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SUMARIO
RESUMO
O presente artigo busca analisar de forma breve o tema da globalização, destacando aspectos
relacionados a democracia e a efetivação dos direitos sociais no contexto político brasileiro. Não
constitui seu objetivo aprofundar a discussão acerca das várias questões relacionadas ao tema, mas
tão somente demonstrar que o fenômeno da globalização concorre para o déficit da democracia nos
países periféricos e que, no caso específico do Brasil, acarretou também a necessidade de reformas
políticas e econômicas no Estado brasileiro. O modelo econômico adotado no Brasil, a partir da
Constituição da República de 1988, inicialmente não guardava sintonia com as novas regras da
economia mundial, sendo, portanto, incompatível com os mercados externos. Assim, a reforma do
Estado operada por sucessivas Emendas Constitucionais abriu as portas do país para investimentos
internacionais e para o capital, acarretando, em consequencia, uma crise generalizada da
democracia, acompanhada da não realização dos direitos sociais prometidos na Carta Federal e do
aumento das desigualdades sociais.
ABSTRACT
The goal of this paper is to analyze briefly the theme of globalization, pointing out aspects
related to democracy and the implementation of social rights in the Brazilian political context. The
paper does not intend to deepen the discussion about the various issues related to this theme, but
just to show that the globalization phenomenon collaborates to the deficit of democracy in the
peripheral countries and that, in the specific case of Brazil, it has also caused the need for political
and economic reforms in the Brazilian state. The economic model adopted in Brazil after the 1988
Federal Constitution was not aligned to the new world economic rules, being, therefore
incompatible with foreign markets. This way, the State reform opened opportunities to international
investments and capital, causing, as a consequence, a general crisis in democracy, marked by the
lack of implementation of social rights and the increase of social inequalities.
1
Doutora em Direito Constitucional (UNIFOR – Fortaleza), Doutora em Ciências Jurídicas e Sociais (UMSA,
Buenos Aires), Mestre em Direito Constitucional (UNIFOR – Fortaleza), Especialista em Direito Público
(UFC – Fortaleza), Procuradora do Município de Fortaleza. Professora da Universidade de Fortaleza -
UNIFOR e membro do Instituto Brasileiro de Advocacia Pública - IBAP.
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INTRODUÇÃO
Ocupa o lugar dos reis no ancien regime, com a diferença de que é eleito por período fixo,
predeterminado; o presidente da república é o centro catalisador e impulsionador de quase
toda a atividade política. É peça fundamental da armação institucional. Personifica o Estado
e tem nas mãos todos os instrumentos de comando e direção do Executivo, além de amplos
meios de liderança do próprio Estado. (ATALIBA, 2001, p. 52).
Quer dizer, quanto mais perto estiver a sede do poder decisório daqueles que a ele estão
sujeitos, mais probabilidade existe de o poder ser democrático. Esse é um ponto
fundamental: não teremos uma autêntica democracia no Brasil se não houver uma forte
tendência descentralizadora. Urge, pois, abrir mão de certas velharias inseridas na
Constituição, que confundem a federação com um mecanismo de convivência de Estados
carentes de unidade nacional para abraçar a federação como um instrumento de
democracia. (BASTOS, 1999, p. 249).
(....) podemos aceitar a concepção de Lincoln de que a democracia, como regime político, é
governo do povo, pelo povo e para o povo. Podemos, assim, admitir que a democracia é
um processo de convivência social em que o poder emana do povo, há de ser exercido,
direta ou indiretamente, pelo povo e em proveito do povo. Diz-se que é um processo de
convivência, primeiramente para denotar sua historicidade, depois para realçar que, além de
ser uma relação de poder político, é também um meio de vida, em que, no relacionamento
interpessoal, há de verificar-se o respeito e a tolerância entre os conviventes. (SILVA, 1999,
p. 130).
La primera forma de democracia es la que recibe este nombre en aténcion sobre todo al
principio igualitário. Otra forma de democracia es aquella en que las magistraturas se
distribuyen de acuerdo con los censos tributarios, pero éstos son reducidos, por más que
sólo quien posee la necesaria propriedad puede participar en el gobierno, y no participa
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quien la ha perdido. Otra forma de democracia es aquella en que pueden participar del
gobierno todos los ciudadanos cuya ascendencia sea inobjetable, pero, en última instancia,
gobierna la ley. Otra forma de democracia consiste en que todos puedan participar de las
magistraturas, con sólo que sean ciudadanos, pero también gobierna la ley. Otra forma de
democracia es en todo como la anterior, excepto que es el pueblo y no la ley el soberano; y
esto ocurre cuando los decretos de la asamblea tienen supremacía sobre la
ley.(ARISTOTELES, 1994, p. 225).
