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Direito Comercial I (Aulas Práticas) – Professor José Reis

Ano Lectivo 2011/2012


Por: Maria Luís Veloso Guedes de Carvalho
DIREITO COMERCIAL I AULAS PRÁTICAS
Aula nº 1 de 13/10/2011 Sumário:
CASO PRÁTICO 1) (feito 2016/2017)

Artur, estudante da FDUP, comprou uma máquina de café. No primeiro dia do período de provas orais
instalou uma "banca" num dos pisos do edifício, servindo aos seus colegas café ao preço de €0,25. Após ter sido
proibido pelo Conselho Directivo de exercer essa actividade, revendeu a máquina à Associação de Estudantes, que
passou a utilizá-la para vender cafés na sala de convívio.

Os actos objectivamente comerciais estão referidos no 2º CCom.

Para ser considerada comerciante, a pessoa não tem de ter apenas essa profissão, nem tem essa de ser a
profissão principal.

Para Artur ser comerciante (13º/1 CCom) tem de praticar reiteradamente actos de comércio e fazer do
comércio profissão. Tem também que ter capacidade de exercício.

Uma empresa só o é se tiver valor de mercado autonomamente considerado.

Neste caso concreto temos uma prestação de serviços. O que diz a lei comercial quanto à prestação de serviços?
230º/2 CCom. Ex: Caso A faça contrato pré-fixado com o restaurante onde vai almoçar todos os dias, pagando 50€
por mês, o risco corre por conta do vendedor, que pode perder dinheiro. Neste caso temos um fornecimento de
serviços. O ginásio, por exemplo, é já um contrato duradouro para aceder aos serviços.

Há que interpretar analogicamente o “fornecer” do 230º/2 CCom, e não o tipo fornecido.

Analogia legis – Ex: 230º/2 CCom abrange também o fornecimento de serviços.

Analogia iuris – princípios de Direito que se aplicam – “Toda a prestação de serviços no âmbito de uma empresa é
comercial.”

A prestação isolada de serviços coloca mais problemas. Devemos ter em conta o carácter empresarial (princípio geral
do Direito Comercial) ou não do serviço em causa. Agências imobiliárias, empresas de transportes e actividades
prestadoras de serviços são diferentes do “fornecimento” que a lei qualifica como sendo comercial.

A actividade de Artur não é praticada no âmbito de uma empresa. É uma actividade não comercial. É uma compra
civil, um acto unilateralmente comercial, e assim os efeitos são comerciais em relação a ambas as partes. No caso não
há empresa de Artur, e ele também não é comerciante.

Já a venda à Associação de Estudantes, embora se trate de uma revenda, não se comprou com esse intuito, logo não
é comercial – 464º/1 CCom.

Aula nº 2 de 20/10/2011
Sumário:
Caso prático: qualificação de actos de comércio e comerciantes.
Dia 27 de Outubro não há aula!

O lucro é uma condição necessária para a empresa?


 Orlando de Carvalho diz que sim, mas
 Coutinho de Abreu diz que não, pois o lucro não consta necessariamente do conceito de
empresa.

As pessoas colectivas regem-se pelo princípio da especialidade do fim.

As sociedades comerciais são comerciantes (13º/2 CCom).

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Direito Comercial I (Aulas Práticas) – Professor José Reis
Ano Lectivo 2011/2012
Por: Maria Luís Veloso Guedes de Carvalho
Associações de Estudantes ou quaisquer actividades de fim altruístico não podem ser comerciantes. Podem explorar
uma reprografia ou um bar, mas não são consideradas comerciantes por isso (14º/1 CCom).

Não pode a Associação de Estudantes ter como actividade principal a actividade comercial. Se essa
exploração passar a ser a principal prioridade da Associação, para obter lucro e distribuí-lo pelos associados, ao invés
de o utilizar para financiar as suas actividades principais, qual seria a consequência?

Pelo princípio da especialidade do fim, se a Associação se desviar do seu fim, diz o 182º/2/b) e 183º/2 CC
que a Associação se extingue.

As cooperativas podem ser consideradas comerciantes? Elas geram lucro e, se têm esse excedente, parecem não
estar excluídas da comercialidade pelo 14º/1 CCom. Serão consideradas comerciantes por analogia com o 13º CCom.

Na opinião do Professor José Reis, o 13º CCom não tem que ser lido de forma fechada, não está necessariamente a
fazer um elenco taxativo dos comerciantes. Se entendermos que este é um elenco fechado, então o 14º/1 CCom
deixaria de fazer sentido, porque as cooperativas já estariam excluídas pelo 13º CCom. Assim, as cooperativas poderão
ser consideradas comerciantes desde que o seu objecto estatutário preveja a prática de actos de comércio.

Para as pessoas singulares, a actividade comercial não tem que ser exclusiva, bastando que seja reiterada,
continuada. De facto, basta isto para que a actividade esteja sujeita ao regime dos comerciantes.

CASO PRÁTICO 1) (cont.)

Artur adquire a máquina de café para a prestação de um serviço. Não é um acto comercial, pois a prestação
de serviços não está inserida numa empresa (Ex: Cabeleireira que atende os seus clientes em casa – não é
naturalmente uma empresa).

A compra da máquina de café não é comercial porque não a comprou com o intuito de revenda, mas
comprou-a antes para a utilizar e só depois a vendeu (464º/1 CCom).

Imagine-se agora que Artur não era aluno de Direito e tinha efectivamente uma empresa, era dono de um
café. Tinha uma empresa e era comerciante, pois toda a prestação de serviços no âmbito de uma empresa é comercial.
Ele compra uma máquina nova de café para servir cafés. Aquela compra é comercial, porque é um acto
subjectivamente comercial. Mas será objectivamente comercial? Ex: Uma fábrica compra tecidos para depois fabricar
roupa e vender a retalhistas. Terá de praticar uma série de actos acessórios à sua actividade principal, por isso
entende-se, de uma forma geral, que qualquer acto praticado no âmbito das empresas do 230º CCom é um acto
objectivamente comercial, mesmo sendo praticado por um não comerciante. Este entendimento é pacífico.

As coisas já não são tão claras para as empresas fora do âmbito do 230º CCom (como é o caso do Artur,
dono do café acima exemplificado). Aqui já há quem defenda que só os actos típicos da empresa em causa é que
devem ser considerados objectivamente comerciais.

O que devemos entender? Neste sentido há que ver os artigos 463º e 464º CCom, mas tudo o que não seja
um acto típico já não é abrangido por estes artigos. Ex: Uma empresa prestadora de serviços. Por analogia iuris poderá
ser considerada comerciante. Na visão apresentada, os actos não típicos não são comerciais, por estas empresas não
estarem tipificadas no 230º CCom, mas por uma questão de coerência normativa, o Professor José Reis entende que,
considerando-se a empresa comercial (por analogia iuris), todos os seus actos devem ser considerados comerciais
(por analogia iuris), independentemente da sua tipicidade, apesar de a empresa não vir prevista no 230º CCom.

Regressando ao caso prático, uma vez que Artur não é comerciante, a compra da máquina de café não é um
acto comercial. Sendo civil esta compra da máquina, que efeitos traz? Civis ou comerciais? Produz efeitos comerciais,
por extensão do 99º CCom.

Imagine-se agora que o Artur não estava sozinho, e exercia esta actividade com Armando. O que sucede?
Compraram a máquina não a pronto, mas a 30 dias, e no fim do prazo não pagam o preço. Quem responde pelo não
pagamento do preço? Qual o regime?

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A regra para as obrigações plurais comerciais é a solidariedade (100º CCom), mas aqui não se aplica, pois o
acto é civil e com efeitos civis relativamente a Artur e Armando, não se inserindo na extensão do 99º CCom. A
responsabilidade dos dois é conjunta e não solidária. Cada um irá pagar a sua quota parte (100º ʃ CCom). O credor
não pode exigir a totalidade a qualquer um deles, apenas podendo exigir a cada um a sua quota parte.

Concluindo o caso prático: A venda que Artur faz à Associação de Estudantes não é um acto de comércio,
porque a venda só é acto de comércio se o bem for comprado com o intuito de revenda. No entanto, a compra pela
Associação é um acto comercial.

Artur vende não comercial


Associação de Estudantes compra comercial

Sendo um acto unilateralmente comercial, aplica-se o regime do 99º CCom.

CASO PRÁTICO 2)

Belmiro é um jovem de 17 anos que organiza actividades "radicais" no rio Minho. Recentemente adquiriu dois
barcos de borracha para o seu negócio, tendo para o efeito contraído um empréstimo de €2500 junto de Carlos, um
amigo da família que explora uma pensão em Melgaço. Carlos emprestou ainda €3000 ao seu amigo David,
serralheiro, para que este pagasse o sinal de um automóvel que pretendia adquirir.

1) Qualifique, do ponto de vista jurídico-mercantil, os actos e sujeitos referidos.

Sujeitos:
• Belmiro desenvolve actividade de desportos radicais (tem site, recebe marcações, etc) e essa é uma
actividade lucrativa.

É empresário? Ele é menor, tem 17 anos. O facto de ele ser menor não impede que haja aqui uma empresa. Tem uma
organização de meios que visa o lucro, por isso, mesmo sendo os seus actos anuláveis, temos aqui uma empresa.

Podemos ter empresa sem empresário? Aqui o conceito de empresário e de empresa são conceitos mais dogmáticos
do que propriamente positivos, são normativamente pouco densos. Naturalmente que a empresa não pode funcionar
desta forma por questões fiscais, mas isso não obsta a que esteja ali uma verdadeira empresa. Temos então também
aqui um empresário, independentemente dos vícios dos seus actos, pois isso não retira valor à empresa enquanto
objecto susceptível de ser transferido para terceiro.

E Belmiro é comerciante? Enquanto a sua incapacidade não for suprida (Ex: Intervenção do representante legal com
autorização judicial), ele não é considerado comerciante, por força do 1889º/1/c) CC.

