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(© ROMANCE COMO EPOPEIA BURGUESA 1. As vicissitudes da teoria do romance © romance literério é 0 género mais tipico da sociedade bur- guesa. Enibora nas literaturas do Oriente antigo, de Antiguidade e da dade Média existam obras sob muitos aspectos afins 20 romance, os tragostt a forma de expressdo da sociedade burguesd. Por outro lado, é no Fomance que todas as contradigoes especificas desta sociedade sto figuradas do modo mais tfpico e adequado, Ao contrério das outras formas artistas (por exemplo, o drama), que a literatura burguesa assimila e remodela em fungéo de seus préprios objetivos, as formas narfativas da literatura antiga sofreram no romance modificagoes to profundas que, neste caso, pode-se falar de uma forma artfstica substancialmente nova, Allei universal da desigualdade do desenvolvimento espiritual ém relaco ao progresso material estabelecida por Marx, manifesta- se de modo claro também no destino da teoria do romance. Com base m nossa definigao geral do romance, seria possivel supor que a teoria desta nova e especifica forma literéria foi elaborada de modo com- pleto na estética burguesa, Mas nao foi isso 0 que aconteceu: os pri- meiros teOricos burgueses ocuparam-se quase exclusivamente dos .géneros literérios cujos principios estéticos podiam ser recolhidos da antiga literatura, como o drama, epopeia, a sétira été. O romance se desenvolve de modo quase inteiramente independente da teoria geral da literatura, que nao 0 toma em consideracio e nao influi sobre ele (recorde-se, nos séculos XVII e XVII, Boileau, Lessing, Diderot etc.) [As primeiras alusbes sérias a uma teoria do romance encontram-se «em observagdes dispersasfeitas pelos préprios romancistas, que de- nionstram elaborar este novo género de modo inteiramente cons- Gente, ainda que, em suas generalizagdes teGricas, nao superem 0 que 6 absolutamente necessério para sua propria criagio. icos do romance aparecem somente depois que ele se tornou 194 @ Gyorcy Lukscs Decerto, esta falta de atencdo para o que ¢ especificamente novo no desenvolvimento burgués da arte nao é casual, O pense- mento tedrico da burguesia nascente, em todas as questdes da estétca e da cultura, tinha forgosamente de se manter 0 mais préximo possivel de seu modelo antigo, no qual encontrara uma poderosa arma ideolégica em sua luta pela cultura burguesa contra a cultura medieval. Esta tendéncia se reforcou ainda mais no perfodo absolu- tista, quando a burguesia atravessava as primeiras fases do seu desen- volvimento. Todas as formas de criacio artistica que haviam crescido organicamente da cultura medieval, assumindo um aspecto popular ¢ até mesmo plebeu — e que, portanto, no correspondiam aos mo- delos antigos -, foram ignoradas pela teoria ¢, frequentemente, re- chagadas como “nao artisticas” (como, por exemplo, o drama shakes- ppeariano). E, como se sabe, o romance — em seus primeiros grandes representantes — liga-se direta e organicamente, ainda que ao mesmo tempo de modo polémico, a arte narrativa medieval: forma do romance surge da dissolucao da narrativa medieval, como produto de sua transformagao plebeia e burguesa. Somente na filosofia cléssica alema é que surgem as primeiras tentativas de criar uma teoria estética geral do romance e de incluf-lo corganicamente num sistema de formas estéticas. Ao mesmo tempo, também as formulagdes dos grandes romancistas sobre seu préprio trabalho ganham amplitude e profundidade (Walter Scott, Goethe, Balzac). Portanto, os principios da teoria burguesa do romance foram estabelecidos neste perfodo. Mas uma literatura mais abundante sobre a teoria do romance velo luz somente na segunda metade do século XIX. Foi nesta época que 0 romance confirmou definitivamente sua predomindncia co- mo forma de expressio tipica da consciéncia burguesa na literatura. As tentativas de fazer renascer a epopeia antiga com base na civiliza~ do moderna, bastante difundidas nos séculos XVII e XVII (Milton, Voltaire, Klopstock), desaparecem neste periodo. Além disso, nos maiores paises europeus, hé j& algum tempo havia se encerrado 0 ponto culminante do desenvolvimento do drama. f assim natural que surja também (mais ou menos na época da publicacdo dos artigos tebrico-polémicos de Zola) uma mais ampla literatura sobre © ROMANCE COMO EFOPEIA BURGUESA # 195 6 romance, ainda que nao tanto de cardter teérico-sistemético, mas sobretudo de natureza jomalistica e voltada para questdes de atuali- dade. A desigualdade do desenvolvimento fez. com que esta literatu- 1a se ligasse, ao mesmo tempo, a fundamentacao tedrica do natura~ lismo: o romance foi separado das grandes tradig6es ¢ conquistas da época revolucionatia classica e a forma do romance sé dissolveu sob o efeito da decadéncia geral da ideologia burguesa. Por mais interessantes que sejam estas teorias do romance para © conhecimento das aspiracOes artisticas da burguesia depois da metade do século XIX, elas no podem resolver os problemas fun- damentais do romance, ou seja, ndo podem nem fandamentar a autonomia do romance como género literdrio particular no scio dé outras formas de narracio épica, nem especificar as caracteristicas especificas deste genero, os principios que o diferenciam da literatura que tem como objetivo o puro divertimento, 2. Epopeia e romance A teoria marxista do romance deve partir, portanto, ainda que ctiticamente, das ideias elaboradas sobre este género literério pela estética cléssica alema.A estética do idealismo cléssico foi a primeiraa pO, no plano dos principios, a questo da teoria do romance —eo faz de modo simultaneamente sistemético ¢ hist6rico. Quando Hegel chama o romance de “epopeia burguesa’, poe uma questao que &, 20 ‘mesmo tempo, estética e hist6rica: ele considera o romance como 0 género literdrio que,-na época burguesa, corresponde & epopeia. O romance, por um lado, tém as caracteristicas estéticas gerais da grande narrativa épica;e; por outro, softe as modificagées trazidas pela época burguese, 0 que assegura sua originalidade. Com isso, em primeiro lugar, é determinado o lugar do romance no sistema dos géneros artisticosele deixa de ser um género “inferior”, que a teoria evita com soberba; sendo plenamente reconhecido seu caréter tipico e domi- nante na literatura moderne. Em segundo lugar, Hegel deriva preci- samente da oposigao hist6rica entre a época antiga e os tempos mo- dernos o cardter ¢ a problemética especificos do romance. A pro- fandidade desta formulagdo do problema manifesta-se no fato de que 196 @ Groacr Luxacs Hegel, seguindo o desenvolvimento geral do idealismo cléssico ale- mio a partir de Schiller, sublinha enfaticamente a hostilidade & arte da moderna sociedade burguesaj ele constrdi sua teoria do romance precisamente com base na contraposigdo entre o caréter poético do ‘mundo antigo eo carater prosaico da civilizacéo moderna, ou seja, da sociedade burguesa. Como jé bem antes dele o fizera Vico, Hegel ~ ainda que cer- tamente sem indicar os seus fundamentos econdmicos objetivos — liga a criagao da epopeia & fase primitiva de desenvolvimento da humanidade, ao periodo dos “hersis’, ou seja, ao periodo em que a vida social ainda no era dominada, como o seria na sociedade burguese, pelas forcas sociais que adquiriram autonomia e indepen- dncia em face dos individuos. 