Sunteți pe pagina 1din 60

As aguas e as levadas da Madeira

.* f
, ,24

~1 8 n 4 c." -*O
i- ir'
i

.'/
Iinpende a esta revista o dever da lembrar-se hoje de quèa Ms-
deira tambem fica situada na Africa, vindó tratar, por excepção,
de importantes e gravissimas questões actuaes que se relacionam
com os destinos da nossa mais bnlla e mais rica ilha adjacente.
'

Filho d a Madeira, o seu director, achando-se alli no vergof de


1897, foi encarregado, por um grupo de pr-esde~tes*. congnjs-
sões administrativas
+
-*C ..' --..-*V
L"-
de k
".+X
y i i d
I-----
~ s de
, redigir uma representaçiio ao
governo jice_ &direito rc~ula_r ~ox.rieo..das .nascentes,ecor-
__-
rentes, de *,agia,assumpto . que esiava e está preoocupando viva-
_--*r

mente a agricultiira de quasi todo o distrícto'do-Fnnchal. A mis-


são que lhe foi oommettida terminou lá mesmo com s apresenta-
$80 do seu trabalho juridiêo. Regressando, porbm, a Lisboa, n%o
podia G i z a r de exercer todos 8s esforbos ao seu alcance, para
que as reclamações legitimas,dos hereos (4) tivessem o competente
deferimento. Assim o pomettera espontaneamente a alguns lavra-
dores e Q exigia o amor da terra fim que nasceu.
NBo po&ernos hoje ciimprir n~elhoro nosso dever do que pu-
blicando este consciencioso artigo; contemplando a situação fun-
damental das idbas e das coisas, e chamando para ellas a attençso
dos inte,ressados, do publico em geral e, do gorerno.
A questgo especial mencionatla foi absorvida na d a s levadas e
na dos servigos hydraulicos da Madeira, ainda inais melindrosas e
graves presentemente. As soLu~8esque, seg~~iindo nos consta de um
modo positivo, se tratou de. fazer adoptar, eram tflo absurdas R ar-

(*)._EZdreos de uma levada, nome que d e c e r t ~muitos dos nossos l e i t e


res descdnhecern, &o tado&os que teem o direito de regar as suas ter-
ras cgm agnas d'sUa. \

B1)I AF~ICB-M~FGQ,
PORTUGAL 18SS - VOL. v.
82 POBTUOAL EY AFBICA

bitrarias, como perturbadoras


, e ruinosas. O governo viu-se forçar10
a reconsiderar, e miidou de rumo. Enviando, porém, á ilha o Sr.
Adolpho Loureiro, para estudar o assiimpto e formular as provi-
dencias necessarias, de accordo com a direcção das obras publicas
do Funebal, cahiu n'um erro, talvez funesto, e poz tudo n'iirna si-
t u a $ %mh
~ e perigosa, n?io só para todos os que teem de figurar
n'isto officialmente, mas tambem, o que é peor, para a economia
e tranquillidade do districto.
NXo temós a menor responsabilidade nas circumstancias e nos
factos que nos obrigam ' a, alludir a desvarios e desacert'os con-
trario~ao bem da Madeira e á seriedade d a administragão pu-
blica. Tambem ngo temos prazer dgum em desempenhar essa ta-
refa; ella Q para n6s at8 bem dolorosa, porque podemos desagra-
dar, contra a nossa vsntade, a pessoas com quem mantemos as
melhores relações pessoaes:Os leitores vAo, pordm, comprehender
que seria um crime preferirmos as comrnodidades do silencio.
A----
nossa attenção deve volver-se primeiro para a questgo jiiri-
I---_f______ r

das--__
levadas
Xb_"-.- -- _
e pará as soliigùes que teem prociirado,
* &
.

e procnrsm.triurnpbar, embora, diante das difficuldades, v30


sando por modificsç8es suoceosivas, em geral apparentes. Depois >. " -.
exporemos
K ~ * toda
* + - ~com v - ,a+franqueza
~ - ,--* ~- o~,pensamento
* . , ~ ~ *que a nosso ver
eve sar adoptado, se nfio se quizer má serie immensa de males
morres, politiaos e-eoonomicos.

A .q'tzestão juridfca
&a duzia de expio~ad~res
de profiss6es diversas veem tra-

calc?ndo aos os interesses mais sagrados, e-os direitos mais


I
I--

a
*
&s
, e dispondo-se
e. s arminar as levadas, a mais beITá; mais
simples e mais util inâtitiiigZo tradicional da ilha, O assvmpto,
sob o aspecto dos faotos e da legislaçíio, estA exposto desenvolvi-
damante na representa*^ de hereos a que acima alludimos. Tran-
serevamói, pois, o que ella diz n'essa.parte, que foi o seu objecto
principal :
SENHOR. A construcgão das levadas, na Madeira, data do prdprio
seculo xv, h que foi descoberta.
As çonàiç6es naturaes da ilha fizeram comprehender aos seus pri-
meiros povoadores, não só, que *a agricultnra tinha de ser a base da
economia da soeiedade, que iam coilstituir, mas tambern que ella 96
AS AGUAS E AS I AVADAS DA NADEIRA 83
podia tomar grandes proporções e offerecer largos interesses nas en-
costas, collinas e valles da beira mar, onde a composição do solo, a
fertilidade do terreno, a suavidade da temperatura e o regimen brando
dos ventos, assegurariam producções intensas e preciosas, com vanta-
gens infindas para a população, para os donatarios, para a ordem mi-
litar de Christo e para a coroa. Era ahi que estava, especialmente, a
zona das melhores culturas - a da vinha e a da canna de assucar-
que já então foram iniciadas, e que fizeram depois a celebridade, a fama
e a riqueza da Madeira, garantindo á metropole, sem interrupção, avul-
tados rendimentos, ainda nos periodos mais criticos e adversos de Por-
tugal.
Taes terrenos, porém, não podiam ser explorados com intensidade,
constancia e vantagem, sem que fossem dotados com aguas de irriga-
ção, que regularmente hurnedecessem e fecundassem o solo, mantendo
verdes e cheias de seiva a s plantaçijes, for4alecendo-as e opulentando-
as, não só durante o verão, mas ainda em parte da primavera e do ou-
tomno, e em geral durante as estiagens, possiveis no proprio inverno.
Ao mesmo tempo, quasi todas as fontes e nascentes estavam nos pon-
toa elevados, nas serras, correndo para os regatos e ribeiras, e por
meio d'estas para o oceano. Desde logo surgiu a necessidade e o pen-
samento de interceptar, em certas altitudes, o curso natural das aguas,
derivando-as para utilissimos canaes, construidos desde grandes dis-
tancias, ao longo de rochedos escarpados, por sobre abysmos perigo-
sos, atravez de immensos obstaculos apenês venciveis por uma tena-
cidade lieroica, até á s regioes mais ferteis e promettedoras.
Tal é a instituição admiravel e proficua das levadas, factor prima-
cial da agricultura, e portanto de todas as condiç0.e~economicas e fi-
nanceiras da ilha da Madeira. E em favor d'ella tinha de vir bem cedo
evidentemente, e bem cedo veiu com effe~to,9 apoio do poder cen-
tral.
Como de futuro poderiam ser occupados os terrenos altos, onde es.
tavam a s nascentes, convjnha garantir a fruiqão d'estas á zona mais
EsQdiadiiea-dabeira-mar, ~ o'tr;õtR "o-sem~fG~%%~^ãfi~~~~ayI$CTCT9~?~
w - h r a t a r n , c W ~ , ~ ; i _ como.
à o ~ coisa
a ~ distinofa.&&e, assentando
que n u n s estariam comprehendidas na transmissão e acqn~siçãoda
propriedade, pfxfdando-as ao dominio da coroa, e ligando o uso per-
petuo d'ellas ás leva-amasde ITrlgação. Ar, mesmo tempo era necessario
assegurar a estas o direito imprescriptivel d6 livre passagem, %demodo
que a s aguas, por um lado, não podessem ser interceptadas pelos do-
nos dos predios das margens dos regatos e ribeiras, e por outro po-
dessem ser conduzidas, em canaes apropriados, atravez de quaesquer
terrenos, mesmo particulares.
A estas necessidades fundamentaes attendeu rigorosamente a legis-
lação.
03"primeiros elementos .dteat;.eendireitoes ecial encontram-se j6 n'um
dos capi&íks de Ü h a carta de ~ & ~ Z E ~ C R ~ ~ B KJÔãci-T~'t~~8C?ipto
-K~TF
n'outra de Ei-Rei D. João 11de 7 de maio de 1493, onde se lê:
."Enas. . . fontes, tornos e olhos de agua . . . particular algum não
'terá jámais em tempo algum poqsa ter nem adquirir dominio nem di-
greito, por titulo algum, nem por posse immemorial, uso nem costume
"em c'ontrario se pogsa filiar nem introduzíir. E de tudo o que dito
Ué concedemos o uso a todos os moradores da dita ilha, para que de
"tudo usem osta mercê que de todas estas cousas faço aos morado-
"res e novos povoadores da dita ilha.. .,
Esta provisão, consagrando a s a uas como propriedade da cor88,
bos - p r e t # ~6ú te'rénos; em-que riasciain,
sepãnrWr--i~s-absolat~ntie~~t~
e dava-os usufructuariamente Bs levadas, em beneficio dos moradores
e povoadores, então estabelecidos nas regiões ttberrimas da beira-mar.
84 POBTUCtAL EM AFRICA

Mais desenvolvida e clara é, porém, a mesma doutrina, na mencionada


carta de meqc6 de El-Rei D. Joào 11, de 7 de maio de 1493, e n'outra do
mesmo monarcha datada, de 8 de maio do mesmo anno.
Ns primeira dispóe El-Rei D. João 11:
@Eno que toca ás fontes, tornos e olhos de agua, deferindo a vossa
'petig8.0 sobre o accprdo que tomastes em guisa e maneira ás terras
a ue se deviam aproveitar, e oonviestes e assentaste9 e accordastes tia
$r,& com que v08 temos mandado, e visto o accordo que uns e ou-
%os tomrstes que sem as aguas as terras náo se podiam aproveitar,
#pela rasgo de que nem em todas nascia agua, e sómente aquellas ter-
'raa aproveitarii%mern que nasciam as aguas, a qual cousa era contra
'o bem commum, e porque todos egualrnente devem ser favorecidos,
'portanto hemos por bem e nos yraz e mandamos que particular al-
'gum tenha direito, dominio nem acçà;o nas fontes, olhos e tornos de
@&gua,que em suas terras nascerem, e jámaís em tempo algum pos-
'aam ter nem adqui~ir,posto que sejam senhores das terras, com as
"gucles as fontes lhes nâo passaram, e as nào poderam nem ainda por
'suas terras mudar nem divertir a corrente, de ?nodo,guisa e maneira
:r tomaram sm carnidw e correrate até darem e se ~netteremnos rios e ri-
a m , e nas Waes juntas as ditas agws que daa fontes correrem se tirarant as
'ktmh, e para que todos possam aproveitar suas terras e que todos
'possam .usar a s ditas aguzbs, serão repartidas por todos conforme ao
'&proveitamento a que fhe for necessario, e o capitão e officiaes da ca-
"mar&e almoxarife farão a dita repartição. . .,
E na carta de 8 de maio de 1493, Iê-se:
@.
. . Faaemos saber. . . que o duque nosso primo senhor da dita
(Madeira) e das dos Açores e Cabo Verde, condestavel de nossos
%einos, nos fee saber par sua relação e mconkamento, que, sendo como
'@f~rarn as terras da dita ilha dadas para se aproveitarem na forma d a
'carta que El-Rei nosso bisavá e senhor, que santa gloria haja, lhe fez
@rnw&,a todas aa maie coisas que na dita ilha houvesse, a saber. le-
qnhits,madeiras. . . rios, ribeiras, fontes, olhos e tornos de agua de que
%s ribeiras da dita ilha se formam, jámaís em tempo algum passassem
'com as ditas terras que assim lhe foram dadas, e a s que em suas
e ~ r r a nascessem
s a povoador algum, pelas quiaes terras seriam todos
aobrigadoa a dar passagem por*ellas a os visinhos tirar regos e levadas
agua para fazerem suas bemfeitorias, e que nos terrados e trastes
*das levadas por onde devessem de correr os donos das terras não ti-
avessem outro sim jbmais em tempo algum dominio nem propriedade
'nem ppdessem fiiiar posse nem ainda immemorial nem valer-se da im-
Ymernorialdas sobre ditas coisas, como mais largamente consta de uma
@cartanossa de confirmação e firmidão que de todas estas coisas fizemos
unaere6 aos povodores moradores da dita ilha, por ser isto assim da sua
'primeira povoação, das quaes ribeiras em ordem a aproveitarem aos vi-
'sinhos suas propriedades por ser uma coisa muitojusta e proveitosa ao
cornmume prol dos direitos e rendas d a nossa fazenda, como tam-
'bem do duque meu primo, o qual como senhor da dita ilha me fez saber
'que algumas pessoas d'ella por poderosas iam e queriam ir contra tudo
*isto e contra a carta'e forma dada pelo dito rei nosso bisavô e senhor
"e por 116sconfirmada, querendo impedir a passagem e correr para
Udeante as taes levadas e tirar outras de novo e os visinhos se apro-
aveitarem por onde menos damrio ikessem e que tudo isto era em
'prejuizo ,de suas rendas e direitos a que nós como rei estamos obri-
@gadoa acudir, e ser isto uma eoisa tão mal feita e contra tudo que o
@ditorei e senhor e nós assim o quizernos. Portanto.. . mandamos a
*v68 capitães, etc.. . que, vindo perante vós aigum morador ou visi-
.nho da dfta ilha implorando vosso officio de juiz que B fazer justiça
AS A ( ; U A S E AS L A V A D A S DA MADEIRA 85

"ás partes de que nós soinos muito encarregado, e algum poderoso lhe
"impedir e prohibir por sua terra passasse e corresse levada que já
"em algum tempo fosse e corresse e que por alguma causa e aconte-
"cimento, negligencia ou por damnificação da levada deixasse de cor-
"rer, vós e os que no officio vos succederem ouvireis com sua razão e
"queixa logo: sem mais delongas nem espirito nem figura de juizo,
"mandareis pôr a dita levada no antigo primeiro estado, passagem e
"corrente, mandando notificar a esse tal poderoso que assim impedir
"a dita levada, ao qual não ouvireis nem consentireis cem admittireis
"a allegar razão de direito em seu favor, porque de todo o hemos por ex-
"cluido a t é que com effeito a dita levada corra e passe p a r a diante,
"mandando com pena de quinhentos cruzados não prohiba nem impeça
"por si nem por outro correr e passar a dita levada, n a qual.pena o
"hemos logo por incorrido, e será applicada nietade para captivos e
"metade para a parte, e se porventura accrescer em contumacia o
"mandareis prender e emprasareis que o dia certo da partida do pri-
"meiro navio que d'essa ilha vier a dois mezes apparega pessoalmente
"n'esta nossa corte a dar a razão que teve para não obedecer ao que
"vós outros lhe mandastes em nosso nome. . . E sabei que isto que aqui
'mandamos é com toda a razão e justiça, porquanto essa ilha não foi
"de vossos antepassados nem d'ella tiveram direito algum ou dominio
'antes de ser desco1)erta e occupada pelo senhor rei nosso bisavô que
'santa gloria haja, o qual fez mercê sómente da terra aos primeiros
"povoadores e m certas condiçces, e esta de dar passagem a regos e le-
"vadas de agua por,suas terras aos visinhos para aproveitariiento de
"suas fazendas, é uma d'ellas . . Em todo o tempo do mundo este tal
"direito s e poderá allegar sem embargo de nenhum e m b a r g e porque
"queremos e nos praz e é nossa vontade que esta e seu cumprimento
"esteja sempre dos sempres em sua força e vigor. . . E de agora para
'sempre derogamos e temos por derogado, quebrado, cassado e an-
"nullado todo e qualquer outro direito que dispozer o contrario em al-
"guma coisa ou em todo ou em parte contra o contheudo n'esta carta...
"E outrosim exc;luimos e hemos por excluidas e inhabeis quaesquer
"pessoas que em juizo qujzerem allegar razão por qualquer via que
"seja contra o contheudo n'esta nossa carta. . ,
Posteriormente, a carta de mercê;. de El-Rei D. Manuel d e 9 de feve-
reiro de 150: confirmou as provisões anteriores, ampliando-as ás pe-
dreiras e barreiras.
Nais tarde El-Rei D. José I, pela provisão de 5 de março de 1770,
cleu nova força á doutrina juridica precedente, nos termos seguin-
tes :
"aço saber a vós corregedor da coinarca da ilha da Madeira que
"Leandro Pereira do Couto e Andrade, capitão de infanterja do Porto
"do Paul d'essa ilha, me representou por sua petição que, administra.ndo
*varias vinculos consistentes em bens d e raiz, em alguns nasciam va-
"rias fontes de agua, que juntas com outras de diversas fontes corriam
"para os moinhos da Fajãa da Ovelha, e nos dias santos s e aproveita-
tvam d'esta agua algumas pessoas, vendendo as, por lhes não ser pre-
"cisas para regarem suas terras, do que resultava damno ao suppli-
Ucante, por s e não poder utilisar d'aquella respectiva quantidade de
"agua nativa nas suas terras, pedindo-me fosse servido mandar se
"desse posse ao supplicante das aguas respectivas á s suas fontes. E
"visto o mais que aliegoil, e informação que sobre este requerimento
" m e enviastes: Hei por bem e vos mando que na conformidade da provi-
"são do senhor rei D. Jodo 11,de 1g.93, que por copia vos remetto, taçaes
'executar a divisdo e repartiçc?~das aguas sem nttertçã.~cllgunm ao ~zltucz-
"me&(, que tiverem em terras pnrticulnres ou (c qztalguer posse ou costume
#em contrario, declarando por abusivas as vendas e afotamentos que se
'faslezll d a que 8s congregam ns.levada que se refere, por se deverem
'repartir peb8 moradores iiproporg&odas terras que cultivam. . ,
!hrrí~handoa t a expoai#o do antigo direito, cumpre-nos ainda fa-
zer eferenci up.nrJQgo& ca-_%cte,.qadsinjsfr ativo , ácerca
d e v a d a s d ~ u m e n t o que s representam um&applicação
e desenvo1viment.a dos que temos mencionado, e em parte deixam eii-
trever claramente o pnwunento tundamental de assegurar o usufructo
das agum ás r e g i h s mais fecundas e ricas d a ilha.
A rainha regente D.Catiharina, por alvârti de 26 de setembro de 1562,
ordenou que as levadas da Ribeira dos Soccorridos, dos Piornaes e do
Castelejo, se tirassem e limpassem no devido tempo á custa dos he-
reos e senhorios, sendo a despesa adiantada p e b alfandega até & quan-
tra de l20$QOO r6is. Por irlvará de 19 de outubro do mesrno anno, ge-
nerrtlisou analogrir~ dispo~qões6s out.ras levadas, uvisto se perderem
muitas cannas de asmwr e deixarem de hi.0 plantar outras por se não
tirarem e limparem rn levadas em tempo,, commettendo aos donata-
rios a sugerintendencia d8elIas,tanto para esse fim como para "tirar
novas levadas ou m u d a m , distribuir, as agnas mediante certo preço
de "preferencia Bs gessori;s que tivessem cannavirzes ou engenhos,, e
tomar , "conhecimento .das demcbndas sobre isso, decidindo-as e dando
ârppellagZio e aggravo*,
Um anno depois foram expedidos tres alvarás do infante D. Henri-
que: um para que sob ti superintendencia do vereador mais velho da
camara do Funchttl os visiabos das ribeiras procedessem regularmente
6 limpeza e fortificação d'etlas; outro para qne fossem cumpridas as
provisõ8s anteriores &cerca da Umpeaa annual das levadas; e o outro
para que na distribuição daa agutrs preoudmsem os cannaviaes, sendo
o preço d'elias taxado em cada capitania pelo respectivo capit-ão do-
natario com "uma pessoa honrada e conforme a quantidade e o pro-
seito que fizemem.,
A administração dãs levadas foi posta a cargo dos donatarios, e,
depois, dos capibhe gmerogbg, que,nomwvam p r ã esse fim delegados
seus chamados j~kes.A s carta8 de nomeação d'estes, até 1834, eram,
substancialmente, como a seguinte:
UFaçosaber aos que a presente carta virem, que, havendo-me,S.A. R
' o Prinoipe Regente NWO Senhor-'confiadonas sues regias instrucções
' a , iwspecçráo s-up~crrrada 'd&&i@e das agtscrs destinadas aos çanaes de
"ega ou levadas d'eíita ilha, cacja p r o p W & é da ma real corôa, ficando
' o seu mo ew ap@ic-aqiIa eommasnr aos habittcntm e cdonos que são compre-
"hendidos nos giros estabekihg, na conformidade das Provisões do Se-
"nhor rei D. João, de 7 e 8 de maio de 1493, do Sephor rei D. Manuel
'de 3 de fevereiro de 1502, e do Senhor rei DAJos6 de 5 de março de
'1770, tendo-se desde muito para este fim ordenado haverem juizes,
"ue segundo as praticas louvaveis as faaiam integralmente observar,
=eproporcionalmente repartir a s aguas por uma regular e bem enten-
'dida distribuiqão, sem dolo o u extr~~vio, em commum beneficio da cul-
Utura das terras; e concorrendo na pessoa de. as qualidsdes, etc ,
uHei por bem do Real S e r ~ i ç oe da Publico, nomeal-o. . . juiz da levado
"de. . . etc.,
-mdo a s disposigões substanciaes do direito antigo, atd
aqui exposto, =amos --
os seguintes principias e regras fundamen-
taes.
1.0 A s ribeiras, ribeiros, regatos, fontes, brnos, e olhos de agua são
propriedade da coráa, por todo o sempre, e destinam-se ás levadas de
irrigaçgo;
2.0 A transmissão e acquisição das terras náo envolvem, em tempo
AS AGUAS E A S LAVADAS DA MADEIRA 87