Se Belmiro tivesse 18 anos, era considerado comerciante? Ele teria capacidade (7º CCom), mas preencheria os
requisitos do 13º CCom? Só faz esta actividade aos finsde-semana, sendo funcionário de uma pensão durante a
semana. Ele é comerciante porque exerce reiteradamente, como profissão, a actividade de desportos radicais, e tal
envolve actos de comércio (13º/1 CCom), não tendo de ser o comércio a única profissão, nem mesmo a principal.

Há aqui uma prestação de serviços (alguém acrescenta valor a determinado equipamento/bem, prestando serviço a
um terceiro). Havendo uma empresa de prestação de serviços, esta actividade é objectivamente comercial? Sim, são
actos objectivamente comerciais porque são praticados no âmbito, causa e proveito da empresa, por analogia iuris
com o 230º/2 CCom.

• Carlos, dono da pensão, tem uma empresa. A sua actividade é objectivamente comercial e ele é empresário
e comerciante, pelos mesmos motivos que Belmiro seria se tivesse 18 anos.
• David, serralheiro, não é comerciante, de acordo com o previsto no 230º ∫1º CCom.

Aula nº 3 de 31/10/2011 – EXTRA


Sumário:

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Caso prático: qualificação de actos comerciais e comerciantes.
CASO PRÁTICO 2) (cont.)

Sujeitos (cont.):
David, serralheiro, não é comerciante, pois não exerce a sua actividade no âmbito de uma empresa nem pratica
comércio em sentido estrito.

Exerce uma actividade de prestação de serviços e actividade artesanal quando produz coisas (janelas, estrados, etc)
– 230º ʃ1º CCom. Para isto ganhar algum sentido tem de se interpretar a norma:

Quando no âmbito dessa actividade artesanal temos uma empresa/organização de meios (para casos como
carpinteiro, serralheiro, cabeleireiro), mesmo que haja empresa (complexo produtivo), desde que o proprietário
participe no processo produtivo de forma essencial e indispensável, não é considerado comerciante. Por isto tem que
se fazer uma interpretação restritiva.

Uma empresa tem autonomia técnico-profissional. Quando a empresa só funciona por causa do proprietário, não é
empresa, porque a actividade da empresa prende-se com o seu sujeito, não podendo ser transferida para terceiro.
Temos como exemplos o advogado, o médico, etc.

Quando a lei diz que não temos comerciante quando ele exerce directamente a actividade, quer dizer que quando o
trabalho técnico essencial do proprietário for de tal forma indispensável, sem o qual o complexo produtivo não
consegue sobreviver, não temos empresa nem comerciante, “mesmo que haja prédio e máquina”.

Ex: Carpintaria gigante na qual o proprietário só gere. Tem uma empresa comercial constante do 230º/1 CCom, não
tendo relevância se o empresário participa no processo produtivo. Se o exercício directo existe e se o titular é
empresário, mas não é essencial, temos uma empresa comercial.

Assim, David só será comerciante se exercer a sua actividade no âmbito de uma empresa propriamente dita, com
autonomia técnico-funcional, o que não parece ser o caso.

Actos:
• Belmiro adquiriu dois barcos para o seu negócio.
O acto é objectivamente comercial, porque está ligado a uma empresa prestadora de serviços,
considerada comercial por analogia iuris do 230º/2 CCom.
O “acto necessário à empresa” deve ser comercial.

NOTA: Se o Belmiro não tivesse empresa e se comprasse barcos para uso recreativo, seria uma compra civil, e os
efeitos seriam civis em relação a ele (100º ∫ CCom).
• Belmiro contraiu um empréstimo de 2500€ junto de Carlos.

O empréstimo é civil ou comercial? Imaginando que Belmiro é comerciante, a compra dos dois barcos seria
comercial, pois praticada no âmbito de uma empresa análoga às do 230º/2 CCom.

O empréstimo concedido por Carlos seria também comercial, de acordo com o 394º CCom, pois o dinheiro destinava-
se a uma compra comercial.

No entanto, apesar de o acto ser bilateralmente comercial, Belmiro não é comerciante, logo o requisito do 396º CCom
não está preenchido, mas o empréstimo é comercial.

Se Belmiro não tivesse empresa e se o barco fosse para uso pessoal, tratar-se-ia de um mútuo civil, sujeito a forma
se superior a 2500€ (1143º CC).

• David contraiu um empréstimo de 3000€ junto de Carlos

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A aquisição do automóvel não se destina a actividade comercial (David não é comerciante nem empresário), não é
um acto objectivamente comercial (463º CCom), logo temos aqui um mútuo civil que, sendo superior a 2500€, é
exigida a forma escrita (1143º CC). Uma vez não respeitada, o mútuo seria nulo por falta de forma legal exigida – 220º
CC.
NOTA: Se David for um comerciante dono de uma grande Serralharia e adque um carro com o empréstimo, não
esclarecendo o uso que vai dar ao automóvel, temos:

- Acto objectivamente comercial, porque o sujeito tem uma empresa comercial do 230º/1 CCom, logo os actos
praticados no seu âmbito são objectivamente comerciais, se o contrário não resultar do próprio acto (2º CCom).

- Uma vez que ele nada diz quanto ao destino a dar ao automóvel, a compra é comercial (2º CCom) e, dessa forma, o
empréstimo também o será, pois é para uma compra comercial (394º CCom).

CASO PRÁTICO 5)

Karl, cidadão alemão a residir em Portugal, explora uma propriedade agrícola no Alentejo onde que cria
porcos e cultiva oliveiras, vendendo os enchidos e o azeite que ele próprio também produz numa pequena loja em
Odemira, instalada num prédio que tomou de arrendamento a Lucas. Ele próprio adquiriu as tintas para pintar a
loja, tendo contudo contratado um pintor profissional para executar a obra.

Karl é cidadão alemão a residir em Portugal. Explora agricultura no Alentejo e tem 10 funcionários. Cria
porcos e cultiva oliveiras. Vende azeite e enchidos numa loja em Odemira.

Quando tomou a loja de arrendamento, tinha uma estrutura empresarial montada e adquiriu tintas de obra.

Karl é comerciante? O facto de ser estrangeiro não afecta em nada no que respeita à sua classificação
enquanto comerciante, desde que preencha os requisitos do 13º/1 CCom, exercendo actividade comercial.

Ele não é comerciante porque transforma o que cultiva (230º ʃ1º CCom). As actividades acessórias
(transformação de produtos agrícolas) não são comerciais.

Se adquiriu frutos e vegetais a vizinhos, e aumentou a sua produção, nos termos do 230º/1 CCom, é comerciante.

Se ele tiver empresa de transformação de matérias-primas e ainda transformar os seus produtos, temos de ver se a
actividade principal é a transformação (mesmo que com os seus produtos, 230º/1 CCom), ou a produção agrícola –
230º ʃ1º CCom.

Karl vende produção na loja em que é proprietário. O 464º/2 CCom exclui do comércio em sentido jurídico as vendas
dos seus produtos, logo não será comerciante.

Se a loja também vende outros produtos, temos de ver a actividade predominante:


• Se os produtos que compra para revenda não forem significativos, vendendo mais os que produz,
continua a não ser comerciante.
• Se a empresa subsistir sem a própria produção, é comerciante (463º/1 CCom). Se Karl se
dedica ao escoamento da sua produção, não é comerciante.

Aula nº 4 de 04/11/2011
Sumário:
.
Caso prático: insolvência
CASO PRÁTICO 5) (cont.)

Karl é comerciante ou não comerciante? Temos que separar as várias áreas de actividade que ele exerce:

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Por: Maria Luís Veloso Guedes de Carvalho

Agricultura Não é comerciante

Produtos seus Não é comerciante

Qual a actividade mais Transformação


relevante/economicamente
predominante? Compra para
Comerciante
transformar

Escoa a própria
Não é comerciante
produção

Venda

Compra para revenda Comerciante

• Cria animais e cultiva árvores de frutos. Com estes produtos e frutos produz alheiras e compotas para
vender numa loja arrendada (ele é o titular do arrendamento).

É agricultor, transforma produtos e vende esses mesmos produtos. Sendo agricultor, não é comerciante, como já
sabemos – a Agricultura não é uma actividade comercial, não está incluída no comércio em sentido jurídico.

• Ele transforma os frutos e os animais. Isto faz dele comerciante? Em princípio faria, porque esta actividade
de transformação caberia no 230º/1 CCom (equipara-se aos comerciantes de lojas de roupa que
transformam tecidos em roupas).

Porém, há aqui uma excepção: retira-se da actividade transformadora tudo que tenha que ver com produtos agrícolas,
de acordo com o 230º ∫1º CCom, desde que essa actividade transformadora seja acessória à actividade agrícola.

Esta empresa transformadora que ele tem não é tida como transformação para efeitos de qualificação desta
actividade como objectivamente comercial (o critério que aqui prevalece é o da acessoriedade à actividade agrícola).

• Ele vende os seus produtos numa loja, num estabelecimento de que é “proprietário”. Passa a ser
comerciante? A questão aqui é a da actividade de interposição das trocas – ele é intermediário ou não? Nos
termos do 464º/2 CCom, estas vendas não são comerciais. Naturalmente que aos olhos de qualquer
cidadão, nada distingue esta loja de outras, e parece absurdo dizer que não se pratica comércio. Mas este
agricultor não revende, apenas vende aquilo que produziu.

Evidentemente que se ele adquirir, paralelamente, outros bens a terceiros, para venda na sua loja, aí sim teremos já
comércio, pois ele compra para revenda (463º/1 CCom), não se limita a escoar a sua própria produção. Aqui ele já
teria uma empresa comercial, e já seria comerciante.

Só olhando para a actividade dele e para a forma como ele a exerce é que se pode qualificar este sujeito como
comerciante ou não.

Mas vamos agora partir do princípio que sim, que ele é comerciante. Ele tomou de arrendamento a loja a um terceiro.
Este arrendamento é um contrato ao qual iremos aplicar o regime dos actos de comércio? Este é um arrendamento
do local onde o estabelecimento/a empresa irá ser instalado.

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Note-se que isto é totalmente diferente da locação da empresa. Aqui não se loca um estabelecimento comercial, uma
empresa. Aqui está apenas a arrendar-se um espaço físico onde futuramente irá funcionar um estabelecimento, uma
empresa. Não é um negócio sobre a empresa.

