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No universo
Em algum lugar no passado, que eu não deveria chamar nem de lugar nem de
passado, porque não existia matéria, nem espaço e nem tempo, alguma falha
rompeu o eterno equilíbrio do “nada” em uma violenta explosão de trilhões de
graus Kelvin, criando espaço, tempo e toda matéria e energia que conhecemos
como “universo”.
De acordo com os modelos cosmológicos aceitos pela comunidade científica,
esta explosão da “singularidade” – momento antes da criação – que criou o
universo, ocorreu há cerca de 13,7 bilhões de anos e a conhecemos como “Big
Bang”.
Cosmologistas e astrônomos admitem que um tipo peculiar de energia existente
no vácuo do espaço, no nada, tenha se mobilizado e por um processo chamado
“inflação”, o universo se expandiu muito rapidamente nas primeiras frações de
um segundo, terminando esta expansão inflacionária quando esta energia
peculiar foi transformada em formas mais familiares de matéria e energia.
No seu primeiro segundo de existência, o universo era composto de partículas
fundamentais: quarks, elétrons, fótons e neutrinos e continuava se expandindo
com uma velocidade menor que a do momento inflacionário. Os prótons e
neutrons começaram a se formar nos segundos seguintes.
Nos próximos minutos, prótons e neutrons se juntaram para formar os núcleos
dos mais simples elementos: Hidrogênio, Hélio e Lítio. O universo permaneceu
por mais 500.000 anos, como uma enorme nuvem de gases em expansão e sua
temperatura já havia baixado a cerca de 10.000 oK. Nestas condições, elétrons
foram capazes de combinar com núcleos de H, He e Li. Fótons emitidos deste
período podem ainda ser detectados sob a forma de radiações cósmicas de
micro-ondas.
O universo continuava a se expandir e esfriar, até que a força de gravidade
começou a exercer sua influencia e ampliar irregularidades sutis na densidade
do gás primordial, fazendo aparecer bolsões de gás cada vez mais densos, até
que as primeiras estrelas tiveram seus pontos de ignição dentro destes bolsões
de gás. Grupos de estrelas tornaram-se as primeiras galáxias. Neste ponto, o
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universo tinha seu primeiro bilhão de anos e representava não mais que 7% do
seu tamanho atual.
Até o terceiro bilhão de anos, a temperatura do universo baixou para cerca de
10 oK. Galáxias menores fundiram-se em galáxias maiores de maneira tão
violenta, que estrelas e gases se contraíam em um centro comum de tão alta
densidade que formavam grandes “buracos negros” no centro destas galáxias
maiores. Gases fluindo para dentro destes buracos negros se tornavam tão
quentes que emitiam um brilho intenso antes de desaparecer. Os brilhos destes
“quasars” podem ser observados nas profundezas do universo.
Nos bilhões de anos seguintes o universo tornou-se muito frio e chegou a sua
temperatura atual de cerca de 3 oK. Dentro das galáxias, estrelas nasciam,
enquanto outras mais velhas terminavam de queimar suas reservas de
Hidrogênio, Hélio e Lítio em elementos mais pesados e morriam em explosões
cataclísmicas chamadas “Super Nova”, que distribuíam no espaço interestelar,
elementos resultantes da explosão, como Oxigênio, Carbono, Nitrogênio, Cálcio
e ferro. A explosão de estrelas de grande massa produzia, também, elementos
mais pesados como Ouro, Prata, Estanho e Urânio. Estes novos elementos
constituíram a matéria prima para as novas gerações de estrelas.
No sistema solar
A Via Láctea é apenas uma entre cerca de 200 bilhões de outras galáxias de
formas e tamanhos variados no universo e possui pelo menos 100 bilhões de
estrelas de mesma grandeza, menores e maiores que o nosso sol. Uma parte
destas estrelas parece ter planetas em sua órbita, que podem ou não reunir
condições para a existência de vida primitiva ou inteligente.
Para que tenhamos uma idéia do tamanho da Via Láctea, uma viagem da terra
até o sol à velocidade da luz (300.000 km/seg) duraria 8 minutos. Até “Próxima
Centauro” que, depois do sol, é a estrela mais próxima da terra, a viagem
duraria 4,2 anos, enquanto uma viagem em direção ao centro da galáxia à
velocidade da luz, duraria 24.000 anos.
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A terra se formou, em sua maior parte, de elementos pesados incluindo os
elementos básicos para a vida, carbono e oxigênio, produzidos dentro destes
reatores de fusão nuclear chamados estrelas.
