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A POLIFONIA
O invento mais significante da música ocidental foi a invenção da Polifonia, quando passámos a
considerar a simultaneidade de duas ou mais melodias.
A polifonia surge inicialmente com a função de embelezar a liturgia. Começou como uma
elaboração do cantochão e foi sendo utilizada como um meio de aumentar o esplendor e a
solenidade dos serviços da igreja entre o séc.IX e o séc.XIII.
Os locais onde esta se inicia e desenvolve são os mesmos locais que produziram os novos e
tardios repertórios dos tropos e das sequências. Ambos surgiram da mesma necessidade criativa
de expandir e enriquecer o único repertório musical que havia – o cantochão.
Logo que a polifonia foi aceite pelos compositores e teóricos, a organização vertical da música
tornou-se a maior preocupação destes.
A música irá seguir as linhas da arquitetura, ou seja, deixará as linhas horizontais do Românico -
cantochão - e desenvolverá as linhas verticais do Gótico – polifonia -, sendo o principal centro de
produção musical da época, a França.
Algumas mudanças e novidades irão ser determinantes na evolução da polifonia, nomeadamente,
o aparecimento das primeiras figuras de notação mensural, a predominância dos ritmos de
acentuação ternária e o uso das consonâncias perfeitas com os intervalos de 8ª, 5ª e 4ª a serem
os mais usuais.
Continuará a haver pouco uso dos instrumentos musicais.
Paralelamente a este desenvolvimento polifónico iremos ter, na mesma altura, o
desenvolvimento da monodia profana – o movimento trovadoresco.
A origem da polifonia
Os primeiros exemplos que chegaram até nós são curtos e, muitas vezes, fragmentados.
Dependemos dos tratados teóricos para percebermos como era executado, o que cria algumas
dificuldades, pois os autores falam sempre de forma muito ambígua e pouco explícita, o que não
ajuda à reconstrução destas práticas.
Sabemos que a polifonia vocal começou por ser um acompanhamento do cantochão que não era
escrito mas, só no séc.XI encontramos documentos que falam de polifonia e que descrevem
partes cantadas a que davam o nome de Organum.
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Regino de Prüm (m.915) e Hucbaldo (840-930) escreveram dois tratados com o mesmo título –
De harmonia institutione – onde pela primeira vez usam o termo Organum (pl. Organa) e onde
definem já as consonâncias e dissonâncias.
Hucbaldo deixa bem claro que o Organum envolve a simultaneidade de sons diferentes.
Os primeiros exemplos
Os primeiros exemplos de polifonia foram encontrados nos dois tratados mais importantes da
época (séc.IX) onde se descreve o fenómeno polifónico e se transcrevem com notação, os
primeiros exemplos de polifonia:
o Musica Enchiriadis (Manual de Música)
o Scholia Enchiriadis (Manual Escolar)
São considerados anónimos mas pensa-se que poderão ser de Hucbaldo.
Mais recentemente foi encontrada uma peça que se pensa ser a mais antiga peça polifónica
encontrada até hoje. Foi encontrada na Biblioteca Britânica de Londres, no final de um
manuscrito sobre a vida de um bispo - Maternianus de Reims.
De acordo com os tratados da época, o organum deriva de uma duplicação do cantochão que já
existia, em movimento paralelo, fazendo intervalos de 8ª, 5ª ou 4ª, rigidamente mantido.
A voz superior chama-se vox principalis e corresponde à voz do cantochão que já existia.
A voz inferior chama-se vox organalis e corresponde à nova voz acrescentada.
o Organum simples - temos apenas duas vozes e uma das vozes canta invariavelmente em
quintas ou quartas paralelas abaixo da melodia de cantochão.
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o Organum composto - As duas vozes são dobradas à oitava, resultando em intervalos de
oitava, quinta e quarta paralelos.
Durante os dois séculos seguintes foram poucas as modificações sofridas por esta polifonia
rudimentar. A evolução virá apenas com Guido d’Arezzo no seu tratado Micrologus.
Os exemplos do séc.XI mostram que foram dados passos importantes no sentido da
independência e importância das vozes.
Se compararmos os dois tipos de organum paralelo descritos anteriormente com os de Guido
D’Arezzo (995-1050) notaremos que, neste último, há já um aumento do predomínio do
movimento contrário entre as vozes, o que significa, um avanço na independência destas.
O movimento das vozes estritamente paralelo não oferecia muito estímulo aos compositores e
não permitia grandes desenvolvimentos, começando então a ser variado com movimentos
contrário ou oblíquo ou com cruzamento das vozes, muitas vezes com as frases a começarem e a
acabarem em uníssono.
O Contraponto
Guido d’Arezzo limita-se a usar cada vez mais as 4ªP, 3ªM e m e as 2ªM e rejeita as 5ª e as 2ªm e
os seus exemplos mostram uma polifonia baseada no contraponto.
Por volta do ano 1100 surgem outros 2 tratados com desenvolvimentos do Organum:
o Tratado de John Cotton – usa as 5ª e as 7ª.
o Ad organum faciendum – anónimo.
Em ambos os tratados há uma indicação clara de que há elementos de escolha por parte dos
compositores ao nível das consonâncias e movimentos, passando a composição a ser um ato
criativo e uma nova forma de arte musical.
Nesta fase, temos uma inversão das vozes com a passagem da voz principalis para voz inferior e a
voz organal para voz superior. Também o nome das vozes se altera passando a chamar-se Tenor
(Tener = sustentar) à voz principalis e duplum à voz organal.
Por esta razão, também se chama a este tipo de organum – Organum duplum.
Este tipo de organum consiste em fazer corresponder a uma só nota da voz principalis, várias ou
muitas notas da voz organal, cantadas sobre uma sílaba, a que se dá o nome de melisma. Daí
este organum também se chamar - organum melismático.
O organum melismático irá fazer aumentar o tamanho das peças e retirar à voz original de
cantochão o carácter de melodia.
Da 1ª fase de evolução da polifonia o único manuscrito ou documento musical que nos chegou é
o Tropário de Winchester – documento inglês (c.1000) que contém cerca de 150 cantos em
organum que incluem muitos tropos, sequências, responsórios, etc.
Alguns dos cantos ainda aparecem com notação em neumas, sem linhas e outros têm notação
mais precisa.
Da 2ª fase de evolução encontramos o Livro de Santiago – norte da Península Ibérica - com uma
peça a 3 vozes.