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Filosofia do Direito

Hermenêutica Jurídica e Interpretação Jurídica

1 INTRODUÇÃO

Segundo Carlos Maximiliano, a Hermenêutica Jurídica “tem por objeto o estudo e a


sistematização dos processos aplicáveis para determinar o sentido1 e o alcance2 das expressões
do Direito”. É uma ciência que estabelece parâmetros e regras interpretativas para a definição
do conteúdo ou do comando normativo. A hermenêutica constitui um conjunto de regras e
princípios que delimitam um saber teórico.

Interpretação difere de hermenêutica. A interpretação refere-se à escolha dentre vários


significados da norma jurídica dentro de um conjunto plausível de possibilidades. É a arte de
interpretar. É uma tarefa eminentemente prática, realizada a partir da norma jurídica posta.
Entende-se, ainda, como a determinação do sentido e alcance das expressões jurídicas.

A integração jurídica, diferentemente da interpretação, objetiva preencher lacunas da


lei, por intermédio dos meios supletivos, tais como a analogia, princípios geral do direito,
costumes e equidade.

Pode-se afirmar que do processo interpretativo conclui-se, eventualmente, que há


determinada lacuna no texto legal e, por intermédio da integração, preenche-se o vazio
normativo.

A interpretação jurídica envolve um ato de concretização da norma. Dito de outra forma,


aplicar é tomar a norma abstrata e adequá-la ao caso concreto, ou seja, utilizá-la para pacificar
um conflito social (Poder Judiciário) ou para a execução de um determinado mandamento
legislativo (Poder Executivo). Assim, para aplicar a norma ao caso concreto, seja pelo
magistrado, seja pelo administrador, é necessário interpretar a norma. A aplicação pressupõe
um processo interpretativo para verificar se determinada norma amolda-se ao pretendido. O
conteúdo da aplicação da norma é decisão do magistrado ou do administrador diante da norma
posta.

1
Finalidade.
2
Âmbito de incidência.
A expressão “hermenêutica” deriva do nome de um deus grego: Hermes, o deus capaz
de traduzir a língua dos deuses para a língua dos mortais e vice-versa. Por isso, entre os gregos,
a figura de Hermes era associada à imagem de uma porta, da porta de casa.

“Pois a porta é o lugar de fronteira entre a casa e a rua, entre o espaço público e o espaço
privado, entre a família e a sociedade, entre o sangue e a política, enfim, entre o dentro e o
fora”3.

Logo, interpretar não é, apenas, aquilo que o intérprete diz a partir de sua própria
circunstância de vida, pois, nesse caso, interpretar seria dar uma opinião. Nem tampouco é,
apenas, esclarecer o significado de algo a partir das circunstâncias externas (políticas,
econômicas, ideológicas etc.) nas quais o intérprete se vê emaranhado, pois, nesse caso,
interpretar implicaria em castrar por completo a autonomia de vontade dele.

“Interpretar, portanto, é colocar na fronteira que separa/une a nossa subjetividade da


objetividade da coisa a ser interpretada. Nesse sentido, interpretar é uma arte”4.

Eis o problema da interpretação: ela se encontra em uma zona de tensão, em uma


fronteira entre duas línguas.

Uma fronteira que separa, mas que também une essas duas línguas. Cabe agora, então,
enfrentar o problema da interpretação.

2 O PROBLEMA DA INTERPRETAÇÃO

O problema da interpretação, e com a interpretação jurídica isto não é diferente, é que


ela convive com dois usos de linguagem: onomasiológico (uso corrente ou não técnico) e
semasiológico (uso técnico). No uso onomasiológico, emprega-se o significante corrente no
sentido comum, ou seja, no sentido compartilhado pelos usuários da linguagem cotidiana. Por
sua vez, no uso semasiológico, utiliza-se ou um significante técnico, pertencente a certo
dicionário especializado, ou um significante corriqueiro que foi redefinido, ou seja, um signo
trivial com significado específico.

Os usos onomasiológico e semasiológico podem coincidir, mas nem sempre isto ocorre.
Ou seja, uma mesma palavra pode ser empregada da mesma maneira pelos dois diferentes usos

3
SOUZA, Elton Luiz Leite de. Filosofia do direito, ética e justiça: filosofia contemporânea. Porto Alegre: Núria
Fabris, 2007, p. 234.
4
SOUZA, Ob. cit., p. 235.

2
que se pode fazer da linguagem. A partir desta circunstância fica claro que estes usos não se
encontram completamente separados, antes se implicam.

Isto é, o uso técnico da linguagem toma como ponto de partida o uso cotidiano. E esta
relação entre os usos da linguagem acarreta a possibilidade sempre presente de dúvida quanto
ao significado deste ou daquele vocábulo empregado pela norma jurídica.

Disto decorre, o problema da Hermenêutica Jurídica. O problema de superar a


possibilidade sempre presente de dúvida quanto ao significado da norma jurídica. Sendo assim,
para que serve a hermenêutica?

3 FINALIDADE DA HERMENÊUTICA

A hermenêutica se presta, assim, a que finalidade? A esclarecer o significado de um


signo. Mas se a hermenêutica se presta a tanto, surge, então, uma nova pergunta: o significado
do signo é descoberto ou determinado?

Se se admitir que ele seja descoberto, então, conclui-se que a hermenêutica não constrói
o significado do signo, antes o declara. Porém, se o ponto de partida adotado é que a
hermenêutica determina, positiva, impõe o significado ao significante, então, forçoso é
reconhecer que ela o constrói.

Pode-se falar, assim, em duas diferentes finalidades para hermenêutica, as quais, por sua
vez, correspondem a duas distintas concepções de linguagem, são elas: a) a descoberta do
significado, que corresponde à concepção substancialista ou idealista de linguagem; b) e a
construção do significado, a que se refere à perspectiva convencionalista da linguagem.

Uma concepção substancialista imagina que a linguagem representa a realidade ou o


pensamento. A seguir, no momento oportuno, se verá como isso se apresenta no campo
específico da hermenêutica jurídica. Enquanto que uma concepção convencionalista pressupõe
que a linguagem é um acordo celebrado entre os usuários dela.

