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Porque Projectamos – A Sombra Em 10 Lições

Como criamos o Eu Falso

Os pais utilizam variadas técnicas e tentativas nos seus objectivos de reprimir


determinados pensamentos, sentimentos e comportamentos nos seus filhos. Por vezes
avançam com pedidos muito directos: “os homens não choram!”, ou “mexer aí (ʻaíʼ
referindo-se aos genitais) é feio!”, ou ainda “não voltes a dizer essas coisas!”

Podem ainda fazê-lo de maneira mais agressiva, como podemos observar numa loja
quando a mãe ralha com a criança, ou dá umas palmadas ou bofetadas porque a
criança mexe onde não deve.

Mas a maior parte das vezes os pais moldam a criança de maneiras subtis, num
processo a que se chama invalidação – limitam-se simplesmente a não testemunhar
um comportamento ou a mostrar agrado por algo que a criança diz. Por exemplo, se os
pais não dão qualquer valor ao desenvolvimento intelectual, oferecem aos seus filhos
brinquedos ou inscrevem-nos em actividades lúdicas, mas não lhes oferecem livros
nem estimulam a leitura. Se acreditam que as mulheres devem ser sossegadas e
femininas e os homens fortes e assertivos, só mostram apreço por comportamentos
relacionados com o sexo da criança. Se o menino de 4 anos entra na sala com um
enorme camião nos braços, podem afirmar algo como “que homem forte!”, mas se for
uma menina a carregar o mesmo camião podem dizer “cuidado! Olha que podes
magoar-te e sujar o teu lindo vestido!”

Contudo, a forma como os pais mais influenciam os seu filhos é através do exemplo.
As crianças, instintivamente, observam as escolhas que os pais fazem, as liberdades e
os prazeres que se permitem, os talentos que desenvolvem, as capacidades que
ignoram, e as regras e valores que seguem. Tudo isto tem um efeito profundo nas
crianças. O que as crianças vêem é: “É assim que nós vivemos. É assim que
conseguimos sobreviver.” Esta socialização inicial é importante, independentemente de
as crianças aceitarem os modelos dos pais ou de se revoltarem contra os mesmos.

A reacção de uma criança aos convencionalismos da sociedade segue um padrão


bastante previsível. Inicialmente, a primeira resposta é esconder os comportamentos
proibidos pelos pais. A criança tem pensamentos de raiva mas não os expressa.
Prefere explorar o seu corpo na privacidade do seu quarto. Pode implicar com os
irmãos mais novos quando os pais não estão presentes (ou abusar deles de muitas
maneiras). Com o decorrer do tempo, a criança chega à conclusão que alguns dos
pensamentos e sentimentos são tão inaceitáveis que deveriam ser simplesmente
eliminados. Assim, constrói um pai imaginário que policie os seus pensamentos e
acções, criando aquilo que muitos psicólogos referem como o superego. A partir daqui,
sempre que a criança tem um pensamento proibido ou tem um comportamento
inaceitável, irá experienciar uma dor causada pela ansiedade do superego. Esta
experiência pode ser tão desagradável que a criança decide meter dentro de um saco
alguns dos seus aspectos proibidos. Ou seja, reprime certos pensamentos e acções. O
preço que paga por fazê-lo é a perda do ser total ou completo que é.

Para preencher o vazio criado, a criança cria um “Eu Falso”, uma estrutura psicológica
que serve dois objectivos: irá camuflar as partes de si reprimidas e também protegê-la

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de mais danos.

Uma criança criada por uma mãe que reprime a sua sexualidade e é distante, por
exemplo, poderá tornar-se no “homem duro”. A criança dirá a si mesmo: “Não quero
saber se a minha mãe é distante e não me mostra afecto. Eu não preciso dessas
lamechices. Eu desenrasco-me bem sem ajuda. E mais uma coisa: sexo é uma coisa
suja!” Com o passar do tempo o menino irá aplicar esta resposta padrão a todas as
situações. Independentemente de quem se queira aproximar dele, irá sempre criar a
mesma barreira. Mais tarde, quando por fim consegue ultrapassar a sua relutância em
relação aos relacionamentos humanos amorosos é muito provável que critique a sua
companheira devido ao desejo desta de querer intimidade e um contacto sexual.
“Porque raio queres tu tantos carinhos e mimos? E porque és tão obcecada com o
sexo?! Isto não é normal!”

No entanto outra criança pode reagir à mesma mãe, distante e sexualmente reprimida,
de maneira oposta. Exagerando os seus problemas na esperança de alguém a ajudar.
“Coitado de mim! Estou ferido, os outros magoam-me continuamente! Preciso que
alguém cuide de mim!”

Uma outra criança pode tornar-se gananciosa, tentando agarrar-se a cada pedaço de
amor, comida e objecto que veja, na certeza que nunca haverá o suficiente.

Independentemente da natureza do Eu Falso, o seu propósito é sempre o mesmo:


minimizar a dor de perder uma parte da criança original. O seu ser completo e divino.

Contudo, a determinada altura do desenvolvimento da criança, esta forma engenhosa


de auto protecção torna-se na causa de mais danos, à medida que a criança é criticada
por possuir estas características negativas. Os outros irão criticar o seu distanciamento
e frieza, ou a sua atitude de ʻcoitadinhoʼ, ou o ser gordo ou ganancioso. Os que atacam
esta criança não conseguem ver as feridas que ela tenta proteger, e não ficam muito
entusiasmados pela maneira astuta com que o faz: tudo o que vêem é a sua natureza
neurótica. É considerada inferior, menos que completa.

É aqui que a criança se sente numa encruzilhada. Por um lado tem que se agarrar aos
aspectos de adaptação do seu carácter, porque servem um propósito útil, mas por
outro lado não quer ser rejeitada. O que pode esta criança fazer? A solução é negar ou
atacar a atitude dos que a criticam. “Eu não sou frio e distante!”, poderá dizer em auto-
defesa, “na verdade sou forte e independente!”. Ou “eu não sou um coitadinho frágil,
sou simplesmente muito sensível.”. Ou ainda “eu não sou ganancioso e egoísta, sou
poupado e prudente!”. Por outras palavras, “Não é de mim que estão a falar. Vocês
apenas estão a ver-me sob uma perspectiva negativa.”

Até certo ponto a criança tem razão. Os seus aspectos negativos não fazem parte da
sua natureza original. São criados a partir da dor e tornam-se parte de uma identidade
assumida, um “outro eu” que a ajuda a viver num mundo complexo e muitas vezes
hostil. Isto não quer dizer, contudo, que ela não possui estes aspectos negativos.
Haverá sempre um número de pessoas que afirmarão a sua existência. Mas para
poder manter uma imagem positiva de si mesma, e aumentar as probabilidades de
sobrevivência, ela terá que negar a sua existência.

Estes aspectos negados irão tornar-se aquilo a que se chama de “Eu Deserdado”,
aqueles aspectos do Eu Falso que são demasiado dolorosas para serem reconhecidos.

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Vamos parar aqui por alguns instantes e ver em pormenor esta proliferação de “Eus”.
Até agora conseguimos criar com sucesso várias fracturas no Eu Verdadeiro e Original,
a natureza de amor e ser completo com a qual todos nascemos, em três partes
distintas:

1. O “Eu Perdido”, aquelas partes do nosso ser que reprimimos devido ás exigências da
sociedade;

2. O “Eu Falso”, a fachada que construímos para poder preencher o vazio criado por esta
repressão e por uma falta de afecto;

3. O “Eu Deserdado”, os aspectos negativos do Eu Falso que encontram reprovação no


meio que nos envolve e que, assim sendo, são negados.

A única parte desta colagem complexa que mantemos consciente é aquela que faz
parte da criança original e completa e que ainda se mantém intacta, assim como certos
aspectos do Eu Falso. Estes aspectos juntos formam aquilo a que chamamos
ʻpersonalidadeʼ – a forma como nos descrevemos aos outros. o Eu Perdido encontra-se
quase totalmente ausente da nossa consciência: cortamos quase na totalidade todas
as ligações com estas partes reprimidas do nosso Eu. O Eu Deserdado (a Sombra), as
partes negativas do Eu Falso, fica alojado muito próximo da consciência e ameaça
constantemente vir à superfície. Para o manter escondido, temos que o negar
activamente ou então projectá-lo em outros.

“Eu não sou egoísta! Tu é que só pensas em ti!” diremos veementemente. Ou “Eu,
preguiçoso?! Tu é que não tens nunca tempo para desfrutar da vida!”

E dizemos isto com tanta energia quanta conseguimos utilizar.

E assim, a pouco e pouco, a criança original, completa e divina, começa o processo de


separação e sofrimento. Eventualmente, por volta dos quarenta anos, começa a
questionar os seus relacionamentos, o seu trabalho, a sua família. Sem que se
aperceba que tudo à sua volta são projecções de si mesmo.

