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TECNOLOGIA NA ESCOLA
Apresentação
Nos anos 80 e início de 90, do século XX, a versão primeira do Programa Nacional de
Informática em Educação visava à preparação de professores para o uso da informática com
seus alunos e a criação de centros de informática educativa, CIEDs, localizados nas secretarias
estaduais de educação, os quais se dedicavam a preparar professores e a atender aos alunos
das escolas públicas no que diz respeito ao uso do computador. Esse programa formou
professores em pequena escala e não conseguiu chegar à sala de aula.
O programa atual do MEC, ProInfo, que se desenvolve por meio de parceria com as Secretarias
Estaduais de Educação, começa a concretizar nosso sonho de introduzir o computador na escola
para ser incorporado à prática pedagógica de diferentes áreas de conhecimento, favorecendo a
aprendizagem do aluno. Esse programa prioriza a formação de professores e educadores em
um processo que integra o domínio da tecnologia, teorias educacionais e prática pedagógica
com o uso dessa tecnologia. Daí decorre o grande impacto não só no sistema educacional, mas
também no desenvolvimento humano e na cultura brasileira, de tradição essencialmente oral.
Concordamos com Cury (2001)2, que o acesso de uma camada da população, sobretudo os
escravos, à escola foi impedido pelo processo de colonização. Tal fato impediu, ainda, a
participação de muitos brasileiros no mundo da leitura e da escrita, bem como a formação de
leitores e escritores.
Quem de nós não se lembra dos ditados de palavras e das regras gramaticais decoradas sem
que soubéssemos em que situação poderíamos empregá-las? Da mesma forma, sem conseguir
atribuir significado, memorizamos datas históricas, acidentes geográficos, ossos do corpo
humano, fórmulas matemáticas e executamos infindáveis seqüências de exercícios com a
justificativa de que um dia isso nos seria útil!
Em seu texto Dígrafos4, Rubem Alves nos faz lembrar que fazer ditados, análise sintática e
morfológica e outras análises, consideradas necessárias ao aprimoramento da escrita, não
desenvolve o prazer da leitura e a compreensão do texto nem o gosto pela escrita. No entanto,
a atividade de sala de aula prima pela exigência das análises gramaticais, textuais e discursivas
em detrimento da leitura e interpretação do mundo e do escrever para representar idéias,
comunicar-se e registrar a própria história.
Não queremos com isso dizer que o conteúdo perdeu a sua importância, mas salientamos a
necessidade premente de mudar a forma de trabalhar conceitos, informações, procedimentos e
regras, procurando partir do que é significativo para o aluno, e criar situações que favoreçam
transformar os conhecimentos do senso comum em conhecimento científico.
O professor não é culpado por essa situação. Ele foi preparado para cumprir esse papel, cujo
desempenho deve voltar-se para o ensino de um conteúdo programático definido fora da sala
de aula, para ser seguido da mesma maneira em diferentes contextos.
Não se trata de encontrar bodes expiatórios para jogar toda a culpa pela complexidade de uma
situação gerada pelo avanço da ciência, da tecnologia e da sociedade contemporânea. Houve
um momento da evolução da sociedade em que a escola, que ainda temos hoje, atendia às
suas exigências. Todos somos frutos dessa escola e, apesar de seu rigor e austeridade, temos
boas lembranças dos momentos felizes que nela desfrutamos.
Além disso, o uso da TIC por meio da navegação em sistemas hipermediáticos permite a quem
o utiliza percorrer distintos caminhos, criar múltiplas conexões entre informações, textos e
imagens; ligar contextos, mídias e recursos. Cada sujeito que explora um sistema hipermídia
torna-se receptor e emissor de informações, leitor, escritor e comunicador. Assim, a TIC
envolve o sujeito em um mar de informações e, ao mesmo tempo, incita-o à leitura e à
expressão através da escrita textual e hipertextual.
No hipertexto cada sujeito define o caminho a seguir entre os distintos caminhos, nós e
conexões existentes. Cada nó caracteriza-se como um espaço de referência que pode ser
visitado e explorado, e não como local de visita obrigatória. Mesmo que exista da parte dos
conceptores do sistema hipermediático uma tentativa de aproximar a estrutura do hipertexto
da linearidade (característica do ensino tradicional) e do respectivo controle e direcionamento,
a interatividade inerente desse sistema impulsiona o ir e vir pelos nós e ligações, não
permitindo aprisionar quem o utiliza. Cada pessoa assume o risco de escolher seus próprios
caminhos, de aventurar-se a enveredar pelo desconhecido e de descobrir-se perdido ou de
chegar a novas descobertas.
Com o uso de sistemas hipermediáticos, como a Internet, redefine-se o papel do professor que
finalmente pode compreender a importância de ser parceiro de seus alunos, aquele que navega
junto com os outros, apontando as possibilidades dos novos caminhos sem a preocupação de
ter experimentado passar por eles algum dia, provocando a descoberta de novos significados,
permitindo aos alunos resolver problemas ou desenvolver projetos que tenham sentido para a
sua aprendizagem.
Nessa aventura, o professor é desafiado a assumir uma postura de aprendiz ativo, crítico e
criativo, constante pesquisador sobre o aluno: seu nível de desenvolvimento cognitivo,
emocional e afetivo, sua forma de linguagem, expectativas e necessidades, seu contexto e
cultura.
O professor que atua nessa perspectiva, enquanto responsável pela aprendizagem de seus
alunos, tem uma intencionalidade, e esta constitui o seu projeto de atuação, elaborado com
vistas a respeitar os diferentes estilos e ritmos de trabalho dos alunos, o trabalho colaborativo
em sala de aula no que se refere ao planejamento, escolha do tema e respectiva problemática a
ser investigada. Não é o professor quem planeja para os alunos executarem, ambos são
parceiros e sujeitos de aprendizagem, cada um atuando segundo o seu papel e nível de
desenvolvimento.
A partir de uma mudança pessoal e profissional é que se começa a refletir sobre a mudança da
escola para uma escola que incentive a imaginação, a leitura prazerosa, a escrita criativa,
favoreça a iniciativa, a espontaneidade, o questionamento e a inventividade, promova e
vivencie a cooperação, o diálogo, a partilha e a solidariedade.
Mas, para transformar o sistema educacional é preciso que essa reciprocidade extrapole os
limites da sala de aula e envolva todos que constituem a comunidade escolar: dirigentes,
funcionários administrativos, pais, alunos, professores e a comunidade na qual a escola
encontra-se inserida.
Para ajudar o professor a enfrentar esses novos desafios que se tornaram mais contundentes
com a chegada da TIC às escolas públicas, o ProInfo promove atividades de formação dos
professores, que se desenvolvem por meio de ações presenciais ou a distância.
