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Série Saude Mental e Trabalho 7 tad =| |p ib iE ee am et e i =| jie al. =| hp [=| | — Bet Jad vf 7 | | ue Bearer: a a Pror* Dr* LitiANA ANDOLPHO MAGALHAES GUIMARAES Pror* Dr* SontA GRuBITS (ORGs.) SERIE SAUDE MENTAL E TRABALHO VOL. | Apoio CULTURAL: Universidade Catdlica Dom Bosco - Campo Grande/MS SAo Pauto - 2003 ON Casa do Psicdlogo® . © 1999 Casa do Psicdlogo Livraria e Editora Ltda. E proibida a reproducdo total ou parcial desta publicacdo, para qualquer finalidade, sem autorizacao por escrito dos editores. 1? edicao 1999 2 edicio 2000 3? edicdo 2003 Editor Anna Elisa de Villemor Amaral Gintert Producao Grafica Renata Vieira Nunes Editoracao Eletrénica Marcia Rodrigues Alves Pinto Capa Sergio Poato Dados Internacionais de Catalogacio na Publicacéo (CIP) (Camara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Saiide mental e trabalho, vol. I / organizadoras Liliana Andolpho Magalhies Guimaraes, Sonia Grubits. — Sao Paulo: Casa do Psicdlogo, 1999. — Varios colaboradores, Bibliografia ISBN - 85.7396-061-2 L. Medicina do trabalho 2. Psicologia Industrial 3. social 4, Recursos humanos 5. Saide mental Liliana Andolpho Magalhaes icologia Guimaraes, 99-3141 CDD-362.2042 Indices para catdlogo sistema 1. Saide mental e trabalho: Aspectos so 362.2042 2. Trabalho e satide mental: Aspectos sociais: 362.2042 Impresso no Brasil Printed in Brazil Reservados todos os direitos de publicagio em Iingua portuguesa & Casa do Ps Rua Simio / jogo® Livraria ¢ Editora Ltda. Ivares, 1020 Vila Madalena 05417-011 Sao PauloiSP Teli: (11) 3034-3600. E-maik casadopsicologo@ casadopsicologo.com br htep://www.casadopsicologo.com.br Z Z Z SUMARIO Agradecimentos.. 7 Colaboradores a 9 Apresentagao ... well Prefacio ......... asta tt oo cee eens I. Efeitos do ambiente de trabalho na satide fisica e mental ..... 1S 1. Alcool e Local de Trabalho 2. Drogas e Trabalho ...... 3. Prevaléncia de Transtornos Mentais nos Ambientes de Trabalho 4. Les6es por Esforgos Repetitivos — L. Aspectos Psicolégicos II. Qualidade de Vida e Trabalho 5. Qualidade de Vida e Trabalho: uma articulagao po: 6. Pensando na Qualidade de Vida ao Aposentar III. Adolescéncia e Trabalho 7. Satide Mental do Adolescente Trabalhador .... 8. Prevengao Primaria em Saide Mental com Adolescent Trabalhadores da Universidade Estadual de Campinas... IV. Estresse Ocupacional .. 9. Validagdio para o Bi Sobre Estresse, Satide Mental e Trabalho 10. O Estres: Ocupacional em Enfermciros ..... 6 Sévie Soride Mental ¢ Trabalho - Vil. 1 11. Risk of Workers of Developing Phisical or Mental Disorders due to External Desirable or Undesirable Changes in Life: preliminary results. V. Aspectos Psicossociais e Trabalho... 12. Satide em Tempos de Desemprego .. 13. O Balango Social como Ferramenta para Formulagao de Politicas de Saiide Mental ¢ Qualidade de Vida nas Empresas .... 211 AGRADECIMENTOS Para que este livro viabil muitas pessoas contribuiram de for- ma direta ou indireta: Daniela Martins, jovem e talentosa profis-sional da area de Psicologia, que tem me assistido em todos os projetos de pesquisa realizados desde 1994, contribuiu de forma especial em todos os momentos, sobretudo na corre¢ao ortografica e revisao final dos textos: Sonia Grubits, amiga ¢ profissional competente, sempre disponivel e motivada, nao pou- pou esforgos para tornar possivel a edigao destes escritos; Wilma Cardoso, generosa e afetiva, acreditou na exequibilidade deste projeto desde 0 inicio. Uma fonte permanente de otimismo e inspiraco para a realizagdo deste projeto, foi o pessoal do Laboratorio de Satide Mental e Trabalho (LSMT) da UNICAMP. que aqui menciono: Acioly Luiz Tavares de Lacerda (Psiquiatra), Ana Lucia Prézia Sampaio (TO), Alexandre Gori (Estatistico), Celso Aleixo de Barros (Psicélogo), An- dreia C. A. Tavares de Lacerda (TO), Duilio Antero de Camargo (Psiquiatra e Médico do Trabalho), Leticia Marin-Leén (Médica do Trabalho), Lucélia Chiavegato Vieira (Psicéloga), Maria Elenice Quelho Areias (Psicdloga), Marisa Lucia Fabricio Mauro (Psicologa), Nancy Julieta Inocéncio (Psicéloga); Re- nata Cruz Azevedo (Psiquiatra). Ao pessoal do Projeto Matrix junto a Universidade Catélica Dom Bosco (UCDB), Campo Grande (MS): Lucy, Adriana, Ana Deise e Paulo Renato, componentes locais do LSMT, nossos agradecimentos. Ao pessoa! do Projeto Matrix junto 4 Faculdade de Enge- nharia Quimica de Lorena (FAENQUIL), coordenados pela prof* Wilma, nossos agradecimentos também. A psicologa do Departamento Geral de Recursos Humamos da UNICAMP, do Setor de Recrutamento e Selegao, Osmarina Dias Alves, por sua dedicagao, ética, respeito e sensibilidade no trato com os trabalhadores de nossa instituigao. & Série Samide Mental e Trabalho - Vol. 1 A instituigao parecira da UNICAMP no apoio cultural ¢ editoragéo deste livro, a Universidade Catélica Dom Bosco (UCDB), de Campo Grande (MS), agrade¢o pelo apoio irrestrito ao nosso projeto integrado de pesquisa. Finalmente, agradecemos ao CNPq pelo apoio dado ao projeto MATRIX, esséncia do livro que ora apresentamos. Liliana Andolpho Magalhdes Guimaraes COLABORADORES Acioly Luiz Tavares de Lacerda- psiquiatra, mestrando em Satide Mental-UNICAMP. Profa. Dra Aparecida Mari Iguti- profa. assistente doutora do Departamento de Medicina Preventiva e Social (DMPS) da Faculdade de Ciéncias Médicas (FCM) da Universida- de Estadual de Campinas (UNICAMP). Celso Aleixo de Barros- psicologo, mestrando em Satide Mental- UNICAMP, Prof. do Instituto de Psicologia da Pontificia Universidade Catdlica de Brasilia. Daniela de Almeida Martins- psicdloga do Departamento Geral de Recursos Humanos da UNICAMP. Prof, Dr. Dorgival Caetano- psiquiatra, PhD. pela Cambridge University, Inglaterra, prof. titular do DPMP/FCM/ UNICAMP. Prof, Dr. Joel Sales Giglio- psiquiatra, prof, do Departa- mento de Psicologia Médica e Psiquiatria da Faculdade de Ciéncias Médicas da UNICAMP. Leticia Marin Len - médica do trabalho, doutoranda em Epidemiologia - UNICAMP Prof* Dra. Liliana Andolpho Magalhaes Guimaraes- dou- tora em Satide Mental pela UNICAMP, profa. assistente doutora do Departamento de Psicologia Médica ¢ Psiqui- atria (DPMP) da Faculdade de Ciéncias Médicas (FCM) da UNICAMP, coordenadora do Centro Colaborador para Pesquisa e Treinamento em Satide Mental da Organizagao Mundial de Satide (OMS/Brasil-UNICAMP) e diretora do Laboratorio de Satide Mental e Trabalho do DPMP/FCM/ UNICAMP. 