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urbs/setembro/outobro Entrevista O socidlogo Manuel Castells vé um. longo caminho até que os excluidos possam beneficiar-se com a globalizacio Cartas 6 Panorama 7 Artigo 28 Livros 56 Mesa 58 Registro 62 Trago 66 “Gaps Fete Ge forse CarleaTTaageatation patrocinadores & BankBoston PINHEIRO NETO - ADVOGADOS Apoio institucional da SAO PAULO Lore (lei 10.923/80) 99 Caro: leitor Voce, que estava certo de qui ‘alinha 4 estaria ligando a Luz a Vila id em 2004, verd nesta edicdo que ‘as coisas no so tao simples. Ela depen- “de de recursos publicos que escasseiam, ‘de financiamentos internacionais que “nao 5 1 val Cora iiume se 0 pleno rendimento desse tipo de-trans- porte, A inodernizagao das ferrovias ¢ a © sua integragao com o metr6 também esta » na dependéncia de récursos que ora inexistem, ~ - O socidlogo Manuel Castells, um dos “ maiores pensadores contemporineos das ~ cldades e da globalizacao, marca presenca nesta urbs com uma entrevista exclusiva. ‘Voce conhecerd também uma'inovadora roposta para o Anhangabaii, saldo da inagio e da prancheta de quatro. itetos jovens, Nao deixe de ler artigo de Regina Meyer. Uma boa noticia: 0 . legendério' TBC, Teatro Brasileiro de ‘Comédia, estd de volta, E outra nem: tanto: 0 poder publico continua a agredir -a cidade com 0 que hd de'mais feio e disfuncional. Deveria ser 0 contririo — Para completar, um roteiro de compras para gastronomos ¢ um comentario sobre 0 ‘ postais ue acaba de ser lancado com 0 patrocinio + da Siemens. E ainda notas, editorial, cartas, “0 desenho da diltima pagina. Esperamos que goste, Boa leiura. Ocditor RecINa PRosPERI MEYER Fotos de Nelson Kon IM TESTEMUNHO Em “Tristes Trépicos”, publica- do em 1955, Claude Lévi-Strauss relata a passagem por Séo Paulo, no inicio de 1935, rumo a sua incur- sio amazOnica. As observagbes que fez sobre esta curtaescala da viagem estio registradas em poucas paginas do texto, nas quais a cidade, a sua arquitetura e alguns aspectos da vida urbana sio objeto de um elogiiente testemunho. O capitulo “Sao Pau- Jo” abre com a invocagio de uma méxima, que o préprio autor apon- ta como “obliqua” ¢ feita por “um espitico malicioso”, que define a ‘América como um continente que passou da barbie’ decadéncia sem conhecer a civilizagao. Embora re- jeitando a dureza da fSrmula para descrever 0 continente americano, Lévi-Scrauss serve-se do mesmo mote para tragar 0 ciclo evolutive das cidades americanas, das cidades do Novo Mundo, como costuma nomed-las: “elas vao do frescor & decrepitude sem se deter na velhi- ce”.1 Apesar do tom genético, pois cle esté efetivamente falando das ci- dades do Novo Mundo, o destino de tao contundente sintese € sem diavida a cidade de So Paulo. Langada sobre a cidade na meta- de da década de 30, no especifico momento em que S4o Paulo alcan- avao seu primeiro milhdo de habi- tantes, com um crescimento anual de 4,5%, com os seus governantes vangloriando-se, como alids ¢ regis- trado no préprio texto com uma ponta deironia, de erguer na cidade uma casa.a cada hora’, tal observa~ so possui um enorme alcance. O il urbs setembro/outubro 99 grande interesse dessa avaliagao est no fato de apontar com preciso para 0s aspectos ambiguos, destrutivos e até mesmo ruinosos do avango que naquele momento ganhava uma enorme presenca, elevando a cidade & categoria de “capital do progres- 50”. Comparada pelo antropélogo as duas metrépoles americanas, Chi- cago e Nova York, Sio Paulo vive, tal como elas, “febrilmente numa doenga crénica, perpetuamente jo- ‘vem, ela nao serd jamais sa"2 1Néo devemos confundig sob pena de perder tio rica informagdo, esse olhat analitico sobre a cidade com observagées deixadas por visitantes que, habituados aos contornos das cidade medievais barrocas, mal conseguem discernir e apreciar ou- tras formas urbanas. Longe disso, a abordagem que Lévi-Strauss faz das cidades americanas, das cidades do Novo Mundo, como prefere desig- iné-las, distancia-se daquelasem que “os olhos