Além de incorporar a TIC à prática pedagógica, o professor enfrenta hoje um novo desafio,
relacionado com a inclusão na sala de aula de alunos que vêm sofrendo um processo histórico
da exclusão, como os portadores de necessidades especiais de aprendizagem ou oriundos de
grupos submetidos a preconceitos de ordem social, étnica e cultural. A TIC pode ser uma
grande aliada do professor para promover a integração entre os alunos e para favorecer que o
aluno com necessidades especiais possa sobrepujar suas limitações e melhor desenvolver suas
potencialidades.
De acordo com as séries anteriores do Salto para o Futuro sobre Informática em Educação, a
participação dos especialistas estará voltada à análise de uma problemática relacionada com o
vídeo de suporte apresentado, procurando estabelecer articulações com outras experiências e
fazendo emergir teorias que explicitem as práticas observadas. Assim, em cada programa,
primeiramente será apresentada uma situação concreta, desenvolvida em escola ou em NTE.
Em seguida, entram os especialistas, juntamente com um professor/pesquisador e um
multiplicador ou professor de escola, para analisar o que foi apresentado, problematizar a
situação e encaminhar as discussões a distância com os participantes.
notas
Este texto, inspirado em uma tese3 que defendi na PUC-SP, se refere à formação como uma
atividade educativa entre educadores no exercício de suas funções, os quais assumem efetiva
participação nas ações de formação, contribuindo com suas experiências, competências,
potencialidades e representações. Nessa perspectiva, uma ação de formação corresponde a um
conjunto de interações entre formadores e formandos com a intencionalidade de mudança e
inovação.
Segundo Nóvoa, a formação não é qualquer coisa prévia à ação, mas está e acontece na ação
(Almeida, 1996, p. 56)4, como um contínuo fundamental em suas vidas e na das escolas
(Ribas, Carvalho & Alonso, 1999, p. 48)5. Essa formação se torna efetiva caso produza
mudanças através de uma intervenção pela qual há a participação consciente e uma vontade
clara do formando e do formador de conseguir os objetivos explicitados (Garcia, 1995, p. 177)6.
A formação orientada para a mudança e a inovação tem como foco o contexto de trabalho dos
educadores e se realiza com o grupo de profissionais interessados em provocar transformações
na escola, de forma que sua aprendizagem se traduza em mudanças pessoais, profissionais e
institucionais. Também os formadores devem estar comprometidos com essa formação e
mudança.
A partir da convivência com os desafios, problemas e outros fatores que interferem no trabalho
educativo, na busca conjunta de alternativas para sobrepujar as dificuldades, no
compartilhamento de conquistas e fracassos, nas reflexões na e sobre a própria ação, o
educador vai adquirindo o saber sobre o quê, como, por quê e para quê (Imbernón, 1998)7
empregar o computador em sua ação.
Não se trata de uma formação voltada para uma atuação no futuro, mas sim de uma formação
direcionada pelo presente, tendo como pano de fundo a ação imediata do educador. A formação
estabelece uma congruência entre o processo vivido pelo educador formando e sua prática
profissional. Essa formação torna-se eficaz quando o formador, também um agente de
mudança, mergulha nas ações de formação com os educadores, compartilha problemas,
angústias, incertezas e conquistas inerentes às mudanças provocadas por uma nova prática
profissional em fase de experimentação, cuja proposta é vivida, refletida e reelaborada durante
a formação, testada pelo formando e refletida pelo grupo em formação.
NOTAS
REDE DE CONHECIMENTOS
Este programa parte do uso da rede tecnológica para propiciar as conexões entre a rede
humana e a rede de conhecimentos, idéias, conceitos, crenças etc. A ênfase será sobre a
constituição de redes cooperativas quer seja de pesca, de neurônios, de renda, de tecido, ou
rede científica e, principalmente, a rede tecnológica. As redes de conhecimento propiciam a
articulação entre pessoas, idéias, pensamentos, teorias e recursos tecnológicos. Os conceitos
que emergem em uma rede e o papel da tecnologia na criação de redes no âmbito da escola e
entre a escola e o mundo são analisados pelos especialistas, que também levantam problemas
relacionados à complexidade das escolas e às possibilidades de criar redes no contexto escolar.
Entre as experiências apresentadas tem-se a rede de multiplicadores do ProInfo/SEED-MEC e a
LTNet - por meio da qual professores do Brasil interagem com professores dos EUA. Também é
mostrada a experiência de um NTE no qual os programas ProInfo e TVEscola, da SEED/MEC,
funcionam em rede, de forma articulada.
Inserir-se na sociedade da informação não quer dizer apenas ter acesso à tecnologia de
informação e comunicação - TIC, mas principalmente saber utilizar essa tecnologia para a
busca e a seleção de informações que permita a cada pessoa resolver os problemas do
cotidiano, compreender o mundo e atuar na transformação de seu contexto. Assim, o uso da
TIC com vistas à criação de uma rede de conhecimentos favorece a democratização do acesso à
informação, a troca de informações e experiências, a compreensão crítica da realidade e o
desenvolvimento humano, social, cultural e educacional. Tudo isso poderá levar à criação de
uma sociedade mais justa e igualitária.
Como criar redes de conhecimentos? O que significa aprender quando se trabalha com redes de
conhecimentos? Como inserir o uso de redes de conhecimentos na escola? O que cabe ao
educador nessa criação?
A metáfora de rede considera o conhecimento como uma construção decorrente das interações
do homem com o meio. À medida que o homem interage com o contexto e com os objetos aí
existentes, ele atua sobre esses objetos, retira informações que lhe são significativas, identifica
estes objetos e os incorpora à sua rede, transformando o meio e sendo transformado por ele.
O uso da TIC na criação de rede de conhecimentos traz subjacente a provisoriedade e a
transitoriedade do conhecimento, cujos conceitos articulados constituem os nós dessa rede,
flexível e sempre aberta a novas conexões, as quais favorecem compreender "problemas
globais e fundamentais para neles inserir os conhecimentos parciais e locais" (Morin, 2000, p.
14)2.
Com o uso da TIC e da Internet pode-se navegar livremente pelos hipertextos de forma não-
seqüencial, sem uma trajetória predefinida, estabelecer múltiplas conexões, tornar-se mais
participativo, comunicativo e criativo, libertar-se da distribuição homogênea de informações e
assumir a comunicação multidirecional com vistas a tecer a própria rede de conhecimentos.
Na rede, aprender é descobrir significados, elaborar novas sínteses e criar elos (nós e ligações)
entre parte e todo, unidade e diversidade, razão e emoção, individual e global, advindos da
investigação sobre dúvidas temporárias, cuja compreensão leva ao levantamento de certezas
provisórias, ou a novos questionamentos (Fagundes, 1999)4 relacionados com a realidade.
