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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

FACULDADE DE FILOSOFIA, CIÊNCIAS E LETRAS DE RIBEIRÃO PRETO

SUELLEN LIMA OLIVEIRA

PROJETOS SOCIAIS E O ENSINO COLETIVO DE INSTRUMENTOS


MUSICAIS

Ribeirão Preto
2015
SUELLEN LIMA OLIVEIRA

PROJETOS SOCIAIS E O ENSINO COLETIVO DE INSTRUMENTOS MUSICAIS

Trabalho de Conclusão de Curso para


formação em Educação Artística com
Habilitação em Música pela Faculdade de
Filosofia, Ciências e Letras da Universidade
de São Paulo

Orientadora: Profa. Dra. Simone Gorete Machado

Ribeirão Preto
2015
AGRADECIMENTOS

Para alguns pode não fazer muito sentido começar um trabalho acadêmico
agradecendo a Deus, mas para alguém que acredita em um ser que além de Criador de tudo é
um ser pessoal, que mesmo eterno está próximo de nós, a falta de sentido estaria em não
agradecer. Primeiramente então, gostaria de agradecer a Deus por me conceder as habilidades
e sabedoria necessárias, além de me guiar e colocar essas pessoas maravilhosas para me
ajudar nessa pequena jornada.
Agradeço aos meus pais pelo apoio e socorro em tudo, inclusive por abrirem meus
olhos quando chegou o momento de ceder ao Ensino Coletivo, à Dany, irmã incrível, parceira
das experiências decorrentes dessa decisão e ao Josué, por, além de ter sido forte influência na
escolha do tema desse trabalho, estar sempre pronto pra me ouvir nas crises e alegrias intensas
que aconteceram durante esse processo.
Outra importante e feliz escolha, pela qual devo agradecer, foi a orientação da Profa.
Dra. Simone Gorete. Lembro-me de várias vezes durante esses meses, pensar o quanto havia
acertado em tê-la convidado. Nossas conversas, seu cuidado e organização foram essenciais
para esse trabalho.
Aos meus queridos alunos e amigos do Projeto Brincando com a Música,
representados pelo Coordenador David Alves Cardoso, por confiarem em meu trabalho me
dando a oportunidade de, não apenas ensinar, mas também experimentar, aprender e crescer.
Muitas das palavras deste trabalho foram aqui escritas pensando em tudo o que vivi e ainda
vou viver no Projeto.
Não poderia me esquecer da Profa. Marina Souza que foi muito importante durante os
meus anos iniciais em música e permanece sendo um auxílio seguro mesmo depois de tantos
anos. Agradeço por todas as vezes que foi solícita e incentivadora, há participação sua aqui
também.
Agradeço ainda à Profa. Dra. Liu Man Ying e ao Prof. Dr. Marcos Câmara de Castro
por aceitarem prontamente ao convite de fazer parte da banca deste trabalho. Acredito que
suas contribuições serão de extrema importância para a conclusão dele.
RESUMO

Este trabalho se desenvolveu a partir da ideia de que os projetos sociais formam um


interessante espaço de atuação para o educador musical e que, para que essa atuação ocorra de
forma mais adequada, é preciso conhecer melhor o espaço em questão. Assim sendo,
pretendemos abordar algumas questões históricas do surgimento dos projetos sociais no
Brasil, principalmente das Organizações Não Governamentais, chamadas, frequentemente, de
ONGs. Além disso, apresentaremos aspectos do funcionamento desses projetos tendo em
vista que essas informações podem ser importantes para um educador musical que pretende
atuar nessa área. Também pensando no desenvolvimento do ensino musical nesses projetos, o
Ensino Coletivo de Instrumentos Musicais é apresentado como uma alternativa de modalidade
de ensino eficaz na solução de várias dificuldades encontradas pelas ONGs. Para isso são
apresentadas características do Ensino Coletivo, além de indicações de qual deve ser o perfil
do educador musical interessado, ou induzido, a atuar nessa modalidade.

Palavras-chave: Projetos Sociais. ONGs. Ensino Coletivo.


ABSTRACT

This work has developed from the idea that social projects are an interesting work
place for a music educator and that, in order for this action to occur more appropriately, we
must know its context. Thus this paper aims to address some historical questions about the
emergence of social projects in Brazil, mainly from NGOs. In addition, we present aspects
about these projects’ operation, assuming that this information may be important for a music
educator who intends to work in this area. Also thinking in the development of music
education in these projects, the teaching of musical Instruments in groups is presented as an
alternative as an effective setting in order to resolve various difficulties encountered by
NGOs. Therefore characteristics of teaching in groups and indications about the
characteristics required for a music educator interested in this area.

Keywords: Social Projects. NGOs. Teaching in groups.


SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.............................................................................................................7

1 UM BREVE HISTÓRICO DAS ENTIDADES SOCIAIS NO BRASIL.................9

2 O FUNCIONAMENTO DAS ENTIDADES SOCIAIS...........................................15


2.1 LEGISLAÇÃO..............................................................................................................15
2.2 FUNCIONAMENTO INTERNO DAS ONGS ...........................................................17

3 O ENSINO COLETIVO DE MÚSICA NOS PROJETOS SOCIAIS....................21


3.1 ENSINO COLETIVO E OS PROJETOS SOCIAIS.....................................................21
3.2 METODOLOGIA DO ENSINO COLETIVO..............................................................24
3.3 O EDUCADOR MUSICAL NO ENSINO COLETIVO..............................................26

CONCLUSÃO.............................................................................................................30

REFERÊNCIAS..........................................................................................................32
7

INTRODUÇÃO

Atualmente há uma variedade de espaços de atuação para o educador musical em


contextos escolares e extraescolares. Dentre essa diversidade de contextos educativos, os
espaços não formais, como as organizações não governamentais, projetos sociais e
associações comunitárias, têm se mostrado um campo bastante interessante, pois a música tem
sido bastante valorizada como uma ferramenta em ações sociais (PENNA, 2012). Este
trabalho pretende apresentar um pouco da história e do funcionamento dessas entidades
sociais, principalmente das Organizações Não Governamentais, chamadas, frequentemente,
de ONGs. O Ensino Coletivo de instrumentos musicais é apresentado como uma possível
metodologia musical a ser utilizada nas ONGs.
A expressão “ONG” foi criada pela ONU em 1946, para designar órgãos não oficiais
que executavam projetos de interesse público, mas tornou-se conhecida apenas em meados
dos anos 80. Comumente, ao se pensar em ONG, temos a ideia de algo totalmente
desvinculado do governo. Realmente a gestão das ONGs é autônoma e não determinada pelo
Estado, entretanto, elas podem estar ligadas ao governo por outros meios, tais como parcerias
ou até mesmo sendo provenientes de iniciativas governamentais. Sendo assim, de acordo com
Gohn (2000, p. 55), “o denominador comum das ONGs parece ser a sua razão social de fins
não lucrativos”, e não sua relação com o governo.
Fernandes (1994) considera a divisão da sociedade em três setores, sendo o governo é
chamado de primeiro setor e a iniciativa privada de segundo setor. Em um terceiro setor se
encontram organizações que possuem características destes outros dois setores. Aqui, dentre
outras iniciativas, encontramos as ONGs que, em sua atuação, resumem a ideia de “privado
com funções públicas”. As ONGs são organizações que, apesar de possuírem pessoa jurídica
privada, atuam em função de interesses públicos (FERNANDES, 1994, p. 65).
Também é interessante citar que “ONG” não é uma sigla oficial e as organizações
desse tipo são classificadas e nomeadas de outras formas pelo Estado, conforme abordaremos
no segundo capítulo desse trabalho.
As ONGs são ferramentas de atuação da sociedade civil que, segundo Oliveira e
Haddad, “corresponde à população de cidadãos, ou esfera privada, e abrange suas variadas
formas de organização e expressão – com ou sem fins lucrativos, podendo ser legalmente
constituídas ou espontâneas e informais” (OLIVEIRA E HADDAD, 2001, p. 62).
Este trabalho não tem por objetivo abordar todas as questões referentes aos temas
propostos. Acreditamos que há ainda outros aspectos importantes a serem tratados, mas que,
8

pelo formato do trabalho proposto, ainda não puderam ser estudados pela autora. É importante
ressaltar também que Projetos Sociais e Ensino Coletivo não estão necessariamente
relacionados, as ideias apresentadas aqui são apenas uma alternativa entre outras.
9