Usuários estes que teriam a capacidade limitada de manipular os significantes, os


significados e as relações entre eles.

Como se vê, quando se atribui à hermenêutica a finalidade de descoberta do sentido,


assume-se o risco de se sustentar uma concepção naturalista ou a-histórica de interpretação.

Isto porque, se a hermenêutica serve para investigar e descobrir o significado escondido


do signo, em maior ou menor medida, o que se admite é que ela tem capacidade de chegar ao
significado perfeito e completo do texto.

3
Ora, o que é perfeito, não precisa mudar, não deve mudar. Tem-se, então, uma
linguagem estática. Esse foi o intento de Justiniano no que toca ao seu Corpus Juris Civilis.

Todavia, quando se confere à hermenêutica o objetivo de construção do significado do


signo, o hermeneuta chama para si a tarefa de defender uma perspectiva normativista ou
histórica de interpretação. Afinal, se a hermenêutica serve para edificar ou construir
significados, imperioso é, então, admitir que ela não tenha a capacidade de chegar ao
significado perfeito e completo do texto.

O que é imperfeito, muda constantemente, em um ciclo que nunca chega ao fim. Eis,
então, que se tem uma linguagem dinâmica.

Uma vez compreendida as finalidades possíveis da hermenêutica, cabe agora a seguinte


pergunta: qual é a finalidade da hermenêutica jurídica?

A resposta a esta pergunta parte da seguinte pressuposição: a hermenêutica jurídica


apresenta aspectos que lhes são peculiares, não podendo, portanto, ser tratada da mesma forma
que as demais espécies de hermenêutica.

Em outros termos, se a hermenêutica é gênero, a hermenêutica jurídica é uma de suas


espécies. Não a única, é lógico. Mas, sim, uma delas. O que há, então, de específico na
hermenêutica jurídica?

4 HERMENÊUTICA JURÍDICA: A DISCUSSÃO

A depender da finalidade que se atribua à interpretação, se descreverá as peculiaridades


próprias da hermenêutica jurídica de diferentes modos. Dito de outro modo, não há uma só
concepção acerca do que venha a ser hermenêutica jurídica e de quais são as suas principais
características.

A doutrina é muito controversa acerca do tema. Por isso, com o intuito de apresentar
algumas abordagens em torno do assunto, a seguir se fará uma apertada exposição de algumas
concepções. A apresentação destas concepções não tem, é lógico, o intuito de exaurir as
correntes doutrinárias acerca da matéria. Pelo contrário, o objetivo é apenas exemplificar
algumas concepções e, a partir delas, evidenciar a discussão.

Sendo assim, inicialmente, se descreverá a polêmica que marcou o assunto no século


XIX. Feito isto, se apresentará o pensamento de Kelsen em torno da questão. A seguir, será
feita uma apertada síntese do raciocínio de Miguel Reale. Após o que, se explicará a lição de

4
Tercio Sampaio Ferraz Jr. O que se quer alcançar com estas exposições? Demonstrar erudição?
Não, definitivamente não.

O que se deseja é explicitar o óbvio: não existe a concepção correta de interpretação,


pois se a interpretação é a fronteira entre os usos de linguagem, é a zona de tensão entre o sujeito
que conhece (o intérprete) e o objeto que é conhecido (o texto, a lei, a norma, o contrato etc.),
então ela não é ponto de partida nem é ponto de chegada, mas a ponte entre duas margens.

4.1 Voluntas legis ou voluntas legislatoris?

“É hoje um postulado universal da ciência jurídica a tese de que não há norma sem
interpretação, ou seja, toda norma, pelo simples fato de ser posta, é passível de interpretação”.

Logo, a pretensão de Justiano de que fosse proibida a interpretação das normas de seu
Corpus Juris Civilis, em verdade, não é uma exceção ao postulado, mas, sim, a pretensão de
que apenas a interpretação do imperador fosse considerada vinculante.

É muito recente a consciência de que a hermenêutica jurídica não é um amontado de


técnicas de interpretação esparsas, mas, sim, um saber teórico. Essa conscientização científica
acerca hermenêutica só veio a ocorrer no início do século XIX. O certo é que a hermenêutica
jurídica é marcada, desde então, por uma profunda controvérsia entre duas concepções de
interpretação, são elas: a objetiva e a subjetiva.

A concepção objetiva é aquela que assinala que a interpretação se presta a descobrir a


vontade da lei, a voluntas legis, o que pressupõe uma linguagem capaz de representar o evento
real, a realidade do conflito. Por outro lado, a concepção subjetivista é aquela que sustenta que
a interpretação objetiva descobrir a vontade do legislador, ou seja, a voluntas legislatoris.

Parte-se, aqui, da pressuposição de que a linguagem representa o pensamento do


legislador.

Antes de avançar no assunto, é conveniente destacar o cuidado que se deve ter ao


empregar os termos, subjetiva e objetiva. Isto porque a doutrina oscila ao empregá-los.

Há quem compreenda como concepção objetiva aquela em que o intérprete deva se


manter vinculado estritamente ao texto de lei, não tendo qualquer margem de liberdade. Se
adotada esta definição para concepção objetiva, note-se que o significado da concepção, neste
segundo sentido, seria completamente diferente do mencionado anteriormente.

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O mesmo se pode dizer em torno da concepção subjetiva, vez que há quem entenda esta
concepção como aquela em que se permite ao intérprete certa margem de liberdade ao realizar
a interpretação.

Apresentada a controvérsia doutrinária acerca da melhor compreensão das concepções,


convém ressaltar que em volta delas ainda há mais uma advertência a ser feita. É preciso chamar
atenção que a discussão entre as duas concepções se dá dentro da perspectiva idealista de
linguagem, ou seja, da perspectiva que confere à linguagem a capacidade de representar com
exatidão alguma coisa.

Esta alguma coisa pode ser ou o pensamento, ou a realidade.