O homem apreende a realidade por meio de uma rede de colaboração na qual cada ser ajuda o
outro a desenvolver-se, ao mesmo tempo que também se desenvolve. Todos aprendem juntos
e em colaboração. "Ninguém educa ninguém, como tampouco ninguém se educa a si mesmo:
os homens se educam em comunhão, mediatizados pelo mundo" (Freire, 1993, p. 9)5.
Por meio de interações favorecidas pelas TIC, cada participante do grupo confronta sua unidade
de pensamento com a universalidade grupal, navega entre informações para estabelecer
ligações com conhecimentos já adquiridos, comunica a forma como pensa, coloca-se aberto
para compreender o pensamento do outro e, sobretudo, participa de um processo de
construção colaborativo, cujos produtos decorrem da representação hipertextual, comunicação,
conexão de idéias no computador, levantamento e teste de hipóteses, reflexões e depurações.
Assim, as interações entre as pessoas que se envolvem na criação dos nós de suas redes de
conhecimento propiciam as trocas individuais e a constituição de grupos que interagem,
pesquisam e criam produtos ao mesmo tempo que se desenvolvem. Cada ser retira do
hipertexto as informações que lhe são mais pertinentes, internaliza-as, apropria-se delas e as
transforma em uma nova representação hipertextual; ao mesmo tempo que se transforma,
volta a agir no grupo transformado e transformando o grupo.
Redefine-se o papel do professor: "mais do que ensinar, trata-se de fazer aprender (...),
concentrando-se na criação, na gestão e na regulação das situações de aprendizagem"
(Perrenoud, 2000, p. 139)9, cuja mediação propicia a aprendizagem significativa aos grupos e a
cada aluno. Desta forma, pode-se mobilizar os alunos para a investigação e a problematização,
alicerçados no desenvolvimento de projetos, solução de problemas, reflexões individuais e
coletivas, nos quais a interação e a colaboração subsidiam a representação hipertextual do
conhecimento.
Criar ambientes de aprendizagem com a presença das TIC significa utilizar a TIC para a
representação, a articulação entre pensamentos, a realização de ações, o desenvolvimento de
reflexões que questionam constantemente as ações e as submetem a uma avaliação contínua.
O professor que associa as TIC aos métodos ativos de aprendizagem desenvolve a habilidade
técnica relacionada ao domínio da tecnologia e, sobretudo, articula esse domínio com a prática
pedagógica e com as teorias educacionais que o auxiliem a refletir sobre a própria prática e a
transformá-la, visando explorar as potencialidades pedagógicas das TIC em relação à
aprendizagem e à conseqüente constituição de redes de conhecimentos.
Para incorporar a TIC na escola, é preciso ousar, vencer desafios, articular saberes, tecer
continuamente a rede, criando e desatando novos nós conceituais que se inter-relacionam com
a integração de diferentes tecnologias, com a linguagem hipermídia, teorias educacionais,
aprendizagem do aluno, prática do educador e a construção da mudança em sua prática, na
escola e na sociedade. Essa mudança torna-se possível ao propiciar ao educador o domínio da
TIC e o uso desta para inserir-se no contexto e no mundo, representar, interagir, refletir,
compreender e atuar na melhoria de processos e produções, transformando-se e
transformando-os.
NOTAS
O foco deste programa são os ambientes virtuais, com suas simulações de ambientes reais em
sala de aula e as novas possibilidades de trabalho que surgem a partir do uso dos ambientes
virtuais. O enfoque é o uso, segundo uma abordagem que propicia ao aluno a busca de
informações para a compreensão do mundo e do seu contexto e, principalmente, a
representação de suas idéias e a construção de conhecimentos, tornando o aluno o autor de
suas histórias e projetos. Os pesquisadores e professores presentes à mesa de debates do
programa levantam as potencialidades dos ambientes reais e virtuais, suas especificidades e
questionam a respeito do papel da tecnologia e dos agentes de aprendizagem na criação de
ambientes virtuais de aprendizagem.
A visão newtoniano-cartesiana que caracterizou o século XVIII e XIX passa a ser questionada
pela comunidade científica durante todo o século XX. As proposições de Einstein com a Teoria
da Relatividade (1900) e o movimento da física quântica desencadearam uma nova revolução
na ciência, especialmente, focada na busca da recomposição das partes num todo integrado.
Esse movimento desafia o mundo científico, envolvendo investigações de físicos, químicos,
biólogos, matemáticos e de profissionais das mais variadas áreas do conhecimento.
A Revolução Industrial evolui para a Revolução Tecnológica, que traz contribuições significativas
para a humanidade. Acredita-se que o grande avanço da era tecnológica foi provocar a geração
da rede informatizada. Assim, a Era de Informação passa a permitir o contato rápido entre as
pessoas e auxilia significativamente o movimento de globalização. Se por um lado esta
revolução trouxe processos de avanço e desenvolvimento, por outro, apresentou a tecnologia
num sistema capitalista que levou à massificação e a um comprometimento da visão de homem
e da visão de mundo. A Educação, em todos os níveis de ensino e de modalidades, ainda
mantém uma forte impregnação do pensamento conservador newtoniano-cartesiano,
demorando a absorver as mudanças geradas pela Revolução Tecnológica. Grande número de
professores apresenta a tecnologia como a utilização da técnica pela técnica, na busca da
eficiência e da eficácia, das verdades absolutas e inquestionáveis e das evidências concretas.
Neste processo, a sociedade capitalista, com uma visão racionalista e positivista, tem permitido
o acirramento das desigualdades sociais. No dizer de Cardoso (1995), o paradigma cartesiano,
ainda presente em muitas das atitudes da humanidade, levou ao "culto do intelecto e o exílio
do coração".
Com o advento da Sociedade do Conhecimento, nas últimas décadas do século XX, a exigência
da superação da reprodução para a produção do conhecimento instiga a buscar novas fontes de
investigação, tanto na literatura, quanto na rede de informatizada. A Sociedade do
Conhecimento, na "Era das Relações" (Moraes,1997), com a globalização, passa a exigir
conexões, parcerias, trabalho conjunto e inter-relações, no sentido de ultrapassar a
fragmentação e a divisão em todas as áreas do conhecimento. Nesse processo, a tecnologia
precisa tornar-se um instrumento a serviço do bem-estar da humanidade. Com esse desafio
imposto, o importante papel reservado para a Educação Tecnológica é o trabalho para a
formação da cidadania, que leve em consideração a oferta de requisitos básicos para viver
numa sociedade em transformação, e que prepare um cidadão responsável e ético, para
enfrentar os novos impactos tecnológicos (Grinspum,1999).
Existe a proposição de um paradigma inovador na ciência, que venha atender aos pressupostos
exigidos pela sociedade do conhecimento e que tem sido denominado, por alguns educadores,
como Ecológico, Holístico ou Emergente (Capra, 1996; Moraes, 1997; Santos, 1987).
