Documente Academic
Documente Profesional
Documente Cultură
Prefácio, 7
Introdução
Transição para o capitalismo: momento e origem de um debate, 13
Conclusão, 177
Posfácio
Uma palavra, um debate e um livro, 183
Referências, 187
Vânia Cury
Instituto de Economia – UFRJ
Março, 2008
Notas
1
É bem verdade que, como lembra Iring Fetscher, Cambridge fora responsável pela
preservação, durante várias décadas, de um pensamento crítico sobre a economia
política em bases marxistas, partindo de um referencial neo-ricardiano, que, no
caso específico de nossa discussão, interessa apontar para o pensamento de Mau-
rice Dobb. Portanto, a interpretação da transição do feudalismo para o capitalismo
trazida por este economista inglês não inovava no sentido de reinaugurar o debate
marxista em termos não-ortodoxos, mas sim, na discussão acerca dos fenômenos
incorporados à idéia de transição entre modos de produção, sublimada pelo mar-
xismo soviético sob influência do stalinismo (FETSCHER, 1988, p. 243-254).
2
Trata-se da publicação de uma série de palestras proferidas a convite da Universida-
de da Califórnia, publicadas originalmente em 1983 sob o título In the Tracks of the
Historical Materialism. Nelas, Perry Anderson faz um balanço do desenvolvimento
do Materialismo Histórico do pós-Segunda Grande Guerra, reavaliando prognósticos
realizados em outra obra, Considerações sobre o Marxismo Ocidental.
3
A opinião de Anderson no que diz respeito à relação entre a prática revolucionária
e o pensamento acadêmico me parece totalmente descabida. Delegar ao partido
e ao sindicato a capacidade, por excelência, de produção de um pensamento e
prática de transformação social pode vir a sublimar uma tradição acadêmica de
formulação de estratégias e interpretações sobre as sociedades. Soa-me impossí-
vel uma ação revolucionária que não tenha como ponto de partida a compreensão
científica daquilo que se pretenda transformar. Aliás, Anderson é um dos que
também enfatiza a necessidade da estratégia, fundamentada em dados substan-
tivos, para a ação transformadora. Estando de acordo com o autor nesse ponto,
não me parece, entretanto, que no caso brasileiro os partidos tenham sido mais
eficazes na compreensão do funcionamento da sociedade que a universidade.
Ainda que teses demiúrgicas tenham surgido de membros do Partido Comu-
nista Brasileiro, como é o caso de Caio Prado Jr., entre outros, a parte mais
substancial do conhecimento sobre a sociedade brasileira que acumulamos
até este início de século XXI foi produzida em bancos universitários. Mesmo
que parte também significativa deste saber tenha advindo de quadros comuns
ao partido e à academia, ainda assim o papel da universidade ganha relevo.
No caso inglês, Hobsbawm e Thompson estiveram ligados ao Partido e à Universida-
de. Se é possível hoje traçar-se um quadro estrutural estratégico do capitalismo no
Brasil, com suas peculiaridades, isto se deve ao esforço de gerações de acadêmicos
nas últimas décadas. Não pretendo com isso reavivar concepções babovistas de
transformação social; não se espera que uma casta “ilustrada” tente, por si, trans-
formar toda uma sociedade. Entretanto, não se pode esquecer a função histórica da
Introdução
Notas
1
Note-se que o “hoje” de Dobb diz respeito ao final dos anos 1940, o que significa
dizer que se refere aos estudos realizados na primeira metade do sécilo XX.
2
No momento nos centraremos na concepção de capitalismo a que se afilia Dobb,
tendo em vista ser esta a mais importante para estabelecermos os pilares do de-
bate. Ao longo do capítulo definiremos as idéias e argumentos de Sweezy a este
respeito.
3
Noção esta que seria criticada posteriormente pelo próprio Dobb, por ser teorica-
mente imprecisa.
4
Em determinados momentos podemos afirmar que o debate conceitual entre Dobb
e Sweezy aproxima-se de um diálogo de surdos. Apesar de ambos, com maior ou
menor precisão, invocarem as palavras de Marx para sustentarem seus argumentos,
lidam com os mesmos conceitos a partir de significados bastante distintos, o que
acaba levando a um impasse. Um exemplo disso é a própria definição de “feudalismo”
para um e outro: Sweezy associa “feudal” a uma economia pouco mercantilizada e
Dobb entende como sinônimo de “servil”. Mais adiante traremos uma apreciação
crítica sobre este choque de concepções.
