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20 a 24 de setembro de 2010
O Método do Simbolismo em Kant
Resumo
Contudo, para que a interpretação semântica, em linhas gerais, possa ser vista
textualmente em Kant, recorro à primeira Crítica:
Segundo Kant, tal uso “(...) serve, na medida do possível, para conferir unidade aos conhecimentos
particulares e aproximar assim a regra da universalidade” (CRP, A 647/ B 675).
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que contribuirá para a elucidação de tal uso: trata-se de os dois possíveis usos da razão,
a saber, o apodíctico e o hipotético. O primeiro uso da razão se caracteriza por uma
derivação de um determinado particular daquilo que é geral, sendo tal procedimento
realizado pela faculdade de julgar. A conclusão, deste processo, é que tal determinação
do particular é necessária (Cf. CRP, A 646/ B 674). Já o segundo uso da razão carrega
consigo a característica peculiar de que o geral é tido como problemático, sendo que o
particular, derivado do geral, não apresenta problemas. Porém, o geral, detentor das
regras sem as quais não há particular, permanece problemático, por isso, faz-se
necessário, através da regra, a exibição de “(...) diversos casos particulares, todos eles
certos, para saber se se deduzem dela e, se parecer que dela derivam todos os casos
particulares que se possam indicar, conclui-se universalidade da regra e, a partir desta,
todos os casos que não forem dados em si mesmos” (CRP, A 646/ B 674 - A 647/ B
675). Todavia, precisa-se frisar que tal uso é regulador, não constitutivo, na medida em
que atribui “(...) unidade aos conhecimentos particulares (...)” (CRP, A 647/ B 675),
bem como também aproxima, dessa forma, a regra de um caráter universal (Cf. CRP,
ibidem, idem).
Acerca desse procedimento regulativo, vê-se na nota de Lebrun, presente na
tradução de J. Guinsburg e Bentro Prado Júnior da obra Discurso do Método, que
Descartes também o utilizou, ao tratar da quarta regra do seu Método, na qual se deve
“(...) fazer em toda parte enumerações tão completas e revisões tão gerais (...)”
(DESCARTES, 1983, p. 38), para que se tenha “(...) a certeza de nada omitir”
(DESCARTES, ibidem, idem):
Pode parecer que esta regra repita a segunda, visto que a divisão em “parcelas”
éa
mesma coisa que a enumeração das variáveis. Vuillemin, que evoca esta
dificuldade em seu livro Mathématiques et Métaphysique chez Descartes (pág.
137), pensa que tal regra é antes ilustrada pela enumeração de todos os casos
possíveis para a solução de uma equação, o que possibilita a escolha da
solução mais geral “Preceito reflexivo e regulador que versa sobre os métodos
e não sobre os problemas” (Nota de Lebrun, p. 38).
Além de estar presente na quarta regra do Método cartesiano, o uso regulativo das
idéias jaz também na ciência da astronomia, na qual temos Copérnico com sua obra As
Revoluções dos Orbes Celestes. Entretanto, deixaremos a análise deste título para um
outro momento e atentaremos, por ora, apenas ao comentário de Loparic à metodologia
de Osiander, autor do prefácio à obra mencionada do revolucionário astrônomo, em que
Retomando o tema do método do uso hipotético da razão, Kant expõe que tal
procedimento se dá com a busca de uma regularidade na natureza, segundo um princípio
e uma máxima que, por sua vez, agem de acordo com tal regularidade e cujo
fundamento é uma natureza em geral. Tais hipóteses da razão especulativa se
distanciam por demais de uma experiência e observação possíveis, no entanto, abrem a
via da unidade sistemática, na qual há a unidade racional dos diversos conhecimentos do
entendimento (Cf. CRP, A 688/ B 696).
