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CONCEITO DE CRIME

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7.1 CONCEITOS

Até aqui se travou superficial contato com algumas figuras de ilícitos penais, de
crimes. Falou-se de homicídio, de aborto, de furto, de estupro, de sedução, de violação
de domicílio etc.

Cada um desses crimes tem suas características próprias, cada qual tratando de
bens jurídicos diversos, cada um com sua pena abstrata, ora mais severa, ora mais
branda. Num se protege a vida, no outro o patrimônio, ora protege-se a liberdade
sexual da mulher, ou a paz e a tranqüilidade da casa.

No segundo e terceiro volumes deste manual, cada figura de crime será


estudada detidamente, com suas nuanças próprias e suas particularidades. Neste
momento, o objetivo é descobrir e estudar o que existe de comum em todo e qualquer
crime, as características comuns a todo e qualquer delito.

Essa é tarefa essencial, porque se constituirá na extração das notas que sejam
comuns a todos os crimes. Não se irá conceituar cada crime em particular, mas o crime
em geral, de modo que, ao final, será possível obter uma definição que se aplique a todo
e qualquer crime. Conceituando o crime, em geral, será dado um passo indispensável
para conhecer e compreender cada crime em particular.

Ao longo dos anos, os estudiosos do Direito Penal digladiam-se em torno de


concepções opostas, com a finalidade de encontrar a adequada conceituação de crime.
Cada qual apresenta seu conceito, como se passa a demonstrar.

7.1.1 Conceitos formais

Do ponto de vista da aparência externa, da exteriorização do crime, pode-se,


com GIUSEPPE MAGGIORE, conceituar o crime como “qualquer ação legalmente punível”
2 – Direito Penal – Ney Moura Teles

(ogni azione legalmente punibile)1 ou, com HELENO CLÁUDIO FRAGOSO, afirmar ser
“toda ação ou omissão proibida pela lei sob a ameaça de pena”2, ou, então, nas palavras
de MANOEL PEDRO PIMENTEL, “uma conduta contrária ao Direito, a que a lei atribui
uma pena”3. Para FRANCISCO MUÑOZ CONDE, “é toda conduta que o legislador sanciona
com uma pena”4.

Crime, do ponto de vista formal, é o comportamento humano, proibido pela


norma penal, ou, simplesmente, a violação desta norma5. Crime é, simplesmente, aquilo
que a lei considera crime.

Tais conceitos são insuficientes para o estudioso do Direito Penal que pretende
e deve debruçar-se sobre esse fenômeno de modo a conhecê-lo em sua inteireza, em sua
profundidade, porque não desnudam os aspectos essenciais do crime, ou, no dizer de
MUÑOZ CONDE, porque um conceito exclusivamente formal “nada diz acerca dos
elementos que deve ter essa conduta para ser assim punida”6. Não informam a
atividade legislativa, não limitam o poder estatal de punir e não explicam nada a
ninguém. Não servem ao operador do Direito, não servem ao estudante, não servem a
quem quer que seja.

7.1.2 Conceitos materiais

Ao lado dos conceitos formais, os doutrinadores do Direito constroem conceitos


substanciais, ditos materiais, que procuram desvendar as “profundezas” do crime, no
termo de BETTIOL.

Para HELENO FRAGOSO, do ponto de vista material, o crime é “a ação ou omissão


que, a juízo do legislador, contrasta violentamente com valores ou interesses do corpo
social, de modo a exigir seja proibida sob ameaça de pena”7. Como se pode observar, no
conceito é incluída, como essência do crime, a relação de antagonismo entre o

1 Diritto penale. 5. ed. Bolonha: Nicola Zanuchelli, 1951. v. 1, p. 189.

2 Lições de direito penal: parte geral. 13. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1991. p. 144.

3 O crime e a pena na atualidade. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1983. p. 2.


4 Teoria geral do delito. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris, 1988. p. 2.
5SIQUEIRA, Galdino. Tratado de direito penal: parte geral. 2. ed. Rio de Janeiro: J. Konfino, 1950. t. 1, p.
229.

6 Op. cit. p. 2.
7 Op. cit. p. 145.
Conceito de Crime - 3

comportamento humano e os valores do corpo social, a ofensa aos interesses


importantes da sociedade.

GIUSEPPE BETTIOL apresenta interessante conceito substancial de crime: “É todo


fato humano lesivo de um interesse capaz de comprometer as condições de existência,
de conservação e de desenvolvimento da sociedade.”8

Nesse conceito do grande penalista italiano, verifica-se a mesma exigência de


que o crime seja um comportamento que produza lesão ao bem jurídico, com o
requisito de que tal lesão seja capaz de comprometer – afetar de modo grave – a
própria existência da sociedade.

