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Ernesto Laclau

UNIVERSJDADE DO ESTADO DO RIO DF.. J.-\1\F..IRO

Reiwr
Ricardo Vicira lves dt: Castro

Vice-rei tora
Maria C hristina Paixão Maio li

Emancipação e diferença
Conrc/enaçiío e ret,úiío técnim gemi
Alice Casimiro Lopes
Elizabeth Macedo

EDITORA DA UNIVERSIDADE DO
ESTADO DO RIO DE JANEI RO

Conselho Editorial
Antonio Augusto Passos Videira
Flo ra Süssekind
!talo Moriconi (presidente)
Ivo Barbieri
Luiz Antonio de Castro Santos
Pedro Colmar Gonçalves da Silva Vellasco

Rio de Janeiro
2011
J'íru kl nn ginal· /: n;onctt'~ll irulf\1 Sumário
V..:rso. Lo ndr.:s ~'"a Y<>rk. I '''I(•
Dirclll>> cedidos pd o a tll<l f r !f<l puhh~.•d•' em hngua pNtu gu..: r·· I ! !cdH· or•• ,;;~
LJ ni"..:rs •d:tdc do t :;wdo do l<•o J.: Jam:1w {Eul fERJ l

EdU ERJ
Edito ra d a ü i'\1\' ERS IDA D E DO ESTA DO DO RI O D E JA :'-.EI RO
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ww w.eduerj .ue rj .br Alice Casimiro Lopes
educrjr0ucrj.br Eliwberh Macedo

Ed11or Exenlli•·o lt:~lo ivlom:om . da e d.1çao


Prc crác!O - .mgIesa ............. .. .. .. .. .. .. .... .... ........ .. · ...... .. · .. .. .. .. .. 15
Coordenadora Adm inisumi•·a Ros~nc l.1ma
Cuordenador de Pí•blicaçcics Renato C':~simtro
Coordenadora de Produrtio Rosania Rolins Agradecimentos publicados na edição inglesa ...... ... ... ...... ........ .. .. ... 19
Coordenador d e Rewstio F:íbio Fh >ra
Re l"isào Shirley l •ma . L - ., ' ') \
Capa ·• Carlota R oso
Agradeci me nto referente à e d 1ção ~as1 e1ra ... .. .... .. .. .. ..... ..... ..... ... .. . -
Projelo e Diagramuçcio Emílio B •:;c:mh

D a e mancipação à liberdade ...... .. ... ........ .. ........ .. .... .. ........ ...... .. .. .... 23

CATALOGAÇAO NA FONTE
UERJIREDE SIRI USINPROT EC
U niversalismo, particularismo e a questão da identidade.... .. .. ..... .. .. 47

Ll 4 1 Laclau, Ernesro, I 935-


Em ancipação e d iferença/ Ernesw Lacbu; coorde- Por que os significantes vazios são importantes
nação e revisão técnica geral, Alice Casimiro Lopes e pa ra a política? .... ... ... .. ...... .. .............. .... .. .. · ..... · .... .. · .. ..... · .... .. .... .. .... 67
Elizabeth M acedo.- Rio de Ja neiro: EdUERJ, 2011.
222 p.
Sujeito d a política, política do sujeito .... .. ..... .................... ... ........... 8 1
ISBN 978-85-7511 - 199-4
"O tempo está deslocad o" .... .................. ....... .. .......... ....... ............. l 07
I. C iência política - Filosofia. 2. Liberdade.
3. Identidade (Conceiro filosófico) . I. Tfrulo.
Pode r e representação ...... .. .. .... ................ .. ................ .... .... .... .. ..... 129
C D U32
':

Da emancipação à liberdade*
~

lI
I É possível ver a "emancipação" - uma noção que é parte de
nosso imaginário político há séculos e a cuja desintegração hoje
assistimos - organizada em wrno de seis dimensões dis.timas. A
primeira é a que poderíamos chamar de d .: u nsão dicotômica: en-
tre o momento emancipawn · · ' >cial que o precedeu,
há um abismo absoluto, u m a f<.ti..ti l.. ,d ..Jc~corttinuidade . A segunda
é o que se pode considerar uma dimensão holístíca: a emancipação
afeta todas as áreas da vida social, e há uma relação de imbricação
essencial entre seus vários conteúdos nessas diferentes áreas. A ter-
ceira dimensão pode ser referida como dimensão de transparência:
se a alienação em seus vários aspectos - religioso, político, eco-
nômico etc. - é erradicada, existe apenas a coincidência absoluta
da essência humana consigo mesma, e não há nenhum espaço
para qualquer relação de poder ou de representação. Emancipação
pressupõe a eliminação do poder, a abolição da distinção sujeito/
objew e a gestão - sem qualquer opacidade ou mediação - dos
assuntos da comunidade por agemes sociais identificados com o
ponto de vista da totalidade social. É nesse semido que, no mar-