O governo representativo não se originou como prática democrática, mas como artifício
pelo qual os governantes não-democráticos (principalmente os monarcas) poderiam enfiar
as mãos em valiosos rendimentos e outros recursos que desejavam, especialmente para
fazer as guerras. Em sua origem, a representação não era democrática: era uma instituição
não-democrática, mais tarde enxertada na teoria e na prática democrática. (DAHL, 2001, p.
118).
Contudo, a questão que se quer colocar respeita ao dilema básico da democracia lançado por
Dahl acerca da participação do cidadão nas decisões políticas e da eficácia do sistema, considerados
o número de pessoas numa unidade política e a extensão de seu território:
Quanto menor a unidade democrática, maior seu potencial para a participação do cidadão e
menor a necessidade de que os cidadãos deleguem as decisões do governo aos seus
representantes. Quanto maior a unidade, maior sua capacidade para tratar de problemas
importantes para seus cidadãos e maior a necessidade dos cidadãos delegarem as decisões a
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O lado sombrio do governo representativo, como anuncia Dahl, consiste no fato de que, nele,
os cidadãos delegam imensa autoridade arbitrária para decisões de extraordinária relevância não
somente aos seus representantes eleitos, mas também a administradores, burocratas, funcionários
públicos, juízes e, em grau ainda maior, a organizações internacionais.
A propósito da democracia representativa, deve ser enfatizado que a moderna sociedade
política ocidental tem suas raízes fincadas nas revoluções americana (1776) e francesa (1789), tendo
se constituído, originalmente, sobre duas vertentes democráticas: a democracia direta ou popular e a
democracia liberal ou formal.
Chomsky explica que a diferença fundamental entre esses dois tipos de democracia reside na
conceituação da relação entre o poder operativo do Estado e a influência do povo sobre este,
destacando que:
En la democracia direta las minoryas tienden – en teoria – a ser el verdadero soberano del
proceso democrático; en la democracia liberal, el poder real operativo del Estado está en
manos de la clase dominante, con el pueblo jugando un papel aclamatório y legitimador.
(...) Con la implosion del socialismo europeo y su correspondiente superestructura política
– “democracia popular” -, la democracia liberal se impuso como hegemônica en el mundo,
de tal manera, que quando hoy dia se habla de “la democracia”, se refiere generalmente a
este tipo de organización política. (CHOMSKY, 1997, p. 157).
Bobbio, por sua vez, distingue entre democracia participativa e Estado parlamentar,
explicitando que a expressão “democracia participativa” refere-se às deliberações coletivas, ou seja,
aquelas que são afetas à coletividade como um todo. Tais deliberações, embora tomadas por pessoas
que integram essa sociedade, são efetivadas por pessoas eleitas para esta finalidade. (BOBBIO,
2000, p. 56).
Com efeito, é preciso trazer ao debate intelectual e político algumas indagações sobre o tema
democracia, como por exemplo: a) o que é democracia; b) quais são seus limites, alcances e
objetivos mínimos; c) o que cada indivíduo entende por democracia, de acordo com sua situação
econômico-social; d) que problemas resolverá a democracia; e) o que o cidadão comum ou o
intérprete entende por democracia diante de suas condições objetivas de existência.
Estas e outras indagações foram colocadas por Bercholc, que destaca a necessidade de
delimitar de alguma forma o conceito de democracia dentro de uma perspectiva realística e
dinâmica, sem, todavia, aprisioná-lo em uma fórmula estanque e excludente, a fim de serem
evitados equívocos intermináveis. (BERCHOLC, 2003, p. 51).
A discussão merece ser aprofundada, todavia, a amplitude dessas questões ultrapassa o escopo
deste trabalho, devendo, por isso, ser tratada em outro momento.
Não se pode ignorar, entretanto, a inexorável realidade do mundo hodierno que evidencia a
crise enfrentada pelos países em geral e, em especial, pelo Brasil, relativamente ao exercício da
democracia e da soberania, dentro do contexto da globalização.