algum, a transmissão e acquisição das nascentes ahi incluidas, ou do


uso das aguas das ribeiras, ribeiros e regatos, que junto d'ellas correm ;
3.0 Os donos das terras não poderão:
C ( ) impedir que as aguas tomem seu caminho e curso até darem e se
metterem nos ribeiros, regatos e ribeiras;
b ) cortar, interromper ou dizimar as correntes dos regatos, ribeiros
e ribeiras que abastecem as levadas;
C ) obstar a que nas suas terras se tirem regos e levadas para o apro-
veitamento e conducção das aguas, havendo sempre o direito de se fa-
zerem taes obras sem indemnisação;
d ) allegar contra qualquer das suas obrigações, ou qualquer dos di-
reitos da coroa e das levadas, outro direito, ou algum titulo, ou posse,
mesmo immemorial, ou uso e costume;
4.0Com nascentes ou correntes da bacia de uma levada não é per-
mittido tirar outra, ou abastecer tanques e poços;
5: Se deixarem de correr ri'um ponto aguas do uriia levada, por negli-
gencia ou damnificação, ou por terem tirado outra, ou por qualquer
outra causa, os interessados poderão a todo o tempo mandar par a fe-
vada no seu primitivo estado, corrente e passagern;
6."As aguas das levadas pertencem usufructuariamente aos mora-
dores, sendo distribuidas por elles na proporção d a area que cultivam,
preferindo-se desde os primeiros tempos os que tivessem cannaviaes
de assucar, ou, sugundo o espirito da lei, os terrenos das regiões mais
productivas e ricas, e fixando-se por fim, tradicionalmente, a reparti-
ção por horas em favor dos predios co»tprehendidos nosg.iros estabelecidos,
em conformidade corn o pensamento das ditas disposições;
7.0 0 s moradores ficaram obrigados a pagar pelas aguas 'um certo
preço, determinado pela primeira auctoridade administrativa com um
homem bom, conforme a quantidade e utilidade d'elliis ;
8.0 A limpeza das levadas deve ser feita regularmente 5 custa dos
hereos.
9.0 A administraç&oe inspecção das levadas pertenciam á primeira
auctoridade administrativa, que para esses serviços nomeava delega-
dos, os quaes tiveram por fim o nome de juizes.
Passando-se agora ao cam.p,o dos f e g g n'ests mesma p,exj~doque
'vae-a%iFao estab6le"c'i~en£odo regimen liberal, é importante, para os
fins d'esta representação, o que ahi vemos atravez dos tempos.
Desde*o começo houve tendencias raras e dispersas para se cos-
t r z r g r o principio de que a propriedade das aguas da cor63 6 0
uso d'ella;s'pertencla aos hereos, querendo alguns donos de terras fruir
a s nascentes e fontes ahi existentes. Assim se conclue não sb da carta
de merçê de 7 de maio de 1493, feita a pedido de Nuno Caiado eril nome
dos capitães da ilha, officiaes da camara, contadores, juizes e justiças,
e como procurador das camaras, dos moradores e dos visinho~,mas
ainda da de 8 de maio do mesmo anno, expedida em face das reclama-
ções e queixas do duque de Beja.
fEstes coaos não f o ~ , @ r é m ,frequentes, sobretudo desde o reina-
d de El-Rei D. Manoef. O d%%iETcer&~aroe imperativo; contra elle
não.<podiaallegar-se nem posse nem titulo algum, com a circumstancia
de serem legalmente inhabeis8em juizo os que tentassem pugnar pela
regimen opposto; e nas montanhas, onde estavam as nascentes, pouh
cos eram os predios particulares, e ainda mais raras as culturas. Pou-
tas vezes havia, portanto, necessidade de appellar para a s justiças, e
quando ella surgia, a lei era promptamente applicada, sem duvidas
nem hesitwes. O recurso ao poder central, lon e de ter sido preciso
aos hereos, depois do reinado de El-Rei D. Jogo 91, para consolidarem
a sua situação, foi apenas usado por um administrador de terras que
se abalançou a pedir, em vão, & E1-Rei D. JosB, a faculdade de aprovei*
t a r n'ellas a s respectivas fontes, e isto ainda 'com o fundamento de que
80 PORTUGAL EX AFRICA

os visinhos não careciam das aguas, e até as vendiam, o que tudo rnos-
tra a força effectiva do systenia juridico vigente, na corte, nos tribu-
iiaes, na opiniáo e nos costumes.
Outras factos foram succedendo com mais alguma frequencia. Por
nin lado, algumas das nascentes de predios situados fóra da l~aciadas
levadas foram sendo n'elles aproveitadas sem reclamação, o que per-
feitamente se comprehende e era razoavel Por outro, alguns donos de
terras queriam impedir a tiragem de regos e aqueductos atravez das
suas propriedades, ou a passagem de aguas nos canaes; alguns dos la-
vradores mais poderosos, ou ainda os habitantes de 10 ares altos re-
centemente occnpados, tendiam ou chegavam mesmo a fazer novas le-
vadas com fontes de levadas primitivas; e alguns hereos foram ven-
dendo, arrendana0 ou aforando aguas que lhes eram distribuidas, ou
por serem superiores ás necessidades das suas culturas, ou por não da-
rem a esbas todo o possivel desenvolvimento. D'estes abusos, contra
os quaes foram terminantes as provisões de 8 de maio de 1493 e 5 de
março de 1770, só o ultimo se tornou frequente, porque não contrariava
directamente os interesses da beira-mar e o direito vigente, ao passo
que 08 primeiros, por estarem na situaçâo inversa e offenderem aber-
tamente as ideias e os costumes, poucas vezes surgiam, e mais raro ti-
nham de sei: corrigidos pela ac@o dos tribunaes. Ainda assim, esses
mesmos foram em parte favorecidos pela negligencia das auctoridades
e das pessoas interessadas.
O resnmo dos factos anteriores a 1834 pode ser formylado da ma-
y---
e)eira82rpit;e:---. . - - . ..- - -- - --- -
1.0Era applicado e observado rigorosamente, em geral, o direito das
levadas;
2.O A s nascentes de predios situados fora da bacia das levadas fo-
mrn sendo utilisadas pelos respectivos proprietarios;
3.0 Foram tiradas algumas levadas novas com aguas de levadas
primitivas ;
4." Acirna das madres das levadas foram interrompidas frequente-
mente, n'algunspontos, aguas das ribeiras a ellas pertencentes, pelos do-
nos dos predios marginaes;
5.1'Foi-se estabelecendo. o USO de venderem ou arrendarem os hereos
amas destinadas aos seus terrenos
SENHOR. Tal era o estado de direito e a situação d&;;jcoisas, no
wau- irn õ@&qt& ~&~+lI@váTG~GaCTêT~x*êriS-es;quando se implantou
o re&en*t?al. Melhor se pede agora aquilatar'o que vemos iio pe-
riodo quê-(ieiile então decorre e determinar a s saluções necessarias no
momento presente. E n'ests parte convem egualmente olhar primeiro
para o campo do direito, e depois para o dos factos.
A lei de 12 de novembro de 1841, no. seu art. 3.0, estabeleceu o se-
nte: 'A legislação sobre aguas e arvoredos (relativa á Madeira),não
6 alterada pelas disposiqões.d'esta lei, mas continua em vigor., O go-
verno constitucional, ao mesmo tempo que operava uma grande tran-
sformar;%~ no organismo social, sob a influencia da escola individualista,
reconheceu a necessidade de respeitar e manter o direito historico e
tradicional das levadas d'esta ilha.
Posteriormente o cadigo civil. regulando em geral o regimen das aguas
no paiz, assentou a seguinte doutrina:
"Art." 434. O s donos ou posauidores de predios, que são atravessa-
dos por quaesquer aguas correntes, não navegaveis nem fluctuaveis,
teem o direito de usar d'ellas em proveito dos mesmos nredios, com-
tanto que do refluxo das ditas aguas não resulte prejuizo aos predios
que ficam superiormente situados, e que inferiormente se não altere o
ponto d r sahída das aguas remanescentes.
" j ) unico Entende-se por ponto de sahida aquelle onde uma das mar-
gens do alveo deixa primeiramente de pertencer ao predio.
AS A G U A S E AS LAVADAS D A MADEIRA 19

"rt." 43;. Quando a s correntes passarem por entre dois ou mais


preclios, o uso das aguas será regulado pelo modo seguinte:
" s 1.1' Se a agua for sobeja, cada um dos donos ou possuidores dos pre-
dios adjacentes á corrente, de um e de outro lado, poderá usar da por-
ção d'ella que lhe convier.
-s 2.##Se a agiia não for sobeja, cada um dos donos ou possuidores
dos predios fronteiros terá o direito de usar de uma parte das aguas
proporcional á extensão e precisões do seu predio.
- s :l.ltCada arn dos donos ou possuidores dos predios, de que t r a t a
o antecedente, poderá derivar a porçáo de agua que lhe couber em
qualquer ponto da sua linha marginiil, sem que o outro, com o pretexto
d e a derivar superiormente, haja de prival-o d'essa porc;ào, no todo ou
em parte.
" S 4 +. A' sahids das aguas renianescentes, s e a s houver, é applicavel
o que fic;t disposto no art.ll 434.
" A r t o 4'% O que fica disposto nos artigos precedentes não prejudi-
cará os direitos adquiridos, ao tempo da, promulgação d'este (:odigo,
sobre certas e deherminadas aguas, por lei, uso e costume, concessão
expressa, sentença ou prescripção.
" $ unico. A prescripçào, poréni, só será attendida para os effeitos
d'este artigo, quando recaia sobre opposição não seguida, ou sobre a
construcçào de obras no predio superior, de que possa inferir-se aban-
dono do primitivo direito.
*Art.()439. O direito, porém, que teem os proprietarios ao t ~ s odas
aguas que atravessam ou banhatn os seus predios, será de futuro irn-
prescriptivel, e só poderá s e r alienado por escriptura ou auto pu-
blico.
........... ................ . . . . . . . . . . . . . . . ..... .................
"Art o 444. O dono do predio cnde houver alguma fonte ou nascente
de agua póde servir-se d'ella e dispor do seu uso livre'mente, salvo o
direito que algum terceiro tenha adquirido a esse uso por titulo justo.
9 unico. São applicaveis ás aguas, de que t r a t a este, artigo, a s dis-
posições dos artigos 438 e 439 (já transcriptos) ,.
Estas disposições suscitam evidentemente uma importante questàio
de dlreito, qual é a de ssber-se se é ou hão applicavel á s aguas e leva-
das da Madeira o codigo civil, e até que ponto o é, no caso affiraia-
tivo.
Se considerarmos a legislação das aguas e levadas madeirenses co-
mo uma legislação especial, classificação manifestamente juridica, o
direito antigo, sanccionado pela lei de Q de novembro de 1841, não foi
abolido pelo codigo civil, pois trata-se de materia que não estii n'elle
comprehendida, e o art 5 da carta de lei de 1 de julho de 1867, que o
approvou, dispiie termina-ntemente que só "ficará revogada toda a le-
gislação anterior que recahir nas materias que o mesmo codigo abran-
ge, quer essa legislação seja geral, quer especial,.
Este foi de certo o pensamento do legislador, s e attendermos a que
pela citada lei de 1841 o governo constitucional veiu abertamente rnan-
t e r o direito antigo, em opposição a s novas idêas geraes, e a que o
mesmo direito recebeu tambem, indirectamente, depois d a promulga-
çao d o codigo civil, uma verdadeira sancção, pelas leis de 26 d e julho
de 1888 e de 21 de maio de 1896, como adiante se mostrará.
Por outro lado devemos chegar á mesma conclusão quando se con-
sidera que os principias e preceitos da legislação antiga foram conce-
bidos e firmados em conformidade com a natareza physica e a s exigen-
cias ecanomicas da Madeira, e que portanto o legislador não teve de-
certq em mente revogal-os. e muito menos o poderia, ou quereria fazer
por meras disposições genericas.
Finalmente, quando se nota que o codigo civil, no art.* 381, define
cousas communs "as cousas $naturaes ou artificiaes, não individual-
mente appropriadas, das quaes só é permittido tirar proveito, guarda-
90 PORTOCiAL E M AFRICA

dos os regulamentos administrativos, aos individuos comprehendidos


em certa circurnscripgào administrativa ou que fazem parte de certa
corporação publica,; que, no n.O 2 do mesmo artigo, considera como
taes 'as correntes de agua não navegaveis nem fluctuaveis, que atra-
vessando terrenos mcinicipaes ou paroçhiaes, ou predios particulares,
vão lançar-se no mar ou em alguma corrente navegavel ou fluctuavel,;
que, no art.* 434, estabelece que "os donos ou possuidores de predios,
que são atravessados por quaesquer agua.s correntes, não navegaveis,
nem Auctuaveis, teem o direito de usar dlellas em proveito dos mes-
mos predios, com tanto que do refluxo das ditas aguas não resulte pre-
juizo nos predios que ficam superiormente situados e q u e inferiormente
se não altere o ponto de sahida das aguas remanescentes,; e que, no
art." 436 e seus 5 % 1.0r: 2 dispõe, que, quando as aguas das mesmas
O,

correntes passarem por entre dois ou mais predios, podem ser usadas
pelos donos ou possuidores d'estes, na medida que lhos convier, se fo-
rem sobejas, e proporcionalmente á extensão e precisões dos seus ter-
renos, s e o não forem,-desde logo se comprehende q u e o regimen do
mesmo codigo, n'este assumpto, foi destinado ao continente do reino,
e não é applicavei aos regatos, ribeiros e ribeiras madeirenses.
Com effeito, outra é aqui a situação das coisas e d a s aguas. Estas
nunca foram, nem são hoje, nem podem ser comrnuns, no sentido indi-
cado Tambem não podiam nem podem ser usadas n a forma de quaes-
quer regulamentos pelos habitantes de uma circumscripção adminis-
trativa, ou pelos individuos que fazem parte de uma corporagão pu-
blica, m a s sim apenas pelos membros da associação privada dos he-
reos da area que cada levada irriga. Não atravessam só terrenos mu-
nicipaes, parochiaes ou particulares, mas Lambem terrenos do Estado.
Acccesce que não v&o lançar-se no mar, ou em correntes navegaveis
ou fluctuaveis, que a s n5o ha na Madeira, mas em aquêductos cons-
truidos em certas altitudes. Egualmente não poderiani, quando usadas
pelos predios marginaes, produzir refluxos prejudiciaes aos predios
superiores, porque esses pequenos fios de agua descem por leitos de
terrenos e rochas de grande declive. Finalmente dá-se a circumstancia
de que, em tal hypothese, rarissimas vezes poderiam dar sobejos, e em
geral só poderiam ser fruidas por poucos proprietarios limitrophes,
tendo de haver a interrupçgo das correntes.
Se considerassemos a Iogislação das aguas como assumpto em si
mesmo especial, isto é s e a hermeneutica exigisse n'esta questgo que
se não levasse a especialisa@o juridica até ao regimen das aguas da
Madeira, corno tal materia é abrangida pelo codigo civil dever-se-iaen-
tão dizer que o direito antigo relativamente a esta ilha está revogado
pelo art." 5 d a carta d e lei de 1 de julho de 1867. Estia interpretação,
que não é rigorosa, e muito menos justa, e que lucta com as conside-
rações decisivas acima apontadas, adapta-se a certas tendencias e opi-
niiJes communs, que n'este caso, como em muitos outros, não são as
mais solidas e razoaveis.
Mas, e m t a l hypothese, cumpriria logo notar-se q u e o s artigos 438 e
444 8 unico do codigo civil salvaguardarn~osdireitos adquiridos, ao
tempo d a s u a promulgação, por lei, uso e costume, concessão expressa,
sentença ou prescripqão Ora os direitos adquiridos d a s levadas, n'essa
data, pela lei antiga, são os que acima indicámos e pódem syntheti-
sar-se no usufructo perpetuo e imprescriptivel de todas a s nascentes
que vão n a direcção dos regatos, ribeiros e ribeiras d a s bacias de taes
aqueductos: e das correntes dos mesmos regatos, ribeiros e ribeiras,
sem que os donos dos predios onde brotam as fontes podessem utili-
sar-se d'estas, ou adquirir sobre ellas propriedade, o sem que os dos
terrenos marginaes podessem interceptâr aguas. E portanto, ainda
quando se applicasse o codigo civil, a situação juridica d a s levadas se-
ria, pelas s u a s disposiçõ\es, a mesma que pela velha legislaqão.
AS A G U A S E A S LAVADAS D A M B 1 ) E I R A 91

Nem se poderia dizer que por esta hermeneutica se declarava vi-


gentes, em ultima analyse, e contradictoriamente, a s provisòes anti-
gas. O s direitos adquiricios, ao tempo da promulgação do codigo. e por
elle garantidos, tinham de' ser todos os que eram reconhecidos por essa
legislação, que lhes assegurava a perpetuidade e a imprescriptibilida-
de. Os artigos 438 e 444 $ unico do codigo civil só não podiam aprovei-
tar, sob o aspecto de que se trata, a qualquer levada tirada depois de
entrar elle eiil vigor; e só em tal caso, s e se applicasse ainda o con-
juncto dos antigos principios e preceitos, haveria confusão entre direi-
tos adquiridos e legislação precedente, querendo-se manter esta depois
de se t e r dito que estava abolida.
Suppuniiamos agora que os direitos adquiridos não teem hoje o ca-
racter de perpetuidade e de imprescriptibilidade, como tambem se
c'hega a surtentar, com grandissima difficuldade e gravissirr,os erros, e
como o querem certas idéas e tendencias desrazoaveis. A posse para
prescripçào, n'este caso, apenas pode, ainda assim, começar a contar-
se, contra as levadas e a favor dos donos de predios, marginaes ou
onde h a nascentes, desde a applicação do codigo civil, s e fôr mais an-
tiga, por serern antes ixnprescriptiveis os direitos e obrigações e não
ter a lei effeito retroactivo; e desde o principio da mesma posse, se for
mais moderna, considerando, em ambas a s hypotheses, a peor condi-
ção, que 6 a de não ter havido interrupções. Essa prescripção al6m
d'isso, só pode ser a de 30 annos, porque não ha titulo de acquisição
nem boa fé no originario possuidor, e só pode, pois, produzir a perda
de direitos desde 23 de março de 1898.
Portanto, ainda quando dessemos aos artigos 438 e 444 $ unico do
codigo civil, na supposição, de ser este applicavel á s levadas, a peor in-
terpretação que se pode imaginar, a situação juridica d'ellas, a c t d -
mente, seria, pelo proprio codigo civil, ainda a mesma qw gifiharn cl oombra da
antiga legislap30, exceptuada a mera possibilidade de virem depois de
23 de março de 1898 perdas successivas de direitos pela prescripçgo
de 30 annos.
Completando a exposiqàio da marcha d a direito nos tempos moder-
nos, ainda resta considerar a s leis de 26 de julho de 18F8 e de 21 de
de maio de 1896, já citadas.
A primeira dispõe o seguinte:
~ A r t 1.0. ~ As associações de proprietarios ou hereos das levadas da
Madeira ou de qualquer outra região do paiz onde haja o mesmo regi-
men de aguas ou das adíias, são reconhecidas como associações legaes
para todos os actos juridicos, especialmente para, por meio de seus,
juizes, direcções ou commissões 'directoras, quando devidamente aucto-
risadas pela assembléa geral dos consortes ou comproprietarios, adqui-
rir, por qualquer meio legitimo, os bens immobiliarios precisos, com
destino á conservação, accrescentamento ou melhor aproveitamento
dos mananciaes de aguas d'essas levadas.
A r t . ~2." Fica assim interpntado, em relação a estas corporaqões, o
art." 166k do codigo civil, e revogada a legislação contraria a. esta.,
O art.0 1661 do codigo civil estabelece a seguinte disposiçào: %&o
podem comprar bens immobiliarios a s associagões ou corporagões per-
petuas, senão nos casos e pela forma em que por lei lhes é permittido.,
Se, pois, a lei de 26 de julho de 18% e'lzterpretoec nas condições refe-
ridas o art.0 1561 do codigo civil, segue-se que já por lei era permittida
ás levadas a aoquisiçao d e bens irnmobiliarios por qualquer titulo justo.
Mas a lei que auctorisava taes actos directamente não era o codigo cr-
vil que ern nenhuma parte allude sequer a taes instituições. Era evi-
dentemente o direito antigo, consolidado já, sob o regimen constitucio-
nal, pelo art.0 3.0 da 1,gi de 12'de novembro de 1841, direito quo o poder
legislativo implicitamente declarou em vigor pelo mesmo diploma de
5% e! julho de 1b88.
92 PORTUGAL EX AFRICA

A lei d'esta data veiu pi3r em evidencia a personalidade juridica


perfeita das associaçóes, a que ella s e refere, e sanccionar ao mesmo
tempo o uso e costume segundo o qual a administração das levadas
passou de juizes nomeados pela auctoridade publica para juizes e com-
missões directoras eleitas pelos mesmos hereos, reservadas á assem-
b16a geral d'estee a s deliberações de maior importancia. Significa isto
que o poder legislativo, longe de ter mostrado até hoje o pensamento
de reduzir o direito histarico das levadas. manifestou já o de desenvol-
vel-o, segundo a s necessidades e conveniencias do districto e do Estado.
Quanto á carta d e lei de 21 de maio d e 1896, veiu consagrar o direito
que a s levadas teem 6s aguas que a s abastecem, o que é importante,
pois n'isto se envolve o pensamento interpretativo de que as fontes e
correntes respectivas não pertencem nem podem pertencer, no todo
ou em parte, a nenhumas outras entidades ou pessoas, e portanto aos
donos de predios, marginaes ou onde h a nascentes, apesar das dispo-
s i ç 6 h geraes do codigo civil em favor d'estes; pensamento interyreta-
tivo que redunda no d e que o mesmo codigo, em tal assumpto, n5q é
applicavel á Madeira.
Mo art." 1.0 d'esaa lei foi auctorisado o governo a pôr em concurso,
segundo a s bases a ella annexas, a construcção e exploração de leva-
das no archipelago rnadeirense. E na base 7.8 âssenta-se que "a em-
presa aerá obrigada a respeitar as aguas que abastecerem levadas per-
tencentes a hereos.,
SENHOR.Se assarmos ngo r&aacongideyar_os tactos d7ente,~~odo,
e ' w o r à o em+éiflg-gI'a +i<ii;b~b- daslgii-c[a~~~g?:~.~
açtyã;~ e j p ,e 8-9
n e c e s s ~ ~ d "inst;Cfies
es a que n'este importante assumpto os interesses
pXblicos e privados mandãm attender.-
A s perturbações que acompanharam a implantação do systema li-
beral; o direito individualista gue d'elle sahiu, principalmente pela
acção extraordinaría di: Mousinho da Silveira; o destino que d'ahi re-
sultou aos beos da coroa e das pessoas moraes em gesal ; a infiuencia
theoriea e pratioa do codigo civil, filiado na mesma escola ; o desconhe-
cimeato mais ou menos wcentuado da antiga legislaçiio especial das
stg~t.88madeirenses, no fõro; a tendericia d'este para se guiar pelas leis
comrnuns e pelos factos e condiqões do continente do reino; a doutrina
da soberania absoluta d a propriedade privada sobre o solo e tudo o que
n'elle s e encontra; a propensãe do uso e costume para crear o dominio
perfeito; e a expansão d a população e a s acquisiçòes de terrenos nos lo-
gares altos d'esta ilha-tinham de operar nas levadasuma tranuformaç&o
consideravel e de possibilitar abusos e idéas contra a s prerogativas
d'essa, instituiçào tradicional e a s convbniencias do publiçt, e do Estado.
Sob o governo contitucional ainda se fizeram algumas nomeações of-
ficiaes de juizes para a admiiiistração d a s levadas. Mas n a s respectivas
w t a s , os governadores já não mencionavam o principio de que a
propriedade das aguas era do Estado, apenas invocavam o seu direito
de superintendencia e inspecção, e mandavam fazer a "repartição das
mesmas aguas pelos lavradores e mais pessoas por quem devam repar-
tir-se,, szndo estas expressões equivalentes ás que antes se emprega-
vam, quando se dizia que a distribuiç&o devia ser feita pelos "habican-
tes e colonos que s&o comprehendidos nos giros estabelecidos na con-
formidade das Provisões, de 1493,1502 e 1770.
Pouco a pouco as levadas passaram a ser administradas por juizes
e comrnissGes, não d a nomeaçáo da auctoridade superior do districto,
mas de eleição dos hereos, que ao mesmo tempo foram sendo conside-
rados, não meros usufructuarios. mas sim proprietarios das aguas.
Estas tornaram-se definitivamente objecto de transacções, com ou sem
os predios a que pertenciam pela repartição tradicionalmente feita em
harmonia com a s provisões antigas, entrando o proprio Estado n'este
regimen pela venda das que cabiam aos terrenos desamortisados.
A S A G U A S E AS L A V A I ) A S DA MAIJEIRA 93