Traduzido por Joanildo A. Buriry (Durham Universiry). Texro originalmente pu-


blicado em Alexandrina S. Moura (org.). Utopir~ e fonnttções sociais. Recife: Mas-
sangana, 1994, pp. 29-45. Revisro pelo rraduwr especialmente para esra edição.
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xismo, por exemplo , o co munismo e a extinção do Estado impli- uma positividade opaca a nos con fronrar. e no qual a distúncia
ca m logica mente um ao ourro. entre esta e o racional é finalmente cancelada.
Uma qu arra dimensão é a da preexistência daquilo que deve Até que ponto essas seis dimensões defi nem um todo logica-
ser emancipado vis-à-vis o aro de emancipação . Não existe Gman- mente unificado? C onstituem elas uma cstrumra teórica coerente?
cipação sem opressão, e não há opressão sem a prese nça de algo T entarei mostrar que não, e que a afirmação da noção clássica de
que é tolhido em seu livre descnvolvimenro pelas fo rças opressi- emancipação e de suas muitas variantes envolve a defesa de lógicas
vas. Emancipação não é, nesse sentido, um ato de: criação, mas, incompatíveis. Isso não nos deve levar, no enranro, ao simples
ao conrrário, de libertação de algo que precede o aro libenador. abandono da lógica da emancipação. Ao contrário, é jogand o-se
O urra dimensão é a de fundação (ground), 1 inerente ao proj eto de no in terior do sistema de suas incompatibilidades lógicas que po-
qualquer emancipação radical. Se o aro de emancipação é verda- demos abrir caminho para novos discursos liberadores que não
deiramente radical, se ele vai realmente deixa:- para trás wdo que 0 mais estejam presos às antinomias e aos becos sem saída a que a
precedeu, rem de ocorrer no nível da "fundação " do social. Se não noção clássica d e emancipação levou.
há nenhuma fu ndação, se o aro revolucionário deixa um resíduo Começo com a dimensão dicotômica. A dicoto mia com
que está para além da cãpacidade rransformado ra da práxis eman- que deparamos aqui é de um tipo muiro particular. Não é uma
cipatória, a pró pria ideia de uma emancipação radical se torna simples diferença entre os dois elementos ou estágios que coexis-
contraditória. Finalmente, podemos fal ar de uma dimensão racio- tem contemporânea ou sucessivamente e que, desse m odo, con-
nalista. É neste ponco que os discursos -.:as escarologias seculariza- tribuem para a constituição d e suas ~úruas idenridades d iferen -
das rompem com os das religiosas. Para as escatologias religiosas, a ciais. Se estamos falando de emancipação real, o "o urro" que se
absorção do real no interior de um sistema total de representação opõe à identidade emancipada não pode ser um outro puramente
n ão requer a racionalidade deste último: basta que os desígnios pos iti vo ou neutro, mas um "ourro" que impeça a inteira cons-
inescruráveis de Deus nos sejam transmitidos por meio da reve- tituição da identidade do primeiro elemento. Nesse sentido, a
lação. Mas numa escatologia secular isso não é possível. Como a dicoromia envolvida no ato emancipatório está numa relação de
ideia de uma representabilidade absoluta do real não pode apelar a solidariedade lógica com nossa quarta dimensão - a preexistência
qualquer coisa exterior ao próprio real, ela só pode coincidir com da identidade a ser emancipada vis-à-vis o aro de emancipação.
o princípio de uma racionalidade absoluta. Assim, emancipação É fácil ver por quê: sem essa preexistência, não haveria qualquer
integral é simplesmente um momento no qual o real deixa de ser identidade a reprimir ou impedir de se desenvolver inteiramente,
e a própria noção de emancipação se tornaria sem sentido. Ora,
uma conclusão inevitável segue daí: uma verdadeira emancipa-
N. T.:. O termo grou~d ao longo deste tcxro designa a ideia de um fundamento
1
ção requer um "oucro" real - isco é, um "outro" que não possa
a. pa_:m d? qual se enge, se explica ou se sustenta um dado discurso. Dada a dis-
nnçao ex..stcnte em português entre fundamento c fundação, ambos implicados
ser reduzido a qualquer das figuras do "mesmo". Mas, nesse caso,
no concctro deground, usaremos esses dois termos imcrca mbiavelmente, dando entre a identidade a ser emanci pada e o "outro" que se lhe opõe,
a~enção _ao c~~texro da fr~se em _q ue oc~rre o t!quivaleme em inglês. O gerún-
dio, ou tnfinmvo, grormdmg seca traduz1do por fundamentação; e formdmion ,
não pode haver qualquer objetividade positiva subjacente e que
por fundação. constitua a identidade de ambos os polos da dicotomia.
Uma consideração muito simpl es pode ajudar a c.:sclarccer explicado e m te rmos objeti vo~. i \ m en o~. ~ ób' i<~. 4ue o mome nto
esse pontO. Suponhamos que haj a um processo objetivo mais pro- anragonístico seja purameme aparente l' o conr1m> entre as forças
fundo dando sentido a ambos os lados da dicotomia. Se é assim, o sociais seja assimilado a um processo narural - co mo no choque
abismo que constiwi a dicotomia perde seu caráter radical. Se ela c.:ntre as duas pedras. Mas, como disse. isso ~ incompacível com a
não é constimtiva, m as antes a expressão de um processo positivo , <tlreridade reque rida pelo aw fundanrc de emancipação.
o "outro" não pode ser um ourro real: dado que a d ico romia é Ora, se a dime nsão dicotômica reque r a alreridade radical
fundada numa necessidade objetiva, a dimensão oposiciona1 ta m- de um passado que rem de s<.:r lançado fora , ela é incompadvel
bém é necessária c, no caso, é parte da identidade das duas forças com a maior parte d as ou tras que apresenrei como consriwrivas
que se confrontam. A percepção do ourro como um outro radical da noção clássica de e mancipação . Em primeiro lugar, o radicalis-
só pode ser aparente. Se uma pedra se quebra quando se choca mo dicotômico e o fundamento radical são incompadveis. Co mo
com o utra, seria absurdo dizer que a segunda pedra nega a idenci- vimos, a condição do abismo rad ical que a lógi ca emancipatória
dade da primeira - ao contrário, ser quebrada em cenas circuns- requer é a alteridade irredutível do sistema opresso'r ~ue é rej.eita-
tâncias expressa a identidade da pedra ramo quantO permanecer do. Então, não pode haver qualquer fundamento umco expltcan-
inalterada se as circunstâncias forem diferentes. A característica do tanto a ordem que é rej eitada quanto a ordem que a emancipa-
de um processo objetivo é que ele reduz sua própria lógica à to- cão inaugu ra.
talidade d e seus momentos constimtivos. O "outro" só pode ser , A alternativa é clara: ou bem a e mancipação é radical, e nes-
o resultado de uma diferenciação interna do "mesmo" e, conse- se caso ela tem de ser seu próprio fu~·dam enro e confinar o que
quentemente, é inteiramente subordinado a este úlêimo. Mas não é excluído a uma alceridade radical constiruída pelo mal ou pela
é essa a alre ridadc que o abismo do ato emancipatório requer. Não irracionalidade; ou bem existe um fundamenro m ais profundo que
haveria nenhuma ruptura, nenhuma verdadeira emancipação, se estabeleça as ligações racionais e nrre a ordem preemanciparória, a
o ato constitmivo desta fosse apenas o resultado da diferenciação nova ordem "emancipada" e a transição entre a mbas -em cujo
interna do sistema opressor. caso a emancipação não pode ser considerada uma verdadeira fun-
Isso pode ser exprimido de maneira ligeiramente diferente dação radical.
ao dizer-se que, se a emancipação for verdadeira, será incompatí- Os filósofos do Iluminismo foram perfeiran1ente canse-
vel com qualquer tipo de explicação "objetiva". Posso certamente quentes quando afirmaram que, se uma sociedade racional fos~e
explicar um conjunto de circunstâncias que tornaram possíveL a uma ordem totalmente desenvolvida resultante de um rompi-
emergência de um sistema opresso r. T ambém posso explicar como mento radical com o passado, qualquer orga nização prévia àquele
forças antagônicas àquele sistema foram constituídas e evoluíram. rompimento só poderia ser concebida como produto da ignorân-
Mas o estrito m omento da confrontação entre ambas, se o abismo cia e da loucura dos homens, isro é, como privada de qualquer
for radicaL, será refratário a qualquer tipo d e explicação objetiva. racionalidade. A d ificuldade, entretanto, é que, se o ato fundante
Enrre dois discursos incompatíveis, cada qual constituindo o polo de uma sociedade ve rdadeiramente racional for concebido como
de um antagonismo en tre ambos, não existe qualquer ponto em a vitória sobre as forças irracionais do passado - forças que nada
comum, e o momento exato do choque entre eles não pode ser cêm em com um com a nova ordem vitoriosa -, o ato fundante em
l ).t CIIJ.1 1h rp.n,.tP .1 li!·..:rd.tdt. 2!:

si não poderá ser racional, mas ele pró prio se rá totalmente: contin- possibilidad e de alcançá- la se a opacidad e im:rc: nrç à alceridade
genre c depe nderá de uma rdaç:ío de: p1>dcr. Nesse caso. a ordem radical for constitutiva d as relações sociais. hn.1lmeme. co mo vi-
social emancipada ramb~m se rorna puramenre conringen re e não mos, nas escarologias secularizadas roral represenrabilidadc é equi-
pode ser co nsiderada a libertação de qualquer essência humana valente a conhecirncnro absoluto - enrendido co mo roral redução
verdadeira. C hegamos ao mesmo d ik:ma de antes: se quisermos do real ao racional -, e isso só pode se r alcançado se o o utro for
afi rmar a racionalidade e a permant::nci:t da nova ordem social que reduzido ao mesmo.
estamos estabelecendo, tc:remos de esre nder a racionalidade ao aro Então, podemos ver que os discu rsos de emancipação têm
fundanre em si e, como resultado, à ord em social que deve ser d er- sido histOricamente constituídos por meio d a junção d e duas li-
rubada- e então o radicalis mo da dimensão dicotômica desapare- nhas inco mpatíveis de pensamento: urna, que pressupõe a ob-
ce. Se, ao contrário, afirmarmos o radica lismo desta última, ramo jetividade e plena represem abilidade do social; e outra, que só
o aro fundanre quanto a o rdem so<.:ial resultante dele se tornarão se sustenta sobre a demonstração de que há um abismo que ror-
inreiramenrc conringenres - isto é, as condições de um exteri or na qualquer objetividade social, em última a nálise, imposs ível.
e~rrutural permanente estão criad_as c o que agora desaparece é a Ora, o pomo importante é que essas duas linh as de pensamento
dtmensão de fundação da noção cl ássica de emancipação. opostas não são simples erros analíticos demre os quais podemos
. Essa incompatibilidade do discurso da emancipação emre escolher um e formul ar um discu rso ernancipatório livre de in-
a dtmensão dicotômica e a de fund ação cria duas matrizes funda- consistências lógicas. É afirmando ambas as linhas que a noção
mentais em to r~o das quais rodas as ourras dirnens'ões são organi - de emancipação adqu ire significado. Emancipação sign if ica ao
zadas . Como dtsse, a preexistên cia dos oprimidos vis-à-vis a fo r- mesmo tempo fundação (/oundation) radical e exclusão rad ical -
ça opr~ssora é um corolário do radicalismo do abismo requerido isto é, ela postula ao mesmo tempo um fund am ento d o social e
pela dtrnensão dicotômica - se os oprimidos não preexisrissem à sua impossibilidade. É necessário que urna sociedade emancipada
o rdem opressora, seriam um efeito d esca, e, nesse caso, 0 abism o seja plena mente transpa rente para si mesm a e q ue essa transpa-
não seria consriru.riv?. (Outra questão é se o abismo não é repre- rência seja constituída pela dema rcação de uma opacidade es-
semad~ pelos opnmtdos por meio de formas de identificação que sencial- resultando disso que a linha demarcatória não pode ser
pressupoem a presença do opressor. Voltarei a esse pomo.) Mas pensada desde o lado da transpa rência e que a própria transpa-
rodas as outras dimensões requerem logicamen te a p resença d e rência se rorna opaca. É preciso que urna sociedade raciona l seja
um fundam~nt~ ~osirivo e são, consequentemenre, incompadveis urna roralidade fechada em si mesma, que subordine a si rodos
c~m. a consm~ttvtdade do abismo requerido pela dimensão dico- os seus processos parciais; porém, os limites dessa configuração
to~t~. O ho!tsmo seria impossível, a menos que um fun damemo holísrica - sem os qua is esta não existiria de forma alguma - só
posmvo do social unificasse numa roralidade aurossuficiente a va- podem ser estabelecidos pela diferenciação entre ela (a configura-
ried~de d e seus processos parciais- antagonismos e dicotomias in- ção) e um exterior irracional e informe. C oncluímos assim que as
clustv~. M as aí o abismo rem de ser interno à ordem social, e não duas linhas de pensamento são logicamente incompatíveis e que,
uma lmh~ d~visória separando a ordem social de algo fora dela. no entanro, requisitam-se mutuamente: na ausência d e ambas,
TransparencJa requer plena representabilidade, e não há q ualquer roda a noção de emancipação des moronaria.
30 Em,tncip.t~:Í<' ' difcr<·nç:t

O qu e resulta, n o <:ma mo, d<.:ssa incomp:-n ibilidade ló- L\ 1.1<; o que dizer da hipótc\C em si? É ~.:la logicamcntt.: im -
gica ? D e que man eira a noção de emancipação desmorona e m pecável, sc:n do nossa rardà apen.1~ dcrcrmin:u se c:sr:i c\.·n ... ou er-
decorrência daquela? Está claro que eb só se desintegra num rada? Evidt: nte qu<.: não. po rque..: tudo o que foi clico sobr~: ;.~ lóg ica
terreno lógico, mas isso não quer dizer de modo alg um que isso do fundamento e suas dimensót:S concomitant es - rramp.trC: n-
sc:ja suficie m e para rorn á- 1~ inoperanre socialmente - a mt.:nos , cia, holismo erc. - apl ica-se inrt: iramcnrc aqui. A rr:=tn:-.parl: ncia,
n:Huralmeme, que adore m os a hipó tese absurda d e que o terreno como vimos, constitui-se num n.:rreJJO pdo aro de exdu ~:i.o da
social seja es truturado como um te rreno lógico c que proposi- opacidade:. E o que dizer sobre o ato de exclusão em si, a difêrença
ções contrad itórias não possam ter cfcrividade social. Dcv~.:m os
1i constitLJLi va entre transparência <.: opacidade: ~ ela rranspart:nte
distinguir c uidadosamence a esta altura duas afirmações muito ou opaca? Está claro que a alternativa é indccidíveP e q ue os dois
diferemes. A primeira é a de que o princípio da comradição não
se apiica à sociedade e, em decorrência, alguém pode estar e não
estar no m esmo lugar ao mesmo tempo, ou o m esmo projeto de
l
j
movime m os igualmente possíveis- tornar o opaco transparente e
o rranspare nre, opaco- rurvam a limpide<. da alrernariva.
Toda essa digressão sobre o status de contradições lógicas na
lei ten ha sido promulgado e não promulgado etc. Não acho que sociedade é importante para nos ~o nscientiza r t!e dois aspecros que
alguém teria coragem de formular esse tipo de proposição. No rêm de ser levados em coma ao se lida r com os jogos de lingua-
e ntanto, é uma proposição rotalrnenrc diferente afirmar que as gem que podem ser jogados dentro da lógica da emancipação. O
práticas sociais constroem conceiros e instituições cujo funcio- primeiro é que, se o re rmo "emancipação" ainda pode ter sentido,
namento inre rior seja baseado na ope ração de lógicas incompa- é impossível renunciar a qualquer um de seus do1s lados incompa-
tíveis. E n ão há obviamente aqui qualquer negação do princípio
da comradição, porque dizer o contrário seria afirmar que é
logicamcme con traditório formular proposições contraditórias,
l
J
tÍveis. Antes, devemos jogar um contra o ourro de modo a sere m
especificados. O segundo aspecto é que esse duplo e contraditório
requisiro não é simplesmente algo que tenhamos de afirm a r se se

