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Como reformulei a GE
Jeffrey R. Immelt
SETEMBRO 2017
O CEO assume diferentes tarefas em diferentes ciclos. Alguns CEOs são fundadores
e construtores, outros têm o privilégio de administrar momentum numa economia
estável ou num período sem disrupção dos modelos de negócio. Minha tarefa foi
diferente: reconstruir uma empresa histórica e icônica num período extremamente
volátil.
Liderei uma equipe de 300 mil funcionários durante seis mil dias. Fui líder durante
recessões, bolhas e riscos geopolíticos. Testemunhei pelo menos três “cisnes
negros”. Novos concorrentes surgiram, os modelos de negócio mudaram, e
introduzimos uma forma completamente nova de investir. E não apenas
preservamos, nós transformamos a empresa, hoje em posição privilegiada.
A segunda lição diz respeito à jornada em que o líder precisa embarcar antes de
empreender a transformação. Você precisa passar por um período de
reorganização de seu cérebro — chegar ao ponto de acreditar profundamente que
o mundo está mudando e que, para garantir a sobrevivência de sua empresa, é
preciso antecipar a mudança ou estar à frente daqueles que resistem a ela.
Sexta: durante a transformação você precisa ouvir e, ao mesmo tempo, agir. Você
precisa permitir novos pensamentos para se envolver continuamente e estar aberto
para a realidade que sua organização terá de capitanear quando aprender alguma
coisa nova, enquanto você ainda tem coragem de fazer as pessoas avançar.
Finalmente, você deve abraçar novos tipos de talento, nova cultura e novas formas
de fazer as coisas. Contratamos dezenas de milhares de pessoas — gestores de todos
os níveis, engenheiros e desenvolvedores de software, cientistas de dados e pessoal
de vendas, marketing, RH e outras áreas — muitas de fora dos Estados Unidos. Em
2001, 43% da nossa força de trabalho estava fora do país. Hoje são 65%.
As transformações
Todas essas transformações são, até certo ponto, compatíveis. Elas se destinavam
a nos focar na criação de valor para os clientes e a fazer com que nosso negócio
fosse mais enxuto, mais rápido, mais técnico e mais global, colocando-o na
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vanguarda da era digital. Elas contribuíram para que a empresa aumentasse seu
valor de mercado ao longo do tempo.
Antes de assumir o cargo de CEO, eu não acreditava que a empresa poderia ser, ao
mesmo tempo, boa em mídia, em seguro de animais de estimação e em construção
de motores a jato. Tínhamos saído de uma era em que muitos na GE acreditavam
que um bom gestor seria capaz de gerir qualquer coisa. Eu não partilhava dessa
ideia. Achava que as empresas e os líderes de negócio eram bons em algumas coisas.
Nosso portfólio era simplesmente amplo demais e muito opaco. Um negócio não
tinha ideia do que o outro fazia. Ninguém na liderança realmente entendia o
balanço da GE Capital. E muitos de nossos negócios industriais tinham se
comoditizado.
Outro tema de nossas transformações foi a vontade de utilizar nossa escala para
promover o crescimento e a eficiência. Há muito tempo percebi que nada é pior que
uma grande empresa que não cresce organicamente. Nunca desejei que a GE fosse
uma empresa de mais de US$ 100 bilhões que teve de interromper seu crescimento
orgânico. Nós criamos o conceito da GE Store como troca de conhecimento global
— criar capacidades a ser compartilhadas por nossas empresas: pontos fortes
horizontais a ser aproveitados para introduzir inovação baseada em escala e
distribuição global dominante.
Seja disciplinado
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Se você olhar para minha agenda, verá que eu estava fortemente alinhado com as
cinco transformações. Como descobri a quais aspectos me dedicar? Qualquer um
que precisasse de maior mudança. Eu tinha de fornecer um lastro contra a
estagnação.