10 Série Saide Mental e Babatho - Val. 1 Lucélia Chiavegato Vieira- psicéloga, mestranda em Satide Mental- UNICAMP Prof. Luis Alexandre Grubits de Paula Pesséa- economista, mestre em Administragao de Empresas pela Pontificia Uni- versidade Catélica do Rio de Janeiro e prof. da Faculdade da Pontificia Universidade Catdlica do Rio de Janeiro. Prof* Luzia Martins Yoshida - psicologa, doutoranda em Saude Mental - UNICAMP Prof* Dra. Maria Adélia Jorge Mac Fadden - doutora em Saude Mental - UNICAMP. prof* assistente doutora do Departamento de Psicologia Médica e Psiguiatria da Fa- culdade de Ciéncias Médicas da UNICAMP. Prof* Marisa Lucia Fabricio Mauro - psicéloga, doutoran- da em Saude Mental - UNICAMP Prof* Dra. Sonia Grubits - doutora em Satide Mental pela UNICAMP, ¢ coordenadora do Mestrado em Psicologia - Concentragio & Saude Mental e Sociedade -, Psicologia- Concentragao Satide Mental e Sociedade da Universida- de Catélica Dom Bosco (UCDB) - MS. Renata Cruz Soares de Azevedo - psiquiatra, mestranda em Satide Mental - UNICAMP. Profa. Dra. Wilma Lucia Castro Diniz Cardoso- doutora em Psicolog Clinica pela PUC/SP e Universidade de Coimbra, Portugal APRESENTAGAO Desde 1985, quando iniciamos nosso contato com 0 campo da Satide Mental e Trabalho, por meio, sobretudo, dos escritos da pioneira em nosso meio, dra. Edith Seligmann Silva, e, posteriormente, acompanhando a trajet6- ria de autores como Ana Maria Pitta, Jodo Ferreira Filho, Naomar de Almeida Filho e Vilma Santana, e tantos outros, estudando também os trabalhos de Dejours, Levy, Ostermann, Gutiérrez, Cooper, Siegrist, até a realizagiio de nosso primeiro trabalho, em 1990, que culminou em nossa tese de doutoramento, na qual estudamos o operariado da industria extrativa de mineracao de ferro, muito se avangou_em termos do conhecimento. A partir de meu préprio contexto de trabalho, a Universidade Estadu- al de Campinas, ¢ seus trabalhadores, atores estes que progressivamente vamos tornando visiveis através de nossas investigagSes, acredito que tio somente possamos decodificd-los mais e mais se, enquanto pesquisadores, nos mantivermos em grupo e mais, mantendo um carater interdisciplinar na abordagem deste fendmeno multicausal: a satide/doenga mental nos ambi- entes de trabalho. Foi com a oportunidade que o momento histérico nos proporcionou que reunimos em nosso departamento de Psicologia Médica e Psiquiatria pessoas interessadas no tema, e, a partir dai, constituiu-se 0 Laboratério de Satide Mental e Trabalho em agosto de 1997, o qual tenho tido a oportunida- de de coordenar. Este laboratério tem como um de seus objetivos produzir pesquisas que possam fornecer dados relevantes para que se compreenda e intervenha na satide/doenga mental dos trabalhadores, buscando a melhoria das condi- ges de trabalho e da qualidade de vida. Objetiva ainda atividades académicas de orientagiio em nivel de graduago (iniciagao cientifica) e de pos-gradua- ¢4o (mestrado, doutorado ¢ pos-doutorado). 12 Série Satide Mental ¢ Tiabalho - Vol. 1 Os textos reunidos neste livro sao resultado em parte do denominado PROJETO MATRIX, desenvolvido pelo laboratério em parceria com a Dire- toria Geral de Recursos Humanos da UNICAMP, que esti sendo aplicado nos trabalhadores da Universidade como um todo. Este projeto nasceu da necessidade dos proprios trabalhadores da Universidade ¢ foi incorporado pelas 2 instdncias acima citadas. Outra parte, foi produzida por pesquisado- res ligados ao laboratorio. Este livro esta dividido em cinco areas tematicas: 1. Efeitos do ambiente de trabalho na satide fisica e mental; 2.Qualidade de vida e Trabalho, 3. Adolescéncia e Trabalho; 4. Estresse ocupacional ¢ 5. Aspectos psicossociais e Trabalho. Importante salientar que, na busca de um caminho inicial para decodificar o campo da Saude Mental e Trabalho, textos relativos as princi- pais tendéncias tedrico-metodoldgicas estao aqui contidos: textos que privilegiam 0 método epidemioldgico, textos que estiio na linha do “work- stress”, textos privilegiadamente socioldgicos e textos de inspira psicanalitica marcadamente. Acreditamos que desta pluralidade possa vir a se delinear a abordagem preferencial que caracterizarA nosso niicleo O tao decantado hiato entre a pesquisa qualitativa e quantitativa neste livro nfo aparece, pois reunimos a um s6 tempo, os dois métodos, observando que a convivéncia constante entre pesquisadores destas duas abordagens tem se mostrado profundamente enriquecedora. E evidente que a op¢ao preferencial de cada um, ou de cada sub-grupo fica aqui explicita de forma inequivoca. Procuramos apreender, sem pré-julgar, o que cada orienta- ¢Ao tedrica tem a contribuir para com nosso objeto primeiro e ultimo que é a pessoa do trabalhador. Nessa trajetoria, pudemos conhecer e trabalhar com pessoas de ou- tras instituigGes parceiras, a profa. dra. Sonia Grubits, da Universidade Catélica Dom Bosco (UCDB), ea profa. dra Wilma Cardoso, da FAENQUIL, UNIVAP. e Faculdades Salesianas de Lorena, com as quais tenho tido o prazer de privar de um generoso convivio amigo e académico, ¢ que tém sido um dos pilares de sustentacdo de nosso grupo. Tive também 0 prazer de orienta-las em seus estudos de pés-doutorado na area da Satide Mental do Trabalho. Pessoalmente, tenho aprendido muito com esta enriquecedora convi- véncia, esperando que, a um so tempo, o produto primeiro de nosso grupo, que agora se materializa em forma