Existem evidencias da existência de vida primitiva na terra a cerca de 3,5
bilhões de anos atrás, quando o universo tinha 10 bilhões de anos. Neste
período, a terra já tinha se resfriado e se estabilizado o suficiente para
suportar o início da vida. Mas que tipo de vida?
A terra primitiva era um lugar com inúmeras erupções vulcânicas, chuvas
torrenciais, pouco oxigênio livre e sem a camada protetora de ozônio para
absorver a radiação ultravioleta do sol. Moléculas orgânicas simples foram
produzidas nestas condições.
Em experimentos laboratoriais, não se pode criar todas as características
ambientais da terra em seus primórdios, mas se misturas de gases como
metano (CH4), gás carbônico (CO2), amônia (NH3) e hidrogênio (H) são
aquecidas com água e energizadas com descargas elétricas ou radiação ultra-
violeta, estes gases reagem e formam pequenas moléculas orgânicas. O mais
interessante é que são geradas, entre outras, as quatro classes de pequenas
moléculas orgânicas encontradas em células: aminoácidos, nucleotídeos,
açúcares e ácidos graxos.
As moléculas de aminoácidos e nucleotídeos apresentam a capacidade de se
associarem em polímeros maiores, ou seja, aminoácidos se ligam e formam
polipeptídios que representam a estrutura básica das proteínas. Nucleotídeos
se ligam e formam polinucleotídeos que representam a estrutura básica dos
ácidos ribonucléico (ARN) e desoxirribonucléico (ADN), moléculas capazes de
dirigir sua própria síntese e auto-replicar.
Estes experimentos sugerem que a vida pode ter sido gerada espontaneamente,
quando a terra apresentava as condições necessárias. A primeira molécula
auto-replicável deve ter sido o ARN que, além de ser mais simples que o ADN,
pode construir uma molécula de ADN.
O processo de evolução biológica foi muito lento no início da vida e precisou de
2,5 bilhões de anos para evoluir das primeiras células aos vegetais e animais
pluricelulares. Pelo menos mais um bilhão de anos se passou para que os peixes
e répteis evoluíssem até os mamíferos. A evolução dos primeiros mamíferos até
nós foi como uma afinação de tudo que a natureza tinha construído até então e
gastou cerca de 100 milhões de anos.
No atual estágio de desenvolvimento das espécies ou “filogenia”, chegamos a
um ponto, que nos últimos 10 mil anos de história registrada, não se percebe
diferenças importantes no processo de evolução filogenética. Este é um
processo lento que depende de mutações genéticas adaptativas ao ambiente,
que são transmitidas aos descendentes como uma herança genética. As
mutações na estrutura dos genes ou de regiões dos cromossomos ocorrem ao
acaso e de acordo com agentes mutagênicos no ambiente. Podem ser neutras,
quando não causam alterações na estrutura das proteínas produzidas pelos
genes e apenas criam diversidade, ou não-neutras quando alteram a estrutura
das proteínas produzidas.
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As mutações não-neutras podem criar genes mutantes que produzem proteínas
iguais, piores ou melhores, em termos de função e eficiência, que aquelas
produzidas pelos genes originais. Se uma proteína produzida é menos adaptada
para sua função, dizemos que a mutação genética que a produziu foi deletéria
e, normalmente, é eliminada antes de ser disseminada. Se, ao contrário, a
proteína produzida é mais eficiente, dizemos que a mutação foi benéfica, o
que ocorre de maneira extremamente rara. As mutações genéticas, em sua
maioria, não são benéficas nem deletérias e, apenas criam diversidade. A
diversidade de proteínas é importante porque proteínas novas, ainda que não
necessárias no momento de origem, podem assumir alguma função no futuro,
como uma forma de adaptação do organismo ao ambiente em modificação.
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A ordem da linguagem é tão estruturante quanto a ditadura genética. Um gene
mutante deletério carrega uma informação genética que pode produzir uma
anomalia ou uma doença no organismo. Símbolos de linguagem internalizados
de forma inadequada podem gerar distúrbios de comportamento.
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humanidade ampliou-se de maneira exponencial sobre todos os objetos de
ciência. O homem, através da ciência, vem criando um mundo novo cada vez
mais tecnológico e confortável, mas que ao mesmo tempo, se torna cada vez
mais artificial, mais complexo e mais difícil de ser compreendido pelos
homens.