Como sabemos, a globalização traz como uma de suas conseqüências mais importantes
exatamente o debilitamento do Estado. Em primeiro lugar porque este tem que adequar-se
aos regimes internacionais livremente pactuados, limitadores das decisões nacionais. Em
segundo lugar, e uma vez que o processo de globalização significa que o espaço econômico
é global, porque as decisões que incidem sobre o planejamento dos Estados escapam cada
vez mais ao seu controle, portanto à capacidade de decisão da sociedade. (VIGEVANI,
apud DOWBOR et al, 2000, p. 294).
A novidade introduzida pela globalização nas relações políticas entre os Estados remete aos
temas da legitimidade e da democracia diante de uma nova conjuntura. A crise do Estado moderno
torna imprescindível a modificação das regras do Estado de Direito e das políticas sociais que o
integram. A flexibilização atende, portanto, as necessidades criadas pela revolução nas forças
produtivas: a sociedade informática, a revolução da inteligência artificial e a informação, como
elementos fundamentais de valorização do capital. (GENRO, 2002, p. 85).
Retorna-se, pois, ao tema da legitimidade como pressuposto da democracia, nos exatos termos
referidos por Bercholc:
No tocante a este aspecto, Chomsky chama atenção para a escassa legitimidade demonstrada
com o resultado alcançado nas eleições do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. A estratégia
política utilizada pelo ex-presidente durante sua campanha eleitoral baseou-se na estrutura do mito
em sentido antropológico, ou seja, na existência do bem e do mal representados, respectivamente,
pela estabilização e pela inflação. O mito caracterizado pela moeda fez reverter uma situação de
popularidade eleitoral desvantajosa diante do candidato Luis Inácio da Silva no curto período de
oito meses.
Los três pilares del proceso de Supranacionalidad e Integración los identificamos con los
efectos centrípetos de:
1. La centralización política y la superposición de estructuras administrativas de los
Estados Supranacionales, los Estados Nacionales y las tensiones con los Estados
Regionales.
2. La concentración econômica y la imposición de su “racionalidad” por sobre las
perspectivas políticas clásicas.
3. La homogeneización cultural y su fuerte articulación con la moderna tecnología
disponible en los medios de comunicación masiva. (BERCHOLC, 2003, p. 157).
A dificuldade na efetivação dos direitos sociais reside em sua identificação como direito
subjetivo, e, portanto, insusceptível de oposição contra o Estado. A realização dessas prestações
dependeria de sua previsão em lei ordinária, por tratar-se, em alguns casos, de normas de conteúdo
programático. Esse entendimento, entretanto, é rechaçado por autores como Canotilho e Perez
Luño, conforme observa Silva:
A primeira coisa que é preciso rechaçar, como nota Perez Luño, é "a afirmação de que
enquanto os direitos de liberdade se beneficiam da tutela constitucional diretamente os
direitos sociais não podem ser objeto imediato de tal tutela, pois, se a constituição pode
formular positivamente os direitos sociais pode também tutelá-los em igual medida que os
demais direitos nela proclamados". Daí que é preciso repensar também a doutrina das
normas programáticas, em termos que aqui não poderemos mais que sugerir, buscando
responder à pergunta feita por Canotilho: "como pode (se é que pode) uma constituição
servir de fundamento normativo para o alargamento das tarefas estatais e para a
incorporação de fins econômico-sociais, positivamente vinculantes das instâncias de
regulação jurídica?"