A única forma de, então, libertar-se de todo o sofrimento que sente e que também
causa a outros, é através de um abraço. Um abraço com amor por quem é e por quem
tem negado em si. Um abraço sentido a partir do coração. Só aqui começa o
verdadeiro retorno a quem sempre foi.

Agora que começamos a estar mais conscientes das razões porque a nossa vida é
como é, podemos fugir e continuar a fingir que a vida é complicada e difícil, ou
podemos dar início a um processo de cura interior.

A solidão

Vivemos num planeta com mais de sete mil milhões de habitantes e, todavia, sentimo-
nos cada vez mais só.

Os motivos que nos levam a sentirmo-nos cada vez mais solitários são vários, mas as
causas são sempre as mesmas. Sentimo-nos na solidão ou pelas coisas que
aconteceram nas nossas vidas, e gostaríamos que voltassem a acontecer. Ou sentimo-

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nos envolvidos na solidão pelas coisas que ainda não aconteceram e desejamos
ardentemente que aconteçam. Em ambos os casos é tudo um trabalho interior.

Como podemos estar sós quando vivemos num mar de gente? Como podemos afirmar
que os outros não nos compreendem quando nós próprios não sabemos quem somos
e muito menos sabemos pedir aquilo que desejamos?

Conheço muitas pessoas que vivem em relacionamentos mortos, onde não há qualquer
partilha, excepto aqueles momentos em que a sombra começa a fazer algum barulho.
Quando o marido chega tarde a casa. Quando os filhos tiram más notas na escola.
Quando a esposa se senta em frente à televisão à espera que sejam horas de ir dormir.
E nunca, mas mesmo nunca, conseguimos arranjar uma hora para partilhar a nossa
vida com aqueles que são de facto importantes. E nunca, mas mesmo nunca, temos a
coragem para dizer que não gostamos do caminho que estamos a percorrer com
aqueles que nos deveriam dizer algo ao coração.

O motivo está directamente escondido na nossa Sombra. Temos a sombra de


escuridão, em que projectamos tudo aquilo que rejeitamos em nós nos outros. E
conseguimos assim um marido infiel, uma esposa prepotente, um filho preguiçoso, um
pai déspota, uma mãe mártir, um sogro frio e distante, uma sogra bisbilhoteira, uma
amiga viperina e um patrão sádico. E não temos tempo para nos aperceber que todas
estas pessoas, que mexem emocionalmente connosco, com a nossa essência, são
simples projecções dos nossos aspectos negados, rejeitados e atirados para o saco da
inconsciência.

Mas temos também a nossa sombra de luz. E a sombra de luz é ainda mais pesada e
difícil de carregar aos ombros. Então atiramos com o que de melhor há em nós para
cima dos outros. Para cima do marido que é um exemplo da honestidade, a esposa
que é a pessoa mais carinhosa que conhecemos, o filho que é um génio, o pai que
sabe ouvir os nossos problemas, a mãe que nos prepara as refeições mais saborosas
do mundo, o sogro que nos ajuda quando estamos preocupados, a sogra que pinta
quadros maravilhosos, a amiga que é capaz de uma empatia extraordinária, o patrão
que é criativo como mais ninguém.

E mais uma vez estamos a projectar todas as nossas qualidades. E, eventualmente,


temos que resgatar essas qualidades, trazê-las para o nosso consciente e aplicá-las
para uma vida mais.

Mas como podemos nós resgatar a criatividade genial do nosso patrão quando não
estamos minimamente preparados para a pôr em prática? Não podemos. É necessário
todo um treino mental para que nos seja possível abraçar a nossa luz, o nosso Ouro
Interior.

O trabalho do resgate do nosso Ouro Interior tem que começar sempre por um estudo,
uma observação. Em que situações seria de benefício, para mim, possuir a criatividade
do meu patrão? Em que situações me seria útil possuir o afecto da minha esposa?

Para avançar neste processo iremos encontrar o maior obstáculo de todos: o medo. É
o medo de sermos autênticos, verdadeiros à nossa essência, que nos impede de
brilhar. E temos medo porque fomos ensinados há muitas gerações atrás, a ter medo
do desconhecido. E, assim, perpetuamos este medo de nos descobrir, de nos
revelarmos a nós mesmos.

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Então, o primeiro passo que temos que dar é o de verificar quais as qualidades que
vemos nos outros que têm um significado especial para nós. Só o facto de estarmos
conscientes destes aspectos irá ajudar-nos a dar o próximo passo.

Atreva-se a sentir o medo de ser quem é.

A nossa história

Um dos motivos, senão o motivo principal, porque desenvolvemos uma sombra pessoal
e projectamos tudo o que é rejeitado, prende-se com a nossa história.

Aquilo que nos aconteceu no passado e identificamos como sendo o que nos define.
As aventuras e desventuras a que chamamos a nossa vida. Todos os eventos do
passado são por nós aceites como tendo ocorrido de uma maneira específica,
segundo, claro, a nossa perspectiva.

Tente recordar-se de pelo menos 5 eventos do seu passado, da sua infância, que o /a
tenham marcado de maneira negativa. Pode ser algo com uma carga emocional forte,
como por exemplo o ser fisicamente castigado por ter partido uma jarra. Mas também
pode ser algo sem muita importância, como ter perdido um livro e um dos progenitores
dizer-lhe que só não perdia a cabeça porque estava agarrada ao corpo.

Depois de escrever os eventos, verifique qual a lição que aprendeu devido a cada um
deles. Deixo-lhe o caso de uma cliente minha, para que fique com uma ideia.

Teresa

‐ Aos cinco anos o pai esqueceu-se de a ir buscar ao infantário. Quando a mãe a


foi buscar sentia-se abandonada. A lição que aprendeu aqui foi: eu não sou
importante.
‐ Por volta dos sete anos a mãe enganou-se no seu dia de aniversário. A lição
que aprendeu: não era ninguém, não contava.
‐ A sua melhor amiga mudou de cidade quando ela tinha 12 anos, sem terem
tempo de se despedir. A lição que aprendeu: ninguém dá importância aos meus
sentimentos.
‐ Quando tinha 15 anos foi a melhor aluna da turma dela. Quando contou em
casa, a resposta do pai foi “podias ter feito melhor”. A lição que aprendeu aqui:
nunca conseguirei agradar ao meu pai.
‐ Aos 18 anos entrou para a faculdade, para o curso que queria. No entanto a
mãe ficou amuada com ela por ter escolhido um curso que não tinha muitas
saídas profissionais. A lição?... Nunca conseguirei agradar à minha mãe.

Na verdade o que a Teresa aprendeu foi uma das três lições que constituem a base da
vida de cada um de nós: Eu não sou importante.

Ao longo da vida adulta, a Teresa foi provando a ela própria que estava certa. E nesse
processo conseguiu ʻvingar-seʼ dos adultos à sua volta. Quando pedi à Teresa para
imaginar que escrevia um livro sobre a história da vida dela, o título que surgiu foi
“Como sofrer na vida sendo um Zé-ninguém”.

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Qual seria o título do livro da história da sua vida? Enquanto não souber exactamente
qual o tema da sua vida, da sua história, ser-lhe-á muito difícil abandonar os seus actos
de auto-sabotagem.

As lições que os eventos da nossa vida nos ensinaram irão estar sempre entre os
seguintes:

‐ Ninguém gosta de mim;


‐ Eu não pertenço em lado nenhum;
‐ Eu sou estúpido/a;
‐ Eu sou incompetente;
‐ Eu não sou bem-vindo/a;
‐ Eu não sou especial;
‐ Eu não sou merecedor/a;
‐ Eu sou um/a inadaptado/a;
‐ Eu sou insignificante;
‐ A minha vida não conta para nada;
‐ Eu sou um Zé-ninguém;
‐ Eu não presto;
‐ Eu sou um erro;
‐ Eu sou mau/má;
‐ Eu sou incompleto/a;
‐ Eu não mereço ser amado/a;
‐ Eu sou um/a falhado/a;
‐ Ninguém gosta de mim;
‐ Eu não posso confiar em ninguém.

Estas lições são variadas mas todas elas irão encaixar-se em apenas um de três
grandes temas que fazem parte da vida de qualquer pessoa:

‐ Não sou suficientemente bom /boa;


‐ Eu não sou importante;
‐ Há algo de errado comigo.

E é claro que cada um destes temas irá cair no Grande Tema de cada ser humano:
Coitadinho de Mim!

Há coitadinhos mais coitadinhos que outros, claro! Há pessoas cuja vida parece não
sofrer grandes desafios e pessoas cujo dia-a-dia é uma batalha. Mas que há um
coitadinho em cada um de nós há espera de nos provar que tem razão, lá isso há.

