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RAÍZES TEÓRICAS DO PROCESSO DE CRIMINALIZAÇÃO NA OBRA DE

ALESSANDRO BARATTA

Pekelman Halo
Victor Aécio1

SUMÁRIO: Introdução; 1. Introdução; 2. Indo ao encontro de “delinquente”: a


criminalização no paradigma tradicional e as teorias biopsicológicas e
positivistas; 3. O argumento das teorias estrutural-funcionalistas para a
criminalização; 4. O Labeling Approach: Novos fundamentos para o processo
de criminalização; 5. As modalidades da nova criminalização: primária e
secundária; 6. Considerações finais; Referências bibliográficas.

RESUMO:
Trata-se de compreender, através das teorias criminológicas apresentadas na obra de
Alessandro Baratta “Criminologia Crítica e Crítica do Direito Penal”, e secundariamente
através de outras referências, como se desenvolveram as raízes teóricas quais gestaram o
núcleo conceitual do que seja “crime” e “criminoso” bem como o conseqüente fundamento
dos processos de criminalização dos sujeitos aí engendrados, e que tomaram impulso, e ao
mesmo tempo certa reformulação ideológica com o advento do novo paradigma penal do
Labeling Approach.

1. Introdução

O contexto da obra de BARATTA confronta as aquisições das teorias sociológicas


sobre crime e controle social com os princípios da ideologia da defesa social, e, é o ápice
das suas idéias que compuseram a teoria criminológica moderna. O jurista e filósofo
romano (Alessandro Baratta) teve como mestre Widar Cesarini Sforza e fora
contemporâneo a Noberto Bobbio. Teve forte influência de Gustav Radbruch e de
Maihofer, conforme uma publicação periódica da DOXA: Cuadernos de Filosofia del
Derecho, No 25, ano 2002 (págs. 27-36) onde o filósofo italiano Paolo Becchi escreveu um
artigo de homenagem in memoriam a Alessandro Baratta. Conforme Paolo Becchi, seus
primeiros debates encaminharam-se em direção

“A una concepción objetivista-naturalista y a la recuperación de las tendências


iusnaturalistas em la inmediata posguerra, de las cuales el debate sobre la
‘naturaleza de la cosa’ era la más reciente expresión, Baratta contrapuso la

1
Alunos do 6º período vespertino do Curso de Direito da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB.
peculiar perspectiva del idealismo italiano que él había asimilado de su maestro:
un idealismo que, como bien subrayó, no raramente se conjugaba con temáticas
realistas, por lo cual lo definió como ‘idealismo realista’”. (DOXA, n.25, 2002,
p. 28)
O livro é um estudo clássico contemporâneo que propõe uma política criminal
alternativa à cultura penal hegemônica vigente.

Na primeira parte, identifica e delimita as várias teorias criminológicas


desenvolvidas, partindo da Escola Clássica do Direito Penal e do Positivismo
Criminológico, que estabeleceram as bases ideológicas sobre as quais se ergueu o sistema
punitivo de diversos países, inclusive o Brasil, passando por teorias como a psicanalítica,
cuja origem remonta a Sigmund Freud, a estrutural-funcionalista de Émile Durkheim e
Robert Merton. O autor as identifica como uma negação a cada um dos princípios que
fundamentam a ideologia da Defesa Social, programa político para a área penal nascido da
Escola Clássica do Direito Penal e do Positivismo Criminológico.

O livro aborda questões importantes como o velho discurso da Sociologia Criminal


qual vê o crime como realidade ontológica pré-constituída. E também o recente discurso da
Sociologia do Direito Penal onde o foco recai sobre as definições e o processo de
criminalização do sistema penal como elementos constitutivos do crime e do status social
do criminoso. Mostra que, com as teorias psicanalíticas, principalmente a de Reik, o
princípio da culpabilidade é negado.