l
o que certamente não é o caso. Agora, se a operação de lógicas rem de manter emancipação como um termo político relcva nre. Se
comraditórias pode perfeitamente esta r na raiz de muitas ins- o problema rodo fosse esse, poderíamos evirá-lo apenas negando
tituições e práticas sociais, surge o problema de até que ponto que emancipação seja um conceito válido c afirmando a validade
tal operação é possível. Seria o caso de lógicas incompatíveis
operarem no interior da sociedade, mas não se esten derem à l N . T.: Na faha de um c:quivalenre em ponuguês qm: correspondesse fielmcnre
aos m:ologismos inglcsc:s undecidability, undecidttb!e, opt:~ mos, neste livro, por
sociedade como um todo? O u seja, formular proposições con-
traditórias seria em cenas circunstâncias um requisito lógico
para que a sociedade corno um todo não fosse contraditória?
I m:~nter o neo-logismo para o adjetivo, trad uzindo-o de: forma um ramo c:stranha
e não usual - indecidível-, e nquanto tr:1du1.imos o substantivo como indecidi-
biLidade. C laro esd que os termos não implicam uma suspensão da capacidade
de decidir, um imobilismo, mas a situação em que, por um lado, não é possível
Estamos aqui próximos à astúcia da razão de Hegel. E é claro fundame ntar racional e radicalmente as razões de uma decisão, senão pelo re-
conhecimento da contingência de tal decisão, e em que, por o utro, o conteúdo
que aqu i estamos lidando com urna hipótese ontológica, e não da decisão não está predeterminado por nenhum processo objetivo subjacente a
com um requisiro lógico. Essa hipótese ontológica não é nada cada uma das alternativas entre as quais se decide. Em tal siwação, hesitação e
mais do que uma nova formu lação da "d imensão de fundação" decisão são duas dimensões do mesmo processo. Por exemplo, quer-se salienrar
a impossibilidade de se oprar enrrc universalismo e particularismo, de m:meira
que discuti anteriorme nte. racional c fundamentada, como será discutido no próximo capírulo.
de u ma da:-. duas lógicas romad as scpa rada memt:. ivlas precisarnen- será perfeira. sem quaisquer d ivisões imernas. qualque r opacidade
re isso não ~ po:-.;,ívd: nossa an<il ise nos k:vou :l u HJc\usão de: que ou alienação; as vá rias alternativas na luta comra as fo rças do mal
os lados conrradi córios requerem a presença e ao mesmo rempo .t e 0 triunfo final de D eus são conhecidos pela revelação. Ora, nes-
e xclusão um do ou rro: cada um é a condição ramo de possibi! icladc se q:.taclro mundializame vemos su rgir uma dificu ldade que não
q uanro de impos~ i bil i dade do OLmo. Assim, não estamos lida ndo é outra senão o reconhecimento teológico de nossas d uas dimen -
simplesmcnre com urna incompacibil idadc lógica, mas a m es com sões incompatíveis. D eus é todo-poderoso e infinitamente bom.
uma real indecicl ibi lidade emre os dois belos. Isso j~í nos indica ,1 Como criador ex nihiw ele melo o que há, é a fome e o fundamento
maneira pela qual a lógica ela emancipação re m ele ser abordada: absolutos ele todos os seres criados. Nesse caso, como explicarmos a
observa ndo-se os efeitos que resultam ela subversão de cada um de presença do mal no mundo? A alternativa é cla ra: ou D eus é. rocl~­
seus lados inco m~nríve is pelo ourro. A própri a possibilidade des- podcroso e fome de tudo o que há - e aí ele não pode ser mfint-
sa análise resu lta do que foi diro anteriormente: a operação social ra bondade porque é responsável pela presença elo mal no mundo;
de duas lógicas incompatíveis n ão consiste numa a nu lação pura e ou ele não é responsável por aquela e, logo, não é todo-pode roso.
sim ples de seus respectivos efeitos, m as num conj unto específico de Aparece aqui o mesmo problema que coloquei em termos não
deformações mútuas. É isso que em endo por subversão. Como se teológicos: ou a dicotomia separa ndo bem e m al é radical, sem pon-
cada uma das lógicas incompadveis pressupusesse uma roral ope- ro em comum enrre os dois polos, ou existe um tal terreno comum,
ração que a outra está negando, com o se tal negação levasse a uma e nesse caso o radicalismo da oposição emre bem e mal é nublado.
subversão clescritível da esuurura interna ele cada uma dc;as. Ao O pensamemo criscão, con frontado por essa alternativa, osfllou en-
analisar esses efeitos subversivos, não estamos presenciando o sur- tre (a) a afirmação de que os desígnios de Deus são inesc rutáveis e o
gimento de algo totalmente novo que deixa ambas as lógicas para dilema resulrava elas limitações ela razão humana - de form a que o
trás, mas ames um afastamento sistemático daquilo que ele outra problema foi posto de lado sem solução - e (b) a busca ele uma so-
forma seria sua plena operação. lução que, pa ra ser o mínimo consistente, só poderia manter a ima-
Ames que passássemos a escrever o padrão geral desse afas- aem de Deus como fome absoluta ao afirmar, ele uma maneira ou
t>
tamento, tínhamos ele considerar, entretanto, a maneira pela qual ele outra, o caráter necessário elo mal. Eriugena, ao defender, no re-
discursos emanciparórios clássicos lidaram com nossas dimensões nascimemo carolíngio, que Deus alcança sua perfeição por m eio elas
basicamente incompatíveis, que não passaram totalmente desperce- fases ele transição que envolvem finitucle, conti ngência e o mal, deu
bidas. Um discurso de emancipação radical emergiu pela primeira início a uma tradição que, passando pelo misticismo nórdico, Ni-
vez com o cristianismo, e sua forma específica era a salvação. Com colau ele Cusa e Espinosa, chega ria a seu clímax em H egel e Marx.
elementos parcialmente herdados elo Apocalipse judaico, o cristia- A visão cristã ela história também se defrontou com outro
nismo apresentava a imagem ele um futuro da humanidade- ou problema- dessa feita sem contradição -, o ela incomensurabi lidade
pós-humanidade - elo qual todo mal teria sido erradicado. Ambas existente entre a universalidade da tarefa a ser realizada e a limitação
as dimensões, dicotômica e ele fundação, esrão presentes aqui: a dos agentes finitos responsáveis por ela. A categoria da encarna-
história do mundo é uma permanente luta entre os santos e as for- ção foi concebida a fim d e mediar e ntre essas duas realidades inco-
ças elo mal, e não há terreno comum entre eles; a sociedade futura mensuráveis. O p a radigma de toda enca rnação é, naturalmente, o
r
advenro de próprio C risto, mas cada u m dos momenros universais ciedades antagônicas: o com unismo primi ti\·o Linha de se desinre-
na história do mundo é marcado por intervenções divinas nas quais orar 1 fim de desenvolver as forç:as produti vas da humanidade; o
<

