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PODER JUDICIÁRIO

JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA


SEÇÃO JUDICIÁRIA DA PARAÍBA
2ª VARA FEDERAL

Processo: 2000.82.00.001848-8
Natureza: Ação penal pública
Autor: MPF
Réus: Maurício Timótheo de Souza e Marconi Timótheo de Souza

S E N T E N Ç A1

DIREITO PENAL. EQUIPARAÇÃO A FUNCIONÁRIO


PÚBLICO PARA EFEITOS PENAIS (CP, art. 327, §1º). O
enquadramento dos diretores de entidades paraestatais
como funcionários públicos para efeitos penais não sofreu
alteração pela Lei n. 9983/2000, que tão somente
acrescentou ao §1º do art. 327 do CP sua parte final.

DIREITO PENAL. PECULATO (CP, art. 312, caput).


Comprovada a apropriação de valores transferidos a
entidade paraestatal por meio de convênio por pessoas
no exercício de cargo de direção. Configuração da
continuidade delitiva (CP, art. 71). Dada a ausência do
vínculo subjetivo, não se configurou o concurso de
agentes (CP, art. 29).

DIREITO PENAL. SUBSTITUIÇÃO (CP, art. 44). Uma vez


que a pena resultante da aplicação de causa de
exasperação pelo concurso de crimes (CP, art. 71)
ultrapassou o limite previsto no art. 44, I, do CP, não cabe
a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva
de direitos.

RELATÓRIO

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL denunciou Maurício Timótheo


de Souza, Marconi Timótheo de Souza e Niedja Necy Palitot Souza, já
devidamente qualificados, dando-os como incursos no art. 312, caput, c/c os
arts. 29, 69 e 71, todos do Código Penal brasileiro.

1 Sentença tipo D, cf. Res. CJF n. 535/2006.


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Consta da denúncia (f. 04-16) que os denunciados Maurício


Timótheo de Souza e Marconi Timótheo de Souza eram respectivamente
provedor do Complexo Santa Casa de Misericórdia e diretor executivo do
Instituto Santa Emília de Rodat, os quais detinham amplos poderes sobre o
patrimônio do Complexo e não prestavam contas dos recursos recebidos no
decorrer de sua administração.

Dentre outros aspectos que teriam facilitado a “apropriação desses


recursos pelos acusados”, cita o MPF a ausência de controle das atividades
contábeis da Santa Casa, o desaparecimento de documentos do Instituto Santa
Emília de Rodat, a ausência de registro da entrada e saída de bens do
patrimônio móvel do Complexo, a não comprovação de despesas com
pagamento de pessoal e com a execução do objeto dos convênios firmados.

O MPF denunciou Maurício Timótheo de Souza e Marconi Timótheo


de Souza em razão de se haverem apropriado de recursos do Complexo Santa
Casa de Misericórdia, bem como Niedja Necy Palitot Souza, alegando que,
como esposa do segundo denunciado, teria auferido vantagem com as práticas
ilícitas de seu esposo.

Diz o MPF que foi firmado o Convênio n. 025/96 entre a Escola


Santa Emília de Rodat e a Secretaria do Trabalho e Ação Social (SETRAS) em
função de que foram realizados dois contratos (23/96 e 04/97) e um aditivo
(01/97). Em todos eles teriam ocorrido irregularidades que permitiram aos réus
apropriarem-se do dinheiro. Afirma que a Sra. Maria da Glória Uchoa dos
Santos (diretora técnica da Escola) teria recebido as verbas da SETRAS,
limitando-se a repassá-las ao acusado Marconi Timótheo de Souza (diretor
executivo do Instituto Santa Emília de Rodat), o qual se teria delas apropriado
juntamente com os demais acusados. Acrescenta que Marconi teria
providenciado o desaparecimento da documentação contábil do Instituto com o
fim de encobrir as irregularidades que lhe teriam permitido apropriar-se dos
recursos.

Sobre esse desaparecimento de documentos, diz o MP que Expedito


Nóbrega Dinis (ex-caixa da Escola) teria declarado que entregou a Marconi
pessoalmente toda a documentação contábil do Instituto Santa Emília de Rodat
para exame e posterior encaminhamento ao Departamento de Contabilidade
mas, passados alguns dias, constatou que os documentos não chegaram ao
destino. Jader Carlos Coelho da Franca afirmou ter tomado conhecimento
através de funcionários da Santa Casa que toda a referida documentação fora
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retirada numa caminhonete durante à noite por Marconi, um dia antes da posse
da Junta Interventora. Joaquim Paiva Martins também declarou ter ouvido
comentários sobre o desaparecimento dos documentos e que Marconi teria
sido o responsável.

Sobre o contrato n. 23/96, disse o MPF que os cheques a ele


correspondentes (somando R$ 177.408,00) foram emitidos pelo Banco do
Estado da Paraíba em favor da Escola Santa Emília de Rodat, sendo contudo
endossados por Maurício e Marconi e, em vez de depositados na conta da
Escola, ingressaram nos cofres do Instituto Santa Emília de Rodat. Isso
impossibilitou a constatação pelos auditores sobre a realização do objeto
contratual, pois a documentação do referido Instituto teria sido levada por
Marconi. Conclui dizendo que “esse fato, somado às demais constatações
narradas na presente denúncia, representa indício suficiente de apropriação
dessas verbas por MARCONI e seu irmão MAURÍCIO”.

Quanto ao contrato n. 04/97, disse o MPF que os cheques a ele


referentes (total de R$ 220.800,00) também foram emitidos pelo Banco do
Estado da Paraíba em favor da Escola Santa Emília de Rodat, sendo
endossados por Marconi e simplesmente depositados na conta n. 8.700.674-1,
titularizada por ele e sua esposa Niedja Necy Palitot Souza, o que tornaria
explícita a apropriação dos recursos pelos acusados. Salienta que não há
quaisquer documentos que pudessem indicar que o dinheiro fora aplicado no
objeto do convênio.

O termo aditivo n. 01/97 elevou o valor do contrato n. 04/97 de R$


220.800,00 para R$ 275.880,00, sendo que o cheque correspondente a esse
aumento, da mesma forma emitido pelo Banco do Estado em favor da Escola,
foi endossado por Marconi e pela servidora Maria da Glória Uchôa, sendo
depositado na conta do Instituto Santa Emília de Rodat, ficando comprometido
o exame da aplicação desse dinheiro por causa do desaparecimento dos
documentos do Instituto.

A denúncia ainda noticia a existência de documentos que indicariam


transferências financeiras da Escola para o Instituto Santa Emília de Rodat,
sendo que o dinheiro jamais teria ingressado nas contas do Instituto, nem
tampouco haveria provas de que teriam sido aplicados em favor do Complexo.
Tais recursos, segundo o MPF, teriam sido apropriados pelo acusado Marconi.
Além disso, outras transferências “suspeitas” teriam ocorrido entre a tesouraria
da Santa Casa e a Provedoria, tendo sido os valores recebidos pela secretária

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do acusado Maurício, não havendo documentos que comprovem as despesas


que teriam sido pagas com tais recursos.

Diz ainda o MPF que entre fevereiro e dezembro de 1997 o acusado


Maurício efetuou saques na conta da Escola Santa Emília de Rodat no valor
total de R$ 56.980,00, não comprovando em que tais valores teriam sido
utilizados, motivo pelo qual seria de se inferir que foram utilizados em seu
proveito próprio. O ex-caixa da Escola, Expedito Nóbrega Diniz, teria afirmado
que aqueles valores sacados por Maurício “não ingressaram no caixa da
Escola nem foram comprovados através de documentos de despesas”.