0 carter poético da época “heroica’, {que se expressa de modo tipico nos poemas homéricos, repousa na ‘autonomia e na atividade espontanea dos individuos; o que significa, como diz Hegel, que “a individualidade nao se separa do todo ético a que pertence, ¢ tem consciéncia de si somente em sua unidade subs- tancial com este todo”! O caréter prosaico da época burguesa consis- te, para Hegel, na inevitével abolicao tanto desta atividade espontanea quanto da ligacio imediata entre o individuo e- sociedade. Diz ele: “No atual Estado de diteito, os poderes piblicos nao tém em si mes- ‘mos uma figura individual, mas o universel enquanto tal reina em sua uuniversalidade, na qual o caréter vivo do individuo ou é removido ou aparece como secundério ¢ indiferente”, Portanto, os homens mo- dernos, ao contririo dos homens do mundo antigo, “tém seus obje- tivos e condigdes pessoais separadas dos objetivos do todo; 0 queo in- dividuo faz com suas proprias forcas o faz somente para sie, por isso, responde apenas por sua propria aco e nao pelos atos do todo subs- tancial ao qual pertence” Esta lei, que regula a vida da sociedade burguesa, é reconhecida incondicionalmente por Hegel como resultado historicamente ne- cessério do desenvolvimento da humanidade e’como um progresso absoluto em relacio a0 primitivismo da época *heroica” Mas este progresso tem também uma série dé lados negativos; o homem perde stia anterior atividade espontinea e a submissio 40 moderno Estado burocritico, vivida como 2 submissio a um organismo coercitivo (© ROMANCE COMO EPOPEIA BURGUESA @ 197 externo, priva-o de qualquer atividade deste tipo. Esta degradacéo destr6i o terreno objetivo para o florescimento da poesia, que € suplantada pela prose rasteira e pela banalidade. A tal degradagao, 0 hhomem nao pode se submeter sem resistencia. Diz Hegel: O interessee a necessidade de uma totalidade individual efetiva ¢ de uma autonomia auténtica nfo nos abendona- Flo jamais, € nlo podem nos abandonar, por mais que 0 desenvolvimento da ordem na vida civil e politica madura {ou sea, 0 desenvolvimento burgués] seja por nés reconhe- cido como fecundo e racional. Embora Hegel considere impossfvel ta contradicgo entre poesia ecivilizagdo, ele pensa ser possivel mitigé-la. Esta funcdo € encarnada pelo romance, que desempenha na sociedade burguesa 0 ‘mesmo papel desempenhado pela epopeia na sociedade antiga. En- {quanto “epopeia burguess”,o romance deve, segundo Hegel, conciliar as exigéncias da prosa com os direitos da poesia e encontrar uma “média” entre eles, Na realidade que se tornou prosaica, o romance deve, sempre segundo Hegel, “devolver & poesia, nos limites em que isso ¢ possivel na situagio dada, direito que ela perdew” Mas isso deve ser feito ndo na forma de uma contraposicao romanticamente cristalizada entre poesia e prosa, mas mediante a figuracdo de toda a realidade prosaica da luta contra ela: Essa luta encontra sta realizago [a] ne fato de que, por um lado, os personagens, inicial- ‘mente em oposigl0 2 ordem do mundo, aprendem & reco- hecer nela o auténticoe o substancial,reconciiando-se com suas relagdes e nela ingressando de modo ativo; mas, por ‘outro lado, eles cancelam do que fazer e reaizam a forma prosaica, substituindo a prosa existente por uma realidade ‘que se torna amiga da belezae da arte. Na teoria do romance de Hegel, encontraram sua mais lumi- rosa expressio todas as grandes virtudes do idealismo cléssico, mas, ao mesmo tempo, também as suas inevitéveis limitagbes. Por ter se aproximado, ainda que de forma falsa e idealista, da compreensio de ‘uma contradicao essencial da sociedade burguesa — ou seja, do fato de que nela o progresso técnico material € alcancado ag prego de um 198 @ Gyorcy Luxacs rebaixamento de muitos aspectos decisivos da atividade espiritual e social, em particular da arte e da poesia -, a estética classica alema conseguiu realizar uma série de importantes descobertas, que cons- tituem a razo de sua permanente grandeza. Em primeiro lugar, ela tornou evidente o elemento comum que liga o romance epopeia. Na pritica, essa ligagdo se reduz ao fato de que todo romance de grande significagdo tende a epopeia, ainda que de modo contradit6rio paradoxal - ¢ é precisamente nesta tendéncia jamais alcangada que le adquire sua grandeza poética. Em segundo lugar, 0 significado da teoria burguesa cléssica do romance reside na tomada de consciéncia da diferenga histérica entre a epopeia antiga ¢ 0 romance, ¢, portanto, na compreensio do romance como um género artistico tipicamente novo. ‘Nao temos aqui o espaco para falar detalhadamente da teoria geral da epopeia na filosofia cléssica, ainda que esta ditima tenha feito muito para um conhecimento te6rico da composi¢éo dos poemas homéricos (por exemplo: o significado dos momentos regressivos na epopeia em contraposicéo com a progresséo dos motivos no drama, autonomia das partes singulares, fungdo do acaso etc.). Estas teses gerais sio de extraordinaria importancia para entender a forma romanesca, jé que esclarecem os principios poéticos formais gracas 0s quais o romance, como antes dele a epopeia, pode dar um quadro completo do mundo, um quadro de sua época. Goethe formula do seguinte modo a oposicéo entre romance e drama: No romance, devem-se representar sobretudo ideias acontecimentos; no drama, personagens e fatos. O romance deve avancar lentamente: as ideias do protagonista devem retardar [..] a evolugdo demasiadamente répida da aco. ] O her6i do romance deve ser passivo, ou, pelo menos, no excessivamente ativo.? Esta pessividade do her6i do romance é exigida por considera- (bes de natureza formal: ela é necesséria a fim de que, em torno dele, 1possa se desenvolver, em toda a sua amplitude, a totalidade do mundo. No drama, ao contrario, o protagonista encarna a totalidade de uma contradigdo social levada a seu limite extremo. (© ROMANCE COMO EPOPEIA BURGUESA @ 199 Nesta teoria do romance se expressa, a0 mesmo tempo, frequentemente sem que os préprios tebricos 0 percebam, um carter especifico do romance burgués: a sua impossibilidade de encontrar ¢¢ representar um “her6i positivo”, Decerto, a filosofia cléssica néo aborda plenamente este problema, jé que ela tende conscientemente a alcancar um impossfvel estado médio entre as tendéncias contra- ppostas ¢ em luta no seio do capitalismo: ndo por acaso ela toma como modelo 0 Wilhelm Meister de Goethe, romance que se propde cons- cientemente figurar este “estado médio". Todavia, a filosofia cléssi- ca esclareceu até certo ponto a diferenga entre epopeia e romance. Schelling, por exemplo, vé o objeto do romance na luta entre idea- lismo e realismo, enquanto Hegel 0 aponta na educagao do homer para a vida na sociedade burguesa. A importancie dessas conquistas da estética cléssica se mani- festa no fato de que elas liquidaram definitivamente todas as tenta- tivas feitas nos séculos XVII e XVIII no sentido de criar e fundamen- tar teoricamente uma epopeia moderna»A inexequibilidade destas tentativas revela-se no fato de que