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Maristela Franco podem selecionar o alimento, como no sam a ser antagônicas. “Nós privilegiamos
maristela@revistadbo.com.br pastejo contínuo. a segunda”, salienta.
A
Essa é a grande “sacada” do novo sis- A altura de entrada do gado no pasto
costume seus ouvidos – o termo tema, ainda pouco conhecido pelos pecu- não tem segredo: corresponde a 95% de
rotatínuo veio para ficar, se ins- aristas de corte, mas já bastante usado por interceptação luminosa, conforme reco-
crevendo definitivamente no di- produtores de leite do Rio Grande do Sul. mendam pesquisadores como Sila Carnei-
cionário da pecuária. Cunhado pelo pro- “Após 14 anos de pesquisa, comprovamos ro da Silva, professor da Escola Superior
fessor Paulo César Faccio Carvalho, da que os ruminantes têm hábitos de pastejo de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq).
Universidade Federal do Rio Grande do muito próprios. Quando podem escolher, Acima desse percentual de luz incidente, a
Sul (UFRGS), esse neologismo define um comem apenas a parte mais nutritiva das planta começa a emitir mais colmos do que
novo sistema de manejo de pastagens, que plantas (as folhas), rejeitando os materiais folhas, perdendo qualidade. “Chegamos à
promete aumentar a produção tanto de senescentes e os mais duros, como os col- mesma conclusão, em 2004, por intermé-
carne quanto de leite no País. Mescla de mos. O que fazemos, no rotatínuo, é respei- dio de outra linha de pesquisa. Observando
rotativo com contínuo, a palavra dá uma tar esse comportamento, elevando a pro- o comportamento dos animais, descobri-
pista clara do conceito técnico que o nor- dutividade tanto de carne quanto de leite”, mos que, em pastagens com altura corres-
teia. Os bovinos continuam sendo agrupa- explica Faccio. Segundo ele, o grande dile- pondente a 95% da interceptação luminosa,
dos em lotes que mudam frequentemente ma atual do manejo de pastagens é escolher ocorriam as máximas taxas de ingestão”,
de piquete (como no rotacionado), mas o entre duas correntes: a máxima eficiência esclarece o pesquisador gaúcho. Mas qual
principal critério para definição do tempo de colheita do capim e a máxima eficiência deve ser a altura de saída? Neste ponto, o
de permanência na área não é o capim e de utilização desse alimento pelo animal. A rotatínuo diverge dos demais sistemas de
sim o comportamento dos animais, que partir de determinado momento, elas pas- pastejo em uso e ganha singularidade.
fotos: maristela franco
Animais no módulo
de tifton irrigado, que
é usado praticamente
o ano inteiro.
0.20
Taxa de ingestão (gMS/min)
0.18
0.16
0.14
0.12
0.10
0.08
0.06
0.04
0.02
0.00
10 20 30 40 50 60 70 80 90
Rebaixamento do pasto (% da altura inicial)
Velocidade de ingestão norteia novo sistema de pastejo
Tifton 85 Sorgo
O boi fala – Segundo Faccio, nos últimos sossa ou já velha, somente é visitada quando
anos, disseminou-se, entre técnicos e produ- a fome bate forte. Isso também acontece com
tores, uma filosofia do não-desperdício que os bovinos. Em pastagens com boa estrutura
leva ao rebaixamento excessivo do pasto. (altura adequada), ricas em folhas novas, nu-
Isso prejudica principalmente o gado, que é tritivas, cada indivíduo pode dar até 40 bo-
obrigado a comer forragem de menor qua- cados por minuto, apreendendo mais de 570
lidade. “Somos totalmente contrários a essa mg de matéria seca por bocado, enquanto em
prática”, diz o pesquisador. No rotatínuo, a pastos muito baixos ou já fora do ponto óti-
altura de saída é ditada pelo “comensal”, ou mo de colheita, esse número cai para a me-
seja, pelo boi. Um produtor gaúcho usuário tade, com reflexo negativo sobre o desempe-
do sistema costuma dizer que, “quando os nho do bovino. Faccio, da UFRGS: filosofia
animais começam a conversar com as formi- Animais de alta demanda nutricional, do não-desperdício rebaixa muito
gas” (ou seja, diminuem o ritmo de pastejo) como as vacas leiteiras, são especialmente o pasto e prejudica o animal.
