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OS BAILUNDOS
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KALUMBONJAMBONJA
ROMANCE – AUTOBIOGRÁFICO
ANGOLA
OS BAILUNDOS
TOMO II
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Introdução
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A nação de Angola é vasta e tem muitas tribos, e cada uma delas tem a língua ou
dialecto, os seus costumes e a sua origem. Todos os povos do mundo têm cada um deles
a sua história e estórias. Acontece porém, que para muitos desses povos as suas
tradições são desconhecidas.
Muitos africanos confiam mais nas feitiçarias e em tudo o que os europeus cultos
e nada dados a sincretismos religiosos consideram como superstições. O feitiço na África
tem dado bons resultados aos seus possuidores, visto que é uma obra do Diabo (leitura
da teologia cristã tradicional e que é a postulada por este escritor, um metodista
ortodoxo). Há muitos tipos de feitiçarias e os seus ingredientes são restos de cadáveres
que eles desenterram dos cemitérios durante a noite; também recorrem às raízes e folhas
de certas e determinadas plantas, ídolos, etc. As fezes humanas também desempenham
importante papel nas feitiçarias dos africanos. Seria bom se houvesse a história de um
povo. Todas as nações ocidentais têm a sua história que é leccionada nas escolas.
Ao longo dos tempos, os Bailundos nada têm escrito quanto à sua própria
históriai,e do que dela se sabe tem sido transmitida de pais para filhos oralmente e por
meio das tradições entre o povo. Assim, como os mais velhos vão desaparecendo, corre-
se o risco de se extinguir as verdadeiras origens dos seus costumes e dos seus feitos, os
quais bem poderiam ser o fundamento da sua história. Costuma dizer-se que um velho é
um museu de antiguidade. Por conseguinte, muitos dos que poderiam narrar a história e
estórias já desapareceram. Os instrumentos musicais tradicionais, como o ombumba, o
ochissanji, o cacheque, que tem a forma dum violino, o olombendo, parecido com a
flauta, e outros, já desapareceram. As danças tradicionais também vão desaparecendo.
A verdadeira origem dos Bailundos (vide nota de rodapé “i”, página 15) não é
conhecida; apenas se sabe que o seu primeiro rei, de nome Katiavala era originário das
terras do Kuanza Sul, era caçador de elefantes e pertencente à tribo Goya.
O passo seguinte foi destruir todo o poder que os reis tribais e tradicionais tinham,
desrespeitando toda a cultura dos Bailundos. Os sobas (reis) eram os cobradores de
impostos indígenas, sendo submetidos a palmatoadas, chicotadas e outros castigos
severos, caso levassem pouco dinheiro às autoridades dominantes. Eu pessoalmente vi
os sobas serem espancados severamente.
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Angola, como as outras nações, tem muitos lugares dignos de serem turísticos,
mas os portugueses, que a governaram durante longos tempos, não tinham interesse 4
nessas coisas.
Tenho encontrado muitos sítios onde viveram esses primeiros povos, “talvez muito
antes de Cristo”, murados de pedras, e que são dignos de admiração. Os cacos das
panelas de cerâmica espalhados por vários locais, demonstram que estes Bailundos
vieram de tempos remotos.
Ninguém dava valor àquelas pinturas, até que um dia falei delas perante o
secretário do Concelho que interessou-se muito por elas. Levei-o até onde as tais pinturas
se encontravam, Depois foi publicado num jornal e, por tal motivo, passou a ser lugar
turístico. Era visitado por muita gente de Angola e até mesmo por sul-africanos. Dizia-se
que por ali haveria de passar uma estrada asfaltada para ter melhor acesso ao lugar.
Estas pinturas passaram a ser conhecidas como “Pinturas Rupestres do Kanili”.
Quero que saibam que os rios kulele e kukai e a Missão Evangélica Reformada do
Bailundo abrigam um grandioso monumento muito antigo de grande destaque, feito pelo
homem, “talvez mesmo antes de Cristo”. É um grande morro feito de terra e pedra, e feito
muito provavelmente por muitos milhares de pessoas. Os construtores daquela obra
abriram uma vala profunda com a largura de cerca de dez metros; a terra da escavação
era transportada para determinado lugar onde formou um monte grande que calçaram
com pedras.