Voltaire, em sua teorie da poesia épica, polemiza precisamente com o principio heroico dos poemas homéricos e busca construir uma teoria da epopeie carente de todo heroismo, apoiada numa base puramente moderna, ou seja, na base social que € prépria do romance. Nao € certamente por aceso que Marx, falando da hostilidade do capitalismo & poesia em geral e poesia épica em particular, cite precisamente a Henriade de Voltaire ‘como caso modelar de um poema épico fracassado. Portanto, uma atitude teoricamente justa em face da forma do romance pressupde uma compreensdo teoricamente correta das con- tradigbes do desenvolvimento da sociedade capitalista, A filosofia ‘lassica alemi ndo era de modo algum capaz de chegar a uma tal compreensio, Para Hegel, Schelling etc., 0 desenvolvimento burgués era o tltimo grau “absoluto” do desenvolvimento da humanidade, Eles nao podiam compreender, portanto, que 0 capitalismo esté his- toricamente condenado; a compreensdo da contradigio fundamental da sociedade capitalista (a contradigio entre a producao social e a apropriagao privada) situava-se para além de seus horizontes. Até ‘mesmo afilosofia de Hegel s6 podia, no melhor dos casos, aproximar-se 200 @ Grorcy Luxies da formulaczo de algumas consequéncias importantes que decorrem daquela contradicio. E nem mesmo equi esta filosofia podia com- preender a verdadeira unidade dialética dos opostos sociais. Den- tro destes limites, Hegel chega apenas a exata antecipacio das contra- digées do desenvolvimento capitelista, ao pressentimento da insepa- rabilidade entre o seu cardter progressista, que revoluciona a produ- ‘do ea sociedade, ¢@ intensa degradacao do homem que este desen- sigo. imorredouro da estética cléssica alema para a teoria do romance reside ne descoberta da profunda relagao que liga 0 romance como genero 2 sociedade burguesa. Mas € precisamente a justeza deste modo de formular a questo que determina necessa- da resposta que Ihe é dada. Para a estética do mesmo Hegel ~ que, entre todos os seus contemporéneos, foi quem melhor compreendeu a esséncia do capitalismo ~ nao péde ir além de um simples pressentimento da contradigdo interna da sociedade ta; e, quando ele tenta retirar deste pressentimento suas con- veis. E por isso que sua observacao correta sobre a natureza antiartis- tica do capitalismo se transforma na erronea teoria do fim da arte, ‘ou seja, da passagem do “Espirito” para um estégio situado alémn da arte. E também por isso que ele concebe a variante antirromantica da 0 com o real” como o contetido necessério do romance, manifestando com isso, sem diivida, um amor pele verdade que recorda 0 “cinismo” de Ricardo,‘ mas com uma estreiteza que 0 obrigou 2 ignorar muitas possibilidades e questdes importantes do romance, Os te6ricos burgueses ~ até mesmo os do perfodo cléssico — estio diante de um dilema: ou exelter romanticamente 0 periodo he- 0, mitico, primitivamente postico da humanidade, buscando assim escapar da degradago capitalista do homem mediante um retorno ao passado (Schelling); ou stenuar a contradicao do ordena- mento capi insuportével para a consciéncia burguesa, numa ‘© ROMANCE COMO EPOPEIA BURGUESA © 201 medida suficiente para tornar possivel, pelo menos, uma certa aceita- do e um certo reconhecimento deste ordenamento (Hegel). Ne~ nhum pensador burgués superou este dilema te6rico, nem mesmo, como seria de prever, no que se refere & teoria do romance. E os ‘grandes romancistas s6 podem figurar de modo correto esta contra~ digdo quando, inconscientemente, deixam de lado suas proprias teorias romanticas ou conciliadoras. A estética cléssica alema iden- cexemplo, qué, enquanto a objetividade da epopeia antiga é conferida pelo mito, é2 forma especifica do romance que Ihe confere esta obj vidade (“o romance s6 € objetivo gragas a sua forma’, diz Schelling) Contudo, tal estética no foi capaz de tratar concretamente estas caracteristicas do romance e ndo foi além de uma contraposicao — ainda que correta em suas grandes linhas ~ entre romance € epo| ‘As bases para a construcéo de uma auténtica do romance foram colocadas, pela primeira vez, na doutrina de Marx ce Engels sobre a arte. Marx deu uma explicago materialista da desi- gualdade do desenvolvimento da arte com relagao ao progresso ma- terial, bem como da hostilidade do modo capitalista de produgo & arte e @ poesia: esta explicagZo contém a chave para compreender a esigualdade do desenvolvimento de formas e géneros literérios es- peciicos. As ideias geais de Marx sobre a epopeia antiga e sobre sua contrafacio moderna, contidas na Introdusao a critica da economia politica e nas Teorias da mais-valia, bem como o.cepitulo do livro de Engels sobre A origemt da familia, da propriedade privada e do Estado dedicado & desagregacdo da sociedade tribal, trazem luz @ di do desenvolvimento da forme épica, um de cujos momentos importantes ¢ construido pelo romance. 3.A forma especifica do romance Por suas finalidades e natureza, o romance tem todos os tragos caracteristicos da forma épica: a tendéncia a adequar 0 figuragdo da vida ao seu contetido; abarcados a presenga de virios planos; a submissio do prin- cfpio da reprodugao dos fenémenos da vida por meio de uma ati- 202 @ Gyorgy Luxics tude exclusivamente individual e subjetiva diante deles (como 0 ca- ica) ao principio da figuragdo plistica, na qual homens ¢ eventos agem na obra quase por si, como figuras vives da realidade externa. Mas todas estas tendéncias atingem sua plena ¢ completa expresso somente na poesia épica da Antiguidade, que constitui a “forma clissica da epopeia” (Marx). Neste sentido, 0 romance € 0 produto da dissolucao da forma épica,a qual, com o fim da sociedade antiga, perdeu o terreno para seu florescimento. © romance aspira ‘aos mesmos objetivos a que aspira a epopeia antiga, mas néo pode jamais alcangé-los, jé que ~ nas condigies da sociedade burguesa, ‘que constituem a base do desenvolvimento do romance — 05 modos de realizar os objetivos épicos tornam-se tao diferentes dos antigos que os resultados sdo diametralmente opostos as intengdes. A con- tradigdo da forma do romance reside precisamente no fato de que este sgtneroliteréri, como epopeia da época burguesa,é aepopeia de uma sociedade que destréi.a possi que, como veremos, constitui a causa principal dos defeitos artisticos do romance quando comparado & epopeia ~ proporciona-Ihe, 20 mes- ‘mo tempo, também uma série de vantagens. O romance abre cami- rho para um novo florescimento da épica, de cuja dissolugao nasce, gerando com isso possibilidades artisticas novas que a poesia ho- mérica ignorava, Schelling tem toda razdo quando atribui uma téo grande im- portincia & forma do romance. Byron ~ que, a despeito de usar uma forma versificada, escreveu com seu Dom Juan um romance € n80 ‘uma epopcia ~ formulou enfaticamente, desde os primeiros versos, a ‘oposico entre epopeia e romance sob o ponto de vista da forma. Fle quer romper com a composigao épica, com 0 i pois quer contar a biografia de seu her6i desde o comeso. Com isso, Byron aponta efetivamente para uma caracteristica especifica essen- cial da forma romanesca, Como a epopeia opera com um heréi que, por toda sua