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PATENTES de MATÉRIA BIOLÓGICA

Artur Alves, 2003


Ciências da Comunicação
Faculdade de Ciências Sociais e Humanas
Universidade Nova de Lisboa
 Artur Alves 

 Índice

Introdução............................................................................................................3

Capítulo I: Definição e Âmbito das Patentes........................................................7

Capítulo II: Patentes Biotecnológicas e Comercialização de Matéria Biológica.....11

1. Problemas éticos e disposições jurídicas: a directiva n.º 98/44/CE..........17

Capítulo III: Patenteação de Microorganismos, Plantas e Animais....................20

Capítulo IV: Patentes de Matéria Biológica Humana..........................................24

Considerações Finais. .........................................................................................31

Bibliografia.........................................................................................................34

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 Patentes de Matéria Biológica 

 Introdução

E ste trabalho tem como objecto uma questão bem actual, premente e,
de certo modo, uma das que apresenta contornos mais indefinidos e
suscita ampla reflexão nos campos jurídico, biomédico e ético. A patenteação de
matéria biológica e a aplicabilidade das patentes, enquanto forma particular de
propriedade (assunto a que dedicaremos a nossa atenção mais tarde), a seres
vivos abre, contudo, questões de ordem mais vasta, que se relacionam com o sis-
tema comercial e industrial, ou seja, num sentido mais lato, problemas de ordem
económica. As questões científicas estão, obviamente, implícitas.
O desenvolvimento actual das biotecnologias trouxe, para a Humanidade,
enormes vantagens, deixando divisar as grandes potencialidades da tecnociência
e abrindo um campo de intervenção ao Homem que, para algumas correntes, o
aproxima demasiado de Deus - ou de um deus. A realidade é que, desde a desco-
berta da existência e a decifração das funções do ácido desoxirribonucleico (ADN)
e do aparecimento de técnicas que permitem manipulá-lo, com a emergência da
engenharia genética, os cientistas foram capazes de cada vez mais longe, em
movimentos cada vez mais ousados, na direcção de práticas cujas consequências
não são imediatamente divisáveis, nem exclusivamente científicas. Assim, numa
brevíssima cronologia, é já em 1944 que uma equipa de cientistas mostra a impor-
tância do ADN para veicular a informação genética.
Em 1953, Crick e Watson apresentam a estrutura em dupla hélice da molécu-
la de ADN, enumerando as bases que compõem os nucleótidos (adenina, citosina,
guanina e timina)1. O código genético que medeia entre genes e proteínas é desco-
berto por Ochoa e Nirenberg, nos anos 60. A engenharia genética propriamente dita
nasce com as técnicas de recombinação artificial de ADN, em 1973. «O princípio da
engenharia genética é transferir um gene estranho para uma célula hospedeira, a
fim de que a proteína codificada pelo gene seja aí sintetizada»2; as técnicas usadas
para proceder à transferência são múltiplas, cada vez mais sofisticadas, à medida
que se intervém em espécies mais complexas. Os casos mais recentes e mediáti-
cos estão ainda bem presentes, como seja o caso da célebre ovelha Dolly, da gata

1
Como seria de esperar, é completamente impossível, neste trabalho, tecer quaisquer conside-
rações de ordem científica. A nossa orientação preferencial é a ética e a moral, relativamente às
patentes - não abdicando, contudo, de alguns esteios conceptuais.
2
MISSA, J.-N. e PINSART, M.-G., «Engenharia Genética», in HOTTOIS e PARIZEAU, 1998:187.

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CeeCee ou dos rumores de tentativas de clonagem humana na China ou por parte de


um médico italiano.
Trabalhando sempre com este princípio, não tardou até que se fundassem as
primeiras empresas biotecnológicas (os pioneiros foram os fundadores, em 1971, da
Cetus) exclusivamente dedicadas à engenharia genética, que desde então tem evolu-
ído rapidamente, o que fica bem demonstrado pelo destaque que as suas realizações
vêm tendo no espaço público e na formulação de políticas nesta área, como o Projecto
Genoma Humano.
Ora, o facto de serem privadas as entidades que se ocupam da área da en-
genharia genética revela que toda a pesquisa e desenvolvimento levada a cabo tem
como horizonte último a obtenção de lucro e que, ainda que haja convénios e morató-
rias, acordos e leis, esse carácter nunca vai ser rejeitado ou ultrapassado. Então, o que
se passa é que, de modo a proteger aquilo que as empresas consideram como sua
propriedade intelectual, fruto do seu próprio investimento e trabalho, estas recorrem
ao mecanismo instituído da patente. A patente á um dispositivo legal eminentemente
voltado para aplicações industriais e comerciais, que confere um direito intelectual
temporário, mas alargado e exclusivo, ao inventor de um determinado produto ou pro-
cesso. Mais adiante, definiremos com maior precisão este ponto.
É o cruzamento entre a matéria viva e a propriedade ou direito intelectual que
causa problemas. De facto, e dada a distinção jurídica clássica entre, por um lado, coi-
sas e pessoas e, por outro, coisas comuns e coisas que podem ser possuídas, de entre
as quais, só as invenções humanas, e não as descobertas, poderiam ser patenteadas,
não seria possível reclamar direitos sobre uma forma de vida ou partes dela enquanto
tal. Obviamente, isto não impede a invocação de direitos de propriedade e exploração,
como bem notam Suzanne Oschinsky e Gilbert Hottois no seu Dicionário de Bioética3.
Contudo, não são direitos equivalentes, uma vez que os organismos e matéria bioló-
gica que, até hoje, têm sido submetidos a patente não ocorrem naturalmente, sendo
antes fruto de uma intervenção humana de qualquer sorte. As questões éticas não
desaparecem, contudo, com esta constatação. Mesmo aceitando a aplicabilidade do
sistema de patentes, é necessário ainda ter em atenção os efeitos que a comercializa-
ção das biotecnologias podem ter sobre as mesmas e sobre a sociedade, mormente
sobre a investigação científica e as práticas biomédicas.
Um dos grandes receios é, por exemplo, a re- orientação da pesquisa científica
privada (e mesmo pública), de acordo com objectivos estritamente comerciais, volta-
dos para a obtenção de patentes - que são, de resto, o modo mais eficaz de protecção

3
Oschinsky e Hottois 1998:39-43 (entrada «Aplicabilidade de Patentes a Seres Vivos»).
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da propriedade industrial e intelectual que os sistemas jurídicos hodiernos põem


à disposição - e posterior comercialização. Este é um grande senão no conjunto
das vantagens oferecidas pelas patentes.
A tecnociência, enquanto poderoso instrumento de intervenção sobre o
Mundo, tende a usar a Natureza em seu próprio proveito. Nada disto é novo. Con-
tudo, veremos ao longo deste trabalho como o conjunto de questões colocadas
pelas novas capacidades de manipulação e transformação é abrangente a se
relaciona com questões mais vastas, que vêm complexificar enormemente aquilo
que está em causa. Isto porque, ao particular assunto das patentes de matéria
biológica estão ligadas questões como a biodiversidade e preservação de espé-
cies (discussão particularmente acesa no que diz respeito ao debate sobre os
organismos geneticamente modificados), direitos humanos, direitos dos animais,
direitos das gerações futuras, problemas ambientais e questões religiosas.
A ordem jurídica já está parcialmente adaptada a esta realidade. Mas tal
pode não ser suficiente. A criação de precedentes jurídicos e a simples considera-
ção de manutenção da capacidade competitiva (sobretudo na eterna “rivalidade”
entre a Europa e os Estados Unidos da América) pode dificultar a imposição de
princípios éticos a uma ciência que, habitualmente, segue inexoravelmente os
seus caminhos. Desde a queda parcial do princípio de regulação paritária, após
os julgamentos de Nuremberga, é admitida pela sociedade - excluindo sectores
da própria comunidade médica - a necessidade de uma ética para as ciências da
vida, que permita desenhar e impor limites às actividade da biomedicina. Limites
esses que têm de ser mais do que uma mera deontologia, para bem maior da
sociedade e da Humanidade.
Tratados e convenções sucedem-se. Mas há, entre os modos de alargar
a percepção dos problemas criados pela tecnociência em geral e pela biome-
dicina e biotecnologia em particular, uma área interdisciplinar que permite um
pensamento mais frutuoso sobre estas questões. A Bioética surge como forma de
pensar estes problemas, enquadrando-os de um modo que reflecte a complicada
interdependência do mundo em que vivemos e, sobretudo, as consequências das
acções do ser humano no ambiente, nomeadamente nos ecossistemas naturais.
A tecnociência, enquanto modo de acção humana, contém em si mesma contra-
dições e limitações que, inelutavelmente, surgem com a sua aplicação no mundo.
Não nos referimos apenas às mais do que óbvias espadas de dois gumes, repre-
sentadas tradicionalmente pela energia atómica, cujas consequências benignas
convivem com as mais desastrosas aplicações bélicas. Há também casos, como
o do produto químico DDT, em que as consequências não são tão imediatas nem

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tão mortíferas, mas que apresentam riscos não negligenciáveis.


