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Vamos acompanhar.
A Pearson PLC é uma multinacional com sede em Londres, criada em 1844 e que,
dentre outras, é dona do Financial Times e de metade do The Economist. Seu
faturamento em 2009 foi de 5,6 bilhões de libras (à época, algo em torno de 18,5
bilhões de reais).
Neste mesmo 2009, a The Economist afirmou, em artigo, que a "má qualidade da
educação brasileira" é o grande fator de entrave para o desenvolvimento do país.
A mesma que comprou o COC, que era da SEB, que comprou o AZ.
Liguem os pontos...
O fundador do SEB, que vendeu parte imensa da empresa para a Pearson PLC, se
chama Chaim Zaher.
Mendonça Filho, nosso ministro, desde que assumiu, foi o grande promotor
da reforma do Ensino Médio, sob o argumento de que uma “transformação radical da
educação” era fundamental.
Maria Helena Guimarães de Castro, segunda em comando, já afirmou que custeio das
universidades públicas é insustentável. E que é preciso sintonizar o Brasil com o resto
do mundo (desconfio do que isso significa...)
Para Maria Helena, duas soluções para o problema da educação no Brasil são: a)
vinculação do salário dos professores aos desempenhos de seus alunos em testes – uma
já velha política experimentada no Rio de Janeiro, por exemplo, e que apenas
contribuiu para a precarização do trabalho docente -; b) acabar com a estabilidade do
servidor público. Na verdade, para Maria Helena, “um dos grandes problemas do setor
público no Brasil é a estabilidade no emprego, independentemente do desempenho”.
Para Maria Helena, ainda, o fundador do SEB, Chaim Zaher - seu amigo pessoal de
mais de 25 anos, aliás –, é um sujeito dedicado, inteligente, batalhador e "tem feito um
trabalho muito importante na educação".
Liguem os pontos.
Vamos avançando.
Pelo modelo do MEC, quem faz ensino profissionalizante não faz Enem. Ou faz com
muito mais dificuldade.
Adiante.
A relação SEB-Pearson PLC é só a face mais recente de um processo mais amplo.
Desde 2011, já haviam sido vendidos o pH, o Pensi e o Elite. Todos cursinhos-
colégios do Rio de Janeiro. Rede privada.
O pH foi comprado pela Abril Educação. Depois a Abril Educação foi vendida para o
fundo Tarpon por 1,31 bilhão de reais e virou o grupo Somos Educação.
Liguem os pontos.
A Abril não apenas publica o Guia do Estudante (que inclusive faz rankings de
universidades), mas também as revistas Exame, Veja, e Você S/A.
Todas as três são grandes defensoras da privatização da educação. Todas as três
louvam o mundo empresarial da educação, formado, dentre outros, pelo Somos, pelo
SEB e por demais conglomerados⁴.
A base argumentativa do Escola sem Partido, por exemplo, sobre “doutrinação nas
escolas”, sustenta-se (capengamente) sobre uma reportagem da Veja de 2008.
O Eleva é parte de um fundo de capital chamado Gera Venture. Esse fundo tem como
principal investidor (isto é, na prática, o big boss) o banqueiro Jorge Paulo Lemann.
Lemann é apenas o homem mais rico do Brasil. Dono de uns 30 bilhões de dólares.
Para inúmeras publicações, o Eleva é dono de algumas das "melhores escolas do país".
Por que melhores? Porque estão entre os melhores colocados no ranking do Enem.
Para nossa mídia, estar bem colocado no ranking do Enem é sinal de sucesso
educacional.
Metade do “top 20” do Enem, contudo, forja seus resultados reunindo grupos
de “elite” entre os alunos para aumentar sua nota no Enem. O Pensi, por exemplo,
consegue sua boa posição graças a uma boa jogada de marketing (a expressão não é
minha) que abriga os melhores alunos em algumas escolas para incrementar a nota.
A mídia hegemônica costuma achar que isso, porém, é sinal de sucesso. E deseja esse
modelo para o Brasil.
Liguem os pontos.
Quase finalizando.
Isso que descrevi acima não contempla nem perto de tudo que rola nesse mundo.
Nem mencionei, por exemplo, o Kroton, maior grupo educacional do mundo (do
MUNDO).
Vocês não acham bizarro que o Brasil, sempre extremamente criticado pela sua
educação, sempre extremamente criticado nos rankings educacionais internacionais,
seja o lar da maior empresa privada de educação DO MUNDO?
Liguem os pontos!
Concluindo:
Não se trata apenas de negócios. Se trata, também, de uma profunda alteração nos
sentidos da educação pública no país.
Esse negócio bilionário não está aqui apenas para alcançar os demais 20%.
Porque, não se enganem, a menina dos olhos de todos esses grupos é a rede pública
mais robusta. Especialmente universidades estaduais e federais, Institutos Federais,
Faetec e similares etc.
Sim, sei que forço a barra na comparação, já que os IF são uma exceção no sistema.
Mas, então, por que não prestar atenção ao que dá certo ali e buscar replicar? Por que o
modelo educacional valorizado pelo MEC e pela mídia é o privatista? Sabemos a
resposta, não? É só ligar os pontos...
Voltemos.
Prestemos atenção à UERJ. Ali é um grande laboratório do desmonte que será seguido
por ataques desses grupos.
Impossível entender qualquer discussão sobre educação no Brasil, hoje, sem levar em
conta esse gigantesco movimento de bastidores.
Digo isso pois, apesar de entender a imensa importância desse viés mais culturalista,
entendo que essa lógica educacional privatista tem suficiente espaço para acomodar
esse elemento de crítica cultural.
A luta contra os retrocessos mais culturais (como o Escola sem Partido) precisa vir
acompanhada da luta contra esse imperialismo privatista. Senão vamos apenas trocar a
frigideira pelo forno.
João Carlos Escosteguy Filho é professor de História do Instituto Federal de
Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro (IFRJ)
[3] Ver o artigo da autora na coletânea “O Brasil tem jeito?”, organizado por
Arthur Ituassi e Rodrigo de Almeida (Jorge Zahar, 2007).