psicologia, cresceu sem problemas no seio da sociedade em que vive, a figuragao épica nao carece de nenhuma espécie de explicagéo genética; por conseguinte, ela pode ter seu comego n0 pponto mais favoravel ao desenrolar dos eventos épicos. A narra¢do do passado serve somente aos interesses do relato, a explicitagao da ima- (© ROMANCE COMO EPOPEIA BURGUESA @ 203 gem do mundo, & tensio épica etc, mas nfo tem em vista uma cexplicagio do cardter do her6i e de sua relacio com a sociedade. No romance, ocorre precisamente 0 contrétio: 0 passado é absoluta- mente necessério para explicar geneticamente 0 presente, 0 desen- volvimento ulterior do personagem. Mas Byron aborda 0 problema sob um aspecto formal: ele exige a forma biogréfica como forma do romance. Ora, sabe-se que grande parte dos romances cléssicos ado- tam esta forma biogréficas mas seria incidir no formalismo deduzic da necessidade para 0 romance do principio da explicacio genética a conclusio de que a forma biogréfica € igualmente necesséri por exemplo, o grande mestre do desenvolvimento genét pressamente @ exigéncia de comegar o romance em qui do desenvolvimento do her6i e utiliza também esta variante da figu- ragdo em sua prética criadora, Como vimos, ocorre uma contradigao entre teoria e prétici no desenvolvimento do romance, que se manifesta no atraso da téoria com relagio a pratica da criagdo romanesca. Disso se poderia concluir ‘que, para a construgao da teoria do romance com suas particulari- dades especificas, poderiam servir como material somente as obras dos grandes romancistas. Contudo, ao lado da teoria por assim dizer “oficial” dos grandes poetas e pensadores do periodo revoluciondrio da burguesia, encontramos neles também uma teoria “eso qual se manifesta, mais do que em sua teoria propriamente dita do romance, ume mais clara compreensio das contradic6es fundamen- tais da sociedade burguesa. Vejamos um exemplo. Jé na Fentomenologia do Espirito, Hegel ficou a oposigdo entre 0 periodo heroic ¢ o periodo prosaico da Durguesis, of $eja, a oposigao entre a atividade humana espontinea iluminiar o caminho que leva da epopeia e da tragédia gregas ao mun- do da prosa (Roma). Mas 0s leitores atentos da Fenomenal taimeite observaram que esta passagemn aparece duas ve7es, inicial- mente nos capitulos que tratam da transicgo & sociedade burguesa nos capttulos sobre 0 “reino humano espiritual” irito alienado de si mesmo, a cultura”. Estes capitulos jade espontanea e uma autonomia do homem, 204 @ Grorcy Luxics mas a atividade espontanea tornada alienada de si mesma, defor- mante ¢ deformada, prépria do periodo de nascimento do capita- lismo, o da acumulagao primitiva. Em tais capitulos, Hegel nada diz sobre a poesia, em particular sobre 0 romance e seus problemas formais, mas ndo € certamente por acaso que, num momento de- cisivo de suas consideracdes, ele cite O sobrinho de Rameau de Diderot ¢ extraia da estrutura e da forma desta obra-prima importantes conclusdes: © que no mundo da cultura se experimenta & que nao tém verdade nem as esénclas efeivas do poder e da riquera, nem seus concetos determinados, bem e mal, ou @ cons- cincia do bem e do mal, a conscitncia nobre ea consciacia vil; sendo que todos estes momentos se invertem, antes, tum no outro, e cada um é 0 contririo de si mesmo, “Mas a linguagem do dilaceramento € a linguagem perfeta cultura Os principios desta teoria “esotérica” hegeliana do romance contém também os principios da pottica “esotérica” de Balzac, que, nna maioria das vezes, ele enuncie pela boca de seus personagens (¢, portanto, na forma atenuada da ironia). Assim, em Ilusdes perdid Tudo € bilateral no dominio do pensamento... O que le serem grandes nfo € a faculdade de vor ¢ outra contra o duelo. Vocé teria coragem de definir qual era a verdadeira opinifo dele? Qual de nés poderia julgar entre Clarice ¢ Lovelace, entre Heitor e Aquiles? Qual € 0 heréi de Homero? Qual foi a intengio de Richardson? significa apenas que Balzac, em sua obra, desenvolve até o fundo as contradigdes mais profundas da sociedade burguesa e figura a inter- penetracio dinamica destas contradigbes como forgas motoras desta sociedade. O fato de que Balzac, como Goethe e Hegel, busque, do onto de vista tedrico, encontrar um ut6pico “estado médio” destas © ROMANCE COMO EPOPEIA BURGUESA @ 205 contradigbes ¢ o tenha até mesmo figurado em alguns dos seus ro- ‘ances no tem aqui importancia,jé que o significado do autor de A comédia humana na hist6ria do romance reside precisamente no fato de que, no essencial de sua obra, ele se afastou desta utopia e se ateve & figuracdo das contradigoes existentes. E aqui que esto seu mérito e sua forga. Contudo, 0 conhecimento criador das contradig6es antagoni- cas como forgas motrizes da sociedade capitalist (radicadas, em sua forma geral, no antagonismo de classe entre proprietirios néo- roprietérios) € apenas 0 pressuposto da forma romanesca, néo a répria formaiJé Hegel havia enunciado que o conhecimento correto poético” propriamente dito, a premissa da invengaio e do desenvolvi- mento da ago. O problema da agZo constitui precisamente o ponto centfal da téoria da forma do romance. Todo conhecimento das relagdes sociais € abstrato ¢ desinteressante, do ponto de vista da narrativa, se ndo se torna 0 momento fundamental e unificador da aslo; toda descrigdo das coisas e das situagdes € algo morto e vazio se € descrigdo apenas de um simples espectador, e ndo momento ativo ou retardador da agdo. Esta posicao central da ago nao é uma in- vvengdo formal da estética; a0 contrério, ela deriva da necessidade de refletir a realidade do modo mais adequado possivel. Se se trata de representar a relacdo real do homem com a sociedade e a natureza (ou seja, nd apenas a consciéncia que o homem tem dessas relagdes, mas 0 proprio ser que é 0 fundamento desta consciéncia, em sua ‘conexio dialética com esta tltima), o nico caminho adequado € a figuragio da acdo/E isso porque somente quando o homem age em onexio com o ser social é que se expressa sua verdadeira esséncia, «a forma auténtica e o contetido auténtico de sua consciéncia, inde- pendentemente de que ele o saiba ou ndo, e quaisquer que sejam as falsas representacoes que ele tenha desta conexto/ A fantasia poética do narrador consiste precisamente em inventar uma histéria ¢ uma situagio nas quaisee-expresse ativaniente-ésta “essncia” do-homem, ja, elemento tipico do seu ser social. Através deste tal ventivo, que pressupoe-naturalmente uma profunda e concreta pe> netragio nos problemas sociais, os grandes narradores podem criar 206 @ Grorsy Luxkes ‘uma representacio global de sua sociedade, a partir da qual ~ como diz Engels de Balzac ~ é possivel, “mesmo no que respeita aos, pormenores econémicos”, aprender mais do que “em todos os livros de historiadores, economistas e profissionais da estatistica da época”s ‘As condig6es em que surge esta acéo, seu contetido e sua forme sto determinados pelo grau de desenvolviniento da economia da luta de classes filo momento em questi. Mas 2-epopeis-e-o romance Resolvem-este problema central-que ihés €comum de modo diame- tralmente oposto: Para ambos os géneros, énecessério tornar