Temos então um contrato de arrendamento. É ou não comercial? É um acto subjectivamente comercial, partindo do
princípio que todos os actos praticados pelo comerciante são comerciais.

Para o qualificarmos como acto objectivamente comercial teremos de aceitar que todos os actos praticados por uma
empresa comercial são objectivamente comerciais – entendimento que está longe de ser pacífico, pelo menos para
aquelas empresas que não constam do 230º CCom.

Quando não temos comerciante, para qualificar um acto como acto de comércio temos que seguir a via objectiva.

Pense-se agora em alguém que vai abrir uma loja de venda ao público onde exercerá uma actividade comercial. Pense-
se que entre o arrendamento e a abertura da loja decorrem 3 meses (são precisas obras, decoração, stock, etc).
Durante estes 3 meses, o “empresário” não está a exercer actividade nenhuma. Neste caso, como qualificamos os
actos praticados neste período? Serão actos preparatórios.

No momento em que são praticados há uma ideia generalizada, quer por parte do empresário, quer por parte do
público em geral, de que vai existir uma empresa – ela já é vista como futura empresa e ele como futuro empresário.

Mas suponha-se que ele se arrepende, por algum motivo, e não abre efectivamente a empresa. Nesse caso, os actos
preparatórios que ele praticou – contratos celebrados no âmbito da futura abertura de uma empresa comercial – são
ou não comerciais? Não. Pois só no momento da abertura da empresa é que há uma retroacção ao momento da
prática do acto para o classificar como acto de comércio (todos os actos que foram praticados seriam
retroactivamente qualificados como actos de comércio). Como não há abertura, também não retroage àquele
momento, não havendo então actos de comércio. Assim, aqueles actos preparatórios seguirão um regime civil.

Relativamente à qualificação de um comerciante como tal, numa situação na qual o sujeito se arrepende e não abre
a loja, ele adquire a qualidade de comerciante imediatamente, quando toma de arrendamento o espaço, ou quando
adquire produtos para a loja? A preparação da actividade comercial é feita com a perspectiva do exercício daquela
actividade, é certo.

Ele adquire o estatuto de comerciante a partir do momento em que é visto pela generalidade do público como futuro
comerciante. Se vier a exercer a actividade, a sua qualificação como comerciante deve retroagir ao momento a partir
do qual ele é visto como tal – momento em que ele começa a dar notícia do seu intuito de abrir um estabelecimento.
No entanto, só adquire essa qualidade quando começa a exercer efectivamente a actividade comercial. Se ele não
chegar a abrir o estabelecimento, não chega a ser comerciante.

As questões debatidas são relativas. De facto há comerciantes que não têm estabelecimento aberto ao público, e nem
por isso deixam de ser comerciantes.

CASO PRÁTICO 8

A Móveis Macieira, S.A. (MM) vem acumulando, desde há cerca de dois anos, dívidas aos seus
fornecedores. Neste momento o passivo total ronda já os 2 000 000€, sendo que os activos da sociedade foram
avaliados no último balanço em 1 400 000€. Soube-se que recentemente a administração da sociedade decidiu
vender à Predial Mais Valor, S.A. um terreno onde tinha instalada uma serração de madeiras por um preço
considerado consideravelmente inferior ao de mercado. Entretanto Arnaldo, que para além de ser um dos
administradores da sociedade, detém 40% do seu capital social, encontra-se no Brasil há já alguns meses, havendo
fortes indícios de que não tenciona regressar a Portugal e voltar a assumir o cargo.

1. Beltrão, credor da sociedade em 65.000€, procura-o para saber se poderá tomar algumas providências. O
que lhe responderia quanto à possibilidade de instauração de um processo de insolvência?

Temos uma sociedade numa situação financeira complicada, com um passivo de 2 000 000€ e um activo de
1 400 000€. A sociedade acumula dívidas a credores. Tem um administrador no Brasil, e que não pretende voltar.

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Por: Maria Luís Veloso Guedes de Carvalho
A empresa está ou não em situação de insolvência? O credor tem legitimidade activa? Quem pode ser alvo
de um processo de insolvência? Qualquer pessoa singular ou colectiva – 2º/1/a) CIRE, logo a Móveis Macieira, S.A.
pode ser objecto de um processo de insolvência.

Imagine-se que em vez de termos uma pessoa colectiva, temos uma pessoa singular que nem sequer é
comerciante, mas encontra-se numa situação financeira que não lhe permite pagar as dívidas. Pode perfeitamente
ser objecto de um processo de insolvência, não tem que ser comerciante.

Podem ainda ser objecto de processo de insolvência:


• 2º/1/b) CIRE – Herança jacente;
• 2º/1/c) CIRE – Pessoas colectivas sem personalidade jurídica;
• 2º/1/d) CIRE – Sociedades civis;
• 2º/1/e) CIRE – As sociedades irregulares (pessoas colectivas ainda não completamente formadas);
• 2º/1/f) CIRE – Cooperativas antes do registo;

• 2º/1/g) CIRE – EIRL; o A particularidade do EIRL é que tem responsabilidade limitada ao património: pelas
dívidas contraídas na exploração do EIRL responde apenas e exclusivamente o património desse EIRL.

Esta é uma diferença muito grande face aos estabelecimentos comerciais, que sendo objecto e não sujeito das dívidas
contraídas na sua exploração, responde quer o património comercial, quer o pessoal do titular/empresário.

Houve pouca adesão a esta figura do EIRL, e posteriormente foi varrido na prática por uma outra figura criada nos
anos 90, que é a sociedade unipessoal por quotas. Esta tem desde logo uma grande diferença: é um sujeito jurídico
próprio, enquanto o EIRL é apenas objecto do património do seu titular. Pelas dívidas da sociedade responde o
património da sociedade, e não o património pessoal do seu único sócio. 2º/1/h) CIRE – Outros patrimónios
autónomos.

O credor tem legitimidade para propor a insolvência do devedor? Sim, nos termos do 20º/1 CIRE, sempre
que parecer ao credor que o devedor está impossibilitado de cumprir as suas obrigações vencidas (situação de
impotência financeira).

Como é que o credor pode avaliar fiavelmente esta situação? Parece muito difícil. O 20º/1 CIRE avança alguns factos
que devem verificar-se para que se possa proceder à dedução do pedido de insolvência. Note-se que o pedido
infundado de insolvência pode conduzir a responsabilidade civil, mas apenas em caso de dolo – 22º CIRE.

Neste caso, o credor teria fundamento para requerer a insolvência com base no 20º/1/c) CIRE, desde que se prove
que o administrador saiu do país por esse motivo (fuga). Mas de uma ou de outra forma, cairíamos sempre numa das
situações do 20º/1/a) ou b) CIRE.

Depois teria que se avaliar se a empresa se encontra mesmo na situação do 3º CIRE.

Aula nº 5 de 18/11/2011 Sumário:


O estabelecimento comercial: noção e breve apanhado das principais questões que se levantam aquando da sua
negociação.
Caso prático: trespasse de estabelecimento comercial.

CASO PRÁTICO 8 (cont.)

O insolvente tem, como sabemos, o dever de se apresentar à insolvência (18º CIRE). Se não o fizer, podem
outros legitimados fazê-lo – 20º/1 CIRE.

Este cuidado da lei que se resume às exigências presentes no 21º/1/a) a h) CIRE devese ao facto da
insolvência poder manchar irremediavelmente o nome do devedor, quer no mercado, quer na banca.

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Direito Comercial I (Aulas Práticas) – Professor José Reis
Ano Lectivo 2011/2012
Por: Maria Luís Veloso Guedes de Carvalho
A disposição do 35º CSC fala-nos da perda de metade do capital social das sociedades comerciais. Deve
informar-se os sócios quando a sociedade tiver perdido metade do capital social. Esta questão, porém, nada tem que
ver com este caso prático.

2. No passado dia 15 de Outubro foi declarada a insolvência da MM. Parece-lhe que essa declaração pode vir
a afectar o negócio a que se aludiu, celebrado com a empresa imobiliária? E terá algum efeito sobre uma
dívida da MM a um fornecedor, que se vence no dia 30 de Dezembro próximo?

A venda de terreno por valor inferior ao preço de mercado é afectada pela declaração de insolvência? Nos termos do
120º CIRE, qualquer acto prejudicial à massa insolvente praticado nos 4 anos anteriores à data do início do processo
de insolvência pode ser resolvido. Porém, e facilmente se entende, isto não basta. Exige-se a má fé de terceiro –
120º/4 e 5 CIRE, sendo que o nº 5 diz o que se entende por má fé nesta situação:

Tem que haver um aproveitamento por parte deste terceiro da situação de carência. Ex: Se eu sei que a outra pessoa
está em processo de insolvência, tenho a obrigação de não contratar com ela, tenho a obrigação de preservar o seu
património, porque sei que ele vai ter que servir para pagar as suas dívidas. Se eu estou a frustrar a posição de outras
pessoas, não mereço ser protegido.

Assim não tenho que provar que não sei de nada quanto ao processo de insolvência. Exceptuam-se desta regra da má
fé como requisito as situações do 121º CIRE, pois são situações de tal forma suspeitas que são por si só resolúveis.

NOTA (a desenvolver posteriormente): contrato de suprimentos – 243º e ss CSC. O 243º/1 CSC diz que só
se empresta à sociedade dinheiro ou outra coisa fungível. Este é um contrato de um sócio com a sociedade, estando
apenas previsto para as sociedades por quotas.

Regressando ao caso, aqui pressupõe-se a Predial Mais Valor, S.A. tinha conhecimento da declaração de insolvência
(120º/4 CIRE).

Poderia haver resolução do negócio? Se o acto for prejudicial à massa insolvente, e for praticado no período
considerado como suspeito (4 anos anteriores à data de início do processo de insolvência), pode ser resolvido a pedido
dos credores (123º/1 CIRE).

Este acto seria ou não prejudicial? Parece que sim. Resta saber se as condições de mercado são justas, mas não há
quem compre o terreno, ou porque o insolvente não tem liquidez, etc. O tribunal tem de ter isso em conta.

