Juventude e Engajamento Social: O Movimento de um Programa Socioeducativo
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A obra serve de subsídios teóricos e metodológicos a pesquisadores que empreitam trabalhos com elevado número de sujeitos, com a utilização de grupos focais e estudo comparativo. Mas, sobretudo, almeja alcançar notadamente educadores, profissionais ou pessoas que participam da tensa negação do reconhecimento não somente de jovens pobres, mas, especialmente, dos excluídos, como negros, mulheres e homens trabalhadores empobrecidos, como sujeitos de direito. Sujeitos não só do direito à escola, à educação, ao conhecimento, à cultura, mas da negação mais radical do reconhecimento como humano. Além disso, este livro diferencia-se pela leveza utilizada na apropriação das falas dos jovens/sujeitos que embalados pelo desejo de "ser mais" desconstroem o pesado academicismo inerente às avaliações de políticas.
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Juventude e Engajamento Social - Edinólia Portela Gondim
Editora Appris Ltda.
1ª Edição - Copyright© 2018 dos autores
Direitos de Edição Reservados à Editora Appris Ltda.
Nenhuma parte desta obra poderá ser utilizada indevidamente, sem estar de acordo com a Lei nº 9.610/98.
Se incorreções forem encontradas, serão de exclusiva responsabilidade de seus organizadores.
Foi feito o Depósito Legal na Fundação Biblioteca Nacional, de acordo com as Leis nºs 10.994, de 14/12/2004 e 12.192, de 14/01/2010.
COMITÊ CIENTÍFICO DA COLEÇÃO CIÊNCIAS SOCIAIS
Dedico este trabalho
aos jovens que vivem em estado de vulnerabilidade social,
bem como aos docentes e estudiosos
envolvidos com essa questão.
À minha avó Salutina Rosa (in memoriam),
mulher guerreira, que, em seu silêncio,
ensinou-me a importância da força interior e
do equilíbrio entre a justiça e o amor.
Aos meus netos queridos, Maia, Maitê e Álvaro,
pela alegria das suas presenças entre nós e que
tanto revigorou a minha caminhada,
dando-me a certeza da continuação da minha existência.
PREFÁCIO
A obra Juventude e engajamento social: o movimento de um programa socioeducativo, de Edinólia Lima Portela, constitui uma profícua contribuição para o debate acadêmico científico. Expressa o compromisso da autora em socializar o conhecimento produzido no campo da avaliação de políticas públicas voltadas para a juventude, fruto de uma densa e criteriosa análise de um programa socioeducativo, o Projovem, que, entre outros objetivos, propôs-se a possibilitar, por meio dos estudos desenvolvidos em uma das suas dimensões – a ação comunitária –, o engajamento de jovens em espaços/ações em sua comunidade, de forma participativa.
Ultrapassando-se a representação de apenas mais uma produção científica, trata-se, portanto, de uma contribuição que traz em seu bojo sinalizações significativas para se repensar o planejamento de políticas sociais, que tomam a formação humana como meta principal, especialmente quando se lançam no desafio de resgatar a dívida social com aqueles que foram excluídos do direito à educação, como é o caso do público do Projovem.
Nesse processo de produção, merece destaque a forma criteriosa e objetiva com que se debruça a autora para tecer suas argumentações, dialogando com a teoria e a realidade. Sustentada em consistentes bases teóricas e metodológicas que lhe deram suporte para a discussão das categorias centrais trabalhadas na pesquisa, o que lhe permitiu desvelar as armadilhas presentes em estudos dessa natureza e, sem descuidar da análise crítica, apontar como as questões de cidadania, direitos, educação e trabalho, preconizadas pelo Projovem, foram trabalhadas, bem como qual o movimento proporcionado à vida dos egressos desse programa, em São Luís.
Edinólia parte da compreensão de juventude como fenômeno social, permeado de valor simbólico, como condição histórica e categoria socialmente construída. Distingue juventude abstrata de juventudes reais, dialogando com uma vasta bibliografia e com as concepções de organismos internacionais. Situa ainda a problemática da juventude nas políticas públicas recentes do País e, criticamente, aponta seus limites e contradições em uma sociedade capitalista. Descreve e contextualiza bem a origem e a trajetória do programa, tomado em seu estudo como campo empírico, as estratégias traçadas pelos formuladores para atrair e manter o jovem na iniciativa. O livro reporta-se a um recorte geográfico – São Luís do Maranhão –, com as suas peculiaridades locais, tanto demográficas, sociais, econômicas, quanto políticas, culturais e institucionais. Destacamos, de início, os aspectos conceituais, tão bem demarcados em juventude e cidadania: categorias balizares, uma leitura imprescindível para quem pretende dedicar-se a esse campo de estudos. É daqui que o leitor pode melhor entender a dimensão ação comunitária analisada pela autora, ao refletir sobre juventude e rebeldia, os jovens na vanguarda dos movimentos políticos da história. Seria esse o engajamento esperado de uma política pública formatada pelo Estado? O que pretende o Estado com o comprometimento dos jovens com suas políticas: legitimá-las e cooptá-los ou abrir caminhos para o protagonismo juvenil, o empoderamento e a ampliação dos direitos?
