Documente Academic
Documente Profesional
Documente Cultură
ever more
agradeço ao para sempre poe, com beardsley e tudo!
uma hora, só por curiosidade, vou dar uma olhada nas quinze ou mais traduções/
adaptações de o gato preto no brasil.
dentre suas dezenas de contos, escolhi o gato preto para um breve cotejo entre a
tradução de brenno silveira (civilização brasileira, 1959) e a cópia de pietro
nassetti, com ligeiras adulterações (martin claret, 1999).
I.
I am above the weakness of seeking to establish a sequence of cause and effect,
between the disaster and the atrocity. But I am detailing a chain of facts — and
wish not to leave even a possible link imperfect. On the day succeeding the fire,
I visited the ruins. The walls, with one exception, had fallen in. This exception
was found in a compartment wall, not very thick, which stood about the middle of
the house, and against which had rested the head of my bed. The plastering had
here, in great measure, resisted the action of the fire — a fact which I
attributed to its having been recently spread. About this wall a dense crowd were
collected, and many persons seemed to be examining a particular portion of it with
very minute and eager attention. The words "strange!" "singular!" and other
similar expressions, excited my curiosity. I approached and saw, as if graven in
bas relief upon the white surface, the figure of a gigantic cat. The impression
was given with an accuracy truly marvellous. There had been a rope about the
animal's neck.
3. brenno silveira
Não pretendo estabelecer relação alguma entre causa e efeito - entre o desastre e
a atrocidade por mim cometida. Mas estou descrevendo uma seqüência de fatos, e não
desejo omitir nenhum dos elos dessa cadeia de acontecimentos. No dia seguinte ao
do incêndio, visitei as ruínas. As paredes, com exceção de uma apenas, tinham
desmoronado. Essa única exceção era constituída por um fino tabique interior,
situado no meio da casa, junto ao qual se achava a cabeceira de minha cama. O
reboco havia, aí, em grande parte, resistido à ação do fogo — coisa que atribuí ao
fato de ter sido ele construído recentemente. Densa multidão se reunira em torno
dessa parede, e muitas pessoas examinavam, com particular atenção e minuciosidade,
uma parte dela. As palavras "estranho!", "singular!", bem como outras expressões
semelhantes, despertaram-me a curiosidade. Aproximei-me e vi, como se gravada em
baixo-relevo sobre a superfície branca, a figura de um gato gigantesco. A imagem
era de uma exatidão verdadeiramente maravilhosa. Havia uma corda em torno do
pescoço do animal.
4. pietro nassetti
Não pretendo estabelecer relação nenhuma entre causa e efeito - entre o desastre e
a atrocidade por mim cometida. Mas estou descrevendo uma seqüência de fatos, e não
desejo omitir nenhum dos elos dessa cadeia de acontecimentos. No dia seguinte ao
do incêndio, fui ver as ruínas. Com exceção de uma, todas as paredes tinham
desmoronado. Essa única exceção era constituída por um fino tabique interior,
localizado no meio da casa, junto ao qual estava a cabeceira de minha cama. O
reboco havia aí, em grande parte, resistido à ação do fogo — coisa que supus
relacionar-se ao fato de ter sido ele construído recentemente. Densa multidão se
reunira em torno dessa parede, e muitas pessoas observavam, com especial atenção e
minuciosidade, uma parte dela. As palavras "estranho!", "singular!", e outras
expressões semelhantes, despertaram-me a curiosidade. Aproximei-me e vi, como se
gravada em baixo-relevo sobre a superfície branca, a figura de um gato gigantesco.
A imagem era de uma exatidão verdadeiramente assombrosa. Havia uma corda em torno
do pescoço do animal.
II.
Although I thus readily accounted to my reason, if not altogether to my
conscience, for the startling fact just detailed, it did not the less fail to make
a deep impression upon my fancy. For months I could not rid myself of the phantasm
of the cat; and, during this period, there came back into my spirit a half-
sentiment that seemed, but was not, remorse. I went so far as to regret the loss
of the animal, and to look about me, among the vile haunts which I now habitually
frequented, for another pet of the same species, and of somewhat similar
appearance, with which to supply its place.