1 UM BREVE HISTÓRICO DAS ENTIDADES SOCIAIS NO BRASIL

As organizações sociais tiveram origem, na Europa e nas Américas, por volta dos
séculos XVI e XVII. No início, essas organizações eram fortemente ligadas à Igreja e ao
Estado, que não eram separados por lei. Como resultado dessa ligação, elas foram
influenciadas pelos sistemas de governo e pelas políticas nacionais vigentes, além de terem
íntimo relacionamento com o trabalho religioso (ALBUQUERQUE, 2006, p. 21).
No Brasil, o início da assistência aos necessitados é situado no período colonial. Os
principais agentes dessa assistência eram entidades e pessoas mobilizadas por princípios
religiosos, que muitas vezes também escondiam interesses econômicos, sociais e políticos.

Na prática, a assistência no Brasil era exercida como um monopólio de


paróquias e Irmandades ou Confrarias, cujos membros eram cristãos generosos
orientados por uma espiritualidade que tinha como eixo condutor o exercício da
caridade cristã. Convém recordar que as Confrarias ou Irmandades de Misericórdia
tinham origem na cultura europeia. Organizadas a partir do século XII, reunia seus
membros sob o patrocínio de um santo católico, a cuja devoção se dedicavam
(PRADO; SOUZA NETO; CERONI, 2007, p. 18).

As Confrarias podiam ser de dois tipos, as irmandades ou as ordens terceiras, mas


ambas reuniam cristãos voltados para a prática das 14 obras de misericórdia, ou seja, ações
caritativas baseadas no evangelho com a finalidade de auxiliar quem tivesse necessidades. As
obras de misericórdia foram importantes como impulso e orientação no início da assistência
da história brasileira e são designadas como espirituais ou corporais. As obras de misericórdia
espirituais são: ensinar os ignorantes, dar bom conselho a quem pede, corrigir os que erram,
consolar os tristes, perdoar as injúrias, sofrer com paciência as fraquezas do nosso próximo e
rogar a Deus pelos vivos e defuntos. As obras de misericórdia corporais são: visitar os presos,
assistir aos enfermos, vestir os nus, dar de comer aos que têm fome, dar de beber aos que têm
sede, dar pousada aos peregrinos e pobres e enterrar os mortos (PRADO; SOUZA NETO;
CERONI, p. 18).
As Irmandades das Santas Casas de Misericórdia talvez tenham sido as primeiras
entidades assistenciais brasileiras. A mais antiga Irmandade da Santa Casa de Misericórdia
brasileira é a de Santos, fundada por Brás Cubas em 1543, tendo sua manutenção proveniente
de doações de sítios, casas, dinheiro e apólices da vida pública, loterias e ajuda de Lisboa
(PRADO; SOUZA NETO; CERONI, p. 21).
Nesse período, prevalecia a ideia de que a riqueza era fruto do esforço pessoal e da
benção divina, enquanto ser pobre significava ser culpado, carente da graça divina e
10

condenado à paciente resignação no sofrimento. Dentro desse contexto, a partir do versículo


“ao Senhor empresta o que se compadece do pobre, e ele lhe pagará o seu benefício”,
(BÍBLIA, p.659) a esmola era vista como um meio de se obter o perdão dos pecados. Os ricos
poderiam se salvar pela prodigalidade e generosidade, os pobres, por outro lado, se salvariam
pela humildade e paciência (PRADO; SOUZA NETO; CERONI, p. 21).
O pobre era visto como um sujeito desprovido de direitos e desejos, e essa ideologia é
refletida, por um longo período, na ausência de políticas sociais bem estabelecidas e
articuladas (PRADO; SOUZA NETO; CERONI, p. 23). A assistência, por isso, continuou
sendo feita através de esmolas até século XX, quando esse pensamento sofreu mudanças
significativas. Com a Revolução de 1930 iniciou-se um processo político que, sob a liderança
de Getúlio Vargas, gerou uma visão da pobreza como questão social, o Estado passou a se
apresentar como “o pai dos pobres”. Os trabalhos filantrópicos começaram a ser normatizados
pelo Estado numa tentativa de regulamentar a relação entre capital e estado, para isso foi
criado o Departamento de Assistência Social (SPOSATI apud PRADO; SOUZA NETO;
CERONI, p. 25).
A preocupação com a regulamentação continua na década de 1940, quando são criados
o Departamento Nacional da Criança (DNCr) e a Legião Brasileira de Assistência (LBA),
órgãos repassadores de recursos para as instituições filantrópicas particulares (PRADO;
SOUZA NETO; CERONI, p. 25).
Após a Segunda Guerra Mundial aconteceram profundas mudanças políticas, sociais e
econômicas em todo o mundo gerando o aumento da pobreza, da violência, de doenças, da
poluição ambiental e de conflitos religiosos, étnicos, sociais e políticos. Fez-se necessário,
então, a ação de novos agentes sociais (ALBUQUERQUE, 2006, p. 23). Segundo Prado,
nessa época, houve uma forte atuação de voluntárias no Brasil, muitas vezes ajudadas pelas
primeiras damas estaduais e municipais, a ponto de se dizer que “pobre é coisa das mulheres
que têm coração e não do governo que tem razão” (PRADO; SOUZA NETO; CERONI).
Durante as décadas de 1960 e 1970 o cenário do assistencialismo foi marcado pela
ditadura militar, presente em vários países da América Latina, que levou à diminuição do
diálogo da população civil com o Estado e as empresas. Além disso:

O crescimento das cidades e da população urbana na América Latina,


bem como a demanda de bens públicos básicos – como moradia, água, esgoto,
transporte e segurança -, cresceu geometricamente. É por esse motivo que as
associações geralmente mobilizam um grupo de pessoas em razão de problemas
eminentemente locais e de natureza urbana, vendo o Estado como uma instância
inacessível (ALBUQUERQUE, p. 30).
11

