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JOANA SANCHES JUSTO

MASSA E PODER:
ALGUMAS REFLEXÕES

LONDRINA,
2002
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APRESENTAÇÃO

Desde as tantas transformações pelas quais a civilização já passou,


destaca-se a maneira que as populações formaram seus grupos em diferentes épocas e
localidades. Durante a Idade Média as populações se organizavam em unidades
econômicas, políticas e sociais dentro de fortificações estabelecendo relações de estreita
dependência com a terra e seus senhores através de trocas entre famílias que viviam no
mesmo feudo.
As relações no interior de cada feudo eram muito bem delimitadas, visto
que cada grupo social tinha um papel definido na sociedade e o indivíduo não podia
ascender socialmente. Cabia ao senhor das terras deter o poder sobre as trocas de
produtos e a política de seu feudo, reunindo empregados e suas famílias e dando-lhes
proteção e terras em troca do plantio de seus produtos.
Entretanto, recentemente é possível observar uma mudança nas
estratégias sociais da massa: ao invés de as pessoas se reunirem, acontece a dispersão.
Prevalece hoje uma tendência à divisão das grandes corporações dando lugar ao
indivíduo que já não mais vive em grupo, tendo neste e na comunidade apenas uma
referência. Surge um sujeito isolado, fragmentado e desconectado de uma identidade
social estável.
De acordo com Justo (2001), vive-se uma enorme expansão do
tempo-espaço, dando origem a um homem em constante movimentação, ao nomadismo
das pessoas que habitam casas tanto na cidade em que mora a família, quanto na cidade
onde trabalham, pois já não vivem mais no interior do grupo familiar, enfim, à
circulação não só das pessoas, mas da informação, pela internet, da profissão, uma vez
que o risco do desemprego obriga as pessoas a terem várias formações.
Assim sendo, a estratégia dos grupos agora não mais é o agrupamento de
várias famílias dentro de fortificações, mas de controle sobre seus integrantes através da
manipulação do seu ritmo e sua movimentação. Aquele que direciona o fluxo e ritmo
da comunicação, das mercadorias, é o detentor do poder sobre as massas.
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MASSA E PODER: ALGUMAS REFLEXÕES

Ao se adotar uma ética que é racional e racionalizadora para o capital, a sociedade


capitalista ocidental ignora a formação histórica do capitalismo e a constituição das
relações sociais contemporâneas. É contextualizando tal sistema no espaço e no tempo
que pode-se iniciar uma análise.
A sociedade se acha de tal forma constituída que o conflito e a interação de seus
elementos principais formam o fator principal de seu crescimento e mudança (foi assim
que ocorreu com o surgimento, consolidação e expansão do capitalismo).
Nos séculos que antecederam o capitalismo a unidade econômica de produção era o
feudo, tendo por base a economia agrária, amonetária, não-comercial e auto-suficiente.
Cada propriedade feudal tinha um senhor. No perído feudal cada senhor possuía a
sua terra e não havia terras desocupadas. O senhor feudal morava em um castelo ou em
uma grande casa dentro de uma fortificação onde viviam a sua família, seus
funcionários e empregados que administravam a sua propriedade.
Neste período as terras, portanto, tinham grande importância, pois além de abrigar
inúmeras famílias dentro das fortificações, eram também o eixo da economia, já que a
terra produzia praticamente todas as mercadorias de que necessitavam. Na Idade Média
a riqueza de um homem era medida pela quantidade de terras que possuía.
As relações sociais neste período igualmente giravam em torno das terras, tanto
verticalmente, como a relação senhor-servo quanto horizontalmente, como a relação
suserano-vassalo. Na sociedade feudal cada grupo social detinha uma função. O clero
cumpria a função da salvação da alma do povo, a nobreza deveria proteger a todos e os
servos deveriam trabalhar para sustentar os seus senhores. Assim se justificava a
exploração do servo e a necessidade dele seguir os desígnios da Igreja.
As relações de fidelidade entre vassalos e suseranos, bem como a estrutura
hierárquica da sociedade é o que garantiam nesta época a união social. Assim sendo,
pode-se assinalar a dependência como uma forte característica deste sistema.
Em meados do século XVI o feudalismo, entretanto, se mostra um sistema político
saturado, não mais correspondendo às expectativas sociais da época, devido ao avanço
da vida urbana e mercantil causado pela melhora das condições de vida, ressurgimento
das cidades e conquista de novas terras.
O fim das invasões na Europa proporcionou ao homem medieval melhores
condições de adaptação à terra. As epidemias que assolaram aquele continente logo
após as invasões diminuíram com o isolamento da população em feudos, pois
dificultava o contágio. Em conseqüência, o índice de natalidade começou a superar o de
mortalidade, fazendo com que os senhores expulsassem o excedente populacional de
suas terras e levando esta população marginalizada a se estabelecer em antigos centros
urbanos, sobrevivendo de saques.
A solução encontrada para reduzir o contingente populacional foi a formação de um
exército para a luta nas Cruzadas - a reconquista das terras perdidas. Com a conquista
destas terras reativou-se a vida urbana abrindo caminho ao surgimento de um novo
grupo social: os mercadores. Suas atividades, fundamentadas nas concepções de lucro e
de capitalização, prenunciavam o desenvolvimento tipicamente capitalista, entre os
séculos XV e XVI.
A partir dos séculos XV e XVI, a expansão da rede comercial incorporou e
provocou o desenvolvimento tecnológico que fomentou novas possibilidades de
navegação a longa distância. Ao mesmo tempo em que se desenvolvia o comércio em
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larga escala, ocorria o desenvolvimento da manufatura, em substituição às corporações