Em que área da sua vida se sente vítima? Onde é que tem mais desafios, ou
problemas? Que tipo de emoção sente quando pensa nesse problema? Recorda-se da
primeira vez na sua vida em que sentiu a mesma emoção? O que tinha acontecido na
altura? Hoje tem o problema que tem para provar a si mesmo que, na altura tinha
razão, que os outros não tinham o direito de o magoar, e irá criar continuamente
situações que provoquem a mesma resposta emocional para poder punir os culpados.
(Claro que se estivesse consciente deste processo seria capaz de o interromper).

Para saber se está a viver a sua história verifique o seu estado emocional. Quando
estamos dentro da nossa história podemos sentir:

‐ Resignação;
‐ A sensação que falta algo;
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‐ Privação;
‐ Ressentimento;
‐ Vitimização;
‐ Solidão;
‐ Culpa;
‐ Raiva;
‐ Vergonha;
‐ Desespero;
‐ Falta de esperança;
‐ Tristeza;
‐ Medo;
‐ Inveja;
‐ Arrependimento;
‐ Pena de si mesmo;
‐ Ódio de si mesmo.

Comece por identificar qual é o tema da sua história. Só assim conseguirá sair dela e
mostrar ao mundo toda a sua luz, o seu brilho magnificente.

A História Da Minha Vida

Um dos motivos porque projectamos prende-se com A História Da Minha Vida.

Esta história é a grande responsável por não conseguirmos sair da rotina, dos conflitos
e das situações de desalento. Quando ainda crianças criámos uma ideia sobre quem
éramos e aderimos de tal maneira a esta ideia que passamos o resto das nossas vidas
a repetir padrões de pensamento, hábitos, emoções e comportamentos.

Para que comece a tornar-se consciente da Sua História deixo-lhe o exemplo da Minha.

Ao analisar vários eventos da minha infância e adolescência consegui ver que o tema
da Minha História é: “Eu Não Sou Merecedor”.

Mais tarde irei mostrar-lhe todos os benefícios de acreditar que não era merecedor.
Mas primeiro temos que ver o que acontece como resultado deste tema.

Porque não me sentia merecedor deixei que outros abusassem de mim, me utilizassem
e ainda ficasse sempre para segundo lugar. Por exemplo, sacrifiquei muitos momentos
em que podia descansar para estar disponível aos outros. Deixei que outros
utilizassem o meu nome para benefício próprio. Perdi dinheiro, para que outros
pudessem sentir-se melhor. Lembro-me, por exemplo, de ser convidado para jantares e
festas onde nunca me divertia porque estava sempre em modo de consulta: a
dispensar conselhos e fazer tratamentos aos convidados com problemas de saúde. Era
capaz de sair de casa ás onze da noite para ir ver alguém que estava mal! E apesar de
estar na verdade a trabalhar, nunca tinha coragem de cobrar pelos meus serviços.
Porque... Não era merecedor!

Algumas das situações mais cómicas (hoje, na altura não o foram!): pediram-me mil
euros emprestados mas na verdade podiam precisar de mais cinquenta ou cem euros...
E eu passei um cheque em branco! Claro que aconteceu o mais provável: a pessoa
escreveu no cheque mais de dois mil euros! Que nunca devolveu! Hoje rio-me da
situação porque ela me foi útil. Mas na altura... Doeu!
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Ainda hoje tenho momentos em que mergulho completamente na minha história. Por
exemplo, esta manhã! Enquanto cortava a barba, olhando-me ao espelho, comecei o
monólogo que sou capaz de reconhecer como fazendo parte da minha história: “Pois,
já que vou a Itália podia aproveitar para ser Iniciado em .... Mas preciso de mil e
oitocentos euros... Fica muito caro... É melhor deixar para outra altura... Não sei como
vou fazer isto...”

De repente a luzinha vermelha começou a piscar! “Ok, Emídio. Estás completamente


dentro da tua história! Vamos lá sair!”

E como saímos da nossa história? Uma das formas é alterando o monólogo interior.
Mas para mudar este monólogo temos que ser capazes de discernir quando estamos
dentro da nossa história.

O que você pode fazer: em primeiro lugar tente recordar-se de quatro ou cinco eventos
da sua infância e/ou adolescência e veja o que aprendeu em cada um deles. Assim,
começará a ver qual o tema da sua história. Descobrir o tema é um passo importante,
sem o qual não conseguirá avançar.

Temos que possuir a humildade suficiente para saber que na verdade não sabemos
que experiências precisamos para sermos o ser completo e divino que reside dentro de
nós.

Com cada experiência negativa temos que nos perguntar:

‐ Porque preciso desta experiência?


‐ O que posso aprender com esta experiência?
‐ De que maneira posso ser útil a outros agora que passei por esta
experiência?

Uma coisa pode aceitar já como garantida: é nos ingredientes negativos da sua história
que se esconde a sua sabedoria.

Comece por aceitar o facto de que a sua história não é má. Antes pelo contrário! Mas é
sempre limitadora.

Depois de descobrir o tema da sua história identifique dez padrões de pensamento,


hábitos, emoções e comportamentos que lhe digam sem sombra de dúvida estar dentro
da sua história.

Por exemplo, quando estou dentro da minha história, eu:

‐ Preocupo-me com situações financeiras;


‐ Penso só nos outros e esqueço-me do meu bem-estar;
‐ Como chocolates;
‐ Bebo muito café;
‐ Sou extremamente simpático;
‐ Deixo para amanhã o que podia fazer hoje;
‐ Não tenho tempo para planificar o dia;
‐ Preocupo-me com o que os outros poderão dizer de mim;
‐ Estou muito tempo a ʻviajarʼ na internet;
‐ Sinto-me insatisfeito com o que já tenho.

Quando estou fora da minha história, eu:

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‐ Sei que o dinheiro que preciso aparece no momento certo;
‐ Penso no meu bem-estar antes de ajudar outros;
‐ Faço uma alimentação saudável;
‐ Bebo um café ou dois;
‐ Bebo muita água;
‐ Digo ás pessoas o que precisam de ouvir, e por vezes não sou nada
simpático;
‐ Consigo fazer tudo o que tinha planeado para o dia;
‐ Nem penso no que os outros poderão dizer de mim;
‐ Vou à internet buscar o correio e mais nada;
‐ Sinto-me grato e contente pela minha vida.

Assim, é fácil saber quando estou dentro da minha história e quando estou fora. Mas o
passo também importante é escrever 10 padrões de comportamento, pensamento,
hábitos e emoções que posso utilizar para sair da minha história sempre que me
apanho dentro dela. Isto é importante porque apesar de saber que estou dentro da
minha história, uma vez dentro é difícil sair. Então temos que criar gestos positivos para
sair. Pode ser tão simples como afirmar “Ah! Cá estou eu na minha história! Vamos lá
sair!”. Mas pode ainda ser fazer uma meditação, yoga, gritar, dançar... O importante é
ter pelo menos dez maneiras de sair da sua história!

Não caia na asneira de, agora que leu isto, pensar que está livre da sua história. Não
está. O Ego e o Corpo de Dor são dois aliados poderosos que irão fazer tudo para nos
manter dentro da nossa história. Tem mesmo que tirar um tempo, escrever os padrões
de mostram estar dentro e fora da sua história. E tem mesmo que saber qual o tema da
sua história. Irá ver como a sua vida começa a mudar.

E a sua história tem mesmo um final feliz!

Os empurrões do Universo

Da maior dor, da maior escuridão, do maior sofrimento, chega-nos sempre a maior


recompensa. Se estivermos preparados para deixar partir a nossa história.

Quanto mais carregada for a nossa sombra de escuridão, maior a luz com que
podemos iluminar o mundo. O inverso também é verdade.

A nossa história está envolta por sofrimento, vergonha, medo, culpa, raiva, fantasias.
Mas tudo isto serve unicamente para nos ajudar a despertar se estivermos dispostos a
abrir os olhos.

Enquanto apontarmos o dedo indicador na direcção dos outros estaremos a


desresponsabilizarmo-nos e a dar todo o nosso poder a outros.

No curso de Educação Emocional cada um dos participantes terá uma oportunidade de


abraçar cada grama deserdada de si. Cada grão de culpa, vergonha, medo, raiva, ódio.

Eu, para dar o exemplo, faço-o para mais de mil pessoas, sabendo que fico
completamente despido de qualquer desculpa, e colocando-me numa posição em que
estou sujeito a qualquer ataque pessoal.