Recolhendo dados de 32 diretórios referidos a 24 países da América Latina e do


Caribe, Fernandes confirma esses dados concluindo que as ONGs tornaram-se
significativamente presentes no continente a partir da década de 1970, sendo que 68% das
ONGs contabilizadas em 1994 surgiram depois de 1975 (FERNANDES, 1994, p. 69).
O aumento das demandas locais e a falta de diálogo levaram as organizações a se
formarem e atuarem em redes, de forma desarticulada e descentralizada, sendo essenciais a
autonomia e a iniciativa local. Essa estratégia de atuação permanece na América Latina e em
outros países levando à formação de redes de relacionamento e fóruns de discussão.
A partir dos anos 1990 muitos dos movimentos, entidades e outros tipos de
organizações sociais que lutaram contra a ditadura militar começaram a se transformar em
ONGs. Esse processo é chamado por Gohn de “fenômeno ONGs”. Segundo a autora “a
diminuição dos movimentos sociais organizados foi proporcional ao crescimento e
surgimento de redes de ONGs” (2000, p.11). Ou seja, a energia despendida em causas sociais
foi direcionada para o desenvolvimento das organizações não governamentais.
As primeiras ONGs na América Latina surgiram como uma solução para a falta de
opções no sistema institucional existente, originando-se de “centros de pesquisa que se
formavam à margem de universidades submetidas a pressões do Estado autoritário, núcleos de
educação popular paralelos ao sistema escolar oficial, grupos de apoio a movimentos sociais
emergentes sem conexões com os organismos políticos legais”, entre outros. Não se
imaginava que essas iniciativas iriam permanecer, nem que se justificassem enquanto tais
(FERNANDES, p. 66).
Enquanto Albuquerque afirma que “as organizações sociais que hoje compõem o
terceiro setor não são uma criação dos séculos XX e XXI” (2006, p. 21) apontando para a
origem dos movimentos associativos dos séculos XVI e XVII, Gohn defende que as ONGs
atuais são produtos do século XX e de difícil comparação com os antigos grupos religiosos
caritativos, pois, naquela época, a Igreja e o Estado não eram separados por lei.
Segundo a Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais (ABONG), as
ONGs, nas últimas décadas do século XX,

[...] engajaram-se na luta pela multiplicação e pelo fortalecimento das entidades


representativas da sociedade civil, e o fizeram na perspectiva da redução das
desigualdades sociais, da construção de espaços públicos que permitissem a
participação cidadã na negociação de uma nova agenda de direitos que pautasse um
novo compromisso do que entendemos por interesse público.
Dos trabalhos locais, voltados para a construção de organizações de base
representativa de múltiplos interesses e demandas, especialmente dos segmentos
mais pobres e discriminados da nossa sociedade, muitas ONGs transitaram,
12

principalmente durante os anos 90, para um trabalho de articulação de redes e fóruns


e para agregar novos conteúdos e novos temas a uma agenda de direitos, ampliando
os objetivos, além da defesa dos individuais, passando a defender também a
ampliação dos direitos coletivos (1998, p. 7).

O IBGE e o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, em parceria com a ABONG,


realizam, periodicamente, um estudo sobre as organizações da sociedade civil organizada no
Brasil. O estudo é chamado de relatório das Fundações Privadas e Associações sem Fins
Lucrativos (FASFIL). A quarta e mais recente edição do relatório fornece um panorama geral
dessas organizações em 2010.
Tabela 1
Unidades locais das Fundações Privadas e Associações sem Fins Lucrativos, segundo as
faixas de ano de fundação.

Faixas de ano de Unidades locais


fundação
Total 290 692
Até 1970 9 558
1971 a 1980 27 270
1981 a 1990 45 132
1991 a 2000 90 079
2001 a 2005 58 388
2006 11 869
2007 11 551
2008 11 464
2009 13 726
2010 11 655
Fonte: Relatório FASFIL 2010/IBGE

De acordo com a Tabela 1, que contém dados do último relatório FASFIL, podemos
perceber que, no Brasil, muitas entidades são fundadas a partir de 1970, se comparada às
existentes até então. Isso reforça os dados de Fernandes e de Albuquerque mostrando que no
Brasil ocorre o mesmo movimento de surgimento de ONGs percebido em vários países da
América Latina.
Os dados também nos permitem perceber que mais da metade das entidades sem fins
lucrativos fundadas até 2000 foram fundadas a partir de 1991. Esses dados comprovam o
13

“fenômeno ONGs” de Gohn mostrando o grande crescimento desse setor na década de 1990.
A partir de então o espaço das ONGs parece ser consolidado, pois a quantidade de entidades
fundadas por anos se estabiliza. Entre 2001 e 2010 há uma média de 11800 entidades sem fins
lucrativos sendo fundadas por ano.
No que se refere às entidades classificadas como de cultura e arte, podemos perceber
na Tabela 2 que os números acompanham as proporções dos números da tabela anterior.

Tabela 2
Unidades locais das Fundações Privadas e Associações sem Fins Lucrativos de cultura e arte,
segundo as faixas de ano de fundação.

Faixas de ano de Unidades locais


fundação
Total 11 995
Até 1970 312
1971 a 1980 870
1981 a 1990 1 778
1991 a 2000 3 409
2001 a 2005 2 923
2006 545
2007 497
2008 552
2009 567
2010 542
Fonte: Relatório FASFIL 2010/ IBGE

Em 2007 foi publicado pela Secretaria Nacional da Justiça (SNJ) um Manual de


Entidades Sociais com o objetivo de facilitar o entendimento de conceitos, informações e
procedimentos internos, consolidar as normas que organizam as rotinas administrativas e
uniformizar a execução dos trabalhos e serviços das entidades reconhecidas pelo governo.
Também foi elaborado, em 2009, um Guia Prático para esclarecer dúvidas e facilitar o acesso
às informações sobre a qualificação, autorização e prestação de contas de entidades do
terceiro setor.
14

Apesar dos desafios as ONGs têm se firmado como importante ferramenta na


construção social. As últimas décadas foram essenciais para ganharem espaço de atuação e
afirmarem seu lugar na cena pública, mas ainda há um longo caminho a percorrer para a
formação de um terceiro setor coeso e bem definido.
15

2 O FUNCIONAMENTO DAS ENTIDADES SOCIAIS

2.1 Títulos concedidos às ONGs

O órgão responsável por qualificar, acompanhar as prestações de contas e cassar


títulos das entidades sociais no Brasil é a Secretaria Nacional da Justiça (SNJ), que é uma das
cinco secretarias do Ministério da Justiça. As entidades podem receber o título da SNJ de
Utilidade Pública Federal (UPF) ou de Organização da Sociedade Civil de Interesse Público
(OSCIP). Cada um desses dois títulos tem suas especificidades e exigências.
UPF: De acordo com o Manual das Entidades públicas da SNJ “entende-se como
‘utilidade pública’ os serviços oferecidos de forma indiscriminada a toda a sociedade”
(ROMÃO, 2007, p. 23). Para obter esse título a entidade precisa comprovar estar em
funcionamento contínuo e efetivo por, pelo menos, três anos, possuindo personalidade
jurídica e tendo sido constituída no Brasil. Dentre as titulações, a UPF apresenta-se como
mais trabalhosa porque a entidade deve prestar contas através de uma lista de documentação e
relatórios mais extensa que as demais titulações, e os dirigentes da entidade não podem ser
remunerados por ela. Por outro lado, esse título é comumente aceito para se conseguir isenção
de impostos estaduais e municipais sendo, também, pré-requisito para obtenção do título do
Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social. O título de UPF também
possibilita o recebimento de doações da União e de receitas das loterias federais, além de
permitir às entidades tituladas o fornecimento de um recibo que possibilita a dedução no
imposto de renda dos doadores (MANUAL..., 2005, p. 19).
OSCIP: Também segundo o Manual da SNJ “a evolução e o desenvolvimento do
chamado Terceiro Setor, enquanto parcela da sociedade civil organizada de modo a se suprir a
ausência do Estado na prestação de serviços que lhe são típicos, resultou, no direito brasileiro,
na criação da qualificação como OSCIP” (ROMÃO, 2007, p. 50). A criação dessa
qualificação aconteceu em 1999, pela Lei nº 9.790, conhecida como Lei das OSCIPs. A
obtenção dessa qualificação é mais rápida e menos burocrática que nos demais casos. O título
permite à entidade firmar um Termo de Parceria com o poder público. De acordo com o Art.
9º da Lei das OSCIPs o Termo de Parceria é um instrumento jurídico que cria vínculo de
cooperação entre as Organizações em questão e o poder público.
Nas OSCIPs não há restrição quando à remuneração de seus dirigentes, entretanto
algumas entidades como escolas, hospitais e associações de classes profissionais não podem
16