1. oscar mendes com milton amado
Embora assim prontamente procurasse satisfazer a minha razão, senão de todo a
minha consciência, a respeito do surpreendente fato que acabo de narrar, nem por
isso deixou ele de causar profunda impressão na minha imaginação. Durante meses,
eu não me pude libertar do fantasma do gato e, nesse período, voltava-me ao
espírito um vago sentimento que parecia remorso, mas não era. Cheguei a ponto de
lamentar a perda do animal e de procurar, entre as tascas ordinárias que eu agora
habitualmente freqüentava, outro bicho da mesma espécie e de aparência um tanto
semelhante com que substituí-lo.
2. guilherme braga
Conquanto eu pudesse, assim, esclarecer a meu juízo, se não de todo à minha
consciência, o estranho fato detalhado, este não deixou de causar uma impressão
profunda em minha imaginação. Por meses o fantasma do gato me assombrou; e,
durante esse período, insinuou-se em meu espírito um sentimento difuso que
parecia, mas não era, remorso. Cheguei ao ponto de lamentar a perda do animal e
pus-me a procurar, nos estabelecimentos infames que eu então frequentava, um outro
da mesma espécie e de aparência semelhante, para que assumisse o seu lugar.
3. brenno silveira
Embora isso satisfizesse prontamente minha razão, não conseguia fazer o mesmo, de
maneira completa, com minha consciência, pois o surpreendente fato que acabo de
descrever não deixou de causar-me, apesar de tudo, profunda impressão. Durante
meses, não pude livrar-me do fantasma do gato e, nesse espaço de tempo, nasceu em
meu espírito uma espécie de sentimento que parecia remorso, embora não o fosse.
Cheguei, mesmo, a lamentar a perda do animal e a procurar, nos sórdidos lugares
que então freqüentava, outro bichano da mesma espécie e de aparência semelhante
que pudesse substituí-lo.
4. pietro nassetti
se bem que isso satisfizesse prontamente minha razão, não conseguia fazer o mesmo,
de maneira completa, com minha consciência, pois o surpreendente acontecimento que
acabo de narrar não deixou de causar-me, apesar de tudo, profunda impressão.
Durante meses, não pude livrar-me do fantasma do gato e, nesse intervalo de tempo,
nasceu em meu espírito uma espécie de sentimento que parecia remorso, embora não o
fosse. Cheguei realmente a lamentar a perda do animal e a procurar, nos sórdidos
lugares que então freqüentava, outro gato da mesma espécie e de aparência
semelhante que pudesse substituí-lo.
III.
Finally, I hit upon what I considered a far better expedient than either of these.
I determined to wall it up in the cellar — as the monks of the middle ages are
recorded to have walled up their victims.
For a purpose such as this the cellar was admirably adapted. Its walls were
loosely constructed, and had lately been plastered throughout with a rough
plaster, which the dampness of the atmosphere had prevented from hardening.
Moreover, in one of the walls was a projection, caused by a false chimney, or
fire-place, that had been filled, or walled up, and made to resemble the rest of
the cellar. I made no doubt that I could readily displace the bricks at this
point, insert the corpse, and wall the whole up as before, so that no eye could
detect any thing suspicious.
2. guilherme braga
Por fim, decidi valer-me de um expediente que julguei muito mais apropriado que
qualquer um desses. Resolvi emparedar o corpo no porão – como os monges da Idade
Média emparedavam suas vítimas, segundo atestam documentos.
O porão prestava-se bem a esse fim. As paredes não eram muito sólidas e
recentemente haviam sido recobertas com um reboco grosseiro, que a umidade das
paredes não deixara secar. Ademais, em uma das paredes via-se uma projeção,
motivada por uma falsa chaminé, ou lareira, que fora fechada de modo a confundir-
se com o restante da estrutura. Não tive dúvidas de que poderia deslocar os
tijolos da projeção, depositar o corpo lá dentro e cimentar tudo outra vez, de
modo que ninguém detectasse nenhum elemento suspeito.
3. brenno silveira
Finalmente, tive uma idéia que me pareceu muito mais prática: resolvi emparedá-lo
na adega, como faziam os monges da Idade Média com as suas vítimas.