véem diferencas 3s quais reage com indiferenca’.3 Para evi- tar qualquer mal-entendido, ele dei- xa claro para seus leitores que dis- pensa a presenca de vestigios acu- mulados no passado para se sentir atraido pelas cidades do Novo Mun- do. Considera, pelo contrério, que essa auséncia ¢ justamente um ele~ mento de Sua significagio, de sua substincia urbana. E vai mais longe quando afirma que vé como um privilégio para a sua atividade po- der adaptar-se a um sistema de di- mensio atemporal para interpretar uma forma nova de civilizacio. © que o antropélogo esté eferi- vamente lamentando é a incapaci- dade das cidades americanas, no caso Sao Paulo dos anos 30, de perma- ecerem novas, uma vez que “essa € sua justificativa e sua esséncia”* [DOIS FENOMENOS SIMULTANEOS E IMBRICADOS QUE COABITAM NA METROPOLE eee E DISPERSAO? Hoje, passadas sete décadas e trans- corrido um longo percurso urbano, dois grandes temas dominam o urba- nnismo paulistano contemporaneo: a degradagao de setores urbanos, sobre- tudo das 4reas centrais, eo crescimento fragmentado ¢ disperso das metrépo- les. As interpretages, e sobretudo as descrig6es produridas pelos urbanis- tas a partir desses temas primordiais, revelam anatureza das inuimeras ques- t6es neles contidas. As formas fisicas assumidas pela degradacao dos espa- 0s centtais e a dispersdoilimicada do territério metropolitan tém sido ob- jeto de reflexo para todos os campos do conhecimento que assumem a metrépole como um fato decisivo da vida contemparinea. Est4 sempre presente uma recor- rente distingdo entre aqueles que tm com as questées urbanas responsabi- lidades propositivas ¢ aqueles cujo compromisso é a compreensio das implicagées do fendmeno com outros aspectos da sociedade contemporinea, com a antecipagio de novas expeti- éncias urbanas. Aceitar um distanci- amento entre as duas abordagens, s0- bretudo na atual conjuntura, quan- do pairam mais dilvidas e perplexi- dades do que certezas sobre as ques- tes que invade as mecrépoles, pre- judica particularmente aqueles cuja fungao ¢ intervie. Assumindo o fato inexordvel que o urbanista tem di- ante de si uma tarefa propositiva, tor rnou-se vital acompanhar as artdlises Parque D. Pedro TI: degradagio dos cespagos centrais como cema de reflexio que emergem do olhar artistico e da anilise politica. Hoje, mais que nun- ca, é oportuna e acertada a observa~ ‘s40 de Giulio Carlo Argan quando afirmou que o urbanismo é uma dis- lina estética que avanga para 0 ‘campo politico.5 O exame do vasto material pro- duzido a partir da década de 70, ex- trapolando as abordagens urbanisti- cas convencionais, aponta para rela- ges dindmicas que unem e confron- tam os dois temas mencionados aci- ‘ma, isto é, 0 declinio e a atrofia dos bairros centrais e a propagacio es- sencialmente difusa ¢ ilimitada da mancha metropolitana. Por forca dessa relagio, pois que séo aspectos de uma tinica e continua realidade urbana —a mettépole— esses dois fendmenos pessuem fortes relacbes na sua origem e, por conseguinte, no seu proprio desenvolvimento. ‘Assim, as interpretagbes da abran- géncia fisica e da natureza espacial e funcional dos problemas das dreas centrais néo podem dispensar, sob pena de tornarem-se inadequadas ou mesmo superficiais, uma abordagem integral do funcionamento metropo- litano. Vale lembrar que ndo se trata de uma anilise de tipo globalizante em que a metr6pole deveria ser to- mada como um todo, como um ob- jeto formalmente uno. A prépria de- finigdo de metrépole — um tipo ur- bano pluriarticulado — torna tal abor- dagem contraditéria. A aceitagio da fragmentagio da cidade tradicional, uunitéria e com limites claramente definidos em favor da avalanche ur- bana metropolicana nos obriga a acei- tar também a sua organizagio essen- cialmente difusa e dispersa. Portan- to, a andlise do Centro e de toda a 4rea central visando a apontar ¢ en- ‘caminhar projetos que enfrentem seus problemas urbanisticos repousa me- nos na definicio precisa de seu perl- metro e muito mais na