Quando alguém nos ataca, seja por que motivo for ou de que maneira for, essa pessoa
está na verdade a projectar em nós as suas partes rejeitadas e que gritam
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desesperadamente por amor. Podem ter a certeza que a pessoa que mais grita que foi
injustiçada, vitimizada, mal tratada, é a que mais necessidade tem de abraçar, de amar
quem é de verdade. E enquanto apontar o dedo a outros (com três a apontar na sua
própria direcção) não terá qualquer poder sobre a sua vida. A vida destas pessoas
parece simplesmente acontecer à sua volta, transformando-as em mártires sofredoras
e merecedoras do Céu quando deixarem esta realidade.

(Um aparte, para todos os que acreditam na reencarnação, como eu: a fase das
reencarnações chegou ao fim, nesta realidade. As crianças que começaram a nascer
de há uns 10 anos a esta data, estão neste planeta pela primeira vez – daí a
dificuldade que nós temos em nos adaptar a elas. Estamos a ser testemunhas de uma
nova era para o planeta).

E agora mais um pedaço da minha vergonha.

Em 1996 estava em Portugal quando o filho de um casal amigo dos meus pais me
pediu ajuda. Não importam os pormenores. Mas o jovem, de 19 anos, estava decidido
a abandonar a casa, por motivos vários. E eu ajudei-o. Levei-o para Londres. Arranjei-
lhe emprego. Começou assim a seguir um futuro no mundo da fotografia (que
desejava). Estes são os factos. Mas as perspectivas podem variar de acordo com
querer ser predador ou vítima (uma pista útil: a maioria das vítimas são predadores
disfarçados e a maioria dos predadores são vítimas disfarçadas).

Desde que regressei definitivamente a Portugal, em 2000, nunca mais voltei a ter
notícias deste jovem. Sempre soube que os pais dele tinham contraído empréstimos
em bancos e colocado o filho como o beneficiário desses empréstimos (na altura existia
um juro bonificado para jovens). Com a partida do filho para Londres, este casal
passou por bastantes dificuldades financeiras. Na verdade acho que perderam tudo,
desde a empresa que tinham até ao apartamento onde viviam. (Vá tecendo os seus
juízos).

Entretanto, de 1996 até ontem nunca mais soube nada deste casal. Ontem recebi um
e-mail da mãe a acusar-me de lhe ter destruído a vida da sua família. Acusou-me ainda
de eu ser uma fraude. Na verdade soube que enviou emails para todos os terapeutas
de reflexologia, cujos endereços se encontram no website, a informá-los que andou a
investigar as minhas habilitações literárias e descobriu que basicamente eu tenho como
passatempo fazer diplomas e certificados para mim no meu computador.

Tinha acabado de chegar de Itália, estava cansado e deixei o meu ego à solta. A minha
atitude foi pior que catastrófica... Durante alguns minutos.

Estava completamente imerso na minha história. A história do coitadinho a quem todos


querem fazer mal. E depois saí. Não foi fácil. Mas foi muito bom. Ajudou-me
tremendamente a compreender as pessoas que têm dificuldades a sair das suas
histórias.

Comecei por escrever os benefícios deste único evento: há muito que queria deixar
completamente a área da saúde. Cansado de tantas técnicas e processos. Em Janeiro
comecei a preparar uma pessoa para me substituir no IRIEC e tinha decidido que até
Maio faríamos a transição. Mas estava com receio. Isto significaria deixar de parte o
meu currículo.

E esta parte da minha história veio em meu auxílio. Ok, agora posso abandonar tudo.
Abraço o fraudulento, mentiroso, maquiavélico, déspota, traidor... Todos de uma
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assentada! No final fiquei apenas com um sentimento por expressar de compaixão para
com esta mulher. Porque irá continuar a procurar um bode expiatório para a sua falta
de amor-próprio.

Assim é a nossa sombra. Cria situações dramáticas com o único objectivo de nos
obrigar a mudar.

Como é que a sua história o/a pode ajudar a mudar?

Um abraço amigo e um obrigado por ser um presente do Universo!

Os quatro aspectos da Sombra

Eu costumava ter uma ideia de mim como pessoa boa que ajudava muitas outras
pessoas. E esforçava-me como um louco para que todos à minha volta andassem bem
e felizes. Claro que esta atitude só podia conduzir à frustração total, para além de
muitos dissabores.

Há perguntas que temos que enfrentar, e responder, tão honestamente quanto nos seja
possível. Por exemplo, quantos relacionamentos já tive? Em cada relação, o único
factor que nunca é alterado sou eu. As pessoas que entram e saem da minha vida são
sempre diferentes, eu sou o único que nunca é novidade. Então porque atraio sempre o
mesmo tipo de relacionamentos? A pergunta, neste caso, é simples: porque motivo
tenho o tipo de relação que tenho com esta pessoa? O que tenho que mudar em mim?

No passado Sábado estive com algumas pessoas que frequentaram O Processo Da


Sombra, e fiquei a saber de que maneira este processo alterou os seus
relacionamentos e as suas vidas. Por exemplo, fiquei a saber de uma participante que
contemplava a possibilidade de divórcio há uns meses antes do seminário (porque o
marido era ausente, não dava importância ao que ela fazia, não era carinhoso, etc.) e
fiquei a saber que a relação mudou radicalmente! Ao ponto de o marido desta pessoa
andar a ler livros do Paulo Coelho (antes não lia o que quer que fosse!), tornou-se mais
comunicativo e carinhoso. Na verdade o que aconteceu é que esta pessoa, que
frequentou o seminário, resgatou a sua sombra e, neste processo, autorizou o marido a
mostrar-lhe quem ele é de verdade. Pôs um fim a muitas das projecções, aspectos
negados de si, que atirava para cima do marido.

Uma outra pessoa contou-me como começou a perder peso, coisa que havia tentado
inúmeras vezes sem sucesso. Outra ainda falou-me da forma como alterou
radicalmente de planos a nível profissional, e como agora a sua vida parecia finalmente
seguir o trajecto que há tanto tempo ansiava.

Todas estas coisas só são possíveis depois de abraçarmos a totalidade que somos.

Sempre que tiver uma reacção emocional ao comportamento de outra pessoa, tenha a
coragem de afirmar “eu sou assim”!

Nós agarramo-nos a velhos comportamentos, hábitos, pensamentos, porque nos


sentimos seguros no conhecido. E atiramos para cima dos outros tudo o que não
aceitamos, rejeitamos e negamos em nós mesmos. E passamos a vida a apontar o
dedo aos outros. Esquecemo-nos que os outros estão meramente a mostrar-nos aquilo
que já está em nós.

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Eu não digo que sou mentiroso, desonesto, ladrão, arrogante, etc. metaforicamente.
Digo-o porque é a verdade. Eu minto, por exemplo, quando digo que estou bem e não
estou. Eu sou desonesto quando faço de conta que sou um exemplo a seguir, e não o
sou. Eu sou ladrão quando roubo pacotinhos de açúcar nos cafés. Eu sou arrogante
quando ouço outros a falar e, mentalmente, desdenho do que dizem. Ainda ontem
recebi um e-mail de uma amiga que me dizia maravilhas sobre PNL! A minha primeira
atitude? “PNL?! Hello! Aprendi isso há 4 anos, está desactualizada!” Isto é ou não é
arrogância?

A diferença está entre assumir que somos iguais a todas as pessoas que vemos, ou
apontar o dedo aos defeitos dos outros. Os defeitos dos outros são sempre os nossos
defeitos. A vida perfeita, calma, de sonho, está dentro de nós e nunca fora, no exterior.
Jamais irá aparecer o príncipe valente ou a bela adormecida para dar mais encanto ás
nossas vidas. Mas há um príncipe valente e uma bela adormecida em cada um de nós.
A dificuldade está em encontrar ambos.

Quando alguém nos deixa ficar mal, quando sentimos que nos enganaram, quando
alguém é mau para nós. Teremos a coragem suficiente para ver que é tudo um trabalho
interior, nosso? Quando somos atraiçoados. Quando nos magoam tanto que caímos
numa depressão. Quando nos insultam. Quando inventam mentiras sobre nós.
Seremos o suficientemente audazes para reconhecer que tudo isso é um trabalho da
nossa sombra?

A maior dificuldade com abraçar a nossa sombra é que esta está escondida no
subconsciente. Como podemos tornar-nos conscientes de algo inconsciente? A única
maneira é olhando para aqueles que nos rodeiam. Só aí teremos as respostas.

Mas enquanto não abraçarmos a totalidade de quem somos a nossa sombra irá
sempre mostrar-se, dificultar a nossa vida, criar conflitos e caos.

Há uma necessidade urgente de resgatar a nossa sombra. O tempo parece avançar


mais acelerado que nunca. E pode estar a esgotar-se.