de ofício remanescentes do período feudal. Foi o momento da transição do feudalismo
para o capitalismo.
Entretanto a transformação de um modo de produção em outro não se dá de maneira
abrupta, as etapas de transição não foram, de forma alguma, nítidas:

durante certo período o novo modo de produção, ligado às novas forças


produtivas e potencialidades econômicas, deverá expandir-se muito além dos limites
dentro dos quais o antigo sistema estava destinado a se mover, até que, por sua vez,
as relações de classes e as formas políticas determinadas, nas quais a nova classe
dominante afirma seu poder, entrem em conflito com algum desenvolvimento
ulterior das forças produtivas, e a luta entre as duas seja levada a um clímax mais
uma vez (Dobb, 1988, p. 12).

Na segunda metade do século XVI e XVII, quando o capital começou a penetrar na


produção em escala considerável - seja na forma de uma relação bem amadurecida
entre capitalista e assalariados, seja na forma menos desenvolvida da subordinação dos
artesãos domésticos a um capitalista - é que podemos situar a fase inicial do capitalismo
na Inglaterra. Um momento decisivo dessa instauração foi a Revolução Industrial no
final do século XVII e a primeira metade do século XIX, cuja importância foi
essencialmente econômica mas também apresentando reflexos na ordem política. A
Revolução Industrial representou a transição de um estágio inicial e ainda imaturo do
capitalismo para uma fase mais moderna caracterizada pela acumulação de capital,
graças aos progressos tecnológicos que tornaram possível a criação da indústria, e pela
criação de uma classe operária emancipada de obstáculos históricos anteriores (o
pequeno produtor passou a se ver livre das obrigações feudais, foi desapropriado dos
meios de produção e passou a ser subordinado ao trabalho assalariado para conseguir a
subsistência). Tal revolução se mostrou

tão decisiva para todo o futuro da economia capitalista, tão radical como
transformação da estrutura e organização da indústria que levou alguns a considerá-
la como as dores de parto do capitalismo moderno, e, portanto, o momento decisivo
no desenvolvimento econômico e social desde a Idade Média (Dobb, 1988, p. 15).

