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RESUMO
Não existem dúvidas que o direito de greve perpassou por um longo processo histórico, ora
negado, ora aceito ou somente tolerado, até ser reconhecido como direito fundamental dos
trabalhadores, inclusive com sua firmação em diversas constituições ao longo do mundo.
Todavia este sempre fora recheado de controvérsias e longos embates entre os patronos e
subordinados, discutindo-se, então, até onde tal direito poderia interferir nas relações
trabalhistas e suas consequências, positivas ou negativas, perante a sociedade. Contudo, no
Brasil - com bastante influência de outras legislações, embora trate o tema de forma bem
peculiar - existem algumas categorias de empregados cujo direito em foco encontra-se
proibido, a exemplo das Forças Armadas, ou limitado e condicionado como no caso dos
servidores ou empregados públicos. Neste sentido, observa-se que por força da omissão
normativa do poder público, em relação àqueles últimos, ou por reconhecimento de algumas
atividades como essenciais para a sociedade, quando exercidas por qualquer categoria, ainda
resistem divergências doutrinárias e jurisprudenciais sobre a possibilidade de se exercer
plenamente, ou com restrições, este direito, quando não completamente cerceado, levando,
inclusive, certos movimentos grevistas à ilegalidade sob argumentos pautados no maior
interesse da coletividade. Perante este cenário o presente trabalho se propõe a fazer uma breve
análise sobre o direito de greve vigente no Brasil, levando em consideração principalmente os
aspectos pertinentes à sua ilegalidade e o envolvimento das atividades essenciais, com foco
especial no funcionalismo público, destacando até onde aquele pode ser exercido por estes,
em contra ponto aos interesses do Estado e as consequências para a sociedade. Por fim, vale
ressaltar que este estudo possui a forma de uma pesquisa bibliográfica, com a doutrina, a
jurisprudência e a legislação pátria e comparada como principais fontes. Não obstante o
interesse em trazer novos questionamentos sobre tema, além de um olhar crítico, não tem, este
texto, a pretensão de esgotá-lo.
1 Graduado em Sistemas de Informação pela UNIT, Universidade Tiradentes, 2005, Aracaju / SE.
Rua Isaias Amâncio de Jesus, 110, Condomínio Jardim Primavera, Bloco D, Apto 301, Luzia. E-mail:
lugusth@gmail.com
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1 INTRODUÇÃO
a arbitrariedade nas relações trabalhistas - outrora reconhecida, a greve, como uma espécie de
autotutela, hodiernamente como uma garantia fundamental - quando alguém detinha o poder
econômico e impunha ao empregado uma evidente disparidade de forças. Contudo se percebe
esta diferença mais proeminente quando se trata de relação Estado / empregado, pois o
primeiro possui todo um aparato financeiro, administrativo e político, como também não é
passível de falência, podendo suportar longos períodos de negociações e pressionar os
trabalhadores a retornarem para suas atividades, já que estes não suportam vários meses sem
seus rendimentos.
Todavia não se deve vislumbrar a Greve como uma queda de braços, ao contrário,
é preciso reconhecê-la como um equilíbrio de forças para realmente se atingir o objetivo do
bem comum. Neste sentido explana Granzotto (2008, p. 01):
2 CONCEITO DE GREVE
uma paralisação coletiva provisória, parcial ou total, das atividades dos trabalhadores
em face de seus empregadores ou tomadores de serviços, com o objetivo de exercer-
lhes pressão, visando a defesa ou conquista de interesses coletivos, ou com objetivos
sociais mais amplos.
Ou ainda que
no entanto tal lei não foi editada até o presente momento. Ao terceiro grupo não foi
reconhecido o direito de greve, sendo expressamente vedado no artigo 142, §3º, IV. Por fim,
o quarto grupo na prática também tem seu direito de greve vedado, em analogia aos militares
das Forças Armadas, contudo existe um longo confronto doutrinário em relação a estes dois
últimos grupos, pois alguns juristas entendem que este último tem relação com o terceiro,
enquanto outros entendem que o mesmo pertence à categoria de trabalhadores da
Administração pública direta. Todavia esta divergência não é foco deste estudo,
possivelmente apreciada em algum momento oportuno.