Prossegue dizendo que Marconi, entre agosto e dezembro de 1997,


autorizou a emissão de 16 (dezesseis) vales no valor total de R$ 17.000,00 em
favor de José Augusto de Souza Peres, sem justificativa perante a tesouraria
da Escola sobre a finalidade dessas emissões. Contudo, prestando
depoimento, o próprio José Augusto de Souza Peres afirmou ter sido
contratado para a realização de estudos para a implantação da Escola
Politécnica de Saúde, recebendo pelo serviço um valor efetivo de R$ 15.000,00
embora haja firmado recibos, por orientação de Marconi, no valor de R$
29.339,07. Nesse depoimento, José Augusto afirmou que o referido acusado foi
à sua casa e lhe solicitou endossar os cheques emitidos para pagamento de
seus serviços, levando o acusado consigo, após os endossos, metade dos
cheques endossados.

Quanto ao acusado Maurício, diz o MPF que, em agosto de 1997,


ele autorizou a emissão de um vale em favor de Aluízio Nunes de Lucena no
valor de R$ 2.069,28, também retirado do caixa da Escola, sem justificativa de
emissão e saque. A emissão teve como garantia dada pelo Sr. Aluízio um
cheque de R$ 7.000,00, emitido pela empresa Transportes e Representações J
B Ltda. (João Coutinho), cheque que Marconi depositou na conta de sua
esposa Niedja, com o objetivo de se apropriarem da quantia, fato que não
ocorreu por conta da ausência de provisão de fundos do cheque.

Prossegue o MPF dizendo que entre 1996 e 1998 vários cheques


foram emitidos pelo Instituto Santa Emilia de Rodat e depositados na conta n.
8.700.674-1, titularizada conjuntamente por Niedja e Marconi, permitindo-lhes a
apropriação de R$ 27.882,97. Outros cheques, importando no valor de R$
310.575,41, não tiveram sua aplicação comprovada por documentação idônea,
uma vez que os documentos teriam sido levados por Marconi para encobrir os
fatos.

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Por fim, registra o MPF que os acusados Maurício e Marconi seriam


equiparados a funcionários públicos por força do art. 327, §1º, do CP, vez que
a Santa Casa de Misericórdia se enquadraria no conceito de entidade
paraestatal. Além disso, recebia recursos do SUS. Em razão disso, a conduta
por ambos praticada teria sido de peculato, nos termos do art. 312, caput, c/c
os arts. 29, 69 e 71, todos do CP. Niedja responderia nos mesmos moldes por
ter auferido benefícios indevidos com a prática dos delitos, tendo plena
consciência dos fatos.

Denúncia recebida em 12/03/2007 (f. 27-34). Na mesma decisão,


autorizei a quebra do sigilo fiscal dos denunciados, determinando à DRF
fornecer declarações de bens dos denunciados relativas aos anos de 1994 a
1999.

Providência cumprida pela DRF com remessa das declarações


referentes ao período 1995/1999, informando-se que as declarações de 1994 já
teriam sido incineradas (f. 44-91).

Determinei a quebra do sigilo bancário das contas titularizadas pelos


réus no período de 1996 a 1998 (f. 117-8).

Os réus foram devidamente citados (f. 133).

Cumprimento de diligência pelo Banco do Brasil (f. 134-52 e 156-


206).

Cumprimento de diligência pelo Banco Real ABN AMRO (f. 208-


524).

Cumprimento de diligência pelo Banco Central do Brasil (f. 526-547).

Deferida a habilitação dos advogados dos acusados Marconi e


Niedja (f. 550-3), ficando assegurada vista dos autos em cartório.

Informada nos autos a impetração de habeas corpus (HC n. 2946-


PB) junto ao TRF da 5ª Região pela defesa dos acusados Marconi e Niedja,
bem como o indeferimento do pedido liminar para suspensão da ação penal (f.
557-68).

Realizada audiência de interrogatório de todos os denunciados em


26/09/2007 (f. 569-82). No termo de audiência a defesa dos acusados Marconi
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e Niedja pugnou pela aplicação do procedimento previsto no art. 514 do CPP


(defesa preliminar), o que foi indeferido pelo juízo (f. 569-70).

Apresentaram defesa prévia Maurício Timótheo de Souza (f. 595-7),


Marconi Timótheo de Souza (f. 598-601) e Niedja Necy Palitot Sousa (f. 602-5).

Informação oriunda do E. TRF da 5ª Região, Quarta Turma, sobre a


concessão parcial da ordem de habeas corpus para excluir do polo passivo da
demanda a denunciada Niedja Necy Palitot Sousa (f. 611-5), dando-se imediato
cumprimento (f. 617).

Informação sobre nova impetração de habeas corpus perante do E.


TRF da 5ª Região pela defesa do acusado Marconi Timótheo de Souza (HC n.
3116-PB), dando conta do indeferimento do pedido de liminar (f. 632-46 e 661-
75).

Oitiva das testemunhas Maria da Glória Uchoa dos Santos (f. 688-
92), Joaquim Paiva Martins (f. 693-4), José Augusto de Souza Peres (f. 697-
700), Hernan Pinto Rodriguez (f. 701-4) e Jáder Carlos Coelho da Franca (f.
728-9). A requerimento do MPF, foi dispensada a oitiva de Expedito Nóbrega
Diniz (f. 730).

Informação oriunda do E. TRF 5ª Região, Quarta Turma, acerca do


arquivamento dos HCs n. 3116-PB e n.2946-PB (f. 737-8).

Oitiva das testemunhas Ricardo José Alves (f. 750-1), Gerson da


Silva Ribeiro (f. 752-3), Haroldo de Figueiredo Diniz (f. 754-5) e Ziclomar
Rodrigues Cartaxo (f. 756-7). Sobre as testemunhas ausentes (Gilson
Cavalcanti de Melo e João Bosco Lins Guimarães), as partes prescindiram de
seus depoimentos (f. 758).

Em diligências:

1) O MPF requereu (a) que fosse oficiado ao TRT 13ª Região,


solicitando-lhe informar se existiam reclamações trabalhistas contra a Santa
Casa na época dos fatos e se houve determinação de bloqueio de contas
bancárias da “referida Associação beneficente”, bem como (b) a renovação de
certidões de antecedentes e feitos criminais distribuídos contra os acusados (f.
761). As diligências foram devidamente deferidas (f. 762).

2) Intimados os réus, deixaram transcorrer “in albis” o prazo (f. 778).


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O MPF insistiu na diligência ao TRT 13ª Região (f. 789v.).

Informações enviadas pelo TRT 13ª Região (f. 787-851).

Em alegações finais:

1) O MPF (f. 855-65) sustentou haver sido comprovada a tese


apresentada com a denúncia, pugnando assim pela procedência do pedido e
pela condenação dos acusados Maurício Timótheo de Souza e Marconi
Timótheo de Souza.

2) Maurício Timótheo de Souza (f. 870-81) alegou: (a) a necessidade


de desclassificação da imputação pelo crime de peculato, (b) a nulidade do
processo por não aplicação do rito do art. 514 do CPP, (c) a não ocorrência de
apropriação de quaisquer valores da Santa Casa de Misericórdia, motivo pelo
qual pugna pela improcedência do pedido.

3) Marconi Timótheo de Souza (f. 883-9) alegou: (a) a incompetência


da justiça federal para a presente demanda, (b) a ausência de tipicidade do
fato, ensejando a absolvição por ausência de provas, (c) a não aplicação do
parágrafo único do art. 327 do CP a fatos anteriores a sua entrada em vigor e
(d) a ocorrência da prescrição da pretensão punitiva. Ao final, pugnou pela
improcedência do pedido.

Autos conclusos para sentença.

É o breve relato.

DECIDO.

FUNDAMENTAÇÃO

Passo imediatamente ao exame das preliminares e prejudiciais.

1) Nulidade processual por não aplicação do art. 514 do CPP

A questão já foi abordada no curso do processo e volta a ser


suscitada. Alega-se a ocorrência de nulidade processual pela não concessão
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aos réus da prerrogativa de apresentarem resposta preliminar aos termos da


inicial em momento anterior ao do recebimento da denúncia. Tal seria o
procedimento previsto para os crimes de funcionários públicos apenados com
detenção.