de livro, possa servir como instrumento de troca, desta feita além dos muros de nossa instituigao. Liliana Andolpho Magathdes Guimaraes PREFACIO A partir da formagdo da denominada Comissio de Readaptagio de funcionarios na Universidade Estadual de Campinas, UNICAMP, composta por representantes de varios setores implicados de forma direta ou indireta com 0 trabalhador, constatou-se a necessidade premente de que houves: um diagnéstico situacional sobre a satde geral e mental dos trabalhadores objetivando prevenir e, posteriormente, intervir para a melhoria da qualidade de vida e trabalho. Esta constatag4o precipitou contatos entre varias instan- cias da universidade e, a partir de entao, 0 Laboratério de Satide Mental e Trabalho, do Departamento de Psicologia Médica e Psiquiatria da Faculdade de Ciéncias Médicas, coordenado pela profa. Liliana A. M. Guimaraes, pas- sou a claborar um projeto que pudesse atender as necessidades observadas, surgindo ento 0 Projeto MATRIX. O livro Série Satide Mental e Trabalho, vol. 1, surge (em grande parte) do Projeto MATRIX: Satide Mental, Qualidade de Vida e Trabalho em Insti- tuigées de Ensino Superior: Diagnéstico, Prevencio e Tratamento. Em fungao da realidade das rela de trabalho e do conseqiiente adoecimento dos funcionarios, outras instituigdes de Ensino Superior mani- festaram 0 mesmo interesse na implantagao desse projeto, que se transformou em um programa interinstitucional, com a participagaio da Universidade Ca- tolica D, Bosco (UCDB) e Faculdade de Engenharia e Quimica de Lorena (FAENQUIL), tendo 0 apoio do CNPq. Na qualidade de primeira vice-coordenadora do projeto como um todo e coordenadora da area 3, UCDB, tive a felicidade de acompanhar a profes- sora Liliana Guimaraes desde a criagao, em todas as subseqtientes etapas até a efetivagao da proposta interinstitucional e inicio de sua execugdo. Nio éa primeira vez que Liliana, com suas qualidades de lideranga, sensibilidade para perceber a demanda social por pesquisas com temas ¢ programas mo- dernos na area da satide mental, elabora e coloca em execucao trabalhos de 14 Série Saside Mental ¢ Trabalho - Vol. I grande significado para a comunidade cientifica ¢ para a sociedade como um todo. Assim, foi com varias pesquisas sobre grupoterapia surgidas na UNICAMP, sendo que ela foi a pioneira em estudos e intervengées na area. Hoje, Liliana é conhecida e reconhecida por estes trabalhos na América Latina ¢ nos meios mundiais de pesquisas sobre grupos. Comprovando sua habilidade e conhecimento nao sé em teoria e pesquisas como também na sua pratica, Liliana consegue reunir um grande ntimero de especialistas em diferentes areas para realizar um novo trabalho pioneiro. O projeto MATRIX e a presente obra so um exemplo de sua visio multidisciplinar, seu interesse académico agora também por grupos huma- nos mais amplos (os trabalhadores), atingindo trés grandes instituigdes universitarias. Este livro reuniu textos de especialistas em epidemiologia, prevengaio e tratamento do alcoolismo, drogadi¢io, lesdes por esforgos repetitivos (LER), transtornos psiquiatricos, terceira idade e aposentadoria, estresse ocupacional, entre outros. Além disso conta também com uma valiosa con- tribuicdo quanto 4 satide mental do adolescente trabalhador e finalmente reflexdes sobre o balango social como uma exigéncia da empresa moderna, para avaliar sua efetiva contribuigao para o desenvolvimento dos recursos humanos internos e¢ do contexto social de um modo geral. Diferentes formas de analise e intervengao na area organizacional tém sido tentadas, porém nenhuma que buscasse efetivamente entender e favo- recer as areas humanas, como o presente trabalho. O grande mérito do projeto MATRIX e da presente obra Série Satide Mental e Trabalho, vol. |, foi ter partido de uma real necessidade expressa pelos proprios trabalhadores, entendendo que o fator humano sera 0 princi- pal recurso para a qualidade e competéncia de uma organiza¢ao no préximo milénio, criando um programa e iniciando uma série de pesquisas e acdes, levantando reflexdes e buscando solugdes para as principais questdes e conflitos na empresa moderna. O titulo da obra que apresento tem uma numeragao, indicando que é a primeira parte da série sobre o tema Saude Mental e Trabalho. As proximas publicagdes acompanhario o desenvolvimento, resultados e estratégias que irdo surgir dos diferentes subprojetos do MATRIX, inclusive as préprias diferengas institucionais. Esperamos que este trabalho pioneiro possa contribuir para uma me- Thor qualidade de vida, trabalho e funcionamento organizacional, nao sé nas instituigdes analisadas no projeto, como também para diferentes organiza- ¢Ges ptiblicas ou privadas, que poderao aproveitar e beneficiar-se com esta experiéncia. Sonia Grubits EFEITOS DO AMBIENTE DE TRABALHO NA SAUDE FISICA E MENTAL ALCOOL E LOCAL DE TRABALHO Acioly Luiz Tavares de Lacerda Introdu¢ao O alcool é a droga mais amplamente utilizada no mundo, nas mais diferentes culturas. Obviamente a utilizagao desta substancia no local de trabalho é parte integrante desse padrao de uso global. OAlcoolismo é o segundo transtomo psiquiatrico mais prevalente na atualidade, sendo superado apenas pelas depressdes. O Epidemiologic Catchment Area (ECA), estudo epidemioldgico realizado nos Estados Uni- dos na década de 80 e considerado como referéncia no que se refere ao rigor metodoldégico, aponta para uma prevaléncia de 13,8% de Dependéncia ou Abuso de alcool na populagao adulta americana (HASIN e cols, 1990; HELZER e cols, 1991). Este estudo também demonstrou uma associagao inversa entre alcoolismo e renda. Estudos similares mostram que 90% da populagao jé usou bebida alcodlica durante a vida; 60 a 70% bebem habitualmente; 40% tiveram pro- blemas tempordrios em decorréncia do uso do alcool; 20% dos homens e 10% das mulheres usam abusivamente ¢ 10% dos homens e 3 a 5% das mulheres sfio dependentes do