Com base nesses conceitos, pode-se concluir que, para o legislador definir certo
fato humano como crime, deve, previamente, verificar se o mesmo é daqueles que
lesionam bens jurídicos, ou pelo menos expõem-nos a grave perigo de lesão, e se tais
lesões são de gravidade acentuada, de modo a serem proibidas sob a ameaça da pena
criminal. Do contrário, não poderá o legislador considerá-las crime.

A importância dos conceitos substanciais é essa: fundamentar e limitar a


atividade do legislador no momento da construção das figuras que deseja proibir sob a
ameaça da pena criminal. Não pode, pois, o legislador construir definições de crime que
não constituam graves lesões ou ameaças de lesões a bens jurídicos de grande
importância.

Ocorre, todavia, que se tais conceitos, de um lado, servem para limitar a atuação
do legislador, são, por outro, insuficientes e incompletos, pois, como bem lembra
BETTIOL, nem todas as condutas humanas consideradas criminosas são daquelas que
comprometem as condições de existência da sociedade, como no crime de injúria, que
consiste na ofensa à dignidade de um indivíduo. No caso, apesar de não constituir grave
perigo para as condições de conservação da sociedade, trata-se de conduta que deve ser
proibida para a preservação de valores individuais cuja proteção constitui interesse
público da mais alta importância.

7.1.3 Conceito de Carrara

FRANCESCO CARRARA, um dos maiores penalistas clássicos, em sua monumental


obra Programa do curso de direito criminal, definiu o crime como

“a infração da lei do Estado, promulgada para proteger a segurança dos

8 Direito penal. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1977. v. 1, p. 241.
4 – Direito Penal – Ney Moura Teles

cidadãos, resultante de um ato externo do homem, positivo ou negativo,


moralmente imputável e politicamente danoso”9.

Desse conceito, pode-se concluir que o crime deve ser sempre um


comportamento do homem – só do homem, não dos animais, nem das entidades
jurídicas – que se concretiza, que se materializa no mundo, não podendo ser
consideradas crimes as atitudes puramente internas do homem, como o pensamento, o
simples querer, o sonhar, o pensar (ato externo do homem).

Esse comportamento humano pode ser fazer alguma coisa, ou a abstenção de


um fazer, o não fazer algo, ação ou omissão (positivo ou negativo), e somente será
considerado crime se previsto anteriormente na lei (infração da lei do Estado
promulgada).

Além disso, será comportamento que significa lesão ou perigo de lesão para
interesses dos indivíduos (para proteger a segurança dos cidadãos, politicamente
danoso) e que possa ser atribuído a pessoa capaz de responder por seus atos
(moralmente imputável).

Todos os conceitos apresentados – formais e materiais – não respondem ao


interesse do estudioso do Direito Penal que, com eles, não pode afirmar, com
segurança, diante de um fato qualquer, se ele é ou não considerado crime. Sim, porque
existem fatos que constituem ofensas a bens jurídicos importantes e que, nem por isso,
são considerados crime, como, por exemplo, o incesto. Outros, como já se disse, não tão
graves – como a injúria – o são.

7.1.4 Definição legal de crime

O art. 1º da Lei de Introdução ao Código Penal define crime, desta forma:

“Considera-se crime a infração penal a que a lei comina pena de reclusão ou de


detenção, quer isoladamente, quer alternativamente ou cumulativamente com
a pena de multa; contravenção, a infração penal a que a lei comina,
isoladamente, pena de prisão simples ou de multa, ou ambas, alternativa ou
cumulativamente.”

Trata-se, como se vê, de um conceito puramente formal, que nada explica, a não
ser quais penas correspondem ao crime e quais à contravenção penal.

9 Programa do curso de direito criminal: parte geral. São Paulo: Saraiva, 1956. v. 1, p. 48.
Conceito de Crime - 5

7.1.5 Conceito analítico

Se nenhum dos conceitos apresentados atende aos interesses do penalista, a


solução é procurar uma nova forma de conceituar o crime, partindo do ordenamento
jurídico vigente, analisando todas as normas penais, incriminadoras, permissivas
justificantes e permissivas exculpantes, bem assim as explicativas, para construir, com
base no conjunto do ordenamento jurídico-penal e dos fatos que a vida revela, um
conceito analítico de crime, partindo do geral para o particular, decompondo o crime
em suas características mais simples.