Desde que a administração das levadas *deviana;turalmente recahir


em pessoas da confiança dos proprios hereos, que a s construiam, ou a s
conservavam com o seu capital, e melhor podiam conhecer e zelar os
seus interesses, doutrina abertamente sanccionada elo art." 1." da lei
de 26 de julho de 1888; e uma v e z q u e tanto importa a propriedade
completa como o usufructo perpetuo, principio talvez admittido indi-
rectamente pela mesma lei n'este assumpto, o unico abuso notavel,
que de tal evoluçào resultou,. foi a acquisição de aguas por quem nào
tinha predios, produzindo exploraçòes que elevam desorganisadora-
mente os preços d'ellas, e esmagam em muitos pontos a agricultura.
Ao mesmo tempo, os proprietarios confinantes com as ribeiras, em
algumas partes, foram fazendo n'ellas sacndas, muitas vezes destruidas
por ordem dos hereos, e algumas vezes toleradas forçadamente, pela
repetição do facto abusivo e difficuldade de o estar continuamente eli-
minando. As sacadas, o mal mais grave com que póde luctar uma le-
vada, consistem em pequenas paredes de pedra e torr6es de argilla,
atrclvessadas na corrente, fazendo derivar a s aguas p a r a terrenos da
leito das ribeiras, que não deviam ser cultivados, ou p a r a os das ver-
tentes, que deviam estar sujeitos ao regimen da arborisação. As leva-
das, que só mais abaixo encabeçam com a s ribeiras, ficam assim ape-
nas conl os escoamentos, muita^ vezes pequenissimos, prejudicando-se
enormemente a agricultura nas regiões fecundas da beira mar.
Por outro lado, aIgumas das nascentes de predios situados nas ba-
cias d e levadas, principalmente algumas das que nâo estavam ainda
bem conduzidas para os regatos e ribeiras, foram sendo, até cerca de
1860, usadas ou distrahidas pelos respectivos proprietarios, que para
,este fim construiram tanques ou poços, fazendo-sc transacções sobre
essas aguas.
Até a mesma epocha approximadamente foram tiradas algumas le-
vadas novas, peta reunião de nascentes e fontes que faziam parte d a s
bacias das levadas primitivas.
Estes factos determinaram por vezes pleitos, não s e tendo, porém,
fixado uma juri~prudenciacerta e razoavel, por desconhecimento da
legislação especia 1 e condições excepcioaaes da Madeim. A que&%
das samdus ~ h e g o ua ser resolvida contra os donos das terras margi-
naes, e m nome do direito tradicional das aguas, e contra as levadas,
em nome de uma pretendida posse antiga, apesar de s e oppor a prin-
.cipios imprescriptiveis. A das nascentes situadas em predios privadoa
foi decidida já contra os proprietarios, quanto á faculdade de tirar as
aguas para fóra d'aquellea, e contra a s levadas, quanto ao poder de
ussr as aguas nos mesmos predios, sem que se possa achar a lei que
dispõe esta originalidade contraria ás necessidade8 e circumstancias
da ilha.
Na epocha que agora decorr.e, a s administrações das levadas, exer-
~ e n d ouma grande actividade, veem procurando aproveitar melhor a s
nascentes que lhes pertencem, e desembaraçar a s correntes das respe-
ctivas ribeiras, onde quer que surjam obstaculos. Mas ao mesmo tempo
alguns donos.de predios, guiando-se pelos conselhos de utis e pelos
exemplos de outros, tratam de apossar-se de nascentes e fontes nas
condições referidas, ou impedem o seu melhor aproveitamento, ou que-
rem manter a todo o transe a s sacadas, ou ameaçam mesmo fazer ou-
t r a s Umas vezes os donos de predios marginaes fazem uma sacada, os
hereos mandam ou vão destruil-a, o d'ahi a pouco apparece ella feita
de novo. Outras vezes, os hereos mandam fazer obras, em geral peque.
nos canaes, atravez dos terrenos onde h a nascentes, para melhor con-
.ducçi%odas aguas d'estas; e succedeu já irem os proprietarios dos rnes-
mos terrenos e pessoas .da mesma região acabar com tudo n'um mo-
mento. E' o reinado da anarchia.
Todos querem a posse, e acontece que, para prova d'ella, alguns
-espiritos imaginam, que é applicavel a uns e outros o 5 unico do art.
94 POBTUGAL EM AFRICA

438.O do codigo civil, pelo qual "a prescripção só será attendida para os
effeitos d'sster artigo, quando recáiâ sobre opposição nQo seguida, ou
sobre a constrz(cção de obras no predio superior de que possa iftferirse nban-
dono do primitivo direito.,
Esta interpretaç&o é pbantwtica e erronea. Com effeito, ainda
quando supponhamos sujeito o assumpto ao codigo civil, o direito dos
hereos, pelo proprio art. 438.0 fundar-se-ia sempre lia lei antiga., que já
se examinou, e nunca na prescripçdo. Esta é visivelmente mencionada
no $ unico do mesmo artigo, para outros casos, e até apenas em favor
de quem usa das aguas contra os direitos dos donos dos predios mar-
ginaes, e não em favor d'esfes, que em seu beneficio teem as regras ge-
raes dos art. 434." a 436.0,sendo de futuro irnprescriptivel o respectivo
uso, segundo o art. 433 E as expressões - ou sobre a construcção de
O.

obras no predio hfm'or, de que possn inferir-se o abandono do primitivo di-


-
reito n&o se podem aju8tar á questào na Madeira, ainda pelos moti-
vas seguintes:1.0 Porque n'esta ilha a questiio não é entre predios su-
periores e predios inferiores, mas entre predios e levadas. 2.0 Porque
a8 levadas tanto podem ter necessidade de fazer obras acima como
abaixo d'esses predios. 3."Porque a posse das levadas não se pode pro-
var por obras, visto que em geral as aguas correm soltas pelos terre-
nos, regatos e ribeiras at$ encontrarem a madre das mesmas levadas,
mas sim pelo uso constante e tradicional de taes aguas. 4.0Porque os
predios nào teem, por nenhuma lei, como vimos, direito que possam ou
n&oabnridonar.
A interpretação a que alludimos é, pois, absurda e cdprichosa, e en-
vol-cré uma profunda inversão de termos e de idéas No entretanto, tem
já força para complicar as coisas, e tornar mais difficil e até arriscado
o mero emprego d a acçiio posses~oriapelos hereoe.
De tudo isto não resylta apenas o estarem prejudicialmente retra-
hidas as adminiritrações de algumas levadas e não poderem ellas em
k e s cpndições fazer todas a s obras indfspensapeis para o melhor apro-
veitamento das agtzas, e portanto para o desenvolvimento da agricul-
tura, da economi~maàeirense e dos reditos do thesouro. Ha ainda som-
bras e perigos mais ou menos inqui&adores, e a possibilidade de
grandes despesas, que deviam ser desnecessarias e que porventura se-
r8o algumas vezes inefficazes, apesar das garantias do direito, que não
B bem cunhecido, e que na prztf,icstesta tendo varias interpretações ab-
suràas.
Se exceptuada a modificação favopavel aos heroes, que se fez pelo
art. 1.0 d a lei de 26 de julho de 1888, considerarmos vigente a legislação
antiga, doutrina que é a verdadeira, as levadas podem a todo o tempo
acabar com todas as sacadas, com todas as letradas novas tiradas com
aguas das suas bacias, e com todos os desvios de nascentes suas, effe-
ctaados por tanques e pows, ou por outra maneira, e explorar e cana-
lisar todas as fontes que lhes pertqncem, sem que se possa allegar,
contra estas reivindfcagões, nem ki, nem titulo: nem uso ou costume,
nem posse, mesmo imrnemorial. hlaa as destruiç6es de posses, e espe-
cialmente as acgões possessorias e oydinarias tinham d e ser em nu-
mero algum tanto aonsideravel, e muitas vezes compltcàdas, em vista
das- idéas e tendencias anomalas que vão lavrando em tal assumpto.
Alem d'isso, podia, ser inafficaz para os hereos, n&osó a acção posses-
soria, pela interpretaçà;~absurdissimmb do j5 unico do art. 438.0 do codigo
civil, j A aaíludida, mas porventura, em alguns casos, a propria acção or-
dinaria, ao menos em parte do pedido legitimo das levadas, pela dispo-
sição que ha para se tomar por norma as coisas e factos do continente
do reino e se applicar o systema individualist~+ e as regras da prescri-
pção do citado eodigo, sem se medir bem a força do direito antigo, das
leis que directa ou indirectamente o sanccionararn desde 1841, e'das
condiqdes e necessidades particulares da Madeira. Finalmente, como a s
levadas novas e tanques e poços com mais de 30 amos de existencia
A S A G E A S E A S LAVADAS DA MADEIRA 95

estão servindo regices importantes, se a s levadas primitivas fossem


ainda n'essa hypothese reivindicar os seus direitos, e o conseguissem,
teriamos graves pertiirbaç6es economicas, que ninguem decerto quere-
ria affrontar.
Se supposermos applicavel o codigo civil, appellando para os seus
art. 438." e 444.0 unico, e julgando ainda imprescriptiveis os direitos
adquiridos das levadas, doutrina erronea, mas admittida por alguns, os
hereos podem, como se deduz das conclusões a que atraz chegámos,
mandar ct todo o tempo fazer. o que lhes seria permittido se vigorasse
a lei aiitiga. Nas, n'este caso, a s difficuldades e consequencias seriam
as mesmas que n a hypothese anterior.
Se finalmente suppozermos que, sendo applicavel o codigo civil, os
direitos adquiridos das levadas tornaram-se prescriptiveis desde o co-
meço da vigencia do mesmo codigo, interpretação insustentavel, e que
no entretanto corresponde á s tendencias e opiniões de certos espiritos,
desde logo s e deduzem a s duas seguintes conclusões:
1.0A posse das sacadas, das levadas novas e dos poços, constituida
antes do codigo civil pode dar origem a dominio desde 3 de março de
1898, se se verificarem as condições geraes da prescripção; o que quer
dizer que a s levadas antigas podem antes do tal data interromper ou
destruir essa posse, ou, na maioria dos casos, intentar acçôes ordina-
rias de reivindicação ;
2.0 A posse das sacadas. levadas novas e poços, constituida depois
do codigo civil, pode produzir o dominio 30 annos depois do dia do seu
começo, sempre difficil de determinar, podendo, no entretanto, ser an-
t e s interrompida, ou anniquilada pelas levadas antigas, que e geral
teern de recorrer á acqão ordinaria egualinerite.
E' obvio, porém, que ainda por este rumo encontramos os mesmos
escolhos e males que vimos nos casos precedentes.
E ainda ha, tambem por considerações juridioas, um aspecto muito
mais grave n'este assumpto Sempre que os donos de predios tentem
apropriar-se de nascentes n'elles incluidas; quasi sempre que a s leva-
d a s as queiram melhor aproveitar; e quando quer que os proprietarios
d e terrenos marginaes pretendam fazer sacadas - os hereos teem de
recorrer ás acções ordinarias, com todas a s despesas que isto envolve-
rá, e com todas a s contingencias a que por vezes estará sujeita uma
t a l senda, por circumstancias que temos já mencionado. Se quizessem
valer-se da acção possessoria, o que tambem seria dispendioso, haveria
riscos serios, por não haver obras de arte, mas sim a lei e o uso, em
geral, em favor da sua posse, e por ser possivel dar-se ~nterpretações
absurdas ao 5 ianico do a r t 438.0do codigo civil.
Accresce que as circumstancias e tendencias já creadas podem tra-
zer, por outro modo não indicado ainda, difficuldades e perigos extraor-
dinarios á vida dos municipios, cujos direitos e interesses s e alliam
n'este assumpto inteiramente aos dos hereos. As ievadas, e;m quasi toda
a ilha, fornecem á população a s aguas potaveis, de uso culinario e de
limpeza domestica, abastecem os lavadouros publicos e destinam-se
tambem aos serviços geraes da hygiene, prendendo-se, portanto, com
a s necessidades concelhias fundamentaes. A isto não pode deixar de
attender de uma maneira especial o governo de Vossa Magestade, sendo
certo que por causa das sacadas j6 aconteceu faltar sgua para as ur-
gencias diarias de grandissimo numeto de casaes de uma parochia, e
que a successão d'esses e de outros abusos pode originar males e per-
turbaqões formidaveis.
ConvBrn lembrar, por fim, que ao lado dos direitos e interesses doa
hereos e dos municipios, estão, n'este assumpto, os direitos e interes-
s e s do Estado, não apenas por tudo Q que fica exposto, mas ainda por,
outros factos e motivos de grande+significagãoe peso O Estado é at6
96 PORTUGAL EM AFRICA

certo p a t o hereo de levadas particulares, quanto ás aguas pertencen-


tes a entidades sujeitas á8 leis geraes de desamortisaçao E ao mesmo
tempo, o que 6 mais importante ainda, o Estado B proprietario de va-
rios aqueductos, sendo evidente que a s tendencias anomalas e abusi?
raa, que temos mencionado,podem tarnbem crear-lhe situações difficeis
e precarias.
SENHOR.Uma incerteza geral, aliás infundada, acerca da lei vigente
no assumpto de que se trata; um estado de anarchia pela construcção
e destruiçi3o de obraa na bacia dos aqueductos de irrigação; uma ten-
dencia, ainda incipiente. mas d'aqui a pouco desenvolvida, para serem
usadas as a m a s das nascentes pelos predios onde se acham, e as das
ribeiras pelos brrenos marginaes; uma propensão, por isso mesmo, em-
bora distante, para se tornar a região das mattas em campo de cereaes,
legumes e hortaliças, e a regiiio da vinha, da canna e dos outros pro-
ductos preciosos em deserto arido e quasi inculto, apenas adequado a
algumas searas transltorias e arvores de fructo sem rendimento, com
todas as consequenciw que isto importará ao regimen pluvial, á segu-
ranga das povoações da beira-mar, á economia do districto, á densidade
e á, vida da sua população, ás necessidades e interesses dos municipios
e &a fontes de receita do Esta,do; a possibilidade de se haver de inten-
tar uma serie consideravel de acções, dentro de pouco tempo, com des-
pesas avultadissimas, para sustentar os direitos dos hereos; uma op-
osiç8.0, ainda pequena, mas jS bem prejudicial, ás explorações e me-
Pheramentios que elles razoavelmente querem fazer, para ficarem maia
abastecidos os canaes de rega e dar-se á agricultura condições de pros-
peridade; e portanto um retrahimento natural que impede em alguna
pontos as iniciativas para o maior aproveitamento das aguas - taes
aáo os Cactos que tornam desagradavel a situação das levadas da Ma-
deira, cujo numero 6 de algumas centenas, cujo valor deve ascender a
milhares de contos de rdis, e cujo papel e influencia no trabalho, no
movimento e na riqueza da ilha, por nenhum outro factor podem ser
sobrepujados.
40 que fica exposto n'eata representação, deixa ver, SENHOR, qual
o caminho que assumpto d'ella os interesses do Estado e da, Madeira
20
e o direito vigente mandam seguir.
Como principio fundamental deve ser declarado que continua a vi-
gorar o art. 3.0 da lei de 12 de novembro de 1811,quanto ao dominio e
80 uso das aguas da Madeira e aos direitos annexotl ao mesmo uso, fi-
cando assim interpretado o art 5 0 da carta de lei de 1 de julho de lt.67,
que approvou o cordigo civil, mas sem prejuizo da lei de 21 de maio
de 1896 e dos actos a que ella deu origem.
Ao mesmo tempo, já para facilitar a applicação d'essa regra capital,
j6 paro evitar a' possibilidade de reivindicações de direitos antigos, com
prejuizo de interesses importantes de regiões agricolas que se desen-
volveram com aguas desviadas d e levadas primitivas, cremos indis-
peasavel estabelecer-se que ficarão garantidas as posses constituidas
pbr obras de arte de caracter permanente quando tenham maie de um
certo e determinado numero de annos e não hajam sido interrompidas
ou impugnadas por qualquer forma no mesmo periodo. Parece que para
tal effeito devam ter mais de trinta annos, condiçà;~geral da prescri-
pção, embora esta não seja o fundamento da tolerancia transitoria de
ue se trata. Menos de cinco, seguindo as indicações d a lei commum
8 cerca da mera posse, de maneira nenhuma se lhes pode exigir, tanto
mais que desde o começo da decada actual é que principiaram a surgir
a s novas tendencias já descriptas contra os direitos dos hereos
A-autonomia administrativa das levadas, reconhecida pela lei de 26
de j ~ i i C i = f ~ ~ ' d é tambm
'v~ ser maritida inteíram'ente 23' na epoea
presente a melhur garantia da agricultura.
AS A G U A S E AS LAVADAS DA MADEIRA 97

Este dociimento foi assignado pelos srs. visconde de Cacongo,


visconde do Ribeiro Real, barao de Xora, dr. Maniiel José Viei-
ia, Luiz Gomes da Conceição, Jordzo de Freitas Bettencourt, dr.
Xrino Ferreira Jardim, Jogo de Caires Camacho e João Maria Hen-
riqiies, representantes das levadas do Bom Successo, do Pico do
Cardo e da Serra, de Santa Luzia, dos Peornaes, do Curral e Cas-
tellejo, da Magdalena, do Piro do Arvoredo, da Asenha e de Rai-
xo, e das Calles. Progressistas iins, regeneradores outros, e inde-
pendentes os restantes, cooperavam todos de harmonia para um
fim commiim, defendendo os direitos das levadas de hereos e do
Estado e os interesses economicos geraes do districto.
Temos 1.az5es para affirmar que nao faltaram bons esforqos
subordinados aos principios e intuitos da representa~Lio.
Depois tudo se concent~ou,como dissemos, no assumpto das
levadas do Estado e dos servigos Ziydraulicos. Adiante veremos a
solução perturbadora e inacceitavel que no mesmo plano se consa-
gra para a questSio jiiridica.

O contracto das levadas

A maior parte das nascentes e correntes-de agua da Madeira


estiio canalisadas, embora em muitos pontos nSo seja cumpleto o
aproveitainen to.
Cuasi todas as levadas, que devem ser cerca de quatrocentas,
pertencem a partkulares. Bom é dizer-se desde j á que represen-
tam um -capital de muitos milbares de contos de reis. As aguas,
que em algumas regiões teem mais valor do que a propria terra?
siio o sangue da Madeira, o primeiro elemento de vida e de ri-
queza da sua populaç80, o factor preponderante e fundamental da
sua economia int.eira.
*- -
0,"F;stado possue a levada"nova e -a levada volha. do Kabaçal,,
e v -.++ -
AI - %

a do Juncal, a do Furado, e a da FajZ dos Vinhaticos. Come~ou


tambem a construir tres - a do Caniço, S. Gonçalo e Santa Ma-
ria Maior, a de S. Vicente e Ribeira Brava e a do Coqiiim. Ou-
tras s5o ainda iiecessarias, n2o podendo, porém, o seli numero ir
decerto alem de dez.
Paralysados OS trabalhos, por se terem exgotado as verbas e
haverem cessado as do,taftGesrespectivas, gregos e troianos, progres-
sistas, regeneradores e neutros, opinavam em 1896, mais ou me-
PORTUCAL EM -
AFRICA Março, 1898 -VOL V. 2
98 PORTUGAL EM AFRICA

nos influenciados por alguns homens de iniciativa, que as obras


hydraulicas, tanto nas levadas já em constriicção, como nas que
o não estavam ainda, deviam ser adjudicadas a uma empresa de
capitaes particulares.
Esta solugão, era um erro, aggravado pela situaçso existente,
que ia determinaririvalidades e luctas prejudiciaes e lamentaveis.
As -.-l_".---.."-
C^L-
aguas da Madeira
.. nllo devem sahir 6-0s do Estado
r h h x a d ~ r e - ppna
q ~ ~de~ perturbações economicas ~rofundas,
tanta mais que nenhuns intermediarios, ainda que se alliem áquel-
les, podem tirar lucros razoaveis, que não lesem os interesses do
Estado e da agricultura.
Obedecendo, pordm, a esse movimento geral dos espiritos, o
parlament,~votou a lei de 21 de maio de 1896, que estabeleceu o
s0guint.e :

aArt. 1 . O E' o governo auctorisado a adjudicar em concurso


publico, e segundo as bases annexas a esta lei, a construopão e
explora@o das levadas de agua de irrigapzo no archipelago da
Madeira, pertencentes ao Estado, e bem assim a construcçEo e ex-
ploriç20 de novas levadas, quer para a reparti~foe distribiçao
das fevadas hoje existentes, quer para o aproveitamento de novas
aguas que convenha captar e conduzir em beneficio da agricul-
tura n'aquella ilha. D

Aberto o concurso por decreto de 18 de junho do mesmo an-


no, e completadas as bases pela portaria de 22 de julho seguinte,
que ainda tornou mais irrealisavel o projecto, appareceram apenas
duas propostas, sendo uma dos srs. Adriano Trigo e Roma Ma-
chado e outra do sr. Manuel Alexandre de Soiisa. O ultimo offere-
cia mais vantagens ao Estado e á agricultura, e a elle se fez a
adjudicaglo.
Quasi todos recoiiheceram logo que o contracto era inexequi-
vel. N'este sentido formiilou tambem ha pouco o seu parecer, se-
gundo coiista. officiosailiente, u cuiiseilio superior de obras piibki-
cag e minas.
Q peior de tudo, pordm, foi a lucta de interesses que reben-
toii, desde o começo, em rolta do emprshendimento que todos
apontavam como util u recommendaval. O espirito desapaixonado,
olhando para as coisas e oslfactos á luz das conveniencias do Es-
tado c? dos povos da ilha, tem de assignalar n'este ponto a ver-
A S AGUAS E AS LAVADAS DA M A D ~ ~ I R A 99

dade, naturalmente indicada para influir nas solu~õesque se tor-


liam indispensaveis.
>i peleja travada entre os srs. Adriano Trigo e Roma Macha-
do e o sr. Alexandre de ousa. tomou depois o aspecto de uma
guerra systematica e sem t;eguas contra a concessão, e ainda que
esta fosse viavel não poderia resistir. Se o ultimo tinha entzo a
seu lado a força da lei, os priineiros dispunham, da força do
~ o d e rexecutivo, superior á primeira no nosso paiz.
E' evidente que, feita a adjiidicação, devia ser acatada pelas
estações offiçiaes, ainda quando não fosse sen3,o para livrar o go-
verno de responsabilidades nos achaques ou na morte da empresa.
Cremos que até em taes rasos se deve dispensar todas as facilida-
des possiveis, dentro dos limites da lei e da equidade.
E m vez d'isso, por&m, de todos os expedientes se 'tanqou mão
para cangar e dissuadir o concessionario. Sabe-o toda a Madeira,
tem consciencia d'esse facto o governo, e no proprio ministerio
das obras publicas devem existir algumas provas documentaes de
que tudo se empregou n'esta campanha' official, completada pela da
imprensa.
O concessionario veiu, por fim, a Lisboa, onde, segundo nos
consta, o sr. Augusto Jose da Cunha, lhe disse que se mantivesse
até ser tomada uma deliberaçgo, ácerca das condigões da resci-
são do contracto. A gestação vae já no oitavo mez, e o parto
promette exigir mais de nove, por ser de especie differente da hu-
mana.
Q,uem
--" -
administra hoje as levadas do Estado ? Quem faz agora
n'ellas as obras de reparaçgo exigidas pelos effeitos das ultimas
invernadas'? Quem arrenda aos agricultores as aguas, visto que tem
havido estiagens na Madeira e o verão se approxima j$?
O concessionario? Mas o contracto e os factos subsequentes
prenderam-no em Lisboa, fechando em volta d'elle a muralha da
China.
A direc~fiodas obras publicas? Mas está de pé a concessiio,
que não se soube rescindir a tempo, ou fazer executar com as mo-
dificaqões necessarias.
NZo nos alonguemos em considerações, tal é o desejo de não
sermos desagradavel a ninguem. Mas n%opodemos deixar de di-
zer que o Sr. Augusto José da Ounha, ministro das obras publicas,
em condições muito especiaes, porque 6 ao mesmo tempo depu-
tado pela Madeira, assumiu, pc& mais de um titulo, n'esta ques-
mo PORTUGAL EM AFRICA

tilo, responsabilidades importantes c0111 as siias irreso1iiy;jr.s r fra-


quezas interminaveis.