Conforme já salientado alhures, a resposta preliminar a que se


refere o art. 514 do CPP é dispensável nos casos em que a denúncia é
devidamente instruída com os autos de inquérito policial – exatamente como no
presente caso – não havendo assim qualquer nulidade a ser suscitada.

Apenas para exemplificar, eis a seguinte decisão do E. STJ:

RECURSO ESPECIAL. DIREITO PENAL. MATÉRIAS NÃO


ANALISADAS NO ACÓRDÃO A QUO. FALTA DE
PREQUESTIONAMENTO. VIOLAÇÃO AO ART. 514 DO CPP.
FALTA DE DEFESA PRÉVIA. DENÚNCIA FUNDADA EM
INQUÉRITO POLICIAL.
CONSTRANGIMENTO ILEGAL. INEXISTÊNCIA. AGRAVO A QUE
SE NEGA PROVIMENTO.
1. Quanto aos 1º, 33, § 2º, "c", e § 3º, 44, I e 64, I, todos do CP, não
há prequestionamento. Do exame dos autos, constata-se, sem
maiores esforços, que a matéria agitada no presente recurso especial
não foi objeto de um questionamento prévio da instância ordinária.
2. Por outro lado, quanto à ofensa ao já mencionado art. 514 do CPP,
é dispensado o cumprimento da formalidade referente à notificação
prévia do acusado para que ofereça resposta por escrito quando a
denúncia se encontra devidamente respaldada em inquérito policial.
Assim, a obrigatoriedade da notificação do acusado – funcionário
público –, para a apresentação de resposta formal fica restrita aos
casos em que a denúncia apresentada estiver baseada, tão-somente,
em documentos acostados à representação. Precedentes.
3. Tal entendimento, inclusive, foi consolidado no verbete 330 da
Súmula desta Corte, aprovado pela Terceira Seção, conforme se
depreende da notícia publicada na página eletrônica deste Superior
Tribunal de Justiça.
4. Agravos a que se nega provimento.
(AgRg no Ag 703.123/RJ, Rel. Ministra JANE SILVA
(DESEMBARGADORA CONVOCADA DO TJ/MG), SEXTA TURMA,
julgado em 28/08/2008, DJe 15/09/2008) (grifado).

Por esses motivos, indefiro a preliminar.


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2) Incompetência da justiça federal

Alega-se que a demanda não trataria de interesse pertinente a


quaisquer entes públicos federais que conduzissem à justiça federal a
competência para processo e julgamento do caso em questão. Em arrimo a
essa tese, salienta-se o reconhecimento da competência da justiça estadual
para julgar prefeito acusado de desvio de verbas federais incorporadas pelo
município por força de convênio.

O presente caso, contudo, é diferente do paradigma jurisprudencial


trazido nas alegações finais. Aqui se cuida da efetivação do serviço de saúde e
do manejo – inclusive – de verbas do Sistema Único de Saúde. A apropriação
de que trata a denúncia não cuida apenas de dinheiro público de origem
estadual, mas também de verbas de origem federal.

Esse caso já foi bem abordado pelo Superior Tribunal de Justiça,


como revela o julgado que adiante transcrevo, na linha da competência da
justiça federal para processo e julgamento:

PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. TRANCAMENTO DE


INQUÉRITO POLICIAL INSTAURADO POR REQUISIÇÃO DA
CHEFIA DA PROCURADORIA REGIONAL DA REPÚBLICA.
PECULATO. DESVIO DE VERBAS DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE
(SUS). PREFEITO MUNICIPAL. PRERROGATIVA DE FUNÇÃO.
COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL.
CONSTRANGIMENTO ILEGAL INEXISTENTE. ORDEM
DENEGADA.
1. Em sede de habeas corpus, conforme pacífico magistério
jurisprudencial, somente se admite o trancamento de inquérito
policial, por falta de justa causa, quando desponta induvidosamente a
inocência do indiciado, a atipicidade da conduta ou se acha extinta a
punibilidade, circunstâncias não demonstradas na hipótese em
exame.
2. Ademais, não caracteriza constrangimento ilegal a simples
instauração de inquérito policial destinado a apurar fatos em tese
delituosos.
3. Por outro lado, a prerrogativa de função ostentada pelo paciente
não obsta a prática de atos de investigação a serem promovidos pela
autoridade policial, quando requisitados por membro do Ministério
Público com atuação perante o Tribunal competente para processar e
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julgar eventual ação penal originária, sob pena de inviabilizar a


adoção das medidas pré-processuais de persecução penal, no âmbito
do procedimento investigatório em curso perante o órgão judiciário
competente.
4. Por fim, conforme decidido pelo Plenário do Supremo Tribunal
Federal, "(...) A competência originária para o processo e julgamento
de crime resultante de desvio, em repartição estadual, de recursos
oriundos do Sistema Único de Saúde - SUS, é da Justiça Federal, a
teor do art. 109, inc. IV, da Constituição Federal" (RE 196.982/PR,
Rel. Min. NÉRI DA SILVEIRA, DJ 27/6/1997, p. 30.247), pois, "(...)
Além do interesse inequívoco da União, na espécie, em se cogitando
de recursos repassados ao Estado, os crimes, no caso, são também
em detrimento de serviços federais, pois a estes incumbe não só a
distribuição dos recursos, mas ainda a supervisão de sua regular
aplicação, inclusive com auditorias no plano dos Estados" (RE
196.982/PR, Rel. Min. NÉRI DA SILVEIRA, DJ 27/6/1997, p. 30.247).
5. Ordem denegada.
(HC 35.996/RJ, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA
TURMA, julgado em 04/11/2004, DJ 06/12/2004 p. 345) (grifado).

Em meu sentir, como bem esclarece o julgado, o interesse da União


não se revela apenas na afetação de verbas do Sistema Único de Saúde, mas
também à implementação do serviço público de saúde a ser custeado com
esses recursos, objetos mesmo de fiscalização por entidades federais.

Afora o fundamento acima, saliento que a questão da competência


para o processo e julgamento dos fatos apresentados pelo MPF em sua
denúncia – o seja, do presente caso em concreto – já foi objeto de exame pelo
Superior Tribunal de Justiça no CC n. 41073/PB (Rel. Ministro Arnaldo Esteves
Lima), resolvido em favor da 2ª vara federal da SJPB (f. 1303-5 dos autos
anexos).

Por esses motivos, indefiro a preliminar.

3) A necessidade de desclassificação do crime de peculato para


apropriação indébita e a consequente prescrição da pretensão punitiva

A alegação de prescrição depende, para seu acolhimento, do


reconhecimento da necessidade de desclassificar-se o fato para apropriação
indébita, sustentada com base no argumento de que o parágrafo único do art.
327 do CP não poderia ser aplicado ao caso concreto, uma vez que os fatos
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narrados na denúncia seriam anteriores à Lei n. 9983/2000. Em consequência


disso, o fato em tese seria de apropriação indébita que, tendo pena máxima de
quatro anos (CP, art. 168), prescreveria “in abstrato” em oito anos (CP, art.
109, IV). Conclui dizendo que já teria ocorrido a prescrição da pretensão
punitiva do Estado.

No ponto sobre a inaplicabilidade do art. 327, §1º, do CP ao


presente caso, uma vez que os fatos – da forma como narrados na denúncia –
teriam sido anteriores ao advento da Lei n. 9983/2000, entendo que não assiste
razão à defesa.

Embora o art. 327 do Código Penal tenha realmente sido modificado


pela Lei n. 9983/2000, seu parágrafo único (transformado em parágrafo
primeiro) já previa a equiparação a funcionário público daquele que exercia
cargo, emprego ou função em entidade paraestatal. A modificação operada
pela aludida lei apenas acrescentou sua parte final, estendendo a equiparação
a “quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou
conveniada para a execução de atividade típica da Administração Pública”.

Sendo assim, no ponto realmente importante – a equiparação do


ocupante de cargo, emprego ou função em entidade paraestatal – a Lei n.
9983/2000 não operou qualquer modificação, não se apresentando como
“novatio legis in pejus”, não se podendo falar em aplicação retroativa “in malam
partem”.