Aquela adega se prestava muito bem para tal propósito. As paredes não haviam sido
construídas com muito cuidado e, pouco antes, haviam sido cobertas, em toda a sua
extensão, com um reboco que a umidade impedira de endurecer. Ademais, havia uma
saliência numa das paredes, produzida por alguma chaminé ou lareira, que fora
tapada para que se assemelhasse ao resto da adega. Não duvidei de que poderia
facilmente retirar os tijolos naquele lugar, introduzir o corpo e recolocá-los do
mesmo modo, sem que nenhum olhar pudesse descobrir nada que despertasse suspeita.
4. pietro nassetti
Finalmente, tive uma idéia que me pareceu muito mais prática: resolvi emparedá-lo
na adega, como faziam os monges da Idade Média com as suas vítimas.
Aquela adega se prestava muito bem para tal propósito. As paredes não haviam sido
construídas com muito esmero e, pouco antes, haviam sido cobertas, em toda a sua
extensão, com um reboco que a umidade impedira de endurecer. De resto, havia uma
saliência numa das paredes, produzida por alguma chaminé ou lareira, que fora
tampada para que se assemelhasse ao resto da adega. Não duvidei de que poderia sem
nenhuma dificuldade retirar os tijolos naquele lugar, colocar o corpo e deixá-los
do mesmo modo, sem que nenhum olhar pudesse avistar nada que despertasse suspeita.
imagem: http://copycat.lidonet.com
fico imaginando: se a rideel, como detentora dos direitos de tradução das obras de
seu catálogo, descobrisse que alguma delas foi integralmente copiada e publicada
por outra editora, mas com a autoria da tradução atribuída a outrem, o que será
que ela faria?
também achei muito engraçada a nota de tradução que aparece no mesmo conto:
agora, o silver blaze do original virar silver star em português é algo que
ultrapassa meu entendimento.
imagem: capa
no brasil, uma obra passa a fazer parte do patrimônio cultural da sociedade apenas
setenta anos após a morte de seu autor. acho uma barbaridade de tempo, mas é assim
que é. com isso, o famoso prefácio de clóvis beviláqua (1859-1944) a a luta pelo
direito ainda não está em domínio público, e só é possível reproduzi-lo para fins
comerciais com a autorização de seus sucessores.
é o que imagino que a pillares tenha feito - isto é, obtido a licença da família
de beviláqua para publicar seu prefácio. o difícil de entender é a razão pela qual
a tradução pela pillares, sendo idêntica à de josé tavares bastos, aparece em nome
do jurista ivo de paula, mestre em leis e autor de várias obras jurídicas.
1. josé tavares bastos
CAPÍTULO I
Introdução
O direito é uma idéia prática, isto é, designa um fim, e, como toda a idéia de
tendência, é essencialmente dupla, porque contém em si uma antítese, o fim e o
meio.
Não é suficiente investigar o fim, deve-se também saber o caminho que a ele
conduz.
Eis duas questões para as quais o direito deve sempre procurar uma solução,
podendo-se dizer que o direito não é, no seu conjunto e em cada uma das suas
divisões, mais que uma resposta constante a essa dupla questão.
Não há um só título, por exemplo o da propriedade ou o das obrigações, em que a
definição não seja imprescindivelmente dupla e nos diga o fim que propõe e os
meios para atingi-lo. Mas o meio, por mais variado que seja, reduz-se sempre à
luta contra a injustiça.
A idéia do direito encerra uma antítese que se origina nesta idéia, da qual jamais
se pode, absolutamente, separar: a luta e a paz; a paz é o termo do direito, a
luta é o meio de obtê-lo.
2. ivo de paula
CAPÍTULO I
Introdução
O Direito é uma idéia prática, isto é, designa um fim, e, como toda a idéia de
tendência, é essencialmente dupla, porque contém em si uma antítese, o fim e o
meio.
Não é suficiente investigar o fim, deve-se também saber o caminho que a ele
conduz.
Eis duas questões para as quais o Direito deve sempre procurar uma solução,
podendo-se dizer que o direito não é, no seu conjunto e em cada uma das suas
divisões, mais que uma resposta constante a essa dupla questão.