solicitar a titulação, exceto em casos em que os serviços de educação e saúde são totalmente
gratuitos. Quanto ao controle por parte da SNJ, o foco nesse caso é principalmente na
produção de resultados (MANUAL..., 2005, p. 18). É interessante notar que “a imensa
maioria das entidades qualificadas constitui-se de associações ou fundações recém-criadas, ou
melhor, que não poderiam candidatar-se ao título de utilidade pública federal”. Podemos
concluir, então, que a qualificação como OSCIP se tornou uma boa alternativa para entidades
criadas a pouco tempo e que, portanto, não poderiam se qualificar como Utilidade Pública
Federal, pois esse título exige que a entidade esteja ativa a pelo menos 3 anos (ROMÃO,
2007, p. 58).
As entidades não podem acumular os dois títulos, sendo assim, cada entidade deve
optar pelo que lhe for mais interessante considerando sua estrutura e seus objetivos
institucionais, ponderando sobre os prós e os contras de cada título (MANUAL..., 2005, p.
20).
Visando melhor cumprir com suas atribuições a SNJ criou, em outubro de 2007, o
Cadastro Nacional de Entidades de Utilidade Pública (CNEs).
O CNEs constitui-se em um conjunto de mecanismos eletrônicos que coletam,
processam, analisam e transmitem os dados das entidades facilitando os procedimentos
administrativos. O principal objetivo do sistema é agilizar a comunicação entre Estado,
entidades e sociedade, à medida que desburocratiza, padroniza e dá transparência a essa
comunicação.
O cadastro abarca não apenas as entidades qualificadas no Ministério da Justiça, mas
todas as ONGs que possuam interesse na captação de recursos públicos.
Há ainda um terceiro título concedido em âmbito nacional pelo Conselho Nacional de
Assistência Social, o Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social (CEAS).
O CEAS possibilita a isenção de pagamento da cota patronal de seguridade social e é
indispensável para o convênio com a União. O Título de UPF é pré-requisito para se obter
este título, sendo assim a entidade deve estar em funcionamento contínuo e efetivo por no
mínimo três anos e seus dirigentes não podem ser remunerados. Há bastante rigidez quanto
aos fundos públicos utilizados pelas entidades tituladas podendo a chegar à pena de devolução
do montante e aplicação de multa em caso de mau-uso da verba (MANUAL..., 2005, p. 20).
17

Tabela 3
Titulações concedidas às ONGs
Titulação Concessor Exigências Benefícios
Utilidade Pública Secretaria Funcionamento por Isenção de impostos
Federal (UPF) Nacional de Justiça pelo menos três anos. estaduais e municipais.
Personalidade jurídica Permissão para obtenção
e ter sido constituída do título de CEAS.
no Brasil. Dedução do imposto de
Dirigentes não renda dos doadores.
remunerados. Recebimento de doações
da União e de receitas
federais.
Organização da Secretaria Exclui-se escola, Termo de Parceria com o
Sociedade Civil de Nacional de Justiça hospital ou associação poder público.
Interesse Público de classes
(OSCIP) profissionais, exceto
em casos em que os
serviços de educação e
saúde sejam
totalmente gratuitos.
Certificado de Conselho Nacional Título de UPF Isenção de pagamento da
Entidade de Assistência cota patronal de
Beneficente de Social seguridade social.
Assistência Social Convênio com a União
(CEAS)
Tabela organizada pela autora

2.1 FUNCIONAMENTO INTERNO DAS ONGS

Pela ótica administrativa as ONGs atuam principalmente por projetos, conhecidos,


nesse contexto, como projetos sociais.
18

“No sentido etimológico, o termo projeto vem do latim projectu, particípio passado do
verbo projicere, que significa lançar para adiante. Plano, intento, desígnio. Empresa,
empreendimento. Redação provisória de lei. Plano geral de edificação” (FERREIRA apud
VEIGA, 2004, p. 14).
O significado do termo “projeto social”, entretanto, parece ainda não estar muito claro
na literatura. Silva constata que, sob a denominação de projeto social, existe uma enorme
variedade de ações destinadas aos mais variados setores da sociedade. Ainda assim o autor
cita Armani (2004) para quem projeto é, basicamente, “uma ação social planejada, estruturada
em objetivos, resultados e atividades baseadas em uma quantidade limitada de recursos
(humanos, materiais e financeiros) e de tempo”. Armani ainda ressalva que não existe
“projeto social” isolado de programas e/ou políticas sociais mais amplas (SILVA, 2010, p.
52).
Para Scronavacca, Becker e Caravantes o projeto é o que permite à instituição planejar
e avaliar a viabilidade das ações a serem realizadas. Os autores defendem que o projeto deve
ser utilizado, de maneira geral, para “transformar instituições de cunho caritativo em
instituições de cunho formativo e educativo”. Para que cumpra tal objetivo a instituição deve
evitar o paternalismo e ações de caráter apenas paliativo (SCORNAVACCA; BECKER;
CARAVANTES, 1998, p. 161-2).
Magali Kleber, em 2006, publicou, em sua tese de Doutorado, uma pesquisa que teve
como campo empírico duas ONGs: Associação Meninos do Morumbi, da cidade de São Paulo
e o Projeto Villa-Lobinhos, da cidade do Rio de Janeiro vinculado à ONG VivaRio. O
objetivo da pesquisa foi abordar as práticas musicais em ONGs.
Kleber encontrou nas ONGs que pesquisou justamente essa intenção de promover uma
educação musical com objetivo social, mas sem amparar-se em uma abordagem
assistencialista ou paternalista. A autora constatou que tal intenção se mostrou coerente tanto
no discurso quanto na prática das ONGs selecionadas (KLEBER, 2006, p. 303). Ela também
alerta sobre o perigo de corporações que, procurando negócios rentáveis, encontram nas
ONGs um álibi para suas ações. Essas corporações exageram no uso de clichês que
sensibilizam a sociedade buscando alcançar lucro “através da miséria alheia” (KLEBER, p.
305).
Também é preciso ter cuidado para que as ONGs não se tornem meios para que,
grupos de pressão e lobbies, se utilizem de verbas públicas direcionando-as para interesses de
minorias privilegiadas (MANUAL..., 2005, p. 14).
19