O valor de mercado nem sempre é um índice 100% fiável de se estar ou não a fazer um bom negócio. Por outras
palavras, as condições pessoais do devedor, liquidez e tesouraria podem obrigar a fazer maus negócios, sendo isso
uma necessidade, um acto realizado em benefício da sua empresa ou negócio. O facto de alguém estar a vender algo
abaixo do seu valor normal não quer dizer que haja um conluio para que o valor real e o declarado sejam diferentes.
Mesmo que tenha sido feito um valor inferior ao de mercado, o juiz pode considerar que esse acto não foi prejudicial
à massa insolvente, pois a falta do negócio poderia ser mais prejudicial, por exemplo.

A resolução pode ocorrer em qualquer caso? Tem desde logo de existir má fé de terceiro. A boa fé do terceiro,
normalmente em quase todos os casos, é um impedimento de resolução do negócio. Neste caso temos aqui, pondo
de parte o interesse do devedor, dois interesses conflituantes: credores querem ver o negócio resolvido e o terceiro
quer a eficácia do negócio realizado.

120º/5 CIRE – Entende-se por má fé o conhecimento por parte do terceiro de que o devedor está numa situação de
insolvência, ou que já teve início o processo de insolvência. É preciso um conhecimento do terceiro, à data do negócio,
de que o devedor vai estar ou já está em situação de insolvência. Se o terceiro tem esse conhecimento do prejuízo
futuro dos credores, deixa de ter protecção. Só existe resolução havendo má fé – 120º/4 CIRE.

121º CIRE – A verificação de qualquer uma destas circunstâncias pressupõe a má fé do terceiro e do próprio devedor,
e os actos são incondicionalmente resolúveis. Não pressupõe o período de 4 anos. Ex: Partilha celebrada – se há uma
partilha e o insolvente prefere ficar com os bens que se podem vender facilmente, esta partilha é resolúvel pelos
credores. Cada uma das alíneas do 121º/1 CIRE prevê o seu próprio prazo de relevância e o prazo em que os actos

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Ano Lectivo 2011/2012
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referidos são resolúveis. Muitas destas alíneas referem-se quase exclusivamente a pessoas singulares: partilhas,
fianças, garantias reais, etc.

No caso dos actos gratuitos, as sociedades comerciais estão proibidas de os praticar. Podem fazê-lo excepcionalmente
em conformidade com os usos sociais – 6º/2 e 3 CSC. Tudo o que seja uma doação, um perdão de dívida, a constituição
gratuita de uma garantia, já estaria impedido, logo não era necessário vir previsto no 121º CIRE.

980º CC – O fim de qualquer sociedade, civil ou comercial, nos termos do Código Civil, é sempre a obtenção do lucro
e a sua repartição pelos sócios. Se a sociedade não tem capacidades necessárias ou convenientes à obtenção do seu
fim, deixa de ter capacidade para praticar actos, e os seus lucros diminuem potencialmente.

As ofertas de uma sociedade, os brindes ou patrocínio de eventos culturais, são disposições gratuitas, pois não há
uma contrapartida imediata de quem recebe um cabaz de Natal, por exemplo. Trata-se de marketing, de um acto
conveniente à obtenção de lucro, pois aproxima a empresa do mercado.

A sociedade está proibida de prestar garantias pessoais ou reais, seja em benefício de terceiros, seja em seu próprio
benefício. No caso dessas garantias serem dívidas de outras entidades, temos o 6º/3 do CSC. Ex: Uma sociedade
contrata um funcionário qualificado e experiente, mas este tem que mudar o seu local de residência para trabalhar
nessa sociedade. Se o sujeito pede à sociedade para ser fiadora do seu contrato de arrendamento, há uma justificação
para a sociedade garantir a dívida, pois vai beneficiar da actividade da pessoa. Há aqui um justificado interesse da
sociedade em servir de garantia a terceiro.

Nem todos os casos do 121º CIRE têm uma razão de ser muito evidente. O que são suprimentos (121º/1/i) CIRE)? São
contratos celebrados entre a sociedade e os sócios, em que estes emprestam capital às sociedades como forma de
contornar um aumento de capital que a sociedade estivesse a precisar.

A sociedade está descapitalizada, isto é, precisa de dinheiro. Este empréstimo chama-se suprimento e tem um regime
próprio que é menos favorável aos sócios do que o regime comum, pois o sócio também beneficia com o facto de a
sociedade se recapitalizar. Contudo, os sócios estão na última linha dos reembolsos quando a sociedade é liquidada.

Os artigos 120º e 121º CIRE entenderam considerar resolúveis, em benefício da massa insolvente, os negócios
celebrados após a situação de insolvência.

A declaração de insolvência da MM tem alguma influência sobre a sua dívida a um fornecedor, que se vence no dia
30 de Dezembro? O credor sabe hoje que foi declarada a insolvência da MM e pergunta como é. Tem que esperar até
dia 30 de Dezembro para resolver o crédito?

De acordo com o 91º/1 CIRE, a declaração de insolvência determina o vencimento de todas as obrigações do
insolvente, não subordinadas a uma condição suspensiva. O princípio geral é que a partir do momento em que a
insolvência é declarada, todas as obrigações não vencidas, isto é, que não tenham condição suspensiva, vêem o seu
vencimento antecipado a essa data.

Porquê? O insolvente fica privado da administração dos seus bens e, em termos processuais há uma fase declarativa,
a que se segue a fase executiva. Há também o pagamento aos credores após a identificação destes e do montante
das suas dívidas. É preciso antecipar o vencimento de todas as dívidas e obrigações para a data da declaração de
insolvência, caso contrário só seria possível a intervenção deste credor no processo em Dezembro, não tendo as
mesmas condições que os outros credores. Ele tem que partir nas mesmas condições que todos os outros credores.

3. Beltrão sabe que Arnaldo é proprietário de uma casa de praia, que acredita valer, pelo menos cerca de
350 000€. Poderá este bem vir a responder pelas dívidas da
MM?

Há que ver os artigos 186º e 189º CIRE. A ideia da insolvência culposa é inibir uma pessoa que não conseguiu gerir o
património de exercer outros cargos semelhantes.

Podemos falar em gestão danosa? Não se aplica o enriquecimento sem causa, porque este é um regime subsidiário
ao regime civil.

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Ano Lectivo 2011/2012
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No caso das sociedades anónimas e das sociedades por quotas, só o património societário responde pelas dívidas da
sociedade, salvo casos excepcionais no caso das sociedades por quotas (198º CSC). Os sócios nunca respondem
perante os credores da sociedade.

A questão que se coloca é em função da qualidade de administrador, Arnaldo. Os administradores não precisam de
ser sócios (≠ SEC, 470º/1 CSC).

O que está em causa é um caso de má gestão. Ele pode ser responsabilizado por má gestão do dinheiro e dos negócios
da sociedade. Temos uma responsabilidade do administrador perante a própria sociedade se se mostrar que ele não
agiu em conformidade com os seus deveres. O 72º CSC prevê a responsabilidade dos administradores em geral.

Sendo o administrador alguém com interesse directo na gestão da sociedade, O incumprimento dos seus deveres
legais determina que poderá ser pessoalmente responsabilizado pelos prejuízos da sociedade. O tribunal determina
o seu grau de culpa perante os danos na sociedade. Só assim a sociedade poderá obter uma indemnização, que será
repartida pelos credores sociais.

Há vários tipos de responsabilidade – 71º e ss CSC. Não há nenhuma norma que responsabilize directamente os
administradores pelos prejuízos causados à sociedade perante os credores. Poderá também haver lugar a
responsabilidade penal relativamente às pessoas colectivas.

4. Cristóvão, um dos três administradores da sociedade, é igualmente gerente da “Confecções Colombo,


Lda” e membro da direcção da associação de solidariedade social “Criança feliz”. Diga, explicando, se a
eventual insolvência da MM poderá ter repercussões de algum tipo sobre estas suas actividades. Que
outras consequências poderão ainda advir-lhe em virtude de tal declaração?

Os ramos de actividade das sociedades são diferentes.

Há algum facto que determine que o tribunal declare esta insolvência culposa? Sim, há culpa grave ou dolo dos
administradores quando a situação foi criada ou agravada pela gestão, pela conduta do administrador nos 3 anos
anteriores ao processo de insolvência – 186º/1 CIRE.

Analisamos a legitimidade do credor para arguir a insolvência, mas poderia haver uma apresentação à insolvência,
que aqui não teve lugar – 18º CIRE.

Salvo situações excepcionais, se o devedor insolvente, sendo pessoa colectiva, não se apresentar à insolvência no
período devido, cai imediata e irreversivelmente no 186º/3/a) CIRE. Os devedores vão ser identificados na sentença
de insolvência nos termos do 189º/2/a) CIRE. Os administradores da pessoa colectiva serão obviamente culpados, a
não ser que demonstrem que não agiram por culpa grave, mostrando, por exemplo, que as contas foram falseadas
sem terem conhecimento disso, ou que não tiveram conhecimento da prática dos factos.

Há um ónus por parte de todos os membros da Direcção de mostrarem a sua falta de culpa, caso contrário
serão afectados pelas consequências da insolvência culposa. 189º/2/c) CIRE – Ficarão, durante um período
determinado, proibidos de ocupar qualquer cargo social. No caso concreto, Cristóvão não poderá ser gerente da
sociedade Confecções Colombo, Lda, nem membro da direcção da associação “Criança feliz”, pois a lei considera que
o indivíduo não tem capacidade para administrar ou gerir qualquer sociedade ou património de uma pessoa colectiva.
Aula nº 6 de 30/11/2011 – EXTRA
Sumário:
Caso prático: trespasse de estabelecimento comercial.
CASO PRÁTICO 5

Ambrósio é proprietário da "Roque & Role", uma loja de venda de discos situada no centro do Porto e
que funciona num prédio arrendado a Casimiro. Graças aos contactos privilegiados que Ambrósio mantém com
diversos distribuidores discográficos, e que lhe permitem ter em primeira mão as novidades musicais de pop-rock,
o seu negócio vai de vento em popa, de tal forma que acaba por vendê-lo a Barata por €125 000. No contrato
apenas se diz que o estabelecimento é transmitido "com todo o património, activo e passivo".

O prédio é próprio do trespassante ou do arrendatário?