Certo é que muitas das normas constitucionais que outorgam os direitos sociais requerem
uma atividade legislativa posterior para a sua concretização, mas daí não se pode concluir
pela sua não preceptividade. "A sua disciplina - diz Canotilho - é obrigatória e as directivas
por elas definidas, longe de serem meros convites para legislar, assumem o caráter de
verdadeiras imposições constitucionais de actividade legiferante". Significa isso repelir a
tese dos direitos econômicos, sociais e culturais como simples direitos legais, tese que
assenta fundamentadamente na concepção de que tais diretivas "não alicerçam qualquer
pretensão subjectiva, judicialmente accionável", pois só "quando o legislador concretiza
essas diretivas, fundamentando poderes jurídicos subjectivos, é que se pode falar de direitos
subjectivos", logo, "os direitos subjectivos só existem no âmbito da lei ordinária" não no
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Uma outra questão que se coloca diz respeito à eficácia desses direitos diante de terceiros,
considerando-se que alguns direitos sociais, tais como os relativos aos trabalhadores, como observa
Silva, não configuram meras prestações estatais, mas são impostas a terceiros, no caso, as empresas
privadas. Nesse caso, sua aplicação alcança pessoas privadas, extrapolando a concepção de que se
trata apenas de direitos públicos subjetivos destinados a regular relações de subordinação entre o
Estado e os cidadãos, ressaltando Silva que esse entendimento decorre da idéia de que os direitos
fundamentais são apenas os preceitos normativos surgidos para tutelar os cidadãos contra a
onipotência do Estado não se justificando nas relações entre particulares. Essa visão, entretanto,
encontra resistência entre os autores estrangeiros como se observa adiante:
É fácil advertir o caráter ideológico deste raciocínio ligado a uma concepção puramente
formal da igualdade entre os diversos membros integrantes da sociedade. Mas é um fato
notório que na sociedade moderna neocapitalista essa igualdade formal não supõe uma
igualdade material, e que nela o pleno desfrute os direitos fundamentais se vê, em muitas
ocasiões, ameaçado pela existência no plano privado de centros de poder, não menos
importantes do que os que correspondem aos órgãos públicos. Daí que se tenha tido que
recorrer a uma série de medidas destinadas a superar os obstáculos que de fato se opõem ao
exercício dos direitos fundamentais por parte da totalidade dos cidadãos no plano da
igualdade. (LUÑO, apud SILVA, 2004, p.3).
O tema tem sido objeto de estudos mais desenvolvidos em países como Alemanha, Espanha e
Portugal, tratando-se, segundo a doutrina alemã, da “eficácia externa dos direitos fundamentais”,
que pretende superar a tese de que os direitos fundamentais só podem ser contrapostos aos poderes
públicos, únicos obrigados a respeitá-los.
Ubilos, por sua vez, entende que “os poderes privados constituem hoje uma ameaça para o
gozo efetivo dos direitos fundamentais não menos inquietantes que a representada pelo poder
público”. (UBILOS, apud SILVA, 2004, p. 4).
De regra, as normas referentes aos direitos fundamentais possuem aplicabilidade imediata,
porém, a vigente Constituição condiciona o exercício de alguns direitos sociais a uma lei de
natureza integradora, resultando daí que tais direitos possuem eficácia contida e aplicabilidade
indireta.
No contexto do Estado Social, a execução de políticas públicas constitui tarefa primordial
para sua realização, exigindo, em contrapartida, a elaboração de um planejamento para a
implantação de políticas sociais a médio e longo prazo. O Estado torna-se responsável pelo bem
estar coletivo, materializado através dos direitos sociais, sob o amparo da democracia, objetivando
assim, assegurar o direito à igualdade com a garantia de liberdade.
Como ressalta Bercovici, o Estado não se limita mais a promover a igualdade formal, a
igualdade jurídica, e que a igualdade perseguida é a igualdade material, não mais perante a lei, mas
através da lei. Nesses termos, justifica-se a intervenção do Estado para garantir a igualdade de
oportunidades e a liberdade. (BERCOVICI, 2004, p. 3).
As políticas públicas encontram seu fundamento na necessidade de concretização de direitos
por meio de prestações positivas do Estado, que poderiam estar contempladas genericamente em
uma política de desenvolvimento econômico e social nacional, visando à erradicação da pobreza e
das desigualdades.
O planejamento, portanto, apresenta-se como instrumento legitimador das ações do Estado,
constituindo “expressão da política geral do Estado” e, nesse aspecto, comprometido
axiologicamente, tanto pela ideologia constitucional, como pela busca da transformação do status
quo econômico e social.
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O que ocorre, entretanto, é que existe um distanciamento entre as diretrizes contidas nas
normas constitucionais e a realidade política e social brasileira. Embora a Constituição Federal de
1988 tenha estabelecido os fins e os objetivos a serem alcançados pelo Estado e pela sociedade,
caracterizando-se, por isso mesmo, como uma Constituição dirigente, ela não se substitui à
atividade política.