Não há um só título, por exemplo o da propriedade ou o das obrigações, em que a
definição [] seja imprescindivelmente dupla e nos diga o fim que propõe e os meios
para atingi-lo. Mas o meio, por mais variado que seja, reduz-se sempre a uma luta
contra a injustiça.
A ideia do Direito encerra uma antítese que se origina desta ideia, da qual jamais
se pode, absolutamente, separar: a luta e a paz; a paz é o termo do direito, a
luta é o meio de obtê-lo.
2. ivo de paula
Poder-se-á objetar que a luta e a discórdia são precisamente o que o Direito se
propõe a evitar, porquanto semelhante estado de coisas implica uma perturbação,
uma negação da ordem legal, e não uma condição necessária de sua existência.
A objeção seria procedente se se tratasse da luta da injustiça contra o Direito;
ao contrário, trata-se aqui da luta do Direito contra a injustiça. Se, neste caso,
o Direito não lutasse, isto é, se não resistisse vigorosamente contra ela,
renegar-se-ia a si mesmo.
Esta luta perdurará tanto quanto o mundo, porque o Direito terá de precaver-se
sempre contra os ataques da injustiça.
A luta não é, pois, um elemento estranho ao Direito, mas sim uma parte integrante
de sua natureza e uma condição de sua idéia.
Todo direito no mundo foi adquirido pela luta; esses princípios de Direito que
estão hoje em vigor têm sido indispensáveis na [sic] luta contra aqueles que não
os aceitavam; assim, todo o direito, tanto o de um povo, como o de um indivíduo,
pressupõe que estão o indivíduo e o povo dispostos a defendê-lo.
2. ivo de paula
O Direito não é uma ideia lógica, porém uma ideia de força; é a razão porque a
justiça, que sustenta em uma das mãos a balança em que pesa o Direito, sustenta na
outra a espada que serve para fazê-lo valer.
A espada sem a balança é a força bruta, e a balança sem a espada é o direito
impotente; completam-se mutuamente; e, na realidade, o direito só reina quando a
força despendida pela justiça para empunhar a espada corresponde à habilidade que
emprega em manejar a balança.
2. ivo de paula
Observa-se facilmente que a nossa teoria se ocupa muito mais com a balança do que
com a espada da justiça.
A estreiteza do ponto de vista puramente científico com que se encara o direito, e
que é onde se ostenta menos o seu lado real, como ideia de força, do que pelo seu
lado racional, como um conjunto de princípios abstratos, tem dado, julgamos, a
todo esse modo de encarar a questão, uma feição que não está [] em harmonia com a
amarga realidade. A defesa da nossa tese o provará.
O direito contém, como é sabido, um duplo sentido: o sentido objetivo que nos
oferece o conjunto de princípios de direito em vigor; a ordem legal da vida; e o
sentido subjetivo, que é, por assim dizer, o precipitado da regra abstrata no
direito concreto da pessoa.
Nessas duas direções o direito depara com uma resistência que deve vencer, e, em
ambos os casos, deve triunfar ou manter a luta.
2. ivo de paula
E é deste desenvolvimento interno que [] derivam todos os princípios de direito,
que os arestos análogos e igualmente motivados interpõem pouco a pouco nas
relações jurídicas, como as abstrações, os corolários, as regras que a ciência
aufere do direito existente, por meio do raciocínio, e põe logo em evidência.
Porém, o poder destes dois agentes, as relações e a ciência, é limitado; pode
dirigir o movimento nos limites fixados pelo direito existente, impeli-lo, mas não
lhe[] é dado romper os diques que impedem as águas de tomarem um novo curso.
Somente a lei, isto é, a ação voluntária e determinada do poder público, é que tem
essa força, e não por acaso, mas em virtude de uma necessidade, que está na
natureza íntima do direito, porquanto todas as reformas introduzidas no processo e
no direito positivo se originam das leis.