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O prédio nem sempre é necessário à transmissão da empresa, mas pensemos numa empresa tradicional,
que precisa de um prédio para funcionar. Em princípio pode mudar de localização, funcionando em prédio diverso da
sua localização originária. Mas é necessário saber se o trespassário vai poder usar o espaço, e se sim, a que título
(usufruto, arrendamento, etc) questão que deve colocar-se no contrato para evitar conflitos posteriormente.

Sendo o prédio arrendado, a questão não se coloca assim, mas ao trespassário exigemse certas diligências:
o Que se certifique que o trespassante comunicou ao senhorio a mudança para o trespassário (1112º/3 CC).

Se o trespassante não o tiver feito, poderá o próprio trespassário comunicar ao senhorio? 1038º/g) CC.

Não havendo comunicação ao senhorio, este pode resolver o contrato de arrendamento com base na cessão não
comunicada, previsto no 1083º/2/e) CC. É, no entanto, necessário que o senhorio prove a gravidade do
incumprimento da obrigação quando haja uma quebra grande de confiança entre as partes que justifique a resolução
(≠ antigamente era um efeito automático).

De acordo com o 1112º/1/a) CC, havendo trespasse, transmite-se do trespassante para o trespassário a posição
jurídica de arrendatário do prédio em que a empresa funciona. Não necessita de consentimento do senhorio (≠ não
havendo trespasse, o consentimento para a transmissão da posição de arrendatário é necessário).

Quem tem de comunicar ao senhorio? O trespassante, porque é este quem tem o vínculo contratual com o senhorio
(o trespassante é arrendatário do senhorio), não fazendo sentido que seja o trespassário a fazê-lo, já que não tem
relação com o senhorio. Mas nada impede que seja o beneficiário da cedência (trespassário) a comunicar-lhe.

De acordo com o 1049º CC, o senhorio perde o direito à resolução se demonstrar que desculpa a falta de comunicação.
Ex: Se aceita as rendas. Isto já não cabe no 1083º/2 CC, porque aqui a manutenção da relação contratual deixa de ser
inexigível.

Outra questão é a de saber se o trespassário vai manter o mesmo ramo de negócio, mesmo que a mudança de ramo
não prejudique relações com vizinhos. Só em caso de manutenção do mesmo ramo negocial é que o contrato de
arrendamento é válido, devido ao 1112º/5 CC, pois caso contrário o senhorio pode resolver o contrato.

Com isto está-se a privar o adquirente da empresa de um direito que o trespassante tinha, está a dar-se um direito
ao senhorio de resolver o contrato devido a uma causa que não faz sentido. Para acautelar isso, poderá haver
negociação com o senhorio para prever a mudança de ramo, podendo as partes afastar esta norma.

Para além das questões relacionadas com o arrendamento, há outras relacionadas com a negociação do
estabelecimento comercial.

Âmbitos de negociação da empresa, que se prendem com duas questões diferentes:

Havendo ou não convenção, foram transmitidos elementos suficientes para identificar a empresa? Não se tendo
transmitido, houve trespasse?

O âmbito mínimo dá a resposta – elementos sem os quais a empresa fica descaracterizada, não se podendo dizer que
houve transmissão (definitiva ou temporária). o Não tendo havido convenção expressa, quais os elementos que se
transmitem?
A resposta é dada pelos âmbitos natural e convencional.

Âmbito natural – Transmite-se mesmo sem convenção expressa.


 Há situações em que a marca e o logótipo se transmitem naturalmente, excepto quando incluem o nome
do titular transmitente ou a firma – 31º/5 CPI.
 Também os bens móveis utilizados na exploração da empresa (mesas, cadeiras, etc) se transmitem
naturalmente, excepto se houver convenção negocial em contrário.
 E quanto aos bens imóveis? Normalmente têm valor patrimonial elevado, pelo que tradicionalmente se
entendia que só eram transmitidos se houvesse cláusula nesse sentido. Acresce que ao contrário dos

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móveis, a transmissão de imóveis está sujeita a forma (875º CC), sendo um requisito mais exigente do
que o exigido para o trespasse.

O 1112º/3 CC diz “transmissão”. A que transmissão se refere? À da empresa ou à da posição de arrendatário? Parece
tratar-se da posição do arrendatário, e parece não fazer sentido não se exigir forma para o trespasse e exigir-se forma
para a transmissão de um elemento da empresa (transmissão da simples posição de arrendatário), pelo que se tem
entendido assim:
O 1112º refere-se às situações de trespasse em caso de prédio ARRENDADO.
o O 1112º/1 CC refere-se à transmissão da posição de arrendatário.
o O 1112º/3 CC refere-se à transmissão da empresa.

Este 1112º/3 CC está mal colocado, porque se refere à transmissão da empresa, quer situando-se esta em prédio
arrendado, quer próprio.

Coutinho de Abreu diz que se o preço pago pela transmissão da empresa é elevado, é razoável concluir que a vontade
das partes foi no sentido de transmitir o prédio também (no caso de prédio próprio), independentemente de não
haver convenção expressa nesse sentido. O mesmo se diga nos casos em que há grande vinculação da empresa ao
prédio.
Nestas situações é razoável entender que o prédio integra o âmbito natural de entrega, no entanto esta questão está
longe de ser líquida.

Pode entender-se que para a transmissão de imóveis seja necessário escrito particular autenticado, em nome da
exigência de forma na lei. Se as partes quiserem transmitir o imóvel devem respeitar a exigência formal da lei, pelo
que o trespasse deve ser feito por documento particular autenticado, sob pena de haver falta de forma legal, caso em
que não haverá transmissão do imóvel.

E quanto aos débitos, créditos e posições contratuais?

Para Orlando Carvalho tudo faz parte do âmbito natural, à excepção dos débitos puros, que não se transmitem a não
ser por convenção nesse sentido.

A lei não prevê regra especial para a transmissão de débitos, créditos e posições contratuais em caso de trespasse.
Dado o silêncio legal, parece ser de seguir o regime geral Se o contratante é o empresário (dado que a empresa não
tem personalidade jurídica), é este que responde.

Como os débitos, créditos e posições contratuais não são elementos da empresa, mas antes resultados da exploração
da mesma, daí não integrarem o âmbito natural. Aplicam-se por isso o 595º CC para as dívidas, o 424º CC para as
posições contratuais e o 577º CC para os créditos.

Esta aplicação das regras gerais das obrigações NÃO é a posição de Orlando Carvalho.
Aula nº 7 de 07/12/2011 – EXTRA
Sumário:
Apresentação. Indicação do plano do curso e dos elementos de estudo. O direito comercial.
CASO PRÁTICO 5 (cont.)

3. Cerca de seis meses depois do trespasse, Ambrósio resolve retomar a actividade profissional e abre uma nova
loja de discos em Valongo. Ao saber disso, Barata procura saber se pode ou não impedir Ambrósio de realizar esse
propósito, e quais os meios legais ao seu dispor para o efeito. Qual é a sua opinião?
A resposta seria a mesma no caso de a proprietária do novo estabelecimento ser Dora, com quem este é casado
em regime de separação de bens, ou a sua filha Ester? E se a nova loja de Ambrósio se dedicasse exclusivamente à
venda de discos de Jazz e música clássica?

Temos uma loja que vende discos de música pop/rock e foi trespassada, tendo o anterior proprietário aberto uma
nova loja de discos de música jazz/clássica.

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Direito Comercial I (Aulas Práticas) – Professor José Reis
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Esta nova de loja de Ambrósio tem conteúdo assim tão diverso que, ao abri-la, não esteja a fazer
concorrência diferenciada/diferencial à de Barata, a quem ele trespassou a anterior loja? Não é fácil dar uma resposta
imediata e inequívoca, mas sem mais dados de facto, parece que uma empresa não vai afectar a outra, podendo a
clientela ser coincidente numa pequena franja, mas não na totalidade, logo parece não haver aqui nenhuma obrigação
de não concorrência.

O objectivo da obrigação de não concorrência é proteger a empresa trespassada, estando longe de ser uma obrigação
automática que nasça a partir de qualquer contrato de trespasse.

2. Dois meses após Barata ter tomado posse do estabelecimento, recebe uma carta de Casimiro em que este lhe
comunica a intenção de o despejar. Invoca, para o efeito, vários fundamentos. Serão eles procedentes?

Apesar de ter já por duas vezes aceite o pagamento da renda por Barata, Casimiro não foi devidamente notificado
do trespasse do estabelecimento, o que o impediu de exercer (como alegadamente pretendia) a preferência legal
que a lei lhe atribui;

Casimiro pretende despejar por não ter sido notificado. O senhorio tem ou não direito de preferência na venda do
estabelecimento comercial locado no seu edifício? Tem, de acordo com o 1112º/4 CC. A obrigação do trespassante
que pretenda realizar o trespasse é a de notificar o senhorio, indicando as cláusulas do contrato, antes de concluir o
negócio.

Imaginando que a comunicação não foi feita, quais são os direitos do senhorio? Pode, a partir do momento em que
tenha conhecimento do negócio, intentar uma acção de preferência (1410º CC) no prazo de 6 meses.

Se o senhorio aceitou as rendas, não poderá caducar assim o seu direito de preferência? O Professor José Reis inclina-
se a dizer que não, que mesmo tendo recebido as rendas, o senhorio terá direito de preferência durante os 6 meses,
pois a aceitação, na cabeça do senhorio, pode não ter valor de consentimento do negócio de trespasse.

Há dois tipos de notificação:


• Uma com a intenção de venda, comunicando ao senhorio o negócio que pretende realizar;
• Outra depois de concluído o negócio, pois o trespassante tem a obrigação de notificar o senhorio da
realização do negócio, informando-o de que o novo inquilino é o trespassário (1038º/g) CC).

Não se podem confundir as duas notificações e os seus regimes!

No caso concreto o senhorio quer despejar o inquilino por falta de notificação para a preferência.

Vamos imaginar que o trespassante não notificou o senhorio para preferir, mas comunicou-lhe, notificando-o, que o
novo inquilino era o trespassário, imaginando que o senhorio não tem interesse algum em adquirir a empresa, em
preferir. Poderá, nesse caso, despejar o trespassário? Não, pois só pode despejar se não lhe tiver sido comunicada a
conclusão do negócio. A falta de notificação para preferência apenas lhe permite substituir-se ao trespassário no
negócio de trespasse.