corpos finiros têm de assumir tarefàs que não escavam de maneira desenvolvimemo destas requeria - como sua condição histórica e
nen huma predeterminadas por sua finirude concreta. A dialética da lógica- a passagem pelo inferno de sucessivos regimes explorado-
encarnação pressupõe a distância infinita entre o corpo encarname res; e é sornenrc ao final do processo, quando a história atinge seu
e a tare('l encarnada. É somente a mediação de Deus que estabelece clímax num novo comun ismo - que representa um desenvolvi-
uma ponte emre os dois, por motivos que escapam à razão humana. mento a mais das forças produtivas-, que o sentido e a raciona li-
Voltando às nossas várias dimensões de emancipação, pode- dade de rodo o sofrimento anterior finalmenre se mostram. Como
mos dizer que, no discurso cristão, a transparência é assegurada no l Hegel disse, a história universal não é o terreno da felicidade. Tudo
nível da representação, mas não no do conhecimento. A revelação J _ escravidão, obscurantismo, terrorismo, exploração, Auschwitz -
nos dá uma representação da tOtalidade da história, mas a racio- revela, desde o ponto privilegiado da história universal, sua subs-
nalidade que se expressa naquela história sempre nos escapará. É tância racional. Rejeição radical, antagonismo, incompatibilidades
por isso que a dimensão racionalista tinha de estar ausente das éticas - em suma, qualquer coisa ligada à_dimensão dicotômica
narrativas teológicas da salvação. - perrencem ao domínio das superestruturas, ao modo pelo qual
É esse abismo entre representação e racionalidade que as os arores sociais vivem (disrorcidamenre) suas relações com suas
escatologias modernas tentarão preencher. Uma vez que Deus não condições reais. Como foi clico num famoso rexro :
mais se encontra em primeiro plano como garamia de plena repre-
senrabilidade, a fundação tinha de demonstrar suas habilidades As mudanças nas bases econômicas levam cedo ou tarde à trans-
wralizadoras sem qualquer recurso a uma distância infinita em formação de toda a imensa superestrurura. Ao se eswdarem tais
J
relação àquilo que ela incorpora. Assim, plena representação só se transformações, é sempre necessário distinguir cmrc a transfor-
torna possível como plena racionalidade. A primeira consequên-
l mação material das condições econômicas de produção, que
cia dessa guinada moderna é que o movimento insinuado nas ver- 1 pode ser distinguida com a precisão das c iências naturais, e as
sões panteístas e semipanreísras do cristianismo é agora levado a formas legais, políticas, religiosas, artísticas ou filosóficas - em
suas conclusões lógicas. Se há um fundamento a partir do qual a síntese, ideológicas - pelas quais os homens romam consciência
história humana se mostra como puramente racional- e, portan- deste conflito e lutam contra ele. Assim como não se julga um
to, inteirameme aurotransparente -, mal, opacidade e alteridade indivíduo pelo que ele acha de si mesmo, também não se pode
só podem ser o resultado de representações parciais e distorcidas. julgar um tal período de transformação por sua consciência, mas,
Quanto mais a dimensão de fundação se impõe, mais a alceridade ao contrário, sua consciência deve ser explicada a partir das con-
irrecuperável do abismo inerente à dimensão dicotômica rem de tradições da vida material, a partir dos conflitos existentes entre
ser descartada como falsa consciência. as forças sociais de produção e relações de produção.3
Mencionei anteriormente a "astúcia da razão" hegeliana.
Mas as versões marxianas do mesmo princípio não fica m atrás. 3
Karl Marx. A contribution to the critique of political economy. Londres: Lawrence
Basta lembrar a descrição de emergência e desenvolvimento de so- and Wisharr, 1971, p. 24.
A ~.., im ,
r11.:ssa leitura . .1 dim<.:nsão dicotô mica .,c m rn a uma dizer qu(. ele 15 oprimido pelo me:-mo regim~ qw.~, o con~ritu i.
--~upcre~rrurura" da dirnen~ão de Fundaç~o . e a ema nc ipação se Podemos. é cla ro, argumtma r que o proktanado e p roduto do
transforma num m c:ro adorno retórico d<.: um proo.:~so substan- ckse nvnlvimenw capitalista, pois som ente este cria a separação
tivo q ue: deve ser cmcndido em termos inteiramen te diferentes. cncre 0 p rodutGr d irem e a propried ad e dos meios de prod uçá~,
Com o resulcado disso. o s~.:gundo requisito lógico dL·ssa inv~.: rsã o mas isso s6 explica a e mergê ncia do proletariado como u ma posi-
essc:nc ialista é que remos de: ahandona r cotalm enre a c!i.dética da ção de suj eito pa rticular no interior d a s?~iedade ca~iralis ta , não
encarnação. a emergência do proletariado com o SLIJeiro e ma_nC1?ador. Para
Como vimos, a enca rnação requer uma liga ção entre os ter este úl timo. precisam os demonstra r que o capl(ahsra nega no
d ois elementos via a mediação de um terceiro externo a eles, de trabalhado r a lgo que não é me ro prod uto do capita lismo. Em
ta l m od o que, cnrregues a si mesmos, há uma disrância intrans-
p onível e ntre os do is primeiros elementos; isto é, se m o tercei-
ro ele me nro não existiria nenhuma ligação entre eles. Assim, a
I nossos rermos: precisamos mostrar que há uma dime nsão a ma-
cronística que não é reducívcl a um fundamento único. O u seja,
D .
a condição da verdade ira emancipação é, como mencione•, u m a
.

enca rnação e ra possível na m edida e m qw.: D e us e ra pane do


explanans; poré m, se Ele recua para o fundo da cena , a cone- I opacidade constitutiva que nenhuma fundamentação pode erra-
dica r. Isso significa que as duas operações de fecha m e nto que

~
xão entre universalidade encarnada e corpo e ncarnanrc torna-se fundara m o discurso po lítico da modernidade têm de ser eles-
impossíve l. Que r dizer, u ma escarologia plenameme rac ionalista feiras. Se a modernidade iniciou-se por meio de um estritO en-
e secular rem de de m onstrar a possibilidade de um aror un iver- -- 1 laçame nro entre represcmabil idad e c conhec~mento: a o~acidade -.
s.sU que es teja pa ra além d a contradição enrre particularidade e I constiwti\'a resultante d a dialética da e manctpação Implica q ue a
unive rsalidade, ou melhor, um acor cuja parricularidade expresse I sociedade não é mais transparente ao conhecimento e que- uma
direrameme, sem qualquer sistema d e mediações, a pura c uni- lI vez que D eus não esrá mais lá para substit~ir con heci m~nro po~
versal essência humana. Esse aror, pa ra Marx, é o proletariado, revelação - toda representação será necessa namem~ parcial e ter_a
cuja parcicularidade expressa a universalidade de ral modo dire- luvar cont ra 0 pano de fundo de uma essencial Irrc presentabt-
tamente que seu advemo é concebido como o fim da necessida- lidade. Além disso, essa opacidade co nstitutiva retira o funda-
de d e qua lquer processo de represemação. N enhum a encarnação me nto que havia possibilitado ir além da dialética da encarnaçã~,
rem lugar aqui. Mas, se olharmos mais d e perco, veremos que esse visto que não há mais uma socied ade transparente ~a ~ual o um-
ator, apresentado como o único que pode levar a cabo um verda- versa! possa mostrar-se de maneira dire ta c não mediatJzada. M as
deiro processo de emancipação, é precisamente aquele pa ra quem nova meme, se D eus não está mais lá, assegura ndo por Sua pala-
"emancipação" se torna um termo insignificante. Como cons- vra 0 conhecime nto de um destino universal que escapa à razão
truirmos a identidade desse ator? O agente da emancipação rem humana, a opacidade també m não pode levar a uma restauração
de ser um cuja identidade seja bloqueada em sua constituição/ d a dialética da e ncarnação. A morre da fundação parece levar à
desenvolvime nto pela existência de um regim e opressivo. Conru- m orte do universal e à dissolução das Juras sociais em mero par-
do, se o processo d e desintegração do regime e o de formação do ticularismo. Essa é a oucra dimensão da lógica erna nciparória que
ator "emancipatório" são o mesmo, então dificilme nte podemos salicnrei anteriormente: se a ausência de uma fundaç ão é a condi-
ção da emancipação rad ical, o radicalismo do aro cm ancipar6rio necessário. nos de ixa num mu ndo puramente parricu larisra, c:rn
fundauo r não pode <><.:r concebido de o urra m aneira sen ão como que os arares sociais perst..:guem apenas objt..:rivos limirados? Um
um ato de fundamencação. instante de rdlexão é has ranre pa ra nos mos(J'ar que essa conclu-
Assin1, é como se. qua lquer que seja a direção que tomar- são não é adequada .
mos, a emancipação se torne impossível. No encanro, lanço uma ·' Pani cularismo'' é um co nceito ess<.:ncialmenre relaciona! :
dúvida ames de passarmos o ates tado de óbito. Pois, embora te- algo é particular em relação a ou eras particu laridades, e o conjunto
nham sido exp loradas as consequências lógicas que seguem de delas pressupõe uma wral idadc social no interior da q ual elas são
cada uma d as alrern:uivas separadamente, ainda não foi dito constituídas. Ass im, se a própria noção d e wralidade social está
nada sobre os dciros que poderiam d erivar d a interação social em questão, a de identidades "particulares" é igualmeme ameaça-
dessas duas impossibilidad es simétricas. Consideremos a ques- da. A categoria de wral idade cont inua nos rondando pelos efeiws
rão cuidadosamente. que derivam de sua ausência.
A emancipação está estritamente vinculada ao destino do ~ Essa última colocação abre cam inh o para um a fo rma de
universal. Quer a dimensão de fundação prevaleça, quer a eman- conceber a relação entre parricularismo e universalisn:o que difere
cipação venha a ser um verdadeiro ato de fundação radical, sua canto da encarnação de um no ouuo quanto do cancelamemo de
perfo.rmanc~ não pode ser obra de qualquer agência social parti-
culansta. VImos que estas duas dimensões - fundação e abismo
r:o.Jical - são realmente incompatíveis, mas ambas as alrernativas
requerem igualmente a presença do universal. Sem a emeraência
do universal no terreno histórico, a emancipação seria impo~sível.
I
~
sua diferença e que, de faro, cria a possibilidade de novos discursos
de liberação . Estes vão, certamente, além da emancipação, mas
são construídos por meio de movimentos que ocorrem no sistema
de alternativas gerado por aquela. Consideremos, para começar,
qualquer antagonismo social- por exemplo, uma minoria nacio-
. No pensamenro teológico, como vimos, essa presença do
untversal era garantida pela lógica da encarnação, que mediava
j nal que é oprimida por um Estado auroritário.
Existe aqui um abismo enrre os dois, e já sabemos que
entre a finitude particularisra e a tarefa universal. E nas esca- há em rodos os abismos uma indecidibilidade básica quanto a
r?logias secularizadas o universal tinha de surgir sem qualquer qual de seus dois lados a linha divisória pertence. Suponhamos