Caracterizar o paradigma emergente não parece tarefa de fácil resposta neste momento
histórico, pois além da multiplicidade de denominações, ele engloba diferentes aspectos e exige
a interconexão de pressupostos de diversas teorias.
Para alicerçar uma ação docente que venha atender às mudanças paradigmáticas da ciência, há
a necessidade de se constituir uma aliança de abordagens pedagógicas, formando uma
verdadeira teia de referenciais teóricos-práticos. Behrens (1999), ao realizar pesquisas sobre a
prática pedagógica dos professores, em todos os níveis de ensino, propõe que para atender ao
Paradigma Emergente faz-se necessário construir uma aliança entre os pressupostos da visão
sistêmica, da abordagem progressista e do ensino com pesquisa. Defende que para o professor
oferecer uma ação docente baseada nessa aliança precisa ampliar também os recursos
oferecidos para a aprendizagem dos alunos, em especial com a instrumentalização da
tecnologia inovadora.
Uma prática pedagógica competente, que acompanhe os desafios da sociedade moderna, exige
uma inter-relação dessas abordagens e o uso da tecnologia inovadora. Servindo como
instrumentos, o computador e a rede de informações, aparecem como suportes relevantes na
proposição de uma ação docente inovadora. Dentre os recursos que têm auxiliado processos de
contato entre pares, destacam-se: Correio Eletrônico: ferramenta de comunicação escrita a
distância via rede de computadores; Listas de Discussão ou Fóruns: formadas por pessoas e
grupos que têm como objetivo a discussão de um determinado assunto; Chat: interface gráfico
que possibilita conversa com diversas pessoas ao mesmo tempo; Teleconferência:
conferências que envolvem usuários fisicamente distantes, podendo envolver a transmissão e o
recebimento de texto, som e imagem. Acredita-se que esses recursos devem ser utilizados para
subsidiar uma metodologia de ação docente baseada nas aprendizagens e nas competências e
habilidades que o professor quer desenvolver com seus alunos.
Referências bibliográfica
BEHRENS, Marilda Aparecida. A formação pedagógica e os desafios do mundo moderno. In:
Masetto, Marcos (org.). Docência na universidade. Campinas: Papirus, 1998.
_________. O desafio da Universidade frente ao novo século. In: Autores variados. Educação,
Caminhos e Perspectivas. Curitiba: Champagnat, 1996.
________. Projetos de aprendizagem colaborativa com tecnologia interativa. IN: MORAN, José
Manoel; MASETTO, Marcos; BEHRENS, Marilda A. Novas Tecnologias e mediação pedagógica.
Campinas, SP: Papirus, 2000.
CAPRA, Fritjof. A teia da vida. Uma nova compreensão científica dos sistemas vivos. São Paulo:
Cultrix, 1996.
CARDOSO, Clodoaldo Meneguello. A canção da inteireza. Uma visão holística da educação. São
Paulo: Summus, 1995.
GRINSPUN, Miriam Zippin. Educação tecnológica. Desafios e perspectivas. São Paulo: Cortez,
1999.
NOTAS
A Informática na Educação, como tem sido tratada nos programas do ProInfo e por diferentes
centros de pesquisa que se preocupam com esse tema, enfatiza o fato de o professor da
disciplina curricular ter conhecimento dos potenciais educacionais do computador e ser capaz
de alternar, adequadamente, atividades não informatizadas de ensino-aprendizagem e
atividades que usam o computador. Para ser capaz de integrar a informática nas atividades
pedagógicas, a formação do professor necessita atingir quatro pontos fundamentais:
• Propiciar ao professor condições para entender o computador como uma nova maneira
de representar o conhecimento, provocando um redimensionamento dos conceitos já
conhecidos e possibilitando a busca e compreensão de novas idéias e valores;
• Propiciar ao professor a vivência de uma experiência que contextualiza o conhecimento
que ele constrói;
• Prover condições para o professor construir conhecimento sobre as técnicas
computacionais, entender por que e como integrar o computador em sua prática pedagógica e
ser capaz de superar barreiras de ordem administrativa e pedagógica;
• Criar condições para que o professor saiba recontextualizar o que foi aprendido e a
experiência vivida durante a formação para a sua realidade de sala de aula, compatibilizando as
necessidades de seus alunos e os objetivos pedagógicos que se dispõe a atingir.
Isto significa que a formação desse professor não pode se restringir à passagem de
informações sobre o uso pedagógico da informática. Ela deve oferecer condições para ele
construir conhecimento sobre técnicas computacionais e entender por que e como integrar o
computador em sua prática pedagógica. Além disto, esta formação deve acontecer no local de
trabalho e utilizar a própria prática do professor como objeto de reflexão e de aprimoramento,
servindo de contexto para a construção de novos conhecimentos (Prado & Valente, 2001a).
Este acompanhamento mais o assessoramento do professor têm que ser constantes e podem
ser realizados de duas maneiras: uma, é ter a presença constante de um especialista
vivenciando com o professor as atividades do seu dia-a-dia, oferecendo condições à construção
de novos conhecimentos; uma outra maneira é mediante a presença de um especialista, porém
realizando atividades a distância, por meio da rede telemática.
Figura 1 - Ciclo que se estabelece na interação especialista-professores no "estar junto" via Internet
O "estar junto virtual" está sendo colocado em prática na formação de professores de diversos
projetos como Rede Telemática para Formação de Educadores, financiado pela OEA;
Projeto de Informática na Educação Especial (PROINESP) da Secretaria de Educação
Especial do Ministério de Educação e da Federação Nacional das APAEs (FENAPAEs); e do Curso
de Especialização em Desenvolvimento de Projetos Pedagógicos com Uso das Novas
Tecnologias financiado pelo ProInfo da Secretaria de Educação a Distância do Ministério de
Educação.
Este projeto tem como objetivo a utilização das redes telemáticas para a formação de
professores, investigadores, administradores escolares e membros da comunidade, para
auxiliar a implantação da informática na educação e a promoção de mudanças na escola
pública. O Projeto é financiado pela Organização dos Estados Americanos (OEA), envolvendo 7
países (Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, Costa Rica, República Dominicana e Venezuela) e
com data prevista de término em abril de 2001. No Brasil é realizado conjuntamente por três
centros: Laboratório de Estudos Cognitivos (LEC), da Universidade Federal do Rio Grande do
Sul (UFRGS); Núcleo de Informática Aplicada à Educação (NIED), da Universidade Estadual de
Campinas (UNICAMP); e Programa de Pós-Graduação em Educação: Currículo, da Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).