E agora imaginemos que o trespassante notificava para a preferência, e o senhorio não se mostrou interessado em
concluir o negócio. Posteriormente o negócio era concluído com terceiro, mas o senhorio não era notificado dessa
conclusão. Poderá nesse caso despejar?

Depende. O 1038º/g) CC parece indicar que o despejo fundado na falta de comunicação era um direito automático,
mas com o 1083º/2 CC isto já não opera automaticamente, sendo necessário que da falta de notificação resulte uma
quebra de confiança entre o senhorio e o arrendatário, tornando inexigível a manutenção do contrato.

Neste caso parece excessiva a decisão de despejo, pois o senhorio foi informado dos termos do negócio, tendo o
trespassante apenas falhado na notificação da celebração efectiva do mesmo. Além disso, de acordo com o 1049º CC,
se o senhorio aceitou as rendas do inquilino, não teria direito de resolução, pois seria venire contra factum proprium,
porque o direito do senhorio é ser informado (seja pelo trespassante ou pelo trespassário). Esta questão é diferente
da referida acima, pois aqui falamos do direito de resolução e acima falávamos do direito de preferência.

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• O trespasse não acarretou, como deveria por força da lei, a transferência de todos os bens que
compunham o estabelecimento, tendo Ambrósio ficado para si com um gira-discos, as colunas de som e
um disco autografado de Elvis Presley (que desde sempre decorava a loja e que se tornara mesmo na sua
imagem de marca, aparecendo como imagem de fundo na publicidade incluída em jornais da
especialidade);

Houve uma transferência apenas de alguns elementos e, nos termos da lei, o trespasse tem que incluir todos os
elementos. No entanto, não podemos fazer uma interpretação literal do 1112º/2/a) CC, mas temos de lê-lo como
exigindo a transmissão de todos os elementos do âmbito mínimo da empresa, sob pena de não haver trespasse
(quando não há trespasse, não se aplica a dispensa do consentimento do senhorio para a cedência da posição de
arrendatário referida no 1112º/1/a) CC, aplicando-se o regime geral do 424º CC).

Quais são os elementos do âmbito mínimo? Esta questão não pode ser respondida em abstracto, porque cada
empresa funciona à sua maneira e, em determinados casos, o âmbito mínimo pode incluir a localização, noutros casos
a marca, noutros ainda o know-how.

Em termos gerais trata-se do conjunto de elementos sem os quais aquela empresa se torna irreconhecível aos olhos
do público. O âmbito mínimo responde a uma questão diferente da que respondem o âmbito natural e o âmbito
máximo.

Nenhum dos elementos referidos no fundamento apresentado parece estar dentro do âmbito mínimo.

Sendo Barata um grande apreciador e especialista de heavy-metal (género que Ambrósio praticamente não
vendia), a clientela do estabelecimento alterou-se substancialmente desde o trespasse, sendo constantes as
queixas dos outros inquilinos do prédio, a quem desagradam as roupas e penteados dos novos clientes.

Há aqui uma mudança substancial da clientela da empresa em função de alguma alteração, não propriamente do
objecto da empresa, mas do seu grau de especialização, e parece que os restantes inquilinos do prédio não estão
satisfeitos.

O senhorio pode reagir contra isto? Não havendo nenhuma violação grosseira dos deveres de manutenção da coisa
locada pelo arrendatário, nem do respeito pelos restantes comproprietários do prédio, a única possibilidade do
senhorio seria se esta modificação se qualificasse como uma mudança de ramo da empresa (1112º/5 CC). Esta
questão passou a ser mais relevante desde a alteração do regime do arrendamento, e pode ter duas vertentes:

Houve trespasse?

O 1112º/2/b) CC diz que não existe trespasse se houver uma mudança de ramo, aplicando-se nesse caso o regime
geral do 424º CC, o que faria com que fosse necessário o consentimento do senhorio para a transmissão da posição
de arrendatário. Não havendo consentimento do senhorio quando exigido, este resolver o contrato. Esta solução
apoia-se na ideia de que uma mudança de ramo consubstanciaria numa simulação.

Há trespasse. A mudança de ramo, ainda que não seja proibida pelo contrato de arrendamento, tem consequências
– 1112º/5 CC, podendo o senhorio resolver o contrato.

O trespasse não inclui o direito de alterar o destino do prédio e instalar uma empresa diferente da empresa que aí
estava instalada. O direito do trespassante não se transfere para o trespassário, enfraquecendo a posição do
transmitente que vai vender a loja sem um direito que tinha, desvalorizando a empresa, porque essa poderá ser
vendida com um direito limitado ao local.

O 1112º/5 veio tornar inútil o 1112º/2/b) CC, pois qualquer mudança de ramo leva à resolução do contrato, excepto
se se considerar (razoavelmente) que aquela norma veio reiterar a segunda, englobando-a e alargando-a.

No caso concreto, temos ou não mudança de ramo? Não, o trespassário não deixou de vender discos.

Hipótese colocada pelo Professor José Reis para explicar a situação:

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Imaginando que o Professor tem uma papelaria e nela passa a funcionar uma sapataria, por iniciativa do
novo arrendatário. Não haveria trespasse, logo a transmissão da posição de arrendatário teria de ser consentida
pelo senhorio nos termos gerais do 424º CC, não se aplicando o 1112º/1/a) CC.

Regressando ao caso, podemos vê-lo de duas formas. No caso concreto temos uma loja de discos de todo o género
que posteriormente se especializa em heavy metal. Não há mudança de ramo, pois era o mesmo que uma loja de
roupa deixar de vender fatos e passar a vender calções. É uma questão de bom senso e de saber qual o grau de
especialização exigível à empresa.

CASO PRÁTICO 6

António é proprietário do restaurante "O cantinho do António", situado num prédio arrendado a Clarisse.
Graças à sua magnífica localização (mesmo em frente ao mar) e à excelência dos seus grelhados de peixe, o
restaurante tem grande sucesso, sendo hoje em dia um dos restaurantes mais caros do Porto.
Decidido a tirar umas prolongadas férias, António celebrou com Bento, em Maio do ano passado, um
contrato que designaram como "cessão de exploração", nos termos do qual o segundo explorará o restaurante por
um período de dois anos, pagando para tal ao primeiro uma renda mensal de € 5000.

1. Em Agosto do mesmo ano, Clarisse comunica a António a sua intenção de resolver o contrato de
arrendamento. Os argumentos aduzidos são vários. Serão eles procedentes?

• Para que o prédio fosse ocupado por alguém que não o arrendatário, seria necessário o
consentimento da senhoria, que não foi pedido nem prestado;

A senhoria alega que teria de consentir na locação da empresa. O argumento é procedente ou não? O que diz o
1109º/2 CC é que a locação da empresa não carece do consentimento do senhorio. Isto é um erro enorme do
legislador, porque nunca a transferência temporária da empresa precisaria do consentimento do senhorio. O
consentimento do senhorio apenas seria necessário para ceder o gozo do prédio ao locatário da empresa.

Antes da reforma onde foi incluída a norma expressa sobre a locação, entendia-se por maioria de razão que a norma
do trespasse (1112º CC) se aplicava à locação. Hoje a lei é expressa, embora muito mal redigida.

• Ainda que assim não se entenda, seria sempre obrigação do arrendatário comunicar a cedência do
local ao senhorio, sendo irrelevante o facto de tal comunicação ter sido feita pelo locatário do
estabelecimento;

A senhoria diz que há aqui uma obrigação de comunicação que deveria ser feita pelo arrendatário do prédio (locador
da empresa). Esta comunicação não foi feita por ele, mas pelo locatário da empresa. Esta obrigação de comunicação
vê-se em geral no 1038º/g) CC, mas em concreto no 11109º/2 CC. No entanto não se diz nesta norma que a obrigação
de comunicação é uma obrigação do locador da empresa, referindo apenas a sua necessidade.

O artigo 1049º CC diz que o senhorio não pode resolver o contrato se a cedência lhe tiver sido comunicada pelo seu
beneficiário (locatário da empresa). O artigo não se aplica analogicamente, mas sim directamente, na óptica do
Professor José Reis.

Nesta questão, em termos de regime, apenas o prazo diverge do regime do trespasse.

• Sendo sabido por todos que o sucesso do restaurante se devia em grande parte à arte da cozinheira
Deolinda (esposa de António, que naturalmente acompanhou o marido nas suas férias), só por
falácia se poderá dizer que o estabelecimento que agora funcionava no locado era o mesmo que
António explorava; bastaria, de resto, constatar que o afamado "Espadarte à Deolinda" (o prato
mais célebre da casa) fora suprimido da ementa;

• Finalmente alegava Clarisse que as duas carrinhas para transporte de peixe tinham sido
expressamente excluídas do negócio, tendo ficado na posse do "locador".

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A cozinheira não acompanhou a locação, o prato desapareceu da ementa e duas carrinhas de transporte de
peixe foram retiradas do negócio de locação. Isto afecta o negócio? E a posição da pessoa que ocupa o prédio? A não
ser em casos contados, excepcionais, o cozinheiro não é essencial ao funcionamento da empresa, senão com a morte
deste a empresa desaparecia. É como a saída de Falcão do Futebol Clube do Porto – o clube não acaba.

A não transferência do know-how da cozinheira na locação da empresa não põe em causa a subsistência do
restaurante enquanto tal. O senhorio pretendia com este argumento alegar que não havia locação e que, por isso,
fosse aplicável o 1112º/2/a) CC (por remissão do 1109º/1 CC). Baseia-se na não transmissão dos elementos do âmbito
mínimo, havendo uma cessão da posição de arrendatário e violação das suas obrigações.

No entanto o senhorio não tem razão, porque apesar de os elementos não transmitidos serem importantes, não são
essenciais ao ponto de descaracterizarem a empresa no seu âmbito mínimo.