A nossa sombra pode manifestar-se de quatro maneiras distintas:

1. A Sombra Inconsciente – permanece no inconsciente, embora activa e a


manifestar-se nas nossas vidas. Sempre que nos justificamos perante
determinado comportamento ou pensamento. Quando criticamos grupos de
pessoas, ou culturas, sociedades e grupos de indivíduos. Desfrutar do mal que
acontece aos outros (por exemplo, rir quando alguém tropeça e cai);
2. A Sombra Deserdada – também conhecida por projecção. Quando dizemos que
o Manel é arrogante, mau, ganancioso, hipócrita (quem tem a coragem de
acrescentar “como eu”?);
3. A Sombra Possessiva – quando somos possuídos na totalidade pela nossa
sombra. Por exemplo, o bom pai de família que tem uma amante. Ou a
respeitada presidente de uma associação caritativa que consome drogas duras.
Quando a nossa sombra nos possui causará danos irreparáveis a nós e a todos
os que nos rodeiam;
4. A Sombra Integrada – aquela que somos capazes de abraçar e reconhecer na
totalidade. É esta última a que nos dará paz e poder.

Iremos ver cada um destes aspectos da sombra nas próximas semanas.

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A Sombra Inconsciente

A pergunta à qual nenhum de nós tem resposta é: o que guardamos no nosso


subconsciente?

Por definição, jamais poderemos saber o que permanece inconsciente. Ou seja, não
conhecemos algo que nos conhece a nós. E, muito pior, aquilo que não conhecemos
sobre nós persiste e infiltra-se subtilmente nos nossos valores e escolhas.

Uma das formas de começarmos a reconhecer a nossa Sombra é a forma como muito
prontamente racionalizamos ou justificamos as nossas atitudes, comportamentos e
escolhas. É-nos tão fácil criticar outros indivíduos, ou grupos de indivíduos. É tão fácil
ajudar os sem-abrigo, mais que não seja para que a nossa Sombra absorva mais
daquele sentimento de superioridade. Notei já diversas vezes que as pessoas que se
envolvem em projectos de apoio aos sem-abrigo abandonam os mesmos em muito
pouco tempo. Sem se aperceberem, as suas sombras indicaram-lhes que não têm
necessidade de se sentirem superiores. É claro que é importante ajudar quem precisa
de ajuda, mas mais importante é verificarmos os nossos verdadeiros motivos. Muitas
das pessoas envolvidas em projectos humanitários têm uma necessidade de sentir que
prestam, que são boas ou que valem enquanto seres humanos. Este motivo irá
alimentar a sombra e criar projecções monstruosas. Mas fazê-lo pelo simples facto de
querer ter a experiência, de ser útil sem esperar algo em troca, aí vale a pena.

Se você está envolvido num qualquer projecto de ajuda aos mais carenciados verifique
se comenta o seu envolvimento com outros. Se tem necessidade de fazer saber aos
outros que está neste projecto é preferível que o abandone imediatamente pois está
apenas a alimentar a sua Sombra. Mas se o trabalho que faz passa despercebido, se
não sente necessidade de informar os seus amigos e conhecidos, então continue! Está
a prestar um óptimo serviço.

A sombra inconsciente manifesta-se de muitas maneiras. Quando contamos uma


anedota sobre os Alentejanos. Ou quando criticamos os produtos das lojas Chinesas.
Ou quando manifestamos a nossa veemente oposição a um político. Ou temos pena da
família que sofre a tortura de um patriarca alcoólico. Quando lemos meia dúzia de livros
de auto-ajuda e acreditamos ter a resposta para os problemas dos nossos amigos
(alguma vez se ouviu a dizer “Se ela fizesse as coisas como eu lhe tinha dito...”). Ou,
entre as pessoas ʻespirituaisʼ: “O meu mestre disse que o melhor era...”

A Sombra inconsciente leva-nos a procurar a nossa espiritualidade em muitos lugares,


excepto naquele onde sempre esteve: dentro de nós.

Mantenha sempre presente que a complexidade do universo, assim como a


complexidade das nossas vidas, nunca será completamente compreendida nem
revelada. Mas nós podemos viver a fantasia de que sabemos muito bem quem somos
e o que queremos. E criamos um conjunto de situações problemáticas no processo de
tentar compreender tudo à nossa volta. E o nosso problema é apenas um: não aceitar
Aquilo Que É.

A nossa Sombra contém tudo aquilo que nos causa preocupações, aquilo que é
estranho ao ideal do ego, tudo o que é contrário aquilo que desejamos que os outros
pensem de nós. Tudo aquilo que ameaça criar instabilidade no ambiente ʻseguroʼ que
nos esforçamos tanto por criar.

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Da mesma maneira que o ego é formado a partir dos pedaços quebrados de muitas
experiências, assim também é ameaçado pelo seu próprio lado mais escuro. Tudo o
que contradiga o ego é uma ameaça. A Sombra é a maior ameaça ao nosso ego. E o
perigo verdadeiro surge quando esta Sombra começa a ter mais energia do que o
próprio ego. Eventualmente irá tomar posse dele.

Por este motivo, este sentimento de ameaça desconhecida, é que o nosso ego não
sabe nada sobre a sua sombra. A sombra é inconsciente. Será que os peixes sabem
que nadam na água? Não creio. São um com o elemento que os rodeia. Será que o
ego sabe que nada num mar de contradições que competem por atenção? Raramente.

Quem, de entre nós, tem a coragem de admitir que por vezes (ou muitas vezes), faz o
que faz por motivos menos íntegros? Quem é capaz de admitir que por vezes dá aos
amigos os conselhos que o próprio precisa urgentemente de colocar em prática? Quem
é capaz de admitir que por vezes tem inveja de um amigo? A nossa sombra tem uma
agenda diferente da do nosso ego. E tudo fará para conseguir os seus objectivos.

Quem, de entre nós, não se sente por vezes necessitado, vaidoso, narcisista, hostil,
dependente ou manipulativo? Pergunto-me se as esposas dos grandes homens da
História seriam felizes partilhando as suas camas com amantes poderosas como eram
as causas dos seus maridos.

Será que as pessoas que dedicam toda a sua vida ao serviço dos outros, vivendo sem
qualquer conforto ou prazer, não o farão movidas apenas por uma enorme insatisfação,
depressão e raiva? Será que o seu sacrifício é uma coisa assim tão boa? Será que é
mesmo uma escolha? Será que a pessoa que ganha o prémio Nobel da paz não terá a
necessidade de ser necessário? Será que estamos a ser cínicos ao tornarmo-nos
conscientes dos valores opostos aqueles que expressamos conscientemente, ou será
uma forma muito profunda de honestidade?

Será que uma pessoa foi ʻsantaʼ porque sacrificou a sua viagem nesta realidade em
serviço aos outros? Será que a sua vida poderia ser tão tenebrosa que a única opção
era não a viver? Será que um dos aspectos dos santos é que de facto não são capazes
de viver a sua própria aventura nesta vida? E quem, entre nós, poderá fazer este tipo
de juízo?

Será possível que uma vida de boas obras pode existir lado a lado com uma vida
interior carregada de sentimentos torturados? Não será possível que uma vida interior
rejeitada, apesar de no exterior aparentar muita iluminação, possa mascarar uma
sombra poderosa?

Para responder à questão anterior basta olharmos para qualquer noticiário. O padre
acusado de pedofilia, o líder político acusado de corrupção, o bom samaritano que bate
nos filhos. Não podemos cair na tentação de subestimar o poder da sombra do ser
humano.

Será que o fundamentalista que tenta desesperadamente converter todos à sua


ideologia está convencido que isto é para o melhor bem de todos, ou será que o que o
leva a agir assim são sentimentos de culpa, frustração, ansiedade e dúvidas
existenciais?

Um autor que muito admiro, Nicholas Mosley, afirma que “pessoas como os católicos
ou islamitas, são-no muito mais para poder pertencer a um grupo que ofereça um apoio
emocional num mundo conturbado, do que por motivos de escolha feita depois de uma
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busca da verdade e significado na vida”. E lá se vai por terra a teoria das revelações
divinas e da integridade individual! Repare ainda que este tipo de questão levanta de
imediato, em muitas pessoas, um sentimento de ofensa. Naturalmente lutamos para
defender os nossos valores morais (mesmo que nunca tenham sido nossos). Ao
defendermos as nossas escolhas, justificando-nos por cada decisão, estamos a dar
poder à sombra. Lembre-se apenas que a verdade nunca precisou de ser defendida.

E mesmo assim, e porque a sombra se mantém inconsciente, longe da nossa vista, em


oceanos demasiado profundos para nos atrevermos a mergulhar, não compreendemos
como é que ela brinca com as nossas vidas. E onde é que está a nossa rectidão? Será
que a humanidade é inerentemente boa? Seremos pessoas boas apenas porque a
nossa cultura nos criou assim? Será que é possível existir a bondade sem o seu
oposto? Será que uma bondade constante, ao longo de muitos anos, não pode tornar-
se numa força demoníaca? Basta-nos olhar para a história da humanidade para ver
que muitos dos actos bondosos tiveram o seu peso e preço.