Como afirmou Schneider, a Constituição é, fundamentalmente, direito político: do, sobre e
para o político. E é por meio da política (e do Estado), conforme destacou Streck, que a
Constituição vai ser concretizada. (SCHNEIDER, apud BERCOVICI, 2004, p. 4). Retorna-se,
portanto, ao ponto central da questão: o dever de proteção do Estado brasileiro contra todas as
formas de desigualdade – pobreza e exclusão social.
Cuida-se, no caso, de assegurar o exercício da igualdade formal, que se coloca como
pressuposto do exercício da liberdade e como norma impositiva das ações do Estado para sua
efetivação, notadamente no que concerne à implementação de políticas sociais e econômicas.
O princípio da igualdade irradia-se em vários dispositivos do texto constitucional,
inaugurando o art. 3º que trata dos objetivos fundamentais da República Federativa brasileira. As
disposições constantes do citado art. 3º são explícitas em determinar aspectos de atuação prioritária,
nas esferas pública e privada, visando à consolidação do Estado Democrático de Direito. Tais
objetivos, de outra parte, revelam a própria razão de ser do Estado brasileiro, constituindo cláusulas
do pacto social onde os direitos fundamentais funcionam como instrumentos para sua consecução,
de acordo com os meios assegurados pelo ordenamento para garantir seu atingimento.
A Constituição Federal de 1988, segundo Bonavides, é, basicamente, em muitas de suas
dimensões essenciais uma Constituição do Estado social e, portanto, refratária ao individualismo no
Direito e ao absolutismo no Poder. (BONAVIDES, 2003, p. 371). Contudo, o maior problema
enfrentado pelo direito Constitucional hodierno consiste em como juridicizar o Estado social, como
estabelecer e inaugurar novas técnicas ou implementar institutos processuais aptos a garantir o
exercício dos direitos sociais básicos, a fim de torná-los efetivos. Nesse aspecto, o Estado social
brasileiro, instaurado a partir da Carta de 1988 fez consideráveis avanços, inserindo no vigente
ordenamento jurídico institutos destinados à salvaguarda dos direitos fundamentais denominados de
“remédios constitucionais”, a exemplo do mandado de injunção, o mandado de segurança coletivo e
a ação direta de inconstitucionalidade por omissão. 2
Salienta Bonavides que “o Estado social brasileiro é, portanto, de terceira geração, em face
desses aperfeiçoamentos: um Estado que não concede apenas direitos sociais básicos, mas os
garante”. (BONAVIDES, 2003, p. 373).
Não se cuida, portanto, de normas de conteúdo programático, destinadas a pacificação de
conflitos pela simples positivação, mas, sim, de obrigações que devem ser perseguidas pelo poder
público e pela sociedade, conjuntamente.
2
O mandado de injunção encontra-se previsto no inciso LXXI, do art. 5º, da CF/88: “Conceder-se-á
mandado de injunção sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício de direitos e
liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania”. Nos
termos do art. 8º, III da CF/88, o mandado de injunção poderá ser impetrado por sindicato para defesa dos
direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria.
O mandado de segurança coletivo encontra-se previsto no inciso LXX, do art. 5º, da CF/88 com a seguinte
redação: “O mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por: a) partido político com representação
no Congresso Nacional; b) organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e
em funcionamento há pelo menos um ano, em defesa dos interesses de seus membros ou associados”.
A Constituição Federal de 1988, por força do princípio da supremacia, que requer que todas as situações
jurídicas se conformem com os princípios e preceitos constitucionais, reconhece duas formas de
inconstitucionalidade: a) por ação – quando a produção de atos legislativos ou administrativos contrariam
normas ou princípios constitucionais, contrariando, assim, o princípio da compatibilidade vertical das
normas; b) por omissão – quando não sejam praticados atos legislativos ou administrativos requeridos para
tornar plenamente aplicáveis normas constitucionais. A ação de inconstitucionalidade encontra-se prevista
no art. 103 da Constituição de 1988.
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Art. XXIII – 1. Toda pessoa tem direito ao trabalho, à livre escolha de emprego, a
condições justas e favoráveis de trabalho e à proteção contra o desemprego. 2. Toda pessoa
que trabalha tem o direito a uma remuneração justa e satisfatória, que lhe assegure, assim
como à sua família, uma existência compatível com a dignidade humana, e a que se
acrescentarão, se necessário, outros meios de proteção social.