Em um primeiro momento pode-se ter a impressão de que foi a ordem econômica


capitalista, característica de um tempo distinto, que originou a sociedade de classes, ou
seja, pode parecer que a divisão da sociedade em classes hierarquizadas seja algo
“natural” do capitalismo, porém uma análise mais minuciosa leva-nos a concluir que tal
divisão esteve presente em vários períodos históricos. Podemos estabelecer dessa forma
uma uniformidade qualitativa, onde a classe social politicamente dominante de cada
época, usará seu poder para conservar o sistema e manter sua posição.
No capitalismo a relação entre classes é estabelecida por um modo de produção
cujos meios estão nas mãos dos capitalistas que visam “acumular e reproduzir a riqueza
social e assegurar os meios para a apropriação privada dessa riqueza” (Chauí, 1999, p.
38). Essa é uma peculiaridade do capitalismo já que nos sistemas anteriores a riqueza
social não aumenta nem diminui, apenas muda de mãos. O conflito entre as classes
surge do fato de que ao se apropriar privadamente dos meios de produção a classe
dominante força as classes expropriadas a trabalhar para eles mediante a um salário, ou
seja, o “trabalho se torna assalariado e submetido às leis da sociedade privada
capitalista” (Chauí, 1999 p. 39 apud Lafargue).
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A sociedade capitalista baseia-se na ideologia da igualdade, cujo parâmetro é o


mercado. Por um lado está o trabalhador que oferece sua força de trabalho, por outro, o
empregador que a adquire por um salário. A idéia de “equivalência” na troca é crucial
para a estabilidade da sociedade capitalista. Os homens aparecem como iguais diante da
lei, do Estado, do mercado, etc. e assim vêem a si mesmos.
Mas, embora o processo de venda da força de trabalho por um salário apareça como
uma troca entre equivalentes, o valor que o trabalhador pode produzir durante o período
em que se emprega é superior àquele pelo qual vende suas capacidades, seu salário. A
força de trabalho

é uma mercadoria peculiar: ela é a única capaz de produzir valor. Uma parte
desse valor apropriada sob a forma de trabalho excedente, é trabalho não pago e
passa a integrar o próprio capital. Transforma-se assim numa riqueza que se
encontrará em oposição à classe dos trabalhadores (Oliveira, Quintaneiro, 1995).