Quantas pessoas não chegam à segunda parte das suas vidas sem uma certa
quantidade de arrependimentos, rancores, ressentimentos, culpas e desculpas? E
contudo, na altura, pensámos que estávamos a agir para o melhor bem de todos, com
a melhor das intenções. Fazer um levantamento da nossa história pessoal é o primeiro
passo para reconhecer aquilo que permanece no inconsciente: a presença e actividade
da nossa sombra.

Quem, de entre nós, poderá afirmar: “Eu estou consciente da vida do meu
inconsciente?”

O que permanece no inconsciente é como um segundo governo, ou governo-sombra,


capaz de a qualquer momento destruir toda uma vida, assim como a vida daqueles que
mais ama.

A Sombra Projectada

Pense na pessoa que, quanto a si, é prepotente, preguiçosa, desonesta e corrupta. É


capaz de dizer “fulano/a é prepotente, preguiçoso/a, desonesto/a e corrupto/a... Tal
como eu!”?

Pense na antipatia à volta dos homossexuais... que parte destas pessoas, que rejeitam
de uma forma mais ou menos velada a homossexualidade, é que nunca se sentiu
completamente confortável na sua própria sexualidade? Pense na conveniência de
conhecer os seus inimigos a todo o momento – se o inimigo está ʻlá foraʼ, então não
está ʻcá dentroʼ. Logo, não tenho que carregar esse peso na consciência, nenhuma
obrigação de me auto-examinar.

A consciência do ego, aquele pedaço de bolacha Maria a flutuar num vasto e profundo
oceano, desconhece por completo o que se esconde nas águas profundas sob si. A
verdade é que aquilo que está contido no subconsciente são um sem fim de sistemas
energéticos, dinâmicos e activos, capazes de invadir e controlar na totalidade a mente
consciente.

Será possível que um homem, qualquer homem, mesmo o mais sincero de todos, seja
capaz de erradicar toda a sua sexualidade? E se é, qual o preço a pagar? É fácil
responder a esta questão: basta olhar para todos os escândalos à volta do clero, desde
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os filhos bastardos até à pedofilia. E quem são os ʻmais purosʼ que exigem este
sacrifício do clero? Que Deus é esse que apregoam e que aniquilam em simultâneo ao
negar uma parte da natureza humana? Que sombra poderemos encontrar nestes
homens?

Limitar-se a negar algo nunca irá funcionar a seu favor. Os nossos componentes
inconscientes englobam um quantum energético que possui o poder para abandonar o
oceano profundo e entrar no nosso mundo, completamente livre de qualquer interdição
da mente consciente. Se isto não fosse verdade os nossos políticos, propagandistas e
agências de publicidade ficariam rapidamente sem emprego. Na verdade as técnicas e
ferramentas utilizadas durante a Segunda Guerra Mundial para desinformar, manipular
e esconder informação não teriam sido adquiridas pelos acima referidos. O objectivo é
sempre o mesmo: apelar ao subconsciente e provocar projecções positivas sobre
produtos, de um simples caramelo ao detergente da roupa, do carro de luxo ao político
que quer chegar a primeiro-ministro.

Ninguém projecta conscientemente. Isso seria pura e simplesmente uma contradição.


Ninguém acorda pela manhã com a intenção de sair à rua e projectar os seus aspectos
negados, rejeitados e escondidos. E, contudo, a energia psíquica em cada um de nós,
principalmente a que se encontra fora do nosso alcance, no subconsciente, manifesta-
se através de uma dinâmica que o próprio ego não consegue compreender, nem
conter. É assim que nos apaixonamos, que tememos um estranho na rua, e recriamos
as histórias dos nossos relacionamentos uma e outra vez.

A mente é como um computador analógico capaz de funcionar apenas devido à nossa


história pessoal. Até certo ponto, a mente procura situações análogas para poder
atribuir significado a algo ou alguém. “Quando é que no passado senti o que estou a
sentir agora?”, “O que sei eu sobre esta situaçãoʼ”, “O que posso ir buscar ao passado
para melhor processar este evento?”. Apesar de cada momento na nossa vida ser
absolutamente único, o nosso sistema psíquico, funcionando a partir de dados da
experiência do passado, como a ansiedade, inunda o campo da nova experiência com
a informação antiga. E assim projectamos a nossa vida interior, ou aspectos dela, para
cima de indivíduos, grupos, nações. É desta mesma maneira que os propagandistas,
os publicitários e os políticos procuram invocar em nós respostas positivas ou
negativas. Com frequência a capacidade de crítica do ego consciente é suplantada
pelos poderes da programação histórica e os novos momentos da nossa vida sofrem
em benefício do passado.

Tenho um vizinho que apelida todos os políticos e homens com poder de decisão de
“bananas”. Para ele são todos uns “bananas”! Está a ver televisão, surge um politico e
a reacção dele, colérica, é sempre a mesma: “Olha para aquele banana!” O curioso
deste meu vizinho é que a sua esposa, enquanto foi viva, tratou-o sempre por
“banana”. Ele não consegue ver a ironia nem a projecção. Uma vez que a esposa
partiu, o “banana” deixou de estar nele e passou a ser projectado em todos os homens
com poder de decisão. Este exemplo ilustra o que disse até agora.

Assim, aquilo que não somos capazes, ou não queremos, ver em nós próprios, ou
aquilo que perturba a imagem que queremos mostrar ao mundo de nós, é muitas vezes
distanciada do ego consciente através de um mecanismo de projecção que desassocia
estes aspectos negados. Uma vez que a energia, a maldade, se encontra agora ʻlá
foraʼ, eu não tenho que lidar com ela ʻcá dentroʼ.

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Mais uma vez, nós não projectamos conscientemente, motivo pelo qual as nossas
projecções são tão poderosas, tão capazes de reacções desproporcionais ao que está
a acontecer. Quem seria capaz de imaginar que aquilo ʻlá foraʼ a que eu reajo tem a
sua origem ʻcá dentroʼ? Quem seria capaz de imaginar que a realidade que eu vejo ʻlá
foraʼ é mais um aspecto de quem eu sou? Não admira que eu tenha a reacção que
tenho, e que sinta uma enorme atracção pela situação ou pessoa!

Nós estamos continuamente a correr em direcção à nossa Sombra, e acreditamos ser


algo ʻlá foraʼ da qual podemos distanciar-nos. Com cada projecção da Sombra, a nossa
alienação potencial daquilo a que se chama realidade aumenta. Quanto mais
despejarmos os nossos detritos sobre os outros, mais iremos ganhar uma visão
distorcida da realidade. Muito raramente conseguimos ver o mundo, e os outros, tal
como são de verdade. Guerras foram feitas, romances conquistados, relacionamentos
iniciados e terminados sobre as projecções da Sombra. No final perguntamo-nos para
quê tanto esforço...

Quantas pessoas projectaram na Princesa Diana as suas vidas por viver? Os seus
sonhos, os seus sorrisos, a sua bondade? Tudo projecções da Sombra. E depois, na
sua morte prematura, choraram as suas próprias vidas por viver. Quanta da vida
sofrida desta mulher não foi apenas um carregar aos ombros as Sombras de milhares,
senão milhões, de pessoas? De que se alimenta a bisbilhotice e a inveja se não da
fuga de nós próprios?

Aquilo que não conhecemos, ou temos receio de conhecer, magoa-nos de verdade. E


muitas vezes magoa ainda os que nos rodeiam. Muito frequentemente aquele que
recebe a projecção da Sombra dos outros – seja ele um bruxo, pedófilo,
toxicodependente, ladrão, judeu, chinês, homossexual, ou qualquer outro mártir do
nosso inconsciente – irá ser acusado, humilhado, marginalizado, morto, ou ignorado.
Mas estes são apenas os corajosos que carregam a nossa vida secreta, a nossa
Sombra, e por este motivo iremos odiá-los, humilhá-los e destrui-los, porque
cometeram o pior dos crimes: mostraram-nos o que se esconde dentro de nós.

Infelizmente, quanto mais fraco for o estado do ego mais intolerável se torna, e maior o
potencial para julgar os demais de maneira categórica. O mesmo é dizer: maior o
preconceito e a intolerância.

Exercício:

Arranje um caderno e durante esta semana, todos os dias, aponte as várias formas em
que gasta a sua energia e tempo a queixar-se dos outros. Todas as vezes que aponta
o dedo aos outros. Todas as vezes que critica o comportamento dos outros. Sem se
justificar! Irá assim começar a ver o que esconde a sua Sombra.

