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Módulo Técnicas
Observação de Bebês
São Paulo
2009
Regiane de Quadros Glashan – Coren 31970
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São Paulo
2009
Sumário
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Introdução 3
Considerações Finais 18
Referências Bibliográficas 20
Introdução
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No entanto, para que a futura mãe possa ajudar seu bebê a desenvolver-se, ela
precisa entrar em um estado especial considerado como uma doença saudável, que é
segundo Winnicott a preocupação materna primária. Este estado é um estado
organizado e pode ser comparado a um retraimento, ou uma fuga, onde a mãe se
identifica com seu bebê; com suas necessidades, com suas emoções e desqualifica
outros acontecimentos a sua volta, colocando o bebê acima de todas as coisas ou
acontecimentos. É um estado transitório, que normalmente acompanha as primeiras
semanas de vida do bebê (Winnicott, 2006).
É a partir deste período, ou seja, logo no puerpério mediato até o primeiro ano de
vida do bebê que iniciaremos a observação, pois conhecemos de ante-mão que as
primeiras experiências de vida servirão de substrato para as relações posteriores com o
mundo.
Metodologia da Observação
Winnicott (1990) afirmava que a mãe quando adequada e por este termo
podemos entender madura e mentalmente saudável, não deve delegar ao medico ou a
enfermeira os cuidados relativos a sua saúde. Para tanto, a futura mãe deve conhecer a
equipe de saúde que cuidará dela, desenvolver uma atitude de confiança, pois se algo
ocorrer durante o processo, a mãe não assuma o controle da situação e não atribua a
equipe qualquer advento errado em sua assistência.
estar ativa e questionadora durante todo o trabalho de parto (Annibale e col. 1995;
Villar, 2007).
M contou com pesar que durante sua permanência no hospital ninguém lhe
forneceu orientações básicas de como cuidar do umbigo do Bb e nem como estimular a
amamentação. Disse de seu sofrimento ao chegar com as mamas túrgidas em casa e da
dificuldade do Bb em abocanhar o conjunto mamilo/aréola mamária.
Miller (1992) afirma que ser amparado e compreendido esta no topo da lista das
necessidades do Bb. Ele deve ser pego, carregado e colocado junto ao seio já nas
primeiras horas pós-parto de maneira a estimular o vinculo mãe-bebê e a própria
segurança da mãe em nutrir seu filho. A experiência de estar sendo segurado e ao
mesmo tempo, ter algo para focalizar é a primeira experiência significativa na vida do
BB. Instintivamente, os Bebês tendem a se dirigir para o bico do seio, os quais agem
como ponto de focalização para todo o seu ser.
De acordo com Hogg (2002) os bebês dormem cerca de 20 horas por dia e
pequenos períodos de atividade desperta. À medida que os bebes crescem, os períodos
de alerta aumentam e por volta dos 3 anos de idade da criança o ciclo sono/atenção
torna-se semelhante ao ciclo do adulto. Kreslei e col. (1981) ressaltam que durante os
três primeiros meses, o ciclo sono-vigília está relacionado as necessidades nutricionais
da criança. Os mesmos autores ressaltam que o estado de sonolência exibido pelo bebê
em suas primeiras semanas de vida, representa um estado de quietude e é a tradução do
narcisismo primitivo. Este período exprime serenidade, o retorno do tono muscular de
repouso e só é interrompido pela fome, dor, frio, manipulações físicas inadequadas. A
tensão gerada pelo desprazer pode ser apaziguada pela saciedade da fome, pela sucção
do mamilo, pelo embalo e pela sonoridade doce e ritmada da voz da mãe.
O fato do Bb dormir por horas seguidas neste início de vida, mostra que o
mesmo encontra-se em um período de autismo primário (ou fase narcísica de Freud)
que, segundo Soifer (1992) é um estado quase permanente de apatia e desinteresse, onde
o lactente não presta atenção aos estímulos provenientes do exterior, exceto,
parcialmente, os relacionados com sua alimentação e desconforto. As mamadas e o sono
são os termômetros que indicam que o bebê está tendo um bom desenvolvimento, pois o
bebê que dorme muito está se defendendo do mundo externo. É como se a criança
estivesse regredida à vida fetal, buscando o prazer imediato e absoluto, defendendo-se
do mundo externo, que pode estar sendo muito persecutório.
Outro aspecto importante reforçado por Marcelli e Cohen (2009) é que ter
pessoas positivas ao redor da mãe e do bebê é importante para auxiliar a conter os
sentimentos de ansiedades de ambos e alem do mais ajuda a preservar o vínculo sadio
familiar.