Assim surge a taxa da mais valia, que é a expressão do grau de exploração da força
de trabalho pelo capital. Nesse aspecto o capitalismo não deve ser considerado apenas
um sistema de produção para o mercado – um sistema de produção de mercadorias,
como Marx o denominou – mas um sistema sob o qual a própria força de trabalho se
torna uma mercadoria, comprada e vendida no mercado como qualquer outro objeto de
troca. Surge a alienação, a perda da espiritualidade, a incapacidade de o homem fazer
uso de suas próprias potencialidades .
O trabalho, antes considerado uma pena imposta pela justiça divina, tornou-se não
só uma obrigação moral, mas também sinônimo de virtuosidade e os trabalhadores que
antes recebiam como pagamento produtos, gêneros alimentícios e moradia passaram a
receber em moeda por seu trabalho.
Neste novo sistema econômico e político o dinheiro causa um efeito
perturbador sobre a massa de trabalhadores. O próprio dinheiro é um símbolo de massa,
pois a acumulação de cada moeda origina uma quantidade, um tesouro. Mas atualmente
uma nova relação com a moeda foi criada: esta adquiriu um caráter abstrato, deixando
de ser uma unidade e sendo substituída pelo milhão.
A palavra ‘milhão’, entretanto, emprega-se não apenas à fortuna, mas
também às pessoas, o que assemelha ainda mais massa e dinheiro. Na inflação, quanto
maior a massa, menor seu valor. A característica de crescimento rápido e ilimitado
passa a ser negativa. As pessoas também se sentem desvalorizadas devido à sua
identificação com o dinheiro, já que um representa o outro. “Quando os milhões
escalam as alturas, um povo inteiro, composto de milhões, torna-se nada.” (Canetti,
1995, p. 185)
É interessante notar que, de acordo com o mesmo autor (1995), nenhuma
desvalorização é esquecida, mas sim deixa marcas nesta massa empobrecida que é
atingida pela inflação independentemente da hierarquia social de cada componente, já
que tanto o empresário quanto o trabalhador rural sofrem as conseqüências da inflação.
Estas dolorosas marcas deixadas pela perda de valor só podem ser esquecidas caso seja
encontrado algo que tenha ainda menos valor que a própria massa prejudicada e que lhe
será retirado valor até que se torne insignificante.
Esta marcante alteração nas relações de trabalho e no modo de produção fez também
com que as relações sociais fossem transformadas. Com a migração cada vez maior do
campo para as cidades devido ao declínio da comunidade agrária voltada à subsistência
e a busca do acúmulo de capital, já não havia espaço para uma vida tão coletiva quanto
nos feudos.
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O homem não mais vive no mundo rural em relação harmônica com a tradição, os
costumes, a natureza. A sociedade deixou de ter uma estrutura estamental para dar lugar
à divisão em classes sociais e à uma massa de consumidores, livres, assalariados, que
não mais vivem em grandes propriedades rurais com seu senhor, mas agora em
propriedades privadas apenas com a sua família nuclear, com novas maneiras de
conviver em grupo e estabelecer contato e vínculos com as pessoas.
Neste contexto, é possível observar como as relações entre as pessoas se
transformaram com o surgimento de novas relações sociais, no trabalho e na família,
trazidas pela privatização da vida cotidiana, pelo acúmulo de capital e pela divisão da
sociedade em classes. Não só o remanejamento da economia e da política são reflexos
destas transformações, mas também o comportamento de massa e as relações de poder
se modificaram a partir desta nova dinâmica da sociedade.
Uma primeira característica a ser ressaltada a respeito do comportamento
de massa é o grande temor do homem no contato com os outros. O medo do toque e da
proximidade é suficiente para nos fazer ansiar por um pedido de desculpas diante de um
contato não proposital no meio da rua. Esta aversão ao contato, transformada em pânico,
faz com que os homens se protejam uns dos outros trancafiando-se em casas cercadas
por altos muros, cercas elétricas1 e apenas assim sentindo-se mais seguros. Apesar disso,
mesmo durante o sono, surge o medo de que algum ladrão possa adentrar e não somente
invadir a propriedade, mas também tocar quem mora nela.
A distância que os homens mantém uns dos outros nas atividades do dia-
a-dia, nos ônibus, no ambiente de trabalho é ditada por este temor e, se por ventura nos
aproximamos de alguém, é porque gostamos desta pessoa e, nesse caso, a iniciativa da
aproximação é nossa.
Entretanto, uma forma de anular ou até de inverter este temor é a massa.
Quando as pessoas se unem em uma multidão, as diferenças, até mesmo entre os sexos,
é diminuída e o contato se torna presente. As pessoas em massa se comprimem umas
contra as outras, se tocam, como que para se libertarem do temor do contato individual.
Quanto maior o contato na massa, maior o alívio.
“Quanto mais energicamente os homens se apertarem uns contra os
outros, tanto mais seguros eles se sentirão de não se temerem mutuamente. Essa
inversão do temor do contato é característica da massa.” (Canetti, 1995, p.14)
A massa se forma através do agrupamento de cada vez mais pessoas em
um local onde outrora se encontravam apenas algumas. Aos poucos o espaço vazio vai
sendo preenchido por muitas e muitas pessoas que se reúnem às vezes até sem saberem
ao certo o motivo de estarem ali.
Ainda assim. ao contrário do que parece, este aglomerado sempre tem
uma meta, a de estar com o maior número de pessoas e evitar a sua dispersão. A meta, o
objetivo da massa, é o de conquistar mais e mais integrantes sem limites para o seu
agrupamento.

