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O evidente carácter polémico das crónicas de D. Fernando e de D.

João I e as ligações do seu


autor com a corte levantam um problema que já tem sido posto: o da imparcialidade de Fernão
Lopes.

O falecido general Morais Sarmento pretendeu que Fernão Lopes tinha cientemente prejudicado
alguns dos seus biografados, como o rei D. Pedro, o rei D. Fernando e a rainha D. Leonor Teles
(1). Mas a sua argumentação e os seus exemplos revelaram-se infelizes porque foi possível
demonstrar que certos factos, segundo Morais Sarmento falsos e até inverosímeis, tinham como
fonte documentos autênticos de chancelaria. Onde o crítico viu «grosseiras e odiosas patranhas»
descobriu-se que o cronista se limitara a extractar ou parafrasear textos oficiais (2). A probidade
profissional de Fernão Lopes saiu altamente prestigiada desta discussão; e quase todos
concluíram que ele é um historiador fiel e imparcial, em quem se pode ter toda a confiança.

Esta conclusão, a nosso ver, vai muito além das premissas, e confunde duas questões que
devem ser consideradas em separado: a questão da probidade profissional e a questão da
imparcialidade na interpretação dos acontecimentos.

Que Fernão Lopes é um cuidadoso investigador apoiado constantemente em documentos,


parece não haver dúvida, até prova em contrário. Que, além disso, pelo senso crítico com que
joeirou a sua documentação, pelo método de crítica de fontes, ele vai muito além do seu tempo e
se antecipa aos historiadores do século XIX, é também um facto que ressalta da sua leitura.

O historiador medieval (não falando nos historiadores latinos de origem eclesiástica) é


normalmente um memorialista. Joinville, Commynes, Froissart são personagens que, pelo papel
político que desempenharam, ou pelas rodas a que. pertenceram, foram participantes ou
testemunhas de importantes sucessos; uma vez entrados na velhice ou retirados à vida privada,
ocuparam o tempo escrevendo as suas memórias. Froissart foi um pouco mais longe, pois para
alargar o âmbito da narrativa deslocou-se a diversas cortes e cidades para ouvir
testemunhas dos feitos que pretendia narrar; além de memorialista, foi também jornalista.
Nenhum deles, porém, procurou outro material que não fosse as suas próprias recordações e os
depoimentos orais das testemunhas dos acontecimentos. Na Península ibérica a Crónica geral
de Espanha iniciada por Afonso o Sábio, e continuado sob Sancho IV, é em grande parte
entretecida de cantares de gesta, que conservavam a memória oral dos acontecimentos. E em
Portugal, depois de Fernão Lopes, ainda Zurara e Garcia de Resende recorrem
predominantemente ao testemunho oral ou às recordações pessoais.

Com todos estes contrasta flagrantemente Fernão Lopes pela pesquisa e pela. utilização do
documento escrito. Esse documento pode ser uma memória anterior, e nesse caso o cronista
limita-se a transcrevê-la, sem meios para controlar a sua veracidade. As crónicas dos reis de
Portugal anteriores a D. Fernando são, como notámos, uma justaposição de «histórias»
preexistentes, acerca das quais nenhuma garantia temos. Mas, já nesta parte, Fernão Lopes
soube encontrar outras fontes documentais: lápides sepulcrais, cartas, actas, etc.

É o caso das inscrições das lápides sepulcrais de D. Afonso Henriques e de D. Sancho I, e a


carta do papa Inocêncio III convidando o rei de Portugal para a Cruzada (3). A história da guerra
civil entre Sancho e Afonso aparece cuidadosamente documentada com as cartas do Papa ao
Rei destronado e com o texto do compromisso tomado por Afonso em Paris (4). A partir do
reinado de D. Afonso II o recurso à documentação de chancelaria é constante. As leis – como a
das Sesmarias - as discussões de cortes, as negociações diplomáticas, os tratados de paz,
ocupam capítulos e capítulos que não são outra coisa senão a transcrição ou o extracto de
documentos da Torre do Tombo. Acontece até que o cronista utiliza documentos autênticos sem
prevenir o leitor; e um investigador inglês pôde descobrir, levado pelo formulário convencional de
chancelaria de certo capítulo de Fernão Lopes, um documento importante para a história da casa
de Lencastre, que falta em Inglaterra. (5)

Fernão Lopes tinha consciência desta peculiaridade do seu método. de historiador, para a qual
mais de uma vez chamou a atenção do leitor:

Esta autenticidade documental das crónicas de Fernão Lopes dá-lhes um carácter muito
consentâneo com a profissão de tabelião e arquivista exercida pelo seu autor A leitura e a cópia
autentica de documentos, a factura de pública-forma, o emprego rigoroso do formulário de
chancelaria, o escrúpulo na indicação de locais e datas, o relato minucioso das solenidades
legais e contratuais, a noção de que todo o processo tem de ser instruído documentalmente são
qualidades profissionais que Fernão Lopes soube aproveitar na sua tarefa de historiador. Até no
estilo lhe escapam fórmulas quase profissionais:
Enquanto os outros historiadores da Idade-Média se apresentam como testemunhas particulares
dos acontecimentos, ou como porta-vozes de testemunhas, Fernão Lopes aparece como um
magistrado profissional e legalmente qualificado lavrando o instrumento dos acontecimentos,
com a consciência plena da sua competência profissional e o tom dogmático também
característico da função. Nesta posição se coloca logo no prefácio da Crónica de D. João l.
Este prefácio que hoje nos parece banal é todavia um documento singular para a época em que
foi escrito. Depois de ter indicado as razões que levam a maior parte dos historiadores a faltar à
verdade (a conformidade natural com a terra natal e a afeição pelos homens do mesmo sangue),
o seu autor discorre aí sobre o problema da verdade histórica, estabelece a diferença: entre erro
e mentira, indica e põe em evidência os seus próprios esforços para superar as condições que
naturalmente falseiam o juízo do historiador; e enuncia brevemente algumas das fontes a que
recorreu - tudo problemas que andavam muito longe das preocupações dos cronistas Medievais.
E é de notar sobretudo a autoridade de que se reveste, a maneira digna e grave, a consciência
de uma importante função pública que acompanham a sua peremptória declaração de que «mais
certidão haver não pudemos que a contida nesta obra», e de que se em outros livros for achado
contrário do que ela fala é porque esses livros estão errados. Não é um simples particular quem
fala, mas um magistrado como sentimento de uma responsabilidade pública e oficial.