Para Winnicott (1982) existem muitas maneiras de um pai ser valioso. Uma
delas é ajudando a mãe a sentir-se uma boa mãe, ajudando-a a sentir-se bem com seu
corpo e seu espírito. E se tudo estiver bem entre o casal, o bebê será o primeiro a
apresentar os efeitos disto, mostrando-se mais alegre e saudável.
A questão de saber se é melhor para o bebê ser ninado no colo ou ser colocado
no berço para dormir foi discutido por Winnicott. O autor enfatizou que o bebê precisa
de ambas as experiências. Quando o ato de segurar o bebê é perfeito, ou seja, as mães
realmente sabem como fazê-lo, o bebê pode adquirir confiança no relacionamento vivo
e autentico, e pode integrar-se enquanto é seguro e esta atitude da mãe é enriquecedora
para a criança. No entanto, quando o ato de segurar o bebê é irregular ou frágil, a mãe
sente que pode deixar o bebê cair ou o segura com muita força, o bebê não consegue
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relaxar e quando o relaxamento acontece, pode ser por pura exaustão. Assim, o berço ou
a cama oferecem uma alternativa muito bem vinda.
Miller (1992) afirma que não existe alimento melhor para o bebê que o leite
materno e não discute sua importância e suas conseqüências positivas para o bebê em
termos afetivos e físicos. No entanto, afirma que quando a amamentação não pode ser
estabelecida (por vários motivos), o bebê também poderá ter um começo de vida bom,
desde que a mãe se envolva de corpo e alma durante o ato de nutrir seu bebê com a
mamadeira. Segurar com aconchego, olhar olhos nos olhos, manter o contato pele a pele
e manter sua atenção no bebê.
Por volta da metade do segundo mês do bebê, em uma de minhas visitas M disse
que P estava um pouco tenso, implicante e que parecia que ele estava com ciúmes do Bb
e que parecia até que o bebê pressentia o desafeto e todas as vezes que o casal procurava
pela intimidade o bebê chorava.
Este tipo de acontecimento não é raro entre os casais. Muitas vezes o pai pode
se sentir rejeitado e excluído da relação mãe-bebê e pode regredir, afundando-se no
trabalho, atuando com manias e certa hostilidade para com a esposa e levando a mulher
a sentir-se vazia. Klein (1952) reforçava que se o homem estava em harmonia com sua
esposa, ele sente-se satisfeito em ser pai e os sentimentos protetores do pai para com seu
filho nutrem a criança de elementos bons.
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Vasconcelos (1987) ainda reforça que como o bebê ainda não possui estrutura
egoica suficiente para lidar com as ansiedades de perda que esta situação provoca,
defende-se utilizando a identificação projetiva maciça e se projeta para dentro do corpo
da mãe identificando-se com ela na sua relação com o pai e com o mundo externo,
constituindo assim uma unidade simbiótica com ela (e ele). Este momento é
fundamental para o bebê, pois propicia a saída da retração autistica (negação do mundo
externo) para a relação simbiótica (busca do mundo externo pela mãe) que vai favorecer
gradualmente o estabelecimento com o meio externo e com a realidade.
O Bb já está com 100 dias e cada semana que passa é possível identificar seu
desenvolvimento global. Seu sorriso é voluntário, parece acompanhar com a cabecinha
o deslocamento das pessoas que falam com ele (coordenação viso-motora).
Spitz (1962) refere este período dos três meses como um marco no
desenvolvimento do bebê. É o início da saída do narcisismo primário, para a ação. A
criança aumenta mais e mais seus limites e seus ímpetos libidinosos e agressivos. Surge
então o “primeiro organizador”, que é assinalado pelo desenvolvimento da resposta
social, o sorriso. Os rudimentos de um EU e do principio da realidade começam a se
desenvolver. Agora os afetos de prazer e suas manifestações contrarias são evidentes e
são demonstráveis pelo fenômeno da resposta ao sorriso. Seu entretenimento mais
apreciado é o companheiro humano, tanto é que quando o parceiro humano se retira de
seu campo visual o bebê responde com choro ou expressão de desprazer. Entretanto, se
um brinquedinho que lhe tomava atenção é retirado de seu foco, ele não apresentará
sinal de descontentamento.