Nesse sentido, é possível compreender a divergência entre voluntas legislatoris e


voluntas legis a partir da capacidade de representação da linguagem. Quando se defende que a
interpretação jurídica busca descobrir a voluntas legislatoris, em verdade, o que de defende é
que a linguagem tem a capacidade de representar o pensamento do legislador. Por outro lado,
quando se sustenta que a interpretação jurídica busca descobrir a voluntas legis, em verdade, o
que se pressupõe é que a linguagem tenha a capacidade de representar a realidade, uma vez que,
neste caso, o texto da lei teria a capacidade de representar com precisão o conflito a ser decidido.

Feitos tais esclarecimentos fica fácil, agora, com apoio na doutrina de Karl Engish e na
lição de Tercio Sampaio Ferraz Jr, apontar as críticas que a concepção objetiva dirige à vertente
subjetivista:

“1. pelo argumento da vontade, afirmando que a “vontade” do legislador é mera ficção,
pois o legislador é raramente uma pessoa fisicamente identificável;

2. pelo argumento da forma, pois só as manifestações normativas trazidas na forma


exigida pelo ordenamento têm força para obrigar, sendo, em consequência, aquilo que se chama
de legislador, no fundo, apenas uma competência legal(a autorização conferida pela norma
imediatamente superior no ordenamento jurídico);

3. pelo argumento da confiança, segundo o qual o intérprete tem de emprestar confiança


à palavra da norma como tal, a qual deve, em princípio, ser inteligível por si;

4. pelo argumento da integração, pelo qual só a concepção que leve em conta os fatores
objetivos em sua contínua mutação social explica a complementação e até mesmo a criação do
direito pela jurisprudência”.

Por seu turno, os subjetivistas criticam a outra concepção dizendo o seguinte:

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“1. O recurso à técnica histórica de interpretação, aos documentos e às discussões
preliminares dos responsáveis pela positivação da norma é imprescindível, donde a
impossibilidade de ignorar o legislador ordinário;

2. os fatores (objetivos) que eventualmente determinassem a chamada vontade objetiva


da lei (voluntas legis) também estão sujeitos a dúvidas interpretativas: com isso, os objetivistas
criariam, no fundo, um curioso subjetivismo que põe a vontade do intérprete acima da vontade
do legislador, tornando-se aquele não apenas ‘mais sábio’ que o legislador, mas também ‘mais
sábio’ do que a própria norma legislada;

3. seguir-se-ia um desvirtuamento na captação do direito em termos de segurança e de


certeza, pois ficaríamos à mercê da opinião do intérprete”.

Eis, então, o problema. Qual das concepções teria razão? Seria este um problema
insolúvel? O certo é que esta polêmica remete o estudioso de hermenêutica jurídica ao desafio
kelseniano: é possível falar em interpretação verdadeira? A hermenêutica jurídica pode ser
teorizada como um saber científico?

4.2 Desafio Kelseniano: intrepretação autêntica e doutrinária

Se interpretar juridicamente é decodificar conforme regras de uso, forçoso é admitir que


há interpretação um aspecto arbitrário, uma vez que ela é voltada a por fim à uma sucessão de
interpretações que decodificam interpretações.

Ou seja, a interpretação jurídica não pode dar ensejo a uma sucessão indefinida de
interpretações, ela tem que produzir como resultado uma interpretação final. Esse aspecto, aliás,
caracteriza a interpretação dogmática e, ao mesmo tempo, constitui o seu problema teórico, o
problema de criar uma teoria justifique o caráter dogmático da interpretação jurídica.

É por conta deste problema que Kelsen se coloca a questão de “saber se é possível uma
teoria da interpretação jurídica que permita ao jurista falar da verdade de uma interpretação”.
A partir da observação da obra “Teoria Pura do Direito”, nota-se que Kelsen não fornece a partir
dela nenhuma base para a hermenêutica dogmática.

Porém, ele afirma que há dois tipos de interpretação, são elas: a doutrinária e a
autêntica. A interpretação autêntica é a que é realizada por órgãos competentes (pelo órgão
autorizado por uma norma imediatamente superior). Por exemplo, é a interpretação feita pelo
magistrado no exercício de suas funções. A interpretação doutrinária, por seu turno, “é
realizada por entes que não têm a qualidade de órgão competente”. Por exemplo, quando o

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doutrinador emite a sua interpretação acerca de certo texto de lei. Em suma, a interpretação
doutrinária não é vinculante, não obriga, ao passo que a interpretação autêntica tem este poder.

Ou seja, da interpretação autêntica resulta uma norma, a norma específica que é


declarada a partir da norma genérica. Por outro lado, da interpretação doutrinária decorre uma
sugestão, uma recomendação. Em outras palavras, enquanto a interpretação autêntica define
(estabelece limites, fronteiras) o sentido do conteúdo da norma, sendo esta definição o produto
de um ato de vontade, a interpretação doutrinária.

Percebe-se, a partir do exposto, que, para Kelsen, é “possível denunciar, de um ângulo


filosófico (zetético), os limites da hermenêutica, mas não é possível fundar uma teoria
dogmática da interpretação”.

Nas palavras de Wittgenstein, “sobre o que não se pode falar, deve-se calar”. Mas, qual
é a compreensão de Miguel Reale em torno do problema hermenêutico?

4.3 A compreensão de Miguel Reale em torno do problema hermenêutico

De acordo com Miguel Reale, a norma jurídica deve ser entendida pela hermenêutica
jurídica atual em termos de:

“a) um modelo operacional de uma classe ou tipo de organização ou de comportamentos


possíveis;

b) que deve ser interpretado no conjunto do ordenamento jurídico;

c) implicando a apreciação dos fatos e valores que, originariamente, o constituíram;

d) assim como em função dos fatos e dos valores supervenientes”.

A norma deve ser entendida como modelo operacional, ou seja, como modelo útil a
decidir conflitos. Este modelo, por sua vez, é hábil ou a controlar comportamentos (normas de
conduta) ou a regular outras normas (normas de organização). Logo, como quer Hart, não há
apenas normas de comportamento, mas, também, normas de organização, normas de normas.