Assim, é urgente colocar questões e interpor barreiras entre aquilo que é pos-
sível fazer e aquilo que se deve fazer em ciência, em primeiro lugar e, depois, usar de
precauções múltiplas ao fazer sair do laboratório para a fábrica e, depois, para a bios-
fera, os produtos que resultam da inovação tecnocientífica. O alargamento do campo
da Bioética vai permitir um repensar destas questões, introduzindo no tradicionalmente
hermético mundo da ciência considerações que vão além do pura busca do conheci-
mento, nomeadamente de ordem moral. A complexificação dos processos de decisão
em ciência pode ser compensada por uma discussão abrangente que permita uma
melhor compreensão entre ciência e sociedade. A emergência da Bioética deve-se, em
grande parte, à percepção dos limites ético- morais da tecnociência, que exige uma
intervenção, em nome do bem comum.
Este trabalho, incidindo sobre o problema da patenteação de matéria biológica,
vai abordá-lo por fases, ao longo de quatro capítulos. O I Capítulo é dedicado à defini-
ção da noção e âmbito da patente, descrevendo aquilo que é, no ordenamento jurídico
avaliado na literatura especializada, o processo através do qual uma patente pode
ser obtida, para que serve, como actua e quais são as suas limitações. No II Capítulo
estabeleceremos uma relação entre a obtenção de patentes de matéria biológica e a
comercialização, baseada nos pressupostos do Capítulo I. Dar-se-á, neste ponto, uma
atenção especial à Directiva do Parlamento Europeu e do Conselho da União Europeia
(Directiva n.º 98/44/CE, de 6 de Julho de 1998), relativa à protecção jurídica das inven-
ções biotecnológicas. Referiremos sucintamente outras disposições em vigor para esta
área, como convenções e tratados. No III Capítulo dedicar-nos-emos ao estudo dos
problemas éticos e morais suscitados pela patenteação de organismos não humanos
(microorganismos, plantas e animais), enquanto no IV e último capítulo resumiremos
as complexidades relativas às patentes de matéria biológica humana.
Esperamos, assim, poder dar um panorama geral mas sucinto e actual do esta-
do da questão, tecendo comentários e explorando as complexidades de tão profundo
problema - que está, não nos esqueçamos, na ordem do dia, tal como todas as temá-
ticas relacionadas com a biotecnologia.

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 Capítulo I: Definição e Âmbito das


Patentes

S egundo o Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida, em


parecer emitido em 1993/1994,

A patente, integrando o leque dos direitos de propriedade, surge (...) como um


exclusivo de protecção, obedecendo a determinados requisitos específicos, mormente
a novidade, utilidade, susceptibilidade de aplicação industrial, inventabilidade e repe-
tibilidade. O seu titular dispões, assim, se um direito de produzir ou utilizar a invenção
patenteada»4. Mais sucintamente, «Uma patente é um direito exclusivo, mas temporá-
rio, de explorar um objecto caracterizado por (a) novidade; (b) actividade inventiva; (c)
aplicação industrial. Estes três critérios determinam a aplicabilidade de patentes: deve
tratar-se de uma novidade resultante de um processo de invenção que seja industrial-
mente explorável. A aplicabilidade de patentes a seres vivos implica, pois, a possibili-
dade e a vontade de o tratar em conformidade com estas três características.4

Temos aqui, portanto, duas definições bem claras e sucintas daquilo que
se refere quando falamos de patente. Percebemos, deste modo, porque é esta
considerada o modo mais eficaz de proteger uma invenção. É um regime con-
cebido para proteger a indústria e os inventores, orientado para a atribuição de
benefícios e compensações pelo investimento em pesquisa e desenvolvimento,
ou seja, tende a premiar o inventor e fabricante de um determinado produto ou
processo. Confere, na prática, o direito exclusivo de uso, ou monopólio, de um
determinado objecto patenteado, a uma dada entidade que requer a patente, ne-
gando a todos os outros o direito de fabricar, usar ou vender tal invenção. Tem um
período de tempo limitado e não é renovável, o que significa que, tendo em conta
o processo burocrático exigido para a obtenção de uma patente, no termo desse
período, o objecto se torna passível de uso público. Na realidade, de modo a obter
uma patente, o requerente tem de entregar uma descrição da invenção que per-
mita a um técnico da área recriá-la e usá-la - no entanto, o Estado encarrega-se
de se certificar que ninguém tem o direito de o fazer, para além do requerente.
Estes direitos exclusivos constituem uma enorme vantagem para o inven-
tor e fabricante, uma vez que não só lhe dão a propriedade intelectual sobre o

4
Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida, Documentação, vol. II (1993-1994), Presidência do
Conselho de Ministros, Lisboa, INCM, Maio 1995, pg. 98.

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produto, como lhe permitem auferir lucros substanciais a partir da sua comercialização
monopolista. Assim, verificamos que as patentes funcionam como um incentivo para
actividades que possuam as características que exigem para a sua concessão: a acti-
vidade inventiva e a aplicação industrial. Ou seja, o investimento em produtos novos é
generosamente remunerado pelas leis que regulam as patentes, justificando, assim, a
atracção que a obtenção de patentes origina. Isto é verdade em todos os campos da
actividade industrial, mas assume, neste trabalho, particular interesse na biotecnolo-
gia; também aqui, as patentes dão o incentivo necessário para arriscar avultados inves-
timentos privados na indústria. Aliás, os lucros que este sistema permite são normal-
mente tidos como justificados por políticos, economistas, empresas e investigadores,
devido à grande produtividade e contínuo desenvolvimento de empresas dessa área.
Quanto maior é a novidade e originalidade do produto ou processo desenvolvido, maio-
res são os riscos assumidos no investimento, mas é também maior o proveito e a pos-
sibilidade de obter uma patente muito vantajosa. E, claro, a utilidade é essencial e fácil
de compreender, até por uma lógica puramente económica de alocação de recursos.
A repetibilidade é, por si só, extremamente relevante na medida em que é o factor que
determina a capacidade de produção ou aplicação industrial. A ciência é construída a
partir das regularidades, nas quais tende a instalar máquinas.
Compreendemos facilmente que, em vista do bem público e tendo em conta
um “direito natural”, o Estado concede estas patentes (por períodos limitados, habi-
tualmente entre 15 e 20 anos), contanto que cumpram estes requisitos. Ainda que,
tradicionalmente, fossem concebidas e concedidas para objectos inanimados, os esta-
dos alteraram as suas disposições legais e políticas - estamos a pensar no caso dos
Estados Unidos da América - de modo a poder responder às solicitações constantes
das novas empresas da área das biotecnologias, que procuravam, a partir dos anos
70, modos de rentabilizar a sua pesquisa, por um lado e, por outro, responder a uma
crescente solicitação por parte de uma sociedade progressivamente medicalizada. De
facto, a procura de produtos de cariz biotecnológico alarga-se com o crescimento da
cronicidade das doenças, problemas ambientais e novas doenças incuráveis, que de-
positam uma pressão acrescida sobre os sistemas de saúde públicos e privados. É
como se, actualmente, a ciência já não pudesse limitar-se a procurar na Natureza os
seus recursos, mas se visse impelida, devido aos meios fantásticos de que passa a
dispor, a elaborar os instrumentos vivos com que tem de trabalhar. Para alguns, trata-
se de mais um aprofundamento da Ciência que já não pode deixar de ser tecnociência;
para outros, é um passo cuja medida o Homem não pode aferir com segurança.
De notar que, como afirma Enrique Marín Palma, a ideia de patente vem acom-
panhar a concepção de que era necessário proteger os inventos enquanto forma de o

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Homem intervir sobre a Natureza, de colocar as forças naturais ao seu serviço5.


Daqui, aliás, se depreende, devido à divisão implícita entre Homem e Natureza,
que teria necessariamente de se considerar, para efeito de atribuição de paten-
te, a distinção entre descoberta e invenção. Segundo o parecer do CNECV já
mencionado, que por sua vez se baseia no Código da Propriedade Industrial, «a
“invenção” tem como objecto algo que não existia ainda, representando uma con-
cepção inteiramente nova, uma criação nova do espírito, ao passo que a “desco-
berta” coloca em evidência uma coisa que ainda não era conhecida, havendo nela
unicamente o reconhecimento ou a verificação, pela primeira vez, de elementos
ou fenómenos até então desconhecidos»6.
É esta distinção que causa problemas quando passamos, dentro das paten-
tes, para patentes de matéria biológica. As complexidades e subtilezas dos novos
regimes de patentes - que já não aquele trabalhado na sequência da Revolução
Industrial -, que nos pareceram algo herméticas a princípio fazem, contudo, todo o
sentido quando se tem em conta outros elementos, de que falaremos nos capítu-
los seguintes quando nos referirmos com mais pormenor às patentes de matéria
biológica. Contudo, continua a ser, para muitos, contra- intuitivo e até sacrílego
falar de patentes nestas condições. Não obstante, como já referimos, a revisão
das disposições legais urge quando se encontra em jogo algo de que toda a Hu-
manidade pode beneficiar. Para além de proteger o inventor, a patente - convém
termos isto em mente - beneficia também o público em geral e o consumidor em
particular, não só por incrementar o crescimento económico e o desenvolvimento
científico e industrial (o que também está longe de ser linear, como é óbvio), mas
também por responsabilizar claramente a entidade por hipotéticos danos ou in-
cumprimento. Claro que, a jusante, temos também as vantagens comerciais que
advêm do monopólio e cujos rendimentos funcionam como «incitamento à activi-
dade científica»� de não pequena relevância.
É necessário ainda considerar que existem diversos tipos de invenção,
cada um relativo a objectos distintos e conferindo prerrogativas diferentes aquan-
do da candidatura a patente. Trata-se de invenções de produtos, de processos,
de dispositivo para iniciar o processo ou de uma utilização do produto. Como é
habitual na literatura sobre a questão, apenas teremos em consideração, para
este trabalho, as invenções de produtos ou processos, embora as invenções de
utilização de um produto também possam definir alguns aspectos das patentes
biotecnológicas.
5
Cf. «Patentes de Materia Viva», CAMBRÓN, A., 1998:165.
6
CNECV, 1995:107

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Ora, as patentes relativas à invenção de produtos são aplicáveis, segundo a


CNECV (Comissão Nacional de Ética para as Ciências da Vida), a plantas ou animais
transgénicos, órgãos, tecidos, células e produtos sintetizados por qualquer um deles;
as patentes relativas a processos são concedidas para proteger o processo pelo qual
são obtidos os produtos ou as novas substâncias, a partir deles. Isto reveste-se de par-
ticular importância no debate sobre a patenteabilidade de genes humanos. De resto,
estas são as distinções consideradas canónicas pela literatura analisada, possuindo
um valor inestimável para a discussão que se desenrola em torno destes temas. As
questões mais propriamente relacionadas com as patentes biotecnológicas são anali-
sadas no capítulo seguinte.