De todas as vezes que o tenho visitado fico “de boca aberta”, e o considero como
igual às pirâmides do Egipto, e ninguém sabe qual a sua utilização. Uns dizem que era o
túmulo de um rei tribal, outros, uma torre de vigia, e a vala que atingia os dois rios era
uma espécie de trincheira de guerra.
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Um padre francês utilizou dez novelos de barbante, tendo amarrado uma pedra na
ponta do fio de um novelo, fez descer ao poço a pedra, e quando o novelo terminou ligou- 5
lhe outro novelo, até contar os dez novelos, e mesmo assim sem chegar ao fundo, e cada
novelo tinha cerca de 500 metros. Na minha opinião este buraco devia ser explorado,
provavelmente sendo um depósito de petróleo. É um poço histórico, porque a tradição diz
que antigamente lançavam para lá todas as pessoas acusadas de feitiçarias.
O autor
(Élder [Ancião de orientação Baptista Particular e calvinista] congregante da Igreja Baptista Pentecostal de
Braga)
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INÍCIO DO TOMO II
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FUNDAÇÃO (ORIGEM) DO REINO DOS BAILUNDOSii
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No Mungo, para além do sobado de Mbuluyiongombe havia
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outros sobados muito antigos cujos fundadores são desconhecidos,
tais como os da Chiweka, Chango e Chiteva.
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No dia seguinte o soba apareceu com os tais homens, e o
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Secretário lá lhes mandou comprar um garrafão de vinho e lho
entregou.
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seguinte Chihamba organizou outra caçada. A rapariga ficou no altar
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dos caçadores. Chihamba desta vez conseguiu muita caça, e Huambo
Kalunga cumpriu o prometido. À noite Huambo Kalunga enviou a sua
coorte para raptar a moçoila. Chihamba, com os seus cães e com os
vizinhos conseguiram recuperar a formosa moçoila. Matou todos os
raptores e cortou-lhes a cabeça. No dia seguinte, de manhã cedo, pôs
as cabeças num cesto e levou-as ao soba Huambo Kalunga,
perguntando:
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Tal como acontecia com os reis europeus, também os sobas só
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reinavam se fizessem parte da linhagem real.
- Voltamos a pedir que o boi venha até nós para nos lamber a
farinha deste balaio.
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Outrora, para se entronizar um soba, era necessário mandar os
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Akuenje velombe (Rapazes da corte, soldados do soba) a uma certa
distância da Embala para armarem uma emboscada junto de um
caminho e apanharem a primeira pessoa que por ali passasse. Depois
a cabeça desta pessoa era decepada e levada para a embala onde era
cozida juntamente com a carne do boi e comida por todos. A pessoa
morta passava a designar-se por Ekongo.
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Conta-se que um dos sobas do bailundo havia solicitado ao soba
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do Andulo o pagamento de um tributo. Este ficou irritado e mandou o
seu Epalanga como emissário afim de chegar ao soba do Bailundo a
mensagem de que ele não era obrigado a pagar nenhum tributo. O
soba do Bailundo ficou zangado e mandou prender o emissário que se
transformou em Epumumu (Peru bravo) e desapareceu voando. “Oh!”,
exclamou espantado o soba do Bailundo, dizendo:
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Epalanga Matuyakevela. Isto aconteceu quando o Bailundo
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encontrava-se sob a administração do capitão Teixeira da Silva, em
que um dos soldados violou a mulher do soba bailundo chamado
Numa. Quando Numa teve conhecimento deste crime, foi ter com o
capitão Teixeira da Silva a fim de exigir, como era hábito, o
pagamento de uma indemnização por parte do soldado. O capitão ao
invés de atender ao pedido do soba irritou-se sobremaneira, que
acabou por prender o soba Numa. Como se não bastasse, o preso foi
enviado para Benguela, meteram-no num barril e lançado ao mar para
o fazer desaparecer desta forma tão vil e para sempre.
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actividades do reino, o rei manda fechar o portão, mas antes de o
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fazer manda vir uma das suas mulheres para lhe fazer companhia. No
caso de uma urgência, o Ukuepangu entra na residência do rio através
de um labirinto que só ele conhece, pondo à disposição do soberano a
informação que ele possui.
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rei vinham os tocadores de andigo e de flautas que o acompanhavam
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orquestralmente. Como cajado o rei levava consigo um rabo de boi,
seco.
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onjango. Na manhã seguinte, o pirão que havia sobejado, chamado
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obeta, era assado nas brasas.