alcool. Representam 20 a 30% de toda a clien- tela psiquiatrica. A faixa etaria em que mais se consome alcool é dos 20 aos 40. anos, com freqiientes problemas clinicos e psiquiatricos associados (inclu- indo transtornos de conduta, depressio, transtorno bipolar, esquizofrenia, transtornos de ansiedade, transtornos alimentares, jogo patolégico e transtorno de personalidade anti-social), dificuldades de convivéncia fami- liar e social, além de evidentes prejuizos na capacitagdo e desempenho profissionais. (NIDA, 1991; TREFFERT, 1978; ALTERMAN e cols, 1982: INMAN e cols, 1985; HESSELBROCK e cols, 1985; DEYKIN e cols, 1987; 18 Séxie Saside Mental e Trabalho - Val. 1 MIRIN ¢ cols, 1988; BUKSTEIN e cols, 1989; CHRISTIE-BURKE e cols, 1990; MILAN e cols, 1991; LESIER & BLUME, 1993). ALMEIDA FILHO ec cols (1992), em estudo epidemiologico de amos- tras populacionais de trés metrépoles Brasileiras (Brasilia, Sao Paulo e Porto Alegre), encontraram uma prevaléncia de alcoolismo de cerca de 15%, utili- zando 0 Questionario sobre Morbidade Psiquidtrica em Adultos (QMPA), instrumento geral para avaliacdo da presenga de transtornos mentais. Taxa bastante semelhante 4 encontrada no Epidemiologic Catchment Area, con- firmando a hipotese de que o transtornos relacionados ao uso do alcool sio bastante prevalentes em todos os paises, independente do estagio de de- senvolvimento em que se encontra. MOREIRA e cols. (1996) encontraram uma maior prevaléncia de alco- olismo em pessoas nao brancas, 0 que pode traduzir mais uma vez, uma relagio inversa entre renda ¢ prevaléncia de uso indevido do Alcool. Tabela 1. Prevaléncia de alcoolismo - estudos brasileiros * AUTOR/ANO CIDADE PREVALENCIA Azoubel Neto, 1962 Ribeirao Preto 6.2% - alcoolismo crénico 13.3% - bebedores excessivos Luz Jr, 1974 Porto alegre 6.2% Coutinho, 1976 Salvador 22.6% Santana, 1978 Salvador 3.4% - alecoolismo 14.2% - consumo diario Almeida-Filho, 1985 Salvador 6.2% - aleoolismo 21.1% - consumo diario 19.1% - embriaguezsemanal Regoe cols., 1991 Sio Paulo 78% Almeida-Filho e cols., Brasilia, 15% 1992 Sio Pauloe Porto Alegre Moreira ¢ cols., 1996 Porto Alegre 9.3% - alcoolismo 15.5% - bebedores pesados ** * — Extraida de Lima, 1997 ** Definido como pessoas que ingerem mais de 30 gramas de Alcool por dia. Estudos apontam para um maior consumo de alcool entre os homens, embora as mulheres parecam apresentar uma maior vulnerabilidade aos da- nos decorrentes do uso deste e, para uma tendéncia de aumento do uso de alcool entre as mulheres nos ultimos anos, paralelo ao crescimento do Alcool ¢ Local de Trabalho 19 percentual economicamente ativo destas. (WILLIAMS e cols., 1985; DAWSON, 1994) Quanto mais precoce 0 inicio do alcoolismo e mais tardia a interven- ¢4o terapéutica, maior a chance de tornar-se mais grave e com maior dificuldade de recuperagio. Dai a importancia dos programas preventivos e do diagnéstico precoce. (DUPONT, 1984) Os transtornos do uso do alcool tém um curso varidvel que é freqiientemente caracterizado por periodos de remissao e por recaidas fre- qiientes. O primeiro episddio de intoxicagao aguda ocorre freqiientemente na adolescéncia e 0 inicio da Dependéncia propriamente dita ocorre, na maior parte das vezes, entre os 20 e 30 anos de idade. (US Department of Health and Human Services, 1992) Os custos com transtomo de uso de substancias (ai incluido 0 alco- olismo como a principal fonte de gastos) transformam-nos em um problema de satide publica da maior magnitude. Estudos realizados nos Estados Uni- dos apontam para valores astrondémicos, quando somados custos diretos e indiretos, como US$ 300 bilhdes anualmente, o que representa um valor 15 vezes maior que 0 orgamento destinado a todo o atendimento publico de satide em nosso pais. A segunda categoria mais onerosa (precedida apenas pelos custos de tratamento aos problemas relacionados ao alcool) inclui as perdas em produtividade pelos trabalhadores. Estes custos sio dificeis de mensurar em parte por causa da falta de registro nos servigos responsaveis pelo atendimento. Usam-se portanto, medidas indiretas destes prejuizos como declinio na qualidade do produto, diminuigao na produtividade e absenteismo. HARWOOD e cols. (1980) estimou que estes custos chegaram a USS 54 bilhdes no ano de 1980 nos EUA. A terceira fonte de custos em importancia a chamada perda social em decorréncia de mortes prematuras decorrentes do uso do alcool. Utilizando esta técnica de “capital humano”, RICE e cols. (1990) avaliaram um custo de USS 24 bilhdes no ano de 1985, nos Estados Unidos. Outras fontes de custo referem-se aos referentes a Justiga Criminal ¢ Sindrome Fetal Alcoélica. (NIAAA, 1991) E importante enfatizar que 0 custo com o tratamento psicolégico- psiquiatrico dos problemas relacionados ao alcool corresponde a apenas uma infima parte do custo total (nem chega a constituir-se em categoria propria, classificado como “outros custos”), constituindo-se, portanto, em um grande investimento para os empregadores e para os 6rgdos governa- mentais, a elaborag’o de programas que apresentem impacto na prevencao e tratamento do Alcoolismo. Nos séculos XVIle XVIII, 0 alcool era encarado e utilizado como uma substancia psicoativa que aumentava 0 “rendimento” do trabalhador ¢ per- mitia que esse se submetesse as condigdes mais adversas de trabalho. Logo, 0 uso do Alcool era estimulado pelo empregador e bem recebido pelo empre- gado, muitas vezes “pago”, em parte, com quantidades de bebidas alcodlicas (WARNER (8) - Europe) 20 Sevie Satide Mental ¢ Tabalbo - Vol. I O processo da Revolugao Industrial no século XIX, foi marcado pelo aparecimento de maquinas complexas para a época, pela necessidade de produgao em larga escala, de m&o-de-obra cada vez mais especializada e do cumprimento de prazos e rotinas de trabalho com elevada e constante pro- dutividade. E facil concluir que o uso de alcool nesses novos parametros de organizagao de trabalho traria