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É bem verdade que o desenvolvimento tecnológico tem propiciado ao homem
uma vida útil cada vez mais longa, mas sua angustia permanece como
estruturante imutável da sua identidade.
Uma vez, um amigo ao ser interrogado pelo filho de sete anos sobre para onde
irá depois que morrer, respondeu que ele irá para o mesmo lugar que estava
em 1940. O filho achou estranho e disse que neste ano ainda não tinha nascido
e, portanto, não estava em lugar algum. Pois é lá mesmo, respondeu o pai.
O lugar nenhum de todos nós precisa ser ocupado com alguma estrutura que
harmonize vida e morte em um viver sem medos. Esta estrutura tem forma de
linguagem e é forjada sob medida em cada indivíduo como constituinte de sua
personalidade. Nela estão as certezas que construímos baseadas na fé ou no
conhecimento e que de alguma maneira atenuam os nossos medos, além das
fantasias psicológicas que criamos contra as possibilidades de perdas.
A fé aparece como um conjunto de idéias aceitas, de maneira dogmática, como
uma crença na possibilidade de que um ser divino, que sabe de tudo que não
sabemos, ao final, irá nos resgatar desta vida terrena. Aqui a transcendência
sobre a morte aparece como uma certeza dogmática, que alivia a angustia
existencial daqueles que crêem. As diversas crenças religiosas elaboram
construtos coerentes de linguagem que são apresentados aos seus seguidores
como verdades absolutas e imutáveis, mas com a condição de que aceitem o
dogma de fé sobre o qual a religião se fundamenta. Se o dogma não for aceito
como uma premissa válida, tudo o que se construir sobre ele é falso.
O pensamento científico, não apenas contemplativo, mas produtivo, representa
o ápice do pensamento filosófico e, ao mesmo tempo, se distingue dele. O
projeto da ciência é conhecer, modificar a realidade e criar realidades novas,
numa superação dialética do homem pelo homem novo de cada dia.
A evolução do pensamento científico e, consequente acúmulo de conhecimento
científico contribuiu, não apenas para um aumento exponencial, mas para o
aprimoramento do patrimônio sócio-cultural histórico da humanidade que é
como o inconsciente da humanidade e estruturante de pessoas,
potencialmente, cada vez mais qualificadas para viver num mundo em
constante processo de mudança.
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espécie de imagem acústica das palavras. Ao longo da vida, vamos formando
um acervo próprio de palavras significantes de coisas ou idéias e que vai
forjando nossa identidade no mundo, nossa personalidade. Somos o que
pensamos e o que falamos, o que significa que não somos humanos fora da
linguagem. Quando compartilhamos com outros o que pensamos e o que
falamos, compartilhamos o que somos e determinamos nosso lugar no mundo.
A maneira como cada homem se inscreve na ordem da linguagem define sua
personalidade e o modo como se relaciona em sociedade e, depende de fatores
extrínsecos: históricos, culturais, sociais, econômicos e intrínsecos: físicos e
psicológicos.
Os fatores extrínsecos nos permitem entender porque o fenômeno humano é
diferente em cada momento histórico, em cada contexto cultural e tem
diferentes possibilidades, de acordo com seu lugar sócio-econômico. Os fatores
intrínsecos se referem a saúde física e a coerência psicológica que habilitam o
homem a se inscrever na ordem da linguagem e se diferenciar como uma
personalidade.
Um homem pode, por exemplo, estruturar uma personalidade psicótica por
apresentar deficiências fisiológicas. Como nossos comportamentos são
controlados, fisiologicamente, por hormônios, certos distúrbios hormonais são
estruturantes de comportamentos psicóticos.
Um surdo-mudo de nascença, que não foi diagnosticado, não estará habilitado
para a aquisição da linguagem e será percebido por outros como psicótico.
A coerência psicológica pode sofrer uma ruptura quando fazemos associações
de símbolos linguísticos a significados diferentes, por vezes opostos, aos
originais. Psicopatas estruturam sua personalidade internalizando valores
opostos àqueles aceitos socialmente, como um distúrbio de linguagem. Talvez,
seja melhor nos referirmos aos psicopatas como sociopatas.
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Seres do Desejo
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formal ou informal e que, portanto são analfabetos e se comunicam pela
linguagem falada, mas não pela escrita. Vivem, principalmente em sociedades
rurais, onde conseguem sobreviver com atividades de subsistência e à margem
de sociedades urbanas, já que não conseguem competir no mercado de
trabalho.