5
Esta questão será mas bem desenvolvida adiante.
6
Apesar de entender como positiva a iniciativa de extrapolação do conceito de feuda-
lismo para realidades extra-européias, ainda assim Hobsbawm indica considerar a
validade do modo de produção asiático como uma categoria de análise, uma vez que
inicia seu artigo invocando a enumeração dos modos de produção historicamente
verificados feita por Marx no prefácio à Crítica da Economia Política.
É verdade que todo o quadro formado pela crise feudal dos sé-
culos XIII e XIV não foi suficiente para fazer valer o modo de produção
capitalista, embora tenha dado os primeiros passos para o enfraqueci-
mento do feudalismo. Mesmo tendo sido as revoltas camponesas der-
rotadas ou neutralizadas pelas concessões, verificava-se um quadro
em que a nobreza encontrava-se enfraquecida, desprovida de suficiente
trabalho compulsório, arrendando terras ou contratando assalariados,
formados pelas frações miseráveis do campesinato. Esta nobreza já
disputava espaço com uma burguesia mercantil compradora de terras
e uma fração de camponeses prósperos – semelhantes aos kulaks
russos, como lembra Dobb –, que ofereciam concorrência imponente
nos mercados e como empregadores de trabalho livre assalariado.
No caso inglês (a que se refere a quase totalidade das considerações)
esse período de acumulação primitiva iria perdurar até o século XVII,
com a avalanche produzida pela Revolução burguesa modificando
estruturalmente a sociedade (DOBB, 1986, p. 48-51).
A contribuição de Sweezy à questão do agente motor inicia-se
com um breve apanhado dos argumentos de Dobb acerca dos fatores
que levaram à maior necessidade de renda por parte da classe domi-
nante feudal. Detendo-nos no crescimento da classe parasitária como
elemento principal, o economista norte-americano questiona a valida-
de desse pressuposto como fator explicativo. A suposta pressão sobre
Notas
1
A extração de renda feudal por parte da classe proprietária acentuou-se em razão
de alguns fatores específicos. Em primeiro lugar, com o intuito de ampliar a força
militar dos senhores feudais, manifestava-se uma tendência para o aumento do
número de seus vassalos, que somada à expansão demográfica das próprias fa-
mílias dominantes (e de seus agregados), aumenta em muito as necessidades da
fração parasitária da sociedade, incidindo sobre o produto do trabalho camponês.
As guerras e o banditismo, além de ameaçarem diretamente o funcionamento do
processo produtivo, impunham mais requisições, incidindo igualmente sobre o
produtor direto. O comércio de produtos exóticos e a pressão para a produção de
mercadorias fechavam o somatório que tornava o vetor incidente sobre a classe
camponesa feudal insuportável (DOBB, 1986, p. 33-34).
2
O aumento populacional verificado nos séculos XII e XIII somente teve possibili-
dade de surtir um efeito positivo sobre os sintomas de crise na medida em que foi
acompanhado por um compatível crescimento na oferta de terras para comportar
a população camponesa em ascensão. Nas regiões em que tal fato não se procedeu,
o impacto de um aumento demográfico sobre uma disponibilidade de terras menos
dinâmica refletiu-se no agravamento das condições de vida do campesinato (DOBB,
1986, p. 35-36).
3
Evidentemente os camponeses detinham somente a posse tradicional das terras que
ocupavam e trabalhavam para obterem sustento e alguma reserva. A propriedade
estava nas mãos dos senhores feudais, e por meio desse direito, obtinham o trabalho
compulsório dos servos em troca da permissão de uso dessas mesmas terras.
4
Nos casos de propriedades com problemas de abastecimento de mão-de-obra servil,
o uso de trabalho assalariado, mesmo que formasse um excedente muito modesto,
seria mais vantajoso. Se os trabalhadores dispusessem na região de mobilidade
suficiente para suprirem de braços essas unidades de produção, mesmo que a efi-
ciência do trabalhador livre fosse menor que a de um hipotético trabalhador servil,
ainda assim a sua viabilidade estaria garantida (DOBB, 1986, p. 40-41).