significativos prejuizos. A partir de entao, o empregador passou a interessar-se pelos habitos sociais e estilo de vida dos empregados, controlando-os ou procurando estratégias para isso (LAVIN - 9 - Europe). Esse marco na mudanga nas relagées de trabalho apenas iniciou um processo de valorizagéo do bem-estar e da motivagao do trabalhador, como uma estratégia de grande retorno financeiro para as empresas ¢ nao apenas uma “benevoléncia desinteressada” aos empregados, variando essa relago inclusive na dependéncia do desempenho da economia global. Nas ultimas décadas, tem-se assistido a uma mudanga significativa de modo a valorizar cada vez mais a presenga de um departamento de recur- sos humanos dentro da maioria das empresas, além de uma mudanga do paradigma de um controle rigido ¢ coercitivo aos empregados para uma relagio de parceria, levando sempre em consideragao o alcance da satisfa- onal, melhora da motivacaio e recompensa através de planos de carreira. Esse processo tem-se registrado amplamente em paises de primeiro mundo e em paises em desenvolvimento, como o Brasil. Dentro desse con- texto, as maneiras de se lidar com 0 abuso de alcool tem mudado de uma perspectiva punitiva para uma perspectiva de educagao e promogao de sati- de, acentuando a importancia do “capital humano” da empresa. Definigao de termos As definigdes que se seguem sao as adotadas pelo Comité de Espe- cialistas em Promogao de Saiide no local de trabalho da Organizac’io Mundial de Salide (WHO EXPERT COMMITTEE, 1993). O Local de Trabalho A principio, parece bastante Obvia a definicao deste item, e até dis- pensavel. Porém, em diferentes paises esta palavra pode evocar imagens bastante distintas. Mesmo em paises industrializados, a maioria da forga de trabalho encontra-se alocada em pequenas e médias empresas e nado em mega-empresas, como era de se supor. Em paises em desenvolvimento, con- vivem os empregados de industrias (em menor quantidade) e os que trabalham em atividades primarias como a agricultura, com poucos companheiros, mui- tas vezes familiares. Ja nos paises em acelerada industrializagao aparecem os trabalhadores “sem-teio” ¢ os migrantes em proporgdes significativas, como ocorre no Brasil. Aleool ¢ Local de Trabalho 21 Promogao a Saude Enfatiza 0 ganho ou a reconquista do controle sobre 0 bem-estar pessoal e encoraja um ambiente psicossocial que ira favorecer esse controle. Aplicada ao local de trabalho, esta idéia significa que deve-se focalizar a atengio nao apenas para o estimulo de praticas saudaveis entre os individu- os através de programas de educagio e treinamento, mas também para o desenvolvimento e manutengao de condigdes de trabalho que conduzam ao bem-estar da equipe como um todo, e para a prevencao de problemas relaci- onados ao alcool e drogas. Recentemente, a evidéncia relacionando condigdes adversas de tra- balho e a probabilidade do desenvolvimento de problemas relacionados ao Alcool ou drogas tornou-se forte, de maneira que comecou-se a investir na melhoria das condi¢des de trabalho, passando pela qualidade nas relacdes dentro da empresa. Protegao a Sade Este termo refere-se especificamente as atividades de promogao a satide que influenciam o ambiente de modo a repercutir na sade. Esta dis- tingdo é enderegada a um corpo de pesquisa que sugere que a promogio de mudanga do comportamento do individuo através de educagao e persuas é menos onerosa que mudang¢as no ambiente, tais como aplicagdes de pa- drdes de seguranga. Abuso de Alcool e Drogas Abuso & 0 uso repetido ou episédico de alcool ou de drogas para modificar ou controlar o estado mental, de uma maneira ilegal ou prejudici- al para si ou para os outros. Exemplos incluem acidentes, “perda de memoria passageira” em que o paciente “nao sabe o que faz”, problemas com a justiga, comportamentos de risco (sexual, violéncia, dirigir intoxicado, trabalhar intoxicado). Dependéncia ao Alcool ou Drogas Refere-se ao estado de necessidade de doses repetidas da sul cia para sentit-se melhor ou evitar sentir-se mal. Caracteriza-s uso compulsivo, repetitivo do alcool a despeito de evidentes conseq as fisicas e/ou psicolégicas e sociais. Freqiientemente estas pess experimentam epis6dios de intoxicacado que podem durar semanas ou meses, interrompidos por periodos de abstinéncia, voluntaria ou involuntariamente. (JAFFE, 1992; SHARP, 1992) oas 22 Série Satide Mental ¢ Trabalho - Vol. I Problemas relacionados ao Alcool ¢ as Drogas Este termo pode ser aplicado para qualquer dos efeitos adversos do uso do alcool ou drogas. “Relacionado” nao implica necessariamente cau- salidade. Engloba dependéncia, abuso e outros problemas. Recaida Refere-se ao retorno do uso do alcool apés um periodo significativo sem utilizar tal substancia. (GOLDSTEIN, 1994) O uso de alcool no trabalho E incontestavel o grande numero de prejuizos que o uso de bebidas ‘as raz quando feito no periodo de trabalho, o que tem gerado uma proliferagao de politicas especificas de cada empresa enderegadas a este problema. Dentre os prejuizos, encontram-se mais bem documentados 0 au- mento do absenteismo, a diminuigaio da produtividade, clevagdio da taxa de acidentes, elevada taxa de renovagiio do quadro funcional, prejuizo nas rela- g6es interpessoais ¢ na imagem da empresa. Desenvolveremos consideragdes acerca dos aspectos mais relevantes de estudos mais consistentes. alco Absenteismo Se, por um lado, as empresas tém avancado significativamente na otimizacao da jomada de trabalho, de modo que, mesmo reduzindo a jornada semanal, nas ultimas décadas tem-se stido a um aumento na produtivi- dade, por outro lado, continuam lidando com o absenteismo, certamente um grande problema que persiste. Os prejuizos resultam da redugio da produti- vidade decorrente das faltas, atraso em concluir tarefas e abandono do trabalho antes de completar a jornada. Em 1993, na Inglaterra, o absenteismo representou 3,5 a 5% do tempo total de