Ao magistrado não incumbia apenas arquivar e conhecer a documentação autêntica e os


testemunhos, mas também saber utilizá-los e induzir deles os factos. Sobre os mesmos factos
há versões contraditórias, registadas por escrito, variando consoante as testemunhas e os
partidos. O cronista tem de escolher. Também neste aspecto Fernão Lopes se revela um
historiador competente, que avançando muito para além dos seus contemporâneos, se antecipa
à critica histórica do século XIX.

Quando dispõe de documentos autênticos, Fernão Lopes prefere a versão que é abonada por
estes: dizendo uns é que o Mestre de Avis foi para as Cortes de Coimbra com o propósito de se
fazer proclamar rei, outros que com intenção diferente, Fernão Lopes decide a questão exibindo
a procuração passada pelo concelho de Lisboa aos seus representantes em Cortes, na qual lhes
são dados poderes para aceitar e levantar por rei o Mestre de Aviz (10). Quando o documento
decisivo falta, o cronista inclina-se normalmente para a versão que julga mais verosímil, «mais
chegada a razão». Quando, enfim não encontra qualquer critério decisório Fernão Lopes
apresenta as duas ou mais versões contraditórias, deixando a escolha ao leitor. «Desde o
começo desta obra - escreve ele - seguimos pôr desvairadas opiniões para cada um reter qual
mais lhe aprouver» (11).

Convém entretanto não exagerar o rigor crítico de Fernão Lopes. Nem sempre as razões da sua
escolha são explicadas ao leitor; como que utilizando um voto de confiança, ele declara por
vezes que tal ou tal versão é inexacta, e que a verdadeira é a que ele passa a expor. Outras
vezes as suas razões não são inteiramente convincentes. Tendo encontrado escrito que perto de
Santarém Nun'Alvares foi abandonado pelos seus homens, amedrontados pela proximidade dos
Castelhanos, Fernão Lopes rejeita tal versão com o fundamento de que «o conde não trazia tais
gentes que sem porquê o deixassem, nem por que passasse tão vergonhosa míngua, antes
eram tão leais, e de tal modo. Provados por bons e ardidos (12) homens de armas que ainda que
viesse todo o poderio de Castela antes se deixariam todos morrer ante seu senhor que
desampará-lo de qualquer modo que fosse» (13).
Mas incluindo mesmo os casos numerosos em que Fernão Lopes não nos dá as razões em que
estriba a sua versão, é incontestável que pelo sentido da autenticidade documental, pela crítica
das versões contraditórias, e pela noção de que há uma verdade histórica para além dos critérios
pessoais, ele singulariza-se entre os historiadores medievais. É incontestável também, tanto
quanto se tem podido averiguar, a sua probidade profissional. Convém não perder de vista que
essas qualidades andam ligadas a certa mentalidades profissional e a certa função responsável
e pública - a de cronista oficial.

Não se deve, porém confundir a probidade e competência de um historiador com a sua


imparcialidade. Cada um destes aspectos levanta um problema distinto. Dando por averiguado
que Fernão Lopes foi honesto e objectivo na utilização e apreciação dos documentos que
escolheu para as suas crónicas, resta saber se a sua condição social, a sua formação ideológica
e até a própria função de que estava incumbido não o situavam em certa posição, donde era
inevitável percepcionar certa perspectiva.

Parece-nos a priori que Fernão Lopes nunca poderia ser imparcial, no sentido de não ter uma
opinião acerca dos acontecimentos que relatou, e de não ser parte interessada na actualidade
cujos antecedentes imediatos constituíam o assunto das suas crónicas. Bastava a sua
envergadura intelectual tornar inevitável que tivesse uma opinião sobre os factos; e bastava a
sua qualidade de burguês letrado, oriundo de mesteirais, ao serviço do rei, numa época de
intensos conflitos sociais, para o tornar parte interessada num processo em curso.

Seja dita de passagem que o não ser imparcial não significa que não se seja objectivo. Pelo
contrário, suposto um dado conflito de grupos sociais, há sempre uma posição donde se alcança
uma perspectiva mais ampla e mais justa da realidade, e outra donde essa realidade aparece
deformada ou amputada.

A leitura das Crónicas de D. Fernando e D. João I prova-nos que efectivamente elas constituem
um processo bem concatenado em todas as suas partes, uma seriação de factos em ordem a
uma demonstração, da qual resulta a condenação de uma causa, e respectivos defensores, e a
exaltação da causa oposta.

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