A utilização da rede telemática neste projeto está permitindo entender como pode ser feito o
acompanhamento das atividades que o professor-multiplicador realiza, tanto nos estudos das
questões teóricas e técnicas quanto as práticas que acontecem nas escolas. Sem os recursos da
rede seria muito difícil para os pesquisadores do Nied estarem presentes em todas as ações que
estes professores-multiplicadores realizam. Além disto, o fato de o NTE-Campinas estar
próximo do campus da Unicamp facilita as ações presenciais com estes professores-
multiplicadores, procurando entender o que pode ser realizado estritamente a distância e o que
exige o contato presencial e, com isto, complementando as atividades a distância com
intervenções presenciais.
Participaram desta primeira fase do Proinesp, durante o ano de 2000, 40 instituições, sendo 28
APAEs, 10 Pestalozzis, o INES e o IBC, localizadas em diferentes estados do Brasil. Estas
instituições apresentaram um plano de uso da informática com seus alunos e com base neste
plano elas foram escolhidas para fazerem parte do Proinesp. Foi instalado em cada instituição
um laboratório de informática, com cerca de 10 a 20 máquinas, ligadas em rede local e na
Internet, e foram selecionados 4 professores em cada uma delas para participarem de um curso
de formação no uso da informática. Portanto, participaram deste curso de formação cerca de
160 professores.
A proposta de formação foi elaborada tendo em vista professores que não tinham conhecimento
prévio de informática e de educação a distância. Assim, foi previsto um curso de formação de
210 horas de atividades, sendo 90 horas presenciais e 120 horas a distância. O objetivo das
atividades presenciais foi o de propiciar aos professores uma primeira familiarização com a
informática. Estas atividades foram realizadas nos Núcleos de Tecnologia Educacional (NTE) do
Proinfo (nas localidades em que existiam NTEs instalados) ou em empresas locais que prestam
serviços de capacitação em informática. Neste último caso, foi prevista uma verba para cobrir
estes gastos.
Este curso tem como objetivo proporcionar condições teórico-metodológicas aos professores da
rede pública de ensino para o uso da tecnologia da informática integrada à prática pedagógica,
com ênfase no desenvolvimento de projetos. Estes professores deverão atuar como
professores-multiplicadores nos NTEs que foram montados por intermédio do ProInfo.
O Módulo I teve início no dia 7 de agosto de 2000 e foi realizado na forma de oficinas
presenciais com duração de duas semanas (7/08 a 20/08), em um NTE mais próximo do local
onde vivem os participantes do curso. O objetivo deste módulo foi o de dar as condições
mínimas para os professores iniciarem as atividades a distância, via Internet.
O Módulo II foi desenvolvido totalmente a distância e teve início no dia 21 de agosto de 2000 e
término em maio 2001. Para o desenvolvimento das disciplinas foi utilizado o sistema TelEduc e
a metodologia de formação utilizada não foi diferente das já mencionadas acima: à medida que
o professor realizou atividades previstas em cada uma das disciplinas deste módulo, ele
desenvolveu projetos pedagógicos com os seus alunos, reportando para os docentes os
problemas, dúvidas e resultados obtidos.
No Módulo III, o professor elaborou sua monografia durante os meses de junho e julho de 2001
e em agosto e setembro de 2001 devem ser realizadas as avaliações presenciais e finais dos
professores.
Esse curso difere dos outros cursos mencionados no sentido de que o número de docentes é
muito maior, necessitando coordenar as atividades tanto entre docentes da mesma
área/disciplina quanto entre áreas/disciplinas. Além disto, é um curso de Especialização que
conta com uma legislação própria, exigindo um número maior de horas de atividades e um
aprofundamento teórico-prático. No entanto, é possível notar que os professores estão sendo
capazes de acompanhar as atividades propostas, de dar início às atividades de informática em
sua sala de aula e de auxiliar na disseminação das idéias do uso da informática com outros
colegas. Deste modo, gradativamente, tanto o professor quanto a escola vão se apropriando da
informática, incorporando-a às atividades que professores e alunos realizam em sala de aula.
Conclusões
Por outro lado, o "estar junto virtual" permite um tipo de formação que é muito difícil de ser
realizado presencialmente. Primeiro, é quase que impossível criar um curso com participantes
das mais remotas regiões do país e que usa como objeto de reflexão e de formação tanto a
realidade destes professores quanto a própria experiência de implantação da informática nas
respectivas atividades pedagógicas. Nos cursos presenciais, certamente é possível usar a
realidade dos participantes como objeto de reflexão, mas é muito difícil poder usar o resultado
da implantação dos conteúdos do próprio curso na realidade de cada participante, porque o
professor não está no seu ambiente de trabalho para poder testar e experimentar as novas
aprendizagens. Segundo, a interação entre docente e professores é mediada pela escrita,
exigindo a documentação destas ações e um nível de reflexão muito maior do que se a
interação fosse via fala. Presencialmente, muitas idéias são comunicadas implicitamente por
meio de gestos ou olhares que facilitam a comunicação, porém, não contribuem para a
formalização das mesmas. A descrição das ações pode ser vista como uma formalização das
idéias, e usada com objeto de reflexão de outros colegas, contribuindo para o enriquecimento
das trocas entre os participantes do curso. Terceiro, é praticamente inviável pensar em montar
uma equipe de docentes que possa acompanhar e assessorar in loco o processo de formação e
implantação da informática nas instituições em diferentes regiões do país. Além de exigir um
número grande de especialistas, de que ainda não dispomos, o custo para suportar esta
atividade presencial seria enorme.
Referência bibliográficas
Harasim, L., Hiltz, S.R., Teles, L. & Turoff, M. (1995). Learning Networks: a field guide to
teaching and learning online. Cambridge: MIT Press.
Prado, M.E.B.B. & Valente, J.A. (2001a). A educação a distância possibilitando a formação do
professor com base no ciclo da prática pedagógica. In: Moraes, M.C. (org.) Educação a
Distância: fundamentos e práticas. NIED-UNICAMP. (no prelo)
Prado, M.E.B.B. & Valente, J.A. (2001b). A formação na ação do professor: uma abordagem na
e para uma nova prática pedagógica. (no prelo)
Valente, J.A. (2000). Diferentes Abordagens de Educação a Distância. Artigo do Programa Salto
para o Futuro/TV Escola (http://www.proinfo.gov.br/ - textos EAD).
Valente, J.A. (1999). Análise dos Diferentes Tipos de Software Usados na Educação. Em J. A.
Valente (org.). Computadores na Sociedade do Conhecimento. Campinas: NIED - UNICAMP, p.
89-110.