I
tipo de mediação: a "classe universal" em Marx pode realizar que em cerro pomo as outras forças antagonistas - uma invasão
seu trabalho emancipacório porque ela se wrnou, precisamente, estrangeira, forças econômicas hostis etc. - intervenham. A mi-
pu:a essência humana que abandonou qualquer filiação parricu- noria nacional verá todas como ameaças equivalentes contra sua
la:tsra. Ora,. a impossibilidade lógica Li lei ma, de um abismo que identidade própria. Ora, se há equivalência, isso significa que
sep verdadelfamente radical ou da dissolução da emancipação algo igualmente presente em todas as diferentíssimas forças an-
e~ algu~~ :ersão da "astúcia da razão", parece destruir a pró- tagônicas se expressa por meio delas. Esse elemento comum, no
pna posstbdtdade de quaisquer efeitos roralizances. Com isso, o entanto, não pode ser algo positivo, porque, do pomo de vista de
Lin.ico terreno em que o universal p oderia emerai r- a totalidade suas características positivas concretas, cada uma dessas forças
. I o
socta - aparentemente desapareceu. Isso significa que o uni- diferem da outra. Logo, rem de ser algo puramente negativo: a
versal, na impossibilidade da emancipação como seu corolário ameaça que cada uma põe à identidade nacional.
40 Ema ncop.tc."ío ,. dikre 11~.•1

Conclui-se que, n u ma rct.1~o,iio de cquivalcn ~ia . cada um tran-Jo 1 111 a esL~o.: no :>ímhnlo de uma univcrsalida<.k que o tra ns-
dos rermos cquivaknrcs funcion a como um símbolo da ncgar;- cende; , ) como. no c n onto, o universal - romado em si mesmo
vidadc co mo tal , de cerra impo~sib iliJade unive rsal que pcnetra _é um ;;ignificante vazio. quaL comcúdo particular o simbolizará é
a idemiclade em questão . Posw em outros termos: numa rdação aluo qu,.- ~1áo pode ser cktr' rminado por uma análise do particular
anragonísrica. aquilo qué· funcion a co mo o polo negativo d e c;na t.:l~ si ne m do univer~al em si. A relação entre os do is depende do
identid ade é con stitutiva mente Ji vidido. Todos os seus conteúdos conrexro do anta~onis mo e é, no es trito scmido do te rmo, uma
ex pressam uma negarividadc ge r:-~1 que os transcende:. Por isso, o 0
e ração hcgemo nicL É como se a linha indecidível que sepa ra os
p d c . . d . l' .
polo "positivo" tam bém não p ode ser reduzido a seus conte údos dois po los da dicotomia rivessc expan . ido se us ere1ros 111 e_c tc tve~s
concretos: se o q ue se lhes opõe C: a forma universal da negarivi- ao inte rio r dos próp rios polos, à própria relação entre umversali-
dade como tal, esses conreüdos têm d e expressar por meio de sua dade c parti cularidade.
relação equivalencial a forma uni versa! de plen iwde ou identi- C o nsideremos. à luz dessas conclusões, o que aco ntece com
d ade. N ão estamos lida ndo aqui com a "negação de terminada'' as seis dimensões da noção de e mancipação apresentadas no iní-
no sentido hcgcliano : enquanto esta procede da apa rente posi- cio. A dimensão de fun dação é inco mpa rível com a emancipação
tividade do conc reto e "circula" por meio de conteLklos se mpre c nos ~nvolve e m aporias lógi cas insuperáveis. Será que isso, entre-
de terminados, nossa noção de negarividade depende do fracasso tanto, significa que não podemos manter mais quaisquer ligações
de constiruição de roda dete rminação. com a noção de "fundação", que esta tenha de ser merame nte
Essa divisão constitutiva mostra a emergência do universal aoandonada? Obviamenre não, q uando menos porque desagrega-
no seio do ~arti cular. Mas mosrra també m que a relação entre ção e panicu larismo - que co nstituem a única alternativa possível
p a rticularidade e universalidade é essencialmenre instável e inde- - pressupõem e ao mesmo tempo n egam a noção de fundação.
cidível. Que conreüdo panicular iria encarnar a universalidade É possível, no emamo, faze r d a interação dessas lógicas
era uma decisão de Deus, nas escarologias cristãs, e estava conse- incompatíveis o lugar mesmo de certa produtividade política.
quenre, inteiramente fixad o e predeterminado. C omo a univer- A particularidade tanw nega quanto requer totalidade - isto. é,
salidade aurorransparente era um momenro no alto desenvolvi- fundação. Esses movimentos contraditórios se expressam naquilo
roe mo racional da p a rticularidade, que ator particular ir ia abolir que rem sido denominado divisão constitutiva de roda ide ntidade
sua distância em relação ao universal era algo igualmente ftxado concreta. A totalidade é impossível c ao m esm o tempo requisitada
por determinações essenciais na visão hegelo-marxista da histó ria. pelo particular: nesse sentido, es tá presente no particular como
Todavia, se o universal resulta de uma divisão conscitutiva em aquilo que está ausente, como uma falta~ constitutiva que força
gue a negação de uma identidade particular transforma esta no
símbolo da identidade e plenitude como tais, então remos de con- ' N. T.: ·'Falta" traduz, neste livro, o termo laca niano /e manque, em inglês lack.
O n:rmo "f:'llta" tem origem na psicanálise lacaniana e indic~ ~ divisão fun_da-
cluir que: a) o universal não tem nenhum conteúdo próprio, m as mental que ao mesmo tempo possibilita a iden~i~c~ção do SLIJC!tO _e ~ tor~a Im-
é uma plenitude ausente, ou melhor, o significame de p leniwde possível de se torali ur, de governar tOdo o rernw_no de sua p~opna t~enudade.
Sua uriliz:tção chama a atenção para a simultaneadade de ~anos sentt_dos: o de
em si, da própria ideia de plenitude; b) o universal só pode surcrir uma falha ou fissura geológica. o de um hiato entre a .'deaa de to~alt~ade (o~
do particular, pois apenas a negação de um conteúdo particular identidade) c suas "enc:unações" concretas e o de um vazto esrruwraJ (e tn rolera-
42 Emancip,u;5o <: dikrenv r
co nsra nremcnt<.: ~ ) parricular ,t se r mais d o que e le mesmo, a as- aIg:o t.l. lvç.1· 1 11 •ai ,~ ~n.:cioso do <.1UC:
1 ·• _
a L;c'rrcza_
que ~.:sra. mos . perdc:n-
~ _
sumir um papel un ive rsa! que s<Í pode ser precário e não sutura- ~o : cena \.tb t.:·rd ,, -.J·-~ \'l.~~-:1-vi~ '1) di h::n.:nr<.:S rormas de• •
tdemthcaçau
. ,
,
d
do. F. por isso que: podem.os ter uma polírica democ rática: uma impotc:nres para nos prender nas redes de t~m:: logtcl mapelavd.
sucessão de idenr id ad<::~ fin itas e particulares que renram assumir 0 mesmo se aplica à dimens:io de rransparenc ta: pl~na reprcs~.:n­
ta refas unive rsais que as ultrapassam, mas que, e m decorrência, rabilidade não esr<i mais lá como possibili~ade, mas tsso não quer
nunca são capazes de ocultar inn.:iramen te a distância emre rarefa d izer que sua nece:.sidade Lenha s ido erradJCada .. . .
e idenridadc - e podem sempre ser substituídas por grupos aher- Esse abismo inrranspo nível entre posstbiltdade e neces~t-
nativos. lncomplerude e proviso riedade pe rte ncem à essência da dade leva direram e nre ao que N ietzschc.: chamou de ''guerra de
d<.:mocrac ia. ·
10rerpr eraço-es" · Se seres flniros e limi tados tentam co nhecer o
Não é preciso dizer que a dimensão holística m ove-se na mundo e rorná-lo rransparenre a si mesmos, é impossível que essa
mesma linha que a dimensão de fundação: as duas são, de faro , . ·tacão e Ftnirude não seja m transmitidas aos producos de sua
I tml ' d . -
a mesma dimensão, visca de ângulos diferenres. Quanto à dimen- atividade íntelecmal. Nesse senrido, o abandono a asptraçao a
são racional ista, devemos leva r e m conra que a virad a secula rista conhecimento "absoluro" rem efeiros esrimulanres: po r ~m
um d d .
da moclemidade envolveu ramo a afirmação de que o sentido da lado, os seres human os podem se reconhece r como ver a etros
história não deve ser e ncontrado fora da história m esm a, de que ·adores e não mais como recipienres passivos de uma estrutura
cn ~ d
não h á nenhum poder sobrenatura l operando como origem últi- predeterminada; por o utro , como ro~os o_s agentes soc_iais ~em e
m a d e rud?. que existe, q uanto a afirmação, muiro dife reme, de reconhecer sua flnitude conc reta, nmgue m pode asptrar a ser a
que essa sucessão p uramente mundana de eventos é um processo verdadeira~onsciência do mundo. Isso abre caminho para uma
inteiramente racional, que os seres humanos são capazes de do- interação sem-Ftm enrre várias pe rspectivas e rorna ainda mais dis-
minar imelectualm eme. tante a possibilidade de qualque r sonho to ralirário. , .
Assim, a razão reocupa o terreno que o cristianismo havia Que dizer daqueles aspeccos que são incompanvets com a
atribuído a Deus. Mas o eclipse da fundação priva a razão de sua dimensão de fundação e dos que dependem dela? Como remos
capacidade total izante, e apenas a primeira afirmação (ou ames visro, a dimensão dicotômica pressupõe a localização estrutural
compromisso) - o caráter inrramundano de roda explicação - se de uma fundação e, ao mesmo tempo , a rorna dispensável. Só há
m antém. A razão é necessária, mas também impossível. A presen- esse lucrar no nível d e um fundam ento d o social se o abismo que
ça de sua ausência se mostra naquelas várias tentativas de " racio- constit~ti a dicocomia for radical do ponro de vista d e sua locali-
nalizar" o mundo levadas a cabo por agentes sociais finiros. Preca- zação; mas a operação que a dicotomia real iza - a separação enrre
ri edade e fracasso em último recurso (se persiscirmos em m edir o emancipação e um passado totalmente alheio - é incompatível
sucesso por meio de um velho padrão racionalista) são certamente com a noção de uma localização estrumral.
o destino dessas tentativas, m as por meio desse fracasso ganhamos Ora, como no caso das ouuas dimensões, algumas conse-
quências positivas resultam desse duplo movim~nt? de autopo~
sicionamento e retirada d o fundam ento. O maiS Importante e
vel) que precisa ser preenchido por algum princípio ou conteúdo de[Crminado.
t imponame m:tn[Cr-sc essa múhipla referência sempre em mente. que, se, por um lado, nenhuma dicotomia é absoluta, não pod e
I >.t .:Jl .llh.. lp.H,.IO •• lth. d.td<: -!5
44