O regabofe hydraulico

A sciencia e a arte de bem administrar não podiam ficar por


aqui. Trabalhavam, no meio de tudo isto, para o advento de uma
nova solugo governativa.
As oircumstancias e o caracter da guerra n2o permittiaiii, evi-
dentemente, que se pensasse em outro concurso e o11tiia adjudica-
$&o. Adoptou-se e propoz-se ao governo o projecto do rrgabofa
hydraulico, de que a portaria de 7 do corrente 6 apenas um pe-
queno signal, e que algiins ministros na siia boa fE. acharam wb-
stancialmente acceitavel.
Vender as levadas do Estado, crear na Madeira uma circiim-
scripg80 hydraulica independente, mais ou menos semelhante á s
duas unicas que existem no reino, applicar-lhe sem modifica<;ões
esseneiaes o decreto n.O 8 de 1 de dezembro de 1892 e o regula-
mento de 19 do mesmo mez e anno, accrescentar ás disposições
d'esses diplomas a de que podem ser reivindicadas as posses intru-
sas, pela expropiiaç2lo-dasobras respectivas, e de que o producto d a
diena$o dos aqueductos do Estado entrará no ftlndo especial da
nova organisação, taes s(io as linhas principaes do plano que s e
pretende fazer triumphar. Dar um golpe fatal nos interesses d o
Estado e da agricultura, na institui~;&otradicional das levadas d e
hereos, na independencia e na utiliílade das suas administraqões,
causando uma profunda perturbaygo na economia da ilha; estabe-
lecendo no regimen das aguas o reinado da arbitrariedade, d&
cumpadrio e da anarchia, e prolongando fiinsstamente em volta
d'ellas a lucta de intermediarios e do adventicios de differentes es-
pecies qiie surgiu com tão mau caracter, eis o qiie significa, n a
realidade, a solu~ãoapresentada.
Vender as levadas do Estado seria uni erro gravissimo, em
face cla situação poiitica e economica da Madeira.
Diz-se que se obteria um capital relativamente pequeno, por-
que a alienagilo nfo deveria ser feita em condipGes onerosas para
a agricultura, cujo dssenvolvimento deve ser o fim principal do
Estado. Sapponhamos que era justa e boa a proposta, e que ngO
coniewaria ahi o precioso regabofe, assumpte qiie a seu tempo
A S AGUAS E A S L A V A D A S DA MADEIRA 101

se deve esclarecer em publico. Ainda ein tal caso diremos que, já


pelas circumstancias politicas actuaes, já pela falta de dinheiro que
se nota em muitas das regiões interessadas, já pela existencia de
elementos que se preparam para compras avultadas, lançando mNo
tambern de intermediarios, sendo certo que são facilimas as simula-
ções, a s aguas seriam monopolisadas em grande parte. O enriqueci-
mento de poucose a reducção de muitos á miseria, eis o que se veria
de repente. 'Depois, os que tivessem adquirido em demasia impoi*iam
successivamente um jugo formidavel a qiiasi todos os outros, por
meio d e arrendamentos, cada vez mais onerosos e esmagadores.
A perturbaçso seria enorme e irremediavel.
Ao mesmo tempo, que destino seria, especialmente quando con-
deramos o estado miserrimo da administrac;#o e da politioa da
ilha, e as variadas soffreguidaes existentes em volta das aguas, o
d7esseproducto apurado pela venda 3 Uma grande parte seria consu-
mida rapidamente nas voracidades multiformes do organismo hy-
draulico projectado, em empregos, em trabalhos de gabinete e de
campo, em ajudas de custo, em projectos, em plantas, em tudo o
que a ingenuidade, o desvario ou a prodigalidade inventassem; em
tudo o que n8o foi preciso para os nossos antepassados construirem
centenas de leradas fecundantes. O resto seria decerto para obra9
effecfivas, mas obras realisadas nos pontos onde as amizades, e as
influencias o exigissem, e caracterisadas ainda em geral pelas ar&-
truiedades e abusos 'que o $ano torna possiveis.
Isto ainda n2o 6 tudo. Realissndo-se a venda, a grande pra~
cnra e applicaç%o de dinheiro faria escassear e encarecer os ca?
pitaes, prejudicando-se de um modo especial os ernprehendimeni
tos agricolas. 'Os aggravamentos, as difficuldades e as pwalysa-
ções ir-se-iam reflectir exaotamente nas obras hydraulicas parbi-
culares, unicas que a tradipilo, a experienoia e o espirito pratico
recomendam, ao mesmo tempo que as necessidades as exigem
sem interriipç80. O mal eeonomico tornaria,. no proprio systems g ' í ~
projecto, pesado, difflcil, ou at8 irnpossivel o concurso privado que
elle impõe para a exploração ou maior aproveitamento dos ms-
nanciaes da*s&ias bydrographicas. E s estes desequilibrios, sd-
versidadas e damnos ngo corresponderiam nenhumas compensa-
@es Serias.
Nko se çomprehende, por outro lado, como se pode aceriairr
a lououra de.p@ na pequenina Madeira o organismo hydraulico da
metade do continente do reino, embora com algumas modificepóes,'
102 POBTUGAL EM AFBICA

A ilha j&B montanhosa de mais para esta accumulagão, que a fa-


-158 tombar. Aquelle engenheiro director e aquelte engenheiro ad-
joncto; aquelles serviços internos, externos e de recepção de fun-
dos e pagamentos; aquellas secções de expediente, de contabili-
dade e de desenho e organisaçso de projectos ; aquelle pessoal te-
chnico, administrativo e jornaleiro; aqnelles conductores, desenha-
dores e anxíliares, chefes, apontadores, thesoureiros, amanuenses,
mestres, gosrdas de depositos, oontinuos e operarios, representa-
riam, ainda com as diminuiç2les que lhe fizessem, uma monstriio-
sidade incapaz de seFsustentarile p6 na Madeira.
derviria este grande corpo sedento, como observámos já, para
exgotar depressa, com muitos planos e poucas obras, o producto
liquido da venda das levadas do Estado. Acabada esta nascente,
prestaria ainda para ir bebendo todos os mananciaes que o Esta-
do, os rnuni'cipios e directamente os agricultores fossem pondo á
sua disposiçgo. A Madeira n8o tem agua doce bastante para tão
didorine estomago hydraulico.
Bdenos comprehensivel e mais estonteador ainda, ao pensar-se
na Madeira, 8 squelle exercito de 436 artigos, que se conteem no
deoreto de 1 de dezembro de 1892, e no regulamento de 19 de
dertmbro do m e b o anno;
Essa legiànpão para aguas salgadas das cost-as, euseadas, ba-
h b , p r b 9 as%i$ci~eqdocias>fmes, fias, esteiros, caes, e praias;
p & kkgw, lagoas, canses, vallas e 'cerrentes navegaveis ou $o-
eta&veis;pms oorrentes n8o nnvegaaeei nem fiuctuaveis e aguas
p~tieulara; s para margens das mesmas correntes, lagos e lagoas;
para a pgieia de tudo isto e da navegagfo interior e , fluetuap$o
- 6 de famr perder a cabeça ou rebentar de riso, quando se
'e O S blhw na Madeira. A ilha, resto lendario da Atlantida,
apptlTece-nos outrs vez; transformada em continente, e a sua hy-
àmgraphi-s, egual 6 do reino, deve dentro em poiioo ser objecto
dos.tmbalhos de engenheiros titanicos !
E attenda-se desde jd a uma coisa importante. Os diplomas re-
feri* baseiam-se nas disposições do codigo civil acerca do do-
mínio e nso das sguas publicas, comrnuns e particulares. Repro-
dwem exactamente a doutrina inapplicavel b Madeira que moti-
vou a represen tagHo dos hereos acima transcripta ( I ) Obedecem,

(I) Tudo o qne n'ella se die 8, poia, applicavel n'eeta parte.


AS AGUAS E AS LAVADAS DA MADEIRA 103

pois, na sua contextura e siibstaicia, a iiui systema diametralmenta


opposto á legislaçso especial a tradicional da ilha, aos seus cos-
tumes, á siia econoiiiia, ás suas necessidades, á sua propria natureza
physica, e ao direito, ao interesse, ao pensamento e á vontade dos
seus agricultores. Tornariam logo, segundo a opinião mais facil de
formar-se, precarios e prescriptiveis os direitos das levadas, e so-
lidos e imprescriptiveis os que em detrimento d'ellas fossem crea-
dos nas vertentes e margens das ribeiras, pela audacia e pelo
roubo ! Fariam uma revolugiio juridica assombrosa, destruindo
vandalicamente, com a loiicura do presente, as cresgões da sabe-
doria do passado.
Particularisemos tambeili a primeira obra destinada á enge-
nheria hydra(i1ica - a (lelimitação das bacias hydrographicas da
Madeira.
Estabelece o decreto n.* 8 de 1 de dezembro de 1892:
Art. 7." Pelas direcções 'das circumscripqões proceder-se-ha em se-
guida á publicação d'esta lei, em cada uma das bacias hydrographicas,
á sua clasificação e demarcação, designando-se separadamente :
1.0 Quaes os lagos, lagoas, vallas, canaes, esteiros e correntes de
agua, ou parte d'elles, que devem ser considerados navegaveis ou flu-
ctuaveis, e como tal publicos, nos termos da legislagão civil e d'este
decreto ;
2.0 Qual a largura que deverão ter a s faixas de terreno destinadas
a constituir as margens d'essas correntes, esteiros, canaes, vallas, la-
gos ou lagoas.
Ar. 9.0:
$ 1.0 OS lagos, lagoas, vallas, canaes, esteiros e correntes de agua,
ou a parte d'elles que não fôr classificada navegavel ou fluctuavel, se-
rão considerados communs ou particulares, conforme n'elles se verifi-
carem a s condições dos artigos 2.0 ou 3.0.
Quer dizer, a delimitaçto fundamental diz respeito, apenas,
como nno podia deixar de ser, ao que B navegavtil e fluctuavel,
e portanto publico 110 sentido do coctigo civil, n2o havendo nada
d'isso na Madeira.
E mais adiante preceitua o mesmo decreto:
Art. 10.0 Concluida e approvada a classificação de que trata o art.
7.O, ou mesmo independentemente d'aquella classíficação e demarcação;
quando o governo o ordenar, por motivos de interesse ou beneficio pu-
blico ; a pedido da maioria 40s interessados; ou quando os directores
das circumsoripções hydraulicas o julgarem conveniente, estes proce-
derão ao estudo, classificaqão e demarcação da parte das b&8 hydro-
graphicm que se* fiecasario eestudar e conhecer para o fim que se tiver em vis-
ta, sob os seguintes poqtos :
1.0 Quaes as vertentes dos lagos, lagoas, vallas, canaes, esteiros on
cOrrentes.de agua, quer publicas, quer communs, que para a conserva-
104 POBTUGAL E M AFBICA

ção dos terrenos, ou para melhor regihen das aguas, devam ser arbori-
sadas, simpiesmente enrelvados ou cultivados em socalcos;
2.0 Qual o perimetro que limita o terreno adjacente ás correntes de
a p i , vdlaa, canaes, esteiros, pantanos ou lagoas, não navegaveis nem
fluotuaveis, cuja conservação e regimen possa interessar os proprieta-
rios confinantes, quer para o aproveitamento e exgoto das aguas, quer
para a sua colmatagem, quer para a irrigação, executando-se a s res-
pectivas obras e occorrendo-se ao seu pagamento, nos termos do regu-
lamento que faz parte d'este decreto;
3.0 Qual a largura que deverão ter as margens da corrente, valla, ca-
nal, esteiro, pantano, lago ou lagoa;
4.0 Quaesquer outras designações e esclarecimentos concernentes á
baa applicaçào d'este decreto e regulamento que d'elle faz parte.

Significa isto que a classificaç30 e deinarca~aoesyeciaes, r@-


feridas ao que nlo é navegavel nem fluctuavel e a obras de con-
servação de terrenos e utilisaç5o de aguas e oiitras*semelharites,
coisas que nos apparecem na Madeira, por entre as variedades'
hydrographicas continentaes do art. 1 0 . O do decreto, dependem de
necessidades immediatas e fins que se tem em vista na propriâ
occasião. N'umd palavra, n80 6 um trabalho geral feito logo no
comepo do novo regimen.
Ora o projecto imaginado para a Nadeira, quer desde logo a
delimitagão fundamental e geral das bacias hydrographicas da
ilha, contrariando o systema do decreto e esquecendo que ali nlio
se verificam as condiç8es natiiraas e as r a z b s scientificas que ,lhe
servem de base. Passa ao mesmo tempo por cima da considerapEio
impreterivel de que as bacias das ribeiras e ribeiros da monta-
nhosa Madeira est8o bem assignaladas pela natureza, saltando
aos olhos de todos e podendo ser determinadas rapidamente pelo
mais humilde e rude camponea. Declara, em ultima analyse,
urgente uma operagiio dispendiosa e sem utilidade pratica, para
divers8o e goso do pessoal hydraulico.
E ' verdade que, segundo o proj ecto, n'essa inesqa cldlirnitação
se procuraria um resultado eff ectivo, determinando-se enttio quaes
as nascentes das levadas dos partic.ulares. Esta seria a unica ma-
neira de resolver, conforme ahi se pensa, a qiiestlo iuridica de
que trata a representaçgo dos hereos. Mas tal classificaptio e de-
marcapão, que já niio representam nem as do art. 7 . O nem as do
art. 10.O do decreto, que se oppõem mesmo a este absolutamente,
envolvem a rnultiplioação das despesas hydraulicas immodiatas,
uma inversão de principias e uma origem de perturbações.
Para realisar esse trabalho, se notarmos a divisHo e disperslto
das aguas da ilha, conclue-se 1080que seria necessario muito pes-
AS AGUAS E AS LAVADAS DA MADEIRA 105

soa1 r iiiiiito dinlieiro. AlAm d'isso, repugna á razáo theorica e pra-


tica que engenheiros, eonductores e desenhadores sejam eiicarrega-
dos de decidir questks juridicas, de fixar direitos privados, de esta-
helecer emfim a quem pertence o uso de nascentes e correntes ;
quando de mais a mais, discutindo-se se vigora uma ou outra lei,
por Causa da hermeneutica suggestiva dos exploradores, o assum-
pto reclama uma deliberaçgo do poder legislativo. Depois, quantos
favores, compadrios, abusos e arbitrariedades, q uan tas miserias
proprias dos nossos tempos, e por conseguinte quantos desesperos
dos povos r eonflictos sangrentos não sahiriam d'esta intervenpko
louca, odiosa e revoliante dos funccionarios civis e da politioa n a
vida intima dos cidadsos!
Como complemento d'esta idéa, na quastzo jjuridida, pretende-
se qiie se estabeleça o direito de pôr termo ás posses introduzidas
contra o direito tradicional, a que se refere a representaç80 dos
hereos, pagando-se por expropriaçZio as obras por meio das quaes
ellas foram constitiiidas. Mas entâo seria mais togico e recornmen-
davel a reivindica920 pura e simples. Julgamos, todavia, irrea-
lisavel, perigosa, e até em muitos casos prejudicial qiialqiier solupão
que nZo seja a que se apresenta e justifica no referido documento.
Olhemos para outro ponto capital e grave. Pret.enda-se nem
mais nem menos do que avassallar esse riovo organismo de s e r
viços piiblicos todas as levadas da ilha. A grande empresa hy-
draulica, sem concurso, sem adjudieaplo, sem deposito, sein emis-
&o de acg8es e obrigações, sem o menor risco, 'ou incornmodo,
com o seu pesboal interno e externo, com as suas relaqões dis-
persas, com a sua suj~igeiçiioa ,influencias, politioas ou privadas,
mas sempre dissolventes, nocivas e funestas, quando não fossem
amanhii corruptas e escandalosas, teria na sua dependencia,-
d'esta vez, todas as agitas da ilha - $0 Estado, dos munici-
pios, dos hereos e mesmo dos partieiilares -juntamente com as
obras e os capitaes correlativos. Regeria siiperiormente com s u a
m8o o movimento d'esta propriedade valiosissima, que offerece a
especialidade de constituir o que ha do mais in&mo, mais melin-
droso, mais disputado, mais fecundo na econoinia, no interesse, no
direito e na vida dos povos madeirenses. E ao mesmo pass,) des-
apyareceriam as assembldas geraes das levadas e a s suas commis-
sões directoras, que as administram gratuitamente, com sacrifiçiw
proprios, com uma actividade, uma fiscalisaçiio e em zelo por ve-
zes mais do que bdmiraveis.
AS AOUAY E AS LAVADAS DA MADEIRA 10'7

d'aqii-lla repartiçdo, outra pelo escriviio de fazenda e outro pelo


proprietario respectivo. E ainda Ita prasos para editaes, certiíica-
dos, reclamagGes, julgamentos, e tudo n mais que o systema exi-
ge, escripturando-se por fim o cadastro.
Entgo o director hydraulico fará a convocação de todos os in-
teressados da zona para comparecerem na secretaria da adminis-
tragão do concelho, apurando pachorrentamente os nomes d'elles
e o numero de votos de cada um, numero que será determinado
pelos rendimentos constantes do cadastro. A zona, por causa das
levadas e da coníiguraçno geographica da Madeira, pode compre-
hender regiões de freguezias e atd de municipios differentes. Os
inte~egsados,note-se bem isto, ngo sLio apenak os hereos, sao to-
.dos os proprietarios inscriptos no cadastro (art. 45.O do regula.-
mento), s#o todos os proprietarios da zona. Nos negocios funda-
mentaes e verdadeiramente privativos das levadas, como sâo to-
dos os que respeita& á eonservaç~Òe reparo das obras existen-
tes, ou á realisap30 das que determinem o maior aproveitamento
das nascentes e correntes, desapparecem as snas assewbléas ge-
raes, e as votaç?les de extranhos, admittid& mesmo para esses
casos pelo systema exposto, poderiam prejudicar os direitos, os in-
teresses e a vontade dos hereos.
Transcrevemos aqui, sem commentarios, sublinhando apenas o
que for mais significativo, a seguinte disposig80 do rsgulamen to,
que n'esta parte se pretende applicar :
Art. 44." A' reuniao dos interessados compete :
1.0 Baotser e designar qwrero as obraa aovaa a evnprehender na zona, epro-
videnciar sobre a cons'~rvaç$oe reparo das em+stentee;
2.a*Resolverse devem ser tres ou cinco os vogaes do gremio;
3." Procé fer & eleiçdo do8 vogue8 do gremw;
4.0 Fazer a nomeaçlio do8 empregado@,e fixar 08 saca'ho~zorariose a8 gra-
dificaçG~8nltraot dinaria8 aos v o g ~ e ado
' pemio;
5.0Resolver se deve ficar a cargo dos gremios, ou ser entregue á di-
recçgo da circuuacripçào hydraulica, a administraç50 dos valiados, val-
Ias, mattas, ou obras da zona, para aproveitamento das pastagens ou
de quaesquer productos das mesmas obras,.ou para beneficio dos mes-
mos gremios;
6.0 Resolver-se 08 prlyecfoa e obras deçerãa eer c~ecutadospelos qremioe qu
hydrazclica ;
@a cirnsrn~~rt~p@o
7.0 Fixar as multas aos vogaee do gremio ;
8.0 Tomar as demais resofug6es que interessam ao movimento a@
cola, n&otendo que apreciar ou discutir as obras que o governo, os distri-
otos, ou os municipios e os particulares tomarem a seu cargo exclusivo.
Como cfonseqiiencia necessaria, os gremios, cujas funcç0es s b
complexas, segiindo se deprehende jii do art. 44.' substitnem por
108 POBTUGAL EM AFRICA

seu turno as commiss5es e jiiizados actuaes das Ievaclas, nos ne-


gocio~especiaes d'estas.
E n'este ponto' convém trasladar os seguintes preceitos, sem
necessidade de considerações :
Art. 68.0 A cargo dos gremios estão :
1." A eleiqálo ou a escolha de um dos seus membros para presidente;
2.O Ou cstudos e projectos das obras para o rnelhorcrmorto agricola e do
regimeri das aguas n.a re*pectiz.a zona;
3." A adminÊetr.a@o e ~xectlçliodbelrstr#obrax;
4;O A dietribrriç4o por cada trrn dos i7rteressados (?a qqiota parte c, m que
e adcc utrc d'dlu deve corclribuir pn ra c18 deq~esaea .fazer;
5.0 A cobra~ç das quota* dos i~ct~resaudoa
I e outrue recuitas do gremio e n
pngamnzto das desj~esasfeitoai;

Art. 64.0 Em todos os gremios deve haver, emquanto durarem as


obrw :
1.0 Um enlprqg~ldo, tcclanico para fazer os projectos e dirigir a con-
8ia?lq380 das obras, proposto pelos mesmos gremios e approvrrtlo pdo
RGector da n'rntrnsmp~âoh?/dt.rittliça;
2." U m thecrnvreiro, para arrecadar as receitas e pagar as despesas
do rerni,o, que poder& ser um dos seus vogaes;
f: U m ucriplttrario, encarregado da escripturapãe e contabilidade,
aa quaes clevern eatar sempre em dia, e ser sujeitas ao exame esappro-
vagão do director da circumsciipção hydraulica, para o effeito da dia.
tribuiçiio das despesas.

