REVISTA BRASILEIRA DE DIREITO PROCESSUAL - RBDPro- ano 22: n. 88 - cutubro/dezembro 2014 - Publicacéo trimestral DN Se” beet” Ef | oe YOUU EW NyProcesso e Republica: uma relagao necessaria Dierle Nunes Doutor em direito processual (PUC Minas/Universita degli Studi ci Roma “La Sapienza”). Mestre em direito processual (PUC Minas). Professor permanente do PPGD da PUC Minas. Professor adjunto na PUC Minas e na UFMG. Secretério-Geral Adjunto do IBDP e Memibro fundedor do ABDPC. Advogado. Membro da Comissao de Juristas que assessorou na elaboragdo do Novo Gédigo de Proceso Chil na Camara dos Deputados. Alexandre Bahia Doutor em Direito Constitucional ~ UFMG, professor adjunto na UFOP e IBMECMG. Vivemos na sociedade brasileira uma crise de responsabilidade e solidariedade social, ou seja, uma crise de publicismo, pela cooptagao do interesse piblico pelos atores que buscam representélo no ambito estatal. E 0 problema nao é $6 dos agentes do estado, que privatizam o interesse Piblico segundo suas contingéncias privadas (pré-compreensées, interesses etc.), mas de todos os cidadaos que, predominantemente, proferem decisdes pessoais em consonancia com suas buscas individuais de beneficios. Um bom exemplo disto é o recente pleito eleitoral no qual, no discurso de escolha de cada um dos eleitores, de modo mais comum, se encontra(va) a busca daquilo que poderia melhor representar os ganhos pessoais ou do grupo (classe) social ao qual pertence. Poucos analisaram os projetos dos candidatos e muitos votaram em conhecidos ou pessoas que diziam que atenderiam a seus interesses morais, religiosos, mesmo financeiros, ou seja, privados. Esta crise, ao lado das outras, vem sendo denunciada por muitos acerca do déficit do trato da “coisa piblica” em busca do exercicio de um poder participado, ou Seja, nao solitario, fiscalizado mediante ferramentas habeis a controlar potenciais desvios. A solidariedade social ndo ocorre apenas na participacdo em eleigdes, mas certamente a forma como pessoas/grupos tratam daquela denuncia seu éxito ou déficit.* Em nosso caso, 0 tratamento privatistico da questo mostra uma auséncia de habitus (Bourdieu) republicano. Pequenas privatizagdes da “res publica” fazem parte to intima do nosso cotidiano que nao € de se admirar 0 quanto a populagao & refrataria a tratar de questdes “macro”, i.6, que vao além do seu interesse préprio. Ora, um pais carente de Repiiblica 6 a Gnica forma de explicar as pequenas aristocracias, estatais ou n&o, que cooptam o espago (e parcela do dinheiro) piblico, fazendo * Conferir discusso sobre o auxilio-moradia para o magistrado: http://migre.me/mbeWy. R. bras. Dir, Proc. RBDPro | Belo Horizonte, ano 22. n. 88, p. 275-284, out /dez. 2014 275DIERLE NUNES, ALEXANDRE BAHIA com que, a0 lado dos “sobreintegrados”, que gozam das benesses do “publicus convivam os “subintegrados”, relegados ao “privatus” (em um dos sentidos possiveis do latim, ou seja, “excluidos”). Perceba-se que beneficiérios do piblico-estatal nao so apenas seus servidores/agentes politicos, mas também, no Brasil, o mercado e 0 Ambito tido como “privado", uma vez que este se alimenta de beneficios diretos indiretos provocados por aquele. No micro 4mbito do sistema processual este panorama se repete em grande medida em decorréncia da tendéncia de um comportamento ndo cooperative dos sujeitos processuais, especialmente, quando se percebe a animosidade latente (ou declarada) entre as profissées juridicas; no podendo olvidar a propria realizagdo de suas atividades isoladas a partir do horizonte e do papel que desempenham dentro do aludido sistema. Dificilmente vemos um profissional