trabalho, segundo a Federagao de Indtstrias deste pais (Confederation of British Industry, 1993). No mesmo ano, nos EUA, através de estudo epidemioldgico, identificou-se que cerca de 60% dos empregados adultos usavam regularmente bebidas alcodlicas e 5 a 11% faziam uso pesadamente (SAMHSA, 1993 - em Cook, 1996). O abuso do alcool encontra-se entre os principais fatores responsd- veis por esta elevada taxa de absenteismo (JELLINEK, 1947; THORPE & PERRY, 1959), sendo estimado que os “bebedores-problemas” apresentam duas a oito vezes mais faltas que os seus controles (MORAWSKI e col: 1990; BROSS e cols., 1992; COOK e cols, 1996). E importante destacar que ai nao se enquadram apenas os alcoolistas, ou seja, os dependentes, ¢ sim todas as pessoas que utilizam abusivamente 0 alcool, independente de sua Alcool € Local de Trabalho 23 regularidade, reforgando a necessidade da extensdo das politicas de contro- le do consumo de alcool a uma populagao que nao mais se restringe aos alcoolistas. Embora a relagao entre absenteismo e uso de alcool nao seja algo linear, observa-se nesta a interagao de diversos fatores do proprio am- biente de trabalho, fatores sociais, psicologicos e biolégicos. Acidentes de trabalho Segundo a legislagao trabalhista de diversos paises, inclusive o Brasil, € considerado acidente de trabalho desde 0 percurso de ida ao trabalho até o seu percurso de volta. Logo, para as empresas, muitos acidentes de trinsito sao, na verdade, acidentes de trabalho, o que eleva em muito este numero. Neste caso especifico, o estabelecimento de causa-efeito é bastante Sbvio, j4 que o alcool é um depressor do Sistema Nervoso Central, com efeito de sedagiio, redugao da atengiio e concentragao, lentificagao do pen- samento e dos reflexos e dificuldade de coordenagao motora, “sindrome” bastante propicia para predispor a acidentes, Os estudos mostram uma ele- vaciio do numero de acidentes e da gravidade desses, sendo que o alcool encontra-se envolvido em 15 a 25% dos acidentes nao fatais (WECHSLER e cols, 1972; HOLT e cols., 1980; YATES e cols., 1987; CHERPITEL, 1989a; CHERPITEL, 1989b), em cerca de 25% de todos os acidentes de trabalho (MORAWSKI ecols., 1990) e em 16% dos acidentes fatais. O alcool também & responsavel por uma elevagaio de 10 a 1] vezes da chance de acidentes em empregados que apresentavam niveis detectaveis de alcool no sangue em comparagaio com aqueles que nao haviam bebido (LEDERMAN & METZ, 1960). J4 POPHAM (1984) encontrou uma probabilidade de 2,5 a 8 vezes maior de acidentes com aqueles que bebem pesadamente ¢ que 26% deles apresentam acidentes que requerem afastamento do trabalho por pelo me- nos uma vez. Tabela 2. Perdas financeiras decorrentes de acidentes na Inglaterra (1990-1991) * SETOR PRODUTIVO PERDAS Construgao Civil 8.5% do orcamento Industria de Laticinios 1.4% dos custos operacionais Plataforma de Petrdleo 14.2% do potencial produtivo Hospital 5% dos custos anuais Transportes 1.8% dos custos operacionais € 37% dos lucros * Extraidode HEALTH AND SAFETY EXECUTIVE, 1993. 24 Série Satide Mental e ‘Trabatho - Vol. I Queda na produtividade Os efeitos do alcool no Sistema Nervoso Central, como ja discutido no item anterior, também conduzem a uma redugao na eficiéncia e acuracia das tarefas em pessoas intoxicadas. Este achado parte de trabalhos realiza- dos com os proprios funcionarios, que costumam executar as tarefas de maneira menos cuidadosa e mais lentamente. Apesar de ser bastante d mensurar 0 somatdrio desta redugao em uma determinada empresa, pos: velmente este é um dos prejuizos decorrentes do uso do alcool mais onerosos para as empresas. Prejuizos nas relagdes interpessoais Como amplamente conhecido, 0 uso de substancias psicoativas pro- voca claras alteragdes emocionais e de comportamento humanos. Sendo o alcool a mais difundida delas e de uso legalizado, ¢ de se esperar que seja importante fator que contribui para um prejuizo nas relagdes interpessoais e de trabalho de maneira especifica. Dependendo dos niveis sangiiineos, 0 Alcool pode desinibir, predispor 4 agressividade, 4 ansiedade ou a depres- so, sintomas e sindromes extensamente implicados neste tipo de prejuizo. Mais uma vez, é bastante dificil mensurar essas evidéncias. Fatores que influenciam 0 uso do alcool no trabalho Certamente 0 abuso/dependéncia do dlcool apresenta uma etiologia complexa e multifatorial, como ja citado anteriormente. Neste topico, iremos destacar 0 que comumente é omitido na maioria das politicas de prevengao do uso do alcool no trabalho: os fatores intrinsecamente relacionados ao trabalho em si. Fatores especificos do local de trabalho O Ambiente de Trabalho Este pode exercer uma influéncia extremamente negativa, “incenti- vando” 0 uso de alcool pelos funcionarios, obviamente de um modo nado intencional. A acessibilidade ao alcool no ambiente de trabalho € de relevan- te importéncia, como a presenga de restaurantes que vendem bebidas alcodlicas, lugares em que se pode beber as escondidas, a inexisténcia de uma politica clara referente ao uso do alcool no trabalho que componha as diretrizes gerais de funcionamento da empresa, até mesmo a permissividade por parte da empresa quanto ao uso do alcool por alguns ou todos os funci- ondrios em determinadas ocasides. E quase que uma tradigao 0 uso de alcool v a Alcool ¢ Local de Trabatho por empregados da construgao civil e outras categorias na sexta-feira a tar- de, por exemplo, e essa tradigdo pode ter o seu hordario de inicio cada vez mais cedo. COOPER & SADRI (1991) chegam a apontar 0 uso exagerado de Alcool pelos funcionarios de determinada empresa como um “sintoma de um ambiente de trabalho doentio”. Por outro lado, preconiza-se a disponibilida- de de bebidas nao alcodlicas e 0 subsidio da alimentagao na propria empresa ou em estabelecimentos por ela “controlados” , evitando que os funcionari- Os recorram a restaurantes que sirvam alcool as refeigdes, além de identificar