Normas de organização que se subdividem em normas de reconhecimento, normas de


modificação e normas de julgamento. Essa é, aliás, uma das maiores críticas dirigidas por Hart
à Kelsen, vez que, segundo aquele, este apresenta uma teoria sobre a norma jurídica incompleta.

Ademais, a norma jurídica que deve ser interpretada no conjunto do ordenamento


jurídico. É dizer, a norma deve ser interpretada sistematicamente. A norma jurídica não pode

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ser interpretada em tiras. E, além disso, o intérprete deve levar em consideração os fatos e
valores que, originariamente, constituíram a norma.

Em outras palavras, a norma deve ser interpretada a partir dos fatos e valores relevantes
no momento de sua constituição, isto é, de acordo com a vontade do legislador.

Porém, segundo Miguel Reale, a norma deve ser interpretada não apenas segundo a
vontade do legislador, mas, também, em função dos fatos e dos valores supervenientes à sua
elaboração. Ou seja, a norma deve ser interpretada também segundo a vontade da lei, segundo
os fatos e os valores relevantes no momento em que ela é aplicada. Logo, a partir da lição de
Miguel Reale, a hermenêutica jurídica atual deve combinar as duas correntes acima
explicitadas, voluntas legis e voluntas legislatoris.

Em suma, a hermenêutica jurídica atual, de acordo com Miguel Reale, deve possuir uma
dupla visão da norma, retrospectiva (voluntas legislatoris) e prospectiva (voluntas legis). É a
partir dessa dupla visão que deve aparecer o significado concreto da norma, “reconhecendo-se
ao intérprete um papel ativo e criador no processo hermenêutico, o que se torna ainda mais
relevante no caso de se constatar a existência de lacunas no sistema legal”. Mas será que o
melhor caminho é esse? Será que interpretar é uma questão de descobrir alguma coisa? Será
que a linguagem tem a capacidade de representar algo? Não seria a interpretação uma tradução?

4.4 Interpretação e tradução: uma analogia esclarecedora

Traduzir é transpor o texto de uma língua para outra. Admitindo que o legislador se
utilize de uma língua e que o conflito a ser decidido seja derivado de um ruído na comunicação
realizada a partir de outra língua, nota-se a contribuição que a teoria da tradução pode prestar à
hermenêutica jurídica. O legislador se utiliza de uma linguagem técnica ou normativa. Os
participantes do conflito se valem de uma linguagem normal ou cotidiana, língua natural.

Logo, o problema é: como fazer a tradução de uma língua para outra?

Há três hipóteses de tradução: “(a) se as regras básicas de ambas as línguas coincidem,


é possível traduzi-las uma para outra; (b) se a coincidência é apenas parcial, ocorre uma
transferência que exige adaptação; (c) se não coincidem, elas são incomunicáveis”. No primeiro
tipo de tradução, ela é feita por correspondência, pois há entre as duas línguas, por exemplo,
vocábulos que se equivalem. Na segunda modalidade, a tradução é feita mediante adaptação,
admitindo-se, assim, uma margem reduzida de liberdade ao intérprete. E, no terceiro tipo de
tradução, ela, em princípio, seria impossível.

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No entanto, neste último caso, é possível uma transposição indireta. Ou seja, lança-se
mão de uma terceira língua que possa ser utilizada como um canal de acesso entre as duas
outras. O que é preciso é que esta língua contenha, entre as suas regras secundárias, as regras
básicas das outras.

O certo é que, nesta terceira espécie de tradução, ela se dá mediante a “recriação do


sentido por meio de uma língua intermediária”. A língua hermenêutica é esta língua
intermediária que permite a tradução da língua normativa para língua cotidiana. Logo, o
problema da hermenêutica jurídica não é a descoberta de um significado ou de uma vontade
(voluntas legis ou legislatoris) – a língua não é capaz de representar nada - mas, sim, a
construção dele e, a seguir, a sua atribuição à norma jurídica para fins de decisão do conflito
jurídico. Fica evidente, então, a relação entre poder e saber, entre hermenêutica jurídica e poder.

5 HERMENÊUTICA JURÍDICA E PODER

Segundo Alysson Leandro Mascaro, até mesmo “a teoria de Kelsen, quando trata a
respeito da interpretação, expõe o problema nevrálgico da hermenêutica jurídica: ela é um
procedimento de poder”. Não se pode negar que o profissional do Direito não se desvencilha
da sua biografia de vida.

“Ele é alguém que tem convicções, experiências, ideologia, compromissos políticos,


econômicos, culturais, religiosos, de classe social. Daí que o jurista nunca analisa a norma a
partir do nada. Ele lê a norma de acordo com a sua visão de mundo”.

Como assinala Hans-Georg Gadamer, a hermenêutica não é uma atividade


descompromissada, não é uma ingênua operação lógico-dedutiva, antes se mostra como um ato
existencialmente interessado. A norma jurídica não é apenas um texto. Ela, a norma jurídica,
não se originou a partir do nada.

Além disso, convém lembrar que o intérprete da norma também não é um ser sem
experiências e condicionantes. “O jurista interpreta a norma a partir de sua situação existencial,
de seu tempo, de suas circunstâncias sociais”. Em suma, “toda compreensão é uma pré-
compreensão. Compreender é um aprender-com, ou seja, é uma tomada de entendimento a
partir de uma determinada situação, construída socialmente”. Logo, não se interpreta primeiro
para decidir depois, antes o contrário, decide-se primeiro para depois se interpretar.

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6 FUNÇÃO SOCIAL DA HERMENÊUTICA

A função social da hermenêutica jurídica é enfraquecer as tensões sociais, “na medida


em que neutraliza a pressão exercida pelos problemas de distribuição de poder, de recursos e
de benefícios escassos. E o faz, ao torná-los conflitos abstratos, isto é, definidos em termos
jurídicos e em termos juridicamente interpretáveis e decidíveis”. A “hermenêutica possibilita
uma espécie de neutralização (manter sobre controle) dos conflitos sociais, ao projetá-los numa
dimensão harmoniosa – o mundo do legislador racional – no qual, em tese, tornam-se todos
decidíveis. Ela elimina, assim, as contradições, mas as torna suportáveis.