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 Capítulo II: Patentes Biotecnológicas e


Comercialização de Matéria Biológica

N uma entrevista concedida à revista Scientific American, John J. Doll,


director para a biotecnologia do US Patent and Trademark Office, es-
tima que, desde 1980, foram concedidas mais de 20 000 patentes para genes
ou moléculas relacionadas (relativas a todos os organismos vivos) e que existem
cerca de 25 000 aplicações cujas candidaturas são passíveis de atribuição de
patente. Isto é bem revelador do tipo de corrida às patentes que decorre na indús-
tria biotecnológica extremamente competitiva dos Estados Unidos da América,
iniciada, nos moldes actuais, no final dos anos 60, quando se tentou patentear o
primeiro microorganismo geneticamente modificado.
Aquilo que torna a patenteação de matéria biológica tão problemática são
as diversas dimensões da questão inicial. Ou seja: em primeiro lugar, há resis-
tências à possibilidade ou moralidade de reclamar propriedade sobre organismos
vivos ou partes deles, qualquer que seja a sua forma; depois, não parece óbvio
que o espírito do conceito e instituição da patente seja o adequado, uma vez
que se destina a produtos e processos industriais e não exactamente biológicos.
Claro está, o facto de existir, hoje em dia, uma “bio- indústria”, deveria ser - e
foi - suficiente para uma redefinição das fronteiras do patenteável e, mesmo, das
concepções tradicionais de coisas que podem ou não ser apropriáveis enquanto
propriedade intelectual/industrial. O pano de fundo destas questões continua a
ser a possibilidade de obter lucros com a alteração e manipulação genética dos
organismos existentes na Natureza, ou seja, com a comercialização� dos produ-
tos biotecnológicos e a subordinação da investigação biomédica a imperativos de
mercado. As inquietações e perplexidades são tanto mais compreensíveis quan-
to estas indústrias operam com questões de saúde pública, manipulando, com
maior ou menor controlo, produtos de carácter biológico dos quais depende a
nossa sociedade largamente medicalizada (por exemplo, o sangue para transfu-
sões, que é submetido a processos de tratamento antes de chegar ao destinatá-
rio. De salientar que, sendo embora a doação de sangue voluntária e gratuita, as
empresas que fazem os tratamentos necessários à purificação e isolamento dos
componentes obtêm com isso lucro, também devido ao facto de possuírem as
patentes dos processos de tratamento).
Ora, como já afirmamos supra, parece-nos que as fronteiras foram modificadas

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 Artur Alves 

por imperativos e razões perfeitamente justificáveis, uma vez que o desenvolvimento das bio-
tecnologias tem mostrado a sua utilidade para a Humanidade. Ainda que as suas maiores
promessas (terapêutica genética alargada às doenças hoje incuráveis, para as doen-
ças genéticas, no campo da transplantação, testes genéticos, clonagem e intervenção
nas linhas somática e germinal) ainda façam parte do futuro, podemos afirmar que,
pelo menos a avaliar pelos números do USPTO, um longo caminho foi já percorrido,
em que as disposições legais e o modo de fazer ciência se influenciaram mutuamente,
de forma a conseguir um equilíbrio sempre frágil. Tal equilíbrio consegue-se, quase
sempre, com alguns atropelos às considerações éticas consideradas relevantes ou
indispensáveis por sectores menos liberalizantes, ou mais conscienciosos.
Os problemas apresentados pela comercialização (cuja essência não nos com-
pete, aqui, colocar em causa) são múltiplos, mas todos relacionados com esta orien-
tação das pesquisas e produção para a obtenção de lucros (recordemo-nos que mes-
mo o trabalho dos investigadores do National Institute of Health dos EUA - entidade
estatal - é sujeito a patentes de modo a, de acordo com os responsáveis, rentabilizar
a pesquisa e financiá-la), o que justifica o uso da instituição da patente. Esta, como já
vimos, tem como objectivo, entre outros, o estímulo da continuação das pesquisas e
desenvolvimento de novos produtos e processos.
Mas diversos autores nos alertam para os problemas éticos e jurídicos suscita-
dos pela patenteação de matéria biológica, como uma das dimensões específicas do
problema mais vasto da comercialização destes produtos. De alguns desses proble-
mas apercebemo-nos quando falamos das patentes. Há autores que afirmam haver a
possibilidade de uma propriedade pública do património genético, mas esta hipótese
revela-se como apenas parcialmente alternativa, porque fica aquém do objectivo (lou-
vável, aliás) de estímulo à actividade inventiva e científica. Apesar de tudo, a engenha-
ria genética ainda não está a tornar realidade os vaticínios apocalípticos de alguns, e
é de crer que trará grandes vantagens para a Humanidade. Aliás, com o actual estado
da questão, não é realista pensar que se possa dar uma alteração radical do actual
modelo. Na realidade, «Las empresas biotecnológicas existentes y las que a un ritmo
frenético comenzaron a aparecer, denotaban el terreno multimillonario que se pre-
sentaba como seguro para la inversión de sus capitales»7, o que constitui o melhor
incentivo possível para uma acção agressiva e impossível de parar.
Tal como acontecia com as parcerias e joint- ventures que neste campo organi-
zavam empresas e institutos de investigação ou laboratórios. O horizonte último desta
cooperação é sempre a obtenção de exclusivos (leia-se patentes) para produzir um

7
«Patentes de Materia Viva», CAMBRÓN, A., 1998:169

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qualquer produto, sempre lucrativo ou com bom potencial, ou descobrir um pro-


cesso revolucionário para a indústria farmacêutica e genética.
A esta cooperação tão próxima não pode deixar de apontar-se um defeito:
teme-se, e nem sempre sem razão, que o facto de os cientistas se encontrarem
sob pressões deste género possa dar azo a uma condução exterior das pesqui-
sas. Na realidade, pensa-se que, em nome de imperativos comerciais, de molde
a obter patentes sobre os resultados com maior valor comercial da sua pesquisa,
os investigadores podem inflectir a sua pesquisa para esse tipo de áreas. Igual-
mente, ao estar nos quadros de uma empresa privada, o investigador encontra-se
sob a alçada de uma entidade que, muito provavelmente e em nome do segredo
comercial, limitará severamente o intercâmbio científico. Segundo Enrique Marín
Palma, investigadores de institutos públicos sentem-se, com alguma frequência,
tentados a vender os resultados das suas investigações nesses centros, ocultan-
do-os do público e da comunidade científica a troco de somas avultadas, que não
auferem enquanto funcionários do Estado.
Obviamente, percebemos que aqui está presente uma cláusula moral, que
não considera motivo válido para a alteração das linhas de pesquisa científica o
lucro. As imposições ético- legais que a sociedade moderna coloca à investigação
científica são de natureza completamente distinta. Com esse objectivo são colo-
cadas nas directivas relativas às patentes cláusulas que salvaguardam a ordem
pública e bons costumes, justamente pensando em casos semelhantes de claro
atentado à ética e à moral vigente. Igualmente, são de modo comum impostas
severas limitações àquilo que pode ser ou não patenteado, normalmente dividin-
do a matéria biológica em categorias semelhantes a estas: micro- organismos,
plantas, animais não humanos e ser humano.
A nível da avaliação moral, há dois grandes modos de olhar para a questão:
a partir dos princípios e a partir das consequências (principialismo e consequen-
cialismo, segundo Rogeer Hoedemaekers). São orientados para os efeitos que um
produto pode ter, e cada um tenta definir critérios básicos para a atribuição ou não
de uma nova patente; são, contudo, limitados, e tendem a passar por cima da pró-
pria tecnologia, sem uma posição crítica que seria essencial para perceber o carác-
ter moral e ético da engenharia genética. Segundo o autor referido, é importante

(...) a more contextual and two- way approach, which does not only examine the manner in
which a specific technology is embedded in (and is influenced by) specific moral, cultural
or religious values (which may be questioned), but also the manner in which technology is

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transforming important moral and cultural values (which may raise new moral questions).8