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Durante os meses que seguiram, o período que mais chamou a minha atenção foi
o período que compreendeu entre o sexto e o oitavo mês. M relatou que está difícil sair
com o Bb, pois sempre que alguém chama sua atenção fazendo gracinhas ou tentando
pegá-lo no colo, o Bb vira a carinha, faz bico, esboça um chorinho e quando a mãe
ameaça deixá-lo o Bb cai em prantos e agarra a mãe.
Ainda neste período, durante uma de minhas visitas percebo que o Bb tem
mordido intensionalmente os ombros de M e as vezes o faz com tanta força que M
reclama. É notório que o Bb está na fase oral sádica. Observo que sua gengiva está
edemaciada e branca e sua boquinha bem úmida. M refere que costuma lhe dar um
mordedor de silicone azul, mas o que ele gosta mesmo é de seu ombro.
A literatura mostra que no início da dentição, a criança sente que uma parte sua
está se desprendendo e, no decorrer do desenvolvimento, isso pode levar à ansiedade de
perda. Ao mesmo tempo, a criança sente que tem o poder de destruir, de triturar o
objeto. Esse momento representa o período do sadismo oral, em que o bebê sente prazer
em morder. O sadismo, derivado da atividade mastigatória, encontra-se muito
incrementada e são intensas também as angustias relacionadas a introjeção, originadas
no temor de destruir os objetos bons externos, durante a mastigação (Aberastuty, 1996).
M ressalta que o Bb neste período tem tido febre, o intestino mais solto que o
habitual e que ele adora chupar casca de pão. M parece muito adequada quando não
castiga ou fica agressiva quando o Bb a morde. O fato do Bb estar reagindo de acordo
com a fase com que ele se encontra, mostra que o Bb está reagindo positivamente ao
meio externo, o ambiente não se apresenta tão persecutório para ele. É evidente que a
postura da mãe e sua identificação empática colaboram para isso.
sorriso. M não se agüentava de orgulho por seu Bb e o levava ao colo para lhe dar um
grande abraço e beijos.
Mahler (2002) demonstrou que este período que o Bb de minha observação está
atravessando é um período em que o bebê se afasta fisicamente da mãe (engatinhar,
trepar) em busca de novos interesses. A criança emprega elevado investimento no
exercício das funções autônomas, especialmente da motilidade e muitas vezes se afasta
da mãe. Entretanto, quando percebe que este afastamento lhe causa insegurança, retorna
à mãe para se reabastecer de afeto e de contato físico. Este período foi denominado por
Mahler como “reabastecimento emocional”.
M aproveita minhas visitas para falar de seus sonhos, seus desejos e sua vontade
de recuperar a sua vida como ser produtivo. Comenta que gostaria de voltar a estudar ou
trabalhar, mas que sabe que não poderá contar com nenhum familiar para ajudá-la nos
cuidados com o Bb. Todavia, fica em dúvida em colocá-lo numa creche, pois sabe que
ele poderá adoecer e que P não lhe dará apoio em relação a esta atitude.
Percebo que M sente-se acolhida por minha presença, e sente que pode confiar
em mim. Após alguns meses de observação, M pode ir se soltando, abrindo seu coração
para suas angústias e percebeu que eu podia recebê-las e conte-las sem me abalar ou
julgar. No início de minhas visitas M não conseguia confiar a mim seu Bb e com o
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tempo a situação foi mudando e M foi permitindo que eu entrasse em seu lar não só
como uma observadora, mas como alguém que de alguma maneira poderia ajudá-la a
entender um pouco de seus anseios, compartilhar seus desejos, entender suas ansiedades
e afetos. Estava tão segura e confiante de minha presença que não restringia mais o meu
acesso ao Bb como o fazia nos primeiros meses da observação.
M comenta, ainda neste período, que embora conversasse com P sobre sua volta
ao trabalho ou a escola, sente que ele não oferece espaço para qualquer atitude dela
relativo a este contexto e afirma a ela que o que ele recebe de salário é suficiente para
sustentar a família e manter o Bb em casa, resguardado das intempéries até que ele
atinja 2 anos. Entendo que momentaneamente o pensamento de M está inundado de
desejos pessoais e próprios de alguém que está no final de sua adolescência. M de certa
forma pode estar revidando suas frustrações no Bb, por se sentir sozinha por longos
períodos em casa, por não poder contar com o auxílio de familiares no cuidado com o
Bb e por não poder fazer as coisas que fazia antes de ter o Bb.