Portanto, não as oculta propriamente, mas as disfarça, trazendo-as para o plano de suas
conceptualizações”. Em suma, a hermenêutica jurídica “conforma o sentido do comportamento
social à luz da incidência normativa. Ela cria assim condições para decisão”.

7 MÉTODOS TRADICIONAIS DA INTERPRETAÇÃO JURÍDICA

Existem vários métodos e critérios de interpretação das leis. Vejamos:

7.1 Quanto à origem ou fonte de que emana

Em relação à origem de que emana, a interpretação poderá ser autêntica, doutrinária,


judicial ou administrativa.

 A interpretação autêntica: é aquela que provêm do próprio poder responsável pela


edição do ato. Assim, a interpretação legislativa autêntica é aquela efetuada pelo próprio
legislador, que delimita o sentido e alcance da norma jurídica editada. Um exemplo muito citado
é o art. 327 do Código Penal, em que o próprio legislador interpreta o sentido da expressão
“funcionário público no âmbito penal”.

 A interpretação doutrinária (ou científica): é a realizada pelos juristas por intermédio


de comentários à legislação ou estudos desenvolvidos a partir de determinado ramo jurídico.

 A interpretação jurisprudencial (ou judicial): é a resultante da jurisprudência, ou


seja, o conjunto de decisões prolatadas pelos Juízes no exercício decisório. Ex.: um acórdão ou
uma Súmula do STJ ou STF.

 A interpretação administrativa: é aquela que emana da Administração Pública por


intermédio dos seus órgãos. Esses órgãos poderão editar pareceres, despachos, decisões
administrativas, portarias com vistas à delimitação do alcance e do sentido da norma jurídica.

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7.2 Quanto ao Método ou Meio utilizado

Quanto à natureza a interpretação poderá ser literal, lógica, sistemática, histórica ou teleológica.

 A interpretação literal (gramatical, textual, semântica, filológica): dedica-se à


análise do texto, seja em seu aspecto morfológico, seja em seu prisma sintático, seja em sua
dimensão semântica. É a mais pobre das técnicas.

 A interpretação lógica (ou racional): “procede de acordo com as ferramentas que


clarificam o sentido e a compreensão do texto”. Busca-se, por meio de um raciocínio lógico, o
significado, o sentido, a finalidade e o alcance da norma nos fatos e motivos políticos, históricos
e ideológicos que culminaram na sua criação. Assim, extrai-se da lei uma regra ou um princípio
que essa lei não definiu ou enunciou expressamente, mas que ficou implícito. Podemos assim
exemplificar: a) uma lei que reconhece um direito também deve proporcionar os meios para
atingir esse direito; b) a lei que permite o mais também permite o menos (ex.: se há a permissão
para se vender um bem imóvel em uma determinada situação, conclui-se que um bem móvel
também pode ser vendido nessa mesma situação); c) a lei que proíbe o menos também proíbe o
mais (ex.: se é proibido ao depositário usar a coisa depositada, conclui-se que também é
proibido consumi-la).

 A interpretação sistemática (ou orgânica): compara a lei considerando-a como parte


integrante de todo um sistema jurídico (e não isolada no mundo jurídico); a norma deve ser
analisada em seu conjunto (e não apenas um dispositivo isolado), relacionando-a (direta ou
indiretamente) com as demais normas pertencentes a um sistema jurídico (e não de forma
isolada).

 A interpretação ontológica: busca-se a essência da lei, sua razão de ser, a ratio legis
ou o propósito da edição da norma. Ex.: O Código de Defesa do Consumidor (CDC), o Estatuto
da Criança e do Adolescente (ECA) e o Estatuto da Pessoa com Deficiência, têm como objetivo
a proteção destas pessoas em especial.

 A interpretação histórica (ou investigativa): pesquisam-se os fatos que antecederam a


norma, as circunstâncias ou o contexto político-jurídico em que a norma foi editada (histórico
do processo legislativo).

 A interpretação teleológica (sociológica ou finalística): é a que busca do fim (telos)


da norma. Adapta o sentido ou a finalidade da norma às novas exigências sociais. Para nós, que
estamos estudando para concursos, esta é a principal forma de interpretação (há maior

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incidência nas provas). Até porque há uma previsão, ainda que indireta, no próprio art. 5°,
LINDB. Este dispositivo indica o caminho que o Juiz deve seguir: “Na aplicação da lei, o juiz
atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum”. Portanto, deve
o Juiz buscar o real sentido da lei e não se ater a um texto frio e literal da lei. Deve ele aplicar
o que for mais justo, o que atende melhor ao bem comum, evitando-se situações absurdas.
Exemplo: nas cláusulas duvidosas prevalece o entendimento de que se deve favorecer quem se
obriga (ou seja, devedor).

Observem o entendimento do Superior Tribunal de Justiça a respeito: “A norma jurídica


deve ser interpretada teleologicamente, buscando sempre realizar solução de interesse social.
Se assim não for, a atividade judiciária será ociosa, inútil, mera homenagem à traição”. Isso não
quer dizer que o Juiz deva atuar com indolência, abatimento ou flacidez, mas sim com justiça.
Reforçando o que estou dizendo e finalizando este tema, costumo citar o autor Zeno Veloso:
“A proposição de fazer justiça com frouxura ou complacência pode até ser sincera ou altruísta
na base, mas é marota, cruel e perversa na consequência, pois tem aumentado a impunidade,
estimulado o generalizado descumprimento das leis; essa moleza, essa lassidão é a alegria do
crime organizado, o contentamento dos maus pagadores, o deleite dos escroques, a animação
dos traficantes, a felicidade dos ladrões de dinheiro público. Se é certo que a justiça não se
alcança com rudeza, ódio ou vingança, no final das contas, entre os extremos, é fácil encontrar
a fórmula ideal e salvadora: justiça se faz com justiça!”.

