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Introdução
Este texto foi produzido, inicialmente , para uma documentação em vídeo VHS sobre a
arte pré-histórica da Ilha do Campeche, uma vez que apenas levantamentos fotográficos e
A Ilha do Campeche está entre 15 ilhas localizadas nos arredores da Ilha de Santa
Campeche está situada em frente a praia do Campeche, na região sul da Ilha de Santa
Catarina, onde se encontram outras praias bem conhecidas, como Armação e Pântano do
Sul.
A Pré-história Regional
na costa catarinense. A primeira e mais antiga tradição, com 5020 anos atrás, é a dos
Guarani que significa monte de conchas. Estes chegam a ter até 20 m de altura e são
coletores denominada Tradição Itararé, diferenciada do grupo mais antigo pela presença de
tronco lingüístico de grupos Indígenas do Brasil Central, onde provavelmente este tipo de
cerâmica teve sua origem e, com o passar do tempo, chegou até a costa catarinense,
até o momento indicam que a dieta dos grupos litorâneos de pescadores-coletores, após a
marinha, e não terrestre , como a dieta do grupo caçador-coletor com agricultura incipiente,
que produz esta cerâmica no interior. Alguns indivíduos em sítios da Tradição Itararé , da
área costeira, apresentam dieta essencialmente terrestre. Eles são minoria, e podem estar
Guaranis, caracterizada pela presença de cerâmica nos sítios arqueológicos com uma
povos falantes migraram para o sul, chegando na costa de Santa Catarina ao redor de 910
anos atrás. Resumindo então, teríamos um grupo mais antigo de pescadores coletores
vivendo na costa catarinense desde 5020 anos atrás, que entrará em contato com um grupo
Amazônia ao redor de 910 anos atrás, 400 anos antes da invasão dos Portugueses, há 500
anos atrás.
A arte rupestre do litoral catarinense jamais foi encontrada, até o presente momento,
em associação direta com quaisquer sítios arqueológicos de uma destas tradições culturais
da pré-história de Santa Catarina mencionados anteriormente. Isto torna difícil saber qual ou
quais grupos culturais realizaram estas inscrições. Da mesma forma, não é possível saber
quando foram realizadas estas inscrições, uma vez que não é possível datá-las, pois são
apenas sulcos nas rochas, sem um contexto estratigráfico ou associação direta com outros
artefatos que podem ser datados. Mas antes de começarmos a pensar em quem ou quais
grupos realizaram este tipo de arte, vamos rever alguns conceitos sobre arte, bem como
Arte
De acordo com Robert Layton, arte é um fenômeno difícil de definir porque esta
podem ser expressos utilizando-se várias formas de mídia, entre elas a poesia, a dança, a
escultura e as pinturas e, dentro destas formas, utilizaremos outros recursos como o tipo de
linguagem utilizada na poesia, assim como as regras do estilo na pintura e na escultura, para
Para Layton existem duas maneiras de definir arte que ultrapassam os limites culturais
de quem a define, isto é, definições de aplicação universal. A primeira define arte em termos
de sua estética e a segunda define arte como uma comunicação simbólica. Em termos de
pragmaticamente funcional. Esta abordagem tem uma longa história na cultural ocidental, e
harmonia. Na arte como comunicação simbólica, os objetos são produzidos para mostrar a
são muito importantes. É muito difícil ou mesmo impossível saber os pensamentos e idéias
de um artista. Estes pensamentos e idéias somente podem ser entendidos através dos
meios que o artista usa para comunicá-los. Normalmente, nossa compreensão de tais
pensamentos e idéias expressos na arte não é baseada na experiência de quem a fez, mas
sim nas experiências de nós próprios. Para Layton, portanto , quando utilizamos critérios
estéticos para identificar objetos da arte de outros povos nos deparamos com dois
problemas. Primeiro, nós não podemos imaginar que, no mundo, todo os povos utilizam os
mesmos critérios estéticos que nós ocidentais. Mesmo na nossa própria história, nossos
critérios estéticos mudaram radicalmente. Segundo, nós não podemos assumir que o
significado que certos objetos de arte têm para nós , como pessoas de uma outra cultura, seja
aquele que o artista deu a sua obra. Para o autor, o objeto de arte que alguém observa é
meramente uma tangível expressão cultural, portanto uma construção mental, expressada de
pertence. Layton ainda nos alerta de que um objeto de arte, provavelmente tem qualidades
significado, certamente havendo uma interpretação diferente para cada pessoa que as
observe, uma vez que não temos o artista que as realizou para nos dizer seus significados.
