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= 6 ~ail ul Ml A} CAPITULO 35 Ohomem que nao fazia perguntas HANNAH ARENDT (O nazi Adolf Eichmann era um administrador muito diligente. A partir de 1942, foi encarregado de transportar os judeus da Europa para os campos de concentragio na Polénia, incluindo Auschwitz. Isto fazia parte da «Solugao Final» de Adolf Hitler: 0 plano para matar todos os judeus que viviam nos territérios ocupados pelas forgas alemas. Eichmann nio era responsivel pela politica do exterminio sistematico - a ideia nao era sua. Mas esteve fortemente envolvido na organizacio do sistema de caminhos-de-ferro que possibilitou esse exterminio. Desde 0s anos 30 que os nazis promulgavam leis que eliminavam os direitos do povo judeu. Hitler culpava os judeus por quase tudo o que corria mal na Alemanha e tinha um desejo louco de se vingar deles. Essas leis proi- biam os judeus de frequentarem escolas piiblicas, obrigavam-nos a entre- ‘garem o dinheiroe as propriedades ¢ a usarem uma estrela amarela. Os judeus foram reunidos ¢ obrigados a viver em guetos ~ bairros de cidades sobrepo- voados que se tornaram prisdes para eles. A comida era pouca e a vida era ‘dificil, Contudo, a Solucio Final introduziu um novo nivel de mal, A decisio de Hitler de matar milhdes de pessoas apenas por causa da sua raga levou a que ‘os nazis necessitassem de arranjar maneira de transportar os judeus das cidades para 0s locais onde poderiam ser mortos aos milhares. Os campos de concen- tragio existentes foram transformados em fabricas para gasear ¢ cremar cen~ tenas de pessoas por dia. Como muitos destes campos se situavam na Polénia, alguém tinha de organizar os comboios que transportavam os judeus para a morte. Enquanto Eichmann, sentado num escritério, despachava papéis e fazia telefonemas importantes, milhdes de pessoas morriam como resultado daquilo que fazia, Alguns morreram de febre tifide e de fome, outros foram obrigados a trabalhar até morrer, mas a maioria morreu com gis. Na Alemanha nazi, os comboios andavam a horas ~ Eichmann e outros como ele certificavam-se disso ‘mesmo. A sua eficiéncia mantinha cheios os vagées de gado, No seu interior, havia homens, mulheres e criancas, todos numa longa ¢ penosa viagem para a ‘morte, normalmente sem comida nem gua e, por vezes, em condigées extremas de calor ou frio, Muitos morriam durante a viagem, particularmente os idosos cos doentes. s sobreviventes chegavam debilitados e aterrorizados, e eram imediata- mente levados para cimaras disfargadas de chuveiros, onde eram obrigados a despirem-se. As portas cram trancadas. Era aqui que os nazis os matavam com gis Zyklon. Os seus corpos eram depois cremados e as suas posses roubadas. Se nfo fossem escolhidos para esta morte imediata, os mais fortes eram obri- gados a trabalhar em condigées atrozes com pouca comida, Os guardas nazis espancavam-nos e até disparavam contra eles por gozo. Eichmann desempenhou um papel importante nestes crimes, No entanto, apés o fim da Segunda Guerra Mundial, conseguiu escapar aos Aliados ¢ foi paraa Argentina, onde viveu secretamente durante alguns anos. Contudo,em 1960, alguns membros dos servigos secretos israclitas, a Mossad, descobricam- -no em Buenos Aires e capturaram-no, Drogaram-no e levaram-no para Israel afim de ser julgado. Seria Eichmann uma espécie de besta maléfica, um sidico que gostava do sofrimento dos outros? Antes do inicio do julgamento, era isso que a maioria das pessoas pensava. De outro modo, como podia ter desempenhado esse papel ‘no Holocausto? Durante virios anos, a sua fungio consistira em organizar modos eficientes de enviar pessoas para a morte. Certamente, sé um monstro seria capaz de dormir a noite depois desse género de trabalho. A fildsofa Hannah Arendt (1906-1975), judia alema que emigrara para os Estados Unidos, fez a cobertura do julgamento de Bichmann paraa revista New Yorker. Hannah estava interessada em conhecer diretamente um produto do Estado totalitarista nazi, uma sociedade na qual ndo havia espago para o pen- samento pessoal. Queria compreender aquele homem, perceber como ele era; ever como podia ele ter feito coisas tio terriveis. Eichmann nao era o primeiro nazi que Arendt conhecera. Ela propria fugira ‘aos nazis quando se mudou da Alemanha para Franga, acabando por se tornar cidada norte-americana. Na sua juventude, quando estudava na Universidade de Marburgo, 0 seu professor fora o filsofo Martin Heidegger. Durante um breve periodo de tempo, foram amantes, apesar de cla ter apenas 18 anos de idade e de ele ser casado, Heidegger estava ocupado a escrever Ser e Tempo (1962), um livro incrivelmente dificil que alguns pensam ser um grande con- tributo para filosofia e outros consideram ser um texto deliberadamente obs- curo, Mais tarde, seria um membro empenhado do Partido Nazi, apoiante das, suas politicas antijudaicas. Heidegger chegou a retirar 0 nome do seu antigo amigo, ofilésofo Edmund Husserl, da pagina dedicatéria de Sere Tempo por ser judeu. ‘No entanto, agora em