Só com esta nova estratégia se pode passar para uma nova forma de avaliar o
sistema, tal como ele está - sem que se ponha na mesa a possibilidade de um corte
radical com ele, como já foi acima referido.
A patenteação levanta questões morais muito importantes. Operou um corte ex-
tremo com o modo de ver o mundo e a acção humana, graças à engenharia genética.
A subsistência de visões metafísicas das formas de vida faz com que, ao discutir este
problema, nos deparemos com a sacralização, religiosa ou não, da vida e da matéria
biológica. Assim, um argumento frequente refere-se aos receios de redução da vida a
mero problema de composição química; os materialistas afirmam, porém, que a vida
em si não é o objecto da patente, mas sim compostos químicos. Na mesma linha de
sacralização da vida, argumenta-se afirmando que patentear matéria biológica obede-
ce a uma falta de reverência pela vida, mas não nos parece, tal como acontece com
Nils Holtug, que isso seja muito diferente de possuir animais. Relativamente ao bem-
estar e ao problema do sofrimento, falaremos mais adiante, no capítulo dedicado à
questão específica das formas de vida que podem ser objecto de patente. Obviamente,
o facto de ser possível patentear matéria biológica faz-nos ver a vida, como fenómeno,
de um ponto de vista diferente.9
Os debates desenham-se principalmente em torno da patenteação de genes
mas, de um modo geral, há pouco de definitivamente admitido neste campo, muito
embora se continuem a adoptar os procedimentos normais das patentes. Procura-se
justificar moralmente o sistema de patentes, a aplicabilidade destas a formas de vida,
a patenteabilidade do ADN e, particularmente, do material genético humano, a própria
patenteação de invenções (a que já nos referimos) e a avaliação dos efeitos da própria
patenteação. Do campo técnico- legal ao religioso e lógico, passando pelo ambiental,
nem sempre estão directamente relacionados com os efeitos os argumentos utilizados.
A avaliação da tecnologia e da moral subjacente é multidisciplinar e incide sobre to-
dos, ou quase todos, os aspectos do processo que desemboca no pedido de patente,
pondo em causa, segundo Hoedemaekers, os princípios que orientam a pesquisa, a
investigação e desenvolvimento, a patente, o fabrico, os testes, a publicidade e marke-
ting, o uso apropriado e as consequências ou implicações sociais. Em qualquer uma
destas fases, directamente relacionadas com a comercialização dos produtos biotec-
8
HOEDEMAEKERS, 2001:274.

9
Seguimos aqui de muito perto HOLTUG, Nils, «Creating and Patenting New Life Forms», in A Com-
panion to Bioethics (ed. Helga Kuhse and Peter Singer), Blackwell Companion to Philosophy, Grã-
Bretanha, 1998, pgs 206-14.

14
 Patentes de Matéria Biológica 

nológicos, colocam-se problemas prementes, o que justifica a importância que a


uma avaliação moral deve ser atribuída. Segundo o autor referido, esta avaliação
deve implicar:

1. Analysis of the various forms of interaction of a specific technology with society or


societal segments of various stages of development.
2. Exploration of (new) moral issues resulting from this interaction at various levels.
This involves mapping and analysis of interests, objectives, claims, arguments and
concepts, used in the various (moral) debates generated by a specific technology.
3. Exploration of value systems generated by a specific technology and its products
and its interaction with important societal values.
4. Examination of the transformational and conditioning powers of a specific technol-
ogy. This includes assessment of the promotional and marketing phase.10

Note-se que, tal como é preconizado pelo autor, dá-se primazia à aná-
lise ético-moral e não à consideração dos efeitos ou à imposição de princípios
apriorísticos ao processo. Esta concepção é ideal para a tomada de decisão e
discussão dos processos, sendo, portanto, particularmente indicada para os de-
bates alargados, orientados ou não para a definição de políticas. De qualquer dos
modos, aqui se encontram sintetizadas as principais preocupações e perplexida-
des relativas à patenteação de matéria biológica em geral. É nestas dimensões
que nos vamos basear para, nos próximos capítulos, tornar a nossa análise mais
pormenorizada.
Há ainda algo a que não nos referimos mas que, por lhe encontrarmos par-
ticular interesse, não queremos deixar de apontar: as relações Norte- Sul na bio-
tecnologia. Na realidade, verificamos que os países em vias de desenvolvimento,
onde de encontra uma grande biodiversidade, constituem enormes reservatórios
potenciais de genes. No entanto, o que acontece é que, como em muitas outras
áreas, estes são recursos que só podem ser explorados em grande escala pelos
países desenvolvidos, do Norte. O facto de nestes se estar a desenvolver a ten-
dência a usar as patentes como forma de protecção pode levar a que a biodiver-
sidade dos países do Sul seja “apropriada” e aproveitada em favor das empresas
biotecnológicas, não possuindo os primeiros, em contrapartida, a capacidade e
recursos quer para concorrer, quer para comprar os novos produtos postos à dis-
posição. É aquilo que Renée Vellvé classifica como «(...) un conflit très grave entre
le statut des ressources génétiques comme patrimoine commun de l’humanité

10
HOEDEMAEKERS, 2001:283.

15
 Artur Alves 

et le statut de propriété privée que l’on accorde aux inventions intelectuelles»11. As


questões que aqui perpassam, relativas à biodiversidade e aos direitos dos países
pobres, são vastas e muito difíceis de pormenorizar, mormente num trabalho com esta
dimensão. Fica, no entanto, a referência e o enquadramento.
Mas, claro está, o património genético não é patenteável na sua forma natural,
como veremos detalhadamente mais adiante. O que acontece é que genes, ou sequên-
cias de genes, apenas podem ser objecto de patente se forem resultado de intervenção
humana. O processo artificial de obtenção do objecto sobre o qual é pedida a patente é
condição sine qua non para a sua concessão. Isto é decisivo na argumentação de que
nos ocupamos aqui. Por exemplo, a patente de um microorganismo só pode ser conce-
dida se ele tiver sido geneticamente manipulado, não ocorrendo na Natureza, ou tiver
sido isolado dela, purificado, por assim dizer, por meios técnicos. Assim, a obtenção de
uma forma mais pura de um gene (digamos, um que codifique a disposição para uma
determinada condição) ou a descoberta de uma forma mais simples de sintetizar uma
proteína são patenteáveis, por serem originais relativamente aos processos naturais.
A comercialização, que se desenhara como fantasma durante tanto tempo, pas-
sou a ser uma realidade bem presente, fazendo emergir perigos que tanto podem
dizer respeito a excessiva permissividade como a um proibicionismo moralista. As mu-
danças estruturais possíveis, cujas variantes analíticas já foram descritas, têm de ser
debatidas e ponderadas, de modo a agir em conformidade com as questões colocadas
pelo desenvolvimento da ciência, que a experiência mostra ser praticamente impará-
vel, em termos práticos. Este facto levou a que fossem dadas à luz inúmeras directivas
e convenções, destinadas a limitar e controlar legalmente o desenvolvimento e as
áreas de expansão da biotecnologia. Tomaremos, em particular, a Directiva Europeia
relativa à protecção jurídica das invenções biotecnológicas como objecto de análise,
para verificar o estado das políticas europeias neste campo. Sempre em mente esta-
rão também os Estados Unidos da América, de longe a maior “potência biotecnológica”
e o país pioneiro nesta área.
Entre disposições legais e documentos de cariz menos vinculativo, verificamos ha-
ver um cuidado especial na reflexão política e ética sobre estes temas. De qualquer modo,
a fronteira entre as diversas possibilidades de discussão é muito mais marcada no que
diz respeito ao Homem do que relativamente a microorganismos, plantas e animais. Aqui,
há diversos níveis a ter em conta: o nível molecular, celular, dos órgãos e do próprio ser
humano. Teremos isso em conta quando, no último capítulo, analisarmos essas questões.

11
In GROS e HUBER (Org.), 1992:499.

16
 Patentes de Matéria Biológica 

1. Problemas éticos e disposições jurídicas: a directiva n.º 98/44/

CE

S egundo o Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida,

[A]s fontes legais que podemos encontrar em matéria de direito de patentes


a nível europeu, para além das legislações nacionais, são as seguintes: Convenção
Europeia de Patentes (Convenção de Munique), de 5 de Outubro de 1973; Convenção
Internacional para a Protecção das Obtenções Vegetais (Convenção de Paris), de 2
de Dezembro de 1961, revista em 23 de Outubro de 1978 e o Tratado sobre o Reco-
nhecimento Internacional do Depósito de Microorganismos para Fins de Processo em
Matéria de Patentes (Tratado de Budapeste), de 28 de Abril de 1977.12

É a partir destas disposições vinculativas, ratificadas por países da União


Europeia que, em 1998 sai a lume a Directiva n.º 98/44/CE, relativa à protecção
jurídica das invenções biotecnológicas. Tem como bases o direito de patentes
tradicional, datado do século XIX, mas também os recentes desenvolvimentos,
a nível de pedidos de patentes de matéria biológica, na Europa e nos Estados
Unidos, e procura estabelecer um chão comum para os países membros se guia-
rem e harmonizarem a legislação, na senda da criação de um mercado único
nos termos do Acto Único europeu. Verificamos que esta directiva também tem
raízes nas Conferências de Asilomar, realizadas a partir de 1975, para debater
os riscos representados pela tecnologia de ADN recombinante, e nas Guidelines
elaboradas a partir das mesmas na Europa e Estados Unidos da América, com
vista a regular as investigações científicas realizadas, bem como os seus usos
comerciais.
Apesar da necessidade de uma directiva tal se fazer sentir desde os pri-
meiros pedidos para concessão de patentes e dos primeiros desenvolvimentos
da engenharia genética, sobretudo nos EUA, sucederam-se propostas e directi-
vas transitórias, como a de 1995, até se chegar a um ponto favorável à redefini-
ção de algumas questões, posteriormente originando o documento a que devo-
taremos a nossa atenção nas páginas seguintes.
Ainda nos considerandos, podemos constatar a importância que o Conselho
e o Parlamento Europeu já dão à engenharia genética, à indústria biotecnológica e