definigio dos sistemas urbanos de escala metropo- fitana dos quais participa. ( problema da decadéncia de ére- as urbanas centrais, conjugado aos projetos de estruturagéo metropoli- tana, desdobra-se em um conjunto de quest6es decisivas para a pritica do urbanismo contemporaneo. A fuga dos pobres para as areas cen- trais deu a0 tema, sob todos os pon- tos de vista, um forte contetido so- cial que nao poderd mais estar au- sente de qualquer intervengio recu- peradora. Tanto investimento quan- t0 0 desinvestimento do setor imobi- lidrio privado ou do poder puiblico no Centro estio fortemente vinculados a presenga e mais fortemente 20 des- 10 da maior parte da populacio cor- tisada da metrépole, que ali encon- trou um nicho de vida urbana. aumento significativo dos cor- tigos na érea central — Centro e bait- ros centrais — néo é um fendmeno que acompanhou de forma lincar 0 padrio de gentrificagio descrito pela literatura especializada. Embora o fe- ‘ndmeno seja onipresente em todos os bairros considerados centras, isto é, 0s bairros contidos no denominado centro expandido, € nos bairros que compéem a drea central que ele se apresentou de forma mais consisten- te. O processo desenvolveu-se de for- ma mais evidente a partir dos anos 660 e esteve, desde o inicio, associado a perda de qualidade introduzida por projetos urbanos de grande escala, setembro/outubro 99 urbs a todos ligados 8s transformagbes vid- rias metropolitanas, E muito esclare- cedora a distingio feita por Neil Smi- th: “A gentrificagio deixou de ser uma excentricidade estreitae quixotesca do mercado imobilidrio ¢ tornou-se 0 ponto avangado de um projeto muito ‘mais amplo: a substituigio de classe social (class remake) no Centro. Seria anacrénico agora excluir as reformas turbanas da rubrica de gentificagio, agsumir que esta, no Centro, mante- ve-se restrita & recuperagio de um pas- sado clegante das velhas alamedas das cidades antigas, 20 invés de associé-la com uma ampla restrucuragéo.” 6 Para reforgar 0 ponto de vista que busco apresentar aqui, vale 2 pena Jembrar um dado histérico banal: nao foi a contundente dentincia das con- digbes de vida nos cortigos de Man- chester que langow os alicerces do ur- banismo modemne.7 Embora a ma- tetialidade da descrigo de Friedrich Engels revelasse a realidade dos bair- ros ¢ da habitagao que a grande in- diistria moderna oferecia& classe ope~ riria inglesa nas iltimas décadas do século XIX, foram outras as detert nantes e condicionantes da instaura~ fo da disciplina urbanistica. A des- crigio dos textitérios operitios de Glasgow e Manchester por volta de 1850 apontava para a inexordvel ne- cessidade de transformar 0 préprio ‘modo de produgio.8 As transforma- Ges exigidas pela cidade industrial, a melhoria dos bairros proletérios, dos cortigos, deveriam vir como corolé- rio das modificagbes que 0 socialis- mo introduziria nas relagdes sociais. Na verdade, 0 urbanismo mo- demo teve origem na necessidade imperiosa que se apresentou para as sociedades capitalistas da segun- da metade do século XIX de orga- nizar de forma adequada e eficien- te 0 espaco urbano exigido pelo ca- pitalismo industrial. Enquanto aparato teérico e conjunto de tée- nicas, o urbanismo nasceu compro- metido com a adapracio da cidade ‘medieval a nova ordem econdmica ¢ logo a seguir com a regeneragdo da cidade destruida pelos procedi- mentos predatérios do primeiro ciclo industrial. Mas foi muico além a0 deixar claro, pelos seus prépri- ‘08 atos, isto é, pelos projeros apre- sentados ¢ executados, que no se tratava apenas de uma aco repa- radora, mas acima de tudo de uma ago exacerbadora.9 ‘Assim, além do seu contetido cau- datrio e subalterno, para usar as pa lavras do proprio Leonardo Benévo- lo, as técnicas urbanisticas voltadas para a regeneragio de setores urba- nos engendraram navas ¢ duras ques- tes cujo ambito nao é muitas vezes contemplado nas andlises que estamos produzindo nos dltimos vinte anos. ; EFEITO BUMERANGUE DA ESTRUTURAGAO VIARIA A formulagio ¢ consolidagao do conceito de mancha urbana revela a dificuldade e cm seguida a rentincia ‘em buscar configuragSes precisas ea conseqiiente aceitacio de um cresci- mento ilimitado e literalmente fora de controle, Nao vou aqui enume- rar nem tampouco analisar 0 processo de crescimento metropolitano pau- listano. Nos interessa apenas subli- raha, como jé foi dito acima, que existe relagéo dindmica ¢ direta en- a urbs setembro/outubro 99 tre 0 crescimento dessa mancha ¢ a destruigao dos espacos centrais, so- bretudo a partir da década 50/60, Um breve retrospect das quest6es que estiveram em pautaem Sao Paulo a partir de meados dos anos 60 co- loca como contraponto da descen- tralizagéo uma acentuada disperséo do territério urbanizado, conduzido pelo padrio de crescimento que re- sultou na produgio de uma metr6- pole tentacular onde a procura da forma urbana pode adquitir a cono- tacio de uropia regressiva tal como foi apontada por Manfredo Tafuti.10 Embora a atividade de demoligo da cidade colonial e construcéo da metrépole industrial moderna ja es- tivesse em curso na década de 20 ¢ ‘mais incensamente nos anos 30, com as obras realizadas pelos prefeicos Pi- res do Rio (1926/30) ¢ Fabio Prado (1935/38), € a anilise do Plano de ‘Avenidas que nos fornece uma clara visio das relagées do Centro com os baitros da cidade. Obras importan- tes ¢ estrururadoras antecederam 0 periodo em que 0 engenheiro Fran- cisco Prestes Maia (1938/1945) lide- roua transformagio urbanistica da ci- dade. Obras de grande porte, como saneamento da Baixada do Glicésio e a ctiaggo do Parque D. Pedro Il, 0 slargamento da Avenida Sa0 Joao, a construgio do novo Viaduto do Ch, a abertura da Avenida 9 de Julho c os dois wineis sob a Avenida Paulista, in- dicam a importincia assumida pela mobilidade no interior da metrépole ve pela acessibilidade & rea centtal Em meados da década de 40, sob ‘ocomande do prefeito Prestes Maia, buscou-se inscalar um sistema vid- rio, e podemos até mesmo dizer urna estruturagio clara e eficiente para 0 Centro e para érea central. Entre 0 Perimetto de Irradiacdo, o “sistema Y" eas 10 avenidas radiais, 2 cidade parecia caminhar para uma estrucu- riigéo que atendia ao mesmo tempo 0 seu perfil radioconcéntrico (cen- trfpeto) e sua expansio centrifuga. ‘Ao longo dos anos 50, 2s obras da “Avenida de Irradiagio” foram se consolidando: avenidas Ipiranga © Sao Lu(s, viadutos Jacaref ¢ Maria Paula, Praca Jodo Mendes, Avenida Rangel Pestana, Rua da Figueira, Viaduto Merctirio, Avenida Senador Queirés, fecham um circuito que’ abragou o Centro. Novos cédigos de uso e ocupacio do solo visaram for- necer as avenidas centrais gabaritos condizentes com suas calhas. O *Sis- tema Y” ganhou sua configuragéo final em 1957 com a aprovagio da abertura da Avenida 23 de Maio, que posteriormence assumiu caracteristi- cas de via expressa.11 Enquanto completava-se o Centro plangjado e sobretudo desenhado nos anos 30, iniciava-se com grande im- acto, nos anos 60, um novo ciclo de transformagées. O projeto da Segun- da Perimetral, afastado pelo prefeito Adhemar de Barros em 1957, ¢ poste- riormente parcialmente recuperado, tornara-se fundamental para criar as ligagées complementares da “Avenida de Itradiagio”. O prefeito Faria Lima, que assume o cargo em 1965, concen- trouseus esforgos na conclusio deduas obras de grande importincia para 2s ligagées mecropolitanas e enorme im- pacto no Centro: a Radial Leste ¢ a execucio das obras do complexo vid tio do Parque D. Pedro II.12 A proliferacio e crescimento dos baitros suburbanos ¢ das “vilas” — Matilde, Guilhermina, Esperanca, entre outzas —, assim como 0 des- membramento ¢ crescimento dos munic{pios que formariam mais tar- de a metrépole, deixavam claro que © crescimento da mancha era efeti- vamente ilimitado e veloz. No peri- odo de 1940 a 1970 hé um.avango considerdvel no ntimero de munici- pios em torno de Sao Paulo: dez munic{pios na década de 40 e trinta em 1960. 