O que torna um pouco mais complicado a interpretação destas inscrições é seu estilo
mundo, mas seu significado pode ser distinto para cada sociedade que as utiliza em sua arte.
Como nossos artistas pré-históricos não estão mais presentes na costa catarinense, e não
deixaram nenhum relato onde pudéssemos resgatar informações sobre as inscrições nas
trabalhar a arte pré -histórica para se conseguir obter mais informações sobre as mesmas. A
plástico, para que as mesmas possam ficar definitivamente registradas. Uma vez
documentadas, estão salvas para que possam ser estudadas em laboratório ou levadas ao
Um relato descritivo de cada inscrição é realizado, muitas vezes sob a forma de uma ficha de
campo, onde dados sobre tamanho, profundidade dos sulcos, posição geográfica, altura do
solo, distância de outras inscrições e outros são registrados. Cada pesquisador registra as
informações que julga serem importantes para sua análise. Uma vez realizada a
Pesquisas prévias
catarinense foram realizados por Pe. Rohr, quem acreditava ser esta arte produzida pela
catarinense são as únicas existe ntes em todo o litoral brasileiro e não pode ser comparada
portanto uma criação local, denominada de Tradição Litorânea Catarinense. Segundo, dos
Após estes estudos iniciais, alguns levantamentos fotográficos forma feitos por
Lucas, o qual excede sua característica essencialmente documental e peca por realizar uma
a reutilização dos motivos das inscrições rupestres da costa catarinense, pela população
deste trabalho de Aguiar que surgiu o documentário mencionado anteriormente, pois De Masi
O levantamento de Aguiar parece ser, até o momento, o mais extensivo, indo além de
qualquer pesquisador anterior. Embora sua análise ainda seja superficial, necessitando de
Prous (1977), pois não encontra as mesmas diferenças entre ilhas localizadas ao norte e ao
sul da Ilha de Santa Catarina. Os dados mostram um padrão comum em todas as ilhas, com
poucas exceções, as quais não são representativas o suficiente para caracterizar diferenças
difusionistas. Aguiar tenta correlacionar os motivos artísticos das inscrições com algumas
das tradições culturais pré -históricas da costa. Sabemos que todos os grupos pré -históricos
das três tradições culturais da costa catarinense utilizavam pigmentos de cor vermelha,
laranja e amarela, produzidos a partir de óxidos de ferro, obtidos pela oxidação de rochas
vulcânicas ricas em ferro, abundantes nas ilhas. Estes pigmentos poderiam ser utilizados
para pinturas corporais e pinturas de adornos e adereços, utilizados por crianças e mulheres,
como atestam alguns sepultamentos no Rio Vermelho, no grupo mais antigo de pescadores-
coletores locais. Alguns sepultamentos apresentam cor vermelha depositada sobre o corpo,
pigmentos indicam a existência de arte gráfica sob a forma de pinturas corporais ou outra
forma qualquer, em todos os grupos pré-históricos costeiros. Fazendo uma correlação com
utilizadas por Aguiar não sejam provenientes de sítios arqueológicos locais, mas da região
sul do Brasil como um todo. Isto dificulta a analogia, pois deveriam ser usados exemplares
questionamento mais sério sobre quais grupos realizaram tais inscrições, ao invés de cair em
passado, basicamente, por duas abordagens básicas. Uma é através de sua estética e
função e a outra através de seu significado simbólico. Tendo isto em mente nós vamos
agora revisar como a arte pré-histórica da Europa foi estudada. A arte do paleolítico superior
muito divulgadas no mundo todo, sendo o sul da França um dos locais mais conhecidos,
arte, na década de 50, foram feitas por Abbe Breuil, um pesquisador e sacerdote francês que
acreditava que as imagens tinham um caráter mágico. A arte então representava a caçada a
ser realizada, assegurando desta forma que o animal fosse caçado com sucesso e que o
mesmo animal tivesse fertilidade. Esta forma de interpretação mudou na década de 60, com
diferenças étnicas.
os Kung! San, da África do Sul, sugeriu uma explanação alternativa para a arte pré -histórica
Williams (1991) a arte precisa ter um significado e um lugar na sociedade que a produz.