12
CNEV, 1995:98.

17
 Artur Alves 

à sua evolução actual, bem como aos motivos de ordem económico- financeira que presi-
dem ao uso da patente por parte dessa indústria, como forma de proteger as suas ob-
tenções e investimentos. Parece-nos também estar plenamente consciente da função
reguladora e fiscalizadora dos Estados e administração, reafirmando a utilidade das
patentes para a protecção jurídica, bem como a necessidade de harmonizar definitiva-
mente o conjunto contraditório de legislações nacionais em vigor com as definições e
disposições dos tratados internacionais. Isto com finalidade comercial e de eficácia do
funcionamento do mercado interno europeu, em clara concorrência com os Estados
Unidos e Japão; está bem presente na exposição de motivos da directiva a intenção
de incentivar o desenvolvimento das vantagens que pode apresentar a engenharia
genética para a agricultura, para o ambiente, para a economia e para a saúde. Sem
esquecer, claro está, a salvaguarda das disposições internacionais relativas à protec-
ção da saúde pública, segurança, ambiente e da diversidade biológica e genética, bem
como das normas éticas e deontológicas.
Na exposição dos considerandos vemos ainda os problemas relativos ao uso e
patenteabilidade da matéria biológica humana; sobretudo, tenta-se impedir a possibi-
lidade ou veleidade de apropriação de algo mais do que elementos isolados do corpo
humano, identificados e purificados por processo externos, i.e., técnicos. Num plano
mais vasto, também as patentes de matéria biológica não humana são, ainda que de
um modo mais moderado, sujeitos a condições, entre as quais se destaca, numa linha
de protecção dos países em vias de desenvolvimento, a exigência de localização geo-
gráfica da procedência da matéria a patentear. Reafirma-se a relevância dos conceitos
de ordem pública e bons costumes, devido ao alcance das invenções biotecnológicas
- aplicando-os, de facto, às temáticas da clonagem humana e da intervenção na linha
germinal do Homem. Os problemas relacionados com os Direitos Humanos, sofrimen-
to animal e derrogação de direitos de patente são também referidos.
Após os considerandos, a Directiva propriamente dita é exposta em cinco capítu-
los. O primeiro indica as regras de patenteabilidade, em que se dá a seguinte definição
de matéria biológica, crucial para este trabalho: «“Matéria biológica”, qualquer matéria
que contenha informações genéticas e seja auto- replicável num sistema biológico»13.
Os artigos 3.º, 4.º, 5.º, 6.º são relativos ao que é ou não patenteável, sendo os três
últimos uma forma de definição negativa, que inclui as espécies no seu estado natural
e o Homem, bem como as invenções contrárias aos bons costumes e ordem pública
que não são considerados patenteáveis, a saber:

13
Directiva n.º 98/44/CE, Cap. I, art. 2.º, n.º 1, a).

18
 Patentes de Matéria Biológica 

a) Os processos de clonagem de seres humanos;


b) Os processos de modificação da identidade genética germinal do ser humano;
c) As utilizações de embriões humanos para fins industriais ou comerciais;
d) Os processos de modificação da identidade genética dos animais que lhes
possam causar sofrimentos sem utilidade médica substancial para o Homem ou para
o animal, bem como os animais obtido por esse processo.14

O segundo capítulo estabelece o âmbito da protecção concedida por uma


patente, enquanto o terceiro faz referência às licenças obrigatórias por depen-
dência, relacionadas com a obtenção de patentes que, por ser impossível serem
obtidas ou exploradas sem violar um direito anterior, são necessárias para o re-
gisto legal de uma nova obtenção vegetal.
O capítulo quarto refere-se ao depósito de matéria biológica, acesso a essa
matéria e novo depósito, realizados de acordo com o Tratado de Budapeste de 28
de Abril de 1977, em substituição da descrição habitualmente exigida no registo e
pedido de patentes. De qualquer modo, esse depósito de matéria biológica numa
instituição reconhecida é, posteriormente, aberto ao público, mediante garantia de
não comercialização nem utilização que não para experimentação e estudo.
O Capítulo V inclui as disposições finais da directiva.

14
Idem, Cap. I, art. 6.º, n.º 2.

19
 Artur Alves 

 Capítulo III:
Patenteação de Microorganismos, Plantas e Animais

H á quem fale em “brincar aos deuses”. Há quem acuse cientistas e investi-


gadores, bem como empresas e governos, de estar a “jogar” com a Natu-
reza e com os genes, interferindo com estes de um modo que pode ter consequências
imprevisíveis. Mesmo com as actuais directivas e precauções da iniciativa de gover-
nos, fruto de estudos levados a cabo por comissões técnicas, científicas, éticas, conti-
nua a haver uma grande desconfiança em relação às futuras evoluções das patentes
de matéria biológica. Como afirma John Harris, é possível abusar ou fazer mau uso de
qualquer técnica ou descoberta científica, e só estando atentos podemos fazer face às
potenciais ameaças. E então, os nossos medos relativos às consequências ou efeitos
nefastos do uso dessas técnicas não nos devem impedir de usufruir daquilo que de
positivo elas nos trazem. Não podemos, ab ovo, limitar aquilo que pode ser uma mais-
valia para a Humanidade. A partir do momento em que foi possível fazer engenharia
genética através das tecnologias de ADN recombinante, o Homem não resistiu a rea-
lizar experiências com essa tecnologia.
Esta é uma inquietação que remonta a 1969 (embora alguns autores refiram
a patente de uma levedura registada por Louis Pasteur em 1873), quando surgiu a
necessidade de patentear o primeiro organismo vivo - neste caso, uma bactéria ma-
nipulada geneticamente, do género Pseudomonas, capaz de transformar o crude de
petróleo em alimento para gado, e com aplicação óbvia nos desastrosos derrames
de petróleo. A criação desta bactéria transgénica viria a dar origem ao célebre caso
Diamond vs. Chakrabarty, na sequência do qual a patente da bactéria viria a ser atri-
buída, em 1981 (U.S. Pat. No. 4,259,444) à empresa que financiou as pesquisas do
investigador Chakrabarty, a General Electric Company, com o argumento de que este
é um organismo que não ocorre naturalmente e, como tal, pode ser objecto de patente.
Contudo, esta decisão permitia patentear microorganismos modificados ou
“apenas” isolados da Natureza. Os primeiros são mais fáceis de explicar à luz daquilo
que é uma patente, tal como está exposto no I Capítulo deste trabalho, uma vez que
são novos e resultam de um processo inventivo. No entanto, os segundos já apre-
sentam problemas de outro tipo, devido à distinção já estabelecida entre invenção e
descoberta; por isso, foi à luz do Convénio de Munique, que, no seu artigo 53.º b), não
contempla limitações à patenteação de processos microbiológicos, desde que sejam
considerados úteis, i.e., que tenham um uso prático. Aqui, portanto, a invenção seria

20
 Patentes de Matéria Biológica 

relativa ao uso a dar à matéria biológica descoberta. Assim, como afirma Marín
Palma,

(...) Podemos deducir que es posible en Europa patentar un microor-


ganismo extraído de la naturaleza, si:
1. Es posible aislarlo del media en el que se encuentra.
2. Tiene posibilidad de crecer pos si mismo en las condiciones ade-
cuadas.
3. Posee una utilidad industrial demostrada.1516

Obviamente, tratando-se de “meras” bactérias imperceptíveis à vista, não


houve reacções muito acesas fora das comunidades científicas e empresariais,
aquelas que mais benefícios poderiam tirar desta deliberação. Como se compre-
ende, também estas podem causar problemas, mormente se forem libertadas
na Natureza17, ou se tiverem uma aplicação militar, como armas biológicas. Aqui
continuam a cruzar-se as grandes questões presentes neste trabalho, i.e., aquilo
que representa ter direitos de propriedade sobre uma forma de vida e, por outro
lado, a sua utilidade e rentabilidade económica para as empresas biotecnológi-
cas. Estas, à data da decisão do Supremo Tribunal Federal dos Estados Unidos
da América, atravessavam algumas dificuldades, e por isso acolheram com entu-
siasmo a nova oportunidade.
Relativamente às plantas, a patenteabilidade desenhou-se no horizonte a
partir de 1930, nos Estados Unidos da América, com o chamado Plant Act, que re-
afirma que a distinção válida para as patentes é aquela entre os produtos que ocor-
rem na Natureza e os manufacturados pelo Homem. Na Europa, contudo, só com a
Convenção de Paris de 1961, relativa à protecção das obtenções vegetais é que se
abre uma janela à patenteação de plantas, protegendo as obtenções concedendo
ao inventor direitos sobre a comercialização, mas não sobre o uso e propagação
normal dos seus produtos. A engenharia genética, contudo, esbatendo as fronteiras
entre espécies e reinos, também elimina a possibilidade de resistir à patenteação
de produtos que não poderiam existir na natureza (como seja o milho resistente aos
insectos, por exemplo). Este tipo de organismos é, actualmente, objecto de uma
dupla protecção, através da Convenção de Paris e da patente.

15
Op. cit., pg. 174.

17
A União Europeia possui, pelo menos desde 1990, directivas regulatórias concernentes à
libertação de microorganismos no meio ambiente, visando o seu controlo e restrição.