 A interpretação axiológica: tenta compreender quais são os valores que se encontram


relacionados à norma jurídica.

7.3 Quanto aos efeitos ou resultados

 A interpretação extensiva (ou ampliativa): o intérprete conclui que o alcance da norma


é mais amplo do que indicam os termos da lei. Nesse caso, diz-se que o legislador escreveu
menos do que queria dizer e o intérprete alarga o campo de incidência da norma, aplicando-a a
situações que não estão textualmente escritas. Ex.: o legislador usa o termo “filhos”, mas queria
dizer “descendentes”, abrangendo não só os filhos, como netos, bisnetos, etc.; o legislador fala
em “sentença”, quando na verdade queria dizer decisão final, abrangendo não só as sentenças
proferidas por um juiz singular, como os acórdãos, que são as decisões proferidas pelos
Tribunais; aplicação do benéfico do bem de família no caso de um devedor solteiro e que reside
sozinho no imóvel.

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 A interpretação restritiva: o intérprete restringe o sentido da norma ou limita sua
incidência, concluindo que o legislador escreveu mais do que realmente pretendia dizer. O
intérprete elimina a amplitude das palavras. Ex.: não se pode subentender vinculado o fiador ao
contrato de locação que foi renovado pelo locatário se ele não foi consultado expressamente
sobre isso, ainda que haja uma cláusula no contrato prevendo sua responsabilidade “até a
entrega das chaves”.

 A interpretação declarativa (ou especificadora): a letra da lei corresponde


exatamente ao pensamento do legislador, não sendo necessária (em tese) qualquer forma de
interpretação; não se amplia e nem se restringe seu alcance. O intérprete chega à constatação
de que as palavras expressam, na medida exata, o espírito da lei. Essa forma de interpretação
também é chamada de interpretação estrita, na qual, segundo Carlos Maximiliano, as normas
“aplicam-se no sentido exato, não se dilatam, nem restringem os seus termos”. Assim, não
confundir interpretação estrita (declaratória) com restrita.

Observação: alguns autores acrescentam a chamada interpretação progressiva


(adaptativa ou evolutiva). Ela ocorre quando o intérprete procura adaptar a lei às necessidades
atuais, identificando novas concepções ditadas pelas transformações sociais, científicas,
jurídicas ou morais que auxiliam na aplicação da lei penal.

Atenção: é importante deixar claro que todas essas espécies de interpretação não se
operam de forma isolada e nem se excluem. Na realidade elas se completam, pois todas trazem
alguma contribuição para a descoberta do sentido e alcance da norma. O intérprete
simplesmente deve lançar mão daquela que melhor produza resultado no caso concreto.

7.4 Lógica dedutiva

Essa concepção tradicional vincula-se ao Estado de Direito. A máxima desse modelo de


Estado é o princípio da segurança jurídica, cuja principal fonte jurígena é a lei. A prescrição de
um determinado Direito no bojo de um Código confere segurança à pessoa tutelada.

Historicamente, são apontados dois eventos fundamentais para o desenvolvimento da


metodologia tradicional: a Revolução Francesa e a lógica científica moderna.

A Revolução Francesa foi um movimento social e político que derrubou o Antigo


Regime, de caráter absolutista, e abriu caminho para a edificação de uma sociedade fundada
sob o primado da lei. Esse movimento consagrou duas formas relevantes de concepção do
Direito.

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A primeira delas foi a noção de direitos individuais, que surgiu em oposição ao arbítrio
do monarca absolutista. Ao Estado foi atribuída a função de zelar pela observância das leis.

A segunda concepção marcante é a de que apenas o Poder Legislativo – legitimamente


escolhido pelo povo – poderá editar normas. Aqui destaca-se a ideia de soberania popular. O
povo é livre porque autonomamente escolheu representantes para que legislem em nome dele.
Por consequência dessa concepção, viola-se a prerrogativa até então do monarca absolutista de
editar normas ao seu alvedrio, e institui-se o princípio da separação dos poderes.

Portanto, a segurança jurídica pela prescrição de Direito, que somente poderia ser
instituída pelo Poder Legislativo, em respeito à separação dos poderes, especificou a tarefa dos
operadores do Direito. O Poder Judiciário, nesse contexto, torna-se um simples revelador da
norma jurídica.

O Poder Judiciário, na execução de suas atividades principais, não poderá, de modo


algum, criar direitos. Poderá apenas revelar norma jurídica a ser aplicada no caso concreto. Por
isso, afirma-se que o magistrado é um “boca da lei”.

Paralelamente à Revolução Francesa, a base da metodologia tradicional é firmada na


lógica científica moderna. O desenvolvimento das ciências, notadamente do Iluminismo para
frente, conferiu enorme destaque à física e à química. A sociedade passou a crer que apenas o
conhecimento científico era capaz de chegar ao conhecimento verdadeiro.

Essa concepção, a princípio pensada para as ciências exatas, passou a ser cogitada nas
ciências humanas. Houve, portanto, uma influência do pensamento científico no Direito. O
exemplo mais claro dessa influência é o positivismo jurídico, que objetivou retirar todo e
qualquer sentido valorativo ou subjetivo da compreensão jurídica.

A sentença judicial, nesse contexto, foi pensada como o resultado de uma operação
lógica dedutiva, uma atividade mecânica na qual o aplicador do direito deve procurar no sistema
jurídico a solução para o caso concreto por intermédio da subsunção.

Assim, segundo o positivismo jurídico, o jurista vale-se de uma lógica formal ou


dedutiva. Para identificar qual norma aplica-se ao caso concreto, deve-se executar uma
operação denominada de silogismo.

Assim, compete ao aplicador do Direito desvendar na lei (premissa maior) a solução do


caso concreto (premissa menor) e declará-la por sentença (conclusão). Essa operação silogística

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não traz qualquer inovação, pois o resultado na sentença, em realidade, encontra-se estabelecida
na premissa menor, compete ao aplicador do Direito apenas identificá-la.