Finalmente cumpre notar-se que s repartigtio hydraulica n%o


86 &a tendo orno aopito predominante na reuniãodaos interessados
e n a v i d e o s gremios, mas tambem pode substituir aquelles ou
estes em tudo o que 4 das suas attribuiçaes, e pode portanto con-
ceátrar e& si as fmuldades e os direitos das actuaes assembl6as
gerses e commiss6es administrativas das levadas de hereos. O
leitor j&deve q r concluido isto, em parte, do facto de ser a con-
vocaçáo dos proprietarios da zona feita pelo director da oircum-
scrippão, e das disposiç8es do art. 4 4 . O n.O 6 e do art. 64.O n . O I .O
do regulamento, acima trânseriptas. Considerem-se mais os se-
guintes preceitos, entre us muitos que para o mesmo fim podia-
mos accrescentar :
idos interessados) determinada n'este artigo,
Art. 42.. 2.@A ~-etmicr"o
será praidida pelo er~genkeirodirector o18 por rrm s e 4 clcfqado, e ter&lagar
na secretaria da administraç2o do coricelho a que pertencer toda ou a
maior parte da zona respectiva.
Art. 43.0 A r e u n i a dos interessados só poderh funccionar estando
presentes LU representados proprietarios com mais de metade do nu-
mero &tal dos votos d a zona respectiva
8 1.0 que O procemo relativo a obras novas p.oma tãr-segni-
Ef lenta é n%cessai!i;io que ellas sejam apgrovadas por dois terqos doa in;
A S AGUAS E AS L A V A D A S DA MADEIRA 169

teressados, pelo menos, representando tres quartos do valor cadastra1


das propriedades da zona
# 2.0 Não se reunindo o numero sufficiente de interessados para a
assembléa poder funccionar, 011 não se realisando a eleição dos vogaes
do gremio, d'isso se fará mençào na acta, e o director da ctrcwrnscripção
hydrazrbica resobvero todos os asuumplos que n'essa veu7ziCio se deceriam tratar
e nomenrá os vogaes do gremio (1).
Art. 52.0 São elegiveis para vogaes dos gremios todos os individuos
mencionados na lista dos interessados, / , t i ni7tdu qvaesqwet outros que, em-
bora nfio yosbflarn p~ opriedatles 71a zona, sejam prnprietarios no concelho ou
concell~ox em que a zona estiver sitftada. (Isto applicado á s levadas é de-
licioso !)
Art. 53.0 O mandato dos vogaes dos gremios dura tresannos, de-
vendo um dos vogaes ser reconduzido para a administração seguinte,
não podendo ser reeleito um dos outros.
8 e director da respcctiça circumscripção hyrlraulicu depigqtar
P ~ J - t e n cao
1.O

o q~ t ~ m
iangnl! de ser reconduzido e o qvre 7Go poderá spr reeleito.
Art 55.0 As funcções de vogaes dos gremios serão gratuitas
# unico. Quando, porém, algum ou alguns 'dos vog ies dos gremios
tenham prestado serviços dignos de especial consideração, a reunião
dos interessados poderá, mediante informação do director da respectiva
circumscripçào hydrhulica, conceder a esses vogaes urna gratificação
extraordinaria pelos serviços prestados. (Combine-se com o art. 43," 9
2.0, acima transcripto.)
, Art. 56 Os gremios eleitos não carecem de approvagão do governo
para poder funccionar ; mas, este em qualquer occasião, sob proposta d o
director da circumscri~)çãohydrarrlica, ou a reqtrerimento documen-
meP1qe7~heiro
tado de um terço, pelo menos, dos proprirtarioo interessados, com ii~fornrcip%o
d'aqvellr rrtge~heiro,tem a faculdade de Ihes mandar suspender as attri-
buições, e ordenar nova eleição dentro do praso de trinta dias contados
da data dasuspensão effectiva (combine-se tarnbem como a r t . 43.0 5 2.0),
assumii~doo director as attribuiçGes do qremio a t é se verificar a eleiçgo e
posse do novo gremio.
5 unico. A dissolução dos gremios, quando fôr ordenada, será inti-
mada a cada um dos seus membros, não podendo ser reeleitos os iudividuos
que .faziam parte do gremio dissolvido.
Art. 57.u Aos vogaes dos gremios novamente eleitos será conferida
a posse pelo director da respectiva circumscripção hydraulica, e dadas
a s instrucções convenientes ácerca das obras e trabalhos que lhes com-
pete administrar, execiltar. conservar ou fiscalisar. . .
Art. 58." 5 unico. Quando os gremios expressamente e por escripto
,declararem que preferem que a direcção da respectiva circumscripção
hydraulicíl execute os projectos e obras que teem de fazer-se, os gre-
mios serão considerados como nko existentes, excepto no que respeita
á distribuição e cobrançq das quotas e pagamento das despesas com
os projectos das obras e com a sua execução e administração.
Art. 67: Quando os gremios eleitos não vierem tomar posse, não s e
reunirem, ou náo cumprirem com as obrigações que lhes são impostas
pelo decreto n o 8 de 1de dezembro de 1892 e por este regulamento, o
engenheiro director da respectiva circumscripçâo hydraulica assumirá
para todos o s effeitos, pelo tempo que ainda faltar para a nova elei-

( I ) Considerando-se que é enorme a divisgo da propriedade na Madeira e que a zona tem


de abranger em geral freguezias e concelhos differentes. rarissimas vezes estar50 representa-
dos proprietarios com mais de metade do numero total dos votos. Por maioria dc razão nunca
talvez no processo relativo a obras novas, poderão estas ser approvadas por dois terços dos
intereisados, com representação de tres quartos do valor cadastra1 das propriedades da zo-
aia. Tudo passará, pois, para a alçada do director hydraulico, cuja acção era alias ji grande
gelo direito de presidencia
110 PORTUGAL E M AFRICA

çào, todas as attribuições dos gremios, e tomará iinmediatamente posse


de todos os respectivos projectos, documentos,, fundos, livros, contas,
materiaes, utensilios e quaesquer objectos.

Paremos aqui. NBo temos já animo da continuar a axposigito


das monstrriosidades do regimen hydraiilico sonhado para a Ma-
deira. E na verdade o espirit,~sente-se desalentado quando con-
sidera que a administraç20 publica anda por tal modo em Portu-
gal que se chega a ter necessidade dt: examinar projectos d'esta
natureza !

O decreto e o regulamento de 1892

Já o leitor deve ter concluido que o decreto de 1 de dezem-


bro de 1892 e o regulamento de 19 do mesmo mez e armo 1150
s8o applicaveis á Madeira. As provas d'esta verdade estão já iar-
gamente expostas. Por um lado, reproduzindo taes *
diplomas, sob o
aspecto do direito das aguas, o codigo civil, que ngo revogori o
art. 3 . O da lei de 12 de novembro de 1841, 8-lhes extensiva ,toda
a doutrina que a este respeito se apresenta com razões decisivas
na representapilo dos hereos. Por outro, o exame das siias linhas
geraes, feito no capitulo precedente, deixa em evidencia que ape-
nas se referem ao continente do reino, e que, na ilha, niio só seriam
incomprehensiveis e absolutameute contrarios ás condições geogra-
phicas e eiconomicas, mas tambem eliminariam ins ti tuiç0es que
por nenhuma disposi$to especial fordrn abolidas.
Contra esta ordem de idbas, baseada nos principios geraes da
j urisprudencia, nenhum argumento se poderia, evidentemente, achar
no 8 2 do art. 28.' do decreto de 1 da dezembro de 1892. Se
d'ahi se pode tirar alguma conclusSo 8 ein favor da mesma
these.
O decreto divide expressamente o covttinente do reino em duas
circiimscripções hydraulicas e estabelece a orçanisaçzo de cada
uma d'ellas. Nas quanto á Madeira (e Açores) apenas formula o
preceito d'aquelle paragrapho :

.Os serviqos hydraulicos da Madeira e Aqores ficarão a cargo


das respectivas direcções de obras pub1icas.r

Esses serviços eram os anteriores; se fossem os do decreto, este


organisal-os-ia tambem, como procedeu quanto á metropole. N'aste
A S AGUAS E A S LAVADAS DA MADEIRA 111

assiirripto nZo se poderia attingir novos fins sem novos meios. Tal
diploma nao se eseciitoii, por isso mesmo e por tudo o mais, no
distrivto do Funchal.
O que a t e aqui temos dito nao inhibe, por&m, que n'unia certa
ordem de assumptos e para attender a uma certa classe de ne-
cessidades se lance mão de alguns principios do decreto e do re-
regulamento, applicando-os com simplicidade, economia e bom
senso A Madeira.
A representaçso dos hereos, embora primacialrnente subordinada
á questiio do direito das agiias, manifesto11 o desejo de que se
reorganisassem os servigos hydraiilicos, fóra da espherei. privativa
das levadas. Começava por dizer o seguinte:
Primeiramente, Senhor, devemos mostrar a situação dos serviços
hydraulicos do districto, que é precaria e lastimavel. O melhoramento,
a conservaç80, o aproveitamento e a policia das nascentes e correntes
de agua destinadas aos usos domesticos, hy&ienicos,agricolas e indus-
triaes, dos terrenos a ellas sobranceiros ou adjacentes, dos alveos ou
leitos e margens das ribeitas, e das mathas e arvoredos que podem in-
fluir na consolidaçiio das vertentes e collinas e no regimen hydrogra-
phico, teem sido infelizmente descurados pelo Estado, pelos municipios
e pelos particulares, com prejuizo de todos e perigos irnrnensos, que
ámanhã podem ceder o logar a factos e acontecimentos funestos.
As vertentes das ribeiras, nas regiões onde se acham a s nasçentes,
ou onde não é conveniente a lavoura por degraus e socalcos, esdião tran-
formadas em taboleiros mal seguros de culturas ephemeras, Ou se apre*
sentarn sem nenhuma vegetaçàto, ou são' arborisadas e desarborisadas
á vontade dos donos das terras, sem obedieacia aos príncipios de. um
bom systema hgdraulico.
Bem grandes sào os males, que d'aqui resultam. A falta de mattas
esta exercendo uma influencia nefasta no regimen pluvial, determi-
nando longas estiagens, operando modificações nocivas no clima, e cau-
sando graves advereidades á agricultura. As chuvas não encontram nos
declives das montanhas um meio penctravel e absorvente, n&o abaste-
cem os reservatorios interiores das fontes, que vão diminuindo ou sec-
cando umas após outras, e lavam em torrente a superficie do solo, pre-
cipitanda-se as enxurradas enormes nos valles profundos. As aguas das
correntes, no verão, cada vez mais reduzidas, são desviadas subrepti-
ciamente, em grande parte, para irrigações anomalas n'essas altitudes,
e escasseiam de um modo assustador nas levadas que vão fecundar as
zonas ,das producções riquissim3s.
Em muitos pontos não se sabe bem onde são os leitos ou afveos e
as margens das ribeiras. O s proprietarios confinantes roteaq e culti-
vam os areiaes por onde a s aguas das cheias passaram já e podem pas-
sar ainda. Não se limitam a fazer ali sementeiras transitorias e de pe-.
queno porte, mas chegam a plantar arvores de grande duraçgo e des-
envolvimento e famm arrumações obstructivas de calhaus e entulhos
em todos os sentidos. Junto das correntes, em muitas partes, as obras
de defesa são empilhamentos desmoronadiços de pedras, ou barrancos
revestidos d e vegetações precarias.
Os ribeiros ,e corregos, que por todos os lados atravessam as colli-
nas e encostas, acham-se n'uma situação semelhante. Não teem, mui-
tas vezes, paredes de defesa sufficientemente altas ou segufas, são
transformados, com frequencia, em receptaculos das escolhas e limpe-
112 PORTUGAL EM AFRICA

zas das terras, e succede mesmo servirem de lanços de agua de rega,


com entradas faceis, largas e perigosas para as propriedades adjacentes.
Tudo está assim preparado para sinistros e catastrophes tremen-
das No dia em que de repente se despejarem nas montanhas as cata-
ractas de uma grande tormenta, as aguas pluviaes, varrendo com im-
peto a s superficies alcantiladas, arrastarão com furor terras e culturas,
bardos e arvores, paredes e calhaus, destruindo na sua passagem fa-
zendas e herdades, desmoronando obras publicas e particulares, derro-
cando ou sobrepujando as muralhas das ribeiras, arrasando casas, ruas
e bairros inteiros, fazendo tremer os alicerces da cidade, das villas e
das aldeias, e estabelecendo o reinado da morte, da ruina, do terror e
da consternação, n'um espectaculo proprio do cahos
A historia madeirense rememora tragicamente a alluvião de O de ou-
tubro de 1803, que em toda a ilha fez derrocadas e damnos collossaes,
e irreparaveis, devastando at6 uma parte do Funchal, de Santa Cruz,
de Machico, da Ríbeira Brava e do Campanario. A memoria dos velhos
de hoje recorda ainda com horror a s demolições, destroços e sinistros
que na cidade. nas outras povoações da beira-mar e nos valles cultiva.
dos causou a tempestade fatal de 24 de outubro de 1842. Todos nós te-
mos bem vivo o exemplo de taes males, embora em menores propor-
çães, nos effeitos geraes das tormentas dos uttimos tempos, sendo certo
que, se se deve especialisar a de 2 de outubro de 1895, todos os annos
a s aguas das chuvas, em virtude da situação j á descripta, destroem ou
arruinam pontes, muralhas, estradas, outras obras publicas e predios
rusticos e urbanos, e obrigam assustadoramente o Estado e os parti-
culares a constantes e grandes despesas de renovamento ou de repa-
ração. E o peor é que está, fundadamente, no animo de todos, que os
resultados funestos da imprevidencia dos homens podem ámanhã ser
. maiores do que nunca.
A origem do mal, como quasi sempre succede, não tem estado, até
certo ponto, na falta de boas leis. O que nunca houve foi uma organi-
sação satisfatoria de serviços hydraulicos
Apesar .do regimento de 7 de agosto de 1568, que obrigava os pro.
prietarios a arborisarem as vertentes das ribeiras e estabelecia multas
em favor da conservação das mattas; apesar das disposições da Ord.
L. I. T. 66 26 e L. I. T. 68 5 46, da lei de 30 de março de 1623 e do al-
vara, de 29 de maio de 1633, que completavam, sob o mesmo aspecto, os
preceitos d'aquelle diploma; apesar das excellentes instrucções respe-
ctivas ao bem geral da agricultura, que, eni correiçào, deixou na ca-
mara da villa da Calheta o corregedor Velloso d e Oliveira, em 1792, at-
tendendo com bom senso ás necessidades hydrographicas - as serras
e encostas da Madeira estavam preparadas, no começo d7esteseeulo,
para a lavagem repentina e espantosa que produziu a s inundaç6es e
catastrophes de 1803.
Para reparar os estragos de então e prevenir os de futuro, o governo
central enviou logo a esta ilha o brigadeiro Oudinot. Homem de scien-
cia e pratico, viu elle immediatamente que o pensamento fundamental
devia ser -diminuir a riolencra das t o r r e ~ r t ~0 tsh rihci~«S. 1.edlrzir o 7rvmero
dos barrancos qvce ae produzem, e c.cztaí. 1176e ellcs He mltltipliquem. Ao mesmo
tempo reconheceu que o restabelecimento das mattas ora a primeira
de todas as necessidades, se não se quízesse o mallogro de todos os
projectos e esperanças. E por isso fanulou, no seu plan? de obras e
providencias, approvado por carta regia de 14 de maio de 1804, as se-
guintes propostas sensatas, que apresentamos em resumo, por conte-
rem ensinamentos ainda preciosos :
1.0 Devem principiar-se as sementeiras e plantações no vertice dos
picos ;
2 E" necessario applicar-se o regimento das madeiras promulgado
O

por El-Rei O. Sebastião e as leis municiyaes acerca dos arvoredos e


das mattas nas immddiações das ribeiras;
AS AGIUAS E AS LEVADAS DA M A D E I R A 113
3.0 Os proprietarios confinantes com as ribeiras e a s camaras muni-
cipaes farão plantações de arvores aquaticas, de cannas e de arl~ustos
proprios, ao longo das margens, deixando ás correntes a largura pro-
porcionada ;
4.0 A roteação das terras deve ser totalmente prohibida nos montes
que tiverem seu declive com menos de tres partes de base por uma de
altura, ficando essas terras para mattas;
5.0 Nos terrenos que tiverem menos declive a s roteagões não serão
permittidas senão em tiras horisontaes de 50 ou 60 até 100 palmos de
largura, as quaes serão entreseparadas por outras tiras, tanto maiores
quanto mais proximas dos montes, destinadas a lenhas, mattas e ar-
voredos ;
6.0Em todas a s freguezias dever-se-ha atalhar a formação de que-
bradas e barrancos, por meio de fachinas pregadas com estacas, e estas
serão tecidas com ramos de arvores, sendo as fachinas cobertas com pe-
dras e cascalho ; repetindo-se tal trabalho e entupindo-se o barranco,
plantar-se-hão arvores e arbustos, que impeçam a demolição;
:7 Os concelhos se proverão, nas estações proprias, das sementes
para a s sementeiras recommendaveis e plantações apropriadas, ao
longo das estradas e caminhos;
8.0 Não se devem permittir nem perdoar os incendios nas mattas, e
muito menos nos bosques;
9.0 O chamado Bardo, que limita a serra em toda a volta da ilha,
deve ser acompanhado com plantações ou sementeiras de arvores,,
n'uma tira de 40 ou 50 braças pelo menos;
10.0 Não deve haver negligencia em desembaraçar as abertas ou des-
- aguadouros das propriedades.
O plano era bom, e ainda depois vieram novas posturas mu~iicipaes,
o alvará de 18 de setembro de 1811, que mandou a Junta do rnethora-
menfo d a agricullurcr das Zthas da Madeira e do Porto Santo occupar-se d a
conservação e plantação das mattas e bosques, e successivas portarias
que ordenaram ás auctoridades administrativas de todo o reino a exe-
cução das leis acerca de florestas e arvoredos. As coisas continuaram.
porém, de modo que se tornou possivel e facil a tragedia de 24 de ou-
tubro de 1842.
E depois d'este novo exemplo, o que se fez ? "Levantaram-se muros,
repararam-se pontes, concertaram-se caminhos, abriram-se sahidas
para a s aguas, distribuimos ae esmolas que nos vieram e continuámos
de braços cruzados no mesmo desleixo., Assim fa.llava em 1861 a com-
missão de cultura floreetal, a.quas, lcgislaçüo t) adminisfração rural, que de-
balde pugnava pela applicação das leis e posturas, e trabalhava para a
promulgaqão de um codigo florestal e de um codigo municipal para a
creação e conservação das mattas e arvoredos.
Parece, porém, que já então se poderia concluir que acima de tudo
se precisava de uma boa organisaç50 de serviços hydraulicos.
SENHOR. A lei de 1 de julho e o decreto de 2 6 de d'ezembro de 1867
attenderam com providencias especiaes ás obras de encanamento do
Mondego e seus affluentes, curando-se da utilisagão das aguas e do
aproveitamento dos terrenos marginaes. Em 1884, por lei de 6 de mar-
ço, foi auctorisado o governo a generalisar as disposições d'esses diplo-
mas, diviWo-se o continente do reino em quatro circumscripgões hy-
draulicas Em nenhuma d'ellas, porém, se comprehendeu o disfricto do
Funchal. S6 por decreto de 14 de setembro de 1889 se tornou extensiva
a, lei de 1884 á Madeira, incluindo-a na quarta circumscripção hydrau-
lica, e ainda assim com o intuito restricto de se melhorar a administra-
ç&o das levadas do Estado.
O decreto n.O 8 de 1 de dezembro de 18!J2e o regulamento de 19 do
mesmo mez e anno dividiram o continente do reino em duas circum-
scripqões hydraulicas, uma com séde em Lisboa e outra no Porto, reor-
-Março, i898 - VOL. V.
~'ORTUQAL EM AFRICA 3
114 POBTUOAL EM AFBICA

anisando todos os serviços respectivos, os quaes, na Madeira e nos


fimas
gores, ficaram a cargo das direcções das obras publicas. Estes diplo-
assentaram um systema completo de disposições para o melhora-
mento, conservação e aproveitamento das bacias hydrographicas, con-
sideradas sob todos os seus aspectos fundamentaes. Ao mesmo tempo
estabeleceram para esse fim utilisaimo um regimen, com fiscalisação e
policia, em que entram harmonicamente o Estado, os districtos, os mu-
nicipios, as parochias, as associações e os particulares, procurando-se
n'este importante assumpto uma larga cooperação reclamada pelas ne-
ceseidades e interesses dos povos. Taes são os merecimentos capitaes
da nova legislação. I
O decreto e o regulamento de 1892 não foram at6 hoje applicados 6
Madeira, nem podem mesmo sel-o sem modificações exigidas pela na-
turezza physica, pelo direito, pelas tradições e pelos usos e costumes
d'esta parte do reino. Qualquer tentativa de execuçiio d'esseo dipl,;mas teria
de recuar aqui diante de trea dificuldades imuperaveis. Em primeiro logar salta
aoe olhos que elles ecrtao subordinados &s condz'çües geographicas e necessidades
agricdaa do conliáttente, com ae quaes d o teem sequer semdhanga as da Madei-
T a . Por outro lado, t! tal a latitude que dão & acção do Estado e dosgremios, que
fariam desawrecer a autonomia admi~tktrativadas nssociaçGes de hereos. Ri-
natmente, orno era Zogico, estão dependentes, na sua contextura, dos preceitos do
cudigo civil; acerca do domido e u - o das aguns publicas, commum e particula-
r@, precCit08 que aâo vigoram n'esta ilha, e que vir.iam inlroduz ir uma desor-
dem perig08a e fatal no sac organismo economico, dando um golpe mortal nas te-
mdas de i q a ç ã o , sabiamente feitas pelas geraç4es de quatro seclclos.
Este ultimo ponto 6 importantissimo e está relacionado essencial-
mente com a actual situaçào juridica das levadas, que é precaria, por
motivas extranhos á lei, exige uma attenção profunda, e constitue a
materia especial d'esta representação, sendo certo que em tal assumo
pto cumpre aos altos poderes do h t a d o garantir, em nome da econo-
mia, social e dsas conveniencias do thesouro, os direitos inviolaveis e fe-
cundos que a natureza, a tradiçáo e a historia radicaram nas regiões
mais productívas da, Madeira.