Absorva
Bons líderes, bons CEOs, são curiosos. Eles estão continuamente absorvendo
informações sobre as tendências de desenvolvimento potenciais, mas não reagem
instantaneamente a elas. Eles as contemplam. Eles leem sobre elas. Eles escutam
especialistas internos e externos com diferentes perspectivas. Eles se envolvem no
que eu chamo de “período de incubação” antes de chegar a uma conclusão sobre o
que o input significa para a empresa e sobre como agir em relação a ele. O líder
precisa passar por um longo período de incubação, principalmente por causa da
enorme tenacidade necessária para conduzir uma mudança duradoura numa
grande organização. Você deve estar totalmente convencido de que a empresa
precisa se transformar — que é uma questão de vida ou morte — porque quando
você entra no jogo, a reação é imediata.
Depois desse encontro, fui até o conselho e consegui apoio para criar a Organização
de Crescimento Global. Isso colocou as operações horizontais regionais no mesmo
nível dos negócios verticais e alçou nossos jovens promissores a gerentes de vendas
e marketing, P&D e manufatura em seu respectivo território, permitindo que as
organizações regionais agissem mais rápido, respondessem melhor às
necessidades dos clientes locais e, ao mesmo tempo, se beneficiassem de nossa
escala global.
Outro exemplo é nosso esforço em curso de nos tornar líderes no cenário industrial
digital — transformação esta iniciada em 2011. Ela se originou de reuniões que
realizei com clientes em 2008 e 2009. Minha carreira começou em vendas, área em
que permaneci por muitos anos. Por isso sempre tive um saudável desrespeito, que
mantenho até hoje, pela administração central. Quando você passa muito tempo na
estrada, tem mais oportunidades de imbuir-se de boas ideias e aprender.
Continuei essa prática, mesmo depois de me tornar CEO. Todo mês eu passava seis
a oito dias no exterior e, nos Estados Unidos, dois dias em campo em reunião com
nossas equipes de vendas e, da parte do cliente, os responsáveis pelas decisões de
compra de nossos produtos e serviços. A finalidade era não só atrair o comprador
de uma nova turbina de geração de energia, um motor a jato ou um aparelho de
ressonância magnética, mas também saber o que as pessoas discutiam, as
mudanças operadas em seus negócios e o modo como usavam nossos produtos e
deles se beneficiavam — enfim, como geravam produtividade.
Em 2011, decidimos contratar Bill Ruh, da Cisco, para liderar nosso esforço da
internet industrial e estabelecer um grande centro de software em San Ramón,
Califórnia, que apoiaria a transformação. Desde o primeiro dia prometemos
reforçar a equipe com talentos externos — nosso objetivo original era contratar mil
engenheiros de software. Tais decisões nos colocaram onde estamos hoje. Elas
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Esse modelo de liderança que exerci teve efeito multiplicador na empresa. Hoje as
pessoas que gerem os negócios da GE são mais curiosas e muito mais focadas
externamente que no passado. Frequentemente eu digo nas reuniões: “Ei, tive uma
ideia, mas pela metade. Alguém é capaz de captá-la?”. Algumas das pessoas mais
capazes desse feito são: Beth Comstock, uma de nossas vice-presidentes — ela e
nosso CIO, Jim Fowler, estão assumindo a liderança na exploração do potencial
impacto do blockchain na GE; Keith Sherin, que foi CFO e depois diretor da GE
Capital antes de se aposentar no ano passado; Jeff Bornstein, nosso atual CFO; e
John Rice, nosso vice-presidente, que dirige a Organização de Crescimento Global.
Nossos mecanismos de informação — como a organização de marketing e o
processo do manual de crescimento, que é o nosso método de planejamento
estratégico para garantir que somos disciplinados em perseguir o crescimento
orgânico — apoiam essa postura.
Seja existencial
Toda grande mudança que empreendo é para mim questão de vida ou morte. Se
você incutir essa psicologia em seu grupo de gestão, terá a transformação.
Duas vezes por mês dava aulas num programa de desenvolvimento executivo em
nosso campus de Crotonville, Ossining, Nova York, onde encontrava pessoas de
três ou quatro níveis abaixo de mim na hierarquia da organização. Nessas ocasiões
costumava dizer: “Pessoal, se não nos tornamos a melhor empresa de tecnologia do
mundo, estaremos perdidos, estaremos mortos”. E quando eu falava sobre
industrial digital: “Não existe plano B. Não existe outro jeito de chegar lá. Quem
vem comigo? O que o impede? De que precisamos para fazer diferente?”.