21
 Artur Alves 

A grande questão que se coloca relativamente às plantas transgénicas é, hoje


em dia, a necessidade de prover à alimentação de um número cada vez maior de seres
humanos, tendo em conta a escassez de terra cultivável e as limitações da produtivida-
de das espécies existentes, bem como a sua vulnerabilidade. Só que, lamentavelmen-
te, apercebemo-nos de que continua a ser complicado alimentar o Mundo, porque nem
todos podem pagar, por enquanto, os produtos geneticamente modificados. Talvez no
futuro a situação se altere.
As objecções morais a toda a sorte de manipulação genética são múltiplas, mas
há uma que merece especial destaque, que atravessa os grandes conceitos éticos
em consideração, uma preocupação com a manipulação de organismos vivos como
meios para alcançar os fins humanos. A atribuição de direitos morais a tudo o que é
vivo, bem como a imoralização de todos os processos não naturais (a procriação se-
lectiva é habitualmente considerada como um processo natural) são extremamente
difíceis, uma vez que não são defensáveis em seres que não sentem e não possuem
uma perspectiva do mundo, como os microorganismos, plantas e algumas classes de
animais multicelulares. Seria como atribuir direitos morais a esta folha de papel. O que,
sem dúvida, não implica a desresponsabilização do ser humano para com a Natureza.
As patentes de animais superiores apareceriam, sucedendo naturalmente aos
anteriores estádios de desenvolvimento crescente da engenharia genética, na segunda
metade dos anos 80. O primeiro caso data de 1987 e é relativo a uma ostra polipóide ge-
neticamente modificada, criada pela Universidade de Washington, cujo conjunto extra de
cromossomas lhe conferia um melhor sabor por ser estéril e não perder peso na época de
reprodução. A Agência de Marcas e Patentes norte- americana não concedeu a patente
por considerar a invenção óbvia, mas considerando, doravante, patenteáveis os animais
que obedecessem aos critérios habituais da patenteabilidade. A excepção continuava a
ser, como é óbvio, o ser humano. Já em 1988, o USPTO aceitou o pedido de patente para
um rato transgénico, por parte da Universidade de Harvard e dos investigadores P. Leder
e T. Stewart, ao qual tinha sido acrescentado um onco- gene18 e que se esperava vir a ser
útil na investigação oncológica. Na Europa, depois de ter sido negada, a patente viria a ser
atribuída em 1992, considerando a utilidade, novidade e carácter industrial da invenção
deste animal estranho à natureza. Hoje em dia, este rato pode ser adquirido por laborató-
rios interessados na pesquisa do cancro.
O facto dos animais sentirem, contudo, coloca-os numa posição diferente de
plantas e microorganismos. «A introdução de conceitos como “sofrimento” e “utilidade”
e a importância neles contida como pressuposto de atribuição de patente, parecem-

18
I.e., um gene causador de uma predisposição para o desenvolvimento de cancros.

22
 Patentes de Matéria Biológica 

nos fundamentais e consonantes com o princípio de que os animais também


são abrangidos pela análise ética, não no sentido de que os animais agem mo-
ralmente, mas no sentido de que são merecedores de protecção moral.»19 Isto
tem a ver com os direitos prima facie dos animais, ou seja, com as obrigações do
ser humano para com eles. Posições deontológicas confrontam-se com posições
utilitaristas, que têm em conta a superioridade moral das necessidades humanas
quando confrontadas com o sofrimento animal. Temos contudo, de ter em conta
que os animais transgénicos são animais de facto novos, e que, assim, têm um
telos próprio determinado, tal como a sua existência, pelo Homem.
Activistas continuam a tentar introduzir moratórias para limitar as patentes
e experiência com ou em vista da obtenção de animais transgénicos. Contudo,
os limites parecem-nos já estabelecidos nos seres humanos. Continua a não ser
possível patentear raças animais ou variedades vegetais tal como ocorrem na Na-
tureza e, de qualquer modo, os direitos de propriedade intelectual são limitados e
revogáveis. O medo das grandes quimeras humanas ou animais continua presente,
mas parece, de momento, afastado pelas limitações legais, deontológicas e éticas.
No entanto, a discussão em torno daquilo que é ou não patenteável no ser humano
parece ser a mais acesa, por motivos que iremos referir no próximo capítulo.

19
CNECV, 1995:115.

23
 Artur Alves 

 Capítulo IV:
Patentes de Matéria Biológica Humana

O problema reside no facto de considerarmos a patente sobre


os genes humanos como sinónimo da coisificação.
Há, porém, necessidade de clarificar qual a importância que
os genes têm - não só no que diz respeito ao sentido biológico,
mas no contexto ético. A questão é saber se os genes têm alguma
importância e qualidade específica quando encontrados no Homem.
Haverá uma correlação entre os nosso genes e a circunstância
de eles fazerem parte de nós enquanto raça humana,
em toda a sua dignidade?

(J.P. Remédio Marques)

Em seguimento daquilo que foi exposto nos capítulos anteriores, percebemos


que os ordenamentos actuais colocam o ser humano numa posição especial, rodeada
de protecções e ressalvas, com vista a proteger o Homem das intervenções contrárias
à “ordem pública” e “bons costumes”. Assim, é em nome destes princípios, bem como
das ideias de dignidade humana, auto- determinação, equidade e imponderabilidade
das consequências de determinados tipos de intervenção, que os governos e institui-
ções internacionais impõem barreiras sérias à engenharia genética quando aplicada
a seres humanos. Bem entendido, quando falamos de partes e produtos derivados do
corpo humano estas ressalvas continuam a aplicar-se, mas a extensão da comerciali-
zação destas áreas é já demasiado vasta, e os interesses económicos estão já dema-
siado instalados e dependentes, para poder impedir totalmente essa comercialização.
Daqui não se pode depreender, claro, que esse impedimento fosse desejável
ou benéfico. Pensamos que, ao longo deste trabalho, foi possível deixar claro que este
é o modo mais eficaz de promover a inovação e o desenvolvimento desta área crucial
da ciência hodierna. É também uma das maiores esperanças da Humanidade para
resolver problemas vastos, de saúde, de alimentação, ambientais e económicos o que,
só por si, justificaria alguma forma de consenso relativamente ao seu desenvolvimento.
É necessário fazer concessões e investir no sistema comercial sem, de modo algum,
permitir o livre curso dos interesses capitalistas orientados exclusivamente para o lu-
cro, sem consideração dos interesses gerais da Humanidade. Pensamos, assim, que
o futuro está na aplicação continuada do sistema em vigor, embora sob a “vigilância”
de instâncias reguladoras que coloquem balizas num caminho nem sempre claro ou

24
 Patentes de Matéria Biológica 

transparente. De resto, é este o esquema em vigor, tanto na Europa como nos


Estados Unidos da América. A permissividade liberal usualmente atribuída aos
EUA não passa de uma mistificação - pelo menos neste campo -, embora, na rea-
lidade, a União Europeia costume adoptar resoluções mais restritivas na área das
biotecnologias. Aliás, seria exactamente por isto que as directivas foram sendo
alteradas, de molde a colocar a EU em situação de igualdade concorrencial com
os outros gigantes económicos.
Seria neste espírito que as disposições sobre o corpo humano, nos seus
diversos níveis, se revelariam mais específicas e restritivas. Os vários níveis de
intervenção sobre a matéria biológica humana encontram-se bem regulamen-
tados e definidos, o que faz com que esse seja uma boa estrutura a aplicar na
análise a que nos dedicaremos nas próximas páginas.
Como já referimos, há diversos níveis de intervenção sobre o corpo huma-
no: molecular, celular, órgãos e ser humano por inteiro.
O nível molecular, que agrupa moléculas de origem humana - genes, pro-
teínas ou outros produtos -, não é considerado o mais problemático. De facto, inú-
meras patentes são concedidas anualmente para genes ou proteínas e proces-
sos de isolamento, purificação e sintetização dos mesmos. Como é óbvio, existem
barreiras, mas normalmente são colocadas no ponto em que aquilo que devia ser
uma invenção humana toca a mera descoberta ou descrição. A necessidade de
instalar estas barreiras deve-se às múltiplas tentativas de patentear secções do
genoma humano cujas funções não tinham sido ainda descobertas. Actualmente,
parece ser regra conceder patentes que incluem apenas genes e proteínas per-
feitamente conhecidos, mas só com as secções do genoma estritamente neces-
sárias para o produto a patentear. Isto porque, com o Projecto Genoma Humano,
se descobriu que muitos genes humanos são responsáveis pela sintetização de
diversas proteínas.
Aliás, muitos do microorganismos patenteados foram geneticamente alte-
rados de modo a produzir uma substância que apenas os seres humanos pos-
suem, para suprir as necessidades terapêuticas dos sistemas de saúde. Aqui
também, portanto, podemos detectar o carácter utilitário da engenharia genética
e das patentes de genes humanos. Em todo o caso, continuam presentes graves
questões. Quer se possam ou não patentear genes humanos, a verdade é que,
para efeitos de investigação científica, os cientistas possuem o poder (e, muito
provavelmente, a vontade) de lhes dar usos não permitidos publicamente, mas
também não divulgados. O secretismo laboratorial pode ser um aspecto negativo
do mecanismo das patentes. Em todo o caso, o uso público de invenções desta