Art. XXV – 1. Toda pessoa tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e a sua
família saúde e bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e
os serviços socais indispensáveis, o direito à segurança, em caso de desemprego, doença,
invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência em
circunstâncias fora de seu controle.
Outros documentos mencionados por Arzabe referem-se ao Pacto Internacional dos Direitos
Econômicos Sociais e Culturais e o Pacto Internacional dos Direitos Políticos, que explicitam, em
seus respectivos preâmbulos, a relação entre a privação no âmbito econômico e o gozo dos direitos
econômicos, sociais e culturais, dispondo que os Estados-Partes reconhecem que:
CONCLUSÃO
O tema das desigualdades sociais traz à tona a discussão acerca das políticas sociais no Brasil,
cujos indicadores traduzem a ineficiência do Estado para efetivação dos direitos sociais assegurados
pela Constituição, bem como a ausência de políticas nacionais coordenadas visando ao
desenvolvimento econômico e à redução da pobreza.
A construção de uma sociedade mais justa e igualitária requer, entretanto, a compatibilização
entre os objetivos e a execução dos respectivos programas da área social, o que exigiria uma
política nacional, além de disponibilidade e constância dos recursos para sua implantação e
continuidade.
As políticas e programas sociais implementados no país carecem de unidade e racionalidade,
além de não atenderem a alguns quesitos básicos, tais como a prévia avaliação e definição do
público alvo, dificultando a criação de uma sociedade mais igualitária e democrática.
É necessário rever as diretrizes que imperam na área social, a fim de articular políticas de
desenvolvimento econômico e políticas de desenvolvimento social.
O discurso neoliberalista, conforme foi dito acima, introduziu novos preceitos para justificar a
necessidade de reforma do Estado, ao mesmo tempo em que impôs uma lógica diferente ao mercado
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Arzabe destaca que o caso brasileiro reflete bem as conseqüências da pobreza no acesso e no
exercício de direitos fundamentais.
Arzabe explica, ainda, que as características pessoais do cidadão, como idade, doenças ou
certas deficiências interferem na obtenção de renda e na inserção da pessoa na sociedade e no
mercado de trabalho, afetando, portanto, a possibilidade de conversão de renda em capacidades.
Dessa forma, os mais pobres, também chamados miseráveis ou indigentes, quando excluídos,
menos chances têm de participar do pacto social. A citada autora salienta ademais que pobreza e
exclusão social são expressões com significados distintos e que a noção de pobreza enfatiza
aspectos distributivos, que podem ser definidos como a falta de recursos à disposição de um
indivíduo ou família.
A idéia de exclusão social, todavia, particularmente adotada na França, refere-se a aspectos
relacionais, isto é, na participação social inadequada, na ausência de proteção social, na ausência de
integração social e na ausência de poder. Diz-se, portanto, que o excluído socialmente se encontra
destituído de recursos de toda espécie: econômicos, sociais, jurídicos, culturais etc.
Para Sen, a pobreza é, sobretudo, e na sua parte mais sensível, uma questão de inadequação
dos meios econômicos da pessoa para a sua realização na sociedade. (SEN, apud ARZABE, 2009,
p. 4).
15
Por último, salienta-se que o critério da baixa renda dissociado das condições sociais do
cidadão não é o mais adequado e confiável para avaliar o universo dos cidadãos considerados
pobres, por recusar o reconhecimento das diferenças pessoais. Nesse sentido afirma Sen, que “O
critério das capacidades transcendente da visão limitada da renda, permite melhor apreender a
complexidade da realidade social dos que vivem em condições abaixo do necessário para a
realização eficiente das faculdades humanas na sociedade atual. (SEN, apud ARZABE, 2009, p. 4).
Em conclusão, pode-se afirmar que:
Do que foi exposto resulta que o processo de mundialização da economia, não obstante
tenha ampliado as possibilidades de acesso do cidadão à informação, e, em certa medida, tenha
contribuído para o surgimento de novas democracias, enriquece mais aos ricos e empobrece mais
aos pobres. (DELGADO, 2000, p. 30). Isto porque a implementação de políticas neoliberais
consubstancia uma nova fase de expansão do sistema capitalista, caracterizada, em especial, pela
expansão dos mercados financeiros e pelo debilitamento do Estado, acarretando conseqüências
graves como, por exemplo, o aumento do desemprego.
REFERÊNCIAS
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16
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