Para ele muitos pesquisadores não trabalham o significado da arte do pré-histórica por não
subsistência. Em última instância, para o autor, esta recusa é gerada pelo excesso de
pessoas entram em transe, através do qual predizem o futuro, curam pessoas doentes,
mudam o clima, controlam animais, e fazem viagens para fora do corpo etc. Lewis-Williams
e Dowson propõem um modelo com três estágios alterados de consciência, os quais derivam
pulsantes e luminosas formas geométricas, tais como redes, pontos, grupos de curvas e
linhas paralelas e filigranas. Este estágio é criado por componentes físicos do sistema
nervoso humano, portanto podem ser experimentados por todas as pessoas independente
de seu grupo cultural. Cultura começa a ser importante no segundo estágio de alteração de
primeiro estágio. As várias formas geométricas podem ser interpretadas como objetos de
pessoas, animais, monstros etc. Neste estágio as pessoas sentem que eles são parte
daquilo que eles estão experimentando, chegando a sentir transformações físicas, tornando-
se um animal.
Sul, onde existem dados etnográficos, isto é, dados sobre grupos humanos que ainda hoje
praticam arte shamanística. Os autores encontram evidências dos três estágios alterados de
consciência durante o transe shamanístico. O mesmo modelo também foi utilizado com
sucesso para explicar a arte dos Tukano, na América do Sul, e a arte rupestre dos Coso, na
América do Norte, os quais sabe-se possuírem arte shamanística também. O reverso parece
ser verdadeiro, isto é, arte que não é relacionada com transe shamanístico não pode ser
Este modelo em seguida foi aplicado na arte pré -histórica do Paleolítico Europeu, e os
De acordo com Victor Turner (1968:437) religião é um termo multivocal que varia seu
denominam mágica, e aqueles que o usam, mágicos. Onde o poder é personalizado como
uma deidade, deuses, espíritos, demônios, gênios ou algo parecido, os antropólogos falam
que atuam nos rituais religiosos sem necessariamente entrar em contato com o sobrenatural
vezes são veículos deste, são denominados shamãs. Os primeiros estão preocupados com
sociedades simples todo o adulto tem uma função religiosa, mas os idosos são os que têm
mais. Com a idade avançada os idosos perdem a capacidade de caçar ou plantar, portanto
seu papel religioso torna -se proeminente. Nestas sociedades, mulheres tendem a ter mais
como o conhecimento sobre hervas, técnicas de cura, capacidade de entrar em transe etc.
Durkheim, em seu livro “Formas elementares da vida religiosa”, de 1912, coloca que o
homem está constantemente consciente que ele é cercado por uma força social, limitando e
dirigindo suas ações individuais. Para ele esta consciência é que gera as crenças religiosas.
Em seus estudos na Austrália, Durkheim sugere que os aborígines são conscientes da força
coletiva de seu grupo social, e ele somente pode expressar esta consciência através de
símbolos, no caso os totens, os quais são representações dos grupos sociais simbolizados
Para Horton (1965) a vida social é a fonte dos modelos que as sociedades simples
freqüentemente utilizam, para poder conceituar a natureza das forças menos palpáveis que
eles experienciam. Para ele a estrutura social fornece a área mais marcadamente ordenada
e regular da sua experiência, onde seu ambiente biológico e inanimado é muito mais
previsível. Tanto para Durkheim como para Horton, o pensamento religioso tem uma ordem
básica na analogia entre mundo social e natural. Para Layton duas críticas, ao menos,
devem ser feitas ao totemismo de Durkheim. Primeiro, é a noção simplista de que cada
grupo social tem um relação única e específica com uma espécie animal. Segundo, é a
suposta origem social da religião. Para Layton a religião dos aborígines, ao invés de ser
somente uma representação dos grupos sociais, ela integra aspectos morais e políticos do
perguntar se é possível utilizá-los em nosso caso. A primeira diferença que surge é o fato da
arte na costa catarinense ser essencialmente à céu aberto nos costões rochosos, junto ao
mar, e não pinturas dentro de cavernas ou abrigos, como é arte do Paleolítico Europeu, ou
da África do Sul, ou mesmo na maioria das regiões brasileiras. Todas as tradições culturais
caracterizado por ser essencialmente geométrico, com alguns motivos naturalistas. Alguns