evidente aspeculiaridades essenciais de uma determinada sociedade por meio de destinos individuais, das agdes e dos sofrimentos de individuos concretos. £ nas relacées do individuo com a sociedade, expressas através de um destino individual, que se manifestam as caracteristicas essenciais do ser histérico-concreto de uma forma social dada. Engels descreve a grande dame como figura principal do: .ces de Balzac afirma que, “em torno deste quadro central, [ele] pinta toda a historia da sociedade frances ‘Mas, no estagio superior da barbéri «a sociedade aindy era Telativamente unidal O individuo situado no centro da narracdo podia ser tipico a0 expressar a tendéncia funda- mental de toda a sociedade, e nao a contradicdo tipica no interi da sociedade.A realeza, “a0 lado do conselho e da assembleia do ovo, significa apenas a democracia guerreira” (Marx) ~ e Homero nao mostra nenhum meio pelo qual o povo (ou uma parte do povo) possa ser obrigado a fazer algo contra a propria vontade. A acio da epopeia homérica é 2 luta de uma sociedade relativamente unida, de uma sociedade enquanto coletividade, contra um inimigo externo. ‘Com a desagregacio da sociedade tribal, desaparece da arte narrativa esta forma de figurar a aco, jf que ela desapareceu também da vida real da sociedade. As caracteristicas, as aqbes ou af situagbes dos individwos 10 podem mais representar toda a s seja, nao podem s¢ tornai representa agora uma das classes em justeza-com-as-quais € compreendida uma dada luta de classes em seus aspectos essenciais que permitem resolver o problema da tipicidade dos homens ¢ de seus destinos. A unidade da vida do povo, © ROMANCE COMO EPOPEIA BURGUESA @ 207 ‘que se tornou contradit6ria, pode ser representada apenas por meio da apreensio correta das oposigbes que a conitituem, ou seja, como a sunidade destas oposi¢des. As tentativas posteriores de renovar os ele- mentos formais da antiga poesia épica esto condenadas, na miedi- da em que nascem num nivel de desenvolvimento mais elevado das oposigdes de classe, a representar a sociedade de um ponto de erroneo, com se esa Fosse ainda um sujito un pode extrair sua grandeza épica da profundidade e tipicidade das contradicoes de classe em sua totalidade dinamical Na figuragao na sociedade. Disso resulta, em particular no romiance burgués mais tardio, a aparéncia de que o tema principal seria a oposigao entre O lista pode oferecer um quadro da sociedade ica de suas contradicdes (producio social e apropriacao individual). Em Balzac, 0 amor e o casamento da grande dame pode ser 0 eixo em torno do qual se alinham os tracos carac- (8 personagens “no passam de simples escravos que nio tém participagio no Estado, esfera em que se move o cidadao livre”? A dialética do desenvolvimento desigual da arte se manifes contudo, no fato de que esta mesma contradigao principal, que criaa possibilidade da verdadeira agio romanesca ~ e que faz do romance a forma artistica predominante de toda uma época hist6rica -,cria a0 shesmo tempo as condigdes menos favordveis para a solugdo central do problema desta forma artistica, ou seja, 0 problema da azao. 0 ‘cardter da sociedade capitalista é de tal natureza que, em primeito lugar, 38 forgas sociais se manifestam nela de modo abstrato, im- 208 © GroRcy Luxics pessoal e inapreenstvel pela narragdo pottica (decerto, Hegel jé hava notado este fato, mas sem compreender suas-causes econémicas ¢, portanto, de modo incompleto): Em segundo lugar, esta natureza fez com que arelidade burguesa cotidiane frequentemente nao favoreca sume tomada de consciénciaimediata e clara das contradigbes sociais fandamentais; e isto porque, na sociedade burguesa, dominada por forgas espontineas e elementares, ninguém ¢ capaz de tomer consciéncia do impacto de suas aces nos demais individuos e 0 choque de interesses adquire muitas vezes um caréter impessoal. | Portanto, para os grandes romancists,o problema da forma consis | em superar esta com que trabalham, | tando situagdes nas quais a luta recfproca seja concreta, clara, ituagées tipicas, pode ser construida uma ago épica realmente significative. “Personagens tipicos em circunstancias tipicas” — assim Engels define, numa carta sobre Balzac, a esséncia do realismo no romance? Mas exta tipicidade significa, precisamente, o que vemos em Balzac: uum distanciamento da realidade cotidiana “média” é artisticamente necessério para obter situagoes e agdes épicas, para encernar conc tamente em destinos humanos as contradigdes fundament sociedade e evitar que estas aparecam apenas como um comentirio sobre tais destinos/A criagio de personagens tipicos (e de situacoes significa, portanto, 2 figuragio concreta das formas sociais: significa um novo renascimento ~ que nao seja pura imitago meca- nica~ do pathos da arte e da estética antigas/ Hegel define do seguinte ‘modo a palavra grega pathos, que ele diz ser intrad Segundo os antigos, pode-se designar com a palavra pathos 28 poténcias gerais que nfo se manifestam apenas para si, em sua independéncia, mas que sio igualmente vi- vas no coraséo humano ¢ agitam a alma humana até em suas.mais profundas regibes.° Portanto, pathos nao € simplesmente idéntico & paixtor decerto, ele se exterioriza na paixio, mas é ao mesmo tempo “uma poténcia da alma, legitima em si, um contetido essencial da raciona~ idade”!!-O pathos antigo se apoiava na ligagdo imediata entre 0 © ROMANCE COMO EPOPEIA BURGUESA # 209 privado € 0 piblico na pélis e, ao mesmo tempo, na unidade imediata, ‘nos personagens da epopeia e do drama antigos, do universal e do particular, do tipico e do individual. Na vida moderma, esta unidadé imediata € inatingivel. A separacao entre as fungoes socidis tas ques- fvadas condena toda poesia burguesa do “cidadao” a uma uni- versalidade abstrata: € precisamente por causa disso que esta poesia perde seu pathos no sentido antigo da palavra, Mas este fechamento 1o privado ¢ 0 isolamento entre os individuos ~ que, como diz Marx, € “a realizacdo completa do materialismo da sociedade ci tornam-se nao um fendmeno casual, mas uma lei universal; e, por isso, a busca do pathos da vida moderna s6 pode ter sucesso, até certo indo esta direco. Assim, ainda nas palavras de Marx, iniversal se poe, a borboleta procura a luz da limpada Os grandes representantes do romance realista comecaram sedo aver na vida privada 0 verdadeiro material do romance. Jé ielding se definia como “o historiador da vida privada”; Restif de la Bretonne e Balzac definiam do mesmo modo a tarefa do romance. Mas esta historiografia da vida privada s6 ndo se rebaixa zo nivel da crénica banal quando, no ambito privado, manifestam-se concreta- mente as grandes forcas hist6ricas da sociedade burguesa. No prefécio & Comédia humana, Balzac declara o seu programa: “O acaso € 0 maior romancista do mundo; para ser-se fecundo basta estudé-lo. A sociedade francesa ia ser 0 historiador; eu nada mais seria que o seu Este orgulhoso objetivismo do contetido, este grande realismo na figuragao do desenvolvimento social pode se encarnar na obra de mente quando se vai além do ambito da realidade cot ” € 0 escritor atinge 0 pathos da vida privada (Balzac) ou “o materialismo da sociedade