Sabe-se que muitos pais não possuem a capacidade de se sacrificar em favor dos
filhos e manter a unidade familiar. Neste caso podemos notar que P dentro de sua
realidade masculina, tenta preservar o máximo sua família e M apesar de sua pouca
idade (18 anos) vivencia seus conflitos e suas frustrações, mas acaba acatando a decisão
de P em função da unidade e bem estar familiar.
Neste aspecto, Spitz (1962) demonstrou que nesta fase o bebê estabeleceu o
segundo organizador e a negativa seria o primeiro símbolo incorporado pelo Bebê. É
nesta fase que a criança começa a compreender a interdição imposta pela mãe e ela está
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Agora o Bb já está com 11 meses e engatinha, anda com apoio dos pais ou dos
“moveis”, ameaça dar alguns passinhos por conta própria e segundo M cada dia que
passa ele está mais arteiro e independente. Quer colocar o dedinho em todos os
buraquinhos (TV, batente da porta, aparelho de som, tomadas, cadeiras) e que M tem
que estar atenta o tempo todo para ele não se ferir e que no fundo ela acha isso muito
engraçado.
De acordo com Winnicott (2006), no início, o bebê ainda não estabeleceu uma
divisão clara entre Eu e não-EU, ou seja, o comportamento do meio ambiente faz parte
do bebê da mesma forma que o comportamento de seus impulsos hereditários para a
integração, para a autonomia e a relação com os objetos, e para uma integração
psicossomática satisfatória.
Este momento tão mágico que o Bb está vivendo rumo a sua autonomia foi
identificado e nomeado por Mahler (2002) como a fase de “processo de separação e
individuação. Nesta fase o bebê adota com mais freqüência a posição ereta, seu plano de
visão muda, o teste de realidade está a dispor do bebê e ele se torna mais resistente a
queda e frustrações e a criança está tentando escapar da fusão com a mãe.
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O Bb completou um aninho e minha última visita foi uma semana após a data do
aniversário. M pede que eu fique parada na porta e pegue o Bb no colo. Em seguida M
caminha uns 5 passos e pede que eu coloque o Bb em pé e solte lentamente seus
bracinhos. Para minha surpresa, o Bb inicia sua caminhada em direção a mãe e quando
chega até ela, abre um imenso sorriso, gargalha e M o abraça e o beija intensamente no
rosto. M conta que o Bb começou a andar no dia anterior e que P e ela estão muito
orgulhosos do Bb e deles próprios, pois sentem que os cuidados com o Bb valeram a
pena e que ele está dando muitas alegrias a família. Conta também que o Bb quando vai
mexer em algo que não pode ter acesso e recebe uma negativa dos pais, ele fica bravo e
vira o rosto em sinal de protesto. M diz “até parece gente grande, pode?”
Spitz (1962) também comenta sobre esta importante fase do bebê. O autor refere
que durante esta faze podemos distinguir 3 elementos na mãe que proíbe algo a criança:
gesto da mãe, seu pensamento e seu afeto. É muito provável que a criança não
compreenda o porque das razões que a mãe possa ter para lhe impor uma interdição.
Portanto não é o pensamento da mãe que o bebê incorpora. A criança nesta fase não
dispõe do pensamento racional, ela não sabe se a mãe lhe impõe uma interdição porque
teme que a criança se prejudique ou se ela está zangada porque a criança cometeu um
ato proibido. O que a criança compreende do afeto da mãe é: não estás ao meu lado,
portanto estas contra mim – é o inicio da comunicação com utilização de símbolo – a
aquisição do sinal de negação e da palavra passam a ser vistos como os formadores do
“terceiro organizador”.
Até o momento, o que pude compreender é que a família está unida, adaptada e
muito disposta a acertar no que diz respeito aos cuidados afetivos e amorosos para com
o bebê e para com o próprio casal.
Considerações Finais
No entanto, para mim este estudo foi de fundamental importância para poder
pensar e compreender, a importância da estrutura familiar para um bebê no que diz
respeito ao seu desenvolvimento físico e emocional. Pude observar que a maturidade do
bebê vai de encontro ao que muitos pesquisadores se dispuseram uma vida inteira a
estudar e que os bebês quando bem atendidos em suas demandas respondem com um
desenvolvimento afetivo positivo e a aquisição de novas etapas são atingidas com
menos angústias.
Referências Bibliográficas
Klein, M Algumas conclusões teóricas sobre a vida emocional do bebê. Zahar, 1952.
Villar, N World Health Organization 2005 global survey on maternal and perinatal
health research group – Multicentre Prospective Study. BMJ, 335:1025, 2007.