raho d izn que hoj~: ,·,t .llllO~ nu Fim da unancipaçáo..: no iníc io


haver nenhum aro d ~: Fu nd ação inrc iramcnte r...·.-oluc i on ~ír i o : se.
po r ourro, t:'>Sa dico romi7.ação não resulta dt: uma ~: lim i nação da d.1 \ihndadc.'
al cerid ad e radica l. m as . ao conr rúio, da p róp ria impossibi lidade
Dc·,dc: que c:~r..: .migo foi nngin.ll mc:ntc· fHt~ li L,ltl o, <:111 1992 . um núm<.:ro con ~i ­
d e sua w ra l errad icação, enr5o di com mi ::~s parciais e p recá rias
J.:r.ivel dt: incomprn:n,t,,·, ,urgiu ~·111 rd,l'\:ÍO J. <.:,ta últ ima frase. Será qu..- .1fi rmar
têm d e se r constiruti vas d o tecido socia I. Essa precariedade e in- , u..- c:st.1m0~ tHh .tlbor..-, J.1 lth~: r ..l.lJe implica n.:g.u ru~o o ~uc: o c:n!>:tio d...fcnd<.:?
1
comple rude d as Írome iras que cons ciru c.: m a divisão socia l es tão S.:,, libt:rd:ltk <.: .tuwdc:r<.:rmutac:lo . ..-rn cJtt<.: >c:nndo sc:na d 1f.:rence d .:tqueb posw-
l.ub pd.1 noç:iu d.í~'JC.l ck ~:nt.;tll.. ip.tç.u;? Ê pn.:..:iso dc~f:uer cssa incompreensão.
n a ra iz da possibilidade contem porâ nea de um,t au to no rnização O que <.: llt<.: nd n por li h~:rcla de n ão~ u m.t p lenitude positiva e sem n uanc~:s, mas
das Iucas sociais - os cha m ad os novos mov im encos socia is -. e m .tlgo c:ssc:rlcialnh.:mc· .1mh1guo. P.tr.l deixar is~o hem claro. reproduzo .1 ü h ima
p~:rgu nca (ju ntamente co u1 m in kt r~:,;po,t:t) que David H owarch c Alctta Norval
vez d e subo rdiná-las a uma fronteira una que seria a úni ca fo nte m<.: flzer.un numa encrevi ~ r.t rccentc para a revi ~ ta / lngelnk i ("Negori ming the pa-
d e divisão social. Fina l me nte, a preexistência d ::~ ide midad e a ser r.ldoxe!> of contcmporary politics. An incc:rvi~:w with Ern estO Lacbu". Angelaki,
Oxfo rd, 1994. I: 3. pp. tí5-'i0 ) :
e manc ipada vis-à-vis as forças opressivas também é subvertida O .li. c 1\.N.: Em seu rr:to.1lho. a caregori.1 desloc:~mcnw rem assumido um papel
e submetida ao mesmo m ovimento contraditó rio q ue as out ras c~d:1 ' '{'1 mais ccnrra l. ls<>o ocorn.: cs p~:cialmentc em relação à su a afirm ação d e
que 'o <kslocamento C: a l~>ntc (b li berdade'. V:irias ques tões surgem aqui sobre a
dimensões expe rimentam. Em discursos clássicos, as idenridades rdação cmre dcslocamcnco ..- liberd:tde. c sobre: a natu reza da própria libcrd ade.
e manc ipadas tinham d e preex isrir ao a ro d e c m a ncip~ção e m Nossa p rincipal preoc upaç:io é com .1 narure·w do movimentO d o dcslocame nro
decorrência d e sua alteridade radica l vis-à-vis as fo rças que se à ' liberdade'. Como devcmos entender .1 nawrcza d~:ssa liberdade~ Você se d is-
ta ncia muito claramente de o mras abo rdagc.:ns q ue t: nfarizam a ' liberdade de um
lhes opunham. Ora, é verdade que isso é inevir;ivel em qualquer sujeitO dor;.•do de idenrid.ldt· posiriva' (fvew n:Jl~ctions on rhe revolwion of ou r
luta a ntago nística ; m as se, ao mesmo tempo, a dico romização rime. V~:rso . 1990, p. 60), .t rgum<.:nrando que a li berdade aqui s<.: refc.: re a uma
'f:tlha ~:srruwra l'. A<>sim . ,, liberdade n:io possui contd1do positivo, mas é uma
não for radical - cori'ro acabamos d e ver que não pode ser -, a 'mera possibilidade'. Contudo, vista de~dt.: a per~pectiva do deslocamento. não h:í
identidad e das forças opressivas terá de estar de alguma forma Jibc.: nladt: alguma aqui. A 1:1lha d a esrnuura <.:nt consriruir p lenamente o sujeiro
forç.1 o sujeito a ser sujciw. a romJr um.1 decisão, a agir, a se id emificar de novo.
inscrita na identidade em busca de em a ncipação. Essa situ ação Nós temos qu e respo nder. não somos livres. Parece, po rranco, que a relação d es-
contraditória é expressa na indecidibilidade entre a inrernalidade locarnenrolliberdade pod eria ser mais produ tivamente pen sada enfa tiza ndo-se
t:tnro a di mensão da possibilidade quanro a de sua impossibilidade. Q uer dizer,
e a externalidade do opressor e m relação ao o primido: ser o pri- <.: fll vc·t de sim plesme nte rc.:r liberdade para agir, esco lher, num senrido sarrreano ,
mido é parte de minha ide ntidade como um sujeito lutando por o mome nto da liberdade e da possibilidade é sim ultaneamente o momento de
mi n ha m aior restrição; d a não li berdade. Levar em conta esta última dimensão
e manc ipação. Sem a presença do opressor, minha identidade se-
poderi a - para voltar à nossa situação contem porânea- aju dar a fazer sentido d a
ria diferente. Sua cons tituição requer e simu ltaneamente rejeita cxperic;ncia de deslocam ento como n ão se ndo ipso focro algo posit ivo e d ig no de
a presença do outro. ccl<.:bração. Em ourras palav ras, voe.:: conco rd::~r ia que enfà rizar o rerror e a força
no ;\rna~o d a libc rdade tem que ser parte de nossa própria abo rdagem das possi-