A primeira lei que regulamenta este assunto promulgada no Brasil pós
constituição de 1988 foi a Lei 7.783, de 28 de junho de 1989, já trazendo em seu artigo 1º a
mesma redação do artigo 9º da Constituição, mas estabelecendo de logo sua obrigatoriedade
no parágrafo único do mesmo artigo, “O direito de greve será exercido na forma estabelecida
nesta Lei”. Entretanto, este comando legal atinge uma categoria geral de trabalhadores, não se
encontrando neste grupo, em tese, os militares e aqueles pertencentes à Administração
Pública, quando podemos observar que
de fato, a ordem jurídica evoluiu, no que tange à greve, da atitude autoritária, própria
do contexto político-econômico em que instituída, para a concepção mais
compatível com o Estado Democrático de Direito. O art. 9º da Constituição Federal,
reproduzido no art. 1º da Lei de Greve, bem demonstra a evolução realizada: É
assegurado o direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a
oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devem por meio dele
defender.(TST-RODC-45000-53.2006.5.05.0000).
os básicos como fornecimento de luz e água, que, em tese, não podem parar. Desta feita,
constitucionalmente não se deve falar em proibição e sim de uma permissão condicionada
que, enquanto não houver a lei específica saneadora, cabe aos órgãos competentes dirimirem
os conflitos coletivos observando as peculiaridades de cada caso. Para Süssekind (2002, p.
53) a lei a que alude o art. 37, VII, da Constituição, poderá estabelecer limites; nunca, porém,
negar o direito, o qual, por conseguinte, já existe. Dentro ainda deste raciocínio é possível
descordar do entendimento jurisprudencial que menciona o direito dos servidores públicos
sem auto-aplicabilidade, pois nada impede que os movimentos grevistas no funcionalismo
público sejam efetivamente decretados, logo não existe proibição e, em tese, também não
existem os limites, condições e procedimentos que seriam elucidados na lei especifica
inexistente. Portanto é possível afirmar que este direito é aplicável de plano, pois a própria
constituição expressa que os trabalhadores decidam sobre a oportunidade de exercê-lo e
sobre os interesses que devam por meio dele defender, em seu artigo 9º - sendo esta parte da
norma extensível a qualquer categoria - como também, interpretando sistematicamente esta
Carta, não se pode deixar de lado diversos outros princípios pertinentes ao trabalhador, à
sociedade e ao próprio Estado, formando um conjunto de valores que devem ser balanceados,
tendo em vista certa relativização do texto constitucional para fins de evitar distorções a
exemplo de existirem trabalhadores realmente mal remunerados e sem as devidas condições
laborais atuando em atividades proibidas de exercerem greve, logo, como ficaria a situação
destes se a norma for interpretada ao pé da letra, continuariam nestas péssimas condições ou
mudariam de profissão? Visto que a rotatividade de trabalhadores já seria uma situação
tecnicamente ruim para a continuidade das atividades essenciais. Ademais, em um Estado
Democrático de Direito, a própria decretação de ilegalidade da greve não impede que os
trabalhadores iniciem movimentos paredistas na prática, a exemplo dos policiais militares e
bombeiros que, proibidos de fazer greve, proferiram diversos movimentos em todo o Brasil,
cominando na formação de uma proposta de emenda constitucional, a PEC 300, visando
equiparação salarial, plano de carreira, dentre outras reivindicações.
Assim, na intenção de resolver toda esta discussão doutrinária e jurisprudencial
sobre o direito de greve dos servidores públicos e havendo reconhecimento que aquele é sim
patrimônio dos servidores, contudo não absoluto, como bem afirmou o ministro do STF Eros
Grau (Mandado de Injunção nº 712 – STF), que elucidou sobre uma real necessidade de se
interpretar a Constituição Federal a luz de sua totalidade, sistematicamente, ou seja, não
somente por dispositivos independentes ou de forma estritamente legalista, o Supremo
Tribunal Federal saneou a questão através do julgamento de três mandados de injunção
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Entretanto, é relevante destacar que por não mais se tratar de lei complementar,
cuja finalidade é justamente “complementar” o texto constitucional, e para sua elaboração é
exigido quorum de maioria absoluta, por exclusão, entende-se que a lei específica definida na
vigente redação do artigo 37, VII da Carta Maior é ordinária, logo passível de ser suprida
utilizando-se do instituto da analogia, como uma forma de solucionar a lacuna presente no
comando constitucional há pouco citado. Neste sentido bem entende Kosteski (2004, p. 01):
Diante do atual texto constitucional, parece-nos que, enquanto não for editada a
referida lei específica para regular o exercício do direito de greve do servidor
público, mostra-se perfeitamente aplicável, por analogia, a atual Lei (específica) de
Greve (Lei 7.783/89). Claro que não se trata, obviamente, de lei ordinária
reguladora, especificamente, da greve dos servidores públicos, mas de empregados
regidos por contrato de trabalho. Os limites do direito de greve, e até mesmo sua
proibição, em certos casos, para algumas categorias específicas de empregados ou
de funcionários públicos, justifica-se não em razão do status do trabalhador, mas em
decorrência da natureza dos serviços prestados, que são públicas, essenciais,
inadiáveis, imantados pelo princípio da predominância do interesse geral e da
continuidade do serviço público.