Este aspecto é citado na música ‘Muros e Grades’ do grupo Engenheiros do Hawaii: Nas grandes
cidades, no pequeno dia-a-dia/ O medo nos leva tudo, sobretudo à fantasia/ Então erguemos muros que nos dão a
garantia de que morreremos cheios de uma vida tão vazia/ Nas grandes cidades de um país tão violento/ Os muros e
as grades nos protegem de quase tudo/ Mas o quase tudo é quase sempre quase nada/ E nada nos protege de uma vida
sem sentido/ [...] Nas grandes cidades de um país tão irreal/ Os muros e as grades no protegem do nosso próprio mal/
[..] Meninos de rua/ Delírios de ruína/ Violência nua e crua/ Verdade clandestina/ Delírios de ruína/ Delitos e
delícias/ Violência travestida faz seu trotoar/ Em armas de brinquedo/ Medo de brincar/ Em anúncios luminosos/
Lâminas de barbear/ [..] Vamos lutar pelo poder/ Lutar como puder.
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Esta é uma característica da massa denominada aberta, que se forma


espontânea e desordenadamente e não pára de crescer. Não posso deixar de citar o
movimento de massa aberta realizado na Argentina em dezembro de 2001, quando
multidões em diversas localidades do país saíram às ruas batendo panelas para
protestarem e se fazerem ouvir.
Neste acontecimento é possível observar várias características da massa,
tanto por ser aberta, isto é, não estar presa nos limites de paredes ou ruas, podendo se
deslocar livremente, quanto por promover a descarga desta massa, uma vez que todos os
seus integrantes sentem-se iguais e as diferenças de hierarquia e posição social são
dissolvidas.
Também é possível observar neste episódio mais uma característica da
massa, que é a ânsia de destruição, pois as pessoas batiam panelas e outros objetos até
apedrejando vidros dos bancos durante as inúmeras manifestações neste país.
De acordo com Canetti (1995) o contato é expressivamente evitado, a
não ser que quem o exerce através do toque tenha poder suficiente a ponto de que o ser
tocado não possa resistir a este contato e, ainda, tentará fazer com que o acesso a si seja
dificultado evitando ao máximo uma aproximação demasiada dos outros.
Contudo, o poder deve ser distinguido da força, já que esta diz respeito a
algo que se encontra próximo e presente, algo imediato, relacionando-se à força física.
O poder não é tão coercitivo apesar de, em seus estágios iniciais, ser força pura.
Assume, então um caráter mais universal, mais amplo e não tão dinâmico quanto a
força, que é exercida pelo toque bruto, sem dimensão de espaço ou tempo para
desvencilhar-se. (Canetti, 1995)
O poder é usado para evocar a esperança a fim de ser possível sair de
determinadas situações dolorosas. Assim, a caça tem a esperança de escapar ilesa
enquanto corre durante os momentos anteriores ao uso da força bruta pelo caçador.
Também o fiel roga a Deus sua salvação e confere a este o poder de livrá-lo dos
infortúnios.
Um importante e atual aspecto vinculado ao poder abstrato é a
velocidade. Através dela um caçador consegue capturar sua presa. É o poder que um ser
tem de entrar em contato físico com outro no momento em que desejar. O mais veloz
manipula as oportunidades de contato. Assim dizendo, são os animais mais velozes os
que provocam maior medo, como a águia e os felinos, que atacam suas presas em
questão de segundos.
O raio, em sua velocidade impossível de ser controlada pelos homens,
provoca tanto medo que em muitas culturas é adorado como divindade. É devido a este
poder conferido pela velocidade que o homem, desde a invenção do arco e flecha, vem
buscando se tornar um ser mais rápido. Desta forma o homem estará conquistando, pelo
uso da razão, a natureza, fazendo com que as possibilidades de sobrevivência do homem
se expanda.
A velocidade física, como característica do poder, intensificou-se de
todas as formas na atual era tecnológica, explícita principalmente na criação da internet
(que agilizou as transações do mercado e da bolsa), mas também no guerrear, pois está
intimamente relacionada à força, que se mede pelo tempo de ação.(Canetti, 1995) O
capitalismo impõe então uma nova relação dos homens com o espaço e o tempo, uma
relação de voracidade num mundo onde não há mais a necessidade de arco e flecha, pois
existe o progresso tecnológico.
Além da rapidez com que a tecnologia se desenvolve e avança, rápidos e
vorazes se tornaram o vínculo entre os homens, que se desligam da tradição de
calmamente apreender a cultura através da narração da sua história, dos seus valores. A
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experiência compartilhada coletivamente entra em declínio, a vivência agora é marcada