5
Pelas indicações que fornece, Dobb dá a entender que o que está em jogo na con-
formação das tendências à comutação ou ao fortalecimento da servidão é a razão
entre força de trabalho disponível e terras cultiváveis. Nas regiões em que a penúria
camponesa foi maior, esta se dava principalmente pela pressão exercida pela menor
quantidade de terras aráveis sobre a população existente; um contingente de mão-
de-obra assalariável se formava a partir de indivíduos sem acesso à terra ou com
acesso a uma parcela insuficiente – fosse pequena ou pouco produtiva – para garantir
Notas
1
Hilton corrobora com a opinião de Dobb. Em suas palavras: A capacidade técnica dos
métodos de comercialização, a capacidade de concentrar recursos para financiar (a
taxas de juros usurários) governos e aristocratas donos de terras sempre carentes de
recursos facilmente realizáveis, o mecenato cultural desses mercadores medievais
capitalistas conquistou-lhes de seus historiadores um coro de admiração. Nenhum,
porém, foi capaz de modificar a avaliação feita por Marx do papel histórico desses
mercadores, isto é, que seu capital permaneceu sempre na esfera da circulação, e
nunca se aplicou à produção agrícola ou industrial de maneira inovadora. A chamada
revolução comercial em nada alterou o modo feudal de produção (HILTON, 1989, p.
22-23).
Notas
1
“Estágios sucessivos de produção (como os de fiação, tecelagem, pisoagem e tintu-
raria, na fabricação de tecidos) achavam-se agora mais intimamente organizados
como uma unidade, o que resultava não só na extensão da divisão do trabalho
entre estágios sucessivos de produção, ou entre trabalhadores empenhados numa
variedade de elementos a reunir num produto acabado, como na possibilidade de
economizar tempo na passagem do material de um estágio para o outro, e de se
conseguir um processamento mais equilibrado, porque mais integrado” (DOBB,
1977, p. 104).
2
Ao fim, as duas vias chegariam ao capitalismo, mas não com a maioria das caracte-
rísticas em comum. As sociedades que trilharam caminhos em comum disporiam
de um tipo de capitalismo semelhante.
3
Ainda que Barrington Moore Jr. faça incursões interessantes – pelo fato de serem crí-
ticas – no pensamento marxista, seu aporte tem influências nitidamente weberianas,
que se expressam principalmente na escolha dos temas na análise das transições
das “sociedades tradicionais” para as “sociedades modernas”.
4
No caso francês, em determinadas localidades foi preservada a estrutura da socie-
dade camponesa, mas o impulso comercial passou a demandar mais trabalho do
campesinato, criando um potencial de revolta e sua propensão a colaborar com
a Revolução. Ainda que o impulso comercial tenha sido fraco, o movimento revo-
lucionário enfraqueceu a aristocracia vinculada ao absolutismo, permitindo a via
democrática. Nos Estados Unidos foi a luta contra a escravidão, resolvida durante a
Guerra Civil, que abriu espaço para a democracia, tendo em vista o caráter altamente
Notas
1
Ellen M. Wood é professora de ciência política na Universidade de York, Toronto e
co-editora da revista marxista norte-americana Monthly Review, fundada por Paul M.
Sweezy. O livro A Origem do Capitalismo foi premiado no ano de seu lançamento nos
Estados Unidos, 1999, com o Outstanding Academy Awards, que é uma premiação
da revista Choice aos melhores trabalhos acadêmicos.
2
Robert Brenner publicou, na revista Past and Present, no ano de 1976, um artigo
intitulado “Estrutura agrária de classes e desenvolvimento econômico na Europa
pré-industrial”, que foi o estopim para um debate envolvendo intelectuais do porte
de Rodney Hilton e Le Roy Ladurie. As idéias de Brenner serviram de base para a
argumentação de Ellen Wood, e será através dela que o debate será contemplado
no presente estudo.
E completa:
Mas o que ficou dito já nos serve para situar a questão agrária
brasileira, e colocá-la em seus devidos termos, que vêm a ser,
em primeiro e principal lugar, a relação de efeito e causa entre
a miséria da população rural brasileira e o tipo da estrutura
agrária do País, cujo traço essencial consiste na acentuada con-
centração da propriedade fundiária. (PRADO Jr., 1981, p. 18)
Notas
até que ponto o dispêndio de capital variável representa parte substantiva dos
A tese do capitalismo colonial brasileiro
14
Notas
9
A análise de Gonzales e Bastos nos parece mais precisa na avaliação das causas
Crítica à tese do capitalismo colonial brasileiro
18
O autor define a agricultura tradicional como uma situação de equilíbrio, em que os
Crítica à tese do capitalismo colonial brasileiro