Certo que pode acontecer que uma modificação feita pela lei no direito existente
seja puramente abstrata, que sua influência esteja limitada a esse mesmo direito,
sem se notar no domínio das relações concretas se foram estabelecidas sobre a base
do direito até então em vigor; neste caso, o fato é como uma reparação puramente
mecânica, que consiste em substituir um para¬fuso ou uma roda qualquer usada por
outra melhor. Muitas vezes acontece que uma modificação não [] pode operar sem
ferir ou lesar profundamente direitos existentes e interesses privados; porque os
interesses de milhares de indivíduos e de classes inteiras estão de tal modo
identificados com o direito no curso dos tempos, que não é possível modificar
aquele sem sentirem vivamente tais interesses.
Se colocarmos, então, o princípio do direito ao lado do privilégio, declara-se por
esse fato só a guerra a todos os interesses, tenta-se extirpar um pólipo que
agarra com todos os seus tentáculos.
Está no instinto da conservação pessoal que os interesses ameaçados a mais
violenta resistência oponham a toda [] tentativa de tal natureza, dando vida a uma
luta que, como qualquer outra, não será resolvida pelos raciocínios, mas pelas
forças nela empenhadas, produzindo frequentemente o mesmo resultado que o
paralelogramo das forças: o desvio das linhas retas componentes em uma diagonal.
isso parece indicar que a editora resolveu dar uma espiada mais atenta nesses seus
títulos.
quanto às obras aqui cotejadas, a luta pelo direito, de rudolf von ihering [veja
aqui] agora consta como esgotada nas principais livrarias com acervo online. isso
parece indicar que o livro não está mais em circulação. por outro lado, o volume
que traz acerca da verdade e da mentira [veja aqui] e o anticristo [veja aqui], de
nietzsche, na pretensa tradução de heloísa da graça burati, ainda continua à venda
aqui e ali, por exemplo na fnac.
que bom a editora rideel se disponha a regularizar rapidamente seu catálogo. fico
aqui torcendo para que consiga normalizar tudo, acabe de retirar os exemplares
irregulares de circulação e dê uma palavrinha de satisfação aos leitores que
confiaram em suas edições.
immanuel kant
sobre um suposto direito de mentir
por amor à humanidade
* na troca de "verdade" por "veracidade", leopoldo holzbach não levou em conta que
kant estabelece logo abaixo a clara distinção entre wahrheit e wahrhaftigkeit.
deve-se observar, antes de mais nada, que a expressão "ter direito à verdade"
carece de sentido. deve-se, pelo contrário, dizer que o homem tem direito à sua
própria veracidade (veracitas), isto é, à verdade subjetiva em sua pessoa. pois
ter direito objetivamente a uma verdade significaria o mesmo que afirmar a
dependência em relação à sua vontade, como em geral nas questões sobre o meu e o
teu, que uma dada proposição deva ser verdadeira ou falsa, o que resultaria em uma
estranha lógica. (pp. 123-24)
imagem: www.haznos.org
em por quê? e até quando? deplorei o caminho tomado pela editora rideel, ao
publicar em 2005 uma cópia praticamente idêntica da vetusta tradução de josé
tavares bastos (c. 1909), atribuindo-a, porém, a heloísa da graça buratti.
CAPÍTULO I
Introdução
[...] O direito é o trabalho sem tréguas, e não somente o trabalho dos poderes
públicos, mas sim o de todo o povo. Se passarmos um golpe de vista em toda a sua
história, esta nos apresenta nada menos que o espetáculo de uma nação inteira
despendendo ininterruptamente para defender o seu direito penosos esforços, como
os que ela emprega para o desenvolvimento de sua atividade na esfera da produção
econômica e intelectual.
Todo aquele que tem em si a obrigação de manter o seu direito, participa neste
trabalho nacional e contribui na medida de suas forças para a realização do
direito sobre a terra.
I - Introdução
[...] O direito é um trabalho sem tréguas, não somente [] dos poderes públicos,
mas sim de todo o povo. Se passarmos um golpe de vista em toda a sua história,
esta nos apresenta nada menos que o espetáculo de uma nação inteira despendendo
ininterruptamente penosos esforços para defender o seu direito, como os que ela
emprega para o desenvolvimento de sua atividade na esfera da produção econômica e
intelectual. Todo aquele que tem em si a obrigação de manter o seu direito,
participa desse trabalho nacional e contribui, na medida de suas forças, para a
realização do direito sobre a terra.