Discorrendo sobre a atuação das ONGs, Kater faz distinção entre duas naturezas de
projetos. De um lado, segundo ele, temos projetos que selecionam, entre os interessados
inscritos, aqueles considerados mais aptos para participar do processo proposto. Projetos
desse tipo, frequentemente, trabalham tendo em vista um resultado final que deverá ser
apresentado entre os envolvidos com o projeto ou para um público externo. A necessidade de
apresentar resultados se deve à busca de visibilidade, quase sempre reivindicada pelos
patrocinadores e/ou promotores do projeto.
Esse tipo de projeto costuma criar oportunidades profissionais para os participantes,
entretanto, nesses casos, não há muita preocupação em utilizar modelos didático-pedagógicos
que garantam o equilíbrio nas relações interpessoais entre os alunos, professores e instituição.
Por outro lado, Kater esclarece que há projetos que permitem a participação de toda a
comunidade sem haver seleção de competências. Por conta disso, eles acabam dedicando-se
aos considerados mais limitados e “menos capazes”. Esse público, entretanto, se mostra capaz
devido a um profundo desejo de sucesso, realização e reconhecimento social. Tamanho
estímulo é pedagogicamente valioso, pois induz a mobilização necessária para a superação de
obstáculos no desenvolvimento pessoal.
Em virtude da variedade de comportamentos e as particularidades de cada participante
do projeto é preciso definir prioridades a serem consideradas no trabalho pedagógico. Kater
destaca, entre essas prioridades, a importância de estabelecer vínculo afetivo, a flexibilidade
do processo didático-pedagógico, a adequação, organização e equilíbrio entre liberdade e
limites e a necessidade de valorização do indivíduo (KATER, 2004, p. 46-7).
A flexibilidade também é um dos principais elementos comentados por Kleber. Ela
conta que as propostas das ONGs que estudou foram construídas a partir da relação com os
grupos beneficiários dos projetos, e não de forma rígida partindo apenas da visão e opinião
dos organizadores. Segundo ela, as ONGs precisam saber gerenciar os processos de mudanças
de direções, às vezes imprevisíveis, que são resultados das ações e reações dos participantes.
O processo educativo, nesse ambiente, deve ser considerado como “um campo de permanente
elaboração e redefinição, de conflitos, negociações e transições provisórias” (KLEBER, p.
304-5).
Essa, entre outras características, vem configurando as ONGs como “espaços de
formação mediante a educação informal” (KLEBER, p. 301). Segundo Torres, educação
informal, ou não formal, é “toda atividade educacional organizada, sistemática, executada fora
do quadro do sistema formal para oferecer tipos selecionados de ensino a determinados
subgrupos da população”. Ou seja, toda atividade pedagógica organizada e sistemática que
20

oferece determinados tipos de ensino direcionados a grupos específicos da população, mas


que atua fora de uma instituição com níveis, graus, programas, currículos e diplomas
(TORRES apud SILVA, 2010, p. 57).
Como espaços de formação informais, as ONGs precisam estar atentas para não
caírem no risco de se tornar locais em que se aprende apenas de forma ocasional. A intenção
de transmitir conteúdos, não apenas científicos, mas também ligados à música, à estética e à
sensibilidade, é importante. As ONGs são ferramentas para garantir o acesso à ciência e,
portanto, não devem abrir mão de oferecer um conteúdo devidamente embasado e organizado.
É preciso lembrar que as noções de solidariedade social e compreensão crítica da realidade
fazem parte de uma sólida base científica (CORTELLA, 2003, p. 99).
Magali conta que nas ONGs que pesquisou pôde “experienciar um laboratório de
vivências coletivas que tinham como eixo comum a música como prática social. Dessa forma
o paradigma do coletivo se apresentou como um forte traço na constituição da identidade
sociomusical das duas ONGs. E no bojo desse processo, o pertencimento, o ‘estar incluído em
um grupo musical’ apresentou-se como um fator central nessa constituição” (KLEBER, p.
295).
É importante destacar também que muitas vezes a atuação das entidades fica limitada,
porque elas dependem de fatores externos ao projeto, tais como: a ação do voluntariado, para
questões de execução e da benevolência dos patrocinadores. Tal situação exige “jogo de
cintura” de quem gerencia o projeto, sendo necessário usar de paciência e saber incentivar e
aproveitar esse tipo de colaboração.
Há situações em que os colaboradores, com a intenção de ajudar, dão sugestões em
aspectos que não são sua especialidade. Os responsáveis pelos projetos devem saber lidar com
esses casos valorizando as opiniões, mas sem permitir que o amadorismo prevaleça. Também
há casos de voluntários que se dispõem a ajudar os projetos e prometem se comprometer,
entretanto não prevalecem e “somem”. Essas situações ocorrem porque a prestação de serviço
não remunerado para uma instituição beneficente, muitas vezes, ainda é vista como um favor,
e não como exercício de cidadania (SCORNAVACCA, BECKER e CARAVANTES, 1998,
p. 171-172).
Para a atuação das ONGs e o crescimento de sua influência a articulação em rede
também é importante. As redes de ONGs canalizam as informações de interesse permitindo
uma sinergia e reforço mútuo. A difusão do acesso à internet e uso do e-mail contribuiu para a
proliferação de redes locais, regionais e internacionais (FERNANDES, p. 129-30).
21

3 O ENSINO COLETIVO DE INSTRUMENTOS MUSICAIS

Frente aos objetivos e circunstâncias do ensino de música em projetos sociais no


Brasil, o Ensino Coletivo se apresenta como uma interessante alternativa. Segundo Tourinho
(2007, p. 1) o Ensino Coletivo “coloca de duas a cinquenta pessoas juntas, em uma mesma
sala, horário, todas com instrumentos nas mãos, tocando juntas, em naipes, grupos ou pares,
sem que esta aula seja um ensaio, um grupo de câmara ou uma orquestra ensaiando”.
Montandon (2005, p. 47) vai um pouco mais a fundo ao afirmar que para uma aula ser
considerada Ensino Coletivo ela deve envolver todos os alunos, mantendo-os ativos o tempo
todo, mesmo que com atividades diferentes. Assim a autora descarta alguns modelos de aula
em que apenas um aluno toca e os outros apenas assistem, pois considera esse tipo de prática
“uma tentativa de transposição da aula individual para a situação de grupo”.
As duas definições conferem ao Ensino Coletivo uma perspectiva focada na prática
instrumental, na atividade do aluno, talvez por isso em vários textos essa modalidade aparece
relacionada à Teoria Aplicada.
É importante ressaltar que nos textos estudados os autores consideram o Ensino
Coletivo e Ensino em Grupo como sendo a mesma prática, pois ainda não foram estabelecidas
diferenças claras entre as duas denominações. Ao que parece os termos geralmente são usados
de acordo com a tradição de cada instrumento. No ensino de piano, por exemplo, essa prática
geralmente é chamada de Piano em Grupo, enquanto, entre os sopros, o termo mais comum é
Ensino Coletivo. Entretanto os dois termos se referem a “metodologias de ensino que visam
trabalhar com turmas de instrumentos, aulas que não são individuais” (SODRÉ, 2014, p. 2).

3.1 O ENSINO COLETIVO E OS PROJETOS SOCIAIS

Tanto no Ensino Coletivo quanto nos Projetos Sociais encontramos a valorização do


“trabalhar em grupo”. Além dessa primeira coincidência, podemos encontrar outros aspectos
que caracterizam o Ensino Coletivo como uma alternativa interessante para os Projetos
Sociais.
O Prof. José Coelho de Almeida, considerado um dos pioneiros dessa modalidade no
Brasil, contou durante o I Encontro Nacional de Ensino Coletivo de Instrumento Musical, que
muitos dos seus esforços para configurar uma turma de Ensino Coletivo se deveram às suas
necessidades imediatas. Segundo ele, sua escolha pelo Ensino Coletivo aconteceu quando foi
convidado por um empresário de sua cidade a criar uma banda. Para tanto precisava de uma
22

alternativa que cortasse custos e produzissem resultados rápidos, um projeto que fosse atrativo
para o empresário. Apesar de bastante criticado por seus colegas músicos, optou pelo Ensino
Coletivo e alcançou bons resultados (ALMEIDA, 2004).
Justamente por essa principal associação à economia de tempo e dinheiro o Ensino
Coletivo geralmente é apresentado, nos textos brasileiros pesquisados, como uma alternativa
para o ensino de música em Projetos Sociais, como afirmamos no início deste capítulo.
Cruvinel observa que no Brasil o ensino de música ainda alcança apenas uma pequena
parcela da população. Sobre os projetos sociais também existe a crença de que não merecem
muita atenção devido ao pequeno alcance que a maioria deles tem.
Assim sendo,
o Ensino Coletivo é uma importante ferramenta para o processo de democratização
do ensino musical, contribuindo de forma bastante significativa neste processo. A
musicalização através do Ensino Coletivo pode dar acesso a um maior número de
pessoas à Educação Musical, aumentando a razão professor/aluno por esforço
hora/aula ministrada (CRUVINEL, 2003, p. 2).