de nossa area promovendo uma autoandlise mais profunda do seu papel e dos vicios da atividade que desenvolve. E mais facil. sendo advogado, acusar o juiz das mazelas do sistema, e sendo juiz, acusar 0 advogado das agruras que padece no seu cotidiano (e isto se repete para os outros “atores": Ministério Pablico, serventudrios etc.) - de forma similar, aliés, que se faz quando se diz que “o povo” nao sabe votar ou que “os politicos” so corruptos, esquecendo nés que fazemos parte do primeiro e escolhemos os segundos. A Apresentacio (real) da advocacia como fung&o essencial & administracao da: justia vem alardeada como capaz de promover defesa técnica com competéncia de atuac&o (Handlunskompetend, e cria a ilusio de auséncia de déficits técnicos muito sérios em muitos profissionais que atuam no exercicio do minus, facilmente constataveis empiricamente por qualquer um que milita no foro. A defesa corporativa dos beneficios da classe muitas vezes despreza 0s riscos publicisticos a que isto pode conduzir. Mais uma vez 0 caso é de se lembrar ai nossas agdes privadas tém repercuss&o pliblica, ainda mais agdes de uma profis: (a advocacia, 0 parquet etc.) que majoritariamente agem face ao “Estadojuiz”. Do mesmo modo, a apresentagao do juiz como protagonista do sistema a com imparcialidade julga corretamente traz algo a ser contestado. © mito da imparcialidade (neutralidade) como blindagem ao elemento animi do juiz faz crer no seu desinteresse no julgamento, de modo absoluto, conduzindo desprezo de suas pré-compreensées e propensdes cognitivas solitérias no ato de julgan E aqui nao se esta discutindo a imparTialidade (com T - ou terzieta), co J& comum entre os processualistas, como postura de “ndo parte” que vedaria magistrado qualquer fungo tipica das partes.? 2” GI. NUNES, Dierle. Processo jurisdicional democrético. Curitiba: Jurué, 2008 > Acerca do tema ef. CABRAL, Anténio do Passo. Imparciaidade e impartilidade. In: DIDIER, Fredie (er (coords). Teoria do processa: panorama doutrinério mundial. Salvador, JusPodivm, 2008. 276 A. bras. Dit, Proc. = RBDPro | elo Horizonte, ano 22, n. 88, p. 275281, out de.PROCESSO E REPUBLICA: UMA RELAGAO NECESSARIA Se critica se faz a falaciosa auséncia de elemento animico do julgador ou posta neutralidade, quando se constata a existéncia de verdadeiros ancoramentos itivos* promovides antes do proprio processo (como, por exemplo, 0 preconceito nsciente em relagdo a grupos étnicos/raciais ou de diverse orientagao sexual)® propensdes cognitivas produzidas durante 0 processo (v.g. contaminagao cognitiva magistrado que teve contato com a prova excluida por ilicitude), para nao falar da mao prévia daqueles que so os julgadores, em sua maior parte provenientes das lites econdmicas do pais, chegando-se ao ponto até de haver certa “coincidéncia” sobrenomes (mais uma vez, em sentido oposto aos mecanismos republicanos).® Em face da quantidade de trabalho de um sistema que jé conta com mais de milhdes de processos” segundo o diltimo relatério “Justiga em Nimeros” do CNJ, tendéncia de contaminagao cognitiva em busca de maior rapidez do julgamento isa Ser levada em consideracao. Estudos empiricos (psicolégicos e juridicos), realizados com magistrados iericanos, demonstram que o juiz sofre propensdes cognitivas que o induzem a ‘ar atalhos para ajudéo a lidar com a pressao da incerteza e do tempo inerentes processo judicial. £ evidenciado que mesmo sendo experiente e bem treinado, sua nerabilidade @ uma ilusao cognitiva no julgamento solitario influencia sua atuacao.