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Mas fui notando que teria que deix-lo vendado o trajeto inteiro. No intervalo de 10 quilmetros,
avistava um novo corpo j despossudo de alma e Deus, inchado e annimo, sem a gentileza de
cruz e o amparo da coleira.
Cachorro atropelado na Grande Porto Alegre to frequente quanto as capivaras abatidas na BR-
471.
No me passava maldade pela cabea. Sei o quanto um cachorro costuma cheirar caminhos e se
distrair com facilidade.
At que descobri que existe um nazismo canino. Cachorros so abandonados na rodovia pelos
prprios donos. Aquilo que vejo todo o dia no representa acidentes, , sim, resultado de uma
matana deliberada.
Famlias compram ou recebem de presente um cozinho, acham que barbada cuidar, enfrentam
uma semana de experincia, gastam demais com rao e higiene, e decidem sacrificar o
hspede. Sem tempo a perder, desaparecem com as provas de uma existncia. E ainda
raciocinam que no um assassinato, que Palmira Gobbi apenas o nome de uma avenida.
Fingem acreditar que no cometeram mal nenhum, largaram o pequeno mera provao do
destino.
Que mundo este? Pela janela, eliminam uma vida com a leviandade de algum que arremessa
longe uma bagana de cigarro, uma embalagem de picol, um saco de salgadinho. Absolutamente
crentes na impunidade.
Quem faz isso no merece perdo. No merece explicao. No merece defesa. um crime
premeditado. A mais implacvel execuo que conheo, antecedida de lenta tortura emocional.
Repare na insensibilidade: o dono mente ao seu cachorro que iro passear, para desov-lo no
corredor da morte. Calcule o terror do bichinho quando no entende o castigo, e corre uivando,
desesperado, atrs de um carro que nunca ser mais o seu.