2. Um ano após a celebração do contrato, e cansado de tantas férias, António resolve retomar a sua
actividade. Arrenda para o efeito um espaço num centro comercial em Matosinhos onde, com a
inestimável colaboração da sua esposa Deolinda, abre um fast-food em que serve peixe frito. Sabendo
do facto, Bento ameaça recorrer aos tribunais se António não encerrar imediatamente o negócio. Quid
Juris?
A solução seria a mesma se António passasse a explorar um restaurante de peixe na praia de
Leça?

Está aqui em causa a obrigação de não concorrência. Há aqui violação ou não? São ramos diferentes e, a não ser que
haja concorrência desleal, não há prejuízo para o locatário da empresa que justifique o encerramento desta nova
empresa. Há que ter em atenção que no caso da locação de empresa, a obrigação de não concorrência já não é uma
obrigação implícita, mas com fundamento legal expresso (1037º/1 CC).

Se o objecto fosse semelhante e o âmbito geográfico diferente, passado ano e meio o locador ainda estaria impedido
de concorrer? Contrariamente ao que acontece no trespasse (em que a obrigação de não concorrência desaparece
ao fim de determinado tempo), no caso da locação a obrigação de não concorrência não desaparece enquanto houver
locação!

3. Seis meses antes do termo do contrato de locação, António visita o seu restaurante, constatando com
desagrado que Barata procedeu a alterações significativas no mesmo, que se verificam ao nível da
decoração (de muito pior gosto, na opinião de António), ao nível dos preços (consideravelmente mais
baixos), e ao nível da ementa (onde abundam agora pratos de carne). Para mais, um empregado revela-
lhe que Barata tenciona abrir na semana seguinte um restaurante de luxo na Foz, especializado em peixe.
Em pânico, António dirige-se ao seu escritório, querendo saber que medidas pode tomar para remediar
toda esta situação. O que lhe diria?

O que é que o António pode fazer? O locatário também está obrigado à não concorrência, tendo que devolver a coisa
locada nas mesmas condições em que a recebeu, com o valor que tinha. Não pode, por isso, praticar actos que
diminuam o valor da coisa e, se o fizer, tem de responder por eles – 1043º e 1044º CC.

Imagine-se que o locatário quer concorrer com a empresa locada no dia seguinte a têla entregue ao locador, ou seja,
o contrato terminou dia 30 de Junho e dia 1 de Julho ele abre a sua empresa.

Na opinião do Professor José Reis não pode impedir-se o locatário de exercer a sua actividade no fim do contrato,
pois não há nenhuma obrigação de lealdade para com o locador. Não pode, é claro, durante o contrato de locação,
atrair a clientela ou desviá-la para a empresa que pretende ter no futuro, pois aqui seria concorrência desleal.

Se houver descaracterização da empresa isso implica, desde logo, a resolução do contrato de locação (1038º/c) e d)
e 1083º/2/c) CC). Poderá ainda pedir uma indemnização.

Aula nº 8 de 15/12/2011
Sumário:
Caso prático: letras de câmbio.

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Direito Comercial I (Aulas Práticas) – Professor José Reis
Ano Lectivo 2011/2012
Por: Maria Luís Veloso Guedes de Carvalho
NEGÓCIO CAMBIÁRIO

É um negócio e tem de ser aceite pelas partes, pois sem declaração expressa de vontade não há negócio.

Isto é importante para a distinção entre sacado e aceitante. Até assinar o título cambiário, o sacado não é
obrigado. O principal obrigado pode não existir na letra (não haver aceitante).

Numa ordem de pagamento o principal obrigado será, em princípio, aquele a quem a letra se dirige. Não havendo
aceitante, o sacador é o obrigado, pois ele assina quando dá a ordem de pagamento, emite uma declaração de
vontade.

Entre a relação subjacente e a letra de câmbio existe uma convenção executiva.

Ex: A vende mercadorias a B e fica seu credor em 1000€.

Se as partes concordam que o pagamento será feito por uma letra de câmbio, esse acordo chama-se convenção
executiva = convenção cartular.

Normalmente, quem dá uma ordem a um terceiro não está obrigado a cumpri-la. Por que razão fica o sacador
obrigado? Porque a lei o diz no 9º LULL. O sacador é o obrigado inicial, porque da lei resulta isso e porque a letra de
câmbio não é válida sem a sua assinatura (1º/8 LULL).

O negócio cambiário fundamental para a existência de uma letra é o saque.

A letra continua a ser utilizada no âmbito do Direito Comercial porque tem grande utilidade segurança e protecção
do portador legítimo + protecção dos obrigados cambiários

A boa-fé do portador intermédio sana a má fé dos portadores que lhe advenham.

CASO PRÁTICO 10/1

A sociedade comercial “Zénon Transportes, Lda.” deve 1500€ a Xavier, em consequência de um curso de
informática que este deu aos seus funcionários. Para satisfação desta dívida, Vasco, gerente da sociedade, sacou
uma letra em nome daquela sobre Ulisses, que devia à sociedade uma soma avultada. Vasco equivocou-se no
momento em que preencheu a letra, tendo-a sacado pela quantia de 2500€. Xavier endossou a letra a Teodoro,
que desconhecia as relações entre os outros sujeitos cambiários, e que dois dias antes do vencimento a apresentou
a aceite. Tendo este sido recusado por Ulisses, e estando Xavier em parte incerta, Teodoro procura-o a si para saber
de quem pode exigir o pagamento. O que lhe responderia?

A dívida é de 1500€, mas há um engano de Vasco que subscreve uma letra de 2500€.

U1 Z2 (V) X T

Sendo X endossante, assume as responsabilidades do 15º LULL.

T, uma vez que U não pagou, tem de protestar perante o notário (38º + 44º LULL) nos 4 dias úteis seguintes ao
vencimento da letra. Além do protesto, T pode exigir o pagamento a X e a Z, pois estes são obrigados de garantia.

Nos termos do 47º LULL, a partir do momento em que o pagamento não é efectuado, a responsabilidade dos
obrigados de garantia é solidária e, por isso, pode T exigir a totalidade a qualquer um dos obrigados ou a todos eles.

Imaginando que X paga e fica com o título de crédito. Pode X exigir o pagamento a Z? De acordo com o 49º LULL sim,
pois os garantes são todos os seus antecessores na relação cambiária, na primeira linha de endossos.

1
Sacado
2
Sociedade é a sacadora, representada por Vasco, o gerente.

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Direito Comercial I (Aulas Práticas) – Professor José Reis
Ano Lectivo 2011/2012
Por: Maria Luís Veloso Guedes de Carvalho
Imaginando que T exige o pagamento a Z e este afirma haver um equívoco, pois apenas devia 1500€ a X, pode Z
recusar o pagamento a T? Não, pois de acordo com o princípio da literalidade as cláusulas extracartulares não são
invocáveis nas relações mediatas, que é o caso.

Imaginando agora que a sociedade tinha 3 gerentes e era necessária a intervenção de 2 deles para que ela se
considerasse validamente vinculada. A sociedade não fica vinculada com apenas 1 deles, mas V fica obrigado (8º LULL),
isto porque agiu numa representação sem poderes para tal 261º/1 ou 408º/1 CSC. Uma sociedade indevidamente
representada não fica vinculada à letra de câmbio, mas quem fica é(são) sim aquele(s) que a representou(aram) sem
poderes para tal 261º/1 ou 408º/1 CSC.

CASO PRÁTICO 10/4

Tendo encomendado a Filomena tecidos no valor de 5000€, Guilherme aceita uma letra de câmbio nesse
valor, sacada pela primeira à ordem de Elizabete. O aceite de Guilherme é avalizado por Hugo, um advogado seu
amigo. A letra é posteriormente endossada a Daniel, um carpinteiro que conhece bem todos os anteriores
obrigados cambiários, sabendo bem (ao contrário de Elizabete) que os tecidos comprados por Guilherme a
Filomena nunca tinham sido entregues. Daniel procura-o(a) hoje, para saber de quem pode exigir o pagamento da
letra. O que lhe responderia, sabendo que a mesma se venceu há precisamente uma semana?

H1
|
G F E D

D conhece o incumprimento da relação subjacente entre F e G. A quem pode ele exigir o pagamento da letra, sabendo
que a mesma se venceu há uma semana?

O 53º/1/d) LULL diz que não é necessário protesto para se poder exigir o pagamento ao obrigado principal
(aceitante). Se E estiver de boa fé, D poderá exigir o pagamento a G, apesar de estar a agir conscientemente do vício
e de má fé, pois a boa fé do portador intermédio sana a má fé dos portadores que lhe advenham.

Imaginando que E também conhece o incumprimento entre F e G, estando também a agir de má fé e com
conhecimento do prejuízo que advinha para o devedor G, pode D exigir o cumprimento a G? Não, porque está de má
fé (e não há boa fé de portador intermédio que sane a sua má fé), mas pode exigir o pagamento ao avalista H 32º/2
LULL.

Os artigos 53º/1/d) + 32º/2 LULL dizem-nos que o avalista do aceitante permanece obrigado.

Imagine-se que H vem invocar perante D o seguinte: “Eu não pago porque o que convencionei com G foi de forma
gratuita” – letra de favor. H está a tentar invocar uma excepção causal, mas ao portador (D) não interessa saber o que
levou a que H avalisasse G na letra de câmbio.
Aula nº 9 de 16/12/2011
Sumário:
Caso prático: letras de câmbio.
CASO PRÁTICO 10/1 (cont.)

U Z (V) X T

(U não aceita a letra de câmbio)

Sabemos já que a recusa de aceite tem como consequência imediata a antecipação do vencimento da letra
de câmbio (43º/1º LULL).

1
Avalista

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Direito Comercial I (Aulas Práticas) – Professor José Reis
Ano Lectivo 2011/2012
Por: Maria Luís Veloso Guedes de Carvalho
T quer saber de quem pode exigir o pagamento da letra. A responsabilidade dos obrigados é solidária e
portanto, feito o protesto em tempo útil, T pode exigir o pagamento da quantia quer a X, quer a Z, de acordo com o
47º LULL.

T, caso proteste fora de tempo perde os direitos de acção sobre os obrigados de garantia, excepto sobre o
obrigado principal. Mas aqui não há obrigado principal, porque não há aceite (U não aceita a letra). Qualquer obrigado
de garantia pode ser chamado a responder, de acordo com o 15º LULL.