Não pode haver dúvida de que o Complexo Santa Casa de


Misericórdia, entidade beneficente e filantrópica, possa ser considerado como
entidade paraestatal. Afinal, não integra a Administração Pública (não
integrando o Estado, não pertencendo ao primeiro setor) e não desempenha
atividade econômica com finalidade de lucro (não pertencendo ao mercado,
não integrando o segundo setor). Pertence perfeitamente ao terceiro setor,
atuando paralelamente ao Estado na busca por objetivos com convergentes.

Uma vez que seja necessário manter-se o enquadramento do fato


em tese no tipo penal do crime de peculato, o prazo para prescrição da
pretensão punitiva “in abstrato” é de 16 anos (CP, art. 109, II), considerando a
pena máxima cominada ao crime, fixada pelo preceito secundário do CP, art.
312, em 12 anos de reclusão.

Por esses fundamentos, indefiro os pedidos de nova definição


jurídica do fato e de acolhimento da prescrição da pretensão punitiva.
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Examinadas todas as questões preliminares e prejudiciais, passo ao


exame do mérito da causa.

Em suas alegações finais, o MPF muito bem definiu os pontos que


definem as acusações imputadas contra os réus dessa maneira:

1) Desvio dos cheques n. 3311, 4311 (os quais, juntos, somavam R$


177.408,00) e 8711 (no valor de R$ 55.080,00), que eram destinados à conta
da Escola Santa Emília de Rodat, para a conta do Instituto Santa Emília de
Rodat, mediante endosso feito por ambos os réus, de onde os valores foram
sacados por eles e indevidamente apropriados;

2) Desvio dos cheques n. 6043, 6420, 6656 e 7325 (os quais, juntos,
somavam R$ 220.800,00), que eram destinados à conta da Escola Santa
Emília de Rodat, para a conta n. 8.700.674-1, titularizada pelo réu MARCONI e
sua esposa, NIEDJA, mediante endosso do primeiro;

3) Saques dos valores de R$ 20.009,00, R$ 19.236,61 e R$


9.502,04 da conta da Escola Santa Emília de Rodat, feitos pelos réus
MARCONI, sob a alegação, aposta em recibos, de que estaria transferindo tais
valores para a conta do Instituto Santa Emília de Rodat, sendo que constatou-
se que nenhum valor ingressou na conta desse Instituto no período dos
saques, o que comprovaria que esse réu simplesmente deles se apropriou;

4) Diversos saques realizados no período de fevereiro a dezembro


de 1997, no valor total de R$ 56.980,00, pelo réu MAURÍCIO, da conta da
Escola Santa Emília de Rodat sem comprovação de que tal valor tenha sido
aplicado no objeto do convênio, o que, somado aos demais elementos dos
autos, indica que esse réu do valor se apropriou;

5) Diversos saques realizados nas datas de 09, 20 e 30 de maio e


09 de outubro de 1997, no valor total de R$ 19.845,64, pelo réu MAURÍCIO, da
conta da Escola Santa Emília de Rodat sem comprovação de que tal valor
tenha sido aplicado no objeto do convênio, o que, somado aos demais
elementos dos autos, indica que esse réu do valor se apropriou;

6) Apropriação, pelo réu MARCONI, da quantia de R$ 14.339,07,


equivalente à diferença entre o valor de R$ 29.339,07, sacado da conta da
Escola Santa Emília de Rodat para o suposto pagamento de José Augusto de
Souza Peres, contratado para realizar estudos referentes à implantação da
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Escola Politécnica de Saúde, e o valor que este efetivamente recebeu, isto é,


R$ 15.000,00, embora este tenha firmado recibo, a pedido do mesmo réu,
declarando falsamente que teria recebido o primeiro valor;

7) A emissão pelo réu MAURÍCIO, em agosto de 1997, de um vale,


em favor de Aluízio Nunes de Lucena, no valor de R$ 2.069,28, retirado do
caixa da Escola Santa Emília de Rodat, sem que a despesa tenha sido
justificada, e tendo como garantia de pagamento um cheque de R$ 7.000,00,
emitido peal empresa Transportes e Representações J. B. Ltda., o qual foi
depositado por MARCONI na conta da sua esposa NIEDJA, porém foi
devolvido por insuficiência de fundos;

8) A apropriação, pelo réu MARCONI, da quantia de R$ 27.882,97,


através do depósito de cheques emitidos pelo Instituto Santa Emília de Rodat
da conta n. 8.700.674-1, titularizada pelo próprio MARCONI e sua esposa,
NIEDJA.

Maurício sustenta que não participou em nada dos fatos que, com
referência ao acusado Marconi, traduziam seja o depósito de cheques
endossados em sua conta pessoal ou na conta do Instituto, sem a devida
prestação de contas posterior, seja a assinatura de recibos com valor superior
ao contratado por prestadores de serviço e posterior apropriação do saldo.

Marconi, de sua parte, e no que pertine ao mérito da causa, alega


que em momento algum agiu com o elemento subjetivo necessário para que
sua conduta configurasse qualquer crime. Ele não nega os fatos a ele
imputados pelo MPF, mas o elemento subjetivo do tipo penal (dolo).

O primeiro ponto de mérito que entendo deva ficar bem claro é que o
liame subjetivo necessário à configuração do concurso de pessoas não foi
demonstrado pelo MPF no caso presente. Seria mesmo possível dizer que,
embora os acusados tenham sido denunciados como coautores dos fatos
narrados, a própria denúncia não apresenta esses fatos de forma clara como
produto da vontade conjunta de ambos os réus. O que sobressai dos autos, ao
final, é que os fatos demonstrados como praticados por cada um deles nada
tiveram de colaboração recíproca, o que afasta peremptoriamente a aplicação
do art. 29 do Código Penal ao caso em questão.

A isso se poderia objetar que, ao longo da instrução, foi dito que as


prestações de contas seriam de responsabilidade do Complexo, bem como que
os dois réus teriam causado o desaparecimento dos documentos. Esse fato – a
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colaboração conjunta dos dois réus nesse caso – contudo, não foi devidamente
provado nos autos, de modo que não vejo elementos que fundamentem o liame
subjetivo necessário ao concurso de agentes.

Isso torna necessário um exame dos fatos de maneira


individualizada quanto a cada réu, tornando estanques as imputações e
eventuais responsabilidades.

No decorrer da instrução, apurou-se o seguinte quanto à produção


da prova oral.

Maurício afirmou em seu interrogatório que “nunca houve qualquer


problema judicial com relação ao Instituto, estando suas contas absolutamente
livres, sem quaisquer pendências”, arrematando que “os valores eventualmente
depositados no Instituto, pelo fato de ser uma pessoa jurídica independente e
distinta da Santa Casa, não corriam qualquer risco de arresto ou penhora para
pagamento de dívidas da Santa Casa”. Negou a prática do crime e, embora
haja admitido o saque a ele imputado da conta da Escola, afirmou que isso era
comum uma vez que, como provedor da Santa Casa, tinha competência para
sacar de um dos componentes do Complexo para subsidiar necessidades em
outros.

Marconi disse que havia risco de constrição judicial em valores da


conta da Escola e do Instituto Santa Emília de Rodat, embora o risco, no último
caso, fosse menor. Confirmou que efetuou vários depósitos em sua conta
pessoal por causa desse risco, mas negou a prática do crime, sustentando que
assim o fazia apenas para viabilizar a troca de cheques por dinheiro e poder
fazer frente às despesas da Escola. Negou completamente a prática de
quaisquer dos crimes a ele imputados pelo MPF.