Este programa tem como referencial o rompimento de barreiras para a integração, na escola e
na sala de aula, das crianças com dificuldades de aprendizagem, portadoras de necessidades
especiais ou de grupos sociais historicamente discriminados. A ênfase está em políticas públicas
e experiências de sucesso com a inclusão de alunos com necessidades especiais no convívio da
sala de aula, evitando a segregação e o isolamento, por meio de um processo em que o uso da
tecnologia de informação e comunicação promove a interação entre os diferentes, a aceitação
mútua, a convivência em harmonia e o desenvolvimento integral de cada ser humano. A partir
das experiências apresentadas, os pesquisadores e professores presentes à mesa de debates
desvelam os pressupostos e potencialidades do uso da tecnologia de informação e comunicação
para a inclusão na escola.
Logo, acredito que, a escola como instituição que é, seja o ambiente propício para possibilitar a
interação da criança com o meio social. A inclusão pois, deve ser o início para que a sociedade
receba estes seres especiais, oferecendo a oportunidade para que eles possam relacionar-se
com seus amigos, com ou sem necessidades especiais, no contato com ambientes dos quais
eles foram privados pela sua própria condição, oportunizando-lhes interagirem, experienciarem
e vivenciarem situações como qualquer outro ser.
No entanto, apesar dos esforços de pessoas dedicadas das Secretarias Municipais, Estaduais e
Federais, que buscam melhorar as condições das crianças especiais, a tão desejada inclusão
não acontece. Esta conclusão ocorreu após ter orientado uma pesquisa (Portela, 2001)2, na
qual observou-se a existência de um descompasso entre a teoria/prática no que se refere à
inclusão, ou seja, existe um distanciamento entre a lei que a garante e a prática que a nega. As
principais dificuldades que impedem a operacionalização da inclusão no ambiente são: a falta
de formação e preparo do professor; a necessidade de mudança na prática pedagógica e,
conseqüentemente, no processo educacional; a falta de critério para selecionar os professores
que venham a atuar junto a esses alunos, sem considerar a sua vocação ou histórico de vida; a
prática do professor, que geralmente busca atender à dificuldade do aluno e não explorar a sua
potencialidade; a falta de preparo dos próprios alunos da sala para receber um aluno especial;
a falta de adaptação na estrutura física do ambiente. Este fato é completado com o relato de
uma ex-aluna do curso de Licenciatura de Matemática da FCT/Unesp-PP. Ela declara que, em
uma das salas que atuava como professora de Matemática na cidade de São José dos Campos-
SP, existia um aluno portador de necessidades especiais educativas, que permanecia isolado,
não participando das atividades da sala de aula. A professora sentia-se angustiada com a
situação, porém encontrava grande dificuldade em modificar este quadro, pois não havia sido
preparada para lidar com crianças portadoras de necessidades especiais.
Com as experiências teórico-práticas vivenciadas, posso afirmar que uma das grandes
dificuldades de incluir alunos com essas necessidades deve-se à abordagem metodológica
instrucionista praticada nas escolas: todos devem saber tudo, respeitando um mesmo tempo,
ritmo e caminhos, buscando-se promover na escola uma homogeneização de seres
heterogêneos. Portanto, incluir crianças especiais, sob a perspectiva metodológica
instrucionista, é uma atitude a ser repensada. Dessa forma, percebo que a escola deve rever
sua maneira de ensinar e propiciar a aprendizagem, respeitando as diferenças, oportunizando
aos alunos descobrirem suas habilidades, capacidades e potencialidades, oferecendo assim
reais condições para que esses alunos especiais participem do ambiente escolar.
Vygotsky (1993) sinaliza para uma mudança, enfatizando a necessidade de uma revisão dos
currículos e métodos de ensino, substituindo a abordagem quantitativa por uma abordagem
qualitativa baseada em novos princípios educacionais. Neste sentido, Perrenoud (1999) afirma
que uma abordagem para construir competências, tanto de professores como de alunos, seria a
voltada para o desenvolvimento de projetos. Para Almeida (1999), com o desenvolvimento de
projetos cria-se um melhor ambiente de aprendizagem nos quais professores e alunos são
sujeitos participantes de todas as etapas do processo, desde sua concepção até a reflexão final
sobre as vivências desencadeadas, os resultados obtidos e a avaliação da aprendizagem.
Com este cenário, busquei investigar3 os princípios básicos que orientariam o professor para
construir uma metodologia que usa o computador para criar um ambiente Construcionista,
Contextualizado e Significativo4 para crianças com necessidades especiais físicas, despertando
as potencialidades e habilidades do aluno, usando como estratégia o desenvolvimento de
projetos (Schlünzen, 2000). Logo, em uma formação em serviço, pretendi, junto com o
professor, resgatar um ambiente no qual as crianças pudessem aprender os conceitos de forma
lúdica, conhecerem-se melhor, promovendo contato e vivência com a sociedade, e que as
habilidades e potencialidades de cada um fossem valorizadas e o uso do computador ganhasse
sentido.
Neste ambiente, foi possível também trazer o dia-a-dia para a sala de aula, permitindo
aplicações práticas e a aprendizagem com a experiência, com a realidade e necessidade do
aluno (Masetto, 1998). Dessa forma, o professor descobriu uma maneira mais prazerosa de
ensinar, de dar significado à aprendizagem, integrando e contextualizando os conceitos. O
conhecimento foi construído e a Educação deixou de ser a definida por Freire (1970) como
"bancária", na qual o aluno é um ser passivo em quem são depositadas as informações. O
ensino deixou de ser centrado no professor que fala, dirigindo-se para o aluno que precisa
interagir com o mundo a sua volta.
No desenvolvimento dos projetos com os alunos, o professor aproveitou toda a riqueza dos
momentos que surgiram para conseguir contemplar o currículo. Com sua experiência docente,
percebeu os conceitos que podiam ser desenvolvidos e pôde estar atento à sua formalização,
colaborando com a construção dos conceitos a partir dos temas escolhidos, vividos e
abordados.
Logo, o currículo foi organizado e construído a partir dos problemas e preocupações que
interessavam aos alunos. Isto é diferente dos currículos acadêmicos e fragmentados por
disciplinas, como Hernandez (1998) ressalta que estão presentes na maioria das escolas. Para
contemplar o currículo a cada atividade, o professor fazia um levantamento e uma reflexão dos
conceitos que foram abordados junto com os alunos, o que permitiu verificar que, mesmo não
tendo ocorrido de maneira linear, ele conseguiu contemplar os mais diversos conteúdos, com a
vivência dos alunos. Nos momentos de reflexão e sistematização, verificava-se também o que
poderia ser explorado, delineando as novas atividades por meio de um processo reflexivo.