burguesa® (Marx), Mas este pathos s6 pode ser encontrado por meio de caminhos muito indiretos e complexos, As forcas socials que 6 artista apreende, figurando 0 Sei carder con- ttadit6rio, devem aparecer como tracos caracteristicos dos persone- gens representados, ou seja, devern possuir uma lade de pai- xo ¢ uma clareza de pri na vida burguesa cotidiana; e,20 mesmo tempo, devem se manifestar como caracteris- 210 © Gyorgy Luxacs ticas individuais de um individuo concreto. O caréter contraditério da sociedade capitalista se manifesta por toda parte ea humilhacao e depravacéo do homem impregnam toda a vida na sociedade burguesa, tanto subjetiva quanto objetivamente; por isso, quem vive uma expe- rigncia apaixonada e profunda até o fim torna-se inevitavelmente objeto destas contradigées, um rebelde (mais ou menos consciente) que se poe contra a aco despersonalizadora do automatismo da vida ‘burguesa. Em um de seus prefécios, Balzac observa que os seus le res nio Compreenderam de modo alguma seu personagem pat Goriot se nele viram apenas resignacéo: Goriot, ingénuo e ignorante, €a seu modo tdo rebelde quanto Vautrin, Balzac capta aqui perfeitamente 0 ponto em que, mediante o pathos, podem nascer uma situagao € uma agdo épicas também no romance moderno. Nas figuras de Goriot € ‘Vautrin (bem como nas da Marquesa de Beauséant e de Rastignac), encarna-se efetivamente um certo pathos: cada urna destas figuras € elevada a um nfvel de paixio tio alto qué nelas se manifesta o conflito interno de um momento essencial da sociedade burguesa;"e, 20 mesmo tempo, cada uma delas se encontra num estado de revolta subjetivamente justificada, mesmo se nem sempre consciente, repre- sentando assim em suas proprias pessoas um momento singular da contradigao social. E somente gracas a isso que tais figuras se encon- tram numa relacao reciproca viva: as grandes contradides da socieda- de burguesa adquirem nelas uma forma concreta, como se tais con- tradigdes fossem problemas que elas vivern individualmente. Esta composigo do romance, que salva a invengo poé da destruigdo provocada pelo deserto prosaico da vida c burguesa, ndo é de modo algum uma particularidade individual de Belzac: O procedimento pelo qual Stendhal e Tolstoi poem em contato, respectivamente, Julien Sorel (jacobino retardatério) Mathilde de la Mole (aristocrata monarquista e romantica), ou 0 principe Nekludov e Kétia Maslova,!* fazendo nascer uma a¢ao épi a, este procedimento esté fundado no mesmo principio, ainda que comas diferencas dos métodos criativos de ambos em relacéo a outras questdes. A unidade entre o individual eo tipico s6 pode se mani- festar claramente na aco. Como diz Hegel, a agdo “€ a mais dara manifestagdo-doindividuo, de sua disposicio de espirito e de seus (© ROMANCE COMO EFOPEIA BURGUESA @ 21] objetivos; somente em sua ago torna-se realidade o que o homem é no mais profundo do seu ser”. E esta aco — esta real unidade entre o homem ¢ o “destino”, « unidade entre o homem ¢ a forma de mani- festagao das contradicdes que determinam o seu destino - € 0 que lhe confere a nova forma mediata e indireta do pathos antigo. O perso= sagem & tipico nfo porque € a média estatistica das propriedades individuais de um certo estrato de pessoas, mas porque nele ~em seu carter ¢ em seu destino ~ manifestam-se as caracteristicas objetivas, historicamente tipicas de sua classe; e tais caracteristicas se expres- sam, a0 mesmo tempo, como forgas objetivas e como seu préprio destino individual. ‘A justa compreensio desta unidade determina a fecundidade dos motivos épicos, sua capacidade de servir como base para desen- volvimento de uma ampla agZo na qual se manifeste a totalidade de um mundo. Quanto maior for a concretude com a qual o pathos de uma figura artistica individual se vale com a contradicao social que determina intimamente o seit destino, tanto mais a composigao do romance se aproxima da infinitude épica dos antigos. A Estética de Hegel apresenita & grande arte épica — e, portanto, também ao romance — uma exigéncia juste, ou seja, a figuragao de uma “totalidade dos objetos”. Isso significa néo somente figurar as relagdes reciprocas entre os homens, mas também as coisas, as instituicoes etc., que mediatizam estas relacbes dos homens entre si e com a natureza. A exigencia de totalidade significa que a escolha destes objetos nao deve ser arbitréria. Mas isso nao significa de modo algum a falsa exausti- vidade “enciclopédica” de Zola e de muitos escritores de sue escola, ja ‘que estes “objetos” s6 ganham significasao na medida em que media- tizam relagdes sociais e humanas, ou seja, para usarmos uma lingua- gem técnica, na medida em que sio momentos da aco romanesca. A “totalidade dos objetos’, portanto, nao ¢ uma justaposigao pedante de elementos isolados de um suposto “meio’, mas nasce — a partir de uma necessidade do proprio relato — da representacao de destinos humanos, na qual as determinagbes tipicas de um problema social se expressam com base em uma a¢ao. Como imagem da realidade social, do desenvolvimento da sociedade, a ago do romance é domi- nada pela necessidade. 212 © Gyorey Lukics dade média estatistica, ndo tem aqui quase nenhuma importancia, caso com soberana liberdade; aligacdo extrinseca entre as singulares ages em suas obras é extremamente frouxa. O Dom Quixote é formado por uma série de episddios singulares, ligados entre si somente por meio do pathos da figura do protagonista em seu contraste com Sancho Panga e com a realidade prosaica. Apesar disso, tem-se aqui a unidade da acdo no grande estilo épico, jé que os personagens do romance revelam sua esséncia de modo sempre con- creto, agindo em situacdes concretas. Nos romancistas modernos, a0 contrétio, ainda que feitas com habilidade, as construgbes sdo vazias, © desconexas no sentido épico, jé que as oposigdes, mesmo quando bem observadas, permanecem apenas como oposigées entre perso- nagens e concepg6es e no podem se expressar em acdes. Poderia parecer que o novo pathos como base da composicio romanesca distinga esta composi¢do da epopeia ¢ @ aproxime do drama. O pathos social antigo, que se manifesta de modo imediato, encontra efetivamente na tragédia sua expressio mais adequada ¢ pura. Ao contrério, o novo “pathos da vida privada’, que sofre miltiplas mediagoes, s6 pode se manifestar na a¢do quando sio figurados todos os elos de mediacéo sob a forma de pessoas concretas ¢ de situagdes concretas; este pathos, portanto, destr6i a forma do drama, O caréter dramético da composicio de alguns romances de Balzac (¢ também de Dostoievski) no contradiz esta afirmagao; com no se pode imaginar um drama que contenha uma riqueza de detalhes mediadores tdo ramificada como aquela que tem lugar no romance. A debilidade artistica dos dramas de grandes romancistas (Balzac, Tolstoi) nao € de modo algum casual. Tampouco é casual 0 fato de que a multiplicidade dos personagens contraditérios da vida burguesa tenha encontrado sua expressio adequada em toda uma série de grandes romances, a0 passo que as tentativas de simplificar ¢ abreviar esta multiplicidade, submetendo-a a totalidade intensiva do drama, levaram a um fracasso quase