MARIA DA GLÓRIA UCHOA DOS SANTOS afirmou que se


lembrava do convênio SETRAS n. 025/96 e de seu objeto, esclarecendo que,
nesse caso, como em todos os outros convênios, a testemunha se limitava a
entregar os cheques ao acusado Marconi. Disse não ter notícia de endosso dos
cheques e de depósito na conta pessoal do referido acusado, recordando-se
que uma vez assinou um papel para liberação do dinheiro, não sabendo se se
tratava de um endosso. Quanto ao objeto do convênio, afirma que se referia à
formação de técnicos em laboratório de análises clínicas, oncologia,
recepcionista hospitalar, geriatria e gerontologia, além de outros, sendo a
testemunha responsável pela supervisão de todos deles. Registra ainda que
todos esses cursos foram realizados, formando-se turmas e expedindo-se os
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respectivos certificados. Teriam sido mais de dez cursos com algo entre vinte e
cinco e trinta alunos por turma, chegando os cursos a 240 h/a (duzentas e
quarenta horas-aula), tudo documentado e com controle de presença e
avaliações. Sobre a pessoa de JOSÉ AUGUSTO, afirmou que foi escolhido por
já trabalhar com consultoria, prestando serviço idêntico à FACENE e, embora
não lhe conheça a graduação, sabe que se trata de profissional pós-graduado
com livros escritos. Por fim, afirma que todos os professores receberam em dia
seus salários com os recursos do convênio, bem como que esses recursos
serviam também para a confecção do material devidamente entregue aos
alunos.

JOAQUIM PAIVA MARTINS afirmou que não tinha conhecimento do


convênio SETRAS e seus contratos correlatos. Sobre a declaração de
conhecimento do fato da retirada de documentos da Escola, afirmou que, na
época, em razão do quadro que encontraram quando da designação da junta
interventora, acreditou nessa informação. Tomou conhecimento da realização
de cursos, embora não saiba se realmente ocorreram e se o dinheiro foi
totalmente neles empregado. Ouviu falar de desvio de dinheiro da Escola, seja
para o Instituto Santa Emília de Rodat, seja para a conta pessoal de um dos
acusados. Conversando com auditores, quando a junta começou a atuar, ouviu
falar da ocorrência de irregularidades como a falta de documentos, documentos
irregulares, alguns problemas com cheques que haveriam sido desviados

JOSÉ AUGUSTO DE SOUZA PERES afirmou que, “embora não


esteja absolutamente certo disso, acredita que o projeto em questão tenha sido
contratado pelo valor de R$ 14.000,00 (quatorze mil reais), efetivamente
recebido, sendo o projeto elaborado no ano de 1998”. Confirma em seguida
“que realmente recebeu a quantia afirmada pelo MPF na denúncia como
contraprestação pelos seus serviços prestados, tendo firmado um recibo, a
pedido do acusado MARCONI, no valor de R$ 29.399,07 (vinte e nove mil
trezentos e trinta e nove reais e sete centavos), bem como que recebeu a visita
do mesmo acusado para endossar os cheques relativos ao pagamento da
quantia contida no recibo, ou seja, do valor maior, tendo ficado a testemunha
com apenas um cheque que traduzia aproximadamente metade do valor do
recibo por si assinado” (grifo inexistente no original).

HERNAN PINTO RODRIGUEZ afirmou que foi um dos auditores


designados para a realização do trabalho de auditoria “in loco” no Complexo
Santa Casa, examinando documentos, cheques, dinheiro em caixa etc. Disse
que “a partir da auditoria, ficou constatado o desvio de cheques endereçados
ao Complexo, provenientes de convênios, para crédito em conta-corrente
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pessoal da esposa do acusado MARCONE”. Na época da auditoria, colheram


declaração da pessoa que afirmou ter o acusado Marconi retirado os
documentos da Santa Casa e sumido com eles, “confirmando a testemunha
que realmente a auditoria não teve acesso a ditos documentos”, os quais
“seriam provavelmente relativos às despesas e receitas do Instituto”. Registrou
não saber afirmar se os valores depositados na conta da esposa do acusado
foram utilizados em compras e serviços relacionados ao objeto do convênio.
Quatro cheques endereçados a JOSÉ AUGUSTO PERES no valor de R$
14.820,63 teriam sido depositados na conta da esposa do acusado Marconi,
“tendo sido encontrados onze prestadores de serviço nessa situação, num total
de R$ 50.310,63, tendo sido os cheques endossados pelos prestadores.

JÁDER CARLOS COELHO DA FRANCA afirmou desconhecer


completamente o assunto sobre o convênio com a SETRAS e os contratos a
ele relacionados. Sobre a retirada de documentos, afirma ter ouvido da Sra.
Zélia que os acusados haviam feito a retirada de documentos da Santa Casa.

RICARDO JOSÉ ALVES afirmou que os “vales” certamente se


referiam ao pagamento de salários, os quais estavam sempre em atraso,
inclusive o da testemunha, que muitas vezes recebeu seu salário através
desses “vales”. Tem conhecimento de que a situação financeira do Complexo
como um todo era muito ruim, tendo ouvido falar que as contas estavam
bloqueadas.

GERSON DA SILVA RIBEIRO afirmou que já trabalhou na Escola


Santa Emília de Rodat gratuitamente em atenção às más condições financeiras
por que passava a Escola. Disse ter presenciado uma conversa a que estavam
presentes Expedito, Marconi, Peres e outro funcionário, na linha de que a
Escola estaria recebendo dinheiro de um convênio com a SETRAS, mas que
se tal dinheiro entrasse no caixa da Escola seria bloqueado para pagamento de
débitos trabalhistas. Teve conhecimento de que a Escola passou a ministrar
minicursos, pagando aos professores tão logo eram concluídos.

HAROLDO DE FIGUEIREDO DINIZ afirmou ter conhecimento de


que o acusado Marconi fazia depósito de dinheiro da Santa Casa em sua
conta-corrente pessoal, mas apenas para viabilizar pagamentos de dívidas da
Escola, inclusive professores. Não ouviu falar de o acusado Marconi ter
utilizado dinheiro da Escola em proveito próprio. Ouviu dizer que o acusado
usava sua conta pessoal para depositar dinheiro da Escola porque, de outro
modo, a Santa Casa os reteria, bem como porque estava “sub judice”. Disse
recordar-se de que a Escola celebrou convênio para a realização de
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minicursos, acreditando que incluíam a aquisição dos materiais a serem neles


aplicados.

ZICLOMAR RODRIGUES CARTAXO afirmou ser professora da


Escola Santa Emília de Rodat desde o ano de 1980, tendo ouvido falar que em
determinada época a conta da Escola estava com um problema, de modo que
se o dinheiro da Escola fosse ali depositado os professores não receberiam
seus salários em dia, motivo pelo qual Marconi teria utilizado sua conta
pessoal. Nunca ouviu falar que Marconi houvesse usado o dinheiro para
proveito pessoal. Ouviu falar de que a Escola celebrou convênios para a
realização de minicursos, tendo os professores recebido regularmente seus
salários.

Quanto à prova documental (especialmente contida nos autos


anexos do inquérito policial), vejo que, a partir da f. 425 (numeração da JFPB –
anexo), constam documentos referenciados pelo MPF, tais como:

a) O contrato n. 004/97 e os cheques n. 6043 (R$ 55.200,00), 6420


(R$ 55.200,00), 6656 (R$ 33.120,00) e 7325 (R$ 77.280,00), depositados na
conta corrente do acusado Marconi e de sua esposa Niedja.

b) O contrato n. 23/96 e os cheques n. 3311 (R$ 88.804,00) e 4311


(R$ 88.804,00), recebidos por Maria da Glória Uchoa, endossados por ambos
os réus e depositados na conta do Instituto Santa Emília de Rodat.

c) O termo aditivo n. 001/97 ao contrato n. 004/97 e o cheque n.


8711 (R$ 55.080,00), recebido por Maria da Glória Uchoa, endossado por ela e
pelo acusado Marconi e depositado na conta do Instituto Santa Emília de
Rodat.

