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INVEJA E CONTENTAMENTO

CATEGORIA: COMPORTAMENTO / FAMÍLIA

Copyright © 2006 por Eduardo Rosa Pedreira.

Gerência editorial: Silvia Justino


Preparação e revisão de texto: Equipe MC
Supervisão de produção: Lilian Melo
Capa: Douglas Lucas
Crédito da imagem: Scott Heiner

Os textos das referências bíblicas foram extraídos da Nova Versão Internacional


(Sociedade Bíblica Internacional), salvo indicação específica.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Pedreira, Eduardo Rosa


Inveja e contentamento / Eduardo Rosa Pedreira. — São Paulo:
Mundo Cristão, 2006. (Coleção pecados e virtudes da família)

ISBN 85-7325-448-3

1. Comportamento humano 2. Contentamento 3. Família —


Aspectos religiosos 4. Inveja 5. Pecados capitais 6. Vida cristã
7. Virtudes cardeais I. Título. II Série

06-1587 CDD 248.4

Índices para catálogo sistemático


1. Família: Pecados e virtudes: Vida cristã: Cristianismo 248.4
2. Pecados e virtudes da família: Vida cristã: Cristianismo 248.4

Publicado no Brasil com a devida autorização e com todos os direitos reservados pela:
Associação Religiosa Editora Mundo Cristão
Rua Antônio Carlos Tacconi, 79 — CEP 04810-020 — São Paulo — SP — Brasil
Telefone: (11) 2127-4147 — Home page: www.mundocristao.com.br

Editora associada a:
• Associação Brasileira de Editores Cristãos
• Câmara Brasileira do Livro
• Evangelical Christian Publishers Association

A 1ª edição foi publicada em julho de 2006, com uma tiragem de 3.000 exemplares.
Impresso no Brasil
10 9 8 7 6 5 4 3 2 1 06 07 08 09 10 11
SUMÁRIO

Introdução 7

P ARTE UM — T IRANDO AS LUVAS : U M “ QUASE CONTO ” SOBRE


A INVEJA DENTRO DAS RELAÇÕES FAMILIARES

1. Ravello 13
2. O encontro 21
3. O começo 29
4. A provocação 35
5. A revelação 41
6. As luvas na gaveta 45
7. A despedida 53
8. No avião 55

P ARTE DOIS — O CONTENTAMENTO NAS RELAÇÕES FAMILIARES


9. O império do descontentamento 61
10. O anonimato do descontentamento 67
11. A dimensão teológica do descontentamento 71
6 INVEJA E CONTENTAMENTO

12. A dimensão psicológica do descontentamento nas


relações familiares 79
13. O contentamento na relação conjugal 85
14. Contentamento na relação entre pais e filhos 97

Conclusão 107
Sobre o autor 109
INTRODUÇÃO

OS S E T E P E C A D O S C A P I TA I S E A S S E T E
VIRTUDES CARDEAIS

HOUVE UM TEMPO em que reinavam a corrupção religiosa, a su-


perstição, o medo, a tortura, as fogueiras, as grandes batalhas e as
guerras. Os guerreiros nada mais eram que “cristãos” em busca da
purificação do mundo dos males trazidos pelos não-cristãos.
Naquele tempo de trevas espirituais, alguns homens e mulhe-
res fizeram uma opção pela santidade. Não mais podendo viver no
mundo, fugiram dele. Construíram uma vida protegida pela soli-
dão dos desertos ou pelos muros dos conventos. Enquanto os ricos
e poderosos se precaviam contra a pobreza atrás de seus castelos,
monges e monjas se preservavam contra toda impureza no interior
de seus desertos.
Os homens e as mulheres que optaram pela vida monástica co-
meçaram a perceber intimamente a presença da sujeira espiritual
que os levara a se afastar do mundo. Compreenderam que não bas-
tava conhecer Deus a fundo, enchendo a alma com o conhecimento
8 INVEJA E CONTENTAMENTO