Tal pensamento se refere a lógica dedutiva e é aplicável, de acordo com os pensadores,


tanto para o positivismo, como para o jusnaturalismo. Embora essas correntes seja divergentes
em vários aspectos, aplicam a lógica da dedução no Direito. A diferença do positivismo em
relação ao jusnaturalismo, é que nesta teoria o Direito é deduzido da natureza do homem ou dos
axiomas da razão pura.

Apenas para deixar claro, os “axiomas da razão pura” são máximas gerais de conduta
moral. São exemplos expressões como: cada um deve reparar o dano causado; as promessas
devem ser cumpridas; deve-se dar cada um o que é seu.

Paralelamente à lógica dedutiva, é fundamental analisar outra teoria importante, relativa


à interpretação do Direito: o formalismo.

7.5 Formalismo e a jurisprudência dos conceitos

Essa concepção foi desenvolvida por Savigny, para quem a ciência do direito deveria
tomar o caminho de um sistema lógico no estilo de uma pirâmide de conceitos. Esses sistema
de conceitos seria organizado segundo rígidas regras de lógica formal, que permitiria interpretar
as regras a partir de um padrão pré-determinado.

Em razão da precisão que se pretendia impor na interpretação, afirmou o doutrinador


que essa doutrina permitia tornar o Direito uma ciência.

Nesse contexto, para a interpretação do Direito pressupõe-se a aplicação conjunta de


uma série de regras interpretativas. Essas regras devem ser aplicadas de forma ordenada a fim
de permitir a correta compreensão. Como já estudamos essas regras, vejamos a ordem com que
tais métodos interpretativos se apresentam.

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A gramatical representa o início de toda interpretação, como forma de compreender o
pensamento do legislador, segundo as regras gramaticais de morfologia e sintaxe da norma.

A interpretação lógica, por sua vez, indica a relação lógica entre as partes e os elementos
do discurso.

A histórica objetiva interpretar segundo o conjunto de circunstâncias que marcam a


génese de uma norma jurídica.

Por fim, a interpretação sistemática leva em consideração não apenas as regras jurídicas
da norma interpretada, mas todo o sistema jurídico, hierarquicamente organizado. Por exemplo,
para a interpretação do Código Civil é fundamental compreender as regras fundantes
estabelecidas na Constituição Federal.

Esses quatro métodos de interpretação conjugados resultavam – segundo o pensamento


de Savigny – a vontade do legislador.

Importante registrar que não falamos durante a organização dos métodos de


interpretação em interpretação restritiva e extensiva. Essas espécies não foram consideradas
porque rejeitadas pelos formalistas. Acreditava-se que a interpretação consiste em descobrir o
verdadeiro sentido da lei, sem qualquer modificação, inovação. Ao aplicador do Direito
compete a tarefa de declarar, de reconhecer a norma jurídica.

Assim, a interpretação que restringisse o âmbito de aplicação da lei (interpretação


restritiva) ou a lei que ampliasse o âmbito de aplicação (interpretação ampliativa) extrapola o
real sentido do processo interpretativo.

7.6 Crítica à lógica dedutiva e à jurisprudência dos conceitos

As duas teorias que estudamos acima afirmam que o Direito é uma ciência. E com base
nessa premissa desenvolvem métodos interpretativos fixos e rígidos. Essa compreensão do
Direito foi muito criticada, pois não atendia satisfatoriamente às necessidades vivida pela
sociedade e, em determinadas situações, implicava em conclusões contraditórias e inaceitáveis.

Com o tempo construiu-se o argumento de que o Direito não é e nunca poderá ser
científico, fundado em premissas fixas e absolutas, dedutíveis e racionais.

De forma didática, podemos identificar vários fatores que legavam ao fracasso da


Lógica Dedutiva e ao Formalismo.

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1º Fator

As expressões jurídicas possuem uma certa margem de incerteza e de indeterminação.


Pensemos, por exemplo, em expressões como “Justiça”, “liberdade” ou “igualdade”. São
conceitos que guardam certa variabilidade.

Para o conhecimento lógico-dedutivo, toda e qualquer incerteza deve ser retirada de


discussão. Cogitar o direito sem a análise do que é “Justiça”, “igualdade” e “liberdade” é
inaceitável.

Argumenta-se, portanto, que a lógica dedutiva é importante para a compreensão do


Direito, mas não pode ser considerada como a única fonte interpretativa, porque incompleta e
insuficiente.

2º Fator

Na lógica-dedutiva não há espaço para a valoração, instrumento fundamental do Direito,


que se caracteriza como uma ciência normativa, que estabelece prescrições do dever ser.

Vamos construir um exemplo tradicional:

Na entrada de um restaurante à beira-mar consta: “Proibido ingressar no


estabelecimento com traje de banho”. Por intermédio de uma interpretação puramente lógico-
dedutiva, poder-se-ia argumentar que quem entrasse nu naquele local não infringiu a norma.

Contudo, sabemos que a “intenção” daquela frase é permitir que as pessoas ingressem
vestidas. Como sabemos disso? Chegamos a essa conclusão pela valoração. Ao se questionar
qual a finalidade da norma, concluímos facilmente o objetivo pretendido.

3º Fator

Também é apontado como fator para o fracasso das correntes interpretativas tradicionais
a reação irracionalista, que destacam a irrealidade e ineficácia das leis.

Nesse contexto teórico, destaca-se a obra de Jhering, segundo para quem a teoria calcada
nos conceitos jurídicos (jurisprudência dos interesses ou formalismo) não é capaz de estruturar
todo o pensamento jurídico. De acordo com o autor, toda norma possui uma finalidade bem
delimitada. Isso significa dizer que toda norma jurídica possui um fim social (ou função social),
destacando a interpretação teleológica do Direito.

Juntamente com Jhering desenvolveram-se duas outras teorias:

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Portanto, podemos destacar três correntes do pensamento denominadas de irrealistas:

4º Fator

O último fato que levou ao fracasso da teoria lógico-dedutiva e do formalismo é


apontado como a descrença de que a capacidade humana é capaz de conhecer. Significa dizer
que a compreensão, conhecimento e julgamento humanos estão sujeito a diversas limitações,
denominadas de “dificuldades do juízo”.