A f. 454-60 do inquérito policial (autos anexos), consta relatório da


equipe de auditoria da Secretaria do Controle da Despesa Pública do Estado
da Paraíba, subscrito pelos auditores Henan Pinto Rodrigues e Darcy Bonfim.
Nesse relatório, constam informações sobre:

a) Cheques depositados na conta da Sra. Niedja (esposa do


acusado Marconi);

b) Declarações de supostos favorecidos sobre valores não


recebidos;

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c) Transferências financeiras em 18/02/98 (R$ 20.009,00), 09/03/98


(R$ 19.236,61) e 24/04/98 (R$ 9.502,04), supostamente feitas da Escola para o
Instituto que, embora recebidas por Marconi, não ingressaram na conta do
Instituto;

d) Transferências da tesouraria geral da Santa Casa para a


Provedoria, realizadas em 09/05/97 (R$ 5.800,00), 20/05/97 (R$ 2.745,64),
30/05/97 (R$ 11.000,00) e 09/10/97 (R$ 300,00), sendo os valores recebidos
por Ana Sandra Olinto Barbosa, secretária do acusado Maurício, com a
finalidade de suprir o caixa da Provedoria, não tendo sido tais despesas
documentalmente comprovadas.

A f. 534-7 do inquérito (anexo), novo relatório subscrito pelos


mesmos auditores nos dá conta da emissão de vales em nome de José
Augusto de Sousa Peres (R$ 17.000,00) e Aluízio Nunes de Lucena (R$
2.096,28). No caso de Aluízio Nunes de Lucena, os auditores constataram que
o vale foi dado tendo como garantia o cheque n. 88628944, do Banco
Sudameris, no valor de R$ 7.000,00, emitido por Transportes e
Representações JB Ltda., devolvido por insuficiência de fundos quando era
depositado na conta n. 8.700.674-1, cuja titular era a esposa do acusado
Marconi.

As conclusões definitivas dos auditores estão registradas no


Relatório de Auditoria DECADIR n. 026/99 (f. 571A-642 anexo). Registraram ali
que o desaparecimento dos documentos relativos ao processo de prestação de
contas do Instituto Santa Emília de Rodat impediu a verificação da regularidade
das despesas e operações ali realizadas.

Após um aprofundado exame de todas as provas – especialmente


dos documentos referenciados nos parágrafos acima – passo a examinar as
imputações separadamente:

1) Desvio dos cheques n. 3311, 4311 (os quais, juntos,


somavam R$ 177.408,00) e 8711 (no valor de R$
55.080,00), que eram destinados à conta da Escola
Santa Emília de Rodat, para a conta do Instituto Santa
Emília de Rodat, mediante endosso feito por ambos os
réus, de onde os valores foram sacados por eles e
indevidamente apropriados;

Entendo que logrou o MPF, efetivamente, demonstrar a prática


desse fato. Em verdade, a prova documental minuciosamente referenciada

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(seja pelo MPF, seja no já citado relatório de auditoria) demonstra que os


apontados cheques, inicialmente endereçados à Escola Santa Emília de Rodat,
foram encaminhados à conta do Instituto Santa Emília de Rodat e ali tiveram
destinação absolutamente desconhecida, uma vez que não houve prestação de
contas válida que demonstrasse a efetiva aplicação dos recursos.

A alegação de que os valores foram integralmente utilizados no


objeto do convênio não foi confirmada pelas provas colhidas no inquérito ou no
curso da instrução processual. É de se notar que não se fazia necessário ao
MPF demonstrar a apropriação da integralidade do dinheiro, motivo pelo qual
os depoimentos prestados no sentido de que alguns cursos teriam sido
realizados não afastam peremptoriamente a imputação, já que permitem a
ilação de apropriação parcial.

2) Desvio dos cheques n. 6043, 6420, 6656 e 7325 (os


quais, juntos, somavam R$ 220.800,00), que eram
destinados à conta da Escola Santa Emília de Rodat,
para a conta n. 8.700.674-1, titularizada pelo réu
MARCONI e sua esposa, NIEDJA, mediante endosso do
primeiro;

Também esse fato ficou devidamente comprovado através da prova


documental contida nos autos do processo e do inquérito respectivamente
anexo, prova tal adequadamente destacada pelo MPF.

Em verdade, aqui entendo conveniente destacar que os réus


divergiram frontalmente sobre a necessidade de utilização da conta corrente
pessoal do acusado Marconi e de sua esposa Niedja. Os acusados
concordaram que a realização de depósitos na conta da Escola Santa Emília
de Rodat seria no mínimo arriscada, sendo em razão disso depositados os
valores na conta do Instituto. O acusado Maurício, no entanto, ao contrário de
Marconi, afirmou que a conta do Instituto não corria qualquer risco, sendo por
isso mesmo os valores destinados à Escola depositados na conta do Instituto.

Se a conta do Instituto era segura (não passível de penhora), que


motivo haveria para a realização de depósitos na conta pessoal Marconi? Esse
fato, conforme me pareceu bastante claro, foi decisão isolada de Marconi,
inclusive sem o aparente conhecimento de Maurício. A questão é que se
realmente não havia motivo para utilização da conta pessoal do acusado, o
depósito dos cheques em tal conta aparece – em plena sintonia com a linha
defendida pelo MPF – como meio para viabilizar a apropriação dos respectivos
valores.
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O incontestável aspecto de que, uma vez depositados esses valores


em conta pessoal do acusado, não houve prestação de contas nem a
aprovação da tomada de contas realizada pela auditoria (sem a colaboração
dos réus) permite conclusão de que tais valores foram realmente apropriados,
pois jamais se comprovou sua aplicação em despesas relacionadas ao objeto
do convênio celebrado com a SETRAS.

Como se vê ao longo do processo, o argumento de Marconi cinge-se


à intenção de utilização dos valores no objeto do convênio, bem como de evitar
que tais quantias fossem penhoradas na conta da Escola. O problema é que,
se a conta do Instituto era segura, não havia motivo para depósito em sua
conta privada. Cabia-lhe demonstrar que o acusado Maurício estava errado e
que a conta do Instituto também não era segura – o que seria possível a partir
da comprovação da existência de ações judiciais contra o Instituto. Essa prova
jamais foi feita e, ao fim e ao cabo, chego à conclusão de que os depósitos
serviram a atos de apropriação dos respectivos valores pelo acusado Marconi.

3) Saques dos valores de R$ 20.009,00, R$ 19.236,61 e


R$ 9.502,04 da conta da Escola Santa Emília de Rodat,
feitos pelos réus MARCONI, sob a alegação, aposta em
recibos, de que estaria transferindo tais valores para a
conta do Instituto Santa Emília de Rodat, sendo que
constatou-se que nenhum valor ingressou na conta
desse Instituto no período dos saques, o que
comprovaria que esse réu simplesmente deles se
apropriou;

Esse fato também encontra prova documental contida nos autos. De


acordo com o MPF (devidamente corroborado por documentos que destaca),
houve saques da conta da Escola Santa Emília de Rodat para depósito da
conta do Instituto. Não houve demonstração documental de que tais valores
tenham ingressado na conta do Instituto, nem tampouco de que haja sido
aplicado em quaisquer despesas de interesse do Complexo Santa Casa de
Misericórdia.

Também esse fato não recebeu qualquer alegação em sentido


contrário, muito menos contraprova. Seria de se esperar que os acusados
procurassem evidenciar, à vista de extratos bancários (inclusos até mesmo nos
autos), que os valores ingressaram nas contas do Instituto Santa Emília de
Rodat (apontando, obviamente, os registros de lançamentos) ou mesmo que

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foram utilizados em tais ou quais despesas relacionadas ao objeto do convênio.


Nada disso foi feito.