A Sombra Possessiva

Alguma vez assistiu a um concerto de rock e deu por si aos saltos e a gritar, envolvido
na atmosfera caótica do espectáculo? Talvez até tentando libertar-se dos
condicionamentos do ego educado, através de álcool e/ou drogas recreativas? Alguma
vez deu por si a gritar insultos a um árbitro durante um jogo de futebol? Ou alguma vez
chorou a ver uma cena de uma qualquer telenovela?
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Alguma vez se sentiu cheio de razão ao ponto de julgar outro ser humano e dizer a
quem queria ouvi-lo que determinado criminoso deveria ser enforcado? Ou alguma vez
desfrutou do facto de perder todas as inibições impostas pela sociedade e fez algo de
ʻloucoʼ? Alguma vez vociferou as suas queixas em detrimento de uma minoria, como os
ciganos ou negros? Ou alguma vez comentou que deveríamos bombardear os árabes?

Alguma vez desfrutou de um acto que considera ʻmauʼ, convencido que na verdade
estava a ter prazer nesse acto? Alguma vez passeou num local cheio de pessoas de
diferentes culturas (em férias) e comparou-se com essas pessoas apenas para se
sentir superior?

Se alguma vez experienciou um dos eventos acima, teve na verdade a experiência de


ser possuído pela sua sombra. Não só foi possuído pela sua sombra, mas identificou-
se completamente com ela.

Os grupos de rock activam e canalizam nos jovens a necessidade psicológica da


separação dos progenitores (provavelmente os seus pais gostariam que você
desfrutasse dos Beattles ou Plácido Domingo e você preferia os AC/DC ou os The
Cure).

Quando somos possuídos pela sombra sentimos uma enorme quantidade de energia a
fluir pelo nosso corpo. Daí a nossa reacção a um evento ser sempre desproporcional a
esse mesmo evento. Esta energia é um aspecto da nossa mente que quando activada
tem o poder de usurpar o ego e levar-nos a lugares que jamais iríamos
conscientemente. Já reparou que em contos e filmes de terror, onde surge a presença
de um qualquer Satanás, este personagem é sempre o que tem mais energia, é o que
parece divertir-se mais e ainda o mais assustador? Quanto mais malévolo o
personagem que incarna Satanás mais poder e energia possui.

Quanta maldade, intencional ou não, surge num cidadão normal e bem-educado,


quando é possuído pela sua sombra? Aquilo que temos negado em nós irá fazer-nos
uma visita, mais cedo ou mais tarde. E ser possuído pela sombra é trazer ao mundo
quantidades inacreditáveis de energia. Por algum motivo nos deixamos seduzir pela
sombra em momentos de completa distracção. E depois temos que apanhar os
fragmentos do que resta após a intervenção desta energia sombria.

Nenhum de nós é menos perigoso que a pessoa ʻcertinhaʼ que aponta o dedo aos
males do mundo, pensando que está certo e todos os demais estão errados. “Se
apenas os outros fossem como eu” costuma ser o mantra da pessoa que mais danos é
capaz de causar uma vez possuída pela sombra. E isto porque estas pessoas são as
que mais inconscientes estão e as que menos são capazes de imaginar os danos que
estão aptas a infligir a elas mesmas e aos outros.

Por acaso não foram os americanos quem destruiu a maior parte do Vietname e
causou a maior parte das baixas, para levar ʻo bemʼ a um povo distante? Repetindo
depois o mesmo episódio no Iraque?

Quando somos possuídos pela sombra não conseguimos ver as nossas próprias
contradições, as falhas dos valores que defendemos, as injustiças que praticamos.

Na verdade, um dos primeiros sinais de estarmos a ser possuídos pela sombra é a


nossa rápida racionalização, e/ou justificação, para tornar o nosso comportamento mais
aceitável perante os outros.

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Algumas das justificações que utilizamos no dia-a-dia e que são um sintoma inequívoco
de possessão da sombra (lembre-se, a nossa reacção é desproporcional à ocorrência):

“Fui para a cama com a colega porque a minha mulher já não me ama da mesma
maneira.” – o facto: foi para a cama com outra mulher.

“Levo os agrafos do trabalho para casa porque a empresa merece ser roubada. Não
me paga o que mereço.” – o facto: está a roubar bens alheios.

“Não te cumprimentei no outro dia porque ía cheio de pressa.” – o facto: não te vi, ou
não te queria ver.

“Odeio aquele fulano! Como pode ele roubar tanto dinheiro e não ser apanhado?!” – o
facto: alguém roubou outrem.

“Sou contra a prostituição porque vender o corpo é sujo!” – o facto: há pessoas que
ganham a vida prostituindo-se.

“Gostava muito de te visitar, mas tenho a minha mãe doente.” O facto – não te quero
visitar.

Quando somos possuídos pela nossa sombra sentimos vergonha, culpa, medo, raiva.
No fundo, odiamo-nos pelo acto. E depois, para tentar curar estes sentimentos tóxicos,
justificamos as nossas acções. Temos sempre um motivo. E o nosso motivo é sempre
correcto.

Normalmente são as pessoas mais correctas, bondosas, honestas, eficientes e bem-


educadas as que são capazes de verdadeiras atrocidades contra a humanidade
quando possuídas pela sombra. Ou contra si próprias! Não significa isto que temos que
ser prevaricadores – apenas estar conscientes que no contexto adequado seríamos
capazes de tudo.

Todos nós, sem excepção, somos capazes de tudo. Aquilo que mais critica noutro,
aquilo a que reage de uma maneira emocionalmente desequilibrada, é aquilo que você
está a fazer a outros neste momento. Só que de uma maneira velada e justificada.

Faça o seguinte exercício, com a máxima honestidade que lhe for possível:

Peça a amigos e familiares para ajudar. Diga-lhes que não levará a mal a sua
honestidade. Na verdade irá agradecer-lhes a frontalidade e honestidade. E se algum
amigo não quiser ajudar pode ter a certeza que isso é apenas porque ele/a encontra-se
a fazer o mesmo, a ter o mesmo comportamento e a justificar-se da mesma maneira.

Faça uma lista de três pessoas cujo comportamento o incomodam profundamente. E


não se permita afirmar algo de espiritual como “o comportamento dos outros não me
afecta.” Estará a mentir. Ou então não faz parte desta realidade.

E depois veja como você tem o mesmo tipo de comportamento, mas justificado e
velado. Deixo-lhe o meu exemplo em duas situações específicas.

‐ Não suporto pessoas que amuam!


(claro que eu não amuo! Por vezes fecho-me em silêncio, mas é só porque não
gosto de gente amuada à minha volta. E normalmente o meu silêncio não dura
mais que uma ou duas horas... Ok, pode durar um ou dois dias... Mas é silêncio,
não é amuar!)

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‐ Não entendo como algumas pessoas são lentas a compreender coisas simples.
Fico irritado com a ignorância!
(Na verdade fico irritado porque não aceito as pessoas como elas são. A vida é
muito mais simples do que imaginamos. Mas como não acredito no que digo,
tenho que atrair pessoas complicadas, que me compliquem a minha vida para
que me possa queixar. Ah! E se alguém me disser algo simples, terei que
obrigatoriamente complicar tudo, só para mostrar que sei mais! Mas não é saber
mais, é ser mais inteligente que o comum dos mortais... )

Como pode ver, pelas minhas próprias explicações em relação ao meu


comportamento, eu tenho uma justificação para o que faço mas não aceito as
justificações dos outros. Isto é ser possuído pela sombra. Até me tornar consciente do
que estou a fazer.

Claro que é preferível ser possuído pela sombra em pequenas doses diárias, e ir
destruindo a minha vida e a dos que me rodeiam, lenta e progressivamente. O oposto
seria um comportamento exemplar durante anos a fio e depois agir de uma maneira
completamente absurda e destruir de um só golpe a minha vida e a daqueles que me
rodeiam.

Que filmes passam na nossa cabeça diariamente? Como interpretamos a realidade à


nossa volta? Como nos atrevemos a racionalizar a realidade dos outros? E quando é
que começamos a aceitar que na verdade não sabemos nada?
Esteja atento a todas as situações em que tem uma reacção que é desproporcional ao
que está a acontecer. A sua sombra anda próximo.

A Sombra Integrada

Como nos sentiríamos se o inimigo que está a olhar directamente para nós tivesse a
nossa face? Quem não fugiria de um encontro marcado com o inimigo ao descobrir que
esse inimigo somos nós?

Depois de uma vida a culpar os outros, é extremamente difícil para nós conseguir por
fim reconhecer que a única pessoa que esteve sempre presente em todos os eventos,
bons e maus, da nossa vida fomos nós. E, fruto da necessidade, carregar aos ombros
a responsabilidade pelos dramas que ocorreram. Quem é que não ficará
envergonhado, humilde, e até mesmo humilhado por este reconhecimento?

É este o motivo porque adiamos o reconhecimento da nossa sombra por tanto tempo
quanto nos for possível.