2. Indo ao encontro do “delinqüente”: A criminalização no paradigma tradicional e


as teorias biopsicológicas e positivistas

A Criminologia positivista objetivava “superar as teorias patológicas”,


individualizar a pena, modificar o delinqüente. O discurso positivista “tem por objeto... o
homem delinqüente, considerado como indivíduo diferente, clinicamente observável”
(BARATTA, 2002, p. 29). Refere-se “a teorias desenvolvidas na Europa entre o final do
século XIX e começo do século XX, no âmbito da filosofia e da sociologia do positivismo
naturalista... em particular à escola sociológica francesa (Gabriel Tarde) e à ‘Escola social’
na Alemanha (Franz von Liszt), mas especialmente à ‘Escola positiva’ na Itália (Cesare
Lombroso, Enrico Ferri, Raffaele Garofalo)” (idem, p. 32). A matriz positivista continua
hoje em dia, diz ele:

... a orientação patológica e clínica continua representada na criminologia


oficial, mas também porque as escolas sociológicas que se desenvolveram, dos
anos 30 em diante, especialmente nos Estados Unidos, contrapondo-se como
‘sociologia criminal’ à ‘antropologia criminal’, continuaram por muito tempo e
ainda em parte continuam a considerar a criminologia sobretudo como estudo
das causas da criminalidade. Ainda que estas orientações tenham, geralmente,
deslocado a atenção dos fatores biológicos e psicológicos para os sociais, dando
o predomínio a estes últimos, o modelo positivista da criminologia como estudo
das causas ou dos fatores da criminalidade (paradigma etiológico) para
individualizar as medidas adequadas para removê-los, intervindo sobretudo no
sujeito criminoso (correcionalismo), permanece dominante dentro da sociologia
criminal contemporânea (BARATTA, 2002, p. 30).
Segue-se então a escola liberal clássica desenvolvida nas obras de Jeremy Bentham
na Inglaterra, de Anselm von Feuerbach na Alemanha, de Cesare Beccaria e da escola
clássica de direito penal na Itália.

... não considerava o delinqüente como um ser diferente dos outros, não partia
da hipótese de um rígido determinismo, sobre a base do qual a ciência tivesse
por tarefa uma pesquisa etiológica sobre a criminalidade, e se detinha
principalmente sobre o delito, entendido como conceito jurídico, isto é, como
violação do direito e, também, daquele pacto social que estava, segundo a
filosofia política do liberalismo clássico, na base do Estado e do direito... o
direito penal e a pena eram considerados pelas Escolas clássica não tanto como
meio para intervir sobre o sujeito delinqüente, modificando-o, mas sobretudo
como instrumento legal para defender a sociedade do crime, criando, onde fosse
necessário, um dissuasivo, ou seja, uma contramotivação em face do crime...
Essas escolas “... se situavam como uma instancia crítica em face da prática
penal e penitenciária do ancien régime, e objetivavam substituí-la por uma
política criminal inspirada em princípios radicalmente diferentes (princípio de
humanidade, princípio de legalidade, e princípio de utilidade)”, e, “...
adquiriram um novo interesse à luz das tendências criminológicas que,
contestando o modelo da criminologia positivista, deslocaram sua atenção da
criminalidade para o direito penal, fazendo de ambos o objeto de uma crítica
radical do ponto de vista sociológico e político (BARATTA, 2002, p. 31).
Para os fins de justificar a criminalização pretendida à época os juristas procediam
a uma rigorosa fundamentação filosófica, racionalista e jusnaturalista (ex.: Francesco
Carrara). Fundamentavam-se em Beccaria, Filangieri e Romagnosi (BARATTA, 2002, p.
33). Tendiam “a negação da justiça de gabinete, própria do processo inquisitório, da prática
da tortura”, mas, por outro lado “a afirmação da exigência de salvaguardar os direitos do
imputado por meio da atuação de um juiz obediente, não ao executivo, mas à lei”. Era a
filosofia do dano social, da defesa social. A obra de Beccaria representou a legitimidade do
Estado ao “direito de punir”, com o limite da satisfação coletiva:

... a expressão de todo um movimento de pensamento, em que conflui toda a


filosofia política do Iluminismo europeu e, especialmente, o francês... é a
formulação pragmática dos pressupostos para uma teoria jurídica do delito e da
pena, assim como do processo, no quadro de uma concepção liberal do estado
de direito, baseada no princípio utilitarista da maior felicidade para o maior
número, e sobre as idéias do contrato social e da divisão dos poderes...
necessidade de manter unidos os interesses particulares, superando a colisão e
oposição entre eles, que caracteriza o hipotético estado de natureza
(BARATTA, 2002, pág. 33). Do princípio utilitarista da máxima felicidade do
maior número e da idéia do contrato social segue-se que o critério da medida da
pena é o mínimo sacrifício necessário da liberdade individual que ela implica
(idem, pág. 34).
A obra de Lombroso, junto com Ferri e Garófalo, representou uma nova maneira de
considerar o delito. Partiam da metafísica naturalista e positivista. Aí, o delito é também
um ente jurídico, mas também ato humano inserido na totalidade natural e social, pondo
todo o complexo das causas na totalidade biológica e psicológica do indivíduo. Viu-se
novamente reafirmada a concepção da pena como meio de defesa social. Era próprio da
afirmação do sistema burguês de então. A ciência penal e a codificação penal,
fundamentando um processo criminalizatório do indivíduo, nasceram como elementos
essenciais ao sistema burguês.

A ideologia da defesa social afirma seu predomínio ideológico burguês dentro do


setor penal. Acompanharam a passagem do estado liberal clássico ao estado social. Tal
ideologia constrói aparatos que visam a persecução da culpabilidade relativa à atitude
interior do “delinqüente”. Os progressistas polemizam em direção a uma “irrefletida
sensação de militar do lado justo” (BARATTA, 2002, pág. 44).
O atraso da ciência jurídica em face do pensamento criminológico
contemporâneo mais avançado é tal que, de fato, obriga a pensar que o mesmo
não pode ser hoje recuperado através de uma crítica imanente, ou de uma
autocrítica situada no interior da ciência jurídica (BARATTA, 2002, pág. 45).
As teorias psicanalistas da criminalidade de Sigmund Freud e Tilman Moser
quando se referem à explicação do comportamento criminoso fundam as raízes da doutrina
da neurose para explicar o comportamento delituoso. Radical negação do tradicional
conceito de culpabilidade e do princípio da legitimidade. DELITO = DOENÇA. A função
do processo de criminalização aqui é eliminar ou circunscrever a criminalidade
conduzindo-a para âmbito clínico. Nas teorias psicanalistas da sociedade punitiva a função
corresponde a mecanismos psicológicos em face dos quais o desvio criminalizado aparece
como necessário e ineliminável da sociedade, DELITO = INEVITÁVEL. Nessa teoria
objetiva-se construir mecanismos de contenção dos delinqüentes, distanciamento e
proteção do resto da sociedade.

Theodor Reik desenvolve a idéia de que a tendência de desenvolvimento do direito


penal é a da superação da pena. Alexander e Staub “põem em relevo o mecanismo
sociopsicológico através do qual a pena infligida a quem delinqüe vem contrabalançar a
pressão dos impulsos reprimidos, que o exemplo de sua liberação no delinqüente torna
mais fortes” (BARATTA, 2002, pág. 52). Por outro lado, na obra de Paul Reiwald aparece
a teoria do delinqüente como sendo um bode expiatório, com raiz na análise freudiana do
mecanismo de projeção. Pode-se ver em relação à função da literatura e dos filmes sobre
crimes. Também através dos mass media, por meio da fantasia artística – novelas da
Globo, por exemplo. Ambas teorias psicanalistas reproduziram a concepção universalista
de delito.