Conceituar, analiticamente, o crime é extrair de todo e qualquer crime aquilo


que for comum a todos eles, é descobrir suas características, suas notas essenciais, seus
elementos estruturais. Essa é a tarefa que se impõe.

A observação de todo e qualquer crime – homicídio, furto, estupro, estelionato,


injúria, qualquer crime definido em qualquer lei penal – conduz à conclusão de que, em
todos eles, existe um comportamento do ser humano, uma atitude externa, um fazer ou
um não fazer: uma ação, em seu sentido amplo, que engloba o fazer algo e o não fazer
alguma coisa.

Só o homem, segundo a lei brasileira, é capaz de cometer crimes; logo, deve-se


fazer uma primeira afirmação. Todo crime é uma ação do homem, é uma ação humana.

Nem toda ação humana é, todavia, considerada crime. Ao contrário, a maior


parte das ações do homem são comportamentos lícitos e mesmo alguns deles,
considerados ilícitos, não são, apenas por isso, considerados crimes. Danificar, sem
querer, por falta de atenção, o veículo alheio é uma ação ilícita, mas não é um crime.
Trata-se de um ilícito de natureza civil, cuja sanção é a obrigação, para o responsável,
de reparar o dano causado negligentemente. É a regra do art. 927 do Código Civil
Brasileiro que impera.

Só algumas ações humanas são consideradas crime: aquelas que estiverem


previamente definidas numa lei como tal, consoante manda o Princípio da Legalidade
ou da Reserva Legal. Então, já se pode limitar aquela primeira afirmação. O crime é
uma ação humana assim definida previamente por uma lei penal.

A definição de crime contida na lei penal, por exemplo, “matar alguém” (art.
121, Código Penal), ou “subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel” (art. 155,
Código Penal), recebe da doutrina o nome de tipo. Tipo legal de crime.

Aquela primeira é o chamado tipo de homicídio, a segunda é o tipo de furto.


6 – Direito Penal – Ney Moura Teles

Assim, também existem os tipos de roubo, de estelionato, de lesão corporal, de aborto


etc.

“O conceito de tipo remonta historicamente ao de corpus delicti, sendo


empregado na antiga doutrina para significar o conjunto das características
de determinado delito. Adquiriu função autônoma na estrutura do fato punível
com a obra de Beling (1906), que limitava o conceito de tipo às características
objetivas do crime, por contraposição à antijuridicidade e à culpabilidade.”10

Tipo, modernamente, dentro da teoria geral do crime, é a descrição do


comportamento proibido pela norma penal, um modelo de comportamento humano
que a lei considera crime e que, por isso, proíbe sob a ameaça da pena criminal. Adiante
será aprofundado o estudo dos tipos, cuidando de sua estrutura, apresentando seus
elementos integrantes. Nesta quadra, o objetivo é apenas uma visão global do conceito
analítico de crime.

Pois bem, se foi dito que nem todas as ações humanas são consideradas crimes,
mas apenas aquelas que estiverem, previamente, definidas em lei como tal, e se esta
definição recebe o nome de tipo, pode-se dizer que o crime é uma ação que se
identifica integral e totalmente com um tipo de crime. Correto afirmar com
tranqüilidade que o crime é uma ação que corresponde fielmente a determinado tipo.

Para existir crime, é necessário que a ação humana seja igual à ação descrita
num tipo, ou seja, que a ação humana corresponda exatamente a um tipo. Logo, pode-
se resumir dizendo que o crime é uma ação típica, isto é, adequada, ajustada, a um
tipo.

As ações do homem, mormente aquelas que geram uma conseqüência concreta,


são, na verdade, verdadeiros acontecimentos da vida em sociedade, ou, em outras
palavras, são fatos sociais.

“João, a tiros de revólver, matou Alberto” é um desses acontecimentos, desses


fatos da vida, composto de um comportamento humano (disparar tiros de revólver) e
de uma conseqüência (morte de alguém), assim como este outro: “Paulo comprou um
automóvel, pagando, em moeda corrente, por ele, um preço.” Desses dois fatos, apenas
o primeiro é definido como crime pela lei penal.

Por isso, afirma-se que o crime é um fato típico, o que significa dizer que é um
fato da vida, um acontecimento que se amolda, se ajusta, a um tipo legal de crime.

10 FRAGOSO, Heleno C. Op. cit. p. 153.


Conceito de Crime - 7

Com esse raciocínio, chega-se a uma primeira conclusão: todo crime é um fato
típico. Se não houver um tipo legal de crime que corresponda ao fato da vida, este não
pode ser crime, porque não é típico. Logo, a primeira característica do crime é ser ele
um fato típico.