Quem é que quer reconhecer que o seu cônjuge ou filho ou amigo talvez conheça
melhor certos aspectos de nós do que nós mesmos? Quem é que quer carregar a
responsabilidade de atirar para cima dos outros todos os seus aspectos negados?

Todavia, como os grandes mestres nos ensinaram ao longo do tempo, e como a


própria história o demonstra, aquilo que ignoramos e rejeitamos irá sempre surgir na
nossa vida e nas vidas daqueles que nos rodeiam.

Protestamos que temos boas intenções, e afirmamos que procuramos o conhecimento


e a espiritualidade. Mas quem é capaz de observar o espectro total da humanidade em

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si mesmo? Aqueles que mais luz possuem são também aqueles que mais escuridão
projectam. E aqueles que mais luz vendem são os que mais escuridão impingem nos
outros. Aqueles que mais respostas aparentam possuir, e estão prontos a elucidar os
outros sobre os caminhos da luz, mais insignificantes e escuros são. Quanto mais
moralmente correctos, maior o peso da sombra que é descarregada para cima dos
outros. Especialmente aqueles que se manifestam corajosamente contra o aborto, e
contra as drogas, e contra a guerra, e contra os políticos corruptos, e contra a
prostituição, e contra a homossexualidade, e contra a preguiça, e contra a ganância, e
contra ______________ (preencha com os seus contras), são os que mais escuridão
distribuem pelo mundo. Esquecemos que Aceitar Aquilo Que É não é sinónimo de
apontar o dedo a terceiros. Sempre que apontamos o dedo a outro é de nós que
falamos, das partes de nós que negamos e rejeitamos, das partes de nós que somos
incapazes de aceitar e amar.

Aquilo a que resistimos persiste. Sempre. Ser contra algo irá simplesmente roubar-nos
poder e ao mesmo tempo reforçar a nossa sombra. E assim nos encontramos num
mundo onde a riqueza é mal distribuída, onde há abuso e desrespeito pela natureza,
onde eu estou certo e tu estás errado.

É capaz de aceitar que na natureza humana não há verdadeiros segredos? É capaz de


aceitar que somos todos iguais? Todos escondemos as mesmas vergonhas, medos,
culpas, raivas, rancores.

É capaz de aceitar que é estúpido? Se alguém lhe chamar estúpido, porque haveria de
ficar ofendido? É capaz de se recordar de uma situação em que foi estúpido? Eu não.
Eu sou capaz de me recordar de centenas de situações em que fui estúpido. Porque
haveria de ficar ofendido com esta palavra dirigida a mim?

É capaz de aceitar que já se prostituiu? Se alguém o comparar a uma prostituta é


capaz de ficar ofendido? Eu não. Já me prostitui de tantas maneiras ao longo do
tempo! De cada vez que vai a uma festa para agradar, apesar de no fundo não lhe
apetecer ir, está a prostituir-se. De cada vez que aceita um emprego que não seja a
sua vocação, o seu dom, está a prostituir-se.

Como podemos então chamar estúpido a alguém? Como podemos então ser contra a
prostituição? É de nós que falamos sempre.

A nossa sombra, o mar vasto que está para além da nossa mente consciente, nunca
será totalmente abraçado. Mas algumas partes, certos aposentos, certas correntes,
podem ser abertas ao nosso consciente. Aquilo que eu nego em mim irá, mais cedo ou
mais tarde, aparecer no meu mundo exterior. Quantos mais aspectos do meu mundo
interior eu for capaz de identificar, menores as probabilidades de aparecerem na minha
vida como parte de uma partida do destino, ou do karma. Quem seria capaz de
imaginar que o destino e o karma estão intimamente ligados a aspectos do nosso
subconsciente?

Alguma vez deu por si a relacionar-se com o seu cônjuge exactamente da mesma
forma que se relacionava, quando criança, com o seu pai ou mãe? Quão reconfortante
que é tomar consciência da nossa auto-sabotagem em prol das relações que
construímos quando ainda crianças! Utilizando as mais diversas máscaras para que os
outros, e nós próprios, não consigamos ver que não somos pessoas boas, ou que não
somos importantes nem especiais, que não prestamos. Esquecendo-nos que aquilo a
que resistimos persiste. E vamos então criar as situações para provar a nós mesmos
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precisamente aquilo que mais medo temos de descobrir sobre quem pensamos ser!
Ou, ainda pior, atirando para cima dos filhos, do cônjuge ou dos amigos todos estes
aspectos que negamos em nós.

Se pensar, e tomar consciência, de que sempre que fala de alguém é apenas de si que
está a falar... Então estará preparado para despertar do longo sono da inconsciência.

Tornar a nossa sombra consciente é sempre um gesto de enorme humildade. Mas é


também um gesto de enorme crescimento. Pois é assim que começamos a resgatar a
totalidade que somos e a tomar consciência do nosso dom e da razão para estar aqui
agora.

Este crescimento da nossa humanidade irá pedir de nós muito mais do que aquilo que
se encontra dentro dos limites da nossa zona de conforto. Mas irá garantir a nossa
realização plena como seres humanos, seres espirituais e seres completos.

Foi o Jung quem afirmou que todos nós caminhamos com sapatos pequenos demais
para o tamanho dos nossos pés. Mudar de sapatos, e calçar números maiores, é
sempre um desafio para qualquer ser humano. Exige um crescimento mais acelerado.
É um desafio contínuo.

Isto pode parecer simples e algo que todos desejamos – mas na verdade é pedir muito
de nós. Como o próprio Jung afirmou, o nosso objectivo não é sermos pessoas boas ou
atingir a bondade plena. Porque o bem que fazemos pode na verdade surgir de um
complexo da sombra ou ter consequências que não prevíamos. O nosso objectivo é
sermos completos. E ser completo nunca poderá ser possível enquanto não
abraçarmos todos os opostos presentes. É impossível saber a bondade sem a
maldade, o altruísmo sem o egoísmo, o belo sem o feio. Daí que o crescimento do Eu
começa sempre pelo conflito. Como podemos aceitar sem rejeitar? Este é o problema
de muitas pessoas ditas espirituais. Aceitam tudo e todos. As suas vidas são
preenchidas por um sofrimento silencioso. E continuam a aceitar. Mas é impossível
existir a aceitação sem a rejeição. Então rejeitamos parte da nossa vida, do nosso
potencial, para podermos ser pessoas boas que aceitam tudo e amam tudo e todos. E
no processo criamos sofrimento para nós.

Todos carregamos esta enorme polaridade dentro de nós. Algumas pessoas fogem da
tensão, outras abraçam-na. Como o poeta americano Walt Whitman afirmou num dos
melhores poemas dedicados à sombra: “Eu contradigo-me? Então, eu contradigo-me,
e?... E sou infinito, contenho em mim multidões. Não há duas pessoas iguais.
Contradigo-me.”

E nós contradizemo-nos. Mas tememos que alguém descubra as nossas contradições.


Esquecemo-nos que é este aspecto que nos torna humanos, interessantes. À medida
que vamos resgatando estas pontas perdidas de nós, estas partes enterradas,
rejeitadas, negadas, projectadas, e as abraçamos como uma parte da totalidade que
somos, enriquecemos a nossa experiência humana. E enriquecemos a experiência
humana dos que nos rodeiam.

Apesar de poder parecer uma tarefa problemática, este abraçar da nossa sombra, é a
única forma de conseguirmos a cura das nossas vidas, assim como a cura dos nossos
relacionamentos e do nosso trabalho. Este trabalho não nos aproxima de um ego mais
satisfeito consigo, mas a um ego mais próximo da totalidade que é o ser humano. O
trabalho da sombra a que queremos fugir é o caminho da cura da nossa vida. A cura do

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mundo começa com a nossa cura, começa com aquilo que não queremos conhecer
sobre quem somos.

Com o correr do tempo as ondas que este escrutínio consciente provoca irão tocar
naqueles que nos rodeiam. Abraçar a nossa sombra é o caminho dos corajosos para
criar um mundo melhor. Não é por acaso que os participantes do Processo da Sombra
constatam que depois do seminário as pessoas com quem tinham um relacionamento
difícil mudam. As projecções são resgatadas e os outros ficam automaticamente livres
para serem quem são de verdade. Completos.

Mas para isto acontecer temos que ter a coragem de ser autênticos. Enfrentar as
nossas histórias. Aceitar que somos honestos. E mentirosos. Somos amigos e
inimigos. Criativos e destrutivos.

Espero que estas dez lições sobre a sombra o/a tenham ajudado um pouco mais a
descobrir-se. Não preparei estas lições a pensar na utilidade para outros. Fui egoísta.
Tudo o que escrevi foi sempre para mim. E sinto-me feliz pelo meu egoísmo se este
ajudou alguém para além de mim.

Um abraço amigo,

Emídio Carvalho

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