generalizado. © ROMANCE COMO BPOPEIA BURGUESA © 213 4.0 nascimento do romance Do ponto de vista do contetido; 0 romance moderno nasceu da luta ideolégica da burguesia contra o feudalismoy Mas a nitida- igo & concepsa0 medieval do mundo, que se manifesta na {otalidade dos primeiros romances, néo os impediu de recolher @ heranca da arte narrativa medieval, Esta heranca esté longe de se esgotar nos enredos aventureiros ec, qué 0 ovo romance retoma em forma satirico-popular ou ideologicamente reelaborada. O novo romarice recolhe da narrativa medieval a liberdade e a heterogenei- dade da composicao de conjunto; a sua dispersio numa série de aventuras singulares ligadas entre si somente pela personalidade do protagonista principal; a relativa autonomia destas aventuras, cada ‘uma das quais se apresenta como uma novela acabada; a amplitude \ do mundo representado, Decerto, todos estes elementos so radi- ‘almente reelaborados, tanto do ponto de vista do conteiido quanto daquele-da forma, € no somente nos casos em que sdo tratados 20 modo da parodia @ da sétira- Comecam a penetrar-na:composicéo romanesca, com intensidade cada vez maior, elementos plebeus. Heine tem razao quando considera que este momento € decisivo: ervantes criou o romance moderno quando introduziu no >| romance de cavalaria a figuracéo fiel das classes subalternas e da vida popular”, Mas 0 novo material, cuja apropriagdo artistica levou a criacgio da nova forma romanesca, nao nasceu apenas desta renovacéo de- mocrética da temética de aventuras da velha narrativa, ora apro- ximada vida real: € agora a prosa da vida que, ao mesmo tempo, ingressa no romance moderno, Cervantes ¢ Rabelais, criadores do romance moderno, refletem em suas obras este importantissimo fato, ainda que dele extraiam conclusdes diferentes: Tanto a aristo- -cracia de Cervantes quanto o burguts de Rabelais se rebelam, porum .do, contra a degradacao do homem na moribunda sociedade feu= “g; por outro, contra a sua degradacio na nascente sociedade bburguesa, embora cada um deles veja a seu modo o caminho para superar esta dupla degradacdo. A unidade do si i € do comico na imagens de Dom Quixote — uma unidade que jamais voltou a ser alcancada ~é determinada precisamente pelo fato de que Cervantes, 214 @ Gyorcr Luxics ao criar este personagem, luta de modo genial contra as caracteristicas principais de duas épocas, uma das quais est substituindo a outra: ou seja, a0 mesmo tempo, contra o herofsmo da cavalaria medieval, cada vex mais destituido de sentido, e contra a baixeza prosaica da socie- dade burguesa, que se manifestava claramente desde seus inicios. Esta espécie de “luta em duas frentes” contém em si o segredo da inigualdvel grandeza €, se assim pudermos nos expressar, do realismo fantistico deste primeiro grande romance. A Idade Média, esta “democracia da n&o-liberdade’,* fornece aos escritores, pr samente no perfodo de sua dissolucdo, ume temtica de homens ede situagées extremaniente rica ¢ variada. Neste periods; @ autonomia € 2 atividade esponténea do homem podem ainda se manifestar de modo relativamente livre (Hegel considera este periodo uma espécie de retorno a0 antigo heroismo e explica corretamente a grandeza de Shakespeare com as possibilidades que o periodo Ihe oferecia). A pprosa da vida burguese ndo era nesta época mais do que uma sombra que incidia sobre a ampla variedade da vida em movimento, uma vida plena de maravilhoses colisoes e aventuras; a limitagao da vida individual, a mutilagdo do homem pela diviséo capitalista do traba- Iho nao eram ainda, na época do Renascimento, um fato social dominante. Mas esta luta simultinea contra o feudalismo e contra a jé anunciada degradagdo burguesa fornece 20 artista muito mais do que uum rico material para a criagdo. O mundo multicolorido das formas medievais de vida continua a ser um material rico mesmo quando %e— combate com 0 méximo-vigor 0 sew contettdo social; © 4 nascente sociedade burguesa, com sua nova ideologia, std ainda marcada pelo ppaithos da liberagio do homem em face da mortficacso feudal, da servidio social e ideolégica, da mediocridade ¢ da mesquinhez econémica & politica da Idade-Média-Para Rabelais, a inscri¢io fa porta principal da abadia de Théleme ~“faca o que bem quiser”—tem ainda 0 pathos legitimo e entusiasmante da libertacio da humani- dade. Este pathos nao perde seu valor, nem mesmo aos olhos do leitor contemporineo, pelo fato de que o apelo a “fazer o que se quer” deveria inevitavelmente degenerar em seguida no hipécrita “lisser aire, lasser passer” da covarde eabjeta burguesia liberal. Na utopia de (© ROMANCE COMO EPOPEIA BURGUESA @ 215 Rabelais, ainda ecoa o pathos da luta contra toda mutilagio do desenvolvimento livre ¢ integral do homem, o pathos que inspirou mais tarde a luta heroica dos jacobinos e levou a brilhante critica do capitalismo feita pelos socialistas ut6picos, em particular por Fourier. Portanto, também a luta de Rabelais contra a prosa da nova vida burguesa nao é uma revolta pequeno-burguesa contra os “lados maus” da civilizagdo (como, mais tarde, o seria nos adversérios r0- minticos do capitaliimo). A utopia do “estado médio’, da recon: liagdo dos adversérios em lut, conserva-se naturalmente como uma utopia também em Cervantes e em Rabelais; mas, por vir artistica- mente figurada, ela nao requer uma rentincia a representagao das forcas antagbnicas em toda a sua oposicéo. Este ponto de vista permite que o romance em seu nascimento assuma, em relagio & questo do “her6i positivo”, uma posigdo intei- ramente diversa daquela que seré possfvel mais tarde. A esséncia das classes dominantes na sociedade burguesa nao permite que um grande e honesto escritor encontre neste ambiente um “her6i-posi- tivo", Masyn0-perfodo de nascimento do romance burgues, uma disposigio das oposicbes socizis, das velhias e niovas fornias de Sujeigio da liberdade ¢ da atividade espontinea dos homens, permitia ao romancista incluir na figuragao do seu her6i, apesar de das as observacbes Salricas € Irdnicas, os tragos de uma auténtica itividade’, No desenvolvimentoulterior-do-romance, toda “po- sitividade” do her6i é destruida pela critica, pela ironia e pela sétira, com tanto maior intensidade quanto mais o crescente dominio da Dburguesia leva a uma regresséo da individualidade e a formacio de “homens com estreita mentalidade burguesa” (Engels)/Quanto mais ‘0 Tormance-S€ transforma numa figuracdo da sociedade burguesa, numa critica € autocritica criativa desta sociedade, tanto mais clara~ mente se manifesta nele o desespero suscitado no artista pelas con- stradigbes, para ele insoliveis, de sua propria sociedade (Swift compa- rado a Rabélais e Cervantes) ‘As particularidades do Renascimento geram também o estil0> ‘riginal do romance em sua fase inicial: 0 realismo fantéstico-Os grandes principios ideol6gicos e sociais da época sao apreendidos € représentados pelo romancista de modo realista;realistas si0 os tipos 216 © Gyorcy Lukses L7G é . (© ROMANCE COMO EFOPEIA BURGUESA © 217 figurados, os quais, por meio daheterogénea variedade das averitutas, = 5. A conquista da realidade c sio levados pelo artista a auténticas acées, a uma verdadeira ‘A visdo