Portanto, o professor conseguiu realizar uma avaliação formativa dos alunos (Perrenoud, 1999)
ou mediadora (Hoffmann, 1993), porque pôde analisar as várias manifestações sociais,
emocionais, afetivas e cognitivas deles em situação de aprendizagem. Assim, conseguiu-se
perceber as facilidades ou os problemas de elaboração, de raciocínio, de proporção, de
articulação, de sociabilidade. Isto permitiu ao professor conhecê-los de uma maneira mais
completa, podendo decidir e atuar para ajudá-los a melhorar, a se desenvolverem e a
descobrirem as suas habilidades, competências (Perrenoud 1999), inteligências (Gardner,
1995), potencialidades e seus caminhos isotrópicos5 (Vygotsky, 1993; Braga, 1996). Os alunos
atuavam muito, individualmente e coletivamente, e o que produziam não estava direcionado
apenas para a expectativa do professor, mas estava relacionado com seus interesses. Nesta
avaliação contínua, foram observados os aspectos: emocionais, sociais e cognitivos.
Consideramos o desempenho de cada aluno e sua evolução individual e coletiva no decorrer do
ano letivo.
O ambiente favoreceu ainda mais os trabalhos em grupo, o que contribuiu para que um
completasse as idéias e dificuldades do outro. A aprendizagem não ocorreu apenas com os
professores em uma relação individual e de dependência (Masetto, 1998), havendo uma grande
parceria com os amigos, professores e voluntárias da instituição. Dessa forma, cada aluno pôde
contribuir com suas idéias a partir de sua criatividade, interesses e desejos, não sendo um
espectador das mudanças que estavam ocorrendo (Fazenda, 1995), tornando-se o ser ativo do
processo de ensino-aprendizagem.
Houve também uma mudança na relação do professor com os pais, uma vez que agora eles
compartilham o desenvolvimento do aluno e colaboram com depoimentos. Dessa forma, foi
muito importante a interação das pessoas diretamente ligadas aos alunos, para que o professor
pudesse dialogar e obter informações para avaliar de maneira mais precisa o desenvolvimento
deles também no convívio familiar e social. Nas análises das professoras, elas declararam que
ao observar as grandes evoluções, o progresso e a satisfação que as crianças apresentavam em
cada uma de suas conquistas, vivenciadas no desenvolvimento dos projetos, é praticamente
impossível negar os benefícios do novo ambiente e dos recursos computacionais.
Logo, pude verificar que é possível melhorar o processo ensino-aprendizagem de crianças com
necessidades especiais físicas, as quais construíram conhecimento, aprenderam de forma
contextualizada e significativa. O computador foi o potencializador de suas habilidades, o
currículo foi construído durante as atividades desenvolvidas, houve mudanças na prática
pedagógica do professor e nas relações com os pais, entre outros resultados expressivos. Neste
ambiente, o ritmo e o tempo, as habilidades, as potencialidades e as dificuldades de cada
criança foram respeitados, possibilitando que cada uma encontrasse seu caminho isotrópico.
Tudo isto permitiu-me vislumbrar que estas crianças poderiam ser incluídas em uma escola
normal que fizesse uso desta nova metodologia, sustentando a tese de Mantoan (1997) sobre o
aprimoramento da qualidade do ensino regular e a adição de princípios educacionais válidos
para todos os alunos, resultando, naturalmente, na perspectiva de uma inclusão escolar com o
uso das novas tecnologias.
Finalizando, acredito que a comunidade educacional deva assumir um compromisso para que o
professor possa apropriar-se da metodologia construída, por meio da qual os alunos, com
necessidades especiais, encontrem seus caminhos isotrópicos, possibilitando-lhes participar
deste ambiente escolar. Logo, após todas estas constatações, sinto a necessidade de a escola
regular mudar seu paradigma educacional e oferecer oportunidade para estas crianças de se
relacionarem com outros alunos, desenvolvendo suas potencialidades, sentindo-se incluídas e
não excluídas. Portanto, nasce um novo desejo, desenvolver um ambiente Construcionista,
Contextualizado e Significativo para ser compartilhado por crianças "normais" e com
necessidades especiais. Minha pesquisa não se encerrou quando coloquei um ponto final em
meu texto/tese. Ela me remeteu a novos caminhos que surgiram durante o percurso de meu
amadurecimento como pesquisadora.
Referências Bibliográficas
BRAGA, L.W. (1996). Cognição e paralisia cerebral: Piaget e Vygotsky em questão. Salvador:
Editora SarahLetras.
MANTOAN, M.T.E. (1997). A integração de pessoas com deficiência: Contribuições para uma
reflexão sobre o tema. São Paulo: Memnon: Editora SENAC.
VALENTE, J.A. (1993). "Por quê o computador na Educação?" Em J.A. Valente (org.),
Computadores e conhecimento: Repensando a Educação (pp. 24-44). Campinas: Gráfica da
UNICAMP.
VYGOTSKY, L.S. (1993). Problems of abnormal psychology and learning disabilities: The
fundamentals of defectology. New York: Plenum.
NOTAS
1. Professora Doutora do Departamento de Matemática e do Programa de Pós-Graduação em
Educação da Faculdade de Ciências e Tecnologia/Universidade Estadual Paulista -
FCT/Unesp - Presidente Prudente.
2. Pesquisa sobre a "Inclusão do Portador de Necessidades Educativas Especiais no
Cotidiano Escolar" financiada pela Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado de São
Paulo - FAPESP, sob minha orientação, que visava verificar se de fato cumpre-se a lei em
termos de inclusão de alunos portadores de necessidades especiais.
3. As reflexões apontadas a seguir são resultados da pesquisa de doutorado realizada por
mim na Associação de Assistência à Criança Deficiente - AACD, no período de maio de
1998 a dezembro de 1999, com crianças portadoras de necessidades especiais físicas.
4. Construcionista porque o aluno usa o computador como uma ferramenta para produzir um
produto palpável na construção do seu conhecimento e que é de seu interesse (Valente,
1997);
Contextualizado porque o tema do projeto parte do contexto da criança, desenvolvendo-se
a partir da vivência dos alunos, relacionando-o com a sua realidade;
5. Significativo quando os alunos se deparam com os conceitos das disciplinas curriculares e
o professor media a formalização dos conceitos, cada aluno deve conseguir dar significado
ao que está sendo aprendido, atuando conforme suas habilidades, resolvendo o problema
de acordo com aquilo que mais se identifica.
6. Vygotsky (1993) afirma que a criança deficiente teria seus próprios caminhos para
processar o mundo. Para ele, a necessidade especial da criança faz com que ela se
desenvolva por meio de um processo criativo (físico e psicológico), definindo-o como
caminhos isotrópicos. Ou seja, a criança portadora de necessidades especiais pode
encontrar seus caminhos por rotas próprias e diferentes.
Mas isto só não basta. O que é o falar sem o ensejo e o desejo de nos comunicarmos uns com
os outros ? O que é o andar se não podemos traçar nossos próprios caminhos, para buscar o
que desejamos, para explorar o mundo que nos cerca? O que é o aprender sem uma visão
crítica, sem viver a aventura fantástica da construção do conhecimento? E criar, aplicar o que
sabemos, sem as amarras dos treinos e dos condicionamentos ?