Se todo crime é um fato típico, nem todo fato típico é, contudo, um


crime.

O Direito Penal, às vezes, por meio das normas permissivas justificantes,


considera justa, em algumas circunstâncias, a prática de certos fatos que o mesmo
Direito Penal proíbe, e que são definidos como crime.

Por exemplo, sabe-se que existe uma norma penal incriminadora proibindo a
prática de aborto – que é a interrupção da gravidez, com a morte do ser humano em
formação. Tal fato é típico, pois existem descrições na lei penal a esse respeito, nos arts.
124 (provocar aborto em si mesma ou consentir que outrem lho provoque: pena –
detenção, de 1 a 3 anos), 125 (provocar aborto, sem o consentimento da gestante:
pena – reclusão, de 3 a 10 anos) e 126 (provocar aborto com o consentimento da
gestante: pena – reclusão, de 1 a 4 anos) do Código Penal.

Aborto ou abortamento é, assim, um fato definido como crime; realizá-lo é,


conseqüentemente, realizar um fato típico.

Apesar disso, o Direito Penal considera justificada a realização de um aborto, por


um médico, se não houver outro meio para salvar a vida da gestante. Numa situação de
perigo para a vida da mãe, o direito permite seja sacrificada a vida do feto. Por isso, o
médico está autorizado a provocar o aborto em uma gestante, com ou sem seu
consentimento, desde que seja esta a única maneira de salvar-lhe a vida. Tal permissão é
concedida pela norma do art. 128, I, do Código Penal: “Não se pune o aborto praticado
por médico: I – se não há outro meio de salvar a vida da gestante.”

Do mesmo modo, se a mulher engravidar de um homem que a constrangeu, com


violência ou grave ameaça, à conjunção carnal, entre a vida do feto e a liberdade da
gestante estuprada, o Direito Penal protege esta, deixando a critério dela, ou de quem a
represente, se ela for incapaz, deixar ou não deixar nascer o fruto da violência sexual. É
outra modalidade de aborto permitido, inserta no inc. II do mesmo art. 128 do Código
Penal: “Se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da
gestante, ou, quando incapaz, de seu representante legal.”

Então, se um médico provoca um aborto em Maria – porque a vida desta estava


em grave perigo, evitável apenas através da antecipada interrupção da gravidez, com
morte do feto –, terá cometido um fato típico, porém justificado pelo Direito. Seu
8 – Direito Penal – Ney Moura Teles

comportamento, em conseqüência, não se volta contra a ordem jurídica, não é por ela
proibido; ao contrário, é permitido, considerado justo e pode ser realizado. Não é,
portanto, um crime, apesar de ser um fato típico.

Para ser crime, de conseguinte, o fato típico, ao mesmo tempo, não pode estar
autorizado por uma norma penal permissiva justificante.

Quando o fato é autorizado, justificado, diz-se que ele, apesar de típico, é lícito,
pois não contraria a ordem jurídica. Inversamente, para que haja o crime, o fato típico
deve ser, a um só tempo, injustificado ou ilícito. Deve estar contrariando todo o
ordenamento jurídico.

Essa relação de contrariedade ou de antagonismo entre o fato típico e a ordem


jurídica é o que se chama ilicitude, que é a segunda característica do crime.

Então, deu-se outro passo: todo crime é um fato típico e ao mesmo tempo
ilícito, proibido pelo Direito, injustificado, não permitido, proibido pela ordem
jurídica.

A pergunta que se faz agora é: todo fato típico e ilícito é crime?

O Direito Penal, mesmo não justificando certo fato praticado, entende, em


algumas hipóteses, que não pode ser imposta a pena criminal.

Por exemplo, os menores de 18 anos, segundo manda a Constituição Federal, não


podem ser responsabilizados perante o Direito Penal. Também os doentes mentais que
sejam incapazes de entender o significado de seu gesto não podem ser punidos,
porquanto não faz sentido, não é humano, punir quem não sabia o que fazia. Aquele
que, se soubesse, não faria o que fez.

Para que haja o crime, é indispensável não só que o homem que praticou o fato
típico e ilícito seja capaz de responder por seus atos, mas, ainda, que seu
comportamento seja merecedor de censura, de reprovação do Direito. É que às vezes a
pessoa comete um fato típico e ilícito e, mesmo sendo plenamente capaz de entendê-lo,
não pode ser reprovada.

Por exemplo: um cidadão chega em sua casa e encontra sua mulher e filhos sob a
mira de armas pesadas, empunhadas por homens que exigem dele, chefe da família, que
volte ao Banco onde é gerente e de lá lhes traga certa quantia em dinheiro.