25
 Artur Alves 

categoria não é permitido, pelo que está excluída a possibilidade de efeitos nefastos
em larga escala - o que não significa que este aspecto não seja digno de uma avalia-
ção moral séria.
Habitualmente, na escala molecular, é interdita a hipótese de patentear genes ou
proteínas no seu estado natural, por serem especificamente “partes do corpo humano”,
o que já não acontece quando são purificadas e isoladas, ou seja, quando a patente
versa sobre genes humanos sintetizados e modificados. Os genes, enquanto moléculas
orgânicas complexas, são tão patenteáveis como qualquer outro composto químico. O
seu estatuto especial advém-lhes de serem produtos naturais. O direito de patentes
tem, neste ponto específico, a vantagem de exigir a inventibilidade e novidade.
Seria, contudo, a este nível que se desenrolaria uma das maiores controvérsias
da genética humana: a intervenção sobre a linha germinal e/ou sobre a linha somática.
A primeira refere-se à manipulação genética dos gâmetas humanos, de modo a alterar
as características dos genes de que são portadores e, assim, poder eliminar defeitos
genéticos ou melhorar as características genéticas a transmitir à descendência por um
determinado indivíduo; se tem vantagens, no número de intervenções necessárias e
no melhoramento da espécie humana quer através da erradicação de doenças genéti-
cas, quer pela manipulação das características directa ou indirectamente controladas
pelos genes, possui a desvantagem moral de ser uma prática de natureza eugénica
e, como tal, injusta e condenável an sich. As intervenções sobre a linha somática sur-
tem efeitos apenas sobre o indivíduo em que são realizadas, destinando-se a corrigir
defeitos ou predisposições genéticas para determinadas doenças (como o cancro, por
exemplo). Têm a vantagem de não serem permanentes, uma vez que não se transmi-
tem para os descendentes e, logo, permitirem inflexões no modos de tratamento com
o avanço da ciência. Os riscos são, na nossa opinião, bem menores, quer para o futuro
desenvolvimento da ciência (por eliminarem património genético que não se conhece
a fundo, e que pode provar ser útil), quer para a Humanidade (por não se conhecerem
os efeitos que poderá vir a ter, em qualquer das gerações futuras afectadas pela in-
tervenção da engenharia genética num antepassado). Assim, a redução da incerteza
científica revela-se como o critério mais seguro a utilizar.
O mesmo parecem pensar os autores consultados, que condenam vigorosa-
mente as intervenções sobre a linha germinal do ser humano, seja sob que pretexto
for. Aliás, mesmo as intervenções e manipulação da linha somática só são admitidas
em caso de absoluta necessidade terapêutica. Igualmente, todos os processos de ma-
nipulação da linha germinal estão afastados do horizonte da patenteabilidade, ou seja,
não é possível, legalmente, intervir sobre o património genético futuro da Humanidade.
A nível celular, as considerações a tecer são de outra ordem. É corrente patentear

26
 Patentes de Matéria Biológica 

linhas celulares humanas, quando estas apresentam características particulares


que lhes conferem um carácter único, conducente a aplicações biomédicas de re-
conhecido valor terapêutico, desde o caso John Moore. Se, hoje em dia, é possível
realizar estas patentes, é porque os tribunais dão primazia aos investigadores so-
bre os dadores relativamente aos direitos e propriedade sobre as linhas celulares.
Células que, de resto, quando consideradas isoladamente, não são muito diferen-
tes, para efeitos de patenteação, dos microorganismos acima referidos.
No caso de John Moore, este paciente reclamou, junto do Supremo Tribunal
da Califórnia, nos Estados Unidos da América, direitos sobre células que tinham
sido extraídas do seu baço, que lhe fora retirado cirurgicamente pelo seu médico,
na Universidade da Califórnia. O Tribunal decidiu em favor dos investigadores, ne-
gando ao acusador a legitimidade para reclamar direitos sobre uma linha celular
que, de resto, não tinha sido patenteada tal e qual como fora retirada do seu corpo.
De resto, os tribunais concedem com frequência este tipo de direitos, uma vez que
a matéria biológica doada ou sem utilidade para o indivíduo pode e deve ser usa-
da para investigação, em prol da Humanidade e do desenvolvimento das ciências
biomédicas e da saúde, até porque pode ter efeitos retroactivos sobre os próprios.
As linhas celulares assim desenvolvidas podem ser utilizadas para fins clí-
nicos e terapêuticos, possuindo inestimável valor e utilidade para a investigação
científica. O facto de poderem ser objecto de patente não é surpreendente, tendo
em conta aquilo que anteriormente foi dito.
Relativamente à patenteação e comercialização de órgãos humanos, a li-
teratura parece ser, ainda que escassa, unânime: não são patenteáveis. O má-
ximo que pode acontecer, neste campo, são patentes sobre a forma de obter
órgãos humanos artificialmente, ou seja, destinados a exotransplantes. De alguns
anos para cá, tem tomado forma a hipótese de fazer crescer órgão humanos,
destinados a transplantes, nos corpos de outros animais, processo que passa por
modificar geneticamente esses animais de modo a que esses órgãos não sejam
rejeitados pelos receptores humanos. Esta seria, então, uma forma de controlar
aquele que é o comércio mais iníquo do mundo da biomedicina: o tráfico clandes-
tino de órgãos humanos.
De facto, este é mais um dos campos em que os mais frágeis e desprote-
gidos são explorados pelos mais ricos, fazendo com que a venda de órgãos seja
uma hipótese de sobrevivência para os desfavorecidos, permitindo aos ricos dos
países mais desenvolvidos a continuação da sua vida. Ora, esta é uma perspecti-
va que, mais do que meramente comercial, pode ser objecto de crime, graças aos
lucros fabulosos que este tipo de comércio representa. O transplante de órgãos

27
 Artur Alves 

e de produtos humanos (sangue e gâmetas) é um mercado que, até agora, tem vivido
muito do voluntarismo e da solidariedade, mas pode ser “contaminado” exactamente
pelo factor comercial. Como refere Gilbert Hottois20, este é um problema que se situa
no cruzamento entre os bens públicos (notavelmente no uso de órgãos de cadáveres
e na sua disposição ao uso público), comuns e universais, a necessidade de estrutu-
ras de mercado para assegurar a eficácia máxima no processo e as reivindicações
religiosas e morais de sectores menos liberais da sociedade. Aliás, alguns movimen-
tos religiosos (por exemplo, Testemunhas de Jeová) recusam, pura e simplesmente,
a “contaminação da pureza do corpo humano” de um Homo Dei pela intrusão de ele-
mentos estranhos.
Também neste caminho podemos encontrar a questão da doação de órgãos e
cadáveres para investigação, tão antiga como a própria Anatomia. Aqui, podemos per-
ceber que a questão se coloca, não na solidariedade para com outro indivíduo (que,
habitualmente não se conhece, permanecendo em abstracto como um bem que se
faz à comunidade em geral, ou um serviço que se presta, dependendo da perspectiva
mais ou menos sacralizada), mas para com a investigação científica e o seu potencial
de desenvolvimento futuro. Esta última é uma forma de solidariedade mais indirecta,
com consequências perversas no caso de uso indevido dos itens para pesquisa. Isto
não é de pouca monta, uma vez que qualquer parte do corpo humano usado em inves-
tigação tem de ser legalmente adquirido, pelo menos à luz do Direito vigente. No en-
tanto, se imaginarmos um rim oriundo de um qualquer canto obscuro de um país como
a Índia (em que a extracção de órgãos sem consentimento se tornou, há vários anos,
um crime inconcebivelmente habitual nas grandes urbes como Nova Delhi e Calcutá),
posteriormente vendido e transportado rapidamente para uma clínica privada de uma
país mais desenvolvido, onde tem como destinatário um indivíduo doente com posses
e poder, percebemos como o tráfico se pode desenrolar ilegalmente sem barreiras de
maior. É contra este problema que é necessário transformar algumas disposições e
práticas normais, em virtude da imoralidade deste tipo de exploração do ser humano.
È com este tipo de práticas perigosas e completamente imorais que lidamos no campo
das biotecnologias. Apesar de tudo o que se diz, é de facto com vidas humanas que
se trabalha.
Quanto ao corpo humano como um todo, a literatura é unânime em condenar
veementemente a sua patenteação ou apropriação sob qualquer forma. É John Har-
ris21 quem melhor nos descreve os perigos de interferir com o genoma humano de

20
«Solidarité et disposition du corps humain» in Parizeau, M.-H. Les Fondements de La Bioéthique,
«Sciences, Éthiques, Sociétés», Bruxelas, De Boeck- Wesmaek, 1992, 199 pgs., pgs. 103-19.
21
No seu livro Supermán y la Mujer Maravillosa, de 1992 e traduzido para castelhano em 1998.