As Iucas sociais co ntempo râneas estão po ndo em p rim e iro b ilidades que se originam num d eslocamento profundo?
p lano esse movimento contraditório que os discursos emancipa- E. L: Eu n ão poderi a estar m ais de acordo com sua conclusão. Com o vocês con -
vincen temente ressaltam, a experiênc ia do deslocamento não é ipso focto 'algo
tórios ranco das escatologias religiosas quanto das modernas secu- positivo e digno de celebração'. Mas isso também sig nifica que, se a liberdade e
larizadas haviam ocultado e reprimido. Estamos hoje admitindo o deslocam ento estão relacionados da form a como sugeri - o que vocês parecem
aceitar - , endo a própria experiência da liberdade é ambígua. Por essa razão,
nossa própria finitude e as possibilidades políticas que ela enseja . embora com o cu disse, eu concorde com sua concl usão, n ão posso os seguir nas
Este é o ponto e m que os discursos pote ncialmente libe ra- etapas interm ediárias d e sua a rgumentação , quando vocês afirmam que, po r-
q ue a fa lha da estrutura 'força o sujeito a ser sujeito', quando somos fo rçados a
tórios de nossa era pós-moderna têm d e ser iniciados. Podemos
Universalismo, particularismo e a
questão da identidade ·

Muim se fala hoje sobre idenridades sociais, nacionais e po-


líricas. A "morre do sujeita", que, não faz muiw tempo, foi o rgu-
J lhosamente anunciada urbi et orbi, foi sucedida po r um novo e di-
I fundido interesse nas múltiplas identidades que es tão emergindo
responder, não somos livres. Se assim o fora. cerramence estaríamos no mdhor
dos mundos possíveis: o vilão da história seria o 'dcslocamcnro', enquanto a 'li-
I
j
e proliferando no mundo conremporâneo. Esses dois movimentos
não estão, enrreranw , em cão marcado e dramático contraste entre
berdade', como total ausé:l;cia de limiraçâo. pode ria ser manrida como um valor
positivo inconraminado. Mas, como vocês mc:smos reconhecem, essa solução im-
pecável é impossível : a liberdade é o deslocarne nro não podc.:m ser separados dessa
' si, como somos tenta4:>s a crer à primeira vista. T alve1. a morre
do Sujeito (com S mai úsculo) tenha sido a p rincipal precondição
maneira. Por um lado, uma liberdade a que o deslocamento não força a escolher para esse renovado inreresse na questão da subjetividade. Talvez
não seria minha liberdade, mas a libcrdade da estru tura que.: me construiu co mo
sujeitO. Po r o utro. urna liberdade que é minha li berdade, q ue evita os defeiros
seja a própria impossibilidade d e se remeterem as expressões con-
tanto da liberdade espinosiana, reduzida à consciênc ia da necessidade, quamo
da liberdade sanreana, de escolher sem ter fundarnencos para fazê-l o. só pode ser
a liberdade de uma f:-llha estru tural - isco é, um deslocamc.:nro. Mas, neste caso,
I cretas e finitas de uma subjetividade multi facética a um centro
uanscendenre que permita concentrarmos nossa atenção sobre a
a ambiguidade do deslocamento (o que vocês chamam de 'o terror e a força no multiplicidade em si. Os gestas fundantes dos anos 1960 ainda
âmago da liberdade') conramina a pró pria liberdade. A liberdade é cão liberra-
dora quanco escravizance, revigorante e traumá tica, capacitadora e desrrur iva.
Nu ma sociedade fragmentada e heterogênea, os espaços da liberdade certamen-
j estão conosco, possibilitando as explorações teóricas e políticas
nas quais nos engajamos hoje.
te aumenta m. M as esse não é um fenômeno uniformc::mente positivo, porque Se, no encanto, surgiu esse hiatO temporal emre o que se
também instala naqueles espaços a ambiguidade da liberdade. Como resultado,
surge a possibilidade de tentativas mais radicais de renunciar à liberdade do que havia coroado teoricamente concebível e o que efetivamente se
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aquelas que conhecemos do passado. Se a liberdade e o deslocamento caminham conseguiu, foi porque uma segunda e mais sutil tentação cercou o
juncos, é no te rreno de uma liberdade generalizada que experiências como as do
cocalicarismo contemporâneo to rnam-se possíveis. Se é assim, isso s ignifica que
a busca por uma liberdade absolura para o sujeito é o m es mo que uma busca
Traduzido por Joanildo A. Burity (Durham Unive rsiry). Texto originalmer~te pt~ ­
por um deslocamento irrestrito e a total desintegração do tecido social. Também
significa que uma sociedade democrática que se torno u uma ordem social viável
não será uma sociedade inteiramente livre, mas uma que negociou de maneira
I blicado em Ernesto Laclau. "Universalis mo, parricularismo c a questão da rdenn·
dade". Revisra Novos Rumos, São Paulo, 1993, ano 8, n. 21. Revisto pelo tradutOr
específica a dualidade liberdade/niio liberdade. especialmente para esta edição.

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