de sua Palavra e presença; seria necessário também conhecer a si


mesmos.
Quanto mais conheciam a Deus, tanto mais sua consciência os
levava ao autoconhecimento. Quanto mais se faziam amigos de
Deus, mais sentiam a necessidade de conhecer o pecado que se lhes
alojava no coração. Estavam conscientes de que numa batalha quan-
to mais informações se tem do inimigo,
Meu pecado é maior a possibilidade de vitória.
meu vício de O estudo aprofundado do pecado
cada dia. levou-os a associá-lo a um vício. Percebe-
ram o ser humano, cujas ações são con-
dicionadas pela natureza pecaminosa, como alguém “viciado” em
pecar. Só pecamos em atos porque somos, por natureza, pecadores
na alma. Meu pecado é meu vício de cada dia.
Em busca de melhor entender o pecado, esses cristãos o percebe-
ram como um curinga de muitas faces. Seu mapeamento exaustivo
resultou numa lista que definiu os sete pecados capitais. Foram deno-
minados “capitais” não em virtude de sua gravidade, mas do núme-
ro e da variedade de outros pecados que deles nascem. São como as
sete raízes de uma imensa árvore, repleta de diferentes galhos, pro-
dutora de infindáveis frutos.
Os pecados capitais não foram, contudo, o único resultado
daquele trabalho exaustivo. Para cada um deles descobriu-se uma
virtude correspondente, o outro lado da moeda, o antônimo do
pecado capital. São as chamadas virtudes cardeais, estrelas reluzen-
tes a guiar todos aqueles que desejam libertar-se do escuro céu dos
pecados capitais.
No decorrer do tempo, essas listas sofreram várias modificações.
Vamos nos concentrar apenas naqueles pecados e virtudes original-
mente listados:
INTRODUÇÃO 9

Pecados Virtudes

Orgulho Humildade
Inveja Contentamento
Ira Mansidão
Preguiça Coragem
Avareza Generosidade
Gula Moderação
Luxúria Pureza

Muitos anos se passaram e hoje a palavra “pecado” está cada vez


mais marginalizada do vocabulário, relegada a segundo plano. A
história de insanidade da igreja cristã, rotulando tudo de “pecado”,
gerou forte reação da sociedade. Com a chegada das ciências da
alma, foi substituída por alienação, herança familiar etc. Além dis-
so, os limites da moralidade e da ética desapareceram.
Num mundo onde tudo é permitido, falar em pecado está total-
mente fora de moda. Encontrei um exemplo disso nas correspon-
dências trocadas entre leitores e uma famosa colunista de um jornal
americano, que funcionava como conselheira para aqueles que lhe
escreviam sobre questões pessoais. Um deles observou: “Querida
Ann, tenho dormido ultimamente com três mulheres diferentes, e
nenhuma delas sabia da existência da outra. Um dia, por acaso,
duas delas se encontraram e, ao comparar informações, descobri-
ram minha trama. Que devo fazer? Por favor, não me venha com seu
julgamento moral, falando em pecado”.
A colunista então respondeu: “Caro senhor, o que nos difere dos
animais é o senso de moralidade concedido por Deus aos seres hu-
manos. Uma vez que o senhor parece não ter este senso básico, sugi-
ro que procure aconselhar-se com um veterinário!”.
10 INVEJA E CONTENTAMENTO

Hoje, mais do que nunca, é preciso reacender em nós a noção


exata do que é pecado — uma percepção capaz de nos enxergar como
somos, e a nossa família, na sua mais pura realidade. Apenas essa
visão poderá nos levar a cultivar as virtudes opostas a tais pecados.
Por mais que possa estar fora de moda, o pecado encontra-se
mais próximo e presente em nós e em nossos relacionamentos do
que somos capazes de imaginar. A boa notícia é que cultivar as vir-
tudes cristãs pode nos ajudar a lidar com esse mal.
Esse é o objetivo da coleção Pecados e virtudes da família. Pre-
cisamos reconhecer as características do pecado e cultivar seus
antídotos. Neste volume, discutiremos
Num mundo onde a inveja dentro das relações familiares e
tudo é permitido, seu oposto, o contentamento.
falar em pecado
No próximo volume, orgulho e hu-
está totalmente
fora de moda. mildade farão “ponto e contraponto”.
Assim, nos cinco livros restantes que
completam a coleção, estabeleceremos o grande pano de fundo das
principais questões que envolvem o relacionamento familiar.
Cada livro será dividido em duas partes. Para melhor assimi-
lação do conteúdo deste primeiro volume, decidi utilizar uma nar-
rativa ficcional, sob a forma de um pequeno conto, para tratar da
temática inveja. Aliás, se tivesse de classificá-lo, talvez o chamasse
de romance psicológico. Seus personagens não são identificados
por detalhadas descrições físicas, ambientais ou geográficas, e
sim por seu mundo interior. Não se deixam conhecer pelo rosto,
mas pelo coração.
Convido-o, portanto, a iniciar uma viagem para dentro de si
mesmo, deixando-se guiar pelo poder da imaginação.
Parte um
TIRANDO A S L U VA S
UM “QUASE CONTO” SOBRE A INVEJA DENTRO
DA S R E L A Ç Õ E S FA M I L I A R E S
1
RAV E L L O

