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objetivo geral a realização de uma análise situada dos saberes, valores, competências e
formas de gestão do tempo da atividade de trabalho docente, nos anos iniciais do Ensino
Fundamental de uma escola privada. Segundo Soares (2007), colocar a atividade em
lugar de centralidade na pesquisa é considerar toda a complexidade que envolve o
trabalho.
Entretanto, as situações de trabalho são repletas de variabilidades que não podem ser
encerradas nos procedimentos prescritos. De acordo com Rabardel et all (2002), é
impossível prescrever o trabalho em todos os seus detalhes, o trabalho real é sempre
algo mais amplo do que o trabalho prescrito, é um conceito que nos reenvia ao trabalho
tal como ele se realiza em seu tempo e espaço. O trabalho real toma dimensões maiores,
é algo mais amplo, que toma a tarefa como ponto de partida e a contém, mas que não se
limita a ela.
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Há uma distância entre o trabalho prescrito e o trabalho real que é sempre, em certa
medida, singular – as variabilidades estão presentes de modo único em cada situação.
Ao mesmo tempo ela é também universal, está presente na realização de toda atividade
de trabalho humano. As condições reais de trabalho são sempre diferentes daquelas
condições determinadas, os resultados efetivos são sempre, ao menos parcialmente,
diferentes dos resultados antecipados. A gestão dessas variabilidades pelo trabalhador é
atravessada por elementos de uma dimensão pessoal do trabalho: saberes, valores,
experiências.
meio dos sentidos, principalmente da visão e da audição. E sabemos que a atividade não
está reduzida ao que é manifesto, mas envolve também dimensões como os saberes e
valores, dimensões que não são facilmente apreensíveis. Dessa maneira, os dados das
observações realizadas servirão como ponto de partida para momentos de verbalizações
com os professores pesquisados.
3. Métodos de autoconfrontação
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A partir dos anos de 1960, com o aparecimento de estudos que apontavam a co-relação
entre a linguagem e a possibilidade de estimular o comportamento humano, começam a
surgir estudos que se referiam diretamente à possibilidade de confrontar o trabalhador
ao seu discurso. Vieira (2004) reconstrói brevemente a trajetória desenvolvida por esses
estudos, mas aqui nos interessa referirmo-nos especificamente aos exercícios de
instruções do sósia, desenvolvidos na Itália, nos anos 70, onde
Apoiados nas instruções do sósia de Oddone, o psicólogo Yves Clot propõe o método
do sósia e o lingüista Daniel Faïta, a autoconfrontação cruzada. Métodos de
autoconfrontação que buscam tornar o processo de confrontação uma ferramenta útil na
compreensão das situações de trabalho em sua complexidade, possibilitando nos
aproximarmos do que seja a situação concreta de trabalho,
O método do sósia proposto por Clot é uma variação das instruções do sósia de
Oddone. “No método do sósia, a compreensão da dimensão narrativa e seus recursos
reflexivos é imprescindível para a realização do trabalho de análise” (Vieira, 2004,
p.221). As instruções dadas pelos participantes da atividade ao analista da situação de
trabalho em resposta à pergunta “Suponha que amanhã eu o substitua...” são gravadas e
transcritas. Posteriormente os participantes terão um segundo encontro com o analista,
onde serão confrontados com suas instruções e poderão comentá-las, inclusive, por
escrito. O diálogo é voltado para a transmissão de instruções, instaurando uma situação
dialógica particular que faz com que os interlocutores focalizem a descrição da ação, e
não os seus motivos. No exercício do sósia, o sujeito tem a oportunidade de um contato
social consigo mesmo, ele se torna um estranho a si próprio quando se vê diante da
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necessidade de instruir um sósia seu. Essa situação em que o sujeito dialoga consigo