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 Patentes de Matéria Biológica 

modo a criar seres humanos transgénicos. Ainda que se pudesse criar e patente-
ar, por absurdo, uma nova raça de seres humanos, resistentes a graus mais ele-
vados de poluição atmosférica ou de radiação, sabemos que isso não resolveria
problemas atmosféricos, mas teria como consequência o abandono das grandes
preocupações ambientais - o que teria graves consequências para os seres hu-
manos “normais”. A criação de quimeras e híbridos humanos traria graves con-
sequências para a sociedade; basta pensar na polémica suscitada por questões
como a clonagem e a eugenia (um horizonte implícito na intervenção sobre os
seres humanos como um todo) para termos uma ideia do quão caótico seria este
procedimento, mormente nos seus efeitos.
Hoje em dia, contudo, todas as disposições em vigor colocam categori-
camente de lado a mera ideia de criar seres humanos transgénicos ou de poder
patentear tal feito. Aliás, se não se colocasse este limite, seria impossível, com ar-
gumentos lógicos e retóricos, defender a impossibilidade de patentear uma forma
de vida (humana) que, na realidade, não existe na Natureza. Qualquer conside-
ração acerca deste assunto cairia no demasiado óbvio, mas penso que devemos,
ainda assim, tentar analisar os grandes princípios que presidem a esta proibição.
Em primeiro lugar, considera-se a patenteação de seres humanos con-
trária à ordem pública e bons costumes, fazendo parte daquelas invenções cuja
comercialização é terminantemente proibida. Obviamente, estas são ideias alta-
mente subjectivas, mas por isso mesmo é que devemos considerá-las como ne-
cessárias. Como foi dito, não há razão para, face à possibilidade de patenteação
sobre animais, plantas e microorganismos, impedir um passo em frente. Só que
este passo, como podemos verificar pelo estado da técnica, seria sempre maior
do que a capacidade de compreensão e previsão.
Em segundo lugar, temos a dignidade humana, que justifica a invio-
labilidade do seu corpo. Com o advento da bioquímica, as fronteiras entre
a vida e a matéria foram esbatidas, e hoje compreende-se que não há, fun-
damentalmente, diferenças entre os genes humanos e genes de uma planta
(muito embora o próprio conceito de gene humano já acarrete considerações
acerca de funções específicas do genoma humano e do ser humano). A dig-
nidade do genoma humano e do Homem é-lhes conferida pela razão huma-
na. Contudo, não é isso que está em causa. O que se passa é que, de todas
as coisas do mundo, apenas o Homem como um todo é sujeito de dignidade,
passível de avaliação e estatuto ético, muito embora as partes destacáveis do seu
corpo possam desfrutar, como equaciona Remédio Marques22, desse estatuto de

29
 Artur Alves 

dignidade. Neste sentido, a conduta preconizada é continuar a evitar a patenteação


de genes humanos que ocorram naturalmente, de forma a evitar tentações de maior.
Em terceiro lugar, temos a auto- determinação, que afirma o direito da pessoa
humana a escolher o seu destino, ou melhor, a conduzir a sua vida. As patentes funcio-
nariam para este direito como um inibidor, uma vez que impediriam o indivíduo de ser
completamente livre; afinal de contas, havia um direito de propriedade intelectual que
o ligada inelutavelmente a uma entidade exterior. Isto é extremamente significativo, e é
também razão suficiente para impedir que se operassem manipulações desta ordem.
Cruzar as barreiras de algo que se possa classificar como Humanidade, criando
quimeras humanas, significa não só passar os limites entre espécies, como também
experimentar sobre seres humanos a partir dessa mesma humanidade (que, como se
percebe, teria de ser redefinida a cada passo dado pela engenharia genética), o que
certamente repugna a todos nós, por mais “útil” que fosse um híbrido humano que, por
exemplo, pudesse sobreviver a um ambiente com maior percentagem de poluentes. Os
problemas éticos levantados e aqui resumidos sucintamente são de tal ordem que de-
vemos continuar a analisar cuidadosamente todos os passos dados pela engenharia
genética em direcção a semelhante ideia.

Patentes de Genes Humanos?, Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, Centro de Direito


��

Biomédico, Coimbra, Coimbra Editora, Junho de 2001, 154 pgs., pgs. 97-108.

30
 Patentes de Matéria Biológica 

 Considerações Finais

Neste curto mas, espera-se, claro trabalho, tentou-se dar uma perspectiva
geral do estado da questão da patenteação e da atribuição de patentes sobre
matéria biológica. Apesar de toda a pesquisa levada a cabo, estamos conscien-
tes que, dadas as limitações inerentes a este tipo de trabalho, acaba por não ser
possível ir tão longe como desejaríamos na problematização e análise; contudo,
o método adoptado parece-nos o melhor para apresentar o problema nas suas
linhas gerais, tanto mais que, dedutivamente, descemos gradualmente, ao longo
de quatro capítulos, no âmbito dos objectos ou subtemas a ter em consideração.
A vantagem decisiva é a de que, assim, pudemos “arrumar”, de uma forma preli-
minar ainda que cuidadosa, não o tema (não nos arrogamos tal capacidade) mas
a apresentação dos resultados das nossas pesquisas.
Tendo, agora, uma perspectiva mais documentada sobre o problema, não
podemos deixar de nos sentir tranquilizados pela prudência que tem marcado
a atribuição de patentes e a legislação sobre patenteação em vigor nos países
desenvolvidos. As preocupações e agitações prematuras acerca das patentes de
matéria biológica, nomeadamente humana, são de molde a deixar um rasto de
desconfiança - por vezes mal fundamentada - relativamente à biotecnologia. Ali-
ás, parece-nos que a evolução, tendo em conta o desenvolvimento da engenharia
genética e da biotecnologia, foi a mais vantajosa possível para todos, e que o
mecanismo da patente tem vantagens inestimáveis neste campo, não só para as
empresas com objectivos lucrativos, mas também para a comunidade, que assim
vê salvaguardada a segurança da sua saúde devido à ilegalização de métodos
não patenteados. Os limites ético- morais e jurídico- legais impostos são neces-
sários e salutares, apesar de tudo o que é dito por liberais e “fundamentalistas”.
Apesar de não nos incluirmos no grupo dos entusiastas indefectíveis da
engenharia genética, podemos considerar que há mecanismos que, não sendo
perfeitos (as patentes deixam muito a desejar no que se refere ao equilíbrio Nor-
te- Sul), permitem uma supervisão estatal e da sociedade em geral sobre as acti-
vidades da biotecnologia. Não ignoramos, contudo, que esta tem aplicações que
não se limitam ao campo da biomedicina e saúde humana. Ainda recentemente,
segundo noticiava o jornal The Weekly Standard, George Poste, um responsável
da equipa do Pentágono dedicada ao estudo e controlo do bioterrorismo, apela-
va ao secretismo de alguma investigação biotecnológica, para passar a ter uma

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 Artur Alves 

vantagem sobre os novos inimigos (os Rogue States, agora designados como “esta-
dos terroristas” ou, de forma mais maniqueísta, “Eixo do Mal”, pela equipa de George
W. Bush) no campo da guerra química e biológica. Percebemos, assim, a inevitabili-
dade de a ciência ter este tipo de aplicações, se é que nos tínhamos esquecido. Após
os acontecimentos de 11 de Setembro de 2001, muito haverá a esperar deste campo,
principalmente se quisermos fazer face aos nossos piores receios a às ameaças do
terrorismo internacional. Sem querer cair no maniqueísmo fácil, ou mesmo no alar-
mismo generalizado, pensamos que convém estar preparado para enfrentar grandes
problemas neste campo, com a agravante de não ser possível, em sede de debate no
espaço público, impedir um certo “consenso do medo” em torno da aceleração da in-
vestigação biotecnológica de mecanismos que permitam aumentar as probabilidades
de fazer face a um ataque biológico23. Isto significa que, no futuro, aquilo que a biotec-
nologia criou vai ter de ser enfrentado por ela, o que é mais uma razão para confiar-
mos nas suas potencialidades sem nunca permitir a sua completa autonomia - leia-se,
abandono aos mecanismos de mercado (a morte é sempre um mercado vasto).
O mais recente livro de Fukuyama, Our Posthuman Future, é dedicado à enge-
nharia genética. Prevê-se, apocalipticamente, que os avanços neste campo da ciência
vão ameaçar a nossa humanidade. O mais provável é que eles a vão redefinir, mas
para tal será necessário que algo mude, nomeadamente a natureza, segurança, con-
fiança e aplicabilidade de técnicas ainda por testar ou inexistentes. Lembremo-nos
que, por cada novo processo ou possibilidade que surgir, haverá inúmeras coisas a ter
em conta antes da sua aplicação e da sua escolha. Para além do mais, não nos parece
que a “loucura humana” possa avançar, neste campo, para a maior das incertezas, que
decerto estará de mãos dadas com a intervenção genética sobre a natureza humana
- algo que ainda está para definir com exactidão.
As disposições sobre as patentes são, de certo modo, reconfortantes. Tal como
está, esta área do Direito vai permitir a evolução e desenvolvimento da indústria bio-
tecnológica e, com isso, trazer inúmeros benefícios para a prestação de cuidados de
saúde, em primeiro lugar (principalmente a nível clínico e terapêutico, tal como já antes
tinha feito, e continua a fazer, com a reprodução medicamente assistida). A perspectiva
de medicamentos e testes genéticos, com potencial para resolver muitos problemas
que actualmente atormentam a Humanidade, são apenas a ponta mais visível dos
benefícios a que não podemos virar costas. Entre estes contam-se ainda as poten-
cialidades a nível da resolução de problemas ambientais e alimentares, os benefícios

23
Pode argumentar-se que não é líquido que as redes de terrorismo internacional tenham acesso a
produtos tão letais. Mas pensamos que o risco é demasiado grande, mormente se considerarmos a
facilidade de manipular, transportar e usar algo tão mortífero como o antraz, por exemplo.

32
 Patentes de Matéria Biológica 

para a própria investigação científica e para a sociedade. Acrescente-se a isto o


incremento do conhecimento humano, e o quadro fica ainda mais atraente. Mas é
sempre necessário tomar precauções, de modo a preservar o património comum
da biosfera e, sobretudo, a vida tal como ela existe nos ecossistemas do planeta.

33
 Artur Alves 

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