A representação, tratando depois largamente, como vimos, do


seu assumpto principal, chegava por fim a conclusões praticas.
Atraz ficaram já transcriptas as que se referem a essa parte,
sendo uma d'ellas, a de que a autonomia administrativa das levadas,
~econkecidapela lei de 26 de julho de 1888, deve ser mantida h-
teirmente, porque é na epocha presente a melhor garantia da aglm-
turu. E depois de tragado este grande limite fundamental, que ne-
nhuma providencia deveria prejudicar, vinha seguinte : o
E' necessario, por outro lado, attender-se ao melhoramento, conser-
vação, aproveitamento e policia das nascentes e correntes de agua, dos
terrenos a ellas sobranceiros ou adjacentes, das margens e alveos ou
leitos das ribeiras, e das rnattas e arvoredos das montanhas e verten-
tes relacionadas com a hydrographia madeirense. Convém para, este
fim o estabelecimento de um bom regimen hydraulico, entregando-o á
cooperag&o do Estado, do districto, dos municipios, das associações e
dos particulares, e admittindo-se a instituição dos gremios e o princi-
pio das expropriações, segundo o systema do decreto n." 8 de 1 de de-
zembro de 1892, mas tudo isto subo~difiadoás cond%Üu, naturaes e encono-.
mâcm da Madeira.
Finalmente, conviria decerto e seria uM1 enviar-se a esta ilha um
A S AGUAS E ASLEVADAS DA XADEIRA 115

iechnico experimentado e prudente, para fixar praticamente as bases


de um bom regimen hydraulico, e dar a melhor organisaç50 aos servi-
ços correlativos, em conformidade com as normas yeraes j á delineadas.

Assim pensamos tambem. E por isso mesmo illudir-se-iam os


que imaginassem que nos preoccupam especialmente as pessoas
que podem ser ou não ser encarregadas da direcçto do organismo
hydrauliio projectado. A questão para nós 6 de levadas e de pro-
porpiio de servigos novos. Não se toque n'aquellas, senão para
desafogar a sua situação j uridica, respeitando. completamente
a sua independencia; não estabeleçam estes seniio ate onde o exi-
girem as condiçoes naturaes e economicas da Madeira. Eis tudo.
Os homens, para um acto de legislação e de governo, pouca si-
gnificaçno podem mesnio ter, individualmente considerados. As
instituiqoes é que devem prender o espirito. Os homens pas-
sam, as instituiçses ficam; ainda quando as derrubamos, o que
sempre offerece dificuldades, continuam a viver em factós, ás
vezes de duraçilo perpetua. Dos homens s6 nos podemos lembrar,
em casos d'estes, sob os aspectos geraes da sociedade e da epoca,
para a organisação das instituipões. E então concluimos, cpm o
scepticismo e a fé da experiencia, que nenhuns iriam administrar
melhor aquelles que se estão administrando a si mesmos e que
mais perfeitamente se estariam administrando agora se lá nfio hou-
vessem chegado já influencias da nossa vida publica, ou tivessem
já chegado as providencias necessarias.
Outros tiveram e teem um modo de pensar diverso. O sr. mi-
nistro das obras publicas acceitou-o, como acceitaria qualquer ou-
tro. Depois recuou, por causa de certos factos, como tem andado
e recuado na questão do contracto das levadas. E m seguida, como
lhe disseram que o sr. Adolpho Loureiro podia resolver scientifi-
camente a questao, indo á ilha, achou a idéa excellente, pelo me-
nos para adiar estas preoccupaç6es, que na verdade são incom-
modas.
O sr. Loureiro foi encarregado de assentar com a direcçlo das
obras publicas ngo sci as bases da organisag5io dos servigos hy-
draulicos, mas tambeizi as solu~õesrelativas ao uso da8 correntes,
isto é, as solugões da questão juridica, em ultima analyse, a que
se refere a representaçlio dos hereos. Este grave assuiripto de
direito, submettido ás luzes da engenharia, deve dar uma bella
planta topographica.
Partiu o sr. Loureiro no dia 23 do corrente, e, segundo dizem
%
116 PORTUGCALEM AFBICA

os jornaes, regressará em meiados de abril. O leitor, lembrando-se


das circumstancias, factos, situaçces e difficuldades que até aqui
teem passado sob os seus olhos, suppozera talvez que a missão do
sabio e distincto engenheiro tinha de ser longa, por se tratar de
estudos theoricos e praticos especialissimos.
Ninguem extranhe o caso. O sr. Loureiro, no exercicio con-
sciencioso da sua profissiio, foi á Madeira para dar auctoridade ao
plano já existente, plano que de boa fé póde julgar excellente em
geral, se por lá não andarem já nuvens nos ares, e que terá de
acceitar, com ou sem modificaç0es secundarias, se de lá qiiizer
trazer algum. Se a idéa não foi assim proposta ao Sr. Augusto
Jose da Cunha, beni cedo comprehenderá o illustre ministro que
tal Q o pensamento fundamental da embaixada.
A parte principal do drama pertencerá ao governo e aos po-
vos. Isto se verALtambem.

Bases de uma solução

0.facto hydraulico geral na. Madeirasse nos podemos assim


exprimir, 6.g levada de hereos, com a sua administração indepen-
dente, simples, gratuita, zelosa, e tiio efficaz e melhoradora quanto
o pode ser no estado actual do direito dhs aguas e da sociedade
da ilha. Comprehende-se, por isso, muito bem que se deve legis-
lar de preferencia para elle, desenvolvendo esta admiravel insti-
tuiçáo tradicional, e garantindo-lhe uma situação juridica mais ela
ra, mais perfeita e mais desembaraçada, para que a sua fecunda
autonomia produza todas as fructificações possiveis.
Pela mesma ordem de razões salta aos olhos que, até onde as
circumstancias o reclamarem e permittirem, se deve obedecer ao
mesmo ideal, na conclusão ou na construc$o de novos aquedu-
ctos.
E' fóra de toda a duvida que o Estado tem ainda ahi um pa-
pel a exercer,' principalmente porque ha regiões onde para as
obras não se obteria o capital necessario nas economias e no cre-
dito dos agricultores Enteressados. Mas 6 tambem certo que, per-
filhando-se ao mesmo tempo este ultimo processo, constituidos
os lavradores em associaç%s de hereos, poder-se-ia attingir mais
rapida e satisfatoriamente o fim desejado ; devendo considerar-se
que o Estado não sabe applicar tão bem o dinheiro como elles,
nPo pode contar com rendimentos proporcionaes ao valor das des-
A S AGUAS E AS LEVADAS DA NADEIBA 117

pesas, embora vantajosamente compensadas pelo desenvolvimento


da materia collectavel, nem se acha hoje em condiqões de com-
~ l e t a rdepressa a rede dos canaes de iirigay8o madeirenses. Na
comhinal;ao dos dois systemas está, pois, decerto, o verdadeiro ca-
minho pratico I: iitil, de mais a mais ensinado pela tradição e pela
historia.
O qiiu 6 inconveniente, perturbador e mau, sob o aspecto dos
interesses piiblicos e privados, b a admiss8o de quaesquer in-
termediarios, e mais ainda quando elles se abriguem á sombra do
Estado ou dos agricultores. O apparecimento de empresarios de
diversas especies apenas veiu, por causa de situações conhecidas,
prejudicar as levadas existentes, crear partidos em volta das
aguas, perturbar o uso das nascentes e correntes, levantar n'al-
guns pontos os montanhezes contra os direitos dos hereos, deter-
minar rivalidades, luctas, questões e demandas, estabelecer o rei-
nado da desordem, ferindo os interesses do thesouro, multiplicando
as despesas dos lavradores, lançando-lhe na alma a agitapão, a im-
paciencia e o desespero. Acabemos com esta grande anomalia in-
cipiente, em nome da experiencia dos seculos, do bom senso, da
consciencia, 2 do progresso economioo e da tranquillidade pu-
blica.
Sórnente fora do campo de ãcgão até aqui delimitado, e da es-
phera dos direitos relativos a quaesqiier outras aguas, que ahi n$o
estejam comprehendidas, poderá o Estado organisar servipos hy-
draulicos, para see;urança dos terrenos e das povoaçGes, e melho-
ramento das condigões hydrographicas da Madeira. Estabelecidos
nos devidos termos, cooperando harmonicmente o Estado, os
municipios e os particulares, as proprias levadas tirarão d'elles
vantagens, que poderiam até ser grandes se estivessemos em tem-
pos de boa administração.
E' na realisaç80 exclusiva d'estes trabalhos, ainda vastos, como
se mostra na representapão dos hereos, que os gremios, conjuga-
gados com a direcção das obras publicas, podeeam desempenhar
um papel importante e util, embora na Madeira o seu estabeleci-
mento e a sua actividade estejam sujeitos a muitas aontingencias,
difficuldades e lentidões. A fé n%o pode ser grande n'este ponto,
por causa das condições naturaes e sociaes da ilha, mas sFio pos-
siveis beneficias regulares pelo tempo em diante. Para isto pre-
ciso que se saiba adoptar o que é acceitavel nos decretos de 1892,
elaborar um regulamento simples, adequado á Madeira, e evitar
118 POBTUGAL EM AFBICA

situações ou erros que dividam, perturbem, ou desalentem ainda


mais os espiritos.
De proposito fallámos na direcção das obras publicas. Se por
qualquer f 8 m a lhe tirassemos. os serviços hydraulicos, os mais
importantes, quasi nada lhe restaria, porque o districto é pequeno,
as estradas e edificios poucos, e os outros monumentos da acyfio do
Estado quasi nenhuns. Comprehende-se que a direcção das obras
publicas não dependa de qualquer circumscripção hydraulica do
reino. Crear, porém, lá uma terceira circumscripçlo ou qualquer
coisa parecida, seria absurdo e inutil. A necessidade é essencial-
mente de pessoal externo, sobretudo para a fiscalisaçZio geral. Os
trabalhos são confiados principalmente aos gremios, e aos seus
empregados e operarios.
F&s--e~tes-considera@s preliminares, apresentamos as ba-
ses das*soluções que, a nosso vêr, devem ser perfilhadas:

Base i,& Deve ser declarado :

a) Que o dominio das aguas continua a pertencer ao Estado,


em conformidade com a legislaçito resalvada pelo art. 3 . O da lei
de 12 de novembro de 1841;
6 ) Que o uso das oorrentes das ribeiras e ribeiros, e das nas-
centes e regatos existentes nas suas bacias hydrographicas, conti-
nira a ser garantido As ,pessoas moraes, ás associações de hereos,
ou 'de qusasquer particulares, e aos individuos a quem pertence
pela 1egislqlXo mencionada na alinea a, oii por concessão especial
do Estado;
c) Que, no entretanto, as posses relativas a certas e determi-
nadas nascentes e correntes das bacias hydrographicas das leva-
das existentes nas condições da alinea h, fundarfio egiialmente o
direito de uso das aguas respectivas, nos termos em que esse
mesmo uso est& estabelecido, se houverem sido constituidas por
meio de obra de arte, de caracter permanente, se tiverem 'pelo
menos o numero de annos que se fixar {trinta por exemplo, mas
nunca menos de cinco), e se não tiverem sido n'este periodo im-
pugnadas por qualquer fórma admittida em direito;
d)Que o direito de uso garantido pelas alineas 6 e c b im-
prescrip tive1;
e) Que o uso das nascentes e correntes de agua, partencantes
ás levadas de hereos, e, em geral, das nascentes e correntes que
AS AGUAS E AS LEVADAS DA MADEIRA 119

foram objecto de concessões do Estado, é inalienavel, podendo,


porém, ser trocado pelo de outras equivalentes;
f ) Que B garantido As levadas de hereos o direito de explora-
glo, aproveitamento completo, r canalisaggo e conducgão livres das
aguas cujo uso lhes pertence;
g ) Qiie para os fins indicados na alinea f são applicaveis ás
levadas de hereos as disposições do art. 20." e seus 1.O e 3 . O ,

do 9 unico do art. 22.O; do art. 24.' e seus §§ I;', 2.O e 3.O e do


art. 26.O do decreto n.O 8 de I de dezembro de 1892, e dos art.
116.O, 118.O e seu unico, 119.O, 122.' e seu 5 unico e 123.O do
regulamento de 19 do mesmo mez e anno ;
h) Que, para os effeitos da alinea g, a direcçào das obras pu-
blicas do districto do Fiinchal será equiparada ás direcpões d+
circumscripcões hydraulicas do continente do reino, e se conside-
rarão como approvadas as obras que a associação dos hereos
houver decidido fazer na bacia hydrographica da levada respe-
ctiva ;
i) Qile fica interpretado nos termos das alineas a, 6, d, e,
e f, quanto ao, douiinio e usa das aguas da Madeira, a dis-
posição do art. 5 . O da carta de lei de 1 de julho de 1867, que
approvou o codigo civil, continuando ao mesmo tempo a ser abso-
lutamente garantida Qs levadas de hereos a autonomia adminis-
trativa e mais direitos assegurados pela lei de 26 de julho de
1888 ;
j) Que s6 podem, de futuro, adquirir, por qualquer titulo,
aguas de uma levada, como hereos, e entrar, portanto, nos giros
d7ella, proprietarios ou colonos da regiao que a mesma levada ir-
riga ;
h) Que, no entretanto, os hereos, que por factos de preterito,
não estejam nas condições da alinea j, poderto, transmittir o seu
quinhb, ou parte a outros qiie tambem n'ellaç se não achem, por
successão testamentaria ou legitima ;
1) Que, para os effeitos da alinea k, fica resalvado o caso de
expropriagão judicial por factos anteriores.
Obseruap3es. Todos estes principias sHo j iistificados pelos fa-
ctos e razões constantes da representação dos hereos.
Além d7isso, estgo em geral incluidos na legislagão tradicio-
nal ainda vigente. Exceptiiam-se d'esta regra apenas os das ali-
neas c, g, h, X; e I .
A applicaçgo transitoria do principio da alinea e corresponde,
120 POBTUGAL EM AFRICA

como j á se viu, a necessidade de se contemporisar, atk onde fôr


possivel, com as posses intrusas. E tanibem servirá, em iiltima
analyse, ú *fortio&,para garantia das levadas antigas, cuja legali-
dade difficilmente possa ser apurada pelo da alinea h, embora el-
las tenham eni seu favor as presumpçaes de direito.
Os principios das alineas k e 2 obedecem ao mesmo espirito
de prridencia e moderação. E' verdade que o da alinea j, fun-
dado na organi'saç&o das levadas de hereos, necessario para o
equillibrio dos preços das agiias. e hoje contrariado pela introduçcão
de alguns exploradores que tiido desorganisam, pertence ao direito
ainda vigente, que portanto condemna tambem os factos do pre-
terito. Os proprios interessados, porém, reconhecem qiie se deve
pelos outros dois facilitar a applicaçilo d'esta doutrina, prevenin-
do-se o futiiro e corrigindo-se o abuso lentamente.
Ainda á mesma ordem cle razões estão silbordinados os prin-
cipio~das alineas I/ e h.
O da alinea f está no direito tradicional das agiias, e funda-se
no dogma juridico de qiie todo aquelle que tem o uso excli~sivo
de rima coisa, deve poder tirar d'ella o maior proveito. Essa mes-
ma legislação, como vimos, impiinha as servidões aos proprietarios
dos terrenos, sob penas severas, applicadas summariamente, sem
qiie os hereos fossem obrigados a indemnisações.
Tendo-se manifestado n'alguns pontos uma certa opposi~Ioá
simples doutrina da alinea f, é evidentemente necessario assentar
que ella continua em vigor. Os proprios hereos reconhecem, po-
rAm, que 6 forçoso attender ao espirito da epocha.
Parece-nos que, para isto, nfo ha melhor recurso do que o de
se lançar mgo das disposipGes de leis geraes existentes, parte das
quaes se estendem mesmo & ilha.
O decreto de I de dezembro de 1392 e o regulamento de 19
do mesmo mez e anno, soccorrendo-se de preceitos da lei de 23
de julho da 1850, e estabelecendo outros novos, applica o princi-
pio da alinea f especialmente ás agiias de uso commiim, com as
homenagens hoje devidas ao direito da propriedade, com as sanc-
gões convenientes e com o processo summario indispensavel.
A situapao na Madeira, sob estes aspectos, exige a mesma or-
dem de garantias reciprocas, sendo certo que s3o verdadeiramente
de uso ccmmum as agiias dos hereos, embora tal expresslo não
tenha ali, como se viu, a significação que tem no codigo civil e
no continente do teino.
A S AGUAS E A S LEVADAS DA MADEIRA 12l

Como ein materia tZio importante queremos apoiar-nos no di-


reito geral, que seja acceitavel, e como estamos apenas a formu-
lar bases de soluções, traduzimos n'esta parte o nosso pensamento
pela fdrma que elle reveste nas alineas g e h. E' evidente, porém,
que n'um trabalho definitivo, seria preferivel adoptal-o em enuncia-
dos perfeitamente ajnstaveis aos factos da Madeira, extrahindo das
disposiç6es alli citadas o que lhes fosse a*pplicavel,para evitar nos
assumptos das levadas as viagens horriveis atravez da floresta de
artigos continentaes do decreto e regulamento referidos.
E i s as disposiç6es aproveitaveis do decreto:

Art. 20.0 Quando fi3r necessario, para complemento ou exeçuçiiio d a s


' ~ r a sindicadas nos artigos 14.0 e 16 ( o primeiro refere-se ás aguas
O

~blicase o segundo &sde uso commum), ou para vantagem publica, ou


Sra beneficio da agricultura, al6m das servidões j á auctorisadas pela
i de 23 de julho de 1850, são os proprietarios respectivos obrigados a
!ixar abrir passagens para aguas, e construir levadas, vallas, canos,
,queductos cobertos ou descobertos, em quaesquer predios que n&o
sejam casas, pateos, jardins, alamedas ou quintaes immediatamente
juntos a casas de habitação; assim como a soffrer a occupação tempo-
raria de materiaes de construcgão destinados ás obras de melhora-
mento approvadas, ou provenientes da limpeza dos rios, vallas, canaes,
esteiros, lagos, lagoas e correntes de agua.
f 1.0 A indemnisagão pelas servidões permittidas n'este artigo será
ava iada, liquidada e paga segundo os preceitos d'aquella lei de 23 de
julho de 1850, e mais leis em vigor.
3.0 Aquelles que sem justa causa se oppozerem, por qualquer mo-
do, ao estsbelecimento das servidões indicadas n'este artigo, serão cor-
reccionalrnente obrigados a desistir da sua, opposição, e condemnados
na pena de prisão de tres até trinta dias, e no dobro do maximo por
cada reincidenda e nas custas do processo.
Art. 22.0 § unico. Todas a s obras que forem feitas com prejuiso d a
wnaervaçdo, reg~darisaçãoe r~gimen dos rios, lagos, lagoas, pantanos ê
mais @mentes de agtra, o?&com prguiso de terceiros; ais que forem feitas sem
licença, quando esta deve ser pedida, ou que o forem por modo diffe-
reate das condições com que aquella licenga foi concedida - sergo des-
truidas por conta e á custa dos contraventores, aos quaes pelas direc-
ções das circumscripgCies hyãraulicas, ser&feita a intimação le a1 para
a demolição, marcando-se-lhe um praso para a sua execuç80. #e, findo
esse praso, a intimagão não' for cumprida e as obras desfeitas, serão
essas obras niandadas desmanchar pelos directores das circurnscri-
pções hydraulicas, sem mais intimações nem processos. e as despesas
feitas com taes demolições serão cobradas dos contraventores pelo
processo da cobranoa das dividas & fazenda nacional.
Art. 24.0 Serão julgsdos em policia correccional os que transgredi-
rem os preceitos d'este decreto e regulamento que d'elle faz parte, pa-
gando as multas impostas, e ficando mais os transgressores obrigados
a reparar á sua custa os damnos causados, e a pagar as despesas a
que derem causa, tudo sem prejuizo da responsabilidade civil e crimi-
nal em ue, segundo a s leis, tenham incorrido.
8 !.O.rn caso de nova fslta ou reinoidencia dentro de um a m o da
antenor imposição a s multas serão no dobro.
&! 2.0 Se a multa for fixa e paramente pecúniaria, e se o multadg
confessar a transgressão e voluntariamente quizer pagar a multa e
122 PORTUGAL E M AFRICA

damnos causados, poderá fazel-o, e com o pagamento findara o respe-


ctivo processo sem mais formalidades.
g 3 0 Se a multa não fbr fixa e o contraventor confessar a transgres-
são e voluntariamente quizer pagar a multa e damnos, seguir-se-á o
que fica estabelecido para as multas fixas, pagando o minimo da mul-
ta, além dos damnos causados e sua reparação
Art. 26.0 As auctoridades judiciaes, administrativas e militares cum-
prir&~, na parte que lhes competir, as disposições d'este decreto e do
regulamento que d'elle faz parte, e prestarão dentro da esphera das suas
attribuiç6es todo o auxilio que lhes fbr pedido pelos engenheiros dire-
ctores e mais agentes das circumscripções hydraulicas para a boa
execugão dos serviços a cargo d'estes funccionarios.