SÉCULO VI, ITÁLIA. Um grupo de fugitivos romanos tenta desespe-


radamente escapar do domínio dos povos bárbaros. Sobem até o
topo das montanhas Lattari e ali constroem uma pequena cidade.
Sua localização e difícil acesso são um escudo natural. Além de pro-
teção, ganham um cenário de rara beleza. Inicialmente chamaram a
cidade de Rebello, uma alusão à maneira como eram conhecidos
seus habitantes: Rebelli (rebeldes). Depois passaram a chamá-la de
Ravello, cujo significado é casa maravilhosa.
SÉCULO XXI. O mesmo cenário, a Itália; a mesma cidade, Ravello.
Após longuíssimos anos de história e de milhões de personagens que
habitaram e visitaram aquele lugar, lá estava eu como mais uma
figura a compor o cenário. Em meu carro, dividia com outras de-
zenas de automóveis e ônibus de turismo as estreitas vias de um
pedaço de terra dos mais disputados no verão italiano. Quase não
acreditava estar dirigindo a caminho da cidade de Ravello, na costa
Amalfitana, sul da Itália, beleza do Mediterrâneo.
14 INVEJA E CONTENTAMENTO

Foi um momento realmente inacreditável. O encantamento fez


daquela segunda-feira um dos dias mais belos da minha vida! Re-
conheço que a singularidade das circunstâncias transformava-me
os olhos numa lente através da qual tudo era bonito: o sol invadia
a manhã e poetizava com as nuvens, que caprichosamente com-
binavam com um azul celeste de inconfundível beleza. Entretanto,
para as centenas de pessoas que buzinavam impacientes com o con-
gestionamento que se formava à frente, parecia um dia como ou-
tro qualquer.
Pouco importava a possível banalidade com que as pessoas vi-
viam aquele dia. Em meu coração ele era uma gota singular no
oceano da minha vida. Quem me olhasse concluiria que se tratava
apenas de mais um turista encantado num determinado ponto da
costa Amalfitana, um dos pedaços mais
Sentia pulsar bonitos do planeta.
dentro de mim a
Se, no entanto, alguém pudesse adi-
gostosa sensação
de estar realizando
vinhar como me sentia naquele momen-
um sonho. to, perceberia que a beleza daquele dia
combinava com minha alegria interior.
É assim! Quando desfrutamos o doce sabor de nossas conquistas,
tudo fica mais bonito. Sentia pulsar dentro de mim a gostosa sensa-
ção de estar realizando um sonho. Estava orgulhoso de mim mes-
mo, pois os dois últimos anos haviam sido marcados por muito
planejamento, pesquisa, aperto financeiro, perseverança, para que
afinal lá estivesse!
Depois de uma hora subindo pelas íngremes rodovias das mon-
tanhas Lattari, entrei em Ravello. A cidade não poderia ser mais
linda, tranqüila, charmosa e romântica. Creia-me, não vai aqui
nenhum exagero de alguém encantado por estar num lugar tão
sonhado.
RAVELLO 15

