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“[...] é fato bem conhecido que as pessoas inteligentes e atentas quase nunca executam ao
pé da letra as instruções que recebem” (p. 123).
FICHAMENTO DE LEITURA
Panorama Geral
O livro tenta aproximar o que chama de dimensões biológica, social e cognitiva da
vida. Para tanto, trabalha com profundidade cada uma dessas dimensões, quebrando mitos
e apresentando as mais recentes teorias e descobertas científicas em cada ramo.
Ao aproximar, cria o autor um entrelaçamento entre cada dimensão, numa rede de
conexões que não se separa e que vive constantemente junta. Para o autor, todos os
aspectos da vida estão interligados, não apenas o biológico, mas também o social e o
cognitivo. Todos agem e reagem juntos, de forma que só se pode compreender um,
compreendendo todos.
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Prefácio
Depois de relatar brevemente as conquistas de suas obras anteriores, o autor se diz
ainda crente na escola filosófica da “ecologia profunda”, que “não separa os seres humanos
da natureza e reconhece o valor intrínseco de todos os seres vivos”.
Para o autor, “os princípios sobre os quais se erguerão as nossas futuras instituições
sociais terão de ser coerentes com os princípios de organização que a natureza fez evoluir
para sustentar a teia da vida. Para tnato, é essencial que se desenvolva uma estrutura
conceitual unificada para a compreensão das estruturas materiais e sociais” (p. 17).
Para o autor, a concepção das organizações como sistemas vivos (redes não-
lineares complexas), pode dar novas ideias sobre a complexidade do ambiente empresarial
e ajudar a lidar com os problemas dela decorrentes.
Inicia então o autor o raciocínio partindo das clássicas metáforas sobre as
organizações (máquina, organismo, cérebro, sistema de governo, cultura). Chama a
atenção principalmente para a metáfora da organização como máquina e como ser vivo.
Capra cita Peter Senge, teórico da administração, para quem não é possível hoje deixar de
entender as organizações como seres vivos.
Para tanto, deve-se abandonar a ideia de que as empresas são criadas e possuídas
por pessoas que estão fora do sistema, o que é reflexo da visão mecanicista. Para ele,
quando se abandona esta ideia e se tenta compreender a organização como ser vivo, a
“questão da propriedade” se torna problemática, porque os empregados e mesmo os
proprietários da empresa não podem ser considerados “fora” da empresa, mas sim dentro
dela, dentro deste organismo.
A visão da empresa como ser vivo implica reconhecer que a empresa é capaz de
regenerar-se, de mudar, de evoluir naturalmente (p. 116). * seria capaz também de morrer?
Arie de Geus, ex-executivo da Shell, analisou 27 empresas longevas e identificou
que todas elas apresentavam características e comportamentos semelhantes aos de
entidades vivas. Em primeiro lugar, uma forte noção de comunidade e de identidade
coletiva, em que todos os membros sabem que serão amparados em seus esforços para
atingir os objetivo. Além disso, todas as empresas tinham uma abertura para o meio
externo, a tolerância a novas ideias e indivíduos e uma capacidade grande de aprender e de
se adaptar às novas circunstâncias (p. 117).
Deve-se mudar a prioridade, deixando de “administrar empresas para otimizar o
capital”, para “administrar empresas a fim de otimizar pessoas” (p. 117).
As empresas também devem ser compreendidas como redes sociais vivas e, em
consequência, devem-se entendê-las como redes autogeradoras de comunicações. “Uma
organização humana só será um sistema vivo se for organizada em rede ou contiver redes
menores dentro de seus limites”.
Essa necessidade das empresas está diretamente ligada à recente revolução da
informática, que deu origem a uma nova economia, toda estruturada em torno de fluxos de
informação, poder e riqueza nas redes financeiras internacionais. Para Manuel Castells, a
organização em redes tem se configurado como uma nova forma de organização da
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atividade humana; e cunhou o termo ‘sociedade em rede’ para designar e analisar esta nova
estrutura social”.
* É interessante pensar nesta “sociedade em rede” como uma evolução do lema
“liberdade, igualdade e fraternidade”, e compreender a “sociedade em rede” como a
“fraternidade” do lema francês. Claro que o alcance de cada objetivo do lema não é linear
nem mesmo realizável por completo. Mas até agora só se tem visto esforços para a
liberdade de empresas. A sugestão de Castells, de que a revolução da informática pode ter
criado a sociedade em rede, que não está limitada apenas às redes informáticas, mas às
redes sociais também, pode trazer uma espécie de “fraternidade” social, ou talvez um passo
a mais em seu rumo. Ou não?
Para Arie de Geus, a forte sensação entre os funcionários de uma empresa de que
pertencem à organização e identificam-se com as suas conquistas, ou seja, uma noção de
comunidade, é essencial para a sobrevivência das empresas no turbulento ambiente
econômico de hoje em dia (p. 120).
* Será o mesmo válido para culturas extremamente competitivas, em que muitas
vezes a sensação de “comunidade” não é tão grande assim?
