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1
Rio de Janeiro/ RJ
2008
2
Rio de Janeiro/ RJ
2008
Aprovado por
_______________________________________________
Prof. Drª. Ilana Strozenberg – orientador
_______________________________________________
Prof. Drª. Mônica Machado Cardoso Rebello
_______________________________________________
Prof. Dr. Luiz Solon Gonçalves Gallotti
Aprovada em:
3
Grau:
Rio de Janeiro/ RJ
2008
73f.
4
DEDICATÓRIA
5
A todos aqueles que acreditam na
mudança.
AGRADECIMENTO
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Keidel, Fábio de Araujo. Criação de marcas em movimentos sociais: uma
análise do caso da Daspu. Orientador: Ilana Strozenberg. Rio de Janeiro, 2008.
Monografia (Graduação Em Publicidade e Propaganda) – Escola de
Comunicação, Universidade Federal do Rio de Janeiro. 73f.
RESUMO
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KEIDEL, Fábio de Araujo. Branding in social movements: a analysis of the
Daspu case. Advisor: Ilana Strozenberg. Rio de Janeiro, 2008. Monograph
(Graduation in Advetising and Propaganda) – Escola de Comunicação,
Universidade Federal do Rio de Janeiro. 73p.
ABSTRACT
Many organizations in the third sector face the challenge of defusing the ideals
they stand for. Some have reached relative success and are well known by the
people in general. This work intends to understand the process of creating the
Daspu clothing brand by a non-governamental organization that fights for the
rights of prostitutes, with the aim of making their ideals known through the
commercializing of their products. A description of the brand´s history is made,
since its creation, in 2005, to the fashion show that took place in June, 2008.
Based on this information and interviews with the brand´s creators and a
fashion journalist, this paper analyzes the Daspu products’ nature, exploring the
way they fit in the fashion universe. This work also aims to understand the
usage of Marketing in non-profit organizations, examining the work developed
by the LUPA, the Experimental Advertising Agency of ECO-UFRJ in order to
advertise the Summer 2009 Daspu Collection.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 10
1. DAVIDA E DASPU 13
CONSIDERAÇÕES FINAIS 49
REFERÊNCIAS 52
APÊNDICE A 53
APÊNDICE B 63
ANEXO 69
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INTRODUÇÃO
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medida se dá a caracterização da roupa produzida e comercializada pela
Daspu como moda. Para essa análise foram levantados os principais
acontecimentos nos quais a marca estava presente, nas cidades do Rio de
Janeiro e São Paulo. Isso pelo fato da sede da Daspu estar situada na primeira
e por ter feito importantes desfiles em ambas as cidades. Além de as duas
cidades possuírem suas próprias semanas de moda no começo e no final do
ano.
Justificam a escolha do tema o fato deste autor ter trabalhado na
produção de peças de divulgação da Coleção Daspu Verão 2009, que foi
lançada em junho de 2008 no Rio de Janeiro. Esse trabalho foi realizado pelo
LUPA, que é a Agência Experimental de Publicidade da Escola de
Comunicação Da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Esse foi o principal
trabalho da agência no primeiro semestre de 2008. Além disso, no LUPA, o
autor teve a oportunidade de trabalhar com diversas marcas de movimentos
sociais através das cooperativas populares incubadas pela COPPE/UFRJ na
Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares – o ITCP- situada no
campus da Ilha do Fundão.
Há ainda o fato de a Daspu ter causado grande polêmica na época em
que foi lançada e de ter obtido grande repercussão na mídia, que a apoiou. É
interessante observar as razões que tornam possível a aceitação de uma
marca criada por prostitutas para defender os direitos das mesmas em uma
sociedade que discrimina as profissionais do sexo. Outro motivo que justifica a
escolha do tema apresentado é o fato de não haver muitos trabalhos
publicados sobre marcas no terceiro setor. Há muitos sobre o movimentos
sociais e o marketing para as instituições sem fins lucrativos, mas
pouquíssimos sobre as marcas criadas por essas organizações.
A metodologia escolhida para a realização do presente trabalho foi a
pesquisa participante. Através do trabalho de divulgação realizado pelo LUPA,
o autor participou de atividades inserido no grupo pesquisado . Houve uma
interação entre pesquisador e grupo na medida em que ambos trabalharam
pela promoção do desfile tendo o pesquisador assumido um papel e uma
responsabilidade para com o grupo. Além disso, os integrantes da instituição
concordaram com a realização da pesquisa e o pesquisador se comprometeu a
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devolver os resultados deste trabalho à organização pesquisada. Dessa forma,
“o pesquisador interage com o grupo pesquisado, acompanha as atividades
relacionadas ao ‘objeto’ em estudo e desempenha algum papel cooperativo no
grupo.” (PERUZZO, 2005, p. 137)
O objetivo principal deste trabalho é compreender a importância de
movimentos sociais criarem marcas para suas causas partindo da análise do
surgimento e consolidação da marca de roupas Daspu.
No primeiro capítulo é apresentada a ONG Davida, seu propósito, seus
projetos no campo da cultura e o cenário em que nasce a marca Daspu. Há um
relato da criação de sua criação e dos principais desfiles que ocorreram no
período que começa no ano de 2005 e vai até junho de 2008. Para tanto, foram
utilizados como referência o livro do Jornalista Flavio Lenz, que conta a história
da organização e da Daspu nesse mesmo período, além da entrevista em
profundidade concedida pelo designer Sylvio de Oliveira, que foi quem inventou
o nome da marca.
Uma discussão sobre o conceito de moda e a diferença entre moda e
vestuário é realizada no capítulo 2, visando compreender a relação da Daspu
com o mercado de moda e identificar qual é o produto que ela efetivamente
produz, divulga e comercializa. Isso foi feito a partir da análise da entrevista
concedida pela jornalista de moda Iesa Rodrigues e da história da Daspu e o
modo como foi abordada pela mídia, à luz, principalemnte, do conceito de
moda formulado por Lipovetsky. Além disso, utilizando Gilberto Velho como
referência, busca-se entender a importância da relação dos indivíduos com o
consumo de moda para a construção da identidade individual no contexto de
sua interação com diferentes grupos sociais.
Para concluir a investigação, no capítulo 3 é apresentado o conceito de
marketing social tal como formulado por Kotler e como esta ferramenta deve
ser aplicada de acordo com o tipo de resultado que se deseja alcançar.
Através de George Yúdice, entende-se a relação da Daspu com a roupa,
enquanto produção cultural, e como a marca a utiliza para seus fins. Para
verificar a forma como o marketing deve ser usado por organizações não
governamentais, é feita uma reflexão crítica sobre um plano de marketing
desenvolvido por alunos da Escola Superior de Propaganda e Merketing para a
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Daspu. Essa crítica está baseada no conceito de marketing social e na visão do
redator publicitário Stalimir Vieira. Por último, o autor relata como foi planejada
e criada a campanha feita pelo LUPA para divulgar o desfile da Daspu, fazendo
uma comparação com o plano de marketing dos alunos da ESPM.
O capítulo de Conclusão sintetiza os principais resultados do trabalho de
acordo com os objetivos propostos nessa Introdução.
Capítulo I:
Daspu e Davida
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Palco das mais lindas fantasias
Das mais loucas alegrias
Dos doces prazeres da vida
Rebolando na avenida
Vão fazendo a sua vida
Como em qualquer profissão
É a mulher na batalha, consciente, cidadã
Plantando o mundo que vai florescer amanhã
Daspu! Daspu!
Você diz que dá que dá,
Mas só dá de camiseta,
Que é pro bicho não pegar
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brincadeira, e ninguém imaginou que isso fosse à frente”, disse Sylvio
(SYLVIO, 2008 – COMUNICAÇÃO ORAL).