4) Diversos saques realizados no período de fevereiro a


dezembro de 1997, no valor total de R$ 56.980,00, pelo
réu MAURÍCIO, da conta da Escola Santa Emília de
Rodat sem comprovação de que tal valor tenha sido
aplicado no objeto do convênio, o que, somado aos
demais elementos dos autos, indica que esse réu do
valor se apropriou;

5) Diversos saques realizados nas datas de 09, 20 e 30


de maio e 09 de outubro de 1997, no valor total de R$
19.845,64, pelo réu MAURÍCIO, da conta da Escola
Santa Emília de Rodat sem comprovação de que tal
valor tenha sido aplicado no objeto do convênio, o que,
somado aos demais elementos dos autos, indica que
esse réu do valor se apropriou;

O acusado Maurício afirmou que, como provedor do Complexo, tinha


a prerrogativa de retirar dinheiro de caixa de quaisquer entidades componentes
para cobrir despesas relativas a outro componente. O MPF não contesta esse
ponto, mas a comprovação das despesas custeadas precisamente com o
montante de R$ 56.980,00 a que se refere. Segundo o MPF, a destinação
desses recursos jamais foi comprovada, e nisso tem total razão.

Da mesma forma que afirmei no tópico anterior, cabia ao acusado


demonstrar que os saques foram feitos para fazer frente a despesas
relacionados ao objeto do convênio. Se o dinheiro em questão fora transferido
pelo órgão convenente, estava vinculado ao objeto conveniado. Caso contrário,
ainda assim deveria o acusado demonstrar que fora depositado na conta de
outro componente do complexo ou que fora utilizado diretamente para gastos
relacionados às respectivas atividades da Santa Casa. Em momento algum
isso foi demonstrado, limitando-se o acusado a dizer que tinha a prerrogativa
de remanejar recursos.

Uma vez que se comprovou a realização dos saques e seus


respectivos valores, caberia ao acusado comprovar sua destinação. Para isso
serve a prestação de contas. Uma vez que não prestara suas contas nem
comprovara, por outro modo, a destinação dos recursos, responsabiliza-se por
sua apropriação. As provas dos autos são fortes nesse sentido, com a
corroboração dos trabalhos de auditoria cujo relatório, já aqui citado, encontra-
se nos autos do inquérito policial anexo.

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6) Apropriação, pelo réu MARCONI, da quantia de R$


14.339,07, equivalente à diferença entre o valor de R$
29.339,07, sacado da conta da Escola Santa Emília de
Rodat para o suposto pagamento de José Augusto de
Souza Peres, contratado para realizar estudos referentes
à implantação da Escola Politécnica de Saúde, e o valor
que este efetivamente recebeu, isto é, R$ 15.000,00,
embora este tenha firmado recibo, a pedido do mesmo
réu, declarando falsamente que teria recebido o primeiro
valor;

A comprovação desse fato praticado pelo acusado Marconi foi


incontestável: ficou demonstrado pelos documentos colhidos na fase
inquisitorial e foi confirmado pelo próprio Sr. José Augusto de Souza Peres no
depoimento que prestou em juízo.

Como já destacado linhas acima, afirmou a apontada testemunha


“que realmente recebeu a quantia afirmada pelo MPF na denúncia como
contraprestação pelos seus serviços prestados, tendo firmado um recibo, a
pedido do acusado MARCONI, no valor de R$ 29.399,07 (vinte e nove mil
trezentos e trinta e nove reais e sete centavos), bem como que recebeu a visita
do mesmo acusado para endossar os cheques relativos ao pagamento da
quantia contida no recibo, ou seja, do valor maior, tendo ficado a testemunha
com apenas um cheque que traduzia aproximadamente metade do valor do
recibo por si assinado” (grifo inexistente no original).

Ora, aliando-se esse fato à completa ausência de prestação de


contas e comprovação da completa execução do objeto do convênio, chega-se
à inelutável conclusão, na linha da tese esposada pelo MPF, de que os valores
recebidos através dos cheques endossados foram objeto de apropriação por
parte do acusado Marconi.

7) A emissão pelo réu MAURÍCIO, em agosto de 1997,


de um vale, em favor de Aluízio Nunes de Lucena, no
valor de R$ 2.069,28, retirado do caixa da Escola Santa
Emília de Rodat, sem que a despesa tenha sido
justificada, e tendo como garantia de pagamento um
cheque de R$ 7.000,00, emitido peal empresa
Transportes e Representações J. B. Ltda., o qual foi
depositado por MARCONI na conta da sua esposa
NIEDJA, porém foi devolvido por insuficiência de fundos;

Não entendo que as provas trazidas aos autos demonstrem com


exatidão a ocorrência desse fato. Não foi tomado o depoimento de Aluízio
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Nunes de Lucena que, assim, não confirmou em juízo as informações


apresentadas na fase inquisitorial. A simples emissão de um vale não leva a
uma conduta ilícita, pois ficou bem claramente demonstrado que muitos
funcionários recebiam seus salários dessa forma. A tentativa de depósito do
referido cheque na conta de Marconi apenas entra na linha de outros depósitos
já referenciados.

8) A apropriação, pelo réu MARCONI, da quantia de R$


27.882,97, através do depósito de cheques emitidos pelo
Instituto Santa Emília de Rodat da conta n. 8.700.674-1,
titularizada pelo próprio MARCONI e sua esposa,
NIEDJA.

Também esse fato encontra prova documental nos autos,


devidamente apontada pelo MPF. É de se notar que aqui também ganha revelo
o aspecto da ausência de qualquer prestação de contas e das conclusões
francamente negativas constantes do relatório elaborado pelos auditores
quando da tomada de contas. Não há qualquer prova de que os valores
tenham sido posteriormente utilizados em proveito do Complexo Santa Emília
de Rodat.

Outrossim, associando-se isso ao raciocínio (aqui reiterado) de que


não havia motivo que justificasse o depósito de tais valores na conta pessoal
do acusado (quando dispunha da conta do Instituto sem qualquer risco), esses
depósitos apenas aparecem como estágio natural do procedimento que
culminava na apropriação dos valores depositados.

Pode-se constatar que as condutas dos acusados consistiram na


apropriação, durante certo período de tempo, de valores pertencentes ao
Complexo Santa Casa de Misericórdia, precisamente da Escola Santa Emília
de Rodat, recursos obtidos mediante convênio celebrado com a Secretaria do
Trabalho e Ação Social.

Considerando a natureza paraestatal da entidade (CP, art. 327, §1º),


a homogeneidade do modus operandi das condutas, os fatos perfazem o tipo
do art. 312, caput, do Código Penal brasileiro (peculato), praticados em
continuidade delitiva (CP, art. 71). Nesse ponto, por entender que ficaram
preenchidos os pressupostos no art. 71 do CP, discordo do MPF quando afirma
que alguns deles deveriam ser incriminados como praticados em concurso
material.

Passo à fixação das penas.


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FIXAÇÃO DA PENA

1. Maurício Timótheo de Souza

1.1 Circunstâncias judiciais (pena-base)

Examinando as circunstâncias do art. 59 do Código Penal brasileiro,


vejo o seguinte: a culpabilidade se mostrou própria ao crime em questão; o réu
não possui antecedentes criminais; a conduta social e a personalidade, como
dados inerentes ao réu que não relevantes para o fato, não podem ser
valorados negativamente sob pena de admitir-se uma culpabilidade de autor
que viola o princípio da lesividade e o princípio da dignidade da pessoa
humana; o crime não foi praticado por motivos que mereçam valoração
negativa, nem tampouco em circunstâncias especiais que justifiquem aumento
da reprimenda; as conseqüências indiretas do crime, contudo, a partir do
desvio de valores transferidos mediante convênio para a promoção de cursos
profissionalizantes, afetam uma pluralidade indistinta de indivíduos,
comprometendo os objetivos colimados pela entidade financiadora, o que
merece a devida reprovação; a vítima não colaborou para o crime com seu
comportamento.

Considerando os limites abstratos da pena cominada ao crime de


peculato (CP, 312, caput) e levando em conta a fundamentação acima, fixo a
pena-base em 4 (quatro) anos de reclusão.

1.2 Circunstâncias agravantes e atenuantes

Não encontrei circunstâncias agravantes (CP, arts. 61 e 62) ou


atenuantes (CP, arts. 65 e 66) que sejam aplicáveis ao fato. Mantenho, assim,
a pena acima fixada em 4 (quatro) anos de reclusão.