A consciência que chamou de “transitiva”, daqueles sujeitos que tiveram
acesso a algum tipo de educação formal ou informal, pode ser “ingênua” ou
“crítica”. A “transitividade ingênua” se refere a percepção da realidade pelos
indivíduos alfabetizados e que ganharam acesso à linguagem escrita, mas de
uma maneira ingênua. Estes indivíduos, através da linguagem falada e escrita,
recebem as mais variadas informações sobre a realidade, mas não conseguem
elaborá-las e julgá-las. As informações são, literalmente, engolidas inteiras e
sem discernimento, levando estes indivíduos a se comportarem de maneira
massificada e cristalizada. São como zumbis que morreram de “parada
histórica”, mas que seguem vivos como massas de manobras.
A “transitividade crítica” se refere a uma percepção mais sofisticada de
realidade, onde os sujeitos são capazes de filtrar as informações, fazendo-as
passar por um crivo de discernimento que é sua própria estrutura de
personalidade naquele momento histórico. A consciência crítica permite ao
indivíduo forjar, de maneira coerente, uma personalidade histórica que amplia
e melhora, na medida que este indivíduo toma consciência dos seus limites e
atua para superá-los.
Os homens críticos são senhores das suas próprias histórias de vida e modificam
a história da humanidade, fazendo-a se deslocar para além dos seus limites,
enquanto os homens ingênuos participam da história com movimentos
repetitivos, por vezes intensos, mas que não produzem deslocamentos.
A solidão conquistada
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perdeu a capacidade de frequentar outros níveis e de falar “gol do flamengo”,
mas um indivíduo no nível “gol do flamengo” não pode dizer que E= mc2.
O acúmulo de conhecimento
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números e outros símbolos de linguagem, como realidade teórica, antes da sua
concretude.
Existe uma grande diversidade de objetos científicos, cada vez mais pontuais e
métodos mais especializados, mas nem tudo pode ser objeto de ciência. Todo o
rigor da metodologia científica tem que ser aplicável ao objeto de
investigação, caso contrário, este objeto não pode ser estudado
cientificamente. Opiniões e crenças não são objetos de ciência, embora
frequentemente sejam apresentados como tal, para se beneficiarem do status
de verdades universais. Estudar os mecanismos de formação dos mitos e
crenças é antropologia e é científico, mas tratar os próprios mitos e crenças
cientificamente é cientificismo. É como “matar a cobra e mostrar o pau”, ao
invés de mostrar a cobra morta.
Alguns objetos de ciência são, realmente, mais difíceis de serem estabelecidos
e tratados com o rigor metodológico, por exigirem um maior nível de abstração
dos sujeitos pensantes. A ciência inaugurada por Freud – psicanálise -, por
exemplo, tem como objeto o “inconsciente” que só ganhou contornos mais
concretos com o advento de uma nova ciência, a linguística, que apresenta o
“inconsciente” estruturado como linguagem e os efeitos de se humanizar como
efeitos da aquisição da linguagem. De qualquer maneira, num retorno à Freud,
veremos que a psicanálise já apresentava todos os requisitos de ciência, ou
seja, baseava-se numa prática (cura analítica), numa técnica (método de cura)
e numa teoria fundamentando a prática e a técnica. O modelo teórico evoluiu e
tem se tornado cada vez mais consistente, como é o processo de qualquer
ciência.
Crença e Ciência
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subjetivismos no trato com o objeto científico. Por exemplo, acreditar ou não
em átomos, células, genes, etc., não altera o status destas verdades
científicas, que não são objetos de crença.
Crer parece um ato de defesa e as crenças são como suturas que suportam as
certezas que aliviam as angústias pessoais. Contra o medo da morte, a crença
num pós-morte em lugares metafísicos; contra a imperfeição humana, a crença
em deuses perfeitos, onipotentes, oniscientes e onipresentes.
Os métodos científicos aplicados constituem ferramentas de trabalho para
profissionais com formação acadêmica em áreas específicas, embora isto não os
torne cientistas. Pensar cientificamente é diferente de aplicar métodos
científicos, além de ser a condição para que verdades sejam superadas em
modelos científicos que se desenvolvem com a pesquisa continuada. Os
profissionais de ciência, em sua grande maioria, aprendem a usar modelos
científicos já validados, através de técnicas aplicadas aos objetos destes
modelos, para se atingir o objetivo social de cada profissão científica.