* Um exemplo singelo encontrado nas pesquisas, que aclara esta situagio, é a pensao do magistrado que indefere uma liminar a julgar, ao final, improcedente o dido. Por um efeito de bloqueio ficou demonstrado que o juiz fica menos propenso @ mudanga de sua decisao mesmo @ luz de novas informagdes ou depois de mais ‘tempo para a reflexao, Tal bloqueio cognitive ocorre por causa da tendéncia a querer Justificar a alocaco inicial de recursos (fuga ao retrabalho), confirmando que a decisao inicial estava correta.? Tal constatagao deve induzir 0 fomento ao debate como ferramenta de quebra das ilusdes e propensdes cognitivas. E aqui poderfamos ampliar no caso brasileiro para o uso de ementas de julgados e siimulas sem reflexo e como &ncoras facilitadoras dos julgamentos, com 0 dinico sentido privade de otimizar numericamente o niimero de decisdes. Faz-se uso de sGmulas e “precedentes” sem a devida recuperaco do(s) caso(s) paradigma(s), m estudioso importante da temiética é o Professor Eduardo José Fonseca da Costa, que promove em seu trabalho doutoral um estudo do dilema dos poderes oficiosos de produgéo de prova pelo magistrado fem face das propensées cognitivas. KANG, Jeny etal. Implicit Bias in the Courtroom. UCLA Law Review. v. 59, 2012, p. 1175. ALMEIDA, Frederico Normanha Ribeiro de. A Nobreza Togads: as elites jurdicas e a politica da justica no Brasil. ‘ese apresentada no Departamento de Ciencia Politica da USP. Sao Paulo, 2010. Disponivel em: http://migre. me/m&Fog, Disponivel em: htto://migre.me/mSFmnj GUTHRIE, Chris, RACHLINSK\, Jeffrey J., WISTRICH, Andrew J. Inside the judicial mind, Comelt Law Review, 777, May, 2001, p. 778829. LYNCH, Kevin J. The lockin effect of preliminary injunctions. Florida Law Review, Vol. 66. Ap. 2013. p. 779-821. bras. Dir, Proc. ~ RBOPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 88, 9.275281, out /cez. 2024 277DIERLE NUNES, ALEXANDRE BAHIA valendo-se apenas de ementas ou do pequeno texto das siimulas, como se uns e outros pudessem ter algum sentido sem aquilo (os casos) que Ihes deram origem e se confundindo a ratiodecidendi (fundamento determinante) com algum trecho da ementa ou do voto.*° ‘Ademais, néo podemos nos olvidar da dentincia empreendida por Carlos Maximitiano por mera observacéio, em 1925, de que os profissionais tendem a lei do menor esforgo no uso do direito jurisprudencial.”* O jurista jamais imaginaria como este uso seria mais vocacionado ao que criticava e que estudos empiricos atuais informariam que isto decorreria inclusive da propensao de confirmago (confirmation bias) que induz 0 intérprete a um raciocinio distorcido, de uso e confirmagao de todo material (v.g. provas, julgados) que atesta uma versao dos fatos (que acredita) e negligencia e desprezo a tudo que a contradiz. Tal percepeao de contaminagao cognitiva e auséncia de neutralidade em outros paises induz a promogaio de estudos sérios com a finalidade de criagdo de contramedidas. O National Center for State Courts (NCSC), por exemplo, organizou um projeto piloto de trés estados (Califomia, Minnesota e Dakota do Norte) para ensinar jufzes e funcionérios do tribunal sobre as propensdes do magistrado ao julgar em matéria que envolva preconceito. Em verdade, fol necessdrio demonstrar cientificamente aos juizes sobre as cognigées socials implicitas, os problemas destas propensdes cognitivas (para tomada das apontadas e contramedidas técnico- processuais) e os riscos que elas trazem para 0 bom julgar,*? inclusive aumentando a importancia do sistema recursal. Todas estas constatagdes que mostram a autenticidade de preocupacdes académicas envolvendo a critica ao solipsismo e protagonismo judiciais,* de um lado, e com a busca estratégica