Passados alguns meses, em novembro de 2005 saiu na coluna de Elio
Gaspari que um grupo de prostitutas da Praça Tiradentes havia montado uma
confecção para fazer suas roupas de trabalho e que o nome seria Daspu
(LENZ, 2008). Como a Davida nunca tinha levado a idéia de fazer roupas
adiante e nunca tinha comentado com ninguém da mídia sobre a marca todos
acharam que alguém, desconhecido, tinha copiado a idéia deles. Mas logo
jornalistas começaram a ligar para a Davida a procura de informações sobre a
grife, querendo ver as roupas da marca. Assim, foi no susto que tiveram que,
de fato, fazer uma coleção de roupas e uma logo para apresentar para a mídia.
Não tinham nada preparado, nem dinheiro para fazer. “Não houve um processo
de criação”, disse o designer Sylvio de Oliveira, que criou a logo da Daspu.
Tudo teve que ser feito às pressas naquela semana. No entanto, a partir daí a
Daspu apareceu em diversos jornais, revistas e programas de televisão de
grande audiência, como o Fantástico. Isso com poucas peças de roupa,
costuradas por uma prostituta da ONG: uma camisa com uma gravura de Lasar
Segall que retrata uma prostituta com um cliente numa rua, e outra com a logo
feita por Sylvio. Exatamente a logo da qual o próprio designer que criou afirma
não gostar, pois não teve tempo para fazê-la com cuidado. Afirma, entretanto,
que “inconscientemente, foi proposital” ter juntado três elementos negativos na
marca: a cor lilás, “abominada por designers”; uma fonte “fantasia” e a silhueta
da prostituta, pois “o idel da puta é mostrar a cara” (SYLVIO, 2008 –
COMUNICAÇÃO ORAL), por isso não se deve esconder o rosto da prostituta
em imagens relacionadas à prostituição.
Mas por que lançar uma grife de roupas? Flavio Lenz nos apresenta
duas razões: a primeira é que a Davida precisava de dinheiro para manter seus
projetos; e a segunda é que os membros da organização afirmam que
prostituta sempre fez moda (LENZ, 2008). Sylvio afirma que o objetivo original
da Davida era fazer uma confecção com roupas para as prostitutas com a
finalidade de arrumar dinheiro para a ONG. Mas quando a Daspu começou a
aparecer na mídia “a primeira coisa que passou pela cabeça deles, porque eles
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não são comerciantes, são ‘ongueiros’, foi: está aí a oportunidade para nós
colocarmos ‘puta na boca do povo.’” (SYLVIO, 2008 – COMUNICAÇÃO ORAL)
Com esse objetivo foram criadas várias coleções da Daspu de
2005 até hoje. Com a aceitação da sociedade e o apoio da mídia, começaram
a fazer desfiles e surgiu a idéia de fazer do que era uma marca de roupa,
principalmente camisas, uma grife de moda. Mas Sylvio alerta que “antes de
terem alguma pretensão, a coisa acontecia” (SYLVIO, 2008 – COMUNICAÇÃO
ORAL). Em dezembro de 2005 a marca foi lançada e em janeiro de 2006
estavam no Fashion Rio. E a Daspu foi sucesso de vendas. Quando o site da
loja virtual foi colocado no ar, havia apenas uma camiseta exposta e, mesmo
assim, só na primeira semana foram vendidas quinhentas peças. Percebendo
que frases de efeito e irreverentes sobre prostitutas faziam sucesso, Sylvio
elaborou mais cinco camisetas para colocar à venda na loja virtual. Tudo
aconteceu de repente, sem saber que público a roupa iria atingir nem que tipo
de roupa fazer. Assim, segundo o relato de Sylvio de Oliveira, a fase inicial da
Daspu não teve nenhum tipo de elaboração, era quase que correr atrás dos
acontecimentos.
Em 16 de Dezembro de 2005, na Rua Imperatriz Leopoldina, ponto de
prostituição na Praça Tiradentes, foi realizado o primeiro desfile da Daspu.
Para produzir esse evento eles contaram com vários apoios. De um empresário
dono de hotéis na região, cujos quartos serviriam de camarim, do Centro de
Artes Hélio Oiticica, e de alguns artistas. A passarela ficava na extensão da
rua. Enquanto o grupo Hapax, uma banda formada por artistas
contemporâneos, tocava, anunciando o início do desfile, pétalas de rosas
vermelhas eram espalhadas sobre a passarela por prostitutas vestindo
parangolés inspirados no trabalho do artista plástico Helio Oiticica. As modelos
da Daspu desfilavam três camisetas e as peças-piloto que tinham sido
costuradas por uma das prostitutas e apareceram na imprensa e em programas
de televisão, como o Fantástico e o da apresentadora Adriana Galisteu. No dia
seguinte, uma foto do desfile estava na primeira página do jornal O Globo e
havia ainda uma reportagem naquela edição sobre o desfile da noite anterior.
Com toda essa badalação, a Daspu foi convidada a participar da
semana de moda do Rio em janeiro de 2006. O estande da Daspu na sala VIP
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do Fashion Rio ficou lotado de pessoas durante a semana inteira. Todas
interessadas em saber sobre a marca, as roupas e apoiando a iniciativa e o
movimento das prostitutas. Com poucas peças para mostrar, o manequim
exibia uma camisa diferente por dia. E a mídia continuava a dar apoio e
visibilidade à marca. No final da semana, no dia 13 de Janeiro, também na
Praça Tiradentes, aconteceu o segundo desfile da Daspu. “Por coincidência
(nem calendário de moda conhecíamos ainda) ele foi marcado para o mesmo
dia e hora do desfile de Gisele Bündchen no MAM.” (LENZ, 2008, p. 92) o que
gerou ainda mais polêmica sobre a marca de roupas e deu maior visibilidade
ao desfile, que foi noticiado em diversos jornais. Cinco prostitutas, a atriz Bete
Lago e Rafaela Monteiro, uma estilista que simpatizou com a Daspu durante a
semana de moda, desfilaram as novas camisetas da Daspu e alguns
acessórios comprados por Sylvio de Oliveira para compor o visual das
modelos.
Com a necessidade de apresentar algo novo e com o convite para
participar do Fashion Rio de junho de 2006 as meninas se animaram para fazer
uma coleção. Sylvio insistia que não entendia de moda e que era preciso
arrumar um estilista que elaborasse uma coleção para a Daspu. Apesar do
sucesso inicial da marca, todos reconheciam que era preciso melhorar a
qualidade das roupas e a modelagem, ou seja, profissionalizar mesmo a
produção para que Daspu tivesse condições de competir como grife no
mercado de moda (LENZ, 2008). Durante a participação no Fashion Rio em
janeiro de 2006, Gabriela conheceu a estilista, Rafaela Monteiro, que
simpatizou com a iniciativa da ONG e chegou a desfilar com as prostitutas da
Daspu naquela semana. Rafaela aceitou o convite para fazer a coleção de
junho e começou então a participar ativamente das atividades da Davida.
Convivendo com as prostitutas e passando a conhecer o universo delas, a
estilista fez amizade com os membros da ONG. Nas palavras da própria
estilista: “de cara, gostei muito da equipe e me senti em casa, num ambiente
em que todo mundo fica à vontade” (LENZ, 2008, p. 129).
A proposta era para fazer a coleção de junho, mas um convite para
desfilar no Programa do Jô fez com que Rafaela tirasse alguns coelhos da
cartola. No dia 5 de Abril de 2006 Gabriela foi entrevistada por Jô Soares e, ao
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final, houve um desfile com peças elaboradas pela estilista. A apresentação
das peças em um programa exibido em rede nacional e a presença da Rafaela
na produção evidenciavam uma intenção de tornar a Daspu, efetivamente, uma
grife de moda. Alguns dias depois as meninas da Daspu tomam o coração da
cidade de são Paulo desfilando na Rua Augusta. O desfile foi no Clube Vegas e
contou com uma produção feita pela equipe do stylist (profissional
especializado na produção de desfiles) Daniel Ueda, o mesmo que foi
responsável pelos desfiles de marcas famosas como Colcci e British Colony. O
evento foi marcante. As modelos saíam de um hotel, em frente ao clube ,
usado como camarim, atravessavam a rua fazendo uma performance para os
fotógrafos, parando o trânsito, e entravam no clube para desfilar. Tudo acabou
em uma grande festa ao som de funk.
Após todas essas experiências e desfiles, era chegada a hora de voltar
para casa e retomar os trabalhos para o Fashion Rio de junho. Para a nova
coleção o tema escolhido foi: caminhoneiro. E assim Rafaela criou a coleção
Daspu na Pista – BR 69, com peças bem elaboradas, melhor modeladas e
mantendo a linha de utilizar frases de efeito sobre prostituição. A estilista “não
queria que a coleção se desviasse do foco do preconceito e da vida das
prostitutas” (LENZ, 2008 p. 142). Era um passo muito importante para a Daspu,
pois, pela primeira vez, iriam apresentar uma coleção elaborada por uma
estilista profissional. O desfile foi no Circo Voador, casa de shows identificada
com a juventude e situada na Lapa e contou com uma produção cenográfica de
Gringo Cárdia inspirada no tema da coleção.
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camisetas e vestidos que são variações mais largas das camisetas. Foi feito
um levantamento de vários artistas que mostravam a prostituta na música, no
cinema e na pintura. A coleção foi chamada de “Puta Arte” e, nas peças,
reproduz em silk screen obras de Picasso, Gauguin, Lasar Segall, Otto Dix,
Toulouse-Lautrec, J. Borges, Aliedo, com letras de Chico Buarque, Sting,
Madonna e Raimundos e imagens de atrizes que protagonizaram filmes como
Moulin Rouge, O Anjo Azul, Mata Hari e Cabaré. As roupas ficaram prontas no
dia anterior ao desfile, que ocorreu na Praça Tiradentes. Esse foi o maior de
todos os realizados até então. Na passarela montada na rua, ao lado da praça,
32 pessoas apresentaram a coleção e houve a participação da atriz Elke
Maravilha. Sylvio ainda elaborou uma trilha sonora para o desfile misturando
diversos ritmos como samba, funk, tango e outros. Uma semana depois, a
coleção “Puta Arte” foi apresentada em São Paulo, no clube Glória (boate que
promove festas freqüentadas, também, por artistas). Além das prostitutas
cariocas e paulistas desfilaram o cantor Supla e a escritora Raquel Pacheco,
mais conhecida como Bruna Surfistinha.
A última coleção lançada pela Daspu foi elaborada por um grupo de
estudantes de moda da FUMEC, faculdade que fica em Belo Horizonte. A partir
de uma palestra que o Sylvio fez naquela cidade a professora Ana Luíza
Santos propôs a parceria com a marca para fazer uma coleção com alguns
alunos e ex-alunos. Em março de 2008 a turma mineira se reuniu na sede da
Davida para conhecer seus integrantes, pegar informações, saber dos gostos
das prostitutas, enfim, fazer um briefing para elaborar a coleção em Minas
Gerais. Eu e uma colega também participamos dessa reunião representando o
Lupa, que é a agência experimental de propaganda da Escola de Comunicação
da UFRJ. Naquela altura estávamos começando a planejar a campanha que
iria divulgar a nova coleção da Daspu (o trabalho do LUPA para a Daspu será
tema do terceiro capítulo). Além dos membros da ONG havia uma produtora
italiana que estava realizando um documentário sobre a marca de roupas. Os
estudantes da capital mineira criaram uma coleção com algumas peças
mantendo as frases e imagens irreverentes, além de roupas para as prostitutas
usarem na “batalha”. A Coleção Daspu Verão 2009 foi lançada no dia 12 de
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junho de 2008, num desfile na quadra da Escola de Samba Unidos da Tijuca e
hove desfiles em São Paulo, Belo Horizonte, Florianópolis e Cidade do México.
Esses foram os desfiles e apresentações que tiveram mais visibilidade e,
de certa forma, mais contribuíram para o sucesso da Daspu. Mas nesses três
anos de vida da marca foram feitos aproximadamente trinta apresentações
públicas além de participações em programas de televisão, segundo Flavio
Lenz. Este capítulo foi dedicado a contar um pouco da história da Daspu e da
Davida. Para concluí-lo, é necessário mostrar como eu percebo essa marca.
Começam nos desfiles de moda e depois vão para espaços alternativos,
desvinculados desse universo. Mesmo sua participação na Fashion Rio foi no
espaço dedicado aos projetos de empreendedorismo. A mensagem da estilista
francesa discrimina explicitamente as prostitutas com palavras carregadas de
preconceito. Essa. No entanto, apresenta aspectos curiosamente ambíguos.
Chachnil, sem perceber, ao descrever a identidade de sua Maison, sua visão
da mulher moderna, acaba defendendo muitos dos ideais que as prostitutas
buscam e lutam para que sejam reconhecidos.No entanto, considera que esses
ideais são o extremo oposto dos que movem as prostitutas. Isso evidencia o
quanto seu preconceito impede que compreenda o que está claramente
expresso no discurso da ONG: sua reivindicação por respeito e direitos de
cidadania. Afinal as prostitutas também são pessoas sérias, que têm família,
são mulheres de caráter, que encontraram seu lugar na sociedade ou que
buscam esse lugar com dignidade. Mulheres que representam a beleza, a
sedução, o erótico, características que são exatamente as que a francesa diz
valorizar na mensagem em que desiste da parceria.
O que a Daspu pretende mostrar para o público é que o fato de ser
prostituta não estabelece uma diferença fundamental entre ela e as demais
mulheres. A própria Gabriela diz que o interessante, num desfile da Daspu, é
ver a reação dos espectadores, sem saber quem é prostituta e quem não é na
passarela. A Daspu mistura intencionalmente as pessoas e coloca no meio da
multidão. Gabriela acredita que quando isso ocorre, as diferenças caem por
terra e as pessoas que ali estão se reconhecem e se identificam como iguais.
Essa é uma arma contra o estigma, o preconceito e a discriminação. Sendo
assim, há uma escolha pela profissão. Claro que é uma escolha difícil como
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tantas outras e que não se sabe que fatores são levados em conta para cada
mulher que a assume. Mas uma escolha é feita. Sylvio, em entrevista dada
para este trabalho, diz que “ninguém obriga ninguém a ser puta”, é uma
escolha pessoal. Conta que, assim como há gente que diz ter nascido para
exercer uma ou outra profissão, elas também dizem: “eu nasci para ser puta”
(SYLVIO, 2008 – COMUNICAÇÃO ORAL). A Daspu visa fazer com que a
prostituta se orgulhe e assuma o que é. Na luta pelo reconhecimento da
cidadania dessas mulheres há também aquelas que ainda não tomaram
consciência de seu lugar na sociedade e que chegam a se esconder.
Com o trabalho realizado no Lupa tive a oportunidade de conversar com
algumas das prostitutas e elas dizem que a Daspu aumentou a sua auto estima
que se sentem felizes e poderosas desfilando, que adoram se sentir desejadas
e aplaudidas nos desfiles. Ora, que mulher não gosta de se sentir desejada,
bonita, sensual? E a Daspu faz com que o público abrace a causa, reflita sobre
o tema, apóie a iniciativa.
Assim foram os três primeiros anos de vida da Daspu. O contexto em
que nasceu, as parcerias, os desfiles e o reconhecimento da mídia foram
relatados aqui para desenhar a identidade de uma marca que, de uma forma
ousada invadiu o mercado de moda e colocou as prostitutas nos cadernos de
moda, comportamento e cultura dos principais jornais do país.
Pensar a continuidade do projeto da Daspu e planejar ações de
comunicação que contribuam para isso, no entanto, exige uma análise mais
aprofundada de qual é, efetivamente, o seu produto. É o que se irá fazer nos
próximos capítulos.
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CAPÍTULO II:
A DASPU SOB A PERSPECTIVA DA MODA
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2.2. A Daspu está na moda?
Por se tratar de uma marca associada a uma causa social, no entento, não
pode haver efemeridade na atitude de comportamento que a Daspu propõe.
Seu discurso deve permanecer. A posição assumida não deve se alterar e a
mensagem, grande força da marca, deve se manter, embora inovando no
modo de manifestar sua irreverência irreverência. Assim, se a Daspu pode ser
caracterizada, trata-se de moda de comportamento. A própria Iesa Rodirgues
definiu a Daspu como uma "marca de comportamento" (IESA, 2008 –
COMUNICAÇÃO ORAL) e parece ser exatamente esse significado que a
marca constrói. Não é moda de roupa. A jornalista diz ainda que a repercussão
da marca na mídia se deve ao espetáculo. Um desfile de prostitutas no meio da
rua é,sem dúvida, um acontecimento. Sua cobertura, entretanto, não é feita por
jornalistas de moda, que iriam comentar as roupas. Os eventos são cobertos
por repórteres de outros cadernos. Por outro lado, se a mensagem não deve
ser efêmera, podem-se perceber traços de efemeridade na oscilação da
freqüência com que a marca aparece na mídia. Há momentos em que é mais
mostrada, outros em que é menos mostrada e é bem provável que, com o
tempo, desapareça. A não ser que promova algum espetáculo notório.
A reflexão sobre si mesmo que, segundo Lipovetsky, a moda convida o
indivíduo a fazer, no caso da Daspu se dá pela mensagem que passa e não
pela roupa. O indivíduo se identifica com as idéias presentes nas mensagens e,
por isso, consome seus produtos. É esse, portanto, o principal produto da
Daspu: mensagem. Quem compra Daspu compra as frases irreverentes
estampadas nas camisas ou nos vestidos. Elas poderiam estar impressas em
qualquer outro suporte como canecas, adesivos ou mochilas, pois as pessoas
comprariam da mesma forma. O motivo da compra é a identificação com a
causa. O lúdico da Daspu está em sua mensagem. A roupa é apenas um
suporte possível. Assim, pode-se dizer que a roupa é uma mídia através da
qual a Daspu divulga as idéias e o comportamento que promove.
Além da reflexão individual, cada membro pertencente a um grupo que
compartilha o mesmo estilo participa de uma rede de interações dentro do
próprio grupo e entre grupos distintos. Ao analisar a dinâmica das sociedades
complexas, Gilberto Velho (1994) fala da necessidade de haver uma linguagem
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comum a grupos distintos para haver interação entre indivíduos que as
integram. Assim, a linguagem compartilhada é o espaço que possibilita a
comunicação entre as diferenças, onde se torna possível a sua coexistência
sem conflitos. Segundo o autor, há um processo de negociação que permite a
construção da comunidade e da diferença entre os indivíduos inseridos em
contextos culturais distintos (VELHO, 1994). Portanto, é no campo da
linguagem que, nas sociedades complexas, fragmentadas, contemporâneas, se
“cria uma possibilidade de jogo de papéis e de identidade, que é uma das
marcas mais expressivas de seu estilo de vida. Os limites entre norma,
conformismo, transgressão, constantemente são colocados em xeque”
(VELHO, 1994, p. 25).
A construção social e o papel do indivíduo na transformação de si e,
consequentemente, da sociedade é feita pela linguagem. Como dito neste
capítulo, a moda é comunicação porque torna possível uma rede de interações
entre pessoas. No caso da Daspu, a comunicação se faz através de
mensagens relativas a valores e comportamentos. É dessa forma a marca
pretende criar uma rede de trocas simbólicas entre pessoas e grupos diferentes
e hierarquizados, como o universo das prostitutas e a sociedade mais
abrangente. A Daspu usa a roupa como veículo da mensagens para permitir o
trânsito ente diferentes ambientes da sociais e, assim, fazer com que outros
participem da sua proposta de construção da realidade. A comunicação da
marca toca pessoas de diferentes níveis sócio-econômicos que, quando
compreendem a mensagem da Daspu e a consomem, passam a interagir
positivamente com um mundo no qual é possível reconhecer a cidadania das
prostitutas. Sem dúvida, essa proposta não atinge a sociedade por inteiro. Há
quem a conheça e a desaprove por diversas razões. Mas a Daspu consegue
cativar parte significativa de formadores de opinião, visto que os grandes
veículos de comunicação do país deram crédito, de forma favorável, à iniciativa
da marca.
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Capítulo III:
MARKETING DE MODA OU MARKETING DE IDÉIAS?
37
o projeto, a implementação e o controle de programas que procuram
aumentar a aceitação de uma idéia ou prática social num grupo-alvo.
Utiliza conceitos de segmentação de mercado, de pesquisa de
consumidores, de configuração de idéias, de facilitação de incentivos e
a teoria da troca, a fim de maximizar a reação do grupo-alvo.
(KOTLER, 1978, p. 288).
Nesse caso o que é vendido não é um produto ou serviço e sim uma idéia. O
objetivo da organização é divulgar uma causa e fazer com que cada vez mais
pessoas se juntem a ela. O campo de trabalho são as atitudes e o
comportamento do público. É justamente nesse espaço que o marketing social
vai agir. Verifica-se então que o terceiro setor adequou os conceitos do
marketing ao seu negócio. Uma organização luta por uma causa, produz uma
discussão sobre o tema, publica artigos, organiza eventos beneficentes e
muitas trabalham a cultura como um meio de ascensão social.
Como já foi dito anteriormente, a Davida é uma instituição que não visa o
lucro e trabalha pelo reconhecimento da cidadania das prostitutas e prevenção
de Aids. A idéia que ela lança no mercado é a de que é possível haver uma
sociedade na qual a prostituição possa ser aceita como uma profissão legal,
nos termos jurídicos, digna, sem que haja discriminação das profissionais do
sexo. Dadas as circunstâncias culturais de nosso país, essa não é uma idéia
que possa ser aceita facilmente. Há uma profunda influência religiosa nos
costumes, na moral e até nas leis brasileiras. A proposta feita pela Davida
incomoda não só as instituições como também os próprios indivíduos.
Kotler (1978) identifica quatro tipos de causas sociais. De acordo com o
autor o primeiro é o que propõe uma mudança cognitiva no público-alvo, são as
campanhas de informação pública. O segundo tipo de causa social é o da
mudança de ação, segundo o autor são “aquelas que tentam induzir um
número máximo de pessoas a realizar uma ação específica” (KOTLER, 1978,
p. 295). O terceiro tipo é o da mudança no comportamento, o qual tentaria
modificar algum aspecto do comportamento das pessoas buscando o bem-
estar individual. Um exemplo desse tipo são as campanhas anti-tabagistas. O
quarto e último tipo de causa social identificado pelo autor é o da mudança de
valor. Esse tipo busca alterar algumas crenças e valores que o público possui
em relação a objetos ou situações.
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A causa que busca uma mudança de valor lida com temas polêmicos
como aborto, legalização de drogas, tolerância religiosa, igualdade jurídica e
social dos sexos e também sobre a questão da prostituição. É exatamente esse
o tipo de causa social da Davida. Ela busca alterar os valores da sociedade em
relação às profissionais do sexo para que a cidadania dessas mulheres seja
aceita. Obviamente essa não é uma luta simples e a mudança de valor é uma
das causas mais difíceis de serem realizadas. Requer muito esforço, diálogo e
luta para que o objetivo seja alcançado. A dificuldade reside no fato de
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Davida, que com muita alegria cai na folia cantando sambas pelos ideais da
instituição. Torna-se evidente a relação da instituição com a cultura. A ONG
tem em sua história uma relação íntima com a produção cultural, seja pela
música, pela encenação ou pelo carnaval. Por outro lado a moda, seja de
vestuário ou comportamento, também se insere na produção de cultura. Assim,
é com a cultura que a Daspu trabalha para se comunicar com o público
utilizando uma linguagem irreverente para quebrar aquela tensão que ocorre na
tentativa de uma mudança de valor do público.
Esse uso da arte e da cultura, segundo Yúdice, se torna cada vez mais
predominante na sociedade atual, na qual essas expressões passam a ser
vistas como instrumentos:
Enxergando a marca Daspu como um ator social, visto que está inserida
numa sociedade e se comunica, percebe-se que, em sua performance, ela
utiliza a cultura como um recurso. Suas roupas são feitas e comercializadas
para gerar renda para a instituição a fim de sustentar outros projetos. Dessa
forma é, por um lado, um recurso utilizado para fins econômicos. Além disso,
as mensagens presentes nas camisas e vestidos são um meio de luta política
pelo reconhecimento da cidadania das prostitutas, visando a legitimação
política de um grupo social marginalizado pelo Estado. Assim, na medida em
que suas roupas são uma mídia para dar publicidade à uma causa que
defende, a Daspu utiliza a cultura como recurso numa tentativa de rearticular
significados, dando voz às prostitutas, na busca por uma nova realidade social,
41
na qual a cidadania das profissionais do sexo pode ser reconhecida. Em
síntese, a cultura é utilizada como recurso pela Daspu para a promoção
econômica e política de um grupo social, que busca o reconhecimento dos
demais grupos a fim de alcançar sua legitimidade dentro da sociedade.
Com isso, a Daspu conseguiu dar grande visibilidade à causa da Davida,
pois gerou muito interesse na mídia e no público. Porém, tudo aconteceu
espontaneamente, sem um planejamento, sem pesquisas para analisar as
condições em que iria surgir. No ano de 2006, um grupo de alunos da Escola
Superior de Propaganda e Marketing de São Paulo realizou um estudo da
marca como trabalho de conclusão de curso. O trabalho propunha a
“consolidação da marca Daspu como uma grife relevante no mundo da moda
brasileira, a partir da estruturação de seus processos internos e de seu
reposicionamento estratégico.” (REZENDE et al, 2006, p. 9) O trabalho é
basicamente um plano de marketing com a finalidade de analisar a estrutura da
Daspu e propor mudanças visando a consolidação da marca como uma grife
de moda.
Os autores tratam a Daspu como uma grife de moda desde o começo do
trabalho apontando o objetivo da marca como o de “transformar um pedaço de
pano em um estilo de vida.” (REZENDE et al, 2006, p. 30) Importantes pontos
foram destacados por eles como o fato de a Daspu, por ser gerida como um
projeto social, encontrar dificuldades para ter um planejamento comercial e
financeiro e ressaltando a pouca experiência da equipe em gestão
administrativa e comercial. Isso está de acordo o que foi dito no capítulo
anterior do presente trabalho, em que se afirma que a Daspu precisa de um
investimento substancial para se organizar como uma grife de moda. Além
disso, aquele grupo de alunos fez um levantamento das características dos
clientes da Daspu, bem como as motivações de compra e a essência da
marca.
Foi constatado pelos alunos da ESPM, através de pesquisa com os
clientes que compraram na loja virtual da Daspu, que o perfil demográfico dos
consumidores é de uma maioria de mulheres, com idades que vão de 26 a 45
anos e pertencentes às classes socioeconômicas B1 e B2. Em relação ao
comportamento de compra, identificou-se que menos de 40% dos
42
consumidores compraram as roupas da Daspu pela internet por razões como: o
custo do frete, a desconfiança do brasileiro em comprar pela inernet e a
impossibilidade de experimentar a roupa no ato da compra. Ainda em relação
ao comportamento de quem compra, constatou-se que a temática irreverente é
um atrativo para o público consumidor e há um interesse dos compradores pela
causa social defendida pela Davida. Psicograficamente, o público interessado
na marca foi avaliado como liberal. Através de pesquisa a maioria dessas
pessoas se declarou a favor da legalização da maconha e do aborto. Os
autores avaliam o consumidor da Daspu como pessoas com nível elevado de
formação, preocupadas com causas sociais, interessadas por novidade e a
compra é influenciada por seus valores e princípios (REZENDE et al, 2006).
Na pesquisa que Rezende e seu grupo fizeram com os compradores do
site da Daspu foi constatado que os motivos que levaram os compradores a
comprar as roupas da marca foram, na maior parte, a temática irreverente e a
causa da prostituição. Os adjetivos mais associados à marca foram:
irreverente, autêntica, bem humorada e ousada, entre outros. Os consumidores
declararam que usariam as roupas da Daspu em ocasiões como: em passeios,
sair à noite, na faculdade e reuniões familiares. Percebe-se então o desejo de
ser visto usando a roupa da Daspu (REZENDE et al, 2006). Dessa forma fica
evidente a relação que o consumidor tem com a roupa da Daspu no processo
de construção da identidade e a relação com os grupos sociais, como foi visto
no capítulo anterior. O indivíduo quer ser percebido como alguém preocupado
com questões sociais, uma pessoa politizada e engajada em movimentos de
liberação dos costumes e faz questão de mostrar isso para os outros.
Ou autores fizeram ainda uma análise dos pontos fortes e fracos e das
oportunidades e ameaças que se apresentam para a marca. Dentre os pontos
fortes destacam-se a própria figura de Gabriela Leite, por ser uma referência da
causa no Brasil e a porta-voz da Davida na mídia nacional e internacional, além
do apoio de artistas. A principal fraqueza identificada é a falta de uma
organização comercial e administrativa no gerenciamento da marca Daspu.
Como oportunidade identificaram a presença da roupa da Daspu em algumas
poucas lojas multimarcas que vendem produtos de projetos sociais e a
influência da mídia no público. A ameaça principal é a resistência à marca no
43
mercado, que pode ser gerado pelo preconceito em relação às prostitutas
(REZENDE et al, 2006, p. 148).
Para uma marca se firmar no mercado é preciso manter uma
comunicação constante com seu público. No trabalho dos alunos da ESPM são
feitas sugestões pensando a marca como uma grife de moda. Destacam-se a
produção de material de promoção no ponto de venda, a necessidade de
manter um relacionamento próximo com as revistas especializadas em moda, a
produção de desfiles com o objetivo de dar mais visibilidade à marca, além
disso é sugerido que a Daspu apóie eventos direcionados ao público comum
ao dela e utilize canais alternativos de comunicação para manter o
relacionamento com os seu público (REZENDE et al, 2006, p. 164). Através de
uma análise da marca diante da concorrência, a Daspu foi posicionada no
mercado ao lado de marcas como Cavalera, Sommer, Colcci e Doc Dog. Foi
mantida pelos alunos a percepção da marca como sendo ousada, irreverente e
sensual e foi sugerido direcionar a comunicação para o público de jovens, da
classe AB, que costumam comprar roupas das marcas citadas acima. Dessa
forma, foi proposta uma segmentação do mercado na qual a Daspu deve
concorrer com marcas já famosas, caras e com participação relevante no
mercado de moda. A essência da marca foi descrita pelos autores com
características como underground, por ter nascido num meio específico e
isolado e só após algum tempo se tornar conhecida. Outra característica é a
irreverência, no sentido de romper barreiras. A sensualidade, proveniente das
prostitutas, a coragem de mexer com os padrões da moralidade ao propor uma
mudança de valor no público, são características importantes dentre outras
(REZENDE et al, 2006).
No capítulo anterior foi discutida a relação da Daspu com o mercado de
moda e verificado que a marca não faz moda com roupa e sim com
comportamento. Para propor qualquer tipo de ação relativa a uma marca é
necessário que haja uma compreensão da essência da marca, do que ela é e
aonde quer chegar. Com isso, é possível identificar caminhos a serem
percorridos que sejam mais adequados ao potencial da marca. O que é
discutido aqui não é a identidade da marca Daspu, pois os alunos da ESPM a
perceberam muito bem, de acordo com o que foi dito nos capítulos anteriores
44
baseados na entrevista com o designer Sylvio de Oliveira e no livro de Flavio
Lenz. A Daspu é uma marca associada à irreverência e ousadia, que busca
romper o paradigma da prostituta como vítima da sociedade. Porém, o que é
discutido aqui é a forma como se faz a comunicação da marca. O plano de
marketing proposto por Rezende e seu grupo (2006) toma a Daspu como
sendo uma marca de moda. Parte desse pressuposto sem fazer uma discussão
mais profunda sobre o tema e fazendo apenas um histórico da moda no Brasil.
Colocaram o foco sobre a roupa, encarando-a como moda, minimizando a
importância da causa. Foi proposta a institucionalização da Daspu como uma
grife puramente comercial e o fato de ser uma marca criada como um projeto
social foi encarado como, de certa forma, um defeito que prejudica o
desenvolvimento da marca.
O redator publicitário Stalimir Vieira define o marketing como “uma
espécie de cultura sobre os objetivos de quem produz e os interesses de quem
consome e seu potencial de inter-relacionamento.” (VIEIRA, 2008, p. 3) Assim,
é necessário que os objetivos da marca estejam muito bem definidos e que se
saiba o real interesse que os consumidores têm em relação a marca. O autor
diz ainda que “ao associar-se a valores, a marca, automaticamente, se torna
ideológica.” (Vieira, 2008, p. 5) Compreende-se então a marca Daspu está
carregada de ideologia, pois ela nasce associada a valores que pretende
transmitir ao público. Ela tem um potencial de comunicação imenso e tenta
compartilhar sua ideologia com o público. O produto da Daspu é comunicação
de uma outra possibilidade cognitiva sobre o tema da prostituição.
A marca é uma “percepção, construída sobre contrastes ideológicos.”
(VIEIRA, 2008, p. 5) De acordo com esses conceitos, percebe-se que ela tem
uma identidade, se relaciona com as pessoas, se comunica com o público,
transmite o valor que existe em si. A marca é algo que possui vida. Vieira diz
ainda que “a verdade de a marca é a verdade dos sentimentos das pessoas
que lidam com ela.” (VIEIRA, 2008, p. 6) Com isso, o autor quer dizer que não
adianta anunciar ao público nada que não seja a percepção que o mesmo tem
acerca da marca. Irreverência, ousadia, causa social: essas características da
identidade da marca Daspu são o que constroem sua verdade. É assim que ela
é percebida.
45
Esse olhar mais humanizado do marketing sobre a marca está sendo
apresentado para que haja maior atenção sobre a relação de intimidade que o
os profissionais de marketing e propaganda devem ter com a marca
trabalhada. Não se deve comunicar aquilo que não é conhecido com clareza.
Sobre essa intimidade a ser construída, Vieira faz uma comparação bastante
interessante quando diz que
O que o autor critica ao fazer essa comparação é o modelo que vem sendo
disseminado pelo mercado, no qual os profissionais fazem uso de marketing
como um manual de instruções que pega uma marca e a adequa ao seu
processo de forma indiscriminada. É contra essa atuação cega do marketing,
que tenta adaptar tudo ao seu modelo desumanizado que o autor questiona.
O plano de marketing mencionado anteriormente comete esse equívoco.
Percebe-se que tomaram um modelo de planejamento para empresas e
tentaram encaixar a marca Daspu ali, sem fazer questionamentos mais
aprofundados sobre o caráter comunicacional da marca. A identidade da marca
foi bem percebida, porém não parece ter havido intimidade dos realizadores
daquele com o produto a ela associado. Não se considera relevante, por
exemplo, o fato de ser uma marca de um movimento social. Isto é, não
seguiram a máxima segundo a qual “o marketing deve adaptar-se à marca, e
não a marca ao marketing” (VIEIRA, 2008, p. 36).
47
O flyer foi desenvolvido para informar o público sobre o desfile que
aconteceria em 12 de junho no Rio de Janeiro para divulgar a Coleção de
Verão Daspu 2009. A peça continha uma imagem de fundo com mulheres
vestindo lingeries, passando sensualidade. A cor predominante era o vermelho
e havia ainda uma caixa de texto para a pessoa que recebesse preenche-se
algumas informações pedidas por um dos parceiros da Daspu na realização do
desfile. Foi elaborado para ser distribuído em diversos lugares da cidade tais
como filas de cinema, teatro e casas de show com porta para a rua, livrarias,
faculdades e centros culturais. Locais onde seria encontrado o público
identificado anteriormente. Além disso, seria exibido no site da Daspu e
enviado por e-mail para um considerável número de consumidores da marca.
Construído de forma a parecer um classificado erótico de jornal, o
anúncio mostrava no centro um quadro, parecido com o adesivo da campanha,
para divulgar o desfile. Cada classificado exibido no anúncio foi construído pelo
diretor de arte de forma bem irreverente e bem humorada, assim como a marca
Daspu. Nenhum era verdadeiro, nem continha telefones ou nomes reais de
prostitutas, pois o objetivo da peça era divulgar o desfile e não serviços
sexuais. A peça seria veiculada em jornais, cadernos de moda e
comportamento e revistas especializadas no assunto.
O adesivo era parecido o quadro exibido no centro do anúncio e foi
inspirado nos adesivos que prostitutas colam em orelhões e postes. Poderia
ser distribuído, ou colocado como brinde na caixa em que a roupa da Daspu é
encaminhada para o comprador pelo frete, pois colar em locais públicos
poderia fazer com que a Daspu fosse multada pela prefeitura. Havia nele um
desenho de uma prostituta vestindo uma camisa da Daspu e calcinha e um
texto falando do desfile.
A quarta peça aparecia impressa em formato de perna, flexionada, com
um salto-alto, meia calça e uma cinta-liga. O objetivo era colocá-la em locais
públicos como banheiros de shopping, bancas de jornal, quiosques na praia e
balcões de bares para chamar a atenção de quem a visse. Ela funcionaria
como um display para os flyers, que ficariam expostos como se estivessem
presos à cinta-liga.
48
Além disso, foi elaborada uma apresentação, que podia ser impressa ou
exibida em tela, para conseguir o apoio dos administradores dos
estabelecimentos comerciais em que a Daspu colocaria as pernas com os
flyers. Essa apresentação continha um breve histórico da marca, algumas
imagens de peças da nova coleção, a proposta criativa e um clipping de
reportagens e matérias que já foram veiculadas na mídia sobre a Daspu. O
objetivo era convencer esse público específico a apoiar a campanha, sabendo
que poderia haver um retorno de mídia espontânea para os que apoiassem.
Não só as peças em mídias tradicionais fizeram parte do nosso plano de
comunicação, mas também foram elaboradas ações de marketing de guerrilha
para divulgar o desfile. A começar pela forma como os flyers seriam
distribuídos nas ruas. As próprias prostitutas da Daspu, vestidas com roupas da
marca, distribuiriam os impressos pelas ruas. A idéia era fazer as prostitutas
interagirem com as pessoas de uma forma que evidenciasse a marca, fazendo
uma performance no momento da distribuição como se estivessem em um
desfile. Também tivemos a idéia de fazer desfiles em sinais de trânsito,
distribuindo os flyers e filmando a ação para exibi-la na internet.
Foi levantada, na ocasião, a sugestão de fazer uma “Pu Parade”,
inspirada na Cow Parade, que tomou as ruas da cidade e chamou a atenção de
todos que passaram pelas vacas pintadas. A idéia era colocar manequins
vestidos de prostitutas em posições sensuais próximos aos locais onde seriam
realizadas as outras ações. Por último, se pensou em “redecorar” o banheiro
dos estabelecimentos parceiros, colocando uma luz vermelha e criando um
ambiente parecido com o de um cabaré. No espelho, estaria escrito com batom
vermelho as informações sobre o desfile de uma forma irreverente e sensual.
Essas foram as ações que o LUPA criou para divulgar o desfile de
lançamento da nova coleção da Daspu. Provavelmente, por se tratar de uma
marca de um movimento social que aborda um tema tabu na sociedade, não foi
possível conseguir apoios ou patrocínios para realizá-las. Desse modo, nem
todas as peças tiveram condições de serem veiculadas. Todas, no entanto,
foram criadas a partir do conceito da campanha. A irreverência e sensualidade
próprias da identidade da marca estavam presentes em todas as ações de
comunicação elaboradas pela agência. No entanto, no seu planejamento e
49
criação, a proposta de que se estava realizando um trabalho de marketing
social foi, certamente, predominante. O objetivo não era vender roupas e sim
valores e atitudes face à diferença.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
50
sustentabilidade para a organização e combater a discriminação relativa à
prostituição, associando-lhe valores positivos.
Num primeiro momento, a Daspu vende camisetas com frases de efeito
criadas pelo próprio Sylvio. As roupas falam do orgulho de ser prostituta, com
muita irreverência, numa tentativa de quebrar o preconceito Assim, a marca
surge vendendo, sobretudo, uma idéia: a causa defendida pela Davida.
A constante busca por melhorar a qualidade do produto, no entanto, leva
a organização a convidar estilistas para elaborarem novas coleções. Junto a
isso, a participação em eventos de moda, evidencia o interesse da Daspu em
consolidar-se como uma grife.
A identificação da Daspu com o universo da moda, entretanto, é
problemática. Do ponto de vista do mercado, ela não se adequa aos
parâmetros necessários para ingressar nesse contexto: não compete com
outras grifes, não lança tendências para a estação, não experimenta
modelagens diferentes, não cria uma roupa nova. Seu produto é principalmente
uma idéia. .Para isso utiliza padrões de roupas já existentes, algumas com
certa sensualidade, mas sem nenhuma novidade em termos de estilo: a
maioria é de camisetas. Se há uma novidade são as frases de efeito e as
imagens que transmitem a causa da instituição com irreverência e bom humor.
Do ponto de vista do conceito definido por Lipovetsky, a Daspu também
não pode ser caracterizada como uma grife de moda de vestuário. Ela se
enquadra, porém, numa outra dimensão da moda: o comportamento. Isso fica
bastante evidente na entrevista da jornalista de moda Iesa Rodrigues. Segundo
afirma em seu depoimento, o principal produto da marca é a mensagem que
ela passa através das roupas que vende. Quem compra Daspu compra, de
certo modo, a causa das prostitutas, se identifica com o movimento que
combate a discriminação contra essa categoria. Em suma, literalmente, veste a
camisa. É, portanto, no âmbito do comportamento que a Daspu inova. É esse
também o significado do espetáculo que produz em seus desfiles. É assim que
pode ser entendida a sua repercussão junto ao público de consumidores, de
profissionais de moda e de jornalistas.
O discurso aparece, então, como elemento de construção e
transformação social. A Daspu visa promover a idéia de uma nova atitude em
51
relação às prostitutas através do discurso, que propõe uma mudança de
valores. A roupa serve apenas como mídia para comunicar essa mensagem.
A Davida é uma organização não governamental. Ela não vende um
produto para obter lucro e sim para dar visibilidade à sua proposta. Isso não
pode deixar de ser levado em consideração num planejamento de marketing,
cujas ferramentas devem ser sempre adequadas aos objetivos de uma
empresa ou organização,
Dessa perspectiva, um plano de marketing feito com o intuito de
colaborar para que a marca se torne uma grife de roupas, capaz de competir
no mercado de moda, estaria equivocado na medida em que a trata como se
pertencesse a uma empresa com fins lucrativos. O fato de ter sido criada por
uma ONG, entretanto, é de extrema importância quando se pensa na marca
Daspu. Esse, inclusive, é um dos fatores que explicam a visibilidade positiva
que a marca obteve junto ao público e à mídia.
As ferramentas do marketing não podem ser usadas como um modelo
ao qual a marca deve se adaptar. Pelo contrário, a marca é o que importa e,
por isso, toda ferramenta utilizada deve adaptar-se a ela. Para isso é
indispensável compreender a natureza dos produtos e serviços a ela
associados.
A apresentação da campanha de divulgação da Coleção de Verão
Daspu 2009 realizada pelo LUPA, Agência Experimental da Escola de
Comunicação da UFRJ, visa expor uma tentativa de elaborar um material de
marketing baseado nessa perspectiva. No processo de criação, se buscou
obter intimidade com a marca para poder comunicá-la ao público, e manter as
características da Daspu presentes em todas as peças e ações planejadas. Se
manteve o foco na irreverência e na ousadia da marca e, principalmente, no
discurso de luta pelo reconhecimento da cidadania das prostitutas.
Infelizmente, como a campanha não chegou a ser veiculada, não é
possível saber qual teria sido o seu impacto junto ao público, apenas que foi
muito bem recebida pela própria organização. Tentou-se fazer com as peças e
ações da campanha o que a Daspu faz com as roupas: colocar a profissional
do sexo como sua própria porta voz mostrando a cara e assumindo sua
posição na sociedade.
52
Referências
CRANE, Diana. A moda e seu papel social: classe, gênero e identidade das
roupas. São Paulo: Senac, 2006.
KOTLER, Philip. Marketing para organizações que não visam o lucro. São
Paulo: Atlas, 1978.
LENZ, Flavio. Daspu: a moda sem vergonha. Rio de Janeiro: Aeroplano, 2008.
53
PERUZZO, Maria Cicilia, “Observação participante e pesquisa-ação”. In
Duarte, Jorge; Barros, Antonio (Orgs.) Métodos e técnicas de pesquisa em
comunicação. São Paulo: Atlas, 2005. p 125-144.
VIEIRA, Stalimir. Marca: o que o coração não sente os olhos não vêem. 3. ed.
São Paulo: WMF Martins Fontes, 2008.
54
APÊNDICE A
56
também fossem uma fonte de renda? Hoje, você acha que os objetivos
continuam os mesmo?
57
eu coloquei três coisas negativas na marca, mas inconscientemente foi
proposital.
A idéia da Gabriela era fazer uma confecçãozinha. Quando a coisa
explodiu a primeira coisa que passou pela cabeça deles, porque eles não são
comerciantes, são ongueiros, foi: está aí a oportunidade para nós colocarmos
puta na boca do povo e então eu comecei a bolar os textos das camisetas, aí
sim teve um trabalho de verdade. Mas esse objetivo inicial foi de tentar
conscientiza a população via roupa. Só que o sucesso foi tanto que, muito
rapidamente, se transformou na idéia de fazer uma grife mesmo, com desfiles.
Nem adiantava a gente ter alguma pretensão. Antes de ter alguma pretensão, a
coisa acontecia. Isso foi em dezembro e em janeiro a gente estava no Fashion
Rio, fomos convidados. Nunca imaginamos de ir para o Fashion Rio.
Continua, em primeiro lugar, tentar diminuir o preconceito e isso tem
conseguido e ganhar algum dinheiro para sustentar os projetos.
Para essa matéria no Fantástico, tínhamos que mostrar cinco peças que
não existiam. Então foram três peças que as putas já tinham, a roupa delas.
Uma foi feita por uma puta que costura, mal, mas costura. As duas peças
realmente da ONG foram duas camisetas que eu fiz: uma era a marca, a
camiseta preta com a logo e a outra era uma camiseta que eu já tinha feito,
antes dessa história toda, para o bloco Prazeres Davida. a gente mostrou isso
como a primeira produção da Daspu. Quando a gente apareceu no Fantástico,
na segunda-feira, o site da loja virtual já estava pronto, só com essa camiseta
da marca. Em uma semana eu acho que venderam quase quinhentas, e a
58
gente não tinha as camisas. Na hora em que a gente percebeu que aquilo
podia dar dinheiro para a ONG, o primeiro pensamento, aí, foi esse de arrumar
fornecedor. Na semana seguinte já estava cansativo você entrar numa loja que
só tem uma peça. Então a gente falou: vamos fizer mais três modelos de
camisetas, mas não podemos perder esse gancho de que as pessoas estão
interessadas em ONG de puta, então vamos falar de puta nas camisetas. Aí
pensei nas frases, algumas das meninas sugeriram, fiz algumas modificações e
fizemos, acho que, cinco ou seis nessa primeira leva. E a gente percebeu que
o caminho era esse: frases legais que falavam de prostituição.
59
6) Qual, a seu ver, o público que compra as roupas da Daspu? Quais as
motivações dessa compra (ideológicos – querem contribuir para a campanha e
a divulgação das idéias contra a discriminação; é uma escolha de um produto
da moda como outro qualquer; um certo desejo de desafiar os padrões
tradicionais da moralidade, etc)
64
APÊNDICE B
2) Quando foi lançada, num evento de moda do Rio, a marca Daspu teve
uma grande repercussão na imprensa. A que você atribui esse fato?
3) Qual, a seu ver, foi a repercussão desse fato junto aos profissionais
da moda? E do público? Porque?
Com o público, eu não tenho muita idéia. Eu acho que o público tem
acesso pelo site. Sei que els vendem muito bem as camisetas. As camisetas
são ótimas, muito legais, muita gente de moda tem, mas ainda falta uma
continuidade, no meu ponto de vista. Por exemplo, talvez desde 2006 eu não
ouço falar nada da Daspu. Aí chegou esse livro, eu disse: ah! Estão vivas. Mas
acho que elas não conseguem ter esse time que a moda, infelizmente, exige. É
um negócio massacrante. Todos os estilistas sofrem com isso, existem até
66
livros sobre isso, falando que eles são as verdadeiras vítimas da moda, pois
são obrigados, atualmente, a criar quatro coleções: uma de verão, uma prévia
de verão, uma prévia de inverno e uma de inverno. Exige tempo. Eu não sei se
as meninas têm esse tempo. Exige uma dedicação também, que é muito
complicado.
Não. Nenhuma das duas. Não é uma marca de moda justamente porque
não tem essa continuidade, ela é muito esporádica. Ela é uma marca de
comportamento, de opção alternativa, sabe? Eu acho que a moda, atualmente,
é uma atividade que reflete muito da vida contemporânea, então, ela está muito
próxima das pessoas, ela deixou de ser aquele mistério que era antigamente e
ficou muito próxima das pessoas, até por conta desse culto de celebridade,
então ela deixou der aquela coisa daquelas pessoas perfeitas de um metro e
oitenta e tamanho quarenta e se aproximou do público em geral. Então ela tem
uma relação muito próxima de todo mundo, inclusive das meninas da Avenida
Atlântica, de todo mundo, ela é muito próxima, então existe uma troca muito
grande de comportamento, até de conceito mesmo. Você quer ter uma roupa
sedutora? Quem é mais sedutora do que elas? Acho que elas aproveitaram
isso. Elas têm, também, um reflexo na sociedade, elas não são páreas mais.
Elas estão aí na rua, todo mundo vê, então por que não aproveitar isso? Para
vender moda, só que, não basta você ter esse conceito todo de vida de
sedução para ser profissional de moda. Infelizmente, para ser profissional de
moda você tem que ter administração, continuidade, estilo design... e muita
paciência... para perder dinheiro de vez em quando.
Pela mídia, pelo marketing. É claro. Para o evento também. Um evento,
mesmo que ele tenha uma Gisele Bündchen, não pode se arriscar a ser
esvaziado por um outro evento, então, é melhor se aproximar do chamado
concorrente, chama-lo para perto, isso vai dar uma imagem muito mais
simpática, especialmente no casso da Daspu, do que se opor e fingir que não
está acontecendo nada e ver que metade do pessoal que faz a cobertura vai
para o desfile esterno, que não tem nada a ver com as Giseles Bündchen da
vida.
6) A seu ver, a marca DASPU poderia vir efetivamente a ser uma marca
de moda com condições de competição com outras marcas no mercado?
Nesse caso, qual seria o seu público? Porque?
Acho que não tem nada a ver. Acho que é um pontapé inicial, que já
rendeu muita matéria, já encheu bastante espaço de jornal, mas está parado
atualmente. Não existe preconceito, como eu te falei, se a roupa for bacana...
não tem preconceito. Se elas tiverem um bom visual... ótimo. Não pode botar...
moda é uma coisa cruel. Além de muito trabalho que exige, da dedicação que
exige, ela exige um visual. Ninguém leva a sério, na moda, desfile com gente
que não tenha um metro e oitenta e manequim quarenta. Não adianta. Isso aí
não é só em relação às prostitutas... é muito engraçado você botar prostituta de
modelo, dá entrevistas maravilhosas você falar com a, sei lá, Janete, que está
desfilando, está realizando o sonho da vida dela, mas é não é manequim
quarenta, ela não tem um metro e oitenta, então, é a mesma coisa que você
quere fazer carro de papel.. carro tem que ser feito com material de metal, não
pode. Isso faz parte da moda. Madri é um grande centro de moda. a Espanha
tem a Zara, tem a Mango... a Zara é a maior empresa de varejo de moda no
mundo. Ninguém considera Madri como um centro lançador de moda. eles tÊm
grandes eventos, gente boa para caramba e tudo, mas ninguém considera um
centro de moda. Sabe por quê? Porque eles não põem modelos jovens,
magras e altas. É inevitável, é cruel, é muito chato, tem a anorexia, mas faz
parte da moda. Tudo bem, você não precisa colocar meninas de doze anos
pesando trinta quilos, mas você não pode colocar uma pessoa de cinqüenta
anos pesando sessenta. Então começa por aí. Esse visual dá matéria, mas ele
não dá moda. porque para comprar moda, hoje em dia, a pessoa tem que olhar
e se identificar, nem que seja atriz de novela... melhor exemplo é a Camila
69
Pitanga, na Bebel, aquilo ali virou moda, por que? Porque ela é linda, ela é
magra, ela estava super fascinante. Não rendeu? Rendeu muita moda e era um
papel de prostituta.
70
ANEXO
71
Flyer
72
Adesivo
74
Reprodução da peça desenvolvida pelo LUPA – Laboratório Universitário de
Publicidade Aplicada.
75
Reprodução da peça desenvolvida pelo LUPA – Laboratório Universitário de
Publicidade Aplicada.
76