É comum entre estes profissionais, a crença em divindades que não cabem no
campo científico, mas que ocupam um lugar absoluto no pensamento destes
pretensos cientistas e exercem um poder enorme de interferência tendenciosa
na abordagem do objeto científico.
Um cientista que crê não é nem cientista, nem crente, porque não se pode
operar com duas formas tão desarmônicas de pensamento ao mesmo tempo.
Expurgar as marcas dos mitos e crenças da personalidade de um indivíduo que
ingressa no projeto científico de mundo, não é possível, mas negá-las faz parte
da própria razão dialética que norteia o pensamento científico.
No entanto, negar é, ao mesmo tempo, dar estatuto de existência a coisa
negada, já que negar uma coisa que não existe é uma dupla e vazia negação.
Neste sentido, para a pergunta - deus existe? – e não importa qual, a resposta é
sim e esta é a razão da negação. Existe porque assim foi nomeada uma idéia
compartilhada e, nomear é dar estatuto de existência. Mas se deus existe
porque assim foi nomeado, então deus é uma criação humana, não o contrário
e esta é a negação do dogma. Como criação humana, deus deixa de ser
absoluto e passa a ser relativo a uma fé, a uma religião, a um povo e mesmo a
um indivíduo. A configuração individual de deus é tão própria quanto a própria
personalidade. O deus de um certo jogador de futebol é terráqueo, brasileiro,
carioca, do flamengo e o ajudou a fazer o gol que definiu o campeonato.
A teogênese
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realidades que não podem ser apreendidas por completo, mas que são
imprescindíveis à vida. O sol, a lua, o mar, o vento, o trovão, etc., são seus
deuses concretos e que interagem com os humanos.
Nas culturas mais sofisticadas, em relação ao grau de desenvolvimento
econômico, intelectual e tecnológico, os deuses são próprios e únicos e ocupam
lacunas mais abstratas no pensamento humano, preenchendo-as com idéias que
suturam as falhas do conhecimento, que ameaçam a integridade estrutural de
uma cultura e da personalidade dos seus membros. A integridade tem que ser
mantida a qualquer custo, mesmo com estruturas provisórias, sob pena da
perda de identidade, se o tecido de linguagem que estrutura uma cultura
apresenta pontos vazios, ou seja, pontos não nomeados.
O homem normal
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Infelizmente, fraudadores apresentam alto índice de sucesso em seus
objetivos.
A loucura, por vezes, é a forma extrema de negação da síndrome de
normalidade, geradora de sofrimento ao homem normal, que não consegue
criticar as normas e, tampouco, fraudá-las. A sanidade e a loucura estão, na
verdade, mais próximas do que parecem estar, não sendo uma o oposto da
outra, mas duas formas distintas de se distinguir da normalidade parada.
Memória e memórias
Por um raciocínio silogístico, mas que neste caso penso que se aplica, se os
humanos são fenômenos de linguagem e as memórias são linguagem, então os
humanos são, também, memórias. Eu sou minhas memórias em um banco de
dados com enorme capacidade de armazenamento e que se atualiza
continuadamente, mas este banco de dados é biológico e morre. Aqui está a
ruptura entre as memórias que podem ser eternas e acumulativas e a memória
que é finita e degenerativa. Como superar esta contradição? Será possível criar
um suporte, se não eterno, pelo menos durável, para as memórias?
O homem, talvez em função da sua angustia existencial, do medo de morte que
estrutura sua vida, tem investido muito mais na melhoria da sua estrutura
biológica, como um aprimoramento e refinamento da filogênese. A busca de
um corpo melhor e mais durável não tem, apenas, o propósito de
aperfeiçoamento do suporte de memórias, mas da fonte dos sentidos e do
prazer imediato, numa espécie de culto ao corpo, onde as experiências
sensoriais se tornam fins e não meios.
A tecnologia tem se desenvolvido de maneira exponencial, como o próprio
fenômeno humano, numa corrida contra o tempo. Quem sabe num futuro, o
homem possa migrar com suas memórias para um corpo meio máquina, porque
não sensual, capaz de se aventurar em longas viagens interplanetárias, na
busca de um lugar para continuidade da humanidade e contrariar o inevitável
recomeço após cada inevitável extinção em massa. É verdade que são causas
em longo prazo e que existem milhares de outras causas imediatas a serem
trabalhadas, mas o imediato e o longo prazo dependem de um foco
estabelecido sobre o que se pretende como resultado. Neste caso, preservar o
animal humano ou a humanidade define o imediato e o longo prazo.
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