Portanto, até que a lei especifica seja editada, no cenário atual não restam dúvidas
que a lei de greve deve ser aplicada para os servidores públicos da administração direta e
indireta, além dos já originais destinatários dela, não excetuado a necessidade de o julgador
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mero formalismo um direito fundamental, como bem entende o ministro relator Márcio
Eurico Vitral Amaro, acórdão TST-RODC-45000-53.2006.5.05.0000:
4 ATIVIDADES ESSENCIAIS
3 Comitê de Liberdade Sindical da OIT - analisa queixas formais sobre a aplicação da Convenção 87 sobre a
liberdade sindical e a proteção do direito à sindicalização e da Convenção 98 sobre o direito de sindicalização
e de negociação coletiva (OIT Brasil).
4 Organização Internacional do Trabalho (OIT) - única das Agências do Sistema das Nações Unidas que tem
estrutura tripartite, na qual os representantes dos empregadores e dos trabalhadores têm os mesmos direitos
que os do governo (OIT Brasil).
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Quanto aos serviços essenciais, pode-se dizer que estes são aqueles de vital
importância para a sociedade, pois afetam diretamente a saúde, a liberdade ou a vida
da população, tendo em vista a natureza dos interesses a cuja satisfação a prestação
se endereça. Há aqueles serviços que pela sua própria natureza são ditos essenciais,
que são os serviços de segurança nacional, segurança pública e os judiciários.
Somente o Estado poderá prestá-los diretamente. São portanto, indelegáveis. Mas há
outros serviços que o legislador previamente considera essenciais, embora não
precisem ser prestados diretamente pelo Estado. Estes se encontram na Lei n°
7.783/1989 - Lei de Greve, que define no seu art. 10 os serviços ou atividades
essenciais e regulamenta o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade.
Assim, identifica-se no citado diploma legal como serviços públicos essenciais que
podem ser prestados diretamente ou indiretamente pela Administração Pública, ou
através de concessão ou permissão, entre outros, os serviços de tratamento e
abastecimento de água, produção e distribuição de energia elétrica, gás,
combustíveis, transporte coletivo e telecomunicações.
É oportuno também expor o artigo 10º da mesma legislação, pois especifica uma
série de serviços ou atividades considerados essenciais, no entanto sem a pretensão de exaurir
ou taxar, logo se trata de um rol exemplificativo:
O ministro do Supremo Tribunal Federal, Dr. Eros Grau, em seu voto para o
mandado de injunção MI. Nº 712, do qual foi relator, defendeu que "serviços ou atividades
essenciais" e "necessidades inadiáveis da coletividade" não se superpõem a "serviços
públicos"; e vice versa, no entanto explana que ao exercício do direito de greve no âmbito da
Administração não deve ser aplicado tão-somente o disposto na Lei n. 7.783/89,
mencionando que é necessário assegurar a coerência entre o exercício do direito de greve
pelo servidor público e as condições necessárias à coesão e interdependência social, ás quais
a prestação continuada dos serviços públicos é imprescindível.