CAPÍTULO II
O interesse na luta pelo direito
E assim como não é somente para defender um pedaço de terra, mas sim sobretudo a
sua existência, sua independência e honra - que um povo lança mão das armas; de
modo semelhante nas ações e nos pleitos judiciais, em que existe uma grande
desproporção entre o valor do objeto e os sacrifícios de qualquer natureza que
neles é mister despender, não se vai demandar, não se litiga pelo valor
insignificante talvez do objeto, mas sim por um motivo ideal, a defesa da pessoa e
do seu sentimento pelo direito.
Quando o que litiga se propõe semelhante fim e vai guiado por tais sentimentos,
não há sacrifício nem esforço que tenha para si peso algum, porquanto vê no fim
que quer atingir a recompensa de todos os meios que emprega.
Não é o interesse material vulnerado que impele o indivíduo que sofre tal lesão a
exigir uma satisfação, mas sim a dor moral que lhe causa a injustiça de que é
vítima.
A grande questão para ele não é a restituição do objeto, que muitas vezes é doado
a uma instituição de beneficência, a que o pode impelir a litigar; o que mais
deseja é que se lhe reconheça o seu direito. [...]
Resistir à injustiça é um dever do indivíduo para consigo mesmo, porque é um
preceito da existência moral; é um dever para com a sociedade, porque esta
resistência não pode ser coroada com o triunfo, senão quando for geral.
CAPÍTULO III
A luta pelo direito na esfera individual
Aquele que for atacado em seu direito deve resistir; — é um dever para consigo
mesmo.
A conservação da existência é a suprema lei da criação animada, por quanto ela se
manifesta instintivamente em todas as criaturas; porém a vida material não
constitui toda a vida do homem; tem ainda que defender sua existência moral que
tem por condição necessária o direito: é, pois, a condição de tal existência que
ele possui e defende com o direito.
O homem sem direito desce ao nível dos brutos, assim os Romanos não faziam mais do
que deduzir uma lógica conseqüência desta idéia, quando colocavam os escravos,
considerados sob o ponto de vista do direito abstrato, ao nível do animal.
Temos, pois, o dever de defender nosso direito, porque nossa existência moral está
direta e essencialmente ligada à sua conservação; desistir completamente da
defesa, o que atualmente não é muito prático, porém que poderia ter lugar,
equivaleria a um suicídio moral.
CAPÍTULO IV
A luta pelo direito na esfera social
[...] Enquanto a realização prática do direito público e do penal está assegurada,
porque está imposta como um dever aos funcionários públicos, a do direito privado
apresenta-se aos particulares sob a forma de direito, isto é, por completo
abandonada a sua prática à sua livre iniciativa e à sua própria atividade.
O direito não será letra morta e realizar-se-á no primeiro caso se as autoridades
e os funcionários do Estado cumprirem com o seu dever, no segundo, se os
indivíduos fizerem valer os seus direitos.
Mas, se por qualquer circunstância, por comodidade, por ignorância ou por medo,
estes últimos ficarem longo tempo inativos, o princípio legal perderá por esse
fato o seu valor.
As disposições do direito privado podemos, pois, dizer, não existem na realidade e
não têm força prática, senão na medida em que se fazem valer os direitos
concretos; e, se é certo que estes devem sua existência à lei, não é menos certo
que por outra parte eles lha restituem.
A relação que existe entre o direito objetivo e o subjetivo ou abstrato e concreto
assemelha-se à circulação do sangue, que partindo do coração aí de novo volta.
CAPÍTULO V
O direito alemão e a luta pelo direito
[...] A luta é o trabalho eterno do direito.
Se é uma verdade dizer: — Comerás o teu pão com o suor da tua fronte, — não o é
menos acrescentar também: — É somente lutando que obterás o teu direito.