Daí a necessidade de uma aproximação cada vez maior entre os empreendimentos das áreas
de atendimento às pessoas com deficiência e os que derivam da utilização de recursos
tecnológicos. A proposta é de um encontro dessas áreas, que ao integrar seus conhecimentos,
buscando complementos e interfaces umas nas outras, poderão convir melhor às pessoas que
temporariamente estejam necessitando de recursos especiais para viver.
A ciência tem sido uma grande parceira dos movimentos sociais que atuam no sentido de criar
condições propícias à educação e aos suportes de toda a ordem que a pessoa com deficiência
necessita, para ultrapassar suas incapacidades e melhorar sua qualidade de vida como um
todo.
Mas, insistimos, isto só não basta. Essa parceria não tem sido suficiente para enfrentar
situações que envolvem a marginalização e o isolamento das pessoas com deficiência, ou seja,
a exclusão por razões de ordem política, social, econômica e cultural.
Para garantir a todas as pessoas , indistintamente, uma vida de qualidade e para que todos
possamos compartilhar dos avanços científicos e tecnológicos de uma dada época, a sociedade
precisa estar fundada em princípios de igualdade, de interdependência e reconhecer e aceitar a
diversidade humana, em todas as suas manifestações. Em uma palavra, precisamos somar
competências, produzir tecnologia, aplicá-la à educação, à reabilitação, mas com propósitos
muito bem definidos e a partir de princípios que recusam toda e qualquer forma de exclusão
social e toda e qualquer atitude que discrimine e segregue as pessoas, mesmo em se tratando
das situações mais cruciais de apoio às suas necessidades.
De fato, a exclusão social é uma realidade, mesmo quando as pessoas estão devidamente
apoiadas pelos avanços da tecnologia aplicada à educação e à reabilitação.
Por outro lado, sabemos que incluir não é simplesmente inserir uma pessoa na sua comunidade
e nos ambientes destinados à sua educação, saúde, lazer, trabalho. Incluir implica acolher a
todos os membros de um dado grupo, independentemente de suas peculiaridades; é considerar
que as pessoas são seres únicos, diferentes uns dos outros e, portanto, sem condições de
serem categorizados. Já é tempo de reconhecermos que todos estamos juntos e nascemos
neste mundo e que por isso mesmo não podemos excluir ninguém e convidar a que se
aproximem os que estão à margem, pelos mais diferentes motivos, entre os quais os
portadores de incapacidades físicas, intelectuais, sensoriais, sociais.
O movimento inclusivo surgiu nos anos 90 e preconiza a inserção incondicional de todas as
pessoas como princípio aplicado ao atendimento escolar, clínico, ocupacional, laboral. Trata-se
de um movimento que veio se contrapor, nas áreas da reabilitação e da educação, ao que se
conhece como teoria do meio menos restritivo possível, na qual se baseiam os serviços
segregados de reabilitação e de solicitação do desenvolvimento em seus diferentes aspectos,
inclusive o escolar.
O Desenho Universal não é, pois, uma concepção arquitetônica unicamente dirigida a pessoas
com incapacidades. Os projetos assim delineados obedecem a padrões estéticos podendo ser
bonitos, atraentes e muitas vezes lúdicos; os produtos devem, acima de tudo, visar ao bem-
estar e autonomia das pessoas em geral.
Articulando saberes
Fusão não é justaposição, assim como o verde não é o azul listrado de amarelo!
Queremos, contudo, deixar claro que essa tendência à inclusão não nos remete à globalização,
ao Mesmo, ao Universal - cânones neoliberais. Em uma fala sobre inclusão, o líder Shafik Abu
do movimento Novas Vozes Africanas, nos lembra que (...) "somos um, mesmo sabendo que
não somos os mesmos"
Trata-se, então, de incluir, mas reconhecendo as diferenças, a multiplicidade dos saberes e das
condições sobre as quais o conhecimento é aplicado e de transitar por novos caminhos,
estabelecendo teias de relações entre o que se conhece e o que se há de conhecer, nos
encontros e nas infinitas combinações desses conteúdos disciplinares.
Para que as escolas sejam verdadeiramente inclusivas, ou seja, abertas à diversidade, há que
se reverter o modo de pensar, e de fazer educação nas salas de aula, de planejar e de avaliar o
ensino e de formar e aperfeiçoar o professor, especialmente os que atuam no Ensino
Fundamental. Entre outras inovações, a inclusão implica também uma outra fusão, a do ensino
regular com o especial e em opções alternativas/aumentativas da qualidade de ensino para os
aprendizes em geral.
As escolas ainda resistem muito à inclusão, no sentido pleno e total, que engloba todos os
alunos, sem exceção, entre os quais os que são ou estão mais severamente prejudicados. Mas
há muitas que já estão aderindo à idéia e modificando seus procedimentos, incrementando seus
projetos de ação, aprimorando o trabalho de suas equipes pedagógicas para incluir,
incondicionalmente, todos os aprendizes em suas salas de aulas, porque é justo e desejável
agir assim.
Nossas propostas rompem com as práticas escolares dominantes e apontam para a necessidade
de o processo ensino/aprendizagem ser banhado na riqueza, na subjetividade, nas diferenças e
no dinamismo das transformações que ocorrem na vida, dentro e fora das escolas, quando
entendemos que o conhecimento é produzido no caldo do cotidiano e inventado no encontro
dos saberes e dos fazeres dos que o constroem, com suas mães e com suas mentes.
Comungamos com Michel de Certeau2, que no seu modo sutil e subversivo de analisar o
cotidiano nos faz ver como as práticas escolares são transgredidas, reinventadas, pelas artes
de fazer e de viver de seus membros, ou seja, como podemos caminhar pelas brechas que o
próprio sistema educacional esconde na sua ordem aparentemente impenetrável.
E, finalmente...
A diversidade humana está sendo cada vez mais reconhecida e valorizada por esses
profissionais e considerada como condição primeira para a implementação de seus arrojados
projetos. São nessas e em outras ocasiões similares que constatamos o peso e a importância
da diversidade como fim e meio pelos quais aprendemos mais sobre nós mesmos e sobre os
outros.
NOTAS
* Maria Teresa Mantoan é doutora em Psicologia Educacional pela Unicamp. e leciona nos cursos
de graduação e de pós-graduação da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de
Campinas. Coordena o Laboratório de Estudos e Pesquisas em Ensino e Diversidade LEPED/
Unicamp.
1. Texto publicado em Espaço: informativo técnico-científico do INES, nº 13 ( janeiro-junho
2000), Rio de Janeiro: INES, 2000, pp 55-60.
2. Trata-se de "A invenção do cotidiano" : 1.artes de fazer. Petrópolis/RJ:Vozes, 1994