de sucesso, inclusive de ma-fé, além da ateonia, por parte dos advogados, de outro, demonstram empiricamente a existéncia do problema e 2) necessidade de dimensionamento de contramedidas processuais com a finalidade de: esvaziar e controlar os comportamentos n&o cooperatives € contaminados de todos 08 Sujeitos processuais. Torna-se imperativo, ao se pensar o sistema processual, a criagdo de: mecanismos de fiscalidade ao exercicio dos micropoderes exercides ao longo do iter ® CF. NUNES, Dierle; BAHIA, Alexandre Melo Franco. Enunciados de Simulas: Falta aos tribunais formulaca robusta sobre precedentes. Consultor Jurfaico, 07/01/2014. Disponivel em: http://migre.me/mbeEA. 11 “Em virtude da lei do menor esforgo e também para assegurarem 0s advogados 0 éxito € os juizes inferiores = manutencao de suas sentencas, do que muitos se vangioriam, preferem, causidicos ¢ magistrados, 8s expose ‘ebes sistomaticas de doutrina juridice os repositérias de jurisprudéncia". SANTOS, Carlos Meximiliano Preis dos. Hermenéutica e aplicacao do direito, Rio de Janeiro: Forense, 1993. p. 181. Percepodo feciitadora também percebida em outros contextos como 0 processo penal, por todos, 0 excelente livro: ROSA, Alexandre Morais Ga Guia Compacto do Processo Penal conforme a teorla dos jogos. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2014, p. 31. 32 KANG, Jemry et al. Implicit Bias in the Courtroom, UCLA Law Review. v. 59, 2012. p. 4475, NUNES, Dierle: DELFINO, Licio. Juiz deve ser visto como garantidor de direitos fundamentais, nate mais Disponivel em: http: //migre.me/m7Fow. 278 R. bras. Di. Proc. - RBDPto | Selo Horizonte, ano 22, n. 88, p. 275-282, out /dez. 2038PROCESSO E REPOBLICA: UMA RELAGRO NECESSARIA processual, além da criagdo de espagos de interago (participacéio) que viabilizem consensos procedimentais aptos a viabilizar, no ambiente real do debate processual, a prolacao de provimentos que representem o exercicio de poder participado, com atuago e influéncia de todos os envolvidos. Esta é uma das finalidades de um proceso democratico lastreado numa teoria deontolégica de comparticipagaio/cooperacao, por nds defendida desde 2003," © projetada no Novo Cédigo de Processo Civil,'> mediante a indugdio de balizas procedimentais fortes do contraditério, como influéncia e ndo surpresa (art. 10),2° boa-fé processual (art. 5),*7 cooperacao (art. 6°)** e fundamentacao"’ estruturada da decisao (art. 499).2° Na sintese empreendida por Francisco José Borges Motta e Adalberto Narciso Hommerding, nossa proposta de democratizacdo do proceso civil parte “dos eixos da comparticipagdo e do policentrismo. A ideia defendida é a de que, numa viséo constitucional e democratica, nao existe entre os sujeitos processuais submissdo (como no esquema da relagao juridica biilowiana), mas, sim, interdependéncia, na qual 2 procedimentalidade € a balizadora das decisdes. O processo é percebido como uma garantia contra o exercicio ilegitimo de poderes piblicos e privados em todos os campos (jurisdicional, administrativo, legislativo), com o fim de controlar os provimentos dos agentes politicos e garantir a legitimidade discursiva e democratica das decisdes. Argumenta-se no sentido de que o estabelecimento de focos de * 0 recurso como possibilidade juridicodiscursiva das garantias do contraditorio e da ampla defesa, Faculdade Mineira de Direito, Pontificia Universidade Catélica de Minas Gerais, Belo Horizonte: 2003. Em verso publica da: Direito constitucional ao recurso. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006. NUNES, Dierte. Pracesso jurisdicional democratico. Curitiba: Jurud, 2008, 2 Texto disponivel em: http://migre.me/mb7bL 8 An. 10. Em qualquer grau de jurisdicd0, 0 Grgao jurisdicional ndo pode decidir com base em fundamento a respeito do qual nao se tenha oportunizado manifestacao das partes, ainda que se trate de matéria apreciavel de oficio, #7 Art. 58, Aquele que de qualquer forma participa do proceso deve comportar-se de acordo com a boaé. 8 “Art. 62, Todos os sujeitos do proceso devem coopera’ entre si para que se obtenha, em tempo razoavel, decisdo de mérito justa ¢ efetiva. # Problema da fundamentac3o ha muito estudado pela Escola Minelra de Direito Processual: BRETAS DE CARVALHO DIAS, Ronaldo. A fundamentagao das decisSes jurisdicionais no Estado Demecratico de Direito. In. Processo e Constituigdo: estudos em homenager 20 professor José Carlos Barbosa Moreira. FUX, Luiz; NERY IR., Nelson; WAMBIER, Teresa Arruda AWvim (Coord.). $0 Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. ® “Art, 499. So elementos essenciais da sentenga: [..] §1° Nao Se considera fundamentada qualquer deciséo judicial, seja ela interiocutéria, sentenga ou acdrd8o, que: | ~ se limitar & indicagSo, & reproducao ou a paré- frase de ato normativo, sem explicar sua relagao com a causa ou a questo decidida; Il ~ empregar canceitos Juridicos indeterminados, sem explicar 0 motivo conereto de sua incidéncia no caso; Ill - invacar motives que ‘se prestariam a justificar qualquer outra decisdo; IV ~ no enfrentar todos os argumentos deduzidos no pro- ‘cesso capazes de, em tese, infirmar a conclusao adotada pelo julgador; V — se limitar a invocar precedente ‘ou enunciado de simula, sem identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob Julgamento se ajusta Squeles fundamentos; VI - deixar de seguir enunciado de stimula, jurisprudéncia ou precedente invocado pela parte, sem cemonstrar a existéncia de distingao no caso em julgamento ou a su peracdo do entendimento. §2 No caso de colisdo entre normas, o 6rga0 jurisdicional deve justificar 0 abjeto 0s critérios gerais da ponderagao efetuada, enunciando as razGes que autorizam a interferdncla na norma afastada e as premissas féticas que fundamentam a conclusdo. §3* A decisao judicial deve ser interpretada ‘ pattir da conjugacdo de todos os seus elementos e em conformidade com o principio da boa-é.” R. bras. Dir. Proc. = RBDPro | Belo Horzocte, eno 22, n. 88, p. 275281, out /cez. 2014 279DIERLE NUNES, ALEXANDRE BAHIA centralidade (seja nas partes, seja no juiz) no se adapta ao perfil democratico dos Estados de direito da alta modernidade. Assume-se um paradigma procedimental de Estado Democratico de Direito, no qual se impde a prevaléncia concomitante da soberania do povo e dos direitos fundamentais (cooriginarios e reciprocamente constitutivos) em todos os campos, especialmente na esfera estatal. No ambito jurisdicional, resgata-se a discussdo entre todos os sujeitos processuais, sem privilégios a qualquer deles, mediante a implementagao dos direitos fundamentais, que balizam a tomada de decisdes em seu aspecto formal e substancial. Propde-se a divisdo da atuagaio entre as partes e os juizes, clarificando a sua interdependéncia, de modo a absorver os aspectos benéficos tanto dos movimentos liberais quanto dos sociais. Aposta-se na leitura do contraditério na modalidade de garantia de influéncia como referente constitucional do policentrismo e da comparticipago, em vista de que agrega, ao mesmo tempo, 0 exercicio da autonomia piiblica e privada, torando © cidadao simultaneamente autor e destinatario do provimento”.