3. O argumento das teorias estrutural-funcionalistas para a criminalização

Robert Merton e Emile Durkheim desenvolveram as teorias estrutural-funcionalista


da anomia e da criminalidade. Ambas puseram em dúvida o princípio maniqueísta.
Desenvolveram-nas em alternativa às teorias biopsicológicas do delinqüente acima
referidas. Merton e Durkheim advogam que as causas do desvio não devem ser
pesquisadas em fatores bioantropológicos e naturais como clima e raça, nem tampouco em
uma situação patológica da estrutura social. Que o desvio é um fenômeno social, e,
inerente a toda estrutura social. Desse modo, o desvio só passará a ser negativo para a
sociedade quando ultrapassar determinados limites, quando ameaçar a existência e o
desenvolvimento da estrutura social, momento em que se seguirá um estado de
desorganização, no qual todo o sistema de regras de condutas perde valor, integrantes do
sistema de normalidade. Nesse momento dá-se a anomia quando não se afirmou um novo
sistema.

Emile Durkheim desenvolveu essa teoria da anomia. Antes que ela ocorra os
delitos são salutares para a sociedade de forma indireta, como “modelo do que não se
quer”. Ele percebeu, além disso, que o delito pode ter também um papel direto no
desenvolvimento moral de uma sociedade, pois, “o criminoso não só permite a manutenção
do sentimento coletivo em uma situação suscetível de mudança, mas antecipa o conteúdo
mesmo da futura transformação. Para ele, o crime é elemento de coesão social, quando
dado em proporções aceitáveis. De fato, freqüentemente o delito é a antecipação da moral
futura, como demonstra, por exemplo, o processo de Sócrates” (BARATTA, 2002, p. 61).
Durkheim não via o delinquente ao modo das teorias patológicas “ser radicalmente anti-
social, espécie de elemento parasitário, de corpo estranho e inassimilável, introduzido no
seio da sociedade”.

Robert Merton parte da contraposição fundamental entre indivíduo e sociedade. Na


medida em que a sociedade representa uma força que reprime o livre desenvolvimento dos
recursos vitais individuais, provoca uma reação de revolta do indivíduo contra ela. Daí a
sociedade contra-reage rotulando a atitude do indivíduo de patológica, perigosa e
criminosa, sancionando novamente medidas repressivas. Merton apresenta como base de
entendimento da criminalização a contradição existente entre estrutura social e a cultura.
A cultura propõe metas a serem alcançadas pelo indivíduo (ex., bem estar e sucesso
econômico) quando sua estrutura social não o permitam, pela falta de acesso às
modalidades e aos meios legítimos e igualitários para alcançar tais metas. Para esse autor,
seria essa desproporção que estaria na base dos comportamentos desviantes porque cria
uma tensão entre a estrutura social e os valores culturais. A reação que os indivíduos têm a
essa tensão é classificada por Merton em cinco modelos: conformidade, inovação,
ritualismo, apatia e rebelião.

O acesso aos canais legítimos para enriquecer-se tornou-se estreito por uma
estrutura estratificada que não é inteiramente aberta, em todos os níveis, aos
indivíduos capazes... A cultura coloca, pois, aos membros dos estratos
inferiores, exigências inconciliáveis entre si. Por um lado, aqueles são
solicitados a orientar a sua conduta para perspectiva de um alto bem-estar...; por
outro, as possibilidades de fazê-lo, com meios institucionais legítimos, lhes são,
em ampla medida, negadas (MERTON, 1957, 145-146).
Tal teoria será mitigada pelas pesquisas de E. H. Sutherland sobre a criminalidade
de colarinho branco porque para estes não existe a tensão pela falta de estrutura social, ou
meios de alcançar as tais metas. Surgem a partir daí os critérios da “aprendizagem” e da
“aproximação” com fim de resolver problemas de adaptação não resolvidos pela cultura
dominante, analisados por Albert Cohen ao estudar as subculturas criminosas dos “bandos
juvenis”. Tais teorias negam o princípio da culpabilidade porque afirmam que existem
valores e normas específicos dos diversos grupos sociais (subculturas). O pluralismo de
subgrupos culturais comporta grupos muitas vezes rigidamente fechados em face do
sistema institucional de valores e de normas, e caracterizados por valores, normas e
modelos de comportamento alternativos.