Após a apresentação de os dois usos possíveis da razão especulativa, a saber, o
apodíctico e o hipotético, Kant expõe a diferença substancial entre aquilo que é dado à
razão especulativa como objeto pura e simplesmente e aquilo que é dado como objeto
na idéia:
No primeiro caso, os meus conceitos têm por fim a determinação do objecto;
no segundo, há na verdade só um esquema, ao qual se não atribui
directamente nenhum objeto, nem mesmo hipoteticamente, e que serve tão-
só para nos permitir a representação de outros objectos, mediante a relação
com essa ideia, na sua unidade sistemática, ou seja, indirectamente. Assim,
afirmo que o conceito de uma inteligência suprema é uma simples ideia, isto
é, que a sua realidade objectiva não consiste na referência directa a um
objeto (porque nesse sentido não poderíamos justificar a sua validade
objectiva); é apenas o esquema de um conceito de uma coisa em geral,
ordenado de acordo com as condições da máxima unidade racional e
servindo unicamente para conservar a maior unidade sistemática no uso
Com isso, nota-se que o uso heurístico da idéia de uma inteligência suprema, no
âmbito teórico, abre a possibilidade do conhecimento da natureza, por meio da
sistematização. Não obstante, para Kant, tal idéia não é apenas um problema sistêmico,
mas sim também um problema prático a ser levado em consideração. Levando isso a
cabo, Daniel O. Perez possui razão ao conceder uma importância significativa tanto à
simbolização quanto ao esquematismo analógico na atribuição de significado a esse
conceito da razão, por meio de um símbolo sensível.
Perez, leitor de Caimi, afirma, em Kant e o problema da significação, que a
simbolização é uma exibição indireta dos conceitos. Assim, tratando-se da idéia
transcendental de Deus, no âmbito prático, haveria um objeto na sensibilidade que seria
tomado como símbolo de tal idéia. Por exemplo, a tão conhecida narrativa bíblica do
Filho pródigo, na qual o pai humano simboliza Deus, pois, neste exemplo, ao trabalhar
com o procedimento analógico, estabelece-se uma analogia entre o símbolo sensível e o
conceito de Deus que, por conseguinte, traz um significado ao último:
“ ‘O símbolo de uma idéia (ou de um conceito da razão) é uma representação do objeto segundo a
analogia’ (Fortschritte, AA XX, 280)” (BECKENKAMP, 2001, p. 5).
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de levarem a razão humana a transcender os seus limites, pelo contrário, forneceram a
ela limites seguros. Não obstante, fica em aberto um campo vasto a ser percorrido:
como Kant trabalhará, com o procedimento analógico, nas obras Crítica da Razão
Prática e Religião nos limites da mera razão? Assim, este trabalho possibilita o
caminho futuro de um estudo aprofundado da idéia de Deus, afinal, aqui, concentramos-
nos, acerca do âmbito prático, apenas nas análises de Perez e Beckenkamp. Além disso,
abre-se também, com este trabalho, a possibilidade de um mapeamento histórico-
filosófico de como o uso heurístico da razão foi empregado nas ciências anteriores ao
advento do sistema crítico.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BECKENKAMP, Joãozinho. “Simbolização na filosofia crítica kantiana”. Kant e-
Prints. Campinas: Sociedade Kant Brasileira, Seção Campinas, vol. 1, nº 1, 2002, p. 1-
8.
COPÉRNICO, Nicolau. As Revoluções das Orbes Celestes. Tradução de A. Dias
Gomes. E Gabriel Domingues. Lisboa: Calouste Gulbenkian, 1996.
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Júnior. São Paulo: Abril Cultural (Os pensadores), 1983.
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Abril Cultural (Os pensadores), 1983.
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KANT, Immanuel. Crítica da Razão Pura. Tradução de Manuela Pinto dos Santos e
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Marques. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2008.
_________. A Religião nos Limites da Simples Razão. Tradução de Artur Morão.
Lisboa: Edições 70, 2008.
LOPARIC, Zeljko. (1988): “Kant e o Ceticismo”. MANUSCRITO: Revista
Internacional de Filosofia, Campinas, XI, 2, pp. 67 - 83.