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Lamentações 3.17-33
Entretanto, o profeta Jeremias por mais que desejasse, não podia esquecer-se do mal
que tomara conta do seu povo, da aflição que imperava violentamente, da escassez impiedosa
que fazia com que as crianças desfalecessem de fome e sede pelas ruas e levava as mães a
cozerem seus próprios filhos, o fruto de seu ventre e comê-los como se fossem o pão que
repartimos a cada dia.
Jeremias não tinha como esquecer tudo isso, não podia ignorar o que estava
acontecendo. Ele sabia que todo este mal viera sobre o povo pela mão de Deus, visto haverem
pecado contra o Senhor. Assim, levanta um lamento onde expressa a dor, a agonia, o desespero
e o sofrimento de sua alma e que culmina na declaração dos versos 17 e 18. Porém, mesmo
com sua alma amargurada, a dor rompendo os limites da razão e do entendimento, mesmo com
as circunstâncias desoladoras despedaçando seu coração, ainda assim, num ímpeto de
incontestável lucidez, ele declara: “Quero trazer à memória o que me pode dar esperança” (21).
Todavia, diante deste quadro grotesco, o que poderia gerar novas expectativas? Como
“trazer à memória o que pode dar esperança”?
Muitas vezes nos momentos de dor e aflição e ainda quando estamos sob a disciplina
do Senhor, nos tornamos murmuradores e lançamos nossa amargura sobre Deus, como se Ele
fosse o culpado do nosso sofrimento. Agimos como se Deus tivesse o dever de consolar-nos,
confortar-nos e responder positivamente aos anseios de nossa alma; e quando isso não
acontece, concluímos erroneamente, que Deus não está sendo misericordioso conosco.
Quando criamos falsas expectativas, perdemos o foco e deixamos de esperar confiantemente
no Senhor e nas suas ternas misericórdias.
Jeremias declara no verso 24 que Deus é a sua porção. O Senhor Todo-Poderoso era a
sua parte, a sua herança. Como sacerdote do Deus Altíssimo, certamente ele estava recordando
aqui, as palavras do Senhor a Arão e consequentemente a todos os sacerdotes e levitas: “Eu
sou a tua porção e a tua herança no meio dos filhos de Israel” (Números 18.20).
Ter consciência de quem somos nós e de quem Deus é, leva-nos a desenvolver uma
relação saudável e reverente com o Criador. É por não entenderem que Deus é soberano,
Senhor de tudo e de todos que muitas pessoas se acham no direito incoerente de dizerem a
Deus o que Ele deve e não deve fazer; como deve agir e o tempo que tem para responder às
orações. Eu determino isto; eu não aceito aquilo, são alguns dos absurdos que encontramos
hodiernamente. Pessoas que consciente ou inconscientemente querem fazer de Deus seu servo
e não entendem que eles, é que o devem ser. Não é determinando, decretando ou mesmo
revoltando-nos que alcançaremos a graça Divina, mas entendendo corretamente nosso papel
enquanto servos e buscando a face gloriosa do Senhor nosso Deus. Precisamos reconhecer
que somos apenas vasos de barro nas mãos do Oleiro. Jeremias tinha consciência disso e pôde
afirmar com convicção, no verso 25 que “Bom é o Senhor para os que esperam por ele, para a
alma que o busca”.
Calar a voz de um coração aflito não é tarefa fácil. A dor esmagadora da alma que anseia
por paz e consolo, leva muitas vezes, ao desespero e à murmuração e quando as coisas não
vão bem, via de regra, culpamos o Senhor por nossas próprias desventuras. Jeremias que já
havia lamentado tanto e com motivos justos, percebe que o silêncio é melhor que a murmuração,
a confiança é melhor que o desespero, a fé é melhor do que a dúvida e que a sujeição é melhor
que a rebeldia.
Quando estamos sofrendo, queremos agir e acabar logo com a dor e o sofrimento, custe
o que custar. Contudo, o profeta nos ensina que em meio às intempéries e vicissitudes da vida,
devemos não apenas manter o silêncio, evitando as murmurações, mas aceitar a soberana
vontade de Deus para nós (ver 26-28).
Jeremias sabia bem o que é sofrer e isto fica claro nos versos 17 e 18. Contudo, murmurar
não é a melhor saída, pois a murmuração anda de mãos dadas com a ansiedade. Assim,
Jeremias nos convida a aguardar a salvação que vem de Deus numa postura de profunda
quietude: “Bom é aguardar a salvação do SENHOR, e isso, em silêncio” (26). Não obstante,
somente aguardaremos em silêncio se confiarmos em Deus e somente confiaremos Nele, se o
conhecermos intimamente. De forma prática, nossa confiança é revelada quando aceitamos
integralmente a vontade do Senhor e nos submetemos totalmente a ela.
Sendo assim, a orientação de Jeremias aos cativos foi: “ponha a boca no pó; talvez ainda
haja esperança. Dê a face ao que o fere; farte-se de afronta. O Senhor não rejeitará para
sempre” (29-31). Pôr a boca no pó era sinônimo de humilhação e submissão. Significava o
reconhecimento da superioridade de outrem. Isto nos faz lembrar das palavras do apóstolo
Paulo aos Filipenses, no capitulo 2, verso 3: “Nada façais por partidarismo ou vanglória, mas
por humildade, considerando cada um os outros superiores a si mesmo”. Neste sentido,
Provérbios 15.33 nos diz que “a humildade precede a honra”. Portanto, devemos nos submeter
humildemente ao Senhor nosso Deus, prostrando-nos ante a majestade Divina, pois talvez
assim, ainda haja esperança.
Conclusão
Concluo lembrando que devemos confiar inteiramente nas misericórdias do Senhor, pois
elas se renovam a cada manhã. Contudo isto deve acontecer em completa submissão à sua
vontade, entendendo quem somos nós e quem Ele é, pois somente assim, entenderemos que
o silêncio é melhor que a murmuração.