Empenhe-se ao máximo
Meias medidas são a morte para as grandes empresas, pois as pessoas farejam a
falta de comprometimento. Quando você assume uma transformação, deve estar
preparado para ir até o fim. Precisa estar totalmente comprometido. Disposto a
abrir mão de dinheiro e pessoal. Você não estaria lá se fosse covarde. Veja os
bilhões de dólares que investimos em nossas competências digitais e manufatura
aditiva.
Por isso partimos para o digital em todos os nossos negócios. Com isso embutimos
sensores em nossos produtos e criamos uma capacitação analítica para ajudar
nossos clientes a aprender com os dados produzidos pelos sensores. Nosso foco
inicial era aumentar a produtividade dos contratos de serviços — por exemplo,
diminuindo o tempo de operação ou de transporte de nossos motores a jato e
reduzindo o tempo gasto nas revisões. Depois criamos novas capacitações em
nossos negócios e passamos a vendê-las aos clientes — ajudando-os a utilizar os
métodos analíticos como nós utilizávamos. Posteriormente construímos a
plataforma Predix, que haveria de se tornar o sistema operacional da internet
industrial.
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Mesmo para uma empresa do porte da GE, dar um passo desses é comprometedor.
Você investe muito dinheiro e estende o trabalho para a empresa inteira. Você tem
uma força de trabalho. Tem os produtos. Está disposto a mudar seu modelo de
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negócio fazendo acordos com concorrentes e abrindo o sistema para seus clientes.
Isso é mudança.
Seja resiliente
Da mesma forma, no ano passado a receita anual gerada pela nossa unidade de
assistência médica na China ultrapassou US$ 2 bilhões. Isso é muito quando
comparado com o quase nada que encontrei quando comecei a gerir o negócio no
fim da década de 1990. Atualmente temos um forte negócio local com grandes
talentos locais. Somos respeitados pelos clientes e pelo governo chinês. Mas não foi
fácil chegar a essa posição. Tivemos de perseverar: toda vez que uma porta se
fechava abríamos outra.
Odeio dizer: transformação leva tempo. Se a mudança for fácil, não será
sustentável. Você precisa coragem para ir até o fim. No mercado de capitais, duas
ideias — liberar valor e criar valor — circulam por aí como se fossem
intercambiáveis, mas não são. Liberar valor implica capitulação estratégica para
ganhos de curto prazo. Criar valor resulta de investimento de longo prazo — por
exemplo, quando a atividade de M&A para adquirir tecnologia, posição ou acesso
ao mercado está associada à proposição de valor de longo prazo. É mais difícil
reconhecer o valor desses movimentos se você estiver usando somente a lente de
curto prazo.
Um dos desafios mais difíceis dos processos de mudança é permitir que novas
informações sejam trazidas constantemente e dar a si mesmo a chance de se
adaptar, e ao mesmo tempo ter coragem de agir e fazer as pessoas avançar. Existe
um ponto crítico: mesmo que muitos recursos estejam sendo comprometidos, você
precisa estar disposto a mudar o eixo na base do que você aprendeu, porque é
improvável que obtenha a estratégia perfeita logo no início. Nada do que fizemos
saiu exatamente como começou.
Quando iniciamos a mudança industrial digital, eu não tinha nem pensado em criar
a plataforma de negócios Predix. Tínhamos começado essa organização de
aplicativos analíticos. Três anos depois, alguns especialistas da Microsoft que
tínhamos contratado disseram: “Se vocês estão dispostos a construir esse mundo
de aplicativos, tudo bem. Mas se quiserem criar valor, terão de fazer o que a
Microsoft fez com o Windows, e ser a plataforma para a internet industrial”. Isso
significava criar nosso próprio ecossistema. Expor o que estivéssemos fazendo aos
parceiros, desenvolvedores, clientes e não clientes. E permitir que a indústria o
adotasse. Durante os primeiros quatro ou cinco meses em que os especialistas
estavam desenvolvendo a ideia da plataforma, eu lhes disse: “Apenas façam seu
trabalho. Já conseguimos fazer muito até agora”. Mas eu estava lendo e
aprendendo. Finalmente fui persuadido e lhes disse: “Sabem de uma coisa,
rapazes? Vocês estavam certos. Vamos em frente”. Por isso giramos o eixo. Mais
uma vez fomos até o fim. Não só aumentamos nosso investimento em tecnologia
digital em US$ 1 bilhão, como também mandamos uma mensagem para todos os
nossos negócios: “Vamos encerrar as nossas outras iniciativas analíticas baseadas
em software e colocar todas na Predix, e teremos um sistema aberto que seus
concorrentes poderão usar tanto quanto você”.