Desde o momento em que o direito não está disposto a lutar sacrifica-se, e assim
podemos aplicar-lhe a sentença do poeta:
É a última palavra da sabedoria
Que só merece a liberdade e vida
Aquele que cada dia sabe ganhá-las.
quando saiu numa comunidade do orkut uma notícia de plágio de ivanhoé, quando
saíram aquelas famosas matérias do jornal opção e da folha de s.paulo, e então
comecei a pesquisar o tema, não fazia ideia da extensão que o plagiato de
traduções no brasil tinha adquirido nos últimos quinze anos. eu sabia de alguns
casos avulsos, como a editora germinal; quanto à nova cultural, foi um choque
descobrir o que vinha ocorrendo desde 1995, e que adquiriu uma dimensão fantástica
em 2002/2003 com o patrocínio da suzano celulose e da ong ecofuturo; sobre a
martin claret, já corriam vários boatos e em abril ou maio do ano passado comecei
a pesquisar um pouco suas edições. até o começo de 2009 eu achava que esse
fenômeno em escala industrial estava restrito à editora nova cultural e à editora
martin claret - que, juntas, respondem por milhões e milhões de exemplares
fraudados presentes em lares, escolas, bibliotecas, instituições públicas e
privadas de norte a sul do país.
quanto à landmark e à jardim dos livros, embora ainda devam satisfações ao público
e ressarcimento aos leitores lesados, tenho a impressão de que interromperão essa
prática sem maiores traumas, e até por interesse próprio: a landmark trilhou essa
senda escusa em dois títulos, é uma editora pequena, seus donos parecem alimentar
pretensões políticas no mundo do livro, certamente não quererão ter um tal telhado
de vidro. a jardim dos livros, também pequena, agora é selo editorial do grupo
geração, ao lado da editora leitura e da geração editorial, e não creio que seus
novos sócios se interessem em preservar tais práticas.
é com muita tristeza que reservo o próximo post para mais um caso da rideel,
também em nome de "heloísa da graça burati". (para os outros casos da editora
rideel, ver aqui e aqui.)
as mais das vezes, costumam aqueles que desejam granjear as graças de um príncipe,
trazer-lhe os objetos que lhe são mais caros, ou com os quais o vêem deleitar-se;
assim, muitas vezes, eles são presenteados com cavalos, armas, tecidos de ouro,
pedras preciosas e outros ornamentos dignos de sua grandeza. desejando eu oferecer
a vossa magnificência um testemunho qualquer da minha obrigação, não achei, entre
os meus cabedais, coisa que me seja mais cara ou que tanto estime, quanto o
conhecimento das ações dos grandes homens apreendido por uma longa experiência das
coisas modernas e uma contínua lição das antigas; as quais, tendo eu, com grande
diligência, longamente cogitado, examinando-as, agora mando a vossa magnificência,
reduzidas a um pequeno volume. e conquanto julgue indigna esta obra da presença de
vossa magnificência, não confio menos em que, por humanidade desta, deva ser
aceita, considerado que não lhe posso fazer maior presente que lhe dar a faculdade
de poder em tempo muito breve aprender tudo aquilo que, em tantos anos e à custa
de tantos incômodos e perigos, hei conhecido.
as mais das vezes, costumam aqueles que desejam granjear as graças de um príncipe
trazer-lhe os objetos que lhes são mais caros, ou com os quais o vêem deleitar-se;
assim, muitas vezes, eles são presenteados com cavalos, armas, tecidos de ouro,
pedras preciosas e outros ornamentos dignos de sua grandeza. desejando eu oferecer
a vossa magnificência um testemunho qualquer da minha obrigação, não achei, entre
os meus cabedais, coisa que me seja mais cara ou que tanto estime quanto o
conhecimento das ações dos grandes homens apreendido por uma longa experiência das
coisas modernas e uma contínua lição das antigas; as quais, tendo eu, com grande
diligência, longamente cogitado, examinando-as, agora mando a vossa magnificência,
reduzidas a um pequeno volume.
e conquanto julgue indigna esta obra da presença de vossa magnificência, não
confio menos em que, por sua humanidade, deva ser aceita, considerado que não lhe
posso fazer maior presente que lhe dar a faculdade de poder em tempo muito breve
aprender tudo aquilo que, em tantos anos e à custa de tantos incômodos e perigos,
hei conhecido.
imagem: www.defesabr.com