estudiosos de arte acreditavam que o estilo geométrico seria mais antigo que o naturalista,
mas esta idéia já não existe, podendo os estilos naturalista e geométrico coexistirem em uma
mesma cultura ou terem origens independentes em diferentes contextos. Uma vez que os
funcionalista da magia de caça e fertilidade fica descartado, uma vez que ele é utilizado para
explicar as representações naturalistas, isto é, figuras que representam uma animal sendo
interpretativos, ainda é de difícil utilização, uma vez que não existem levantamentos precisos
da distribuição espacial das inscrições, bem como um tratamento estatístico dos motivos,
sofisticado o suficiente para se elaborar uma relação espacial das inscrições e sua
ser possível obter um “bestiário”, isto é, uma relação entre as representações de diferentes
etnográfico para embasar tal interpretação. Ao mesmo tempo é difícil imaginar shamãs em
transe nestes costões rochosos, realizando suas inscrições e não pinturas, como é o caso da
Europa, África e outros locais. Tais inscrições devem exigir uma quantidade considerável de
energia e tempo para sua realização, considerando o acesso ao local onde as inscrições são
nos estudos da arte pré-histórica da costa catarinense. O aspecto interpretativo deste tipo
de arte deve ser feito com muito cuidado, pois é muito fácil incorrermos em erro, vendo o que
nós queremos ver. A interpretação deve vir somente depois que sejam realizados trabalhos
minuciosos e sérios, como um levantamento exaustivo das inscrições, sua localização, suas
quantidades etc, e uma análise estatística dos motivos representados. O que existe até
agora não é suficiente para criarmos um modelo explanatório interpretativo de tais inscrições
Conclusão
locais em Santa Catarina; se possa estabelecer uma correlação com os grupos Indígenas
entre a arte pré-histórica do litoral e os grupos pré-históricos locais. É possível que esteja
relacionada a um modo de vida adaptado ao mar, uma vez que se encontra nos costões
rochosos de ilhas, nas quais a realização da agricultura seria extremamente difícil, embora
as mesmas não sejam muito distantes do continente . Portanto, um grupo que poderia estar
relacionado a esta arte é o de pescadores-coletores que estão nas ilhas desde 5000 A. P.
entre arte rupestre local e grupos humanos adaptados ao modo de vida marinho, sejam eles
Embora hajam vários estudos sobre a arte rupestre do litoral catarinense, todos são
problemas interpretativos àqueles que os tentarem transpor para os estudos das inscrições
religioso e a sua adaptação ao meio ambiente. A maior parte dos trabalhos etnográficos ou
Estudos futuros
Associados aos levantamentos básicos o que pode e deve ser realizado são estudos
levantamento dos tipos de plantas e liquens que crescem sobre as inscrições, pois os
mesmos destroem a superfície da rocha, conseqüentemente as inscrições, uma análise da
rochas, para se determinar que tipo de soluções químicas podem ser utilizadas nas rochas
para conter o crescimento de liquens e outros vegetais, muitos dos quais podem apenas ser
retirados de cima das rochas. Também é necessário um levantamento de como a águas das
chuvas, do mar, o vento e sol afetam as inscrições para que se criem projetos de
preservação baseados. O escoamento das águas das chuvas ou fontes naturais por sobre a
rocha acaba gerando superfícies erosivas ou depositando material que podem colaborar com
ação humana por sobre estas inscrições, a qual pode ser devastadora em todo o seu
espectro. A Ilha do Campeche tornou-se um ponto turístico bem conhecido nos recentes
anos. Após seu tombamento pelo IPHAN a ilha vem sofrendo uma porção de adequações e
estudos para receber o fluxo turístico que tem aumentado nos anos recentes. Tais estudos
não são ainda suficientes para se estabelecer critérios específicos sobre a utilização da área
Aguiar, Rodrigo 1997. Levantamento de Arte Rupestre da Ilha de Santa Catarina e ilhas
Breuil, H. 1952. Fou Hundred centuries of Cave Art, Traduzido por Boyle, M. (monitgnac:
Horton 1960. A definition of Religion and its uses. Journal of the Royal Antrhopological
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Picard).
Leroi-Gourhan, A . 1968. The evolution of Paleolithic Art. Scientific American 246 (6):104-
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Encyclopedia of the Social Sciences, ed. Sills, Macmillam Co. Free Press.