Edinólia chama atenção para o fato de que esse segmento juvenil vulnerável possui características particulares, vive experiências dramáticas – de gênero, etnia, de orientação sexual –, além de se sentir pouco identificado com o sistema de representação política. O que seria um jovem cidadão idealizado pelo programa analisado? Para responder a essa questão, a autora estabelece um rico diálogo com diversos autores para compreender a cidadania subjacente no Projovem, aproveitando para questionar: não seria esse um caso de cidadania fragmentada?
Ao ouvir os egressos do programa e os jovens que se inscreveram e desistiram dessa oportunidade oferecida pelo Estado, sobre as repercussões no engajamento social, o livro revela que a ação comunitária mobilizadora da juventude reside no campo das manifestações culturais, sublinhando ainda que as falas dos jovens apontam para um contexto social que acaba por limitar um exercício pleno de cidadania.
Com esse direcionamento, o qual expressa também um posicionamento político, Edinólia consegue demonstrar que as políticas e programas que se propõem a resgatar a dívida histórica de exclusão a que está submetido esse segmento social, além de se apresentarem como reguladoras de processos sociais, pedagógicos e políticos, contraditoriamente se convertem em possibilidades, ainda que pontuais, de reconhecimento de subjetividades, que se expressam na autoconfiança que os jovens adquiriram no convívio familiar e nos novos contornos de engajamento em atividades comunitárias assumidas por eles, com certa autonomia, ao participarem de alguns grupos de manifestações culturais de cunho artístico e religioso, em São Luís, a exemplo do Bumba Meu Boi, da Festa do Divino Espírito Santo e de outras participações dessa natureza, além de envolvimento em grupos voltados para ações organizacionais, do tipo associações de moradores.
Reitera, desse modo, a visão crítica trabalhada ao longo do seu estudo, ou seja, na análise de uma política pública não se pode deixar de considerar os elementos conjunturais e estruturais, já que esses nos permitem captar as suas fragilidades e possibilidades, bem como contextualizá-la. É por meio dessa trilha que se descortina a pesquisa, objeto deste livro, o que nos situa em uma posição confortável, corroborando com o nosso propósito de convidar a todos os profissionais que trabalham com essa temática a fazer esta leitura.
Boa leitura.
Salvador, dezembro de 2016.
Prof. Dr. José Albertino Carvalho Lordêlo
Universidade Federal da Bahia
Prof.ª Dr.ª Lélia Cristina Silveira de Mores
Universidade Federal do Maranhão
Sumário
INTRODUÇÃO
1
PANORAMA AMPLIADO DO ESTUDO E A SUA RELAÇÃO COM OS DIFERENTES CAMPOS DISCIPLINARES
1.1 O Projovem como uma política de juventude
1.1.1 O contexto de implantação
1.1.2 Organização e expectativas
1.1.3 O Projovem em São Luís
2
JUVENTUDE E CIDADANIA: CATEGORIAS BALIZADORAS DO ESTUDO
2.1 Itinerário das discussões sobre o significado da juventude
2.1.2 Para além dos conceitos de juventude
2.1.3 Juventude na América Latina e no Brasil
2.2 Cidadania: resgatando concepções a partir dos fundamentos teóricos
2.2.1 A concepção de cidadania expressa no Projovem
3
O MOVIMENTO DO PROJOVEM E A JUVENTUDE LUDOVICENSE
3.1 São Luís e a juventude pesquisada
3.2 Juventude e engajamento social
3.2.1 Egressos engajados em manifestações culturais e grupos religiosos
3.2.2 Os não ingressantes do Projovem
À GUISA DE CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS
INTRODUÇÃO
Esta obra deriva de um estudo sistemático e continuado sobre o impacto e as ressonâncias do Projovem Urbano na vida dos seus egressos residentes em São Luís, Maranhão. Tratamos a avaliação na perspectiva compreensivista, a qual leva em conta as vozes dos sujeitos e defende a interação entre atores e contextos.
Consideramos essa iniciativa como parte de uma política específica para a juventude, que surge para responder às demandas e interesses da sociedade atual. No entanto, para chegar às vozes dos sujeitos beneficiários, buscamos depurar as intenções e o significado do programa, bem como as suas bases conceituais. Em observação ao público destinado, ao programa e às suas finalidades, abordamos o conceito de juventude e enunciamos a concepção de cidadania, compreendendo que as premissas do Projovem (PJ) se deslocam no sentido esperado.
Desse modo, a pesquisa se amplia para além dos resultados do programa, alcançando também a cidadania da juventude abordada, por meio do desenvolvimento da chamada Dimensão Ação Comunitária, um dos três suportes da iniciativa governamental.