Mesmo sendo minha primeira vez, não posso dizer que não co-
nhecia aquela pequena e maravilhosa cidade. Após longas horas na
Internet, consultas a livros, vídeos, eu já conhecia ruas e becos, bi-
bliotecas e livrarias, bares e restaurantes; e isso não só pelos mapas
disponíveis, mas pelas fotografias que despertavam-me mais do que
um conhecimento prévio do lugar. Era natural que experimentasse
uma enorme ansiedade pela chegada iminente.
Assim que desci do carro, constatei o óbvio: conhecemos um
lugar somente quando a ponta do pé e todo o coração tocam nele.
Antes disso, mapas e fotografias são apenas pequenos aperitivos,
incapazes de revelar o pleno sabor de se estar realmente lá.
Procurei imediatamente o Belvedere, um terraço de onde se di-
visava a desconcertante beleza dos vales, que se mostravam vaido-
samente belos ao olhar de quem os contemplava. A combinação das
pequenas cidades, a vegetação e a beleza do mar fazia daquele cená-
rio um espetáculo único, mágico.
Difícil era conter a excitação. A cidade respirava história e cul-
tura. Sentia-me como uma criança que corre de um lado para ou-
tro, tentando consumir um pirulito grande demais. Assim, corri até
o Mosteiro de São Francisco, construído pelo próprio São Francis-
co de Assis. Visitei a Villa Rufolo, com sua arquitetura medieval e a
grande Catedral construída no século XI.
Meus primeiros momentos foram de intensa gula visual, uma
busca por absorver cada gota de beleza e história daquele lugar.
Após o deslumbramento inicial, dirigi-me à Universidade de
Ravello. Afinal, estava ali para muitas horas de trabalho, e não so-
mente para curtir a beleza do lugar.
O campus da universidade não era tão grande, e até combinava
com a singeleza e simplicidade do lugar. Para qualquer lado que se
olhasse viam-se bandos de jovens carregando livros sob os braços,
16 INVEJA E CONTENTAMENTO

trazendo no rosto as marcas de estarem passando ali provavelmen-


te os melhores anos de sua vida, mesmo que ainda não tivessem
consciência disso. À multidão de estudantes juntavam-se profes-
sores, sempre carregando maletas, livros ou mesmo calhamaços
de pesquisas.
O tom azul marinho do macacão do pessoal da manutenção se
misturava ao impecável uniforme cinza da turma da administra-
ção, enquanto secretárias com seus tailleurs davam um tom mais
clássico ao ambiente notadamente informal. De repente, todos se
cruzavam apressados, cada um rumo ao
Aprendi a ler o
próprio destino, numa pequena praça
coração das da cidade universitária.
pessoas por sua Em meio à adrenalina turística que
expressão facial. energizava meu corpo já cansado, dedi-
quei-me a uma das coisas que mais me
proporcionavam prazer. Procurei um pequeno banco, meio es-
condido entre plantas muito bonitas, e sentei para observar. Apre-
ciando a beleza e a agitação à volta, corri a mão automaticamente
para dentro da bolsa, buscando minha companheira de olhar, o
instrumento capaz de cristalizar nas cores de um papel toda a sin-
gularidade da visão, a máquina fotográfica.
Desisti. Afinal, como as pessoas reagiriam vendo-me em meio
aos arvoredos, tirando fotos das pessoas compulsivamente? Dei-
xei a máquina quieta, até por saber que naquele próximo mês nós
dois estaríamos em intensa atividade. A razão de minha viagem
era um curso de fotografia. Seria um mês de muito trabalho, mas
recheado de profundo prazer, pois estaria fazendo uma das coisas
de que mais gostava.
Minha relação com a fotografia começou quase por acaso. Por
conselho médico, tive de procurar uma atividade que me desse
RAVELLO 17

algum nível de relaxamento em meio ao meu estilo de vida


estressante. Foi aí que me voltei para a fotografia. Vi no ato de foto-
grafar um simples canal de escape das tensões. À medida que o pra-
zer aumentava, crescia a necessidade de
saber mais sobre a técnica de fotografar. Em meio a
Uma simples foto já não me satisfa- pequenos
arbustos, um
zia; eu queria dominar técnicas que me
pouco escondido
proporcionassem a melhor luz, o melhor
pelas folhas e
ângulo, a posição ideal. Vieram os cur- galhos, alguém
sos, e quando dei por mim a fotografia me observava.
deixara de ser um simples hobby, para se
tornar um saudável vício, uma ambicionada busca por aperfeiçoa-
mento. Depois disso, meus momentos nunca mais se perderam no
tempo e no espaço; eu os congelava na máquina, e os revelava para
serem compartilhados por outros.
Somente após meus primeiros avanços, percebi que tinha uma
tendência especial para fotografar rostos humanos. Eram sempre
minhas melhores fotos. Tornei-me capaz de esperar horas e horas
pelo melhor ângulo, a fim de captar aquele pequeno levantar de
sobrancelhas, um imperceptível franzir de testa, o invisível brilho
nos olhos, aquele traço facial singular de cada um. No fundo, eu
buscava fotografar o imperceptível pelos olhos comuns, e que ape-
nas uma lente fotográfica consegue expressar e guardar.
Após registrar centenas de rostos fui entendendo o porquê da
minha sede pela fotografia, e em especial pelo rosto: eu, que tra-
balhava com pessoas, estava em busca de conhecer melhor o ser
humano e constatar, mediante a fotografia, que de fato o rosto é o
espelho da alma. Aprendi a ler o coração das pessoas por sua ex-
pressão facial, pois o rosto é o registro físico daquilo que acontece
dentro delas.
18 INVEJA E CONTENTAMENTO