As disposições do regulamento d e 19 de dezembro de 1892


sXo as seguintes :

Art. 116.0 0 s proprietarios de quaesquer predios, que ngo sejam ca-


sas, pateos, jardins, alamedas ou quintaes immediatamente juntos ás
casas de habitação, são obrigados a deixar abrir passagens, atravez
dos seus predios, para aguas, construir levadas, canos e aqueductos,
cobertos ou descobertos, que estiverem marcados no projecto das obras,
devidamente approvado, sendo previamente indemnisados.
*Art.118.0Os proprietarios dos predios mencionados no art. 116.0,as-
sim como dos adjacentes ou atravessados pelos riora, vallas, esteiros,
canaes, lagos, lagoas e correntes de agua são obrigados a soffrer nos
seus predios a occupaç8lo ternporaria ou permanente dos materiaes
necessarios para a construcgão nos mesmos predios das obras appro-
vadas, ou provenientes da sua execuç3i0, mediante a respectiva inde-
mnisaçiio.
$ iinico, Se, porém, os proprietarios dos predios accupados se utili-
sarem dos materiaes ou dos pr~ductosda limpeza em seu ,beneficioou
d'aquelles predios, não teráo direito a indemnisaç80 alguma.
Art. IlQ.+O s proprietarios designados no artigo antecedente ficam
egualmente obrigados a permittir que dos seus predios se extrdiam
terras, pedra, fachinas, ou outro qualquer material necsssãrio para a s
obras epprovadas, ou urgentes, para tapamento de qualquer quebra-
da, ou para outra qualquer reparsç%o, tendo direito & respectiva in-
demnisaç50.
Art. 122.0Aquelles que sem justa causa se oppozerem aos factos e
servidões mencionadas nos artigos anteriores, serão correccionalmente
obrigados a desiatir da sua opposição, nos termos do 8 3.0 do art. 20.0
do decreto n.O 8 de 1 de dezembro de 1892.
$ unico. O respectivo processo será promovido, arequieição do en-
y h e i r o director da respectiva circumscrippi%ohydraulica, pelo agente
o ministerio publico da comarca onde o predio estiver situado.
Art. 123.0 Os trabalhos e obras para o melhoramento do regimen das
a p a s e correntes e suas margens ou da navegaçiko, agricultnra e hy-
giene, que forem executados na conformidade d'este regulamento, ou
ordenados pelo governo, em harmonia com as respecti'vas leis, n b po-
dem,em casQ algum, ser embargados, nem a sua execução intermm-
pida por sentença ou despacho do poder judicial, accordão ou delibe-
ração dos tribunaes administrativos.

As suctortisaç8es d e obras pela reuniiio dos interessados e os


projectos organisados pelos gremios teem forpa de lei, no systema
do decreto e do regulamento, para o procedimento dos engenhei-
AS AGUAS E AS LEVADAS DA MADEIRA 123

ros directores das circumscripções hydraulicas e das auctoridades


judiciaes, militares e administrativas. As assambléas geraes dos
hereos e as suas direcções no regimen madeirense, devem ter,
pela mesma ordem de razões moraes, juridicas e economieas, pre-
rogativas identicas. Em tal CASO, os presidentes das levadas, sem-
pre que fosse necessario tornar effectivas as garantias e sancções
que acabarnos de ver, contra quaesquer infractores, fariam chegar
as suas reclamagaes fundamentadas ao director das obras publi-
cas, que exerceria as attribuições respectivamente conferidas aos
directores das circlimscripç3es hydraulicas.

Base 2." Rescindido o contracto de 1896, acerca das levadas


do Estado e de levadas novas, a economia publica e privada, o
bom senso pratico, as indicações da historia e a situaçãepresentd
exigem :

a) Que se mantenha na administração d o Estado as levadas


qrie lhe pertencem ;
6) Q,ue o Estado conclrta as que est#o comepadas e construa
as outras ainda necessarias, com a maior actividade possivel;
c) Que, no entretanto, por causa das circumstancias do thè-
souro, e para se completar mais rapidamente a rede das levadas
de irrigaçzo, deve o governo ficar auctorisado a conceder aos agri-
oultores das regiões interessadas em qualquer levada nova, o di-
reito de a concluir oude a construir, segundo a hypothese, ti sua
custa, e mediante as condipões que em cada caso particular forem
razoaveis e convenientes para o Estado e para a agricultura, con-
stituindo-se elles em associaç71es de hereos, nos termos communs,
sem intermediarios;
d ) Que as iniciativas dos agricultores, para os fins da alinea
anterior, tenham em todos os casos a publicidade necessaria para
que seja possivel tomarem parte na proposta ao governo todos os
interessados que o desejarem, devendo ser demonstrada essa pu-
blicidade ;
ei) Que, entre os agricultores que quieerem tomar parte na
proposta se guarde, quanto ao numero de horas de agua, attri-
buido a cada um no giro que se estabelecer, a proporglo imposta
pelo 'numero total das horas do giro, menos as que convier deixar
& associag&opara arrendamentos, e pela qualidade das culturas e
natureza e extensão dos terrenos;
124 POBTUGAL EM AFFRICA

j')Que os novos hereus paguem as despesas das obras respe-


ctivas, proporcionalmente ao numero das suas horas de agua, nas
condições que ttstipiilarein, entregando as quotas competentes á
commiss30 administrativa da levada, e sendo applicaveis a este as-
sumpto disposições identicas ás do art. 18.O e seus §$ 1 . O e 2.' do
decreto n." 8 de 3 de dezembro de 1892.
Obse~cações.Os principios das alineas a, b e c estzo já sus-
tentados com razGes de varias especies. Os restantes, admittido o
da alinea c, por si mesmo se justificam. Ainda accrescentaremos,
porém, algumas considerag0~s.
Xa alinea e indica-se clue. devem ficar pertencendo á associa-
fio as horas do giro que seja conveniente reservar para arrenda-
mentos. Esta doutrina 6 applicada já, por formas diversas, na ilha.
*&o se garantiria apenas por tal modo lima parte da receita per-
manente para as despesas de conservaçEo. Facultar-se-ia tambem
aos que nBo tivessem meios para figurarem na proposta uma ma-
neira de obter depois aguas, fim principal a que se deve at.tender.
Aqui não se enriquecem uns á custa dos outros, como succederia
na venda das levadas já concluidas. MZeo se faz a miseria de nin-
guem. Pelo contrario, os proprios pobres poder80 ter mais sala-
rios.
Passemos a outro ponto. Xa alinea $ recorre-se a determi-
nadas disposipões do decreto de 1892. Basta leI-as e considerar o
que dissemos nas ohservagões juntas á base l.a,para achar-se
justa a applicagiio.

Art. 113.0 Todos os proprietarios interessados nas obras de melhora-


mento de que tratam os arts. 14.0 e 16.0(melhoramento, conservaçã,~
ou aproveitamento de aguas publicas ou de uso commwm), são obrigados
ao pagamento, no praso d; trinta dias, das quotas que lhes pertence-
rem, segando a respectiva distribuição approvada (pelos gremios, no
systema do decreto, pela direcção da levada no nosso caso). Este praso
ser& contado desda cr data em que se abriu a respectiva cobrança.
1.O NO caso de recusa ao pagamento voluntario d'essas quotas,
proceder-se-ha á sua cobfancja, accrescida dos juros de 6 por cento ao
amo, contados do fim do praso acima mencionado at6 á data do paga-
mento effectivo, pelo processo das contribuiçbes em divida á fazenda
nacional.
$ 2 Aos agentes do ministerio publico, como representantes da fa-
zenda nacional, pertence fazer instaurar e seguir at6 final estas execu-
ções perante o poder judicial.

Publicidade completa e demonstravel para todos os effeitos


mopaes, administrativos e economicov -o que 6 facilimo eis no-
AS AGUAS E AS LEVADAS DA MADEIRA 125

caso da nlinea c e srgi~intes,a primeira condição funda~nentsl.


Contracto honesto e equitativo, eis a segunda.
O assiiinpto reveste uma iinportancia especial quando se trata
de levadas já em construcçZo. O essencial n'este caso, quanto ao
contracto, é que o capital effectivo das obras existentes seja re-
embolsado em termos jiistos pelo Estado, ou deixe a este a repre-
s e n t a @ ~correspondente na levada, ou lhe garanta um juro cal-
culado pelo numero de lioras de agua correlativo e pela renda
que n'ella se estabelecer. Esta idha, bem estudada, pode ser posta
em pratica por varios processos dignos.
Prnferiamos, no entretanto, que o Estado completasse dire-
ctamente a rede das levadas, deixando as economias e o credito
dos lavradores para outros emprehendimentos da sua indiistria,
hoje tão assediada de males e adversidades.
Nlo exaggeremos as difficuldades das dotac;Ges. O qiie acima
de tudo n2o ha na Madeira, com excepfles bem raras, como em
geral acontece no paiz, 4 uma administra@o satisfatoria, que
saiba poupar r? produzir dinheiro para fomentos.
Na hypothese de que se trata qnasi bastaria, a nosso ver, que
s e quizesse a troca de certos pianos actuaas por normas de jus-
tiça, de economia e de zelo. NiXo si, ha muito que eliminar e
impedir, mas ha ainda alguma coisa que trazer aos cofres publi-
eos, para beneficio das regi7ies da Madeira at8 hoje sacrificadas.
E aqui se dii um facto cu~ioso: rescindido o contracto das leva-
das, exactamente n'ellas se pode achar, com priidencia e equida-
de, uma verba annual progressiva que logo no começo repre-
Gritaria uma fonte de receita mais seria do que essa que se pre-
tende agora apurar, entregando-as por letras como as da desamor-
tisaçlio de bens.. O que se tem feito ou se desejou fazer nos ul-
timos annos, teve ao menos o merecimento de por em evidencia
que as rendas, adoptadas as m6dias dos concelhos, podem ser
elevadas consideravelmente. Se isto era possivel para negocios de
uma empresa, na opinião de todos, mais o deve ser para o Es-
tado fazer o bem da ilha. Desde que o augmento fosse para acu-
dir ás .necessidades de outros pontos onde a agua desenvolveria
a riqueza, e nIo para empreitadas ruinosas, os arrendatarios de-
veriam acceitar a nova situaçgo por espirito de justiça e de soli-
dariedade ecqnomica.
A Madeira dá mais do qiie deve á metropole, porque Lhe
manda um saldo liquido de cerca de 500 contos de réis, sem fal-
126 POBTUGAL EM AFRICA

larmos dos rendimentos resultantes do regimen fiduciario, que não


tem razão de ser na ilha. Isto deve ter um termo. No entretanto,
lá mesmo se pode e deve ir corrigindo a sitiiaglo, que é sobre-
tudo má em algumas regi?ies agricolas de diversos concelhos. Sus-
pendamos aqui, por ora, o desenrolar do nosso pensamento.
3 k e 3.a Convem organisar na Madeira os serviços hydrauli-
cos para o melhoramento, conservação e policia das nascentes e
correntes de agua, dos terrenos a ellas sobranceiros ou adjacen-
tes, das margens e leitos das ribeiras e das mattas e arvoredos
das montanhas e vertentes relacionadas com a hydrographia da
mesma ilha :
a) Deixando absolutamente livres e intactas niio só as esphe-
ras de direitos e de acgiio delimit*adasnas bases e B.a, mas
bmbem qnaesquer outras espheras de direitos e de acção relati-
vas a aguas, qiie n'ellas se nSio achem compreliendidas;
6) Adaptando ás necessidades presentes da Madeira os planos
approvaclos pela carta regia de 14 de maio de 1804, mantida em
vigor pelo art. 3.' da lei de 12 de novembro de 1841, que tam-
bem /este ponto náo foi ainda revogada ;
c) Sujeitando á doutrina das @linem a e b e ás condigões na-
turaes e economicas da Madeira $ decreto n.O 8 de 1 de dezem-
bro de 1892 e o regulamento de 19 do mesmo mez e anno;
d) Ficando os serviços de que trata a cargo da direcqfto
das obras piblicas do districto do Funchal.
Estas indicaçoes geraes e o mais que temos dito põem em èvi-
dencia qiie tudo aqui110 q11e se refere á exploraçiio, canalisaçgo,
c ~ n d w g ã oe administraçRo das aguas nzo deve entrar na espherH
-dos sewigos hydraulicos projectados, mesmo que ellas niio estejam
comprehendidas nas bases 1.' e 2.', como succede a respeito de
muitas que por não terem siiscitado questoes n5o tivemos de con-
siderar em especial. N'esse campo só os qiie teem o dominio util,
quer seja o Estado, quer o município, quer a associag8o de he-
reos, quer um particular, devem exercer taes direitos, mas cada
qual n'aquillo cujo uso lhe pertence, doutrina que não prejudica,
evidentemente, a das alioeas c e seguintes da base 2.', quando
adoptada.
A 0rganisac;iio de serviços hydraulicos necessaria, com a com-
binação dos esforços do Estado, dos municipios, das associações
e dos particulares e a acção especial dos gremios, eitende-se ape-
nas ao que fica indicado no corpo da base 3.', comprehendendo
AS AGUAS E AS LEVADAS DA MADEIRA 137

assim tudo o que se relaciona com a seguranpa das povoações e


dos terrenos das vertentes e com o regimen hydrographico ma-
deiranse, ainda que apparentemente seja em grande parte de na-
tureza florestal. O trabalho é ainda immenso e importante.
Evita-se d'esta maneira uma perturbapCio mais ampla, mais pro-
funda, mais grave, mais perigosa, mais revoltante do que a existente.
Fica restabelecida a ordem no reino cubiçado das aguas. Cum-
prem-se as leis naturaes, moraes e economicas.
Todos os principios da base 3,a estlio justificados na represen-
taçiio dos hereos e nas considwagctes respectivas que temos feito.
Os planos de Oudinot, a que se refere a alinea b, constam da
primeira parte d'aquelle documento e ainda podem ser aproveita-
dos em muitos pontos.
Salta aos olhos que s6 na materia das alineas I> e c devem ser
ouvidos e consultados os technicos. Ngo se deveri, todavia, es-
quecer que tudo isso tem ainda afinidades intimas com assum~tos
de natureza econornica, financeira e juridica.
Revista.- Ln-so-Africana

Loorenqo Marqricw :- Partiu ha dias para Paris, seguindo d'ali


para Berlim e outras capitaes extrangeiras o illustre commissnrio re-'
gio de Moçambique, Mousinho d'Albuquerque. Tanto em Paris como em
Berlim recebeu o valoroso soldado eloquentes testemunhos de consi-
deração e estima e honrosissimas distincções, taes como a que lhe foi
dada pelo imperador Guilherme d'Allemanha, que pôz á s ordens de
Mousinho, durante a sua permanencia em Berlim, um capitão do seu
estado maior - homenagem que só costuma prestar-se a grandes per-
sonagens, e que 6 uma prova de que os altos feitos de Mousinho d'Al-
buquerque, e os brilhantes triumphos alcançados pelas forças do seu
commando, são devidamente apreciados no extrangeiro.
Sobre o fim da sua viagem encontramos no jornal francez Le Temes
um interessante artigo, em que se fazem declaraç6es importantes so-
bre Lourenço Marques, e que por isso julgamos conveniente trans-
crever.
Eil-o :
'O governador geral da colonia portugueza de Moçambique, maior
Mousinho de Albuquerque, acha-se em Paris desde hontem. ~ecebido
pelo presidente da republica, teve tambem uma entrevista com o Sr.
Hanotaux, ao ministerio dos negocios extrangeiros. O Sr. Mousinho de
Albuquerque está incumbido pelo seu governo d'uma missão em Paris,
em Londres, para onde parte hoje, e em seguida em Berlim - missão
que consiste em affirmar a vontade bem determinada de Portugal, de
nada modificar no statu que, no que diz respeito ás suas colonias de Mo-
çambique em geral e de Lourenço Marques em particular.
O major é uma personalidade particularmente bem escolhida para
assegurar a intengão de Portugal de manter a integridade do seu do-
minis colonial da costa Este de Africa. E', com effeito, o vencedor do
Gungunhana, esse potentado negro cuja revolta ameaçava ter os mais
funestos resultados. Esse monarcha negro, o mais poderoso da Africa
austral, depois de Cettiwavo, dispunha d'um exercito sério e comman-
dava grande numero de senhores feudaes, recordando os vassallos da
epocha merovingia. Nas assembléas s6 *votavameffectivamente como
detentores da terra de que tinham sido investidos.
Foi o major Albuquerque que derrubou com um acto de temeridade
beroica, esse poderoso adversario. A' frente de quarenta e oito cavai-
leiros apresentou-se no acampamento do Gungunhana, e, no meio do
REVISTA LUSO-AFRICANA 1211
seus vassallos estiipefactos, fez prisioneiro o rei. Este lance de audacia
foi iirn triumljho para o Sr. Albuquerque, e desde entao Portugal só
teve de reprimir algumas revoltas parciaes dos antigos tributarios do
Gungunhana.
Estivemos agora, em I'aris, com o Sr. Albuquerque. A nosso pedido,
contou-nos esses incidentes com a modestia do verdadeiro soldado.
Foi com o mesmo a r tranquillo que nos expoz a missão que vem cum-
prir á Europa.
- Segundo as noticias sensacionaes que leu nos periodicos inglezes
- disse-nos o sr. Albuquerque - não é sem interesse para n6s acalmar
os espiritns, affirmando a nossa intençãovde nada abandonar da inte-
gridade dos nossos direitos em Moçambique. De resto - accrescen-
tou o sr. Mousinho - o governo não faz senão tornar-se interprete da
vontade nacional que, por preço algum, toleraria que s e cedesse Lou-
renço Marques ou qualquer outra parte da nossa colonia, fôsse a quem
fosse.
--Certamente o Sr. major não ignora como a opinião publica se im-
pressionou aqui com a idéa de que o porto de Lourenço Marques pode-
ria passar para as mãos dos inglezes e que a este respeito se suggeriu
a neutralidade de Delagoa Bay como meio preventivo ?
- Essa solução extrema não se impõe por agora; tanto mais que
Portugal está decidido a observar, aconteça o que acontecer, umaneu-
tralidade absoluta em toclos os conflictos possiveis. N'estas condições,
parece tambem que Purtugal poderia contar com a intervenção das po-
tencias se um Estado qualquer transgredisse, para comnosco, os prin-
c i p i o ~do direito das gentes.
O futuro de Lourenço M a r q ~ ~ preoccupa
es o governo portuguez e o
Sr. Mousinho de Albuquerque. Os aperfeiçoamentos a introduzir 110
porto e a s facilidades .de descarga - disse-nos o sr. hilousinho - foram
alvo de numerosos estudos e propostas. Hoje. Portugal está decidido a
collocar promptamente em adjudicaçáo, em conformidade com uma lei
approvada recentemente, os trabalhos do porto, que permittirão aos
navios descarregar em caes. A linha do caminho de ferro soffreu obras
que a colloCam em condições de satisfmer a um trafico de 1:2çX) tone-
ladas por dia.
- X'estas condições - disse-nos 'o Sr. Albuquerque - Lourenço
Marques não tardará a tornar-se o primeiro porto da Africa austral,
e a occupar o logar que a sua situação e as suas facilidades lhe mar-
cam.
Estas affirmações do sr. Albuquerque são tanto mais Importantes,
quanto o seu regresso á provincia de Moçambique se realiaria logo de-
pois do cumprimento da sua rapida missão. Poderá, assim, velar pes-
soalmente pelo desenvolvimento d'uma colonia que tão hem soube de-
fender contra todos os seus inimigos.,,'
Popula~ãode Lourenço Marpztes:-A populaçiio total da cidade de IAOU*
renço Marques, segundo um mappa official referido a 31 de dezembro
de 1897, era de 4902 habitantes, assim distribuidos, segundo as nacio-
nalidades: portuguezes, 3:605; inglezes, 663; chinezes, 156; francezes,
100; italianos, 86; allemães, 74; hollandezes, 36; suissos, 33; gregos, 28;
americanos do norte, 28; hespanhoes, 19; austriacos, 16; brazileiros, 14;
suecos e norueguezes, 12 ; russos, 7 ; japonezes, 7 ; belgas, 6; dinamar-
quezos, 4 ; maltezes, 4 ; turcos e transvalianos, 2. Ha, pois, em Lourenço
Marques, representantes de nada menos de 21 nações.
Dos portuguezes 1:(i33 silo europeus, :I19 asiaticos e 1:053 africa-
nos.
Inaugncrnçito (tas ohras c10 porto:,- No dia 21 d'este mez, dia do anni-
$%RTWGAL EM AFRI('A-Março, 189%-V~L.b. 4
versario do principe real, foram inauguradas a s obras do porto de
Lourenço Marques: assentando-se o primeiro bloco.
Como se sabe a lei de 21 de setembro ultimo auctorisou o governo
a proceder á construcção das obras necessarias para o melhoramento
do porto d'aquella cidade por meio de empreitadas parçiaes, com pre-
via adjudicação em concurso publico.
O plano das obras deve ficar brevemente concluido, procedendo-se
actualmente 5,s sondagens geologicae.
Aliiita o rlea&hntrti d o Hum bc. - 1-lectificando umas affirma-
ç6es feitas quando se soube em Lisboa a noticia do desastre no Hum-
be, e em que se apreciava injustamente, e de certo por errada infor-
mação, o procedimento do Sr. Ramada Curto governador geral d'An-
gola, attribuindo-se-lhe responsa1)ilidades que realmente lhe não com-
petiam, puhlicamm as Norid(cdcs uma correspondeiicia de Loanda, d a
qual extrahimos os seguintes periodos :