Por exemplo, existem valores, experiências de vida, toda interpretação possui limites,
com certa vagueza e, por vezes, controversa. Desse modo, pelo dato de o conhecimento humano
ser incompleto e carregado de incertezas é impossível se cogitar que os métodos tradicionais
atendam plenamente à finalidade.

As críticas acima demonstram apontam várias falhas e problemas relacionados com o


método da lógica-dedutiva. Na sequência, vamos analisar os métodos interpretativos que
surgiram em superação ao método tradicional.

8 MÉTODOS CONTEMPORÂNEOS

Vimos, no início desta aula, a diferenciação entre interpretação e hermenêutica. Sem


necessidade de retomar o estudo da hermenêutica, é importante destacar que a ciência
hermenêutica é fundamental para apontar as falhas do método lógico-dedutivo.

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A Hermenêutica Jurídica, ao analisar os problemas relacionados à interpretação do
Direito, evidenciou as insuficiências das regras interpretativas tradicionais e destacou, entre
outros:

 a necessidade de o Direito observar a “práxis” da vida. O Direito decorre da vida e das


relações humanas, logo deve considerar a existência humana, inclusive o sujeito interpreta as
normas jurídicas.

 o momento histórico e a cultura atual devem ser considerados no processo interpretativo.

 a interpretação não pode estar atrelada apenas à vontade do legislador, deve levar em
consideração o contexto, de forma que a norma terá “vida própria”, amoldando-se à evolução
da sociedade. Aqui nós temos o que a doutrina denomina de revalorização da interpretação
objetiva, segundo a qual o texto normativo tem vida própria e não está atrelado apenas à vontade
do legislador (interpretação subjetiva).

 a interpretação reflete uma análise conflituosa que abrange a experiência do intérprete,


a situação histórica e a consciência social do seu tempo.

Desse modo, podemos apontar algumas teorias desenvolvidas para interpretar o Direito
em crítica ao pensamento tradicional. Todas essas teorias caracterizam-se por compreender o
Direito de forma flexível e não como uma ciência rígida, lógica, racional e formalista:

8.1. Concepções interpretativas contemporâneas

 Doutrina objetivista de interpretação do Direito

 Lógica do Razoável

 Interpretação segundo a teoria tridimensional do Direito

8.1.1 Doutrina objetivista de interpretação do Direito

Compreende que a lei possui um sentido próprio, que independe do autor. Em última
análise, entende que a norma desvincula-se do legislador e atrela-se ao fim atual da lei.

Acredita-se que essa concepção tem melhores condições de trabalhar com problemas
gerados por mudanças da sociedade e das condições sociais.

A crítica que se estabelece em relação à doutrina objetivista é o risco do arbítrio judicial.


Na medida em que é possível “adaptar” a lei à necessidades da sociedade, o magistrado poderá
aplicar a lei da forma que lhe convir.

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Essa realidade propicia enorme poder ao magistrado o que poderá resultar em sentenças
arbitrárias, sem critérios e segundo a vontade do julgador.

8.1.2 Lógica do razoável

Postula pela substituição da ideia de racionaliddade (verdade), característica das


ciências, para a acepção de razoabilidade, sinônimo de equilíbrio, moderação, harmonia.

A racionalidade é um conceito atrelado à interpretação lógico-dedutiva que, como


vimos, procura pela interpretação verdadeira. Para os defensores da lógica do razoável, deve-
se procurar entre soluções possíveis a mais razoável ao caso concreto.

A lógica racional subjacente à teoria lógico-dedutiva não leva em consideração aspectos


teleológicos. Por intermédio de uma relação silogística, chega a uma única resposta. Contudo,
sabe-se no mundo do Direito, por vezes, é possível identificar diversas respostas possíveis à
mesma situação fática. Cumpre ao intérprete escolher a mais razoável.

Em face de tal compreensão, conclui-se que as normas jurídicas adquirem vida,


transformam-se e evoluem conforme o contexto no qual são aplicadas. É em razão disso que
podemos afirmar que as normas jurídicas são pensadas a partir de um caso concreto e não
meramente a partir do seu conteúdo abstrato.

8.1.3 Interpretação segundo a teoria tridimensional do Direito de Miguel Reale

A teoria tridimensional compreende que o fenômeno jurídico é composto por três


elementos.

De acordo com essa teoria que o fenômeno jurídico decorre de um fato social, recebe
inevitavelmente uma carga de valoração humana, antes de tornar-se norma. Dessa forma, fato,
valor e norma em momentos distintos, mas interligados, tornam-se o fundamento do fenômeno
jurídico.

Constata-se, dai, que a Teoria Tridimensional do Direito insere-se no


âmbito do culturalismo jurídico. Ora, o culturalismo jurídico foi uma
corrente que, de certa forma, nasceu com o pensamento kantiano. Kant,
em sua obra Kritik der Sitten, havia observado que “A produção, em
um ser racional, da capacidade de escolher os próprios fins em geral e,
conseqüentemente, de ser livre, deve-se à cultura.” (GONZALEZ,
2000, p.3).
A Teoria Tridimensional pressupõe que o fenômeno jurídico deva ser analisado e
compreendido sob uma visão que englobe os três aspectos epistemológicos mais utilizados
pelos juristas e filósofos através dos tempos: o fato jurídico, visto como a experiência; o valor

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e a norma propriamente dita. A questão fundamental é que o Direito sempre foi analisado sob
enfoque unilateral, isto é, enfatizando apenas um dos três itens. Porém, na Era Contemporânea,
o Direito critica essa forma unilateral de apresentação das normas e passa a considerar o
fenômeno jurídico era fruto das relações sociais ou do espírito cultural de determinada época.

Esses três elementos devem ser considerados para fins de interpretação do Direito. A
interpretação, de acordo com a teoria tridimensional, é um processo de integração dialética que
implica ir do fato à norma e da norma ao fato, sem desconsiderar os valores subjacentes ao caso
concreto.

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