O Ensino Coletivo ajuda também a eliminar horários vagos. Se um aluno falta em uma
aula individual, a aula não pode acontecer, e o aluno retoma, na próxima aula de onde havia
parado. No Ensino Coletivo, entretanto, mesmo com alguns alunos ausentes, a aula pode
acontecer. A dificuldade passa a ser então lidar com o progresso dos alunos faltosos. Segundo
Tourinho, um dos maiores fatores de desistência dos cursos é justamente a dificuldade de
alguns alunos em acompanhar a turma devido às faltas (TOURINHO, p. 4).
A economia e otimização de tempo, entretanto, são apenas duas entre várias vantagens
do Ensino Coletivo. Em 2010 Christopher Fisher publicou seu livro Teaching Piano in
Groups, um compêndio de informações sobre os diversos aspectos do Ensino de piano em
Grupo. Fisher disponibilizou no site do livro um apêndice com a opinião dos principais nomes
do Ensino Coletivo de Piano nos Estados Unidos. Apesar de os comentários serem relativos
ao ensino de Piano em Grupo, acreditamos que os mesmos são pertinentes para este estudo.
Ted Cooper, um dos entrevistados de Fisher, quando perguntado sobre o porquê de
defender essa modalidade de ensino respondeu que “grupos possuem uma poderosa
motivação embutida por causa da interação entre os pares”1 (2010, p. 2 tradução nossa). A
resposta de Fast complementa essa ideia, pois, segundo ela, essa modalidade fornece uma
motivação natural. Quando os estudantes compartilham seu conhecimento ocorre uma
dinâmica que deve ser fomentada (2010, p. 3).

1
Groups have a powerful, built-in motivation because of the peer interaction.
23

Essa dinâmica acontece na interação do grupo. No grupo o indivíduo tem a


oportunidade de observar, comparar e aprender com os outros alunos. Durante essa
observação o aluno percebe que algumas dificuldades não são exclusivamente suas, pois
outros colegas têm os mesmos problemas, e com isso ele pode encontrar uma solução
(GALINDO apud CRUVINEL, p. 51).
Uma competitividade saudável é também encontrada nas aulas em grupo, funcionando
como uma espécie de combustível. Essa competição, aliada às amizades formadas entre o
grupo, leva os alunos a serem mais assíduos e interessados na aula (DUCATTI, 2004).
Moraes, citado por Cruvinel, acredita que esse tipo de competição natural pode ser um
estímulo extra para um aprendizado mais rápido e de melhor qualidade (MORAES apud
CRUVINEL, p. 52).
Há ainda outra característica interessante do Ensino em Grupo, especialmente para os
alunos iniciantes: a fusão das sonoridades produzidas pelo grupo. No início o som dos
instrumentos pode ser bastante desagradável, se ouvidos individualmente, mas, em conjunto,
o som produzido torna-se mais tolerável, os erros são diluídos no coletivo. Ao escrever sobre
isso Oliveira destaca os instrumentos de cordas, pois esses, em especial, produzem bastante
ruído quando o aluno está iniciando os estudos (OLIVEIRA apud CRUVINEL, p. 51).
Produzir som em grupo também é eficiente no desenvolvimento do ouvido relativo.
Em uma aula individual o aluno tem apenas o professor como referência, ao tocar em grupo,
entretanto, o aluno ouve outros aprendizes podendo fazer comparações (ALMEIDA, p. 23).
Cooper acrescenta que esse ambiente oferece aos alunos oportunidades relativamente
sem stress de se apresentarem2 (2010, p. 2). Como resultado dessa exposição mais frequente
às opiniões alheias, os estudantes se mostram menos tímidos nos primeiros contatos com o
público. “A exposição constante ao julgamento mesmo que silencioso dos colegas diminui a
inibição das ‘audições’ e provas de fim de semestre” (TOURINHO apud TOURINHO, p. 4).
No ensino em grupo, o resultado musical concreto também acontece em menor tempo.
Com poucas notas o grupo já consegue realizar pequenos arranjos harmonizados a três ou
quatro vozes, algo bastante estimulante. Ducatti destaca a economia de tempo e esforço para o
aluno desenvolver os conhecimentos básicos (DUCATTI, p. 93). Essa experiência, além de
um incentivo aos alunos, auxilia no aperfeiçoamento da percepção musical do aluno. É
interessante notar que a maioria dos alunos de instrumentos oriundos de aulas particulares
participa de práticas em conjunto apenas depois de certo domínio do instrumento, que pode
levar anos (GALINDO apud CRUVINEL, p. 51).
2
They offer students frequent and relatively stress-free opportunities to perform.
24

A apresentação também é um aspecto importante desse processo. Hikiji, escrevendo


sobre o Projeto Guri, destaca que:

A perspectiva de uma apresentação em curto prazo é extremamente


estimulante para os alunos do projeto. A possibilidade de tocar para uma plateia –
composta de familiares, amigos, estranhos e, às vezes, com cobertura da mídia –
anima os aprendizes. Jovens que sabem tocar quatro ou cinco notas em um
instrumento podem ser vistos ensaiando durante horas, discutindo as músicas e a
técnica instrumental entre si, alterando o cotidiano da família para participar de
apresentações nos mais diversos horários (HIKIJI, 2006, p.155).

O Projeto Guri é um exemplo de Projeto Social que adota justamente o formato de


aulas em grupo. O Guri provavelmente é a maior Organização Social sem fins lucrativos de
educação musical do Estado de São Paulo. Atualmente conta com cerca de 370 polos
distribuídos pelo estado.
O Projeto adotou a metodologia de Ensino Coletivo para as áreas de cordas
(friccionadas e dedilhadas), sopros, percussão e canto coral, com o objetivo de desmistificar
que a música é somente para uma elite. Busca-se um aprendizado voltado para “cultura de
massa, tendo em seu bojo uma metodologia dinâmica, descomplicada, atraente”
(VALSECCHI, 2004, p. 49).
No Projeto Político-Pedagógico do Guri é apresentado mais um interessante princípio
do Ensino Coletivo, a busca por fomentar não apenas a colaboração entre o grupo, mas
também a cooperação. Segundo o documento:

Em educação, o conceito de Colaboração não é tão abrangente – os alunos


estão sentados juntos, mas não estão estudando juntos de fato; mesmo na alternância
da execução em um grupo instrumental, não há um incentivo permanente para ouvir
o próximo, para respeitar sua interpretação e assim tocar com menor intensidade, por
exemplo. Já a Cooperação supõe trabalho conjunto, a coordenação das realizações
dos alunos com discussão, troca de ideias, etc (AAPG, 2010, p. 8).

Essa interação entre os alunos também é interessante para que o professor tenha uma
visão mais completa de sua personalidade (FAST, p. 6).
É importante destacar que algumas vantagens apresentadas pelos autores, apesar de
interessantes aos Projetos Sociais, não são exclusivas do Ensino Coletivo e podem também
ser aplicadas no ensino tutorial.