* Assim, com 0 Novo CPC, se constata que o sistema normativo exorciza @ incrustada verso que imprime aos principios constitucionais esséncia meramente formal, acomodando as partes € seus advogados em um arranjo afetado e ficcional em que 0 contetido legitimo e democratico de uma decisdo sogobra diante das pré-compreensdes para as quais o decisor obteve (ou nao) comprovacéo nos autos ou que o’mesmo gerou ancoramentos e bloqueios ao julgar. Os principios constitucionalizados do processo exigirao do juiz que mostre de forma ostensive como formou sua decisao: ndo pode decidir questdes de oficio sem consulta prévia as partes; ndo pode citar leis/precedentes/stmulas sem mostrar como se aplicam ao caso; nao pode fazer “ponderagdes” de principios sem igualmente mostrar sua pertinéncia 8s especificidades dos autos. Tudo isso implica o reconhecimento legal de uma renovada ideia de contradit6rio que j defendemos ha anos. Tais principios. mais do que nunca, sero compreendides como normas retoras do processo no di a dia dos profissionais. Buscase assim publicizar 0 debate processual entre todos os sujeitos processuais, de forma que 0 processo deixe de ser formado por atos isolados sujeitos processuais e passe a ser 0 produto da comparticipagao destes na forma do provimento jurisdicional. Reconhece-se que ha papéis distintos, mas que to cooperam para o resultado final. 2 Revista do Ministério Pablico do RS, Porto Alegre, n. 73, jan. 2013 ~ abr. 2013. Acessivel em http://\ ~amprs.org br/ erquivos /revista_artigo /arquivo_1383852047 pdf Acerca do processo constitucional cont BRETAS DE CARVALHO DIAS, Ronaldo. Processo constitucional e Estado democritico de direito. Belo Hi Del Rey, 2010. Para uma analise critica do direito & prova sob o enfoque no Novo CPC: BRETAS DE CAF DIAS, Ronaldo. Las pruebas en el proyecto del nuevo Cédigo de Proceso Civil Brasilefio: sistema nor vo constitucional. In RUA, Ménica Bustamante. Reformas procesales en Colombia y en el mundo. Ni Universidad de Medellin, 2014. p. 509-522. no 22, n. 8B, p. 275-281, out/aez. 280 R. bras. Dir, Pros. ~ RBDPrO | Belo HorizontePROCESSO E REPUBLICA: UMA RELACAO NECESSARIA Ahora é de fazermos um balango sobre o tipo de sociedade, e, no particular, que de processo, queremos. Urge que os principios republicanos sejam incorporados nossas acdes privadas e na forma como lidamos com o piiblico. De igual forma, é tempo de 0 processo ser revestido de seu carter piblico, significando isso apenas ester ligado a uma fungao do Estado, mas, sim, que local piiblico, franqueado a todos; ademais, que em uma sociedade republicana, qual reconhegamos que, ao lado da necessidade da decisao, esta, em relacdo tensao, 0 requisito da corregao da mesma. Essa equacdo, como dito, nao sera vida dando-se preferéncia absoluta a celeridade, ao julgamento de casos como S” que podem ser remetidas a uma stmula/precedente, considerados, uns itros de forma abstrata. Nao é essa a leitura “sob a melhor luz” (Dworkin) dos ‘ipios do Estado Demoeratico de Direito. Cumprir nosso dever constitucional de respeito ao devido processo legal, contraditério e & ampla defesa so as Gnicas formas de se produzir decisées mas; a0 mesmo tempo, se tais decisdes so 0 produto nao da atividade sobre- ‘ana de um juiz, mas do trabalho comparticipado de todos os sujeitos, logo, pode- -ganhar também em celeridade. Informago bibliogréfica deste texto, conforme a NBR 6023:2002 da Associagdo Brasileira de Normas Técnicas (ABNT): NUNES, Dierle; BAHIA, Alexandre. Proceso e Repdblica: uma relagdo necesséria. Revista Brasileira de Direlto Processual ~ RBDPro, Belo Horizonte, ano 22, n. 88, p. 275-281, out,/dez. 2014, 0, Dir. Po. - RBDE(e 1 Belo Hrzorte, ano 22,5 8, p 275268, eu en. 2034 281