O pai acede aos desejos daqueles, retorna ao banco e de lá retira a importância e a


entrega ao chefe do grupo, obtendo, em seguida, a paz e a tranqüilidade de seu lar, com
o fim do perigo para a vida de seus entes queridos.

O fato praticado pelo gerente do Banco é típico, pois terá se apropriado de


Conceito de Crime - 9

importância da qual tinha a posse (art. 168, CP). É igualmente ilícito, porquanto não
incide uma norma penal permissiva justificante, como a da legítima defesa ou a do
estado de necessidade, que serão estudadas adiante.

Esse fato típico é, ao mesmo tempo, ilícito, injustificado, proibido pelo Direito. O
gerente, maior de 18 anos, é plenamente capaz, é um cidadão mentalmente capaz de
compreender que seu gesto era proibido, mas, mesmo assim, não merecerá reprovação
do Direito Penal, não será censurado, pois agiu sob coação, de natureza moral, a que
não podia resistir.

Ninguém, nem a sociedade, pode exigir dele que, em vez de apropriar-se do


dinheiro e entregá-lo aos que ameaçavam seus familiares, tivesse ido atrás da polícia,
colocando em risco a vida de seus entes queridos. Essa exigência o ordenamento
jurídico-penal, em nome da vontade da sociedade, sua fonte produtora, não faz àquele
homem, preferindo desculpá-lo, perdoá-lo, isentando-o da pena criminal, porque, nas
circunstâncias em que ele se encontrava, não se pode censurá-lo pelo que fez.

Quando não se pode censurar o comportamento daquele que pratica o fato típico e
ilícito, quando não se pode reprová-lo, o Direito o desculpa. Nesse caso, igualmente,
não há crime.

Essa reprovabilidade do fato praticado pelo agente, a censurabilidade do


comportamento humano, é a terceira característica do crime, denominada
culpabilidade. O crime, portanto, deve ser, sempre, um fato típico, ilícito e
reprovável, censurável, culpável. Em conclusão, crime é um fato típico, ilícito e
culpável.

Com base em todo o ordenamento jurídico-penal, que contém todas as normas


penais incriminadoras, permissivas justificantes e permissivas exculpantes, além das
explicativas, fez-se a decomposição de todo e qualquer crime em três notas
características, elementos ou faces, não importa que expressão se queira utilizar.
Descobriram-se os três componentes do crime.

Estudar o crime, então, é estudar essas três características: o fato típico, a ilicitude
e a culpabilidade, tarefa sobre a qual se debruçará daqui por diante.

7.1.6 Definições

A partir deste ponto, torna-se necessária a fixação de algumas definições que,


doravante, serão utilizadas neste livro.
10 – Direito Penal – Ney Moura Teles

7.1.6.1 Sujeitos do crime

7.1.6.1.1 Sujeito ativo

A pessoa que pratica o fato típico, que realiza a conduta descrita na lei penal
incriminadora, é chamada de sujeito ativo do crime. No Direito brasileiro, somente o
ser humano pode ser sujeito ativo do crime. Ultimamente, muito se tem discutido
sobre a possibilidade de se responsabilizar, criminalmente, também a pessoa jurídica.

LUIZ FLÁVIO GOMES, com a ousadia que lhe é peculiar, apresenta sua visão a
esse respeito:

“A complexidade da vida moderna, a internacionalização da economia e o


poder cada vez maior das empresas aconselham, sem dúvida, renunciar ao
clássico princípio societas delinquere non potest, é dizer, as pessoas jurídicas
devem ser sancionadas penalmente sempre que o fato delitivo for executado
dentro da esfera das operações ou negócios da sociedade, se tem alguma
relação com as atividades, se utilizaram meios ou recursos da empresa e,
sobretudo, se o fato proporcionou algum proveito ou benefício econômico ou
de outro tipo à empresa ou se ela foi utilizada para encobrir o fato punível.”11

Contrapondo-se a essas idéias corajosas, RENÉ ARIEL DOTTI tem uma posição
muito clara: “A pretensão de atribuir a imputabilidade penal às pessoas jurídicas não
está em harmonia com a letra e o espírito da Constituição”, mostrando que restariam
violados os princípios da igualdade, da humanização das sanções, da personalidade da
pena, o direito de regresso e as regras de aplicação da lei penal, ofendendo, ainda,
vários princípios relativos à teoria do crime, ressaltando, a propósito, que “a conduta,
revelada através da ação ou da omissão, como primeiro elemento estrutural do crime, é
produto do homem”12.

