASP –
aplication service provider.
Forma de Acesso Gratuito para a consulta de vagas. A fonte de receita são os clientes corporativos
da solução ELANCERS CORPORATE e-Recruitment. Clientes ELANCERS
CORPORATE e-Recruitment não pagam nada para postar anúncios em qualquer
formato. Empresas que utilizam o JobPost Elancers também podem postar
anúncios. O formato básico de anúncio é gratuito. Os formatos mais elaborados
são pagos. Considerado um ASP.
Observações Não oferece outros serviços no portal. Semelhante ao Vagas.
32 6

Forma de pesquisa das vagas nos sites selecionados (chaves de busca)


Campos de Catho Empre Manager Curriex Fronti Vagas Curric Elance
busca gos Net ulum rs
Ramo da empresa X
Local – País X
Local – Estado X X X X X X X
Local – cidade X X X X
Local – bairro X
Nível Hierárquico X X X X (*) X X
Função X
Área Profissional X X X X X X X
Faixa Salarial / X X
salário
Data de entrada da X X X X
vaga no banco de
dados
Palavra-chave X X X
Código do anúncio X X X
/ vaga
Tipo de vaga (**) X
(*) profissional ou estagiário / recém formado
(**) agencia de emprego / consultoria de recolocação / trabalho em casa / central de emprego / cooperativa / trabalho
voluntário / concurso / estagiário / trainee / consultoria de head hunter / própria empresa
32 7

Informações que são disponibilizadas a respeito das vagas ofertadas

Campos descritores (*) Catho Empre Manager Curriex (3) Frontti Vagas Curricu Enlanc
gos (2) Net (4) lum ers (5)
Informações da Empresa contratante
Nome da empresa X X X X X X
contratante
Ramo de atividade X X X X X
(segmento)
Departamento X
Porte da empresa X X X
Nacionalidade da empresa X X
(origem)
Descrição da empresa X X X X
Contato X (1) X X (1)
Tipo de vaga X
Informações do posto de trabalho / vaga
Título X X (1) X X X X X
Quantidade de vagas X X X X X
Data de entrada no sistema X X X X X
(publicação)
Nível hierárquico (cargo) X X X X
Área Profissional X X X X
Descrição da vaga / X X X X X X X
atribuições / requisitos
Localização / cidades / X X X X X X
estado (local de trabalho)
(Local de trabalho) Bairro X X
Faixa salarial (salário / X X X X X X
remuneração)
Observações X X X
Divulgação da Vaga X
Forma de contratação X X
Benefícios X X
Informações sobre o perfil do candidato procurado
Escolaridade (nível) X X X
Curso
Conhecimentos (qualificação) X
Experiência (competências) X
Idiomas X X
Que resida na região X
Sexo X
Idade X
Disponibilidade de horário X
Notas:
(*) Os campos descritores apresentados são os que foram identificados em cada site. Muitos não são de
preenchimento obrigatório, o que faz com que cada vaga ofertada possua mais ou menos elementos do que outras,
assim como a quantidade de informações em cada campo pode variar significativamente, dependendo do contratante.
(1) Informação disponível somente para assinantes
(2) Detalhes da vaga somente para assinantes
(3) vaga completa somente para assinantes
(4) Não há campos pré-definidos para o registro de informações
(5) Não há um padrão totalmente definido para a entrada de dados das vagas. Há a possibilidade de publicação de
anúncios e a partir destes, acesso a informações mais detalhadas.

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