As expressões faciais descobrem sentimentos e emoções natu-


ralmente invisíveis. Fotografar as reações tatuadas na face huma-
na já não era um escape das tensões, mas uma extensão da minha
vocação; um maravilhoso instrumento que descobri ser capaz de
me ajudar a fazer melhor meu trabalho.
Talvez agora você entenda por que me encontro num lugar tão
lindo, e prestes a começar um curso tão sonhado. Além disso, pa-
rar e sentar num banco de onde se podia ver as pessoas, observar
as centenas de rostos que desfilavam diante de mim sem que elas
pudessem com igual clareza me perceber era tudo o que eu queria.
Permaneci parado por quase uma hora, hipnotizado pela imen-
sa variedade de sensações captadas dos rostos que passavam diante
de mim. A melhor parte desse exercício de observação era o ano-
nimato em que eu permanecia. Aquelas pessoas não sabiam que
estavam sendo observadas. Alguns passavam e me olhavam, mas
quase não me notavam, pois eu era apenas alguém sentado num dos
muitos bancos daquele lugar.
Na verdade, era bem mais! Um observador atento, uma má-
quina fotográfica humana fotografando. Via sem ninguém me ver.
Puro engano! Logo descobri que me iludira, em meu suposto
anonimato. Para minha surpresa, alguém mais, além de mim, pare-
cia saber que eu estava ali observando tudo. Num banco do outro
lado de um pequeno lago, numa localização muito parecida com
aquela em que me encontrava, alguém, em meio a pequenos arbus-
tos, um pouco escondido pelas folhas e galhos, me observava.
Imediatamente me senti como uma criança flagrada numa
traquinagem. Ao perceber que alguém me observava, não pude
deixar de notar dentro de mim uma pequena faísca de pânico.
Agora era eu quem estava sendo observado. Confesso que detestei
a sensação de alguém fazer comigo o que eu fazia com as pessoas.
RAVELLO 19

Desconcertei-me. Fui descoberto, fiquei nu, exposto, meu anoni-


mato violado.
Desviei o olhar na ingênua tentativa de convencer meu obser-
vador de que eu não o via. Virei o rosto, tentando ignorá-lo. Não
agüentei a ansiedade. Olhei de novo. Ele continuava lá, com os olhos
grudados em mim, fotografando-me com a visão. Virei novamente
o rosto, já sentindo a respiração ofegar.
De dentro do feixe de sensações que me tomaram naquele mo-
mento, começou a nascer certa irritação, prenúncio de ira. Nunca
me dera conta de como um olhar é capaz de invadir a privacidade de
alguém. Determinados olhares podem constituir-se num dos mais
graves atos de invasão da privacidade.
Resolvi enfrentá-lo e abandonar aquele jogo infantil de escon-
de-esconde. Atirei-lhe um olhar de enfrentamento na intenção de
atingi-lo, como se fosse uma bala capaz de dizer que eu também o
estava observando. Decepção. Frustração. Vazio. Ele já não estava
lá. Fiquei furioso. Vasculhei o lugar mais uma vez com o olhar, pro-
curando-o em meio à multidão. Irritante constatação: ele se fora.
Olhei o relógio: estava em cima da hora da primeira aula. Diri-
gi-me apressadamente ao prédio em que as aulas aconteceriam.
Na mesma velocidade dos meus passos, perguntas formavam-se den-
tro de mim: quem seria aquele homem? Como me achara ali no
meio de tanta gente? Por que me observava? Por que saíra de forma
tão mágica como aparecera?
As perguntas começaram a me angustiar. Decidi, então, na rapi-
dez daquela curta caminhada, esquecer o assunto e aproveitar o
momento. Mal sabia que mais cedo do que poderia imaginar, iria
encontrar resposta para todas essas perguntas.

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