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5 CONCLUSÃO
exercidas pelos funcionários ou empregados públicos, até que a iniciativa privada adentrasse,
como observado no parágrafo anterior. Assim, muito se falou sobre o direito de greve daquela
categoria, perpassando este estudo sobre as questões da ausência de norma reguladora, auto
aplicabilidade, a não permissão de exercer a greve até que a norma específica fosse editada,
dentre outras barreiras que foram superadas quando se percebeu que estes trabalhadores não
poderiam ser prejudicados pela morosidade legislativa, quando, então, o STF saneou
temporariamente a questão com os votos sobre mandados de injunção propostos por
sindicatos representativos dos servidores em foco, como resultado se passou a adotar a mesma
lei de greve da iniciativa privada por analogia. Desta feita, em tese, o funcionalismo público
teve seu direito de greve formalizado desde que respeitasse parâmetros e procedimentos
daquela lei sob pena de ilegalidade. Todavia, dentre todos os parâmetros previstos na
legislação alguns especialmente protegem a continuidade das atividades e serviços essenciais,
sendo a atenção a estes o mais contundente daqueles parâmetros. Pode-se observar um grande
número de decisões, no sentido da ilegalidade dos movimentos, oriundas dos tribunais pelo
país hodiernamente. Esta contundência é justamente outro grande ponto de divergência entre
doutrinadores, juizes, tribunais e principalmente os servidores, pois, além da ausência de um
consenso, o rol de atividades previstas na lei de greve é exemplificativo (art. 10º), abrindo
espaço para que outros serviços, originalmente não essenciais, sejam entendidos como tal a
depender da situação fática ou do interesse “coletivo” camuflado pelo da Administração.
Assim, critica-se quando um movimento é julgado abusivo de plano sem analisar as
peculiaridades e motivos deste, enumerando sem maior aprofundamento atividades como
essenciais, prendendo-se a mero formalismo, com claro intuito de cercear este direito em pró
de interesses políticos, cantados como coletivos. Não resta dúvida que os trabalhadores
continuam sendo a parte desfavorecida nesta medição de força, ao passo de que a greve
continua não atingido seu real motivo de equalizar as negociações, provocando insatisfação
com a legislação, logo algumas categorias provocam movimentos, remetendo-se mais uma
vez a autotutela, como fizeram os militares e bombeiros em exemplo citado durante o texto,
não levando em consideração se seriam ilegais ou não, como a única forma de pleitear
direitos, ante as grandes disparidades remuneratórias do país. Desta feita não basta o fato de
certos trabalhadores atuarem em atividades essenciais para que seja decretada a ilegalidade,
deve o julgador analisar a situação como um todo, visando equilibrar direitos e princípios,
utilizando-se do bom som e da proporcionalidade.
Portanto é possível concluir que estes trabalhadores têm a permissão
constitucional de fazer greve, devem sim seguir a regulação vigente, mas é preciso reiterar a
necessidade de se analisar o fato ensejado antes de decretar a greve ilegal, cabendo ao
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ABSTRACT
There are no doubts that the Strike action has passed for a long historical process, sometimes
denied, sometimes accepted or only tolerated, until being recognized as basic right of the
workers, also with its consolidation in diverse constitutions throughout the world. However
that right always is full of controversies and very long strikes between the employers and
employees, arguing itself, then, until where such right could intervene at the working relations
and the results, positive or not, for the society. However, in Brazil - with sufficient influence
of other jurisdictions, even so it deals the subject with distinct way - some groups of
employees have that right in focus as forbidden, like the Armed Forces, or limited and
conditioned like the public service employee. In this direction, by the force of the normative
omission of the public power, in relation to those last ones, or by the recognition of some
activities as essentials for the society, even executed by any category, still resist doctrinal and
case law divergences about the possibility of the full exercise, or with restrictions, when not
completely curtailed, taking, also, certain strikers movements to the illegality under
arguments about the biggest interest of the collective. Front the actual scene the present study
considers to make a shot analysis about the effective right to strike action in Brazil, taking
consideration firstly the pertinent aspects of the illegality and the involvement of the essential
activities, with special focus in the public service employee, detaching until where that one
can be exercised by that group of employees, in against point to the State interests and the
results for the society. Finally, it's too important to stand out that this study has the
bibliographical research form, with the doctrine, the case law and the native and compared
legislation as main sources. However the interest in bringing new questionings about the
subject, and a critical look, does not have, this text, the pretension to deplete it.
REFERÊNCIAS
SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. 15º Edição. Local: Rio de Janeiro: Forense,
1999.
SADY, João José. A respeito da legalidade da greve política. julho de 2007. Disponível em:
< http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=10231>. Acesso em 11/05/2010.
OIT Brasil. Organização Internacional do Trabalho. Escritório no Brasil. Disponível em: <
http://www.oitbrasil.org.br/index.php>. Acesso em 20/05/2010.