Já LUIZ VICENTE CERNICCHIARO, com seu inigualável equilíbrio, chama a atenção para
a necessidade de não se romper com princípios importantíssimos do Direito Penal,
especialmente o da culpabilidade, lembrando que “...no Direito Penal, a pessoa física e
a pessoa jurídica reclamam tratamento diferente”, e que “o Direito Penal, sublinhe-se
mais uma vez, contém princípios que só fazem sentido relativamente à pessoa física”,
mas que “nada impede, pragmaticamente, e disso há exemplos, repita-se, em outras

11 Sobre a impunidade da macrodelinqüência econômica desde a perspectiva criminológica da teoria da

aprendizagem. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo: Revista dos Tribunais, nº 11, p. 171-
172, 1995.

12 A incapacidade criminal da pessoa jurídica. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo: Revista

dos Tribunais, nº 11, p. 187-191, 1995.


Conceito de Crime - 11

legislações, estabelecer sanções penais às pessoas jurídicas”13.

É preciso, portanto, muito cuidado com as propostas inovadoras, que privilegiam


soluções pragmáticas, pois não se deve utilizar o Direito Penal, como se quer
ultimamente, como panacéia, como único instrumento de combate ao crime. Assim
como é necessário contraporem-se os adeptos de um Direito Penal democrático ao
movimento de Lei e de Ordem, que busca o endurecimento e as restrições à liberdade –
atingindo, como é certo, preponderantemente, membros das classes subalternas,
explorados, negros, pobres, minorias marginalizadas – não se pode, igualmente,
quando se tratar de combater a chamada “criminalidade do colarinho branco”,
esquecer-se de que também seus sujeitos gozam das mesmas garantias constitucionais
e legais, e que os delitos por eles praticados são regidos pelos mesmos princípios de
natureza penal e processual penal, não sendo coerente, quando se tratar dos poderosos,
o abandono dos princípios fundamentais do Direito.

A máxima de que igualdade significa tratar os desiguais desigualmente não


importa na construção de outro Direito Penal, feito pelos humilhados, para reprimir os
poderosos. A experiência do chamado socialismo real é por todos conhecida, e não
correspondeu aos sonhos de Karl Marx e Frederich Engels, nem aos de Vladimir Ilitch
Ulianov.

As conquistas do moderno Direito Penal da culpabilidade não podem sucumbir


aos anseios, legítimos, de combate à criminalidade organizada ou do colarinho branco.
Nunca é demais lembrar que o Direito Penal é limitado e tem natureza subsidiária e só
deve ser chamado quando o direito tributário, civil, administrativo etc. forem
insuficientes para a proteção do bem jurídico. Encontrar fórmulas para sancionar a
pessoa jurídica mais eficazmente, mais rapidamente, é tarefa urgente, mas para os
outros ramos do Direito.

Em síntese, apesar das discussões atuais, sujeito ativo do crime no direito


brasileiro é apenas o homem.

No Código Penal, o sujeito ativo é chamado de agente, ainda que o fato típico seja
relativo a um comportamento omissivo, negativo, um não fazer.

Assim que ocorre um fato típico, tem a autoridade policial a obrigação de iniciar
um procedimento destinado a investigá-lo, o chamado Inquérito Policial. Aí, o agente é
denominado indiciado. Quando se instaura o processo, costuma-se nomeá-lo de

13 Direito penal tribuátrio: observações de aspectos da teoria geral do direito penal. Revista Brasileira de

Ciências Criminais, São Paulo: Revista dos Tribunais, nº 11, p. 182-183, 1995.
12 – Direito Penal – Ney Moura Teles

acusado, denunciado ou réu. Terminado o processo, com a condenação, ao agente dá-se


o nome de sentenciado ou condenado.

As expressões criminoso e delinqüente são adotadas por outras ciências, não


sendo de boa técnica utilizá-las em Direito Penal. Até este ponto, não se tinha mostrado
esta preocupação, até porque, por mais popularizadas, foram as expressões que se
preferiu utilizar, por serem mais simples e de mais fácil compreensão. Daqui para a
frente, contudo, a referência ao sujeito ativo do fato típico será sempre como o agente.

7.1.6.1.2 Sujeito passivo

O sujeito passivo é o titular do bem jurídico visado pela conduta típica. Os


doutrinadores fazem distinção entre sujeito passivo material e sujeito passivo formal.
Aquele é, efetivamente, o titular do bem atacado, podendo ser o particular ou mesmo o
Estado, que pode ser vítima de furto, de estelionato etc. Já sujeito passivo formal seria
sempre o Estado, que é o titular da ordem proibitiva da conduta típica.