Jerusalém, Arendt iria conhecer um tipo muito dife- rente de nazi, Aliestava um homem muito vulgar, que decidiu ndo pensar muito sobre o que fazia. A sua falta de reflexio teve consequéncias desastrosas. Mas ni era o sidico maléfico que Arendt esperava encontrar. Era algo muito mais comum, mas igualmente perigoso: um homem irrefletido. Numa Alemanha onde as piores formas de racismo haviam sido escritas na lei, era facil para Eichmann convencer-se de que 0 que fazia estava certo. As circunstancias deram-Ihe a oportunidade de ter uma carreira bem-sucedida e aproveitou-a. Para Bichmann, a Solugio Final de Hitler era uma oportunidade de mostrar «que podia fazer um bom trabalho. Isto ¢ dificil de imaginar e muitos criticos ‘nao concordam com Arendt, mas esta achava que ele estavaaser sincero quando declarou que estava a cumprir o dever. ‘Ao contrério de alguns nazis, Eichmann nao parecia motivado por um ‘grande édio aos judeus, Nao tinha esta maldade de Hitler. Havia muitos nazis que espancariam alegremente um judeu na rua até morte por nio fazer a saudagio «Heil Hitler!», mas Eichmann nio era desse género. No entanto, aceitara a kinha oficial nazi e, muito ptor que sso, ajudara a enviar milhoes de ‘pessoas para a morte. Mesmo enquanto ouvia as provas apresentadas contra si, no UMA PEQUENA HISTORIA DA FILOSOFIA parecia nao perceber o mal que fizera. A seu ver, dado que nao infringira qual- quer lei e nunca matara diretamente ninguém ou pedira a alguém para o fazer, comportara-se bem. Fora educado para obedecer & lei treinado para seguir ordens, ¢ estava rodeado de pessoas que faziam o mesmo. Ao receber ordens de outros, evitava sentir-se responsavel pelos resultados do seu trabalho disrio. Eichmann néo tinha necessidade de ver as pessoas empilhadas em vagies de gado ou de visitar os campos de exterminio. Tratava-se de um homem que disse ao tribunal que ndo péde ser médico porque tinha medo de ver sangue. No entanto, tinha sangue nas maos. Era um produto de um sistema que, de certa maneira, o impedia de pensar criticamente sobre as suas préprias agbes ¢ sobre os resultados que produziam nas pessoas reais, Era como se nfo con- ‘seguisse imaginar os sentimentos dos outros. Durante todo o julgamento, man- teve a crenga iluséria na sua inocéncia. Ou entio decidiu que a sua melhor cstratégia de defesa era afirmar que apenas obedecia a le neste caso, enganou Arendt. Arendt usou a expressio «a banalidade do mal» para descrever 0 que vit em Eichmann, Se uma coisa é «banal», é comum, aborrecida e pouco original. A maldade de Eichmann, dizia ela, era banal no sentido em que era o mal de um burocrata, de um gestor, ¢ ndo de um deménio, Era um homem muito vulgar que permitia que as ideias nazis afetassem tudo o que fazia, A filosofia de Arendt inspirava-se nos acontecimentos que ocorriam em. seu redor. Nao era o tipo de fildsofa que passava o tempo num cadeirio a pen- sar em ideias puramente abstratas ou a discutir interminavelmente sobre 0 significado exato de uma palavra. A sua filosofia estava ligada a histdria recente 8 experiéncia vivida, Aquilo que escreveu no seu livro, intitulado Eichmann «em Jerusalém, baseava-se nas suas observages de um homem, da sua lingugem, das justificagoes que deu. A partir do que observou, desenvolveu explicagbes ‘mais gerais do mal num Estado totalitarista e dos seus efeitos naqueles que no resistem aos seus padrées de pensamento. Eichmann, tal como muitos nazis desse tempo, nao era capaz de ver as coisas a partir da perspetiva dos outros. Nao tinha coragem suficiente para questionar as regras que Ihe impunham: procurava apenas a melhor maneira deas seguir. Faltava-the imaginacao. Arendt descreveu-o como insipido e esti pido ~ embora também isso pudesse ter sido uma representagito, Se fosse ‘um monstro, seria aterrador, No entanto, pelo menos os monstros so raros ¢, normalmente, ficeis de identificar, © mais assustador, talvez, era o facto de (0 HOMEM QUE NAO FAZIA PERGUNTAS parecer to normal. Era um homem vulgar que, por ndo ter questionado aquilo que fazia, participou em alguns dos atos mais maléficos conhecidos da huma- nidade. Se nao tivesse vivido na Alemanha nazi, era pouco provivel que tivesse sido um homem mau. As circunsténcias estavam contra ele. Mas isto nfo 0 inocenta, Obedeceu a ordens imorais, E, segundo Arendt, obedecer as ordens nazis equivalia a apoiar a Solugao Final. Ao nfo questionar aquilo que the man- davam fazer e a0 executar essas ordens, participou num assassinio em massa, ainda que, segundo a sua perspetiva, se limitasse a criar horirios de comboios. Accerta altura do seu julgamento, chegou a declarar ter agido segundo a teoria do dever moral de Immanuel Kant ~ como se tivesse agido corretamente a0 seguir ordens. Néo compreendeu que Kant pensava que tratar os seres huma- nos com respeito e dignidade era fundamental para a moral. Karl Popper foi um intelectual vienense que teve a sorte de escapar a0 Holocausto ¢ aos comboios muito pontuais de Bichmann.

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