1.3 Causas de aumento ou diminuição

Não encontrei causas gerais ou especiais de aumento ou de


redução a pena que sejam aplicáveis ao fato. Mantenho, assim, a pena acima
fixada em 4 (quatro) anos de reclusão.

1.4 Causas de exasperação pelo concurso de crimes


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Atendidos os requisitos objetivos e subjetivos decorrentes do exame


do art. 71 do Código Penal, formando-se desse modo a continuidade delitiva,
deverá o juiz tomar uma das penas, se idênticas, ou a mais grave, se diversas,
majorando-a de um sexto a dois terços, conforme (segundo a doutrina) a
quantidade de crimes que integrem a continuidade.

No presente caso, vejo que nenhum dos fatos praticados pelo


acusado ensejaria pena superior à calculada nos itens acima, de modo que a
pena acima deve ser tomada como padrão para o cálculo da causa de
exasperação da continuidade delitiva.

Considerando a quantidade de delitos comprovadamente praticados,


entendo cabível seja a pena aumentada em 1/4 (um quarto). Sendo assim, fixo
em definitivo a pena privativa de liberdade em 5 (cinco) anos de reclusão para
cumprimento em regime inicial semi-aberto (CP, art. 33, §2º, “b”).

1.5 Substituição e sursis

Uma vez que o resultado da pena supera o limite de quatro anos


previsto no art. 44, I, do CP, não cabe a substituição da pena privativa de
liberdade por restritiva de direitos (cf. HC 21.681/SP, Rel. Ministra LAURITA
VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 17/06/2003, DJ 18/08/2003 p. 215)2. Pelo
mesmo motivo, não é cabível a suspensão condicional da pena (CP, art. 77,
caput).

2. Marconi Timótheo de Souza

2.1 Circunstâncias judiciais (pena-base)

2 HABEAS CORPUS. PENAL. CONCURSO DE CRIMES. PORTE ILEGAL DE ARMA E


RECEPTAÇÃO NA FORMA SIMPLES. SUBSTITUIÇÃO DE PENA PRIVATIVA DE
LIBERDADE POR RESTRITIVA DE DIREITOS. QUANTUM UNIFICADO INFERIOR A
QUATRO ANOS. CONDIÇÕES LEGAIS FAVORÁVEIS. POSSIBILIDADE.
1. Havendo concurso de crimes, a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de
direitos é possível quando o total das reprimendas não ultrapasse o limite de quatro anos,
disposto no art. 44, inc. I, do Código Penal.
2. Não sendo o apenado reincidente, bem como reconhecidas em seu favor as condições
judiciais previstas no art. 59, do Código Penal, e fixado a pena a ele imposta, em ambos os
delitos, no mínimo legal, faz jus à substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de
direitos.
3. Ordem concedida.
(HC 21.681/SP, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 17/06/2003, DJ
18/08/2003 p. 215) (grifado).
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Examinando as circunstâncias do art. 59 do Código Penal brasileiro,


vejo o seguinte: a culpabilidade se mostrou própria ao crime em questão; o réu
não possui antecedentes criminais; a conduta social e a personalidade, como
dados inerentes ao réu que não relevantes para o fato, não podem ser
valorados negativamente sob pena de admitir-se uma culpabilidade de autor
que viola o princípio da lesividade e o princípio da dignidade da pessoa
humana; o crime não foi praticado por motivos que mereçam valoração
negativa, nem tampouco em circunstâncias especiais que justifiquem aumento
da reprimenda; as conseqüências indiretas do crime, contudo, a partir do
desvio de valores transferidos mediante convênio para a promoção de cursos
profissionalizantes, afetam uma pluralidade indistinta de indivíduos,
comprometendo os objetivos colimados pela entidade financiadora, o que
merece a devida reprovação; a vítima não colaborou para o crime com seu
comportamento.

2.2 Circunstâncias agravantes e atenuantes

Não encontrei circunstâncias agravantes (CP, arts. 61 e 62) ou


atenuantes (CP, arts. 65 e 66) que sejam aplicáveis ao fato. Mantenho, assim,
a pena acima fixada em 4 (quatro) anos de reclusão.

2.3 Causas de aumento ou diminuição

Não encontrei causas gerais ou especiais de aumento ou de


redução a pena que sejam aplicáveis ao fato. Mantenho, assim, a pena acima
fixada em 4 (quatro) anos de reclusão.

2.4 Causas de exasperação pelo concurso de crimes

Atendidos os requisitos objetivos e subjetivos decorrentes do exame


do art. 71 do Código Penal, formando-se desse modo a continuidade delitiva,
deverá o juiz tomar uma das penas, se idênticas, ou a mais grave, se diversas,
majorando-a de um sexto a dois terços, conforme (segundo a doutrina) a
quantidade de crimes que integrem a continuidade.

No presente caso, vejo que nenhum dos fatos praticados pelo


acusado ensejaria pena superior à calculada nos itens acima, de modo que a
pena acima deve ser tomada como padrão para o cálculo da causa de
exasperação da continuidade delitiva.

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Considerando a quantidade de delitos comprovadamente praticados,


entendo cabível seja a pena aumentada em 1/2 (um meio). Sendo assim, fixo
em definitivo a pena privativa de liberdade em 6 (seis) anos de reclusão para
cumprimento em regime inicial semi-aberto (CP, art. 33, §2º, “b”).

2.5 Substituição e sursis

Uma vez que o resultado da pena supera o limite de quatro anos


previsto no art. 44, I, do CP, não cabe a substituição da pena privativa de
liberdade por restritiva de direitos (cf. HC 21.681/SP, Rel. Ministra LAURITA
VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 17/06/2003, DJ 18/08/2003 p. 215). Pelo
mesmo motivo, não é cabível a suspensão condicional da pena (CP, art. 77,
caput).

DISPOSITIVO

Diante do exposto, com fundamento no art. 387 do Código de


Processo Penal, julgo parcialmente procedente o pedido para condenar
Maurício Timótheo de Souza e Marconi Thimótheo de Souza como incursos no
artigo 312, caput, c/c o art. 71, ambos do Código Penal brasileiro.

Com base na fundamentação constante do tópico próprio, fixo as


penas privativas de liberdade da seguinte maneira:

a) Maurício Timótheo de Souza: pena privativa de liberdade de 5


(cinco) anos de reclusão para cumprimento em regime inicial semi-aberto (CP,
art. 33, §2º, “b”).

b) Marconi Timótheo de Souza: pena privativa de liberdade de 6


(seis) anos de reclusão para cumprimento em regime inicial semi-aberto (CP,
art. 33, §2º, “b”).

Deixo de substituir as penas privativas de liberdade por restritivas de


direito em razão do não preenchimento do requisito objetivo previsto no CP, art.
44, I. Deixo igualmente de lhes conceder a suspensão condicional da pena em
razão do não preenchimento do requisito objetivo previsto no CP, art. 77, caput.

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Por entender que não estão presentes os fundamentos que


ensejariam a custódia cautelar dos réus (CPP, arts. 312 e seguintes), concedo-
lhes o direito de apelar em liberdade.

Transitada em julgado a presente sentença, após a devida


certificação, deverá a secretaria da vara: a) oficiar ao TRE/PB para os fins do
art. 15, III, da CF; b) preencher e remeter ao IBGE os boletins individuais dos
acusados; c) lançar-lhes os nomes no rol dos culpados; d) remeter os autos ao
juízo das execuções penais.

Custas “ex lege”.

Proceda a secretaria da vara ao lacre dos documentos, constantes


dos autos, referentes às declarações de bens e rendimentos dos acusados, eis
que documentos protegidos por sigilo (folhas 44-91). Certifique-se.

Sentença publicada em mãos do diretor de secretaria. Registre-se


no sistema informatizado. Intimem-se os acusados e seus defensores.
Cientifique-se o MPF.

João Pessoa, 08 de maio de 2009.

Juiz federal Rogério Roberto Gonçalves de Abreu


Substituto da 2ª VF/SJPB

ROGÉRIO ROBERTO GONÇALVES DE ABREU


Juiz Federal

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