lugares que podem ser usados para 0 uso secreto de alcool e facilitar 0 acesso dos funcionarios ao chefe de recursos humanos em busca de trata- mento, isentando-lhes de punigdes e preservando 0 sigilo. Fatores especificos do emprego Como local de trabalho, o tipo de emprego pode exereer uma impor- tante influéncia no consumo de alcool. E classica a lista de profissdes, como misicos, médicos, dentistas, enfermeiros, atores, “executivos”, gari i nhciros, entre outras, que tendem a apresentar uma elevada prevaléncia de abuso ou dependéncia de alcool. Os principais fatores que aumentam essa predisposig&o parecem ser a disponibilidade do alcool no trabalho, a pres- sGo social para beber, falta de flexibilidade ou tarefas repetitivas, isolamento de relagSes sociais ou sexuais, baixos niveis de supervi: pectiva no trabalho. (ROMAN & TRICE, 1970; MANNELLO ¢ cols., 1979) Politicas de combate ao uso do alcool no trabalho Alguns pressupostos orientam a elaboragio de qualquer programa de prevengao e recuperagiio de problemas relacionados ao alcool. Em primei- ro lugar, o trabalho é um local privilegiado para se elaborar e executar tais programas. Em algum momento, os individuos demonstram um certo grau de consciéncia do problema, motivagao ¢ reconhecimento acerca dos prejuizos causados pelo alcool. A elaboragio da politica deve ser feita “sob medida” para cada empre: envolvendo sempre os responsaveis pela politica de recursos humanos local e, na medida do possivel, os préprios funcionarios. O rigor do combate ao uso do alcool no trabalho também é bastante individualizado para cada empresa, na maioria das vezes, dependendo de seu tipo de atividade e do risco envolvendo terceiros, inclusive clientes. Seguindo esse raciocinio, uma empresa de trat porte aéreo certamente tera “uma tolerancia zero” para os funciondrios diretamente envolvidos com o véo, sendo necessdrio também, um teste de screening muito mais acurado quando da admissio e da atuagdo desses funcionirios. a, respeitando suas individualidad 26 Série Satide Mental ¢ Babalho - Vol. 1 Na claboragao da politica, alguns passos sio comuns, como 0 diag- néstico, a listagem das questées pertinentes, os objetivos, a explicitagao das normas, a divulgaco ¢ a avaliagdo do impacto causado pela politica nos diversos indicadores de uso do alcool, apesar de alguns de: freqiientemente suprimidos. ‘s itens serem Diagnostico Refere-se a avaliag3o do ambiente de trabalho e dos varios fatores diretamente enderegados ao quadro funcional. E importante o envolvimento do médico do trabalho, que pode colaborar aplicando testes de screening para alcoolismo rotineiramente em suas consultas, Na Tabela 3 encontram- se alguns dos itens a serem pesquisados na elaboragdo de um diagnéstico. Tabela 3. Dados de diagndéstico da empresa* FATOR ITENS Demografico Idade, sexo, raga, escolaridade, estado civil ¢ mimero de dias em que esteve doente nos tiltimos 12 meses. Frequéncia/Quantidade . Onde bebeu nos ultimos 12 meses. de Ingesta . Numero de dias em que bebeu nos ultimos 30 di: . Numero de doses nesses dias. . Numero de dias em que bebeu 5 ou mais doses. usualmente ingeridas Estagio atual de . Nunca pensou acerca disso. Motivaciio em reduzir . Jé pensou, mas nao é preocupante. a ingestdo de alcool . JA pensou, preocupa-se, mas ndio planejou nada nesse sentido. Ja pensou e planeja reduzir a ingesta. _ Jé comegou a reduzir a ingesta Plano e Intengaio de . Pretende reduzir no futuro. reduzir a ingesta Sabe como reduzir efetivamente * Modificado de COOK e cols. (1996) Sugere-se que esta avaliacdo seja feita na forma de questior S, aplicados anonimamente, assegurando-se um completo sigilo do individuo. Alcool ¢ Local de Trabalho 27 Questées pertinentes Baseado nos achados do diagnéstico da empresa e dos prejuizos causados pelo alcool, sao feitas algumas consideragées pertinentes aquela equipe e ambiente de trabalho. Objetivos Devem ser estabelecidos claramente os objetivos a serem atingidos dentro de um prazo estipulado por uma determinada politica. Dentro do possivel, envolver 0 maior numero de pessoas na formulagao destes, 0 que facilita o engajamento. Explicitagao e divulgacgao das normas/material educacional As normas referentes a politica de combate ao uso de alcool em deter- minada empresa devem ser de total acesso aos funcionarios, devendo estes estarem cientes da disponibilidade de tratamento, puni¢des administrativas, etc. Para tal, ¢ fundamental uma divulgagao eficiente. Esta vai determinar a chamada “taxa de penetracao da politica”, ou seja, a extensdo em que o programa atinge e modifica o comportamento de todos os funcionari A politica prevé, de uma mancira geral, um trabalho educativo com os funcionirios acerca dos riscos do alcool para a satide © possiveis con- seqiiéncias de trabalhar embriagado. E importante mais uma vez estabelecer 05 riscos relacionados ao alcool ¢ nao apenas ao alcoolismo, ou de quem é “alcodlatra”, termo leigo ¢ pejorative a quem desenvolve dependéncia ao alcool. Esse trabalho pode ser realizado utilizando varios meios, como pan- fletos, palestras ¢ videos informativos. CYSTER & McEWEN (1987), como intuito de avaliar especificamente este aspecto da politica, estudaram 4000 funcionarios de empresas de correios, concluindo que a utilizagao de videos educacionais foi o método mais eficiente, seguido de palestra ¢ resposta a questionarios, ¢, por fim, a distribuigdo de panfletos educativos foi o menos efetivo. E geralmente acordado entre os executores desse tipo de programa que uma abordagem combinando exemplos de prejuizos relacionados ao Alcool, ao lado de um estimulo a atividades de lazer e socializagao alternati- vas, ¢ significativamente eficaz. Avaliagao da politica Freqiientemente omitido, este item é de fundamental importancia para © sucesso da politica. Esta gera informacoes acerca da efetividade da politi- ca, possibilita ajustes freqiientes nas estratégias e reforga