Quanto mais os administradores conhecerem os processos das redes autogeradoras,
mais eficazes serão seus esforços nas comunidades organizacionais. Terão, para tanto, de
se acostumar a dar “impulsos significativos” ao invés de “instruções precisas”, já que “é
fato bem conhecido que as pessoas inteligentes e atentas quase nunca executam ao pé da
letra as instruções que recebem [...] as pessoas sempre respondem com novas versões das
instruções recebidas” (p. 123). “A obediência estrita só pode ser obtida à custa da
vitalidade das pessoas” (p. 124).
A tarefa do administrador, portanto, está em tornar o processo de mudança
significativo para as pessoas desde o início, assegurando a participação e proporcionando
um ambiente em que a criatividade possa florescer (p. 124).
Num lampejo de romantismo, Capra conclui que a mudança da “dominação para a
parceria” exige a mudança do poder coercivo (sancionatório) e do poder compensatório,
para o poder condicionado, que “através da persuasão e da educação, procura tornar
significativas as instruções dadas” (p. 125).
* Nem mesmo num mestrado em Direito isso é possível. Devem coexistir os
poderes coercivo, compensatório e condicionado. Sem a ameaça de reprovação, alguns
alunos não cumprem as tarefas. Sem a compensação pelas notas, outro tanto também não
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cumpre. Apenas uma parte (muito pequena) encontra-se persuadida, através da educação,
para realmente cumprir as tarefas a contento sem cobranças ou compensações. Imaginando
isso numa organização empresarial, em que a maior parte dos lucros é destinada a
investidores que não realizam a atividade fim, é difícil crer na mera persuasão dos
funcionários para trabalharem mais e melhor.
O conhecimento gerado nas organizações deve também ser compreendido na forma
de redes, de modo que se amplifique o conhecimento criado pelos indivíduos, tornando-o
parte da rede de conhecimentos da organização. “Embora a criação de conhecimento seja
um processo individual, a sua amplificação e expansão são processos sociais que
acontecem entre os indivíduos” (p. 126).
Assim, pode-se falar em aprendizado das organizações, um fenômeno social em
que o conhecimento tácito, que é baseado no conhecimento explícito (documentos,
linguagem), é gerado coletivamente.
Sobre o tema, escrevi em meu blog (http://doministeriopublico.blogspot.com) o
seguinte:
Aos poucos eu diria que sim, mas ainda falta muito para chegarmos até lá.
adotaram para resolver determinado problema com sucesso. Pena que poucos
encamparam a ideia e apresentaram suas ideias.
Isso foi ótimo, mas acho que é preciso mais, muito mais, considerando
principalmente a qualidade irrefutável do trabalho realizado pela maioria dos
membros. Penso inicialmente em cursos obrigatórios de reciclagem e atualização
em que os membros não apenas sejam submetidos às enfadonhas palestras, mas
que, depois das palestras, que deverão ser mais curtas, com o apoio de
monitores, sentem-se em mesas redondas, com poucos membros, mas num grupo
bem heterogêneo, discutindo problemas específicos levantados pelos monitores e
formas de solução. E isso nem precisaria ficar registrado. Seria realmente ainda o
conhecimento implícito, em que os próprios membros do grupo se encarregariam
de melhorar o que entendessem necessário e naturalmente repassariam adiante.
Sobre a liderança nas organizações, Capra confronta o líder tradicional com o “líder
de redes” (Capra não usa nome algum para este segundo tipo). No primeiro caso, o líder é
apenas uma pessoa capaz de reter na mente a visão da empresa, e de formulá-la claramente
e de comunicá-la com paixão e carisma. As ações do líder também manifestam valores que
servem de padrão aos liderados.
O segundo tipo de líder facilita o surgimento da novidade, criando condições ao
invés de transmitir instruções. Usa de sua autoridade para capacitar, fortalecer e dar poder
aos outros.
estabilidade na globalização, que vem atuando há pelo menos quarenta anos de forma mais
ou menos semelhante. Como uma célula, que aproveita energia e expele resíduos, o
sistema global também suga as energias dos países em desenvolvimento e deixa neles os
resíduos de sua atividade, de forma estável ao longo dos anos.
Capra insiste na tese, comparando a globalização aos organismos vivos
“continuamente instáveis” que, segundo ele, “desaparecem em virtude da seleção natural”
(p. 151).
O problema todo está na falta de regulação destes fluxos, que acabam sendo
espoliadores demais. “O que está em jogo é valioso demais para que o capital especulativo
e as flutuações da moeda possam determinar o destino da verdadeira economia” (Roberto
Kuttner, p. 152).
Por isso “a expressão genética depende do ambiente genético e celular (de toda a
rede epigenética) e pode mudar quando os genes são colocados num novo ambiente” (p.
188).
Estas constatações, todavia, não são divulgadas pelas empresas de genética. Do
ponto de vista econômico, é mais rentável divulgar que os genes são responsáveis
absolutos por doenças, inclusive psiquiátricas, do que aceitar a nova genética. Com a
perpetuação do dogma da genética se consegue vender medicamentos que “consertam” os
genes defeituosos, coisa que, diante das novas conquistas científicas da genética, é
contraditória (p. 190).