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- Luye! – E citava-se mais uma adivinha:
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- Ochinyama ca fa ku iya imbo eli, li punjaco, ku iya imboeli li
punjaco, puai omo ca suilapo.
- Tambu, tambu imbo lia Chissanje, nikula sekulo Ymbo ndu teta
utue, ndu wimba volui, mopisa olondombe siti, ka kuni kunyiko. – “É
bem recebida a ideia de Chissanje, pego no sekulo do quimbo, corto-
lhe a cabeça e lanço-o ao rio e digo aos peixes: Comam-no!”
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Depois disto decifrava-se a adivinha: “Dois morros na charneca
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são duas chuchas no peito duma rapariga”.
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sentir as dores que lhe provocavam os cortes da faca, cuspiu os dois
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homens para o fundo das águas do rio, fazendo-os desaparecer para
sempre”.
Aquele pai foi ter com o filho dizendo-lhe que o vinha resgatar. O
filho disse então ao pai que estava muito rico e por isso não desejava
ser resgatado. Mostrou-lhe toda a riqueza que possuía, deixando o seu
pai muito desapontado.
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satisfeito da vida, a corta mato, e de repente ouviu uma voz vinda de
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cima que dizia:
Aquele caçador levantou os olhos e viu que quem falava com ele
era um leão que estava enganchado no ramo de uma árvore. O leão
disse depois:
Mas o caçador disse que eram os seus braços, e o leão disse que
os braços também servem para comer. Daí então começou uma
grande discussão com o caçador com o caçador a defender os braços.
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- Eu estava aqui e saltei assim… O leão ao saltar ao saltar ficou
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novamente preso nos mesmos ramos da árvore, e o cágado lhe disse
por fim:
A fim de evitar que algum mal destruísse a sua casa por ter
praticado adultério, quem cometesse tal acto, deverá pegar certas
ervas e colocá-las no fogo da cozinha sem que ninguém se
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apercebesse, evitando assim a doença de onjamba. No entanto, a
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melhor maneira de evitar esta terrível doença, é utilizar a carne de
elefante, que em umbundu também se chama onjamba. Quem tivesse
carne seca de elefante podia ter relações sexuais quantas vezes
quisesse, e nada de mal lhe aconteceria caso pusesse um pouco
dessa carne no lume da cozinha depois das relações sexuais.
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Ainda hoje, não obstante as mudanças de civilização e de
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costumes, se num lar dos Ovimbundu houver alguém que sofra de
varíola ou sarampo, é costume vedar-se a casa toda, fechando todas
as portas e janelas para que o doente não tenha contacto com
ninguém. Acredita-se que caso algum homem tenha tido relações
sexuais com a sua mulher e vá visitar um doente de varíola ou de
sarampo, isso faria o doente morrer. Por esta razão não é permitido
que nesta classe de doentes eles sejam alvo de visitas.
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mongumba, dizia: “kuenjo, kuenjo (cuidado rapaz, cuidado rapaz!)”.
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Estas vozes onomatopeicas tinham um significado especial para todos
os que as ouviam.
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O caso acabou por ir à Embala na esperança de que o soba
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conseguisse fazer com que a dona do coador recebesse um
pagamento qualquer, no entanto esta continuava obstinada e só
aceitaria o seu coador. Não houve outra solução senão arrancar a
planta das cabaças. Depois de cortada a planta, as cabaças já quase
criadas acabaram por se secar, morrendo.
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então prometeu entregar dois bois como pagamento da pulseira, mas
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a outra respondeu que não queria boi nenhum, mas sim apenas a sua
pulseira.
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Com o ferro derretido, fabricavam todo o tipo de artefactos para
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a agricultura e objectos caseiros, como machados, enxadas, facas e
outros objectos.