é hora de mudá-los de piquete, pois, do con- prejudicadas pelo fenômeno, pois têm pou-
trário, haverá queda de desempenho. co tempo para pastejar. Colhem forragem do sol, e nem à noite. Portanto, é necessá-
Diversos trabalhos realizados ao longo praticamente 1,5 hora antes da ordenha da rio fornecer-lhes condições para que man-
da última década pelo Grupo de Pesquisa manhã e 1,5 hora antes da ordenha da tar- tenham a maior velocidade possível de in-
em Ecologia do Pastejo da Universidade Fe- de. Não pastejam ao meio-dia, por causa gestão. Quando isso acontece, a resposta é
deral do Rio Grande do Sul (UFRGS), co- imediata: de um dia para o outro a produção
ordenado por Faccio, comprovaram que os de leite aumenta. No gado de corte, apesar
bovinos reduzem a velocidade de colhei- O que é o índice de dos resultados serem menos evidentes (não
ta de capim quando este perde qualidade. interceptação luminosa? podem ser medidos no balde), pesagens re-
Ficam andando a esmo, em busca de algo gulares confirmam aumento no ganho de
melhor. “Comprovamos isso ao colocar pe- peso diário, quando se respeita o hábito na-
É um parâmetro técnico obtido ao
quenos computadores no pescoço dos ani- tural de pastejo dos animais.
medir-se, com aparelho adequado,
mais, que registram os movimentos de sua
a quantidade de luz acima e abai-
mandíbula e, consequentemente, o número xo do capim. A diferença entre esse
Só no filé – As pesquisas mostraram tam-
de bocados (ato de apreensão do alimento) valores é o percentual interceptado bém que os bovinos têm outro comporta-
desferidos durante um dia de pastejo, o que ou captado pela planta para fazer fo- mento típico: em condições naturais, re-
possibilita medir sua velocidade de inges- tossíntese. Índices baixos de IL não movem no máximo metade da forragem
tão”, explica o pesquisador. garantem boa produção de forragem, disponível por horizonte de pastejo. Ou seja,
Quando o pasto está fora do padrão dese- índices acima de 95% resultam em comem camadas sucessivas de forragem,
jável, o número de bocados cai drasticamen- acúmulo de material duro e senes- sempre na mesma proporção: 40% a 50% do
te e o bovino demora mais tempo para se ali- cente. O índice ideal de IL correspon- total ofertado. “Ainda precisamos entender
mentar. Imagine uma mesa cheia de pratos de a determinada altura do pasto, melhor por que isso acontece, mas se trata de
apetitosos, que atraem imediatamente a aten- medida prática utilizada pelos pecu- um fato inequívoco, confirmado por inúme-
ção dos comensais. Em pouco tempo, ela aristas para manejá-lo. ros trabalhos de pesquisa, independentemen-
fica vazia, enquanto outra, com comida in- te da planta forrageira estudada”, diz Faccio.
s
São Borja
das, para não pesar no bolso do produtor. plementados com mistura protéica ou pro-
Apesar do pouco tempo de uso (um ano), téica-energética. Essas áreas constituem
o módulo irrigado da Fazenda Santa Cruz importantes “válvulas de escape” dentro
já possui teor elevado de matéria orgâni- da propriedade, em momentos críticos de
ca, acima do patamar mínimo recomen- oferta de forragem, como o período de es-
na veia para ressuscitar um paciente enfra- dado, que é de 2,5%. Oscila entre 3,3% tabelecimento das forrageiras de verão
quecido. Nós procuramos retroalimentar o e 3,4%, enquanto nas pastagens degrada- (sorgo, milheto etc), plantadas em novem-
sistema, elevando o teor de matéria orgâ- das esse índice não passa de
nica do solo, o que garante maior retenção 1%. “É fundamental mane- Sistema tem perfil
de nutrientes como o potássio, por exem- jar bem o pasto para garan- conservacionista e privilegia
plo”, explica o zootecnista Davi Teixeira, tir boa conservação do solo
ciclagem de nutrientes
da consultoria SIA (Serviço de Inteligên- e melhor aproveitamento
cia em Agronegócio), que presta assistên- de outros recursos naturais
cia à Fazenda Santa Cruz e também tem como a água. Na média anual, esse mó- bro. São 100 hectares de braquiária MG-5,
difundido o rotatínuo dentro do Pisa (Pro- dulo tem produzido mais de 20 toneladas previamente vedados, que podem receber
grama de Produção Integrada de Sistemas de matéria seca por hectare/ano”, salien- grande quantidade de bezerros 45 dias an-
Agropecuários), que reúne 575 peque- ta Teixeira. tes da semeadura das forrageiras de ciclo
nas propriedades do Rio Grande do Sul, a anual no módulo de rotatínuo.
maioria delas voltada à produção leiteira. Válvula de escape – A Fazenda Santa Já a pensacola (Paspalum notatum),
O sistema tem perfil conservacionista Cruz normalmente adquire seus animais gramínea originária da Argentina e adap-
e busca privilegiar a ciclagem de nutrien- com seis/sete meses de idade, na própria tada a climas temperados, ocupa áreas an-
tes. Somente o nitrogênio é reposto regu- região. Quando chegam, eles vão para tes cultivadas com arroz. Sidnei Gerhardt
larmente, em áreas submetidas a maiores pastagens de braquiária e pensacola diferi- arrenda cerca de 240 hectares anualmente
lotações, mesmo assim em doses modera- dos por 40 dias (abril/março), onde são su- para arrozeiros da região, que, após dois
s