3.2 METODOLOGIA DO ENSINO COLETIVO

Como já comentado, é preciso diferenciar aula em grupo de algumas tentativas de


transposição de aula individual para o grupo. Tentar ensinar cada um do grupo
25

individualmente também não funciona muito bem. Coats lembra que os que tentaram esse
tipo de prática perceberam que além de a aula não ser produtiva ela poderia chegar ao caos3
(2010, p. 1).
Sendo assim, existem algumas características e cuidados específicos da aula em grupo
que merecem certa atenção. Lembrando a declaração de Montandon, uma aula para ser
considerada coletiva deve envolver todos os alunos, mantendo-os ativos. Para que isso seja
possível, a aula precisa ser cuidadosamente planejada.
Segundo Coats, em aulas individuais, pode ser que o professor não planeje a aula
intencionalmente e ensine por imitação e exposições ao invés de envolver o estudante na
solução do problema. (2010, p. 3) Na aula coletiva, entretanto, o planejamento é
extremamente importante para que a aula corra bem (COOPER, 2010; DILLON, 2010; FAST,
2010; HILLEY, 2010).
É imprescindível, portanto, planejar a aula para o grupo, considerando as habilidades
individuais de cada um. Quanto a isso Oliveira defende que o ritmo deve ser ditado pelos
melhores alunos. Cruvinel, ao citá-lo, ressalva que o professor deve perceber os limites do
grupo e de cada aluno, individualmente, escolhendo, a partir disso, como conduzir a aula
(OLIVEIRA apud CRUVINEL, p. 49).
Uma forma de lidar com isso é distribuir diferentes partes a serem executadas pelos
alunos de acordo com suas habilidades e preferências (TOURINHO, p. 8). Outra solução
interessante é o atendimento individual, nos casos de alunos com mais dificuldade, ou ainda
escolhendo alunos mais adiantados para fazer esse atendimento, numa espécie de monitoria
(CRUVINEL, p. 49).
No caso de aulas em grupos de diferentes instrumentos, mas do mesmo naipe, como
acontece no Projeto Guri, por exemplo, o professor precisa lançar mão de algumas
ferramentas mais específicas. Galindo (apud CRUVINEL, p. 55), escrevendo sobre o Ensino
Coletivo de instrumentos de arco, e Almeida, sobre sopros, indicam o caminho do
reconhecimento dos elementos em comum entre os instrumentos em questão. A partir dos
elementos em comum é possível então planejar uma aula que envolva todos os alunos.
Tourinho, baseada em sua observação, lista alguns princípios de aprendizagem do
Ensino Coletivo. O primeiro é “acreditar que todos podem tocar um instrumento” (2007, p. 3).
Esse princípio está intimamente ligado às crenças de difusão de conhecimento dos projetos

3
They discover that trying to teach group members individually is not only nonproductive but quite chaotic.
26

sociais, o acesso ao aprendizado de música e de um instrumento não pode ser restrito a uma
pequena parcela da população se todos têm capacidade para tocar algum instrumento.
Ainda nesse sentido, Cruvinel apresenta as ideias de Moraes. Para ele, o professor
deve evitar comparações declaradas entre os alunos, pois estas comparações podem levar à
criação de “rótulos”, contribuindo negativamente para a autoestima do aluno (MORAES apud
CRUVINEL, p. 54). A autora complementa afirmando que pequenas diferenças musicais e
técnicas já são o suficiente para os alunos se compararem mutuamente, quando em grupo.
Entre os princípios apresentados por Tourinho encontramos ainda a crença de que
todos aprendem com todos. O professor não é, portanto, o único que ensina, os alunos
também aprendem uns com os outros. Além de sua relação com o professor o aluno também
tem como referências os comentários feitos por e para os outros alunos, enriquecendo sua
experiência de aprendizado (FAST, p. 3).
É importante ainda destacar que o Ensino Coletivo ajuda a desenvolver a
independência dos alunos. O professor, portanto, deve conter sua tendência de ajudar demais
o aluno. É necessário dar ferramentas para que o próprio aluno encontre soluções para suas
dificuldades (COOPER, p. 2).
Sobre isso Jaffé cunhou o termo Guided Study entendendo que o professor deve
estudar com os estudantes na aula, dando a assistência manual necessária (CRUVINEL e
TOURINHO, 2007, p. 174). Esse tipo de atitude é interessante no caso de projetos em que os
alunos não têm o próprio instrumento e que não têm condições de permitir que os alunos
levem os instrumentos para estudar em casa.
Para que a metodologia seja eficaz é preciso, portanto, buscar meios de conceder aos
alunos um processo educativo dinâmico, aproveitando as vantagens oferecidas pelo Ensino
Coletivo sem, entretanto, agredir a individualidade do aluno.

3.3 O EDUCADOR MUSICAL NO ENSINO COLETIVO

É consenso, entre os autores consultados, que o perfil do professor para o ensino em


grupo possui algumas especificidades não exigidas pelo ensino individual.
Alguns dos principais pré-requisitos apresentados incluem o planejamento prévio e a
organização, pois, como dito no capítulo anterior, a aula em grupo precisa ser planejada.
Tourinho (2007, p. 1) sugere um roteiro de apoio ou tópicos a serem seguidos durante a aula.
27

Dillon acrescenta, à habilidade de planejar, a flexibilidade. Essa ideia concorda com a


afirmação de Hilley: é necessária “a habilidade de planejar e depois não seguir o plano” 4. É
interessante notar que esse é um ponto também destacado por Kater e Kleber ao discorrer
sobre os processos didático-pedagógicos das ONGs, como já comentado no primeiro capítulo
desse trabalho.
Esses conceitos também se identificam com o timing5, apresentado por Alberto Jaffé
como uma das qualidades especiais exigida do professor em uma aula coletiva. É necessário,
portanto, saber lidar com a dinâmica da aula, gerenciando o tempo disponível e intervindo nos
momentos adequados. O professor deve ainda ter bastante concentração, pois precisa estar
atento a vários estudantes ao mesmo tempo (TOURINHO apud TOURINHO, p. 4).
Há várias referências, ainda, à linguagem utilizada pelo professor. O educador deve
ser bastante objetivo em suas explicações (FAST, 2010; OLIVEIRA, 2001). É interessante
também saber explicar a mesma coisa de diferentes maneiras (DILLON, 2010). Ainda nesse
sentido, Jaffé acredita que o professor, no modelo da aula coletiva, deve ter carisma e
habilidade verbal.
Cabe ainda ressaltar a democracia que deve prevalecer em uma aula em grupo. Assim
sendo, o professor jamais poderá ser autoritário ou se portar como o único que possui
conhecimento, pelo contrário. O professor assume o papel de “facilitador e/ou coordenador do
processo ensino/aprendizagem” além de um “líder democrático” (ORTIS; CRUVINEL;
LEÃO, 2004, p. 63).
Pelos diversos motivos aqui colocados, Cooper comenta que as aulas em grupo
requerem do professor um planejamento mais cuidadoso, mais claro e mais criativo levando a
um exame constante da sua concepção do que é ensinar. Segundo ele essas necessidades são
sentidas com mais urgência no Ensino Coletivo do que no ensino individual (COOPER, p. 4).
Interessante notar que em todas as respostas à pergunta de Fisher sobre “Quais as
qualidades que fariam um professor de piano em grupo mais efetivo?” 6, são encontradas
afirmações referentes ao bom humor do educador e à diversão dele e de seus alunos durante
as aulas.
Há ainda duas importantes questões apresentadas por Tourinho: “A maioria dos
professores de música atuantes em escolas especializadas, universidades e conservatórios é
oriunda do modelo tutorial de ensino, com uma formação que valorizava o contato professor-