uQuando, em outubro ultimo, o governador geral çommuriicou para


a motropole que a peste bovina, que de ha muito grassava para além
do rio Cunene, limite sul d'esta provincia, tinha transposto a fronteira
e invadido o territorio portuguez, perguntou s ministro para aqui, s e
haveria meio de estabelecer postos de desinfecqão ao longo d a fron-
teira. A esta pergunta respondeu o governador geral e desde logo, pelo
telegrapho, que era impoasivel impeair a invasão da peste, pois ainda
que s e estabelecessem postos de desinfecção, o que não era exequivel,
a caga silvestre, abundantissirna n'aquellas regioes. se encarregaria de
a trazer comsigo.
Aqui tem, portanto, v. contrariada a asserção que avança o auctor
do artigo, dieendo que: por ordem despropositada e imbecil do gover-
nador geral, o esquadrão de dragões de Mossamedes tinha sido fraccio-
nado em pequenos destacamentos, no intuito de se constituir um cor-
dão sanitario ao longo da fronteira.
Com respeito a este fraccionamento, a verdade é a seguinte:
De Lisboa veiu, a pedido do governador geral, um certo numero d e
seringas e agulhas para inoculações a fazer no gado, confiando-se este
serviço ao medico, delegado de saude no Lubango, planalto de Mossa
medes, dr. Roque, o qual, acompanhado d'uma parte do esquadrão de
dragões, partiu para a região do Huml)e, a cêrca de 300 l<ilometrosd'a-
quelle ponto
Terminado que foi este trabalho, retirou o medico e com elle o e s -
quadrão, praticando-se então o erro grosseiro de fraccionar este em
pelotões, mas nào por ordem do governador geral, que estando em
Loanda, e não sendo isso das suas attribuições, ignorava absolutamente
o que se passava no Humbe n'aquelle momento, para onde não ha t e -
legrapho, é claro.
Não vem para aqui accasar pessoa alguma, mas a responsabilidade
de quanto se passou cabe exclusivamente ao commandante do esqua-
drão de dragões, que foi quem ordenou clue elle se dividisse em pelo-
t6es na retirada.
Mas ha mais: o esquadriio de dragões comporta uma secçiio de ar-
lheria, que tinha tambem seguido para o Humhe, pois por occasião
d'esta funesta retirada, as peças seguiram com um dos pelotões, em-
quanto que as culatras das mesmas vieram com outro!
Diz o auctor do artigo eni questão, que o espirito guerreiro do es-
quadrão de dragões estava por completo abatido, devido isto a inercia'
e immobilidade a que estava condemnado por ordem superior. Erro
completo: so o espirito guerreiro do esquadràio estava abatido, o que
ignoro, deve attril~uir-seesse b c t o ri falta de disciplina, de energia, de
rigor militar, por parte de quem o commandava, e tanto assim era,
que muito antes dos tristes acontecimentos que lamentarnos, já o go-
veriiador geral, que C' tinha percebido, havia resolvido nomear ixin
novo commandante, o capitão Bivar, que ao tempo estava na JJunda.
Infelizmente, este official não chegou ao planalto de Mossamedes a tem-
po de evitar os erros que o seu antecessor praticcira quando foi da re-
tirada c10 Hurnhe, quando 15 chegou já o infeliz conde de Almoster
havia sido morto.,
De unia outra correspondencia transcrevemos tambcm a seguinte
noticia relativa ao ataque d a fortaleza do Humbe:
.-A regiào do Humbe é enorme e muito povoada, e a ninguem deve
surpreheilder o gentio conseguir reunir muitos milhares de homens.
Em 19, 20, 21 e 24, data em que sahiu da Chibia a columna de ope-
rações, o gentio atacou a fortaleza do Humbe, mas inutilmente. Tive-
mos cinco praças feridas e uma morta. Esta noticia foi recebida pelo
commandante da columna no trajecto d a Chibia para os Gambos. Em
vista d'ella, foi apressada a marcha; a peste bovina, porém, contra-
riou-a muito, dando causa á morte de muitas cabeças, tendo de ficar
alguns carros sem bois.
O gentio, ao saber que a expediqiio portugueza ia bem disposta e
municiada, atemoriso8se e fingiu pedir utate-culo, (perdão), e n'este
sentido mandou um soba ao commandante da fortaleza do Humbe.
As chuvas; que ha tres dias recomeçaram, embaraçam a campanha,
e por isso creio levará algum tempo a applicação do castigo.,
- O sr. ministro da marinha louvou o sr. governador geral dlAngola
pelas acertadas providencias que adoptou n a organisagão d a expedi-
ção que foi enviada ao Humbe afim de castigartos revoltosos, e man-
dou tambem louvar os officiaes que constituiam a guarnição da forta-
leza pela coragem' e tenacidade com que se defenderam contra repeti-
dos ataques do gentio.
São merecidos estes louvores porque effectivamente o sr. governa-
dor geral, sem subsidio algum da metropole, conseguiu organisar uma
das expediç7jes militares mais numerosas e melhor municiadas que
teem sido enviadas a o plari'alto de Mossamedes.
A força que defendia a fortaleza do Humbe, em circumstancias
pouco favoraveis, escassa e sem grandes meios de defeza, soube resis-
tir ás investidas de um gentio numeroso, excitado pelo revez que ha-
viamos soffrido e desejoso de tirar ainda mais solemne vingança das
violencias e das extorções que o haviam levado a deixar a s q a attitu-
de naturalmente pacifica.
Foram pois bem merecidos tanto os louvores dirigidos ao sr. Ra-
mada Curto, como aos ofliciaes e forças d a expediçgo.
.Wnun d e maiiica. - N'uina correspondencia do nosso amigo
Delfim Monteiro, illustrado tenente de ençenheria, e datada de Mace-
quece em 28 de janeiro ultimo, encotltramos interessantes informaç0es
sobre a s bellezas da região de Manica, e acerca das riquezas minerias
e seu desenvolvimento n'aquella região.
3'essas informaç2les transcrevemos a s seguintes que de certo deve-
rão interessar os nossos leitores ;
132 PORTUGAL EM AFRICA

&Entrea s minas, aqui existentes, destacam-se pelo desenvolvirriento


dos seus trabalhos as minas da Penha I,onga e as de Pardy. Mencionarei
em especial, a Guy Fawks Gold Miniiig Company. N'esta mina, foi, ha
dias, inauaurada pelo si.. coronel Gorjão, illustre governador do territo-
rio da Companhia de Moçambique, uma bateria Sandycroft, de 10 pilões,
que veiu substituir um velho moinho Huntington. N'esta mina, a som-
ma da altura dos seus 3 poços dá quasi 300 metros, e o comprimento
das 17 galerias cêrca de 3 3 0 0 metros.
Por meio dos poços e galerias de minas se reconheceu já a continui-
dade do fil&o até 150 metros de profiindidade, tendo n'alguns pontos 3
metros de largura.
A percentagem do ouro obtido foi a seguinte:
Julho -80 toneladas de minerio - 3370 grammas de ouro -- 42,2
grammas por tonelada.
Agosto - 145 toneladas de minerio 4:0'30 grammas de ouro -- 27,ti
grammas por tonelada.
Setembro - 172 toneladas de minerio - fj356 grammas de ouro -
%,9 grammas por tonelada.
Outubro - 140 toneladas de minerio - 4402 grammas de ouro -- 31,4
grammas por tonelada.
Novembro - 287 toneladas de minerio - -ti:85l grmmas de ouro -
346 grammas por tonelada.
Dezembro - 187 toneladas de minerio - 6:%31grammas de ouro -
3S,3 grammas por tonelada.
Isto é, em média 34,7 grammas por tonelada.
Se compararmos esta média com a obtida no Transvaal que, segun-
do o (rAnnuaire Français de hlines diOr de 1896,, é de 13,25 grammas de
ouro por tonelada de minerio esmagado e empregado os mais aperfei-
(ioados systemas de extracção, sem esquecer o tratamento dos residuos
pelo cyaneto de potassio ou electricidade, que, aqui, ainda n&ofoi pos-
sivel empregar, por falta de installações apropriadas, concluimos qua,
pelo menos, uma mina promette enriquecer os accionistas.
Convém notar que no Transvaal é rara a. mina cujo rendimento ex-
cede 20 grammas por toneladas.
Ha um mes, foi a região mineira percorrida em varias direcções,
pelo engenheiro Sr. Baeur, aqui enviado pela Oceana Company, bem co-
nhecida do mundo financeiro.
Este engenheiro, que permaneceu durante sete annos no Transvaal
e cuja compctencia não póde ser posta em duvida, disse-me que tinha
encontrado as minas mais ricas do que esperava e que voltaria, desde
que em Londres organisasse uma companhia.
As minas, existentes em territorio inglez, mas pertencentes á Com-
panhia de Moçambique, são taml-)emmuito ricas e abundantes em mi-
nerio de ouro e prata, e nas mesmas condiqões estão a s do valle ~e
Inhamucarara, onde a companhia portugueza tambem tem proprieda-
des mineiras (filões D. Luiz e Maria Pia).
No valle de I n h a m c a r a r a existem tambem ricas minas de ferro
e cobre.
A s minas dos valles de Zaml)uzi, Revué, Chua, Inhamucarara. Chi-
mexi e parte superior do Metari, exigem a construcção de um ramal
do caminho de ferro da Beira que, sahindo de Macequece, suba o valle
do Revu6 ou Chua, ganhando as alturas de Penha Longa, por meio de
reversões ou cremalheira. A construcgão d'este caminho de ferro pela
Companhia de Moçambique tinha, além de um lucro certo, a grande uti-
lidade de nacionalisar rapidamente esta região. A nacionalisapão d'este
paiz tem merecido ultimamente á Companhia de Moçambique as maio
res attenções, sendo o sr. coronel Gorjão iilcançavel n a escolha dos ca-
lonos para aqui enviados.
Infelizmente, é impossivel fazer nada sem o auxilio do governo. Pok
outra parte, ha a luctar contra a rotina e ignorancia do paiz, que só sabe
REVISTA LUSO-AFRICANA 133

emigrar para o Urazil, qiie com certeza, lhe não pode offerecer urn fu-
turo tào prospero como esta parte da Africa, onde se paga a uin pe-
dreiro ou carpinteiro regular uma libra por dia!
Os que se dedicam á agricultura vêem tambem o seu trabalho re-
pyinpensado em demasia, recebendo por uma couve 500 r&s e mais!
lodos os legumes produzidos encontram facil venda por preços eleva-
dissimos, em FClacequece, Mutali ou Beira.
O s que viessem dedicar-se á creação de gado, tirariam tambem lu-
cros enormes.
0 s commerciantes ganham tanto, que ouvi, ha dias, dizer a um iie-
gociante de vinhos que não tornaria a trazer, para cá, vinhos de 1..
qualidade, porque, apesar de os vender todos immediatamente, apenas
ganhava 25 p. c. !
Este pouco intelligente portuguex prefere, como a maioria dos nos-
sos patricios, vender-nos pessimos vinhos, que nos envenenam e des-
acreditam.
A maioria dos negociantes extrarigeiros pensam e bem que se de-
7em coiitentar com um lucro moderado, pois qiie, assim, vendem mui-
tissimo e a final veem a ganhar muito mais. &s, deixando este assutn-
pto, em, que falei por incidente, eu gostaria de convencer os capitalistas
e operarios do meu paiz de que os seus esforços e capitaes teriam aqui
liicros remuneradores e certos e que estes veriam o seu trabalho mais
bem pago.
As condições sanitarias, que podem aterrar muitos, são incompara-
velmente melhores dib que ahi se suppõe. Sobretudo na Beira e Manica
todos se dão, em geral, bem, sendo de notar-se que isto se dá niesmo
corri a s mulheres e creanças- o que é devido, na Beira, á proximidade
do mar e solo arenoso, em Manica á elevada altitude e pureza das
aguas.
Perto de Mecequece, sobre o monte Vumba (1600" de altitude), estd-
se construindo, por ordem do sr. coronel Gorjão, um sanatorio, onde
com certeza, se restabelecer80 os que adoecerem n'outros pontos do
territorio. Por todas estas razctes, julgo prestar iim serviço aos meus
patricios aconselhando-os a vir para cá. Capitalistas, commerciantes,
artistas, lavradores todos aqui, teem vasto campo para o seu trabalho,
e uma larga e certa remuneração. Não duvido dizer que todos os homens
honestos e trabalhadores, aqui encontrarão riqueza, ou abastança para
si e suas farnilias.,
Casnimigas D'uma carta com data de 12 de dezembro, escripta por
um missionario de Cassinga, extrahimos as seguintes noticias:
'A famosa Rittder-Pest fez aqui a sua apparição na semana passada.
De 32 bois e vacas que havia n'esta missão apenas restam dois, que
provavelmente morrerão d'um dia para o outro. Ficamos sem bois, sem
vaccas o sem bezerros! Os rebanhos dos indigenas estão egudlmente
atacados pela Rinder-peat. Esta terrivel molestia foi aqui transmittida
por bois infectados, vindos dos Cuanhamas, em cuja região essea arii-
maes teem morrido á s centenas, e até aos milhares E o mesmo tem
acontecido no Humte, Cuamati e Quitete. Parece que os bois infecta-
dos passaram tamhem o Cunene, para os lados de Caconda; se assim
8, estamos sem meios de transportes. Actualmente todos os bois de
C apemb6 estão a caminho de Caconda, com destino a Benguella. Se a
peste chegou tambem a Caconda, seremos obrigadds a renunciar a
qualquer viagem a Benguella, e a quaesquer serviços em que seja ne-
cessario o auxilio de bois.
Se por um lado esta terrivol epidemia nos causa tantos prejuizos,
por outro lado produz effeitos salutares entre os indigenau de todas a s
tribus, que attribuem este Ragdlo a um espirito qualquer, que, por esta
forma quer punil-os pelas suas guerras injusta^.
A triste praga (10s gafanhotos continua a fazer destroqos. nao só eni
Cassinga mas em toda a provincia de Angola.
-"A 19 de riovembro tivemos aqui a visita do principe Boris, da
ltuusia. li um homem muito instruido, extremamente aniavel e deli-
cado e d'uma sympathia attrahente. Ficou muito penhorado com a re-
cepção simples, mas franca e cordeal que aqui se lhe fez. Visitou as
minas d'ouro, e disse que, se ellas prometterem, fornecerá capital para
a sua exploração. Convidei-o a visitar toda a missão, começando pela
capella, onde elle ajoe:hou deante do S.S., bem como deante da imagem
de N. S. das Victorias, fazendo em amlbos os alliares uma pequena ora-
ção.

Huillcrr A p e d e bovina invadiu o plan'alto de Huilla, vinda do


Humbe onde tem causado consideraveis estragos, pois que de 2' :O00
caljeqas de gado vaccum que alli havia, não escaparam talvez l:(!CiO.
Huilla, Jau, Humpata, ICihita e Gambos teem soffrido enormes prejui-
zos de gado. Tem-se vucinado o gado com o fel de animaes atacados,
segundo o systema do dr. Kock, mas não se poderá salvar mais que 50
por cento.
Conseguiu-se estabelecer na missão catholica de Huilla um posto
vaccinico que tem prestado bons serviços n'aquella região. O s animaes
inoculados em bom estado de saude escapain 6 peste na proporção
de 40 a 50 p. c. e os doentes na razã.0 de 2 p. c . O afamado criador Eri-
kson, um do8 mais importantes negociantes de Damaralaiid, perdeu j&
2900 cabegas de gado bovino, victimadas por tão assoladora epizootia.
Erikson foi á missão d e Huilla estudar o systema de inoculação con-
t r a s peste. Os prejuizos toem sido consideraveis, apesar das acertadas
providencias decretadas pelo actual governador geral da provincia de
Angola.

Variam iio$icirrrrr Partiram para Angola, no vapor de 17 de fe-


vereiro, os n~issionariospadre Felix Perchatn; com destino á missão de'
Malange, e o irmão Gervasio corn destino á missão de Cabinda.
-Victima de urna hematuria, falleceu em Landana, no dia 7 de ja-
neiro, o Sr. padre hleyer. Era muito estimado por todos os que tiveram
a ventura de conhecer de perto a s u a bella alma, e extremamente que-
rido pelos antigos educandos da missão, que disputaram entre si a
honra de conduzir á sepultura os seus restos mortaes
-No Libollo foram atacados de febre hernaturica oito brancos, fal-
lecendo dois. O Sr. Oabriel Antonio d a Silva, intelligente e zeloso chefe,
foi obrigado a sair do Libollo, por ter sido tambem atacado por estas
febres sua ex.iilTaesposa. A missão perdeu n'elle um dedicado e bom
amigo. Picou exercendo interinamente aquelle 1ogz.r o sr. Jorge de Dala
Luza.
-Chegou ultimamente de Malange o rev. padre Jorge Krafft, cuja
saude se tem resentido bastante da sua permanencia em Africa dix-
rante 1 7 annos. Apesar d'isso, logo que se restabeleqa regressará á sua
querida missão, que ficou ii~terinamentea cargo do rev. padre Joa-
quim.
,r peste boviiio erii Amigolu. Pelo ultimo paquete chegaram da
costa occidental il'Afi.ica a s mais desoladora,s rioticias sobre a peste
bovina n a proviiiçia d'Angola.
A doença, tendo penetrado no nosso territorio pela fronteira do sul-
t e m seguido a sua marcha para o norte, avançando em media 10 kilo,
metros por dia.
Ataca todos os animaes de uniia rachada, como os bois, carneiros,
cabras e toda a especie de antilopes. São estes que, emigrando em nu-
merosos bandos para o norte, levam o germen da doença e o espalham
pelos pontos onde existe o gado vaccum, sendo por isso impossivel
deter a marcha da peste por meio de cordões sanitarios, vaccinações
ou outros quaesquer processos de beneficiação.
Por outro lada, os indigenas, aterrorisados com a perda de grandes
rebanhos de gado e temendo o apparecimento de alguma epidemia rc-
sultante da putrefacção dos animaes mortos pela peste, domestico8 e
selvagens, que, pelo grande numero, não podem ser enterrados, teem
abandonado a s suas povoações.
Ha muito a recear que da enorme quantidade de animaes insepul-
t o s resulte uma grave epidemia, que segurament,e ser&peor flagello
que a peste hovinã. I

Accresce a circumstancia grave da contaminação das aguas dos


rios pelos animaes atacados.
Outra circumstancia que concorre para tornar mais precaria a si-
tuaçilo dos indigenas é a frequencia dos ataques pelos animaes carni-
voros: leões, tigres e onças, que, privados da caga mais atiunwtante nos
sertões, os antilopes, se atiram aos indigenas.
Para cumulo de tanta miseria, recrudesceu a praga de gafanhotos,
que teem devorado todas as plantações dos indigenas e dos europeus.
A peste, tendo devastado os gados e a caça no Damara, invadiu o
sobado do I-íumbe, cuja principal riqueza é constituida pelo gado vac-
cum, que pereceu quasi todo, escapando apenas ctois a tres por cento,
Este Estado, que antes da invasão da peste possuia milhares de
rrianadas de bois, acha-se reduzido á maior miseria. Apesar de todas
as tentativas por parte das auctoridades para su)er a marcha da peste
para áquem do rio Cunene, a doença propagou-se rapidamente qa Donga
ao cuanhama e depois ao Humbe, por intermedio de numerosos bandos
de antilopes, que por todos os pontos passavam do Ovampo para o
Humbe, fugindo deante do flagello.
Do Humbe propagou-se o mal para os Gambos, seguin'do d'ahi para
a I-Iuilla e Humpata. Por outro lado a peste seguia a marcha ascencio-
nal, atacando todos os gados dos povos situados entre os rios Cunene
e Cubango, taes como: Cuan'riama, Cuamato, Vale, Hailda e Cassinga;
espalhou-se pelos Ambuellas e Ganguellas, fazendo sentir os seus effei-
t o s a t é Catoco e filassaca, ultiiria zona atacada á chegada das ultimas
noticias.
A missão de Cassinga perdeu todo o gado, escapando apenas uma
vacca velha. Nas miss6es 2 3 Catoco c hlassaca de 10') bois escaparam
:i,send'o atacadas a s cabras. Ein gado não vaccinado escapam em m6-
dia 3 por cento, ern gado vaccinado escapam de 50 a 'por cento. 0
126 PORTUGAL E M AFRICA

celebre caçador Erickson, estabelecido no namara, tendo vacci~iado


todo o seu gado, 4 : W bois, conseguiu s lvar 2:W.
Na missão da Huilla fizeram-se vaccinações e a t é á data das ultimas
noticias tinham os missionarios esperanças de salvar uma parte im-
portante dos seus bois. Nota-se, porém, que a limpha vaccinica enviada
para Mossamedes não inspira bastante confiança, pois que a s expe-
riencias feitas no gado do Huml)e por u rn medico da provincia não de-
ram resultado animador.
Quasi todo o gado vaccinado com a limpha fornecida pelo governo
tem morrido, sendo de crer que ella se alterou por effeito de mudanças
climatericas, ou por qualquer outra razão O que é facto averiguado é
que Erickson, tendo feito vaccinações por processos imperfeitos, (ser-
vindo-se do liquido da vesicula felica dos bois mortos), conseguiu sal-
var 60 por cento do gado atacado.
Como resultado d a extraordinaria diminuição no gado, avaliam-se
as suas consequencias para as condiç6es ecoriomicas da populaç5o d a
provincia, sabendo-se que um boi, que antes da peste custava o maxi-
mo 16$000,custa actualmente 70$000.
Não havendo bois para puxar os wagons, cessaram os transportes
de mercadorias entre o littoral e os sertões e d'ahi a impossibilidade
de transaccionar com os indigenas; por outro lado faltam os generos
alimenticios aos europeus. Tem-se empregado os carregadores do tran-
sporte das mercadorias, mas esses exigem preços exhorbitantes e es-
quivam-se a esse serviço, porque havendo fome, em todo o sertão, já
por falta de gado e caça. jri pela recrudescencia dos gafanhotos, os in.
digenas veern-se obrigados a vigiar de perto a s suas plantações e a
procurar outros meios de alimentação. A situação das missões torna-
s e deveras precaria visto que lhe faltam generos alimenticios e outros
de primeira necessidade para o regular funccionamento dos seus insti-
tutos. A missão da Huilla com 5W pretinhos a sustentar vê-se em
grandes embaraços para obter generos alimenticios. O s gafanhotos
destruiram todas a s suas plantaçdes.
Apesar de todas estas contrariedades capazes de quebrantar o ani-
mo aos mais corajosos, continuam o s heroicos missionai-ios os seus
tra1)alhos de evangelisação e aldea.mento dos indigenas. Na miskão de
Catoco desenvolve-se a aldeia christá, que em breve será uma hella co-
lonia sgricola.
Consta que o governo local requisitou a s armas, os cavallos e grande
porçiio dos mantimentos da ririssão. de Huilla. O Sr. Padre Antunes,
que estava dirigindo a vaccinação no matto, teve de ceder o seu cavallo.
Entre Chibia e Kibita estavam n'um deposito da missão uns 20 car-
ros de mantimentos que foram tornados.
ESCRIPTORIO
ADVOGADO E AGENCIA
DE NEGOCIOS ECCIESIASTICOS
Banqueiros da Curia Romana e Nnnciatnra em Lisboa
(CORRESPONDENCIA DIRHCTB PARA ROhlA)

T m t a de di.qpc.n.sas de parentésco c de hanlzos,


provis0er para festas,
ordenaçües de clerigos, avisos regios, supplementos tle edtctlc,
justificaqoes de estado livre,
baptismo, obito r! casamento, correr banhos,
de qualquer dependcncin da Curia Ronana., Nuncitrtum,
Secretaria do Ex.'" e R ~ V . ~A~*ce?ispo
" Primaz,
A.«visvrin, Ca?nal*ne Relapo Xcclesiastica.
*&ol%ita ordmapei, eolkiyi?es, licengas de c o n ~ s s a e~ *cclebg*a,*,
eie., etc., efc.

Gustavo de Lima Brandão


Fernando Rodriuues de Carvalho
BRAGA -- Campo das Hortas
Das 9 hora8 da manhã ás 3 ,ta ta&#
Typ. da (;omp. NPC. Editora

S-ar putea să vă placă și