7.1.6.2 Objeto do crime

Objeto jurídico do crime é o bem jurídico visado pela conduta típica, o interesse
contra o qual o comportamento proibido se dirige. No tipo de homicídio, é a vida; no de
furto, o patrimônio; no de estupro, a liberdade sexual da mulher.

Objeto material do crime é a pessoa ou a coisa sobre a qual a conduta típica vai
incidir. No tipo de homicídio e no de estupro, o corpo humano; no furto, a coisa
subtraída.

7.1.6.3 Denominação do crime

Além de definir os fatos como crime, a lei penal confere-lhes um nome, pelo
qual podem ser identificados. “Matar alguém”, do caput do art. 121, é denominado na
lei de “homicídio simples”. O crime definido no art. 155 é denominado “furto”.

Os crimes que têm mesmo objeto jurídico são agrupados no Código Penal em
capítulos, e os mais específicos, em seções, recebendo, igualmente, denominações
genéricas, tais como: Crimes contra a Pessoa, Crimes contra a Vida, Crimes Contra a
Honra, Crimes contra o Patrimônio.

Em outras leis penais, os crimes nelas definidos são, igualmente, nominados:


Crimes contra a Ordem Econômica (Lei nº 8.176, de 8-2-91), Crimes contra a Ordem
Conceito de Crime - 13

Tributária (Lei nº 8.137, de 27-12-90).

Assim, quando no dia-a-dia da vida dos operadores do Direito, alguém fala em


“prevaricação”, está-se referindo ao tipo legal de crime do art. 319 do Código Penal. Se
a expressão empregada é “peculato”, trata-se do tipo inscrito no art. 312 do Código
Penal.

Se alguém disser que João praticou “atentado violento ao pudor”, estará


dizendo exatamente que seu comportamento foi: “constranger alguém, mediante
violência ou grave ameaça, a praticar ou permitir que com ele se pratique ato
libidinoso diverso da conjunção carnal” (art. 214, Código Penal).

7.2 CRIME E CONTRAVENÇÃO

A lei penal brasileira, além de definir como crime certas condutas do homem –
cominando-lhe penas – define, sob o nome de “contravenção penal”, outros
comportamentos, cominando-lhes, igualmente, sanções penais.

Contravenção penal é também um fato típico, ilícito e culpável, um fato


definido e proibido por uma lei sob a ameaça de uma pena, a qual, tanto quanto o
crime, deve ser contrária ao Direito e reprovável.

Pode-se dizer que é outra categoria de crime, chamada de contravenção penal.


Os italianos chamam a contravenção de delito anão, o que indica tratar-se de um crime
de menor gravidade.

A diferença que ressalta primeiro entre crime e contravenção não está em


nenhum deles, mas em sua conseqüência, como se viu da definição legal da Lei de
Introdução ao Código Penal: a pena para a contravenção penal consiste em prisão
simples e/ou multa, ao passo que para o crime a pena é de reclusão, detenção e/ou
multa.

A diferença entre a prisão simples e as penas reclusivas e detentivas está não só


no estabelecimento penal onde devem ser cumpridas, mas também no rigor com que
são executadas. A prisão simples é aquela cumprida em estabelecimento especial, sem
rigor penitenciário, ao passo que as penas de reclusão e detenção são, respectivamente,
cumpridas em estabelecimentos penais de segurança máxima, média ou mínima.

Haveria alguma diferença, substancial, entre o que a lei considera crime e aquilo
que ela considera contravenção penal?

Tomem-se três hipóteses: um fato definido como crime: “ofender a integridade


14 – Direito Penal – Ney Moura Teles

corporal ou a saúde de outrem” (art. 129, Código Penal), outro: “expor a vida ou a saúde
de outrem a perigo direto e iminente” (art. 131, Código Penal), e, finalmente, um fato
considerado contravenção penal: “Deixar em liberdade, confiar à guarda de pessoa
inexperiente, ou não guardar com a devida cautela animal perigoso” (art. 31, LCP).

No tipo de lesão corporal, há a descrição de um comportamento humano que


tem, como conseqüência, a lesão de um bem jurídico, a integridade corporal ou a saúde
de outra pessoa. Na segunda hipótese, a saúde de alguém não sofre nenhuma lesão, mas
fica exposta a um perigo concreto de ser lesionada. Na terceira situação, não há lesão ao
bem jurídico, nem perigo concreto, mas abstrato, de lesão do bem jurídico.

O perigo é uma pura representação do espírito ou é uma realidade concreta?


Para os adeptos da teoria subjetiva, perigo é apenas uma idéia, uma abstração, não um
fato ou um ente concreto. É uma impressão de temor, uma representação mental, uma
pura indução subjetiva.