4
The ability to plan and then not follow the plan
5
Escolha do tempo mais adequando para fazer alguma coisa. (MICHAELIS..., 2012)
6
What Qualities Make a Group Piano Teacher Most Effective?
28

estudante” (2007, p. 1). Nessa declaração percebemos a descrença no Ensino em Grupo,


devido à formação da maioria dos professores de música, e a falta de formação que prepare os
professores de música para atuarem no Ensino Coletivo.
Infelizmente o Ensino Coletivo ainda é visto com desconfiança já que a maioria dos
músicos e professores de música atuantes valoriza a atenção exclusiva ao aluno. Desse ponto
de vista as aulas coletivas são vistas como de pior qualidade. É preciso entender, entretanto,
que essa modalidade de ensino não é apenas uma alternativa para economia de tempo e
dinheiro, mas também um formato de aula rico em vantagens, como já defendido nesse
trabalho.
A outra questão, intimamente ligada à primeira, se refere ao fato de que muitos dos
professores de música brasileiros não passam por nenhum tipo de preparação para dar aula em
grupo, o que é bastante sério levando em conta todos os requisitos, já apresentados aqui, para
dar aulas nesse formato. Formados basicamente no modelo de aulas individuais, não têm
contato com os materiais já produzidos sobre o assunto ou mesmo acesso a cursos de
preparação específica para professores de instrumentos. Essa omissão na formação dos
professores acontece até mesmo nas universidades.
Apesar disso, a emergência de renovações na área de ensino de instrumento, a
exigência da adoção do Ensino Coletivo por parte de estâncias superiores, além de outras
questões já apresentadas anteriormente, levam os professores a se envolverem com o Ensino
Coletivo (MONTANDON, p. 44).
A tendência desses professores é, então, ensinar como aprenderam. É preciso lembrar
que “a totalidade do ensino de instrumento tem sido tradicionalmente individual”. Assim
sendo, “dar aulas de instrumento em grupo pode ser um grande desafio e um empreendimento
frustrante” para esses professores (MONTANDON, p. 45).
No caso dos projetos sociais ainda temos casos de professores oriundos dos próprios
projetos. Segundo Kleber “Há que considerar que os projetos sociais estão incorporando em
seus quadros de educadores sociais, pessoas que receberam uma formação no âmbito dos
próprios projetos” (2006, p. 301).
Além de todos os pontos apresentados nesse capítulo gostaria ainda de ressaltar o que
talvez seja um dos mais importantes aspectos em um educador musical, independente do
modelo adotado, o investimento nos relacionamentos que permeiam suas aulas. “O professor
29

deve estar completamente envolvido em cuidar dos relacionamentos tanto no modelo


individual quanto em grupo” 7 (COATS, p. 3 tradução nossa).

7
The teacher should completely invest in caring relationships in both individual and group settings.
30

CONCLUSÃO

Ao observar a história do Assistencialismo no Brasil, percebemos que esse tipo de


ação é vista de diferentes modos em cada período. A própria relação entre esse tipo de
atividade e o governo é bem característico de cada época, variando entre momentos de
responsabilização do Estado e outros de terceirização do cuidado.
As ONGs surgiram justamente em um momento em que a sociedade civil sentiu a
necessidade de se organizar para atender às demandas locais. O governo então reage criando
leis e departamentos que pudessem organizar e apoiar essas manifestações populares.
Quanto ao posicionamento do Estado, Oliveira e Haddad chamam a atenção para o
risco de que a participação das ONGs culmine no esvaziamento do papel do Estado na área
social. Ao assumir responsabilidades sociais que inicialmente estavam nos setores públicos,
como educação, saúde e cultura, poderíamos estar dando brechas para uma espécie de
liberalismo (2001, p. 80).
A partir da criação de leis, as Organizações não governamentais vão então se
organizando de acordo com suas características e objetivos específicos, que, como já dito, são
variados. As titulações aparecem também como uma forma de controle das ações e da
distribuição de recursos para as Organizações. Conforme vão se estabelecendo, as ONGs
passam a atuar através de Projetos Sociais utilizando-se de diversas ferramentas. A que mais
nos interessou nesse trabalho foi a educação musical.
Percebemos, ao pesquisar sobre o funcionamento dos Projetos Sociais, que, apesar de
algumas desvantagens encontradas na bibliografia consultada, o Ensino Coletivo de música
poderia ser um interessante modelo a ser aplicado nas circunstâncias apresentadas.
Considerando que este não é o único formato possível, buscou-se encontrar as convergências
entre o ensino de música em Projetos Sociais e o Ensino Coletivo de instrumentos musicais.
O Ensino em Grupo me foi apresentado, inicialmente, como uma solução paliativa
para equilibrar uma grande demanda de alunos e pouco tempo para dar aulas. Apesar de ter
sido aluna por vários anos de um Projeto Social com atividades desse tipo, fui bastante
resistente à ideia. Em meus pensamentos prevaleciam a crença sobre os prejuízos pedagógicos
que aquele formato de aula poderia acarretar, além do medo de que a minha pouca
experiência não fosse suficiente para lidar com esse tipo de aula. Acreditamos que essa seja a
opinião inicial de muitos que não conhecem outras experiências e o material já produzido
sobre esse assunto. O Ensino em grupo é visto como uma aula fraca para economizar tempo.
31

No caso das ONGs a economia de tempo, e como consequência a economia de


dinheiro, possivelmente é o principal atrativo do Ensino Coletivo, levando em consideração
que muitas delas ainda dependem de voluntariado e doações. Nesse mesmo raciocínio, a
otimização da relação quantidade de aluno por professor seria uma forte à aliada às ideias de
democratização do ensino de música das ONGs.
Entretanto, além dessas primeiras impressões, há ainda várias vantagens na adoção do
Ensino Coletivo. Outra que nos “salta aos olhos” é a maior rapidez na obtenção de um
resultado concreto e passível de apresentações para um público. Isso pode ser uma resposta à
cobrança de investidores e apoiadores por resultados visíveis das ONGs.
Levando ainda em consideração que as ONGs geralmente atuam em áreas pobres, com
baixo IDH, altos índices de criminalidade e dificuldades de acesso a cultura e educação, os
estímulos oferecidos pelo Ensino Coletivo são de extrema importância. Muitos desses alunos
não são incentivados pelo ambiente que vivem, pelo contrário, são desestimulados pelas
dificuldades enfrentadas no dia-a-dia. Assim sendo, qualquer estímulo extra é bem-vindo para
a permanência e desenvolvimento dos estudantes nesses Projetos.
Apesar da indisposição inicial, o Ensino Coletivo me pareceu extremamente
interessante, pois, além de suprir várias das minhas necessidades como educadora musical em
um projeto social, poderia enriquecer a experiência de meus alunos enquanto estudantes de
um instrumento musical.
Entretanto, as dificuldades enfrentadas por um educador que opta ou é induzido ao
Ensino Coletivo sem ser devidamente preparado são imensas. É preciso um maior
investimento na formação de professores de instrumentos no Brasil, tanto na modalidade
tutorial quanto coletiva. Temos a demanda, está na hora de preparar os profissionais que já
estão começando a ocupar essas posições.
Enquanto pouco se faz a esse respeito, as práticas de ensino de música nas entidades
sociais permanecem como descritas por Kleber:

Como não existe, em termos educação musical em ONGs, uma tradição


como há nas universidades, conservatórios e escolas de música, o processo está
sendo construído no cotidiano mediante as ações práticas. Isso, ao mesmo tempo em
que pode ser visto como uma fragilidade mostra-se, também, como uma capacidade
de se lidar com contextos instáveis, imprevisíveis, com o “fazer de repente”
(KLEBER, p. 300).
32

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