Imagine-se que X paga a letra e pede a entrega imediata da letra. Tem direito de regresso sobre quem está
atrás de si na cadeia cambiária, ou seja, sobre Z.

As obrigações subjacentes à relação cambiária vão sendo saldadas mediante a circulação da letra de câmbio.
Esta matéria é regida pelo 49º LULL.

Em suma, T pode exigir quer a Z quer a X, indiscriminadamente, nos termos acima expostos.

Sabemos que a letra foi mal preenchida. Imagine-se que a sociedade em causa tem 3 sócios e a letra foi
assinada apenas por 1 gerente (não pode, geralmente tem que ser assinado pela maioria, excepto se o contrato social
dispuser algo diferente) – 261º/1 CSC. Assim, uma letra só será eficaz perante a sociedade se assinada pela maioria
dos gerentes, excepto se o contrato social disser algo em contrário (que basta a assinatura de 1, por exemplo). Nos
termos dos artigos 260º/4 e 409º/4 CSC, a sociedade só fica vinculada a uma letra de câmbio se para além das
assinaturas se puder inferir (através de elementos literais da letra de câmbio) que os signatários estão a agir enquanto
gerentes (e não pessoalmente), que quiseram vincular a sociedade e não a eles próprios pessoalmente.

Discutiu-se se seria necessário a menção na letra da qualidade de gerente, mas decidiu-se que não no
Acórdão de Uniformização de Jurisprudência 1/2002, de 24 de Janeiro, bastando o carimbo da sociedade e a
assinatura do gerente por cima, por exemplo.

Imagine-se que T recebe a seguinte resposta: “Esta letra só está assinada por 1 gerente e o contrato de
sociedade diz que é necessária a assinatura de pelo menos 2, logo nessa medida a sociedade não está vinculada.”

V quis assinar a letra enquanto gerente, e não enquanto Vasco, pessoa singular. O problema é que a sua
assinatura não basta para vincular a sociedade. Temos aqui então uma situação de representação sem poderes, em
que o negócio não vincula o representante nem o representado.

Nos termos gerais do Código Civil o representante (Vasco) não responderá, mas terá que indemnizar o
tomador da letra pelo interesse contratual negativo (prejuízo que a contraparte sofreu pela não celebração do
negócio). No entanto, o Direito Cambiário tem uma norma especial nesta matéria – 8º LULL, sendo que todo aquele
que apuser a sua assinatura numa letra tem, no Direito Cambiário, responsabilidade, é obrigado.

V não queria agir em nome próprio, mas quis representar a sociedade Z e fê-lo sem poderes. Assumiu,
contudo, a obrigação perante o portador da letra. Assim, a obrigação de garantia que caberia, em princípio, à
sociedade representada, passa a ser sua. V tem a obrigação de pagar a letra ao portador. Esta regra especial vale
apenas e só para os títulos de crédito.

Evidentemente que, se V não tiver meios para pagar, o risco corre por conta do portador. Será que isso não
é excessivo para o portador? Será que não devia o representado pagar, e depois teria direito de regresso sobre o
gerente? Esta última possibilidade parece demais, na opinião do Professor José Reis. O risco do portador é pequeno
e, nessa medida, a lei consagra a melhor opção.

CASO PRÁTICO 10/2

Como forma de satisfazer créditos e débitos recíprocos resultantes das suas sessões de poker, Silva, Rocha
e Queirós resolvem emitir uma letra de câmbio no valor de 2000€, sacada pelo primeiro sobre o segundo (que logo
a aceita) à ordem do terceiro. Queirós endossa posteriormente a letra a Paula, uma jovem de 17 anos com quem
mantinha uma relação extramatrimonial, perante a ameaça formulada por esta de contar o “caso” à sua mulher.
Paula, por sua vez, endossa a letra a Olegário, dono de uma loja de pronto-a-vestir onde esta tinha crédito e parceiro
ocasional daquelas sessões de poker. De quem poderá Olegário exigir o pagamento?

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Direito Comercial I (Aulas Práticas) – Professor José Reis
Ano Lectivo 2011/2012
Por: Maria Luís Veloso Guedes de Carvalho
R S Q P O

Estamos ou não perante o portador legítimo da letra (O), nos termos do 16º LULL? Levanta-se agora a
questão da menoridade da endossante P. A letra foi parar às mãos de O por um negócio cambiário inválido. Há coacção
no negócio cambiário entre Q e P.

O justifica a sua posse da letra por uma série ininterrupta de endossos (16º LULL). O facto de se tratar de um
negócio inválido, dada a menoridade de P, prejudica a posse de O? P não pode ser obrigada a pagar a quantia, porque
o seu endosso é anulável. Será que por causa disso O deixa de ser portador legítimo? Claro que o facto deste endosso
ser inválido prejudica apenas a possibilidade de se responsabilizar a endossante. Só a obrigação de garantia de P (15º
LULL) é que é posta em causa, o restante mantém-se nos termos do 7º LULL, que nos indica a independência recíproca
das obrigações. O poderá apresentar a letra para pagamento aos restantes obrigados.

Relativamente ao endosso de Q para P também há regras específicas, dada a coacção que levou ao endosso.
Indo ao regime da coacção tentaremos proteger Q, claro.

Esqueçamos agora a menoridade de P e foquemo-nos só na coacção exercida sobre Q. A obrigação cambiária


abstrai-se da relação fundamental que lhe serve de causa. Só em dois casos é que se podem opor excepções causais:
exceptio doli e relações imediatas. Assim, a obrigação só pode ser recusada no caso de no momento do endosso, da
aquisição da letra por O, este tivesse conhecimento da excepção e agisse em detrimento do devedor – 17º LULL. Isto
se não houver nenhum portador intermédio de boa fé. O pode, portanto, exigir o pagamento a Q.

Note-se que em lugar algum a lei fala em relações imediatas ou mediatas. Porém devemos entender que
são distintas, por questões de economia processual.

Imagine-se agora o seguinte: na data de vencimento O apresenta a letra para pagamento a R. Esta letra
resulta de uma dívida de jogo. R diz-lhe que as obrigações de jogo são obrigações naturais, ou seja, a obrigação
decorrente do jogo que deu origem à letra de câmbio não é válida. O sabe perfeitamente que a letra surgiu de um
contrato inválido. P, estando de boa fé, poderia exigir o cumprimento da obrigação cambiária a qualquer dos
obrigados anteriores. Se P pode, R já não vai ficar em situação pior do que a que está. Assim O pode estar a agir
conscientemente, mas não está a agir em detrimento do devedor. Para estes efeitos, a obrigação cambiária abstrai-
se da causa a que lhe deu origem e não pode opor-se a excepção do 17º LULL. P está de boa fé quanto àquele vício,
trata-se de um portador intermédio de boa fé. Assim O pode exigir o pagamento a R.

Se P justifica a sua posse por uma série ininterrupta de endossos, R pode arguir a coacção de P? R pode
recusar o pagamento com base no endosso coagido? Claro que não. O aceitante não pode vir invocar vícios de relações
fundamentais às quais é completamente alheio. A obrigação de R é pagar a P. Mesmo com a menoridade de P, ela
seria, para estes efeitos, portadora legítima de boa fé, e sanaria a má fé de O. O poderia exigir o pagamento a qualquer
dos obrigados excepto a P, que é menor e vê a sua obrigação anulada.

CASO PRÁTICO 10/4

Tendo encomendado a Filomena tecidos no valor de 5000€, Guilherme aceita uma letra de câmbio nesse
valor, sacada pela primeira à ordem de Elizabete. O aceite de Guilherme é avalizado por Hugo, um advogado seu
amigo. A letra é posteriormente endossada a Daniel, um carpinteiro que conhece bem todos os anteriores
obrigados cambiários, sabendo bem (ao contrário de Elizabete) que os tecidos comprados por Guilherme a Filomena
nunca tinham sido entregues. Daniel procura-o(a) hoje, para saber de quem pode exigir o pagamento da letra. O
que lhe responderia, sabendo que a mesma se venceu há precisamente uma semana? E se tivesse vencido
anteontem?

G F E D
|
H

E é um portador intermédio de boa fé, que desconhecia que os tecidos não foram entregues por F a G e,
como tal, poderia exigir o pagamento a G. Se E pode exigir, todos os portadores subsequentes podem, porque a boa
fé de um portador intermédio sana a possível má fé de um terceiro portador.

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Direito Comercial I (Aulas Práticas) – Professor José Reis
Ano Lectivo 2011/2012
Por: Maria Luís Veloso Guedes de Carvalho
O 32º LULL demonstra que o avalista acaba por ter mais responsabilidade que o avalisado. O avalisado podia
opor a exceptio doli, enquanto o avalista não pode, só pode recusar o pagamento da letra se esta contiver algum vício
formal.

Imagine-se que quando o portador da letra (D) aparece no escritório para saber a quem pode exigir o
pagamento, já tinham passado mais do que 8 dias úteis do seu vencimento. Ainda tem direito de exigir o pagamento?
O portador da letra pode apresentá-la até ao prazo referido no 38º/1 LULL. D entretanto dirige-se a G e ele recusa o
pagamento, porque já passou o prazo. Quando uma letra não é paga, protesta-se. Mas D já não pode protestar porque
já passaram os 4 dias úteis que tem para protestar 38º e 44º LULL), deixando de ter direito de acção sobre os obrigados
de garantia – 53º/1/d) LULL. Apenas mantém esse direito sobre o aceitante/obrigado principal.

Temos aqui a questão de saber se o avalista do aceitante também está ou não abrangido por esta disposição.
A lei no 53º/1/d) LULL só fala do aceitante, mas o 32º LULL diznos que o avalista é responsável na mesma medida que
o avalisado. Será que o avalista do aceitante também é responsável (ver discussão da doutrina na aula teórica)? Tem-
se entendido que sim, que mesmo já tendo sido ultrapassado o tempo previsto para protesto, o avalista do aceitante
(H) mantém-se responsável pelo pagamento. A obrigação do avalista (obrigado de garantia) é, efectivamente, mais
ampla do que a obrigação do avalisado.

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