pela individualidade, pela solidão. Os homens tornam-se desorientados, incapazes de se
expressarem ou ouvirem uns aos outros uma vez que não os interessa ouvir os valores
de seus ancestrais porque estes valores já não são os mesmos de hoje.
Entretanto, a perda da capacidade de ouvir acarreta em atrofia do
conhecimento e do espírito crítico e abre espaço para a banalização das criações do
homem e do avanço tecnológico. As mercadorias que os homens produzem passam a
serem usadas irracionalmente porque deixou-se de usar a razão crítica em um mundo
movimentado pelo uso da razão. Os homens vivem em um mundo construído pela
razão, uma vida marcada pela super abundância de mercadorias. (Benjamin, 1933)
O capitalismo, além de empobrecer o espírito crítico e tornar os vínculos
fugazes, cria a construção voraz de mercadorias que facilitam a vida do homem, mas
traz consigo a violência e a destruição pela força, pela guerra (como tem feito os EUA
com o Afeganistão e com o Iraque), trazendo a continuidade da dominação do homem
pelo homem. (Benjamin, 1933)
Mas não basta adquirir força física e velocidade para obter dominação.
Para que se tenha o controle total da massa, é necessário manipular o fluxo da
velocidade, isto é, direcionar as rotas da informação, das pessoas, das mercadorias,
obter o controle sobre o maior número possível de infovias, de rodovias, de linhas
aéreas e sites na internet.
É exatamente por isso que hoje os países voltaram-se para a conquista de
novas rotas e não de novos territórios e também é por este motivo que as estradas e ruas
bloqueadas pela multidão são o palco das manifestações.
Ter poder sobre a massa é, ainda, direcionar o fluxo das pessoas, como é
feito pelos grandes líderes, na presidência ou na favela, já que ultimamente os chefes do
contrabando conseguem obter mais poder do que a polícia e o próprio presidente, que
nem mesmo têm permissão de adentrar em determinadas favelas e nada podem fazer
quando a ordem de fechar o comércio é vinda dos líderes do tráfico. Esta é a
demonstração de força pelo bloqueio dos fluxos, agindo no núcleo do sistema de
exercício do poder.(Justo, 2001)
Outro aspecto do poder é o questionar. Ao perguntar, o inquiridor tem a
possibilidade de saber um pouco mais sobre o questionado, que ao responder, acaba por
revelar mais uma parte de si. Entretanto ao obter a resposta para uma pergunta, surge o
desejo de fazer mais perguntas, uma vez que, de acordo com Canetti (1995), o
inquiridor sente uma elevação de seu poder ao fazer perguntas enquanto toma a
liberdade do questionado que consente em respondê-las.
Mas se o inquirido permanece no silêncio, passa uma imagem de ser mais
forte do que realmente é pois, se cala, é porque tem muito o que esconder. Assim,
aquele que se cala, não se entrega, mas justamente por parecer que esconde muito, é
importante não libertá-lo. É por isso que o silêncio continuado leva à perguntas mais
enérgicas, à tortura.(Canetti, 1995)
Cabe notar que a reunião de inúmeros indivíduos com características
diferentes não constitui apenas uma massa física de pessoas, mas esta junção em massa
acarreta, muito além de uma unidade física, também uma homogeneidade de ideais, de
psiquismo já que isoladamente cada integrante pensa e age diferentemente de quando
em grupo, no qual a mente coletiva predomina à individual. Como no exemplo citado
anteriormente, a população argentina saiu à rua e, se por um lado a massa atraía cada
vez mais integrantes, em seu cerne o objetivo de todas essas pessoas era expressar a
inquietação frente à administração do seu país.
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A propósito, de acordo com Le Bon (apud Freud, 1976), o aspecto da