4. O Labeling Approach: Novos fundamentos para o processo de criminalização

Finda aí as principais teorias englobadas e denominadas pela Criminologia Crítica


de “paradigma etiológico” qual desenvolveu o processo de criminalização fundamentado
na elaboração da necessidade da pena bem como de sua função diversa e finalidades. Na
prática penal, esse processo ainda não perdeu campo. Porém, o campo vem sendo
disputado principalmente com o advento do novo paradigma criminológico denominado
labeling approach ou da “reação social”. Tal paradigma argúe o seguinte:
... não se pode compreender a criminalidade se não se estuda a ação do sistema
penal, que a define e reage contra ela, começando pelas normas abstratas até a
ação das instâncias oficiais (polícia, juízes, instituições penitenciárias que as
aplicam), e que, por isso, o status social de delinqüente pressupõe,
necessariamente, o efeito da atividade das instâncias oficiais de controle social
da delinqüência, enquanto não adquire esse status aquele que, apesar de ter
realizado o mesmo comportamento punível, não é alcançado, todavia, pela ação
daquelas instâncias. Portanto, este não é considerado e tratado pela sociedade
como “delinquente”... tem estudado o efeito estigmatizante da atividade da
polícia, dos órgãos de acusação pública e dos juízes (BARATTA, 2002, p. 86).
Sendo assim, para esse novo paradigma que se afigura, a “criminalidade” ou o
“criminoso” não existem em si mesmos esperando que alguém o estude. Ele existe só após
um processo de criminalização que o cria e o constitui enquanto tal. Tal processo conta
com a participação do conjunto da sociedade. Nós fabricamos o criminoso. Ele não se faz
sozinho. O “criminoso” é uma realidade social qual “não se coloca como préconstituída à
experiência cognoscitiva e prática, mas é construída dentro desta experiência, mediante os
processos de interação que a caracterizam” (idem, p. 87). O processo de criminalização se
dá na e com a construção daquela realidade social. Todos os atores sociais participam dela,
não só o sujeito criminoso.

Essa mudança de perspectiva sofreu influencia do interacionismo qual diz ser o


processo de criminalização uma construção cuja operação é problemática por não se dar
objetivamente como querem os positivistas e os liberais. Assim, o código oficial define
uma conduta “típica” ao dizer “o que é crime?”, mas o processo de criminalização opera
um second code ao dizer “quem é criminoso?”, “como se torna?”, “como controlá-lo?”
etc., perfazendo uma interpretação problemática do primeiro código. Tal processo produz
um etiquetamento sobre quem seja criminoso e quem não o será. Além disso, concede um
poder desastroso de definição da etiqueta, diretamente a alguns ligados às agências de
controle social.

Ao estudar os usuários de ‘maconha’ nos EUA em 1963, Howard S. Becker


analisou os efeitos da estigmatização na formação do status social do desviante, dizendo:

Eu penso, antes, que os grupos sociais criam o desvio estabelecendo as normas


cuja infração constitui desvio, aplicando estas normas a determinadas pessoas e
rotulando-as como ‘outsiders’. Deste ponto de vista, o desvio não é uma
qualidade do ato cometido pela pessoa, mas uma conseqüência da aplicação de
normas e de sanções a um ‘delinquente’, por parte de outras pessoas. O
desviante é uma pessoa à qual a rotulação foi aplicada com sucesso; o
comportamento desviante é um comportamento rotulado como tal (BECKER,
1963, p. 9).
5. As modalidades da nova criminalização: primária e secundária
Outra contribuição importantíssima no desenvolvimento teórico desse paradigma
foi dada por Edwin M. Lemert e também por Edwin M. Schur. Estes identificaram na
distinção entre delinqüência primária e secundária a questão central do paradigma da
reação social. A punição do primeiro comportamento desviante do sujeito (por isso
primária) gera uma mudança de identidade social do individuo que o estigmatiza e o
potencializa a permanecer naquele novo papel social, cometendo novos crimes e sendo
mais uma vez punido – e, desta vez, duplamente (por isto secundária).
Anote-se que com tais postulações o paradigma da reação ou do controle pôs em
xeque o princípio do fim ou da prevenção desenvolvidos no bojo do paradigma tradicional
ou etiológico, desmistificando a função reeducativa da pena, pois, em contrário, consolida
a carreira criminosa mormente pelo etiquetamento.
Logo foi feita a distinção doutrinária entre a criminalização primária e a
criminalização secundária. A primeira é determinada pela característica da criação de tipos
penais para a incriminação de certos indivíduos da sociedade e de ações específicas. O
próprio legislador procurou selecionar, adequando assim às condutas mais repudiadas ou
de grande relevância social, aos tipos penais que foram inseridos no Código Penal
Brasileiro. Tal referência à criminalização primária é feita por Zaffaroni ao deixar claro
que a mesma: “é o ato e o efeito de sancionar uma lei penal material que incrimina ou
permite a punição de certas pessoas” (ZAFFARONI, 2003, p. 43).
Já a criminalização secundária é aquela determinada por uma ação direta, ação essa
exercida pelos meios de controle do estado. Tal criminalização é a mais visível, pois se
aplica diretamente no mundo real, transpondo a teoria para a própria prática. Portanto,
Zaffaroni descreve a criminalização secundária: “é a ação punitiva exercida sobre pessoas
concretas, que acontece quando as agências policiais detectam uma pessoa que supõe-se
tenha praticado certo ato criminalizado primariamente” (idem, p. 44).
É de se deixar claro e evidente que a criminalização primária é tida
doutrinariamente como sendo um seguimento mais teórico e abstrato. No que diz respeito à
criminalização secundária, essa sim, é posta na prática direta dos meios de controle
criminais do estado. A própria polícia concretiza a teoria da criminalização secundária na
prática ao adequar a conduta descrita em um tipo penal e ao conecta-la a um sujeito. A
concretização de tal ideia é tirada dos ensinamentos de Zaffaroni:
apesar da criminalização primária implicar um primeiro passo seletivo, este
permanece sempre em certo nível de abstração porque, na verdade, as agencias
políticas que elaboram as normas nunca sabem a quem caberá de fato,
individualmente, a seleção que habilitam. Esta se efetua concretamente com a
criminalização secundária (ZAFFARONI, 2003, p. 44).
O direito penal, como sabido, é tido como sendo o braço mais forte do estado. O
processo penal é determinado por ser um instrumento de concretização do que é descrito
pelo Direito Penal. Mais do que isso, como um sistema interligado de diversos tipos de
conhecimento, todos os ramos do Direito são conectados. O que realmente reforça a ideia e
a verdade que o que está descrito nos códigos de direito nada mais são do que construções
da própria sociedade, pois a procura em se defender bens jurídicos e valores sociais são
sempre constantes nesses códigos.
Nesse sistema penal é que se encontra o processo de criminalização e para este
Baratta consegue determinar três mecanismos de suma importância para a sua
determinação:
a) o mecanismo da produção das normas, conhecido por criminalização
primária; b) o mecanismo da aplicação das normas, isto é, o processo penal,
compreendendo a ação dos órgãos de investigação e culminando com o juízo,
conhecido do processo de criminalização secundária; e finalmente, c) o
mecanismo da execução da pena ou das medidas de segurança (BARATTA,
1999, p. 161).
Portanto, depois da determinação das divisões doutrinárias para o processo de
criminalização é de grande importância complementar como então se aplica ao indivíduo.
É de se compreender que a criminalização primária e a criminalização secundária andam
juntas, possuindo uma grande conexão, uma não existindo sem a outra. Um indivíduo ao
praticar um ato tido como ilícito, este é ‘enquadrado’ em um tipo penal determinado pelo
legislador, logo passa pela criminalização primária.
Desta feita, o mesmo indivíduo só passará realmente pelo sistema penal ao se
deparar com um dos responsáveis pela execução do Direito Penal, ou seja, o individuo
além de praticar uma ação contida em um tipo penal se for encontrado pela polícia, por
exemplo, praticando tal ato, caracterizar-se-á aí a criminalização secundária.