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em Benguela. Havia também empresários chamados, em umbundu,
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de fumbelo, ou seja, pombeiro em português. Estes obtinham muitas
mercadorias de Benguela que enviavam para os Nganguelas, e vice-
versa, mercadorias, estas, transportadas às costas de carregadores
negros. Estes trajectos levavam muitos dias e eram muito arriscados
devido aos animais selvagens, salteadores, às doenças, etc. Viajavam
durante a metade do dia, e a outra metade era para se precaverem
nos acampamentos contra estes malefícios. Faziam grandes cercos de
madeira à volta dos campos, constituídos por palhotas bem
resistentes, a fim de evitar que leões os atacassem ou os salteadores
o roubassem. Apesar de todas as precauções, muitos foram comidos
por leões e assaltados por ladrões. Durante as noites faziam grandes
fogueiras dentro das cercas, e enquanto uns dormiam outros faziam
de sentinela. Se ouvissem o rugir do leão batiam em panelas,
lançavam nas fogueiras farrapos para avivarem as chamas e
provocarem mau cheiro, gritavam e disparavam tiros de canhangulo,
fazendo deste modo muita agitação. Se alguém pele de algum animal,
que designavam de ombinji, cortavam dela um pedaço que deitavam
ao lume, e que afugentava os leões. Os ombinji atacam qualquer
animal, e têm os dentes muito cortantes, semelhantes a navalhas. Diz-
se que quando se defrontam com qualquer outro animal, seja leão,
elefante, etc., atacam-no um por um e em pouco tempo este animal
(atacado) fica apenas esqueleto. Os ombinjiix são semelhantes aos
cães, e até fazem temer até as hienas e outros predadores. (Continua
no tomo III).
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Bailundo é uma cidade e município da província do Huambo, em Angola, localizada em pleno
planalto central. Tem 7 065 km² e cerca de 56 mil habitantes. É limitado a Norte pelos municípios
de Waku Kungo e Andulo, a Este pelos municípios de Mungo, Cunhinga e Chinguar, a Sul pelos
municípios de Catchiungo, Tchicala Tcholoanga e Huambo, e a Oeste pelos municípios de Ekunha,
Londuimbale e Cassongue. É constituído pelas comunas de Bailundo, Lunge, Luvemba, Bimbe e
Hengue.
À região do Bailundo foi dado o nome do primeiro soberano, que vindo do norte, fundou e reinou
durante muitos anos naquilo que foi o maior, mais poderoso e influente reino da colónia
portuguesa. Todos os outros reinos o olhavam com o maior respeito e admiração. A embala (casa
grande), sede do Soma (monarca) situava-se na localidade hoje designada de Bailundo. O Reino do
Bailundo foi sucessivamente atacado pelas tropas portuguesas durante séculos, tendo os mais
conhecidos suseranos que ali reinaram, resistido às confrontações militares até ao ano de 1.896 AD,
altura em que o jovem capitão Justino Teixeira da Silva, transferido do Bié, onde fora também
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responsabilizado pela morte prematura do Capitão-mor Silva Porto, acabou por derrotar o Rei
Numa II que acabara de suceder a Ekwikwi, e ali se instalou. A vila veio a ser denominada de
Teixeira da Silva, tendo retomado o nome anterior de Bailundo após a independência nacional em
1.975 AD. Durante a guerra civil dos anos 90 esteve aqui instalado o quartel-general da UNITA.
Fonte: http://janeladeguilhotina.blogspot.com/2009/04/bailundo-e-uma-cidade-e-municipio-da.html
ii
N.B.: Para saberem da riqueza e cultura fascinantes dos outros Povos de Angola, apresento-lhes os
Bakongo: http://www.fflch.usp.br/spap/administracao/arquivos_publicacao/DA_LUENA.PDF
iii
Ou Bailundus: http://www.minhasimagens.org/convidados/lucianocanhanga/textos15.htm
iv
Olosoma é o plural de Osoma o que significa Soba, que é o plural de Epalanga. Vide
http://www.info-angola.ao/index2.php?option=com_content&do_pdf=1&id=254, na página 7, nota
14.
v
http://www.angoladicas.com/news_detail.asp?ID=5281 (Citação: “Os manuscritos iam com o milho?
Como eu não tinha milho, tinha de comprar milho no comerciante. Na lista das compras, pedia duas quartas
de milho, ou três, com balaio [cesto]”).
vi
Quinda (quin-da) Feminino. Termo de Angola. Espécie de cesto cylíndrico, sem
tampa. Cf. Serpa Pinto, I, 169. [Dicionário Cândido de Figueiredo, 1913].
vii
Efuanga ou Esuanga, que são folhas de mandioqueira.
viii
Contraditório a esta observação: http://eanadv.blogspot.com/2010/07/tirania-da-beleza.html;
http://plenamulher.blogspot.com/2010/01/beleza-madura-sem-neuras-mulheres_18.html
1. ix
Vide o PDF “Cantos africanos em umbundo” na net:
Formato do ficheiro: PDF/Adobe Acrobat - Ver em HTML
www.letras.ufmg.br/labed/download/cantosafricanos2ed-site.pdf
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