13 ‘A ruptura desse lento proceso de organizagfo vidria e urbana veio an- tes do que esperavam os seus ideali- zadores. Sem levarmos em conta as caracteristicas do periodo seguinte, isto ¢, de 50 a 80, as trés décadas em que a industria monopolista condu- ziu os caminhos da metrépole, difi- cilmente poderemos entender como essa estruturagio tornou-se frégil ¢ insuficiente. Assim, enquanto 0 Cen- tro recebeu no periodo 50/60 inves- timentos de grande porte, pois é importance lembrar 2 concomitén- cia da construgio do Conjunto Praga Roosevelt: exemplo do tipo de intervengio que se dé.a partir dos anos 60 ‘Nacional na Avenida Paulista, como a construsio dos edificios Italia e Copan, deixando clara a sua capaci- dade de competir com os atrativos da “nova avenida”, a via expressa, que acabaria por desempenhar um papel crucial no seu enfraquecimento ur- bano, converteu-se na tinica respos- ta vidtia oferecida pelo poder pibli- os novas escalas de veiculos circu- lando na cidade. Em meados dos anos 60 atingimos a marca de 415 mil veicul8s a motor circulando na cidade. Esse ntimero correspondeu a um aumento de 1.518% em 16 anos.14 Hoje, com perto de 300 li nas de énibus chegando nos termi nais do Centro, nio é dificil perce- ber que a escala e 0 tipo de mobili- dade exigido pelo padrao de distri- buigio das atividades na metrépole, conjugados & acentuada distribuigao radioconcéntrica do sistema vidrio, tornou-se um problema crucial. Ava- liados conjuntamente, os projetos ur- banos executados na drea central ¢ no Centro a partir dos anos 60 sio fruto das exigéncias da mobilidade ¢ da acessibilidade de contetido me- tropolitano. E importante ressaltar que tais projetos nao so obrigatori- amente predatérios. Outras metré- poles enfrentaram quest6es idénticas sem criar para suas reas centrais processos tio negativos. Como um bumerangue lancado de dentro para fora, isto & do Centro para ao bairros, a estruturagio vidria rebateu-se de volta sobre 0 Centro, exigindo novas posturas e novas es- calas de intervengio. Embora a im- plantacio do Plano de Avenidas ain- daestivesse mobilizando a atengio de Prestes Maia, que em 1961 assumia novamente o cargo de prefeito, sua resposta técnica aos problemas urba- 1nos paulistanos jéviera em 1955 com © “Ante - Projeto de um Sistema de Transporte Répido Metropolitano”, ‘em que o metré foi apresentado como a tinica solugdo adequada. As reper- ‘cussdes do lento encaminhamento das diversas propostas para a construcio de um sistema de transporte de alta capacidade estio muito presentes nas atuais questées do Centro, i ESCALADA DAS INTERVENGOES A incorporaco dos elementos ur- banos exigidos pelo processo de me- tropolizacio — uma sucesséo dind- ica de etapas de tcansformacio da ‘metrépole — incidiu de forma deci- siva na estrutura fisica e funcional do Centro, produzindo marcas pro- fandas nos seus espagos publics. A conjugagio do inicio das obras do trecho da via expressa Leste-Ocs- te sobre 2 Avenida Sio Joio, o Ele- vado Costa ¢ Silva, com a inaugura- fo da nova Praga Roosevelt, mar- cam 0 primeiro grande ataque aos espagos ptiblicos do Centro tendo como premissa, ou justificativa, as graves questées de circulagao viéria. A via elevada Costa e Silva, ligando a Rua Amaral Gurgel ao Largo Pa- dre Péricles, em Perdizes, entregue 20 uso em janeiro de 1971, criou um novo estatuto urbano para a Aveni- da Sio Joio. Inaugurada no inicio de 1970, a setembro/outubro 99 urbs Praga Roosevelt tornou-se um sim- bolo da acéo do poder piiblico sobre os espagos puiblicos da rea central projeto implantado, distribuido ‘em ués niveis, apresentou um pro- grama complementar de usos com- plexos, além de atender &s exigenci- as da circulagio metropolitana, A antiga praca de terra batida ¢ substi- tuida por uma edificagio cuja qua- lidade urbana foi imediatamente con- testada, A escala do projeco interfe- riu na estrutura da regio, criando paredées onde existiam vistas. Para- doxalmente, mesmo reconhecendo {que ali exiscia um imenso ¢ inade- quado estacionamento a céu aberto, éimpossivel no reconhecer 0 card