Já para os que abraçam a teoria objetiva, o perigo é um trecho da realidade, pois


sempre existe probabilidade objetiva de acontecer um evento, e o perigo é um estado
que contém as condições incompletamente determinadas de um evento lesivo. O
perigo seria o fenômeno objetivamente provável.

Há duas espécies de perigo: o subjetivo ou abstrato, que é uma representação


mental, e o objetivo, concreto, que é um trecho da realidade, a probabilidade de
ocorrência da lesão.

Havendo lesão ou perigo objetivo, concreto, de lesão, deve haver um crime. Se,
todavia, o comportamento proibido chega apenas a criar uma situação subjetiva,
abstrata, de perigo, deve-se estar diante de uma simples contravenção penal. Por isso,
foi criado o tipo legal de crime, no art. 131 do Código Penal, uma vez que existe o perigo
objetivo, concreto, da ocorrência de uma lesão da saúde alheia.

Já na contravenção penal do art. 31 da Lei das Contravenções Penais, há apenas


um perigo puramente subjetivo, abstrato, pois a simples presença do animal perigoso
em liberdade ou sob o comando de uma criança não constituiria, ainda, um perigo
objetivo, concreto, mas tão-somente a incerteza que tal situação gera, um perigo
abstrato. Esse perigo subjetivo poderia ser chamado de perigo de ocorrência de perigo
objetivo.

Conquanto o perigo objetivo seja um trecho da realidade, que antecede a lesão,


há um momento antecedente a esse trecho, e em sua presença, deveria o legislador
construir a figura de uma contravenção penal e não de um crime, para evitar sua
evolução para um perigo concreto ou, mesmo, uma lesão.
Conceito de Crime - 15

Essas construções teóricas, todavia, não se sustentam, pois dependem,


exclusivamente, de o legislador definir tal ou qual conduta como crime ou como
contravenção.

Nada impediu, por exemplo, que a contravenção penal definida no art. 19 da Lei
das Contravenções Penais, “porte de arma”, fosse tornada crime pela Lei nº 9.437, de
20-2-1997. A matéria está regulada pela Lei nº 10.826, de 22-12-2003. Dependeu, tão-
somente, do legislador que, igualmente, pode considerar contravenção penal a “lesão
corporal” de que trata o art. 129, caput, do Código Penal.

As conceituações de ordem científica, todavia, destinam-se a orientar o


legislador no sentido de não construir um direito positivo incoerente, promíscuo e
desorganizado, divorciado de um sistema harmônico, especialmente no que diz respeito
a construções dos tipos de comportamentos proibidos, sejam nominados crimes, sejam
declarados contravenções.

Nunca se deve esquecer de que o Direito Penal só deve ser chamado em último
caso, quando os bens mais importantes necessitarem proteção mais rígida; diante de
certas lesões, é preciso ver que a construção de tipos de contravenção só pode ser
entendida como medida de política criminal destinada a divulgar, no seio da
comunidade, o interesse do Direito em proteger os bens que seleciona, por meio da
mais branda de suas sanções, que é a correspondente à contravenção penal.

Recentemente, há propostas de descriminalizar a maioria das contravenções


penais e os crimes de pequena gravidade objetiva, como uma das medidas de política
criminal reclamadas, a fim de construir um Direito Penal de intervenção mínima, como
se exige para a consecução de seus verdadeiros e legítimos objetivos14.

Algumas diferenças práticas importantes entre crime e contravenção devem ser


mencionadas. Nesta, não se conhece a tentativa e admite-se o erro de direito; ela não é
punível se o fato ocorre no estrangeiro, e o tempo máximo de cumprimento de penas
não pode ultrapassar cinco anos.

As contravenções, em sua maior parte, são simples comportamentos


considerados proibidos, pois não dão causa a qualquer conseqüência concreta. São as
chamadas infrações de mero comportamento ou de mera atividade, não exigindo os
tipos que as definem a produção de qualquer conseqüência concreta. Algumas
contravenções penais: fabricar armas ou munições, sem autorização legal, sem a devida

14JESUS, Damásio E. de. Diagnóstico de legislação criminal brasileira: crítica e sugestões. Revista
Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo: Revista dos Tribunais, nº 12, p. 115, 1995.
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autorização, anunciar meios abortivos, vias de fato, jogo do bicho, jogo de azar, loteria
não autorizada, exercício ilegal de profissão ou atividade, vadiagem e mendicância. Elas
estão definidas no Decreto-lei nº 3.688, de 3-10-1941.

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