A pesquisa se direcionou ao PJ desenvolvido em São Luís, no ano de 2006/2007, com fluxos de matrícula em 2005 e 2006. Essa investigação se justifica, em primeiro lugar, por sua integração integração ao grupo de pesquisa intitulado Escola, Currículo, Formação e Trabalho Docente
do Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), que tem como um dos seus objetivos fortalecer o campo da avaliação e as análises de políticas educativas similares ao PJ.
Além disso, abordamos ainda os objetivos do programa, as suas características inovadoras – e igualmente polêmicas – expressas, sobretudo, no cenário brasileiro por meio das diversas e variadas discussões que o apontam como um sistema paralelo ao escolar, com características fortemente verticais, declaradamente emergenciais e com uma burocracia específica (NASCIMENTO; ARAÚJO, 2009).
Destacamos, também, como parte das motivações para esse estudo, a compreensão de que as políticas socioeducativas raramente consideram os impactos e os resultados que esses programas têm no cotidiano dos participantes, o que confirma a relevância social desta pesquisa. Somada à expressão social, cabe ressaltar a importância operativa que se agrega à medida que são gerados novos conhecimentos (SALOMON, 1999), pois, embora sejam ações socioeducativas que trazem algumas concepções conhecidas, o programa se configura como uma novidade, no âmbito das políticas para a juventude, justamente por seu formato e arranjo¹. Dessa forma, o caminhar deste livro transcorreu a partir do firme desafio de avaliar o movimento provocado pelo Projovem na vida dos jovens egressos de São Luís, direcionando-nos tanto para os aspectos positivos quanto para outros junto aos seus beneficiários.
Este livro assume-se como uma abordagem qualitativa, complementada por dados quantitativos, chegando a se aproximar de uma análise comparativa, já que utilizamos também um grupo de jovens não ingressantes do programa como estratégia de cotejamento.
Para assegurar mais fidedignidade ao resultado do estudo, conforme aponta Draibe (2001), a pesquisa de campo foi realizada no ano de 2010, após três anos de conclusão do curso por parte dos jovens abordados, o que configura tempo considerado suficiente para observarmos as interferências diretas do programa sobre os favorecidos.
Para imprimir rigor ao estudo e extrair resultados fiéis de maneira eficiente, optamos pela combinação de duas técnicas: grupo focal², com a utilização de questões/temas, e aplicação de questionários. As duas técnicas são utilizadas também no grupo de compatibilização, esse empregado com fins comparativos em relação aos jovens egressos, com o objetivo de estimar os efeitos de outras políticas que costumam superestimar os dados obtidos junto aos avaliados (ARRETCHE, 2001; DRAIBE, 2001). O uso do questionário se justifica pela necessidade premente de estabelecer o perfil dos sujeitos em pesquisas dessa natureza; e os grupos focais se explicam porque o foco se dirige para a exposição e a análise das falas colhidas – a partir dessas falas, fazemos, então, as inferências, segundo a perspectiva de Minayo (1991), autora que defende a importância da visão dos sujeitos beneficiados acerca das políticas e dos programas sociais para fins avaliativos:
O respeito ao ponto de vista da população-alvo se dá, portanto, não como estratégia de dominação, mas para modificar os pontos de estrangulamento dos serviços a que ela tem direito e que deve reivindicar. É sobre esse objetivo que se define o conceito de política social: ela não é vista apenas como uma ação de estado em direção à população, mas como um direito para o qual ela deve opinar em termos de efetividade e qualidade (MINAYO, 1991, p. 236).
Além disso, as propostas teóricas desse modelo associadas à antropologia podem produzir estudos promissores, embora passíveis de contradição.
Este livro é conduzido segundo as impressões dos jovens pesquisados sobre seus engajamentos comunitários após suas passagens pelo PJ, embora no trabalho que o originou tratemos o programa em suas três dimensões³.
Na composição das ações comunitárias, consideramos atividades ligadas a manifestações culturais, esporte e lazer, à luz do referencial que explica que ao propormos
[...] uma abordagem qualitativa para avaliação de políticas e programas sociais a antropologia introduz de forma positiva o subjetivo na abordagem do social, oferecendo instrumentos para sua apreensão (DUARTE, et. al., 2009, p. 9).
O primeiro capítulo deste livro contempla o percurso metodológico e a escolha dos referenciais teóricos, empreendendo uma explanação das implicações e das aproximações com a temática, por meio da indicação da trilha a ser percorrida no processo do estudo e da apresentação de um panorama ampliado sobre a problemática em que se insere o ofício de avaliar, na visão eleita. Além disso, destacamos o objeto do estudo, configurado nesse contexto. Nessa seção, apontamos ainda o PJ como um dos elementos que compõem uma política mais ampla para juventude, expondo a conjuntura de