ter destrucivo da iniciativa, A tenta- tiva de dotar um corpo vazio — a megaestrucura de 30.000 m2 — de qualidades urbanas, quando sua fun- ‘Gao primordial e essencial era na ver- dade encobrir as pistas subtertincas e garantir o livre fluxo dos veiculos {que atravessam 0 Centro, sem ne- hum contato direto com a sua ¢5- trutura vidria, levou os arquitetos res- ponsiveis pelo projeto urbano a bus- car uma densidade de uso e de fun- Bes capaz de criar um “auténtico te- cho de cidade”. Mas a falsa complexidade espa- cial e programatica criou espagos que no revelam suas fung6es. A in- distingZo, tanto nos acessos exter- hnos quanto nos espagos incernos, centre uma garagem, uma creche ou uma biblioteca, tornou-se uma bar- reira, um impedimento para uma posterior assimilagéo pelo usudrio ¢ pela cidade. A dificuldade de “ler” ‘0 set opaco € misterioso interior, assim como a impossibilidade de criar qualquer tipo de continuida- de entre a nova construgio ¢ 0 teci- do urbano existente, estabeleceram entre a praca e o Centro relagdes de coexisténcia, no sentido emprega- do por Rem Koolhas a0 descrever as propriedades das edificagSes nas guais 0 tamanho (conceito de big- ] urbs setembro/outubro 99 esi) € um dado fundamental.15 Embora o termo coexisténcia sugi- raalgum tipo de acordo, ébom nao ter ilusdes: as atuzis condigées da Praga Roosevelt ndo demostram ne- nhum tipo de aproximagéoventre 0 contexco urbano onde foi instalada 0 seu interior. A paradoxal possi- bilidade de um projeto exacerbar a precariedade ao invés de induzir ou promover a reparagao dos proble- mas urbanos ficou ali patente. A nova praga criou nos anos 70 um tremendo residuo urbano cujo po- der de eroséo continua negativa- mente vivo ¢ ativo no Centro. ( segundo golpe, dentro de prin- cipios semelhantes 20s que conduzi- ram a intervengio da Praga Roose- velt, veio logo a seguir com o plano de ampliagio da Praga da Sé, apro- vado em 1973 e realizado a partir de 1974, A implantagio de estagio Sé, ligada & primeira linhado metrd pau- listano, a Norte-Sul, impés a demo- igo dos iméveis da vertente leste da praca, junto as ruas Felipe de Oliveira c Santa Teresa. As duas jus» tificativas apresentadas para o porte das intervengbes foram a necessida- de de espaco subterrineo que a mai- or estacio metrovidria do Centro exi- giria e o volume de pedestres que a drea passaria a receber depois de 1978, com a sua inauguragio. Pelo projeto, executado entre1974 € 1978, as pragas da Sé ¢ Clovis Be- vilagua passam a compor um espa- 0 continuo, sem, no entanto, che- gat em momento algum 3 condigéo de expaco integrado. A Catedral da ‘Sée 0 Palicio de Justica perdem seus fespacos especificos, seus suportes urbanos, o que lhes retira também a capacidade de funcionar como “mar- ‘cos delimitadores", passando a dis- putar “ombro a ombro” o espaco du- plicado ¢ transbordante. Implodiu- se com as edificagdes a propria es- séncia espacial e funcional das duas pracas, O novo espago, 0 espago re- sultante, engoliu as duas pragas cri- ando um territério fluido ¢ indefi- nido em todos os niveis. Apesar de posteriormente agregar-sea forte pre- senga da estacio S¢ do mewr6, o feri- mento no chegou a ser cicatrizado fe nem tampouco a estancar 0 exces- so de espago criado pela acumula- ‘glo das duas pracas. vario criado nao chegou a ga- nhar o poder evocative do terrain sague de que fala Ignasi de Sola- Morales.15 Aqui o vazio criado pela auséncia das edificagdes nao pode alcangar a dimensio positiva de uma promessa, de espago expectan- te, pronto a receber um projero ¢ um novo uso, descrico em sua and- lise. O vazio criado na Sé ¢ pura indetérminagio; remete ainda hoje, em termos puramente espaciais, mais claramente ao que foi implo- dido do que 20 que conq) a nova estagdo. As intimeras tenta~ tivas de recompé-lo através de in- ervenges no seu interior resulta- ram nulas. Diante da impossibili- dade de reconstituir 0 tecido ur- tbano implodido, as fontes, as

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