6. Considerações finais

Tendo que com a teoria das subculturas criminais, Cloward-Ohlin e Sutherland


demonstraram de que modo a desigual distribuição estrutural do acesso a meios legítimos,
para realizar metas culturais, compele minorias desfavorecidas para modelos de
comportamento desviantes. E também que a análise do labeling approach (teoria do
etiquetamento) mostra que a criminalidade não seria um dado ontológico pré-constituído
mas realidade social constituída pelo sistema de justiça criminal por meio de definições e
da reação social.

Vê-se então que a linguagem da criminologia contemporânea é marcada pelos


conceitos desse paradigma. Aí tem-se o “comportamento criminoso” como um rótulo. Vê-
se também o papel da estigmatização penal na produção do status social de ‘criminoso’ e a
rejeição da função reeducativa da pena criminal, que consolida a identidade criminosa e
introduz o condenado em uma carreira desviante.

É interessante lembrar o que diz Nilo Batista na apresentação do livro de Baratta,


referindo-se aos problemas atuais, objetos da nova criminologia:

... o discurso penal já desloca o foco perigosista do proletariado, onde estava


por ocasião do Programa de Marburgo, para o conjunto de grupos sociais
marginalizados pelo empreendimento neoliberal que, para usar os termos
lisztianos, ‘costumamos reagrupar sob a compreensiva denominação’ de
excluídos (2002, p. 3).
Mesmo tendo objetos diferentes, diz BARATTA, a sociologia criminal e a
sociologia jurídico-penal sobrepõem-se necessariamente ao menos nos “aspectos da noção,
da constituição e da função do desvio, que podem ser colocados em conexão estreita com a
função e os efeitos estigmatizantes da reação social, institucional e não-institucional”
(2002, p. 25). Tal autor já havia percebido essa “conexão” desde os estudos com F. Sack e
G. Smaus na Universidade de Saarland em Sarbrucken, Alemanha.

Para ele, o processo de criminalização está inserido no que ele chama de “atitude
microssociológica”. A sociologia jurídico-penal foi se libertando da tradição idealista
italiana e construindo um discurso acompanhado da “consciência de sua função crítica em
face das ideologias e, em geral, da realidade social dos fatos estudados” e esta atitude
micro interfere no horizonte explicativo e interpretativo macro (atitude
macrossociológica).

Dada dessa forma, tal relação é uma relação funcional e não de delimitação de
objeto (pág. 26). A relação funcional tem função prática, diz ele, “a nossa matéria pode
realizar a função de teoria crítica da realidade social do direito, que consideramos sua
tarefa fundamental” (BARATTA, 2002, p. 27).

Por isso tudo que é possível dizer-se aqui: mais interessante que seja a contribuição
do paradigma da reação social por descrever de forma precisa como se dá o processo de
criminalização e seus efeitos para o apenado, acaba por não contemplar os conflitos de
ordem econômica e política subjacentes à vontdade social de reproduzir a essas categorias
de criminalização, sem estudar mais a fundo suas causas, ou seja para evitar que se puna o
sujeito causando sua morte identitária social, ao puni-lo.

Referências bibliográficas

BARATTA, Alessandro. Criminologia Crítica e Crítica do Direito Penal: introdução à


sociologia do direito penal. Trad. Juarez Cirino dos Santos. 3. ed., Coleção Pensamento
Criminológico, Editora Revan: Instituto Carioca de Criminologia, Rio de Janeiro, 2002.

BECCHI, Paolo. Alessandro Baratta (1933 – 2002) in memoriam. DOXA: Cuadernos de


Filosofia del Derecho, No 25, págs. 27-36, ano 2002.

BECKER, Howard S. Outsider. Studies in the Sociology of Deviance. New York, 1963.

MERTON, R. K. Social Theory and Social Structure. Glencoe, 1957. [trad. italiana:
Teoria e struttura sociale, Bologna, 1974].

ZAFFARONI, E. Raúl; BATISTA, Nilo; ALAGIA, Alejandro & SLOKAR, Alejandro.


Dirieto penal brasileiro: teoria geral do direito penal. vol. 1, Rio de Janeiro: Ed. Revan,
2003.

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