massa não é a média das características dos seus integrantes, pois há uma transformação
individual ao integrar um grupo. O indivíduo que faz parte da massa sente-se disposto a
realizar coisas que não faria sozinho, rende-se a instintos e o sentimento de
responsabilidade desaparece. Esta desintegração da responsabilidade pode muitas vezes
resultar em atos violentos como nas manifestações populares onde o vandalismo e a
depredação da cidade se fazem presentes. De fato, Canetti(1995) cita a ânsia de
destruição da massa, que depreda objetos e edifícios, provocando prazer nestes atos
agressivos realizados em conjunto, como o gritar em uníssono. Contudo, é necessário
notar que é o sentimento de poder e coragem adquirido pelos indivíduos em grupo a
força motriz para a transformação da sociedade e o exercício da democracia.
Uma outra característica, de acordo com Le Bon (apud Freud, 1976) que
aparece no indivíduo quando está em grupo é o contágio. Na massa todo pensamento e
sentimentos são contagiosos e envolvem o grupo de tal maneira que uma pessoa é capaz
de abandonar seus interesses pessoais a fim de corresponder aos interesses do grupo.
A terceira característica referente à mudança de comportamento de um
indivíduo inserido no grupo é a sugestionalidade uma vez que o indivíduo assume
posições até contrárias do que pensa isoladamente, pois este entra em um estado de
fascinação no qual sua vontade consciente se desvanece.
Portanto, de acordo com Freud (1976), um grupo é impulsivo, levado
quase que inteiramente por seu inconsciente, rendendo-se a impulsos que, de acordo
com as circunstâncias, podem ser generosos ou cruéis, mas cujos interesses pessoais de
cada integrante não são a prioridade, nem mesmo o interesse na autopreservação.
Assim, os sentimentos da massa são exagerados de maneira que dúvida
ou incerteza não são conhecidas. Este aspecto é muito semelhante ao desconhecimento
de fronteiras que a massa aberta proporciona, como enuncia Canetti (1995), citado
anteriormente. Devido a esta característica de exagero, um grupo apenas é impulsionado
por um estímulo excessivo e, tendo consciência de sua própria força, é tão intolerante
quanto obediente à autoridade.
Desta forma é possível observar sentimentos e atitudes antagônicas na
massa, pois ao mesmo tempo que é intolerante com a autoridade e deseja libertar-se
dela, busca um líder para dominá-la e para guiá-la.
Le Bon (1976) também acredita em grandes realizações feitas pela
massa:

Mas sob a influência da sugestão, os grupos também são capazes de


elevadas realizações sob a forma de abnegações, desprendimento e devoção a
um ideal. Ao passo que com os indivíduos isolados o interesse pessoal é
quase a única força motivadora, nos grupos ele muito raramente é
proeminente.(Le Bon apud Freud, p.103 )

As multidões e a massa, por sua vez, embora ainda presentes como força
política e poder, não ocupam, no cenário social, o mesmo espaço de outrora.
Viveríamos hoje exatamente um declínio da sociedade de massas em prol da sociedade?
Estaríamos vivendo hoje uma condição de massificação no mercado e no consumo?
Quando presenciamos grandes manifestações em massa, como ocorrida
no Brasil por ocasião das eleições ou ainda grandes protestos realizados pela internet,
ainda assim podemos pensar em novas formas de ação das massas?
Estas questões, cuja pretensão não foi abordar neste trabalho, mas apenas
levantá-las, demonstram, de qualquer maneira, que as relações entre a liderança e o
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agrupamento de pessoas é relevante tanto na compreensão das organizações sociais


quanto do exercício do poder e das subjetividades no momento atual.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BENJAMIN, W. Experiência e pobreza, 1933.

CANETTI, 1995. Massa e poder. Cia das letras

DOBB, M. H. A evolução do capitalismo. São Paulo: Nova cultural, 1988.

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JUSTO, J.S. Criatividade no mundo contemporâneo. In: VASCONCELOS, M.S.


(org) Criatividade: Psicologia, educação, conhecimento do novo. São
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princípio do prazer, psicologia de grupo e outros trabalhos. Obras
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OLIVEIRA, M.G.; QUINTANERO, T. Karl Marx. In: BARBOSA, M. L.; OLIVEIRA,


M.G.; QUINTANEIRO, T. Um toque de clássicos: Durkheim, Marx e Weber. Belo
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