Outra coisa que aprendemos foi a necessidade de vender resultados como serviços,
em vez de vender um produto e um contrato de serviços. Não estávamos
acostumados a fazer isso, mas aprendemos com os vendedores de software e
ouvindo nossos clientes sobre o que eles consideravam necessário para se tornar
clientes da Predix. Nossa parceria com a Hubco ilustra essa abordagem. Essa
empresa tinha a maior usina de energia termoelétrica independente do Paquistão
— gerando aproximadamente 1,3 gigawatts. Estávamos pensando numa criação de
valor por volta de US$ 120 milhões só com a economia de combustível — com
mínimas mudanças no hardware existente da usina.
Janeiro. Uma das coisas que tenho dito durante cada transformação é: “Estamos
numa jornada de 40 passos. Hoje estamos no 22º passo. Ainda não sei exatamente
como será o 32º passo, mas vamos explorar isso, juntos. E faremos o que for preciso
para ser bem-sucedidos. Vamos vencer”.
Uma empresa madura como a nossa não podia fazer o que estávamos tentando
fazer com nosso pessoal central. Precisávamos de um quadro de funcionários que
não tivessem crescido dentro da companhia. Isso exigia que eu os protegesse até
que estivessem verdadeiramente integrados e dispostos a criar uma nova cultura,
novas formas de trabalhar e novas ideias.
Para que a integração possa ocorrer, o líder precisa defender um novo grupo pelo
tempo que for necessário até a cultura central girar. Por exemplo, um funcionário
da GE Aviation uma vez se queixou para mim de que a Predix não tinha todos os
elementos de que precisava. Por entender que criar um bom software é um
processo iterativo, eu o lembrei de que quando a GE Aviation projetou o motor
GEnx, que impulsiona os jatos 747-8 da Boeing, e o Dreamliner 787, ela projetou
errado a turbina de baixa pressão a primeira vez. “Você precisa apoiar mais seus
colegas”, eu o adverti.
Quando o ritmo do negócio é tão mais rápido, qualquer coisa que seja anual não faz
sentido. Por isso, agora renovamos vários de nossos produtos continuamente e a
forma como conversamos com os outros sobre carreira, estratégia e resultados. Por
exemplo, nós nos livramos do lendário processo Sessão C para planejamento de
sucessão — um ritual anual que permanecia praticamente igual desde sua
introdução, na década de 1970 — e tornamos essas conversas muito mais
frequentes. Agora elas são chamadas de People Days. Transformamos nosso
processo de desempenho de gestão, que focava na classificação das pessoas, na
abordagem desempenho-desenvolvimento contínuo, cujo foco está em lhes
oferecer o feedback que elas querem e precisam para produzir melhores resultados
para os clientes.
Essa ainda é uma empresa bastante orientada para o processo. O que mudou desde
a década de 1990 é que, num mundo protecionista de crescimento lento de hoje,
você já não tem sucesso simplesmente por causa da excelência de um processo
como o Six Sigma. É preciso acumular grandes ideias para chegar lá. O processo é
o meio para, metodicamente, atingir grandes ideias em escala. Ele é importante,
mas não é um fim em si mesmo. As empresas têm problemas quando o processo —
não os resultados para os clientes — se torna a finalidade do jogo.
razão preço/lucro passou de 40:1 para 17:1 na última década e o preço das ações
teve desempenho mais fraco. Assim é com a transformação. Um de nossos lemas é:
“Deixe que as coisas venham até você”.