a sua propria importancia quando da constatac’o de que é custo efetiva, item este cobra- do em todos os programas que se desenvolvem dentro de uma empresa, sob a pena de serem excluidos. Verdadeiramente parece légico que, se a Politica 28 Série Saside Mental ¢ Trabalho - Vol. 1 de combate ao uso de alcool em determinada empresa apresentar custos mais clevados na sua execugdo do que os prejuizos gerados pelo proprio uso do alcool, esta tornar-se-d em breve obsoleta. HOLDER & BLOSE (1992), estudando especificamente este aspecto, em um periodo de 14 anos de exe- cugao da politica de combate ao alcoolismo em determinada empresa americana, concluiram que, a cada d6lar investido 0 retomno era de dois a sete délares, a longo prazo. O que certamente estimulou a diretoria em implementar ainda mais tal politica. Os principais indicadores de eficacia de uma politica so: taxa de absenteismo, ntimero de dias em licenga médica, taxa de acidentes, taxa de renovagao do quadro funcional, qualidade de desempenho no trabalho, numero de agées disciplinares e estimativa da eficiéncia do trabalho (RICHMOND, 1992) Oproblema dos paises em desenvolvimento Como ja comentado na definigao de local de trabalho, este ambiente é bastante diferente nos diversos paises e nas diversas empresas, dependen- do de varios fatores como 0 porte da empresa, a area de atuat estrutura de um departamento de Recursos Humanos, entre outros. Nos paises em desenvolvimento convivem multinacionais j4com um nivel organizacional “importado” de sua matriz com toda a sua experiéncia acumulada, indistrias nacionais emergentes, pequenas empresas, ativida- des rurais e atividades desenvolvidas na propria residéncia. Estes paises tido a um forte éxodo rural nas ultimas décadas, a um problema de moradia crescente, com proliferagao de favelas, além de outros problemas urbanos como transporte, educagio, satide e seguranga. Todo esse contexto social desfavoravel, ao lado dos problemas ine- rentes as populacGes de migrantes, claramente influenciam no aumento do uso do alcool. Nestes paises, a existéncia de uma politica nacional de promo- go a satide, com estrutura baseada na atengao primaria, é de fundamental importancia, até porque significativa parcela da populacao encontra-se desem- pregada ou sub-empregada. A segunda Conferéncia das Nagées Unidas para os Paises Menos Desenvolvidos, realizada em setembro de 1990, delineou um programa de agao para a década de 90, Entre outros itens, foi acentuada a valorizagao do “capital humano” nesses paises. Com este intuito, foram destacadas trés areas de atuagdo: politicas populacionais, servigos de satide e educagado / treinamento. (WHO EXPERT COMMITTEE, 1993) Em grandes empresas do setor ptblico ou privado, 0 modelo de im- plantagao da politica de combate ao uso de alcool assemelha-se ao praticado nos paises desenvolvidos, respeitando-se as peculiaridades da populagdo local. Porém, em menores empresas, empresas de atividade rural ou domeéstics assim como para a populagao desempregada ou sub-empregada, a implementa da politica cabe aos servigos de atengiio primdria ent&o adotado por esses Aleool ¢ Local de Trabalho 29 paises, sendo de fundamental importancia a participagao da comunidade no desenvolvimento ¢ na execugao da politica. Logo, é de fundamental importancia 0 desenvolvimento de uma poli- tica nacional e suas adaptagdes regionais/locais, a realizagao de um “diagnostico” para cada unidade representativa (comunidade, bairro, cida- de, estado, regido), assim como o treinamento de agentes promotores de satide, de preferéncia os ja envolvidos em outras atividades de satide em determinada comunidade. E importante mais uma vez acentuar a necessida- de da ampla divulgagao dessas atividades governamentais, de modo que seja de facil acesso para as empresas e comunidades diretamente dependen- tes destas. Ocontrole do uso de alcool no trabalho através de testes bioquimicos Ja utilizados como “medida essencial”, ao lado de punigoes rigidas, no controle do uso do alcool no trabalho no passado, os testes de dosagem de alcool, como utilizagao de “bafometros” ou mesmo coleta de amosira de urina ou sangue, atualmente sao bastante controversos como medidas efi- cazes em si. Parece que 0 desenvolvimento dos conceitos de promogio de satide e de qualidade total em uma empresa tornou essas medidas ampla- mente inaceitave O uso de medidas de controle como tais testes deve obedecer a uma rigida orientagao ética, obviamente nado devem ser utilizadas como uma roti- na dentro de uma empresa, a menos que haja grave momento que as justifique. Porém, para certas atividades, como motoristas ¢ pilotos de aviéo, opcrado- res de maquinas pesadas, alguns profissionais de sauide, enfim qualquer atividade que ponha em risco a vida de tercciros, a realizagao destes testes pode ser considerada ¢ justificada. A questao ética nio é a tinica que dificulta a utilizagdo desses testes. O clevado custo na sua execugiio regular ao lado de demonstragées de uma eficacia contestavel em reduzir o consumo de alcool, também sao desestimu- lantes. Outro grande problema sio os falsos resultados, ou seja, os falsos negativos (0 funciondrio encontra-se intoxicado e nao é detectado pelo exa- me, principalmente os mais simples e de menor custo) ¢ os falsos positivos (0 funcionario nao se encontra intoxicado, porém 0 exame o “acusa” literal- mente). Este ultimo, seguramente é 0 maior problema e o que traz graves conseqiiéncias tanto para o funcionério quanto para a empresa, se acionada juridicamente. Entretanto, ha experiéncias positivas com 0 uso de programas de testes de screening em determinadas empresas, com relatos de redugdo do absenteismo em até 40%, das acdes disciplinares e do mimero de acidentes em 50%, (OSTERLOH & BECKER, 1990) Em 1986, 25% das grandes empre- s americanas adotavam esse tipo de programa, comparado a apenas 3,2%

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