amarga e preciso dos detalhes necessérios em sua burguesié qiiase dnica no século XVI também é tnicea sua forma sgrande¥ forcas sociais, cuja lata se manifesta sitirico-fantéstica, que se situa fora da corrente principal do desenvol-—~ historia narrada é conscientemente nao realista e, oe Yonrance THO maior pals capi Inglaterra, bem.co- elemento fantastico niasce neste caso, por um lado, da visa tépica das grandes forcas da época, ¢, por outro, da comparagao satirica do ivels ¢ quadros menos ” da sociedade burguesa nascen- te, em Seu perfodo de acumulagao primitiva, Nas obras de Defoe e de \—Seguids, cite Inatca ANG RanaTUIE EH a pada de rominton- pes Lesage, de Fielding e de Smollett, de Rest e de Laclos, e mesmo de con a S [Richardson e Marivaity, ainda que sob forma diverse em cada um de- no se trata de um desesperado combate de retaguarda contraa prosa ; Sete, sciatic onmceaig oot poderia fornecer um material mais do que suliciente para jus Snails revolulondrs da nova socidade em gestagio/E ext fants o pessiminme de Swift Mas o fom fundamental defo a guasto tico nao se contrapde 20 Fealismio e nao constitui algo contrério, nem sequiet do ponto de vista artistco, a0 realismo geral da compasicaos ao contrério, funde-s 7 ‘com ele niin toc ico: tem sua fonte na seus a ra. Walter Scot diz —~, dade de aprender e figurar de modo jus iticas vert las dé Lesage: “Este livro deixa no leitor um sentimento de sa- deiramente decisivas de sua époce, em lever em conta a veross tisfacdo consigo mesmo e com o mundo”. E também o Moll Flanders , acompanhada 20 mesmo tempo riod, # coricluem com um final feliz, Bortanto, os escritores tém pela apropriacao de sua heranga tematica e formal, torna possivel a uma atitiide positiva ei face de sua prépria época ¢ de sua propria classe, que estava realizando uma grande transformacdo hist6rice, ‘May @sta auttoafirmaczo da burguesia vem ao lado de uma grande dalisino num perfodo mais tardio puderam ainda, embora de forma toe ‘todas as abominagées da acu- atenuiada, prosseguir na linha deste realismo fantastico (os romances ‘mulacio primitiva na Inglaterra, bem como a desagregacao morale o de Voltaire)..As viagens de Gulliver, de Swit, sto uma transigéo origi- arbitrio do absolutismio na Franca, sio desmascarados através de im- ‘nal entre o tipo rabelaisiano de realismo ¢ aquele que seria proprio piedosas imagens realistasAlids, pode-se dizer que, com a figuracdo” ~~ de Defoe; do ponto de vista formal, hé uma continuidade coma linha desta 16H do ps i surge o romance r. de Rabelais, mas 0 caréter puramente 4 pela primeira vez, a realidade abre uma nova fase no desenvolvimento do romance. ( ree : © romatice abandona’o vasto campo do fantastico ¢ se volta decsvamente pare a iguraeas da id privada do burgués £ neste petfodo que se manifesta, em toda.a sua clareza, a tent 218 @ Gyoncy Loxscs de se tornar o historiador da vida privada, Os amplos horizontes histéricos do romance em seus inicios se restringem; o mundo do romance & limita cada vez mais ¥ Yealidade-cotidiana da vida burguesa ¢ as grandes contradigdes motrizes do desenvolvimento hhistorico-social sdo figuradas apenas na medida em que se manifes- tam’ dé modo concreto e ativo nesta realidade cotidiane. Mas estes covitradiqoes eoiitintanra ser figuradas, E 6 tealismo da vide cotidia- a a vitoria da poesia sobre esta realidade prosaica, tudo isso ndo passa de um meio pata a figuragio concreta e viva dos grandes contlitos sociais da épo- ca. Portanto, este realismo esté muito longe de ser uma simples €5pia~ da realidade cotidiana, uma simples reprodugdo de seus tragos exte- riotes, a0 contrério do que era frequentemente exigido pela estética~ oficial da época. Com dara conscitacia, os romiandistas tendem a uma Siguragdo realista do tipico, 2 um realismo para o qual a cuida- dosa figuracao dos detalhes nao é mais do que um meio, Fielding diz claramente que o retrato de pessoas vivas, mesmo que plenamente bem realizado em sentido artistico, nao tem nenhuum valor se as pes- s028 figuradas no sao tipos. Ele cit ironicamente o exemplo de um seu conhecido que fizera fortuna sem recorrer a fraudes e trapacas, decerto, diz Fielding, este homem existe na realidade, mas no pode se tornar o her6i de um romance. O principio do t{pico, porém, que esté na base d6 grande realismo, nao s¢ fnanifesta'apenas neste escola negativa. Fielding continua: Embora todo'bom autor deva se manter nos limites da verossimilhanga, no é absolutamente necessirio que seus personagens © suas petipécias scjam cotiianas, ordinérias cou valgares, como as gue tém lugar em qualquer ra ¢ ‘qualquer cata ou podem ser encontradas nos aborrecidos artigos dos jornais. Estes escritores triunfam contra a prosa cada vez mai da vida por meio da forga, da energia e da espontaneidade de seus herdis tipicos. Os grandes realstas desta época veem até que ponto 0 homiéi se tornou um joguete das forcas econdmico-sociais ¢ em que escassa medida a sua vontade ¢ as regras morais influem em seu destino, Apesar disso, 0 cardter poético de Gil Blas, de Tom Jones e de © ROMANCE COMO EROPELA BURGUESA # 219 Moll Flanders nasce de sua enérgica atividade de representantes “tépicos de ume classe em ascensio:’@ sua vida, cujos eventos e proces- ‘sos sao determinados por estas forgas econdmico-sociais, sofre virios abalos, mas, apesar de tudo, eles chegam com éxito outra margem do rio. Coma sociedade tnasce a dominacio da natureza pelo hose; mas, no inicio, por mai terrivel que seja Sua manifesta- s0'voncreta, as forgas socicis ainda nao atingiram aquele ponto de abiolita alienacao do pensamento e da vontade do homem, que seria © traco’proprio da Sociedade capitalista jé consolidada e funcionando de modo ‘atitomitico. Byron define 3 como “o Homero em ;prosé da natureza humana’, Por razdes sobre as quais voltarei em | seguida, este juizo ¢ exageradlo, Mas no hi diivida de que, nas melho- es partes dos maiores romances desta época, hd uma especie de aproxima¢ao a antiga epopéig’ Assim, por exemplo, a luta do homem coma natutéza, enquaitto simbolo do nascente dominio da natureza péla sociedade, é figurada na primeira parte do Robinsom Crusoé de Defoe com uma forga épica incompardvel, aproximando-se ef (anente, algumas vezes, da poesia das coisas préprias da epopeia antiga. Esta poesia se manifesta em numerosos e importantes romances des- te perfodo, Trata-se do reflex literério, da configuragao épica do car4- ter progressisia da liberacao das forgas produtivas pel dinda a ser aqui o fator predomi horrores produzidos pelo desenvolvimento cay issous Contradiybes sejam apologeticamente encobertas; disso resulta sua peculiar poesia, que se manifesta igualmente, ainda que de modo ‘menos perceptivel e claro, nos demais romances deste periodo.. Este empenho realistas tem em si um certo trago de “mediagao” en ‘contradigoes da épocee, sem duivida, hes atribui _Srandes romancistas do primeiro periodo jé se manifesta muito clara; Cgnente na questio do carater positive do her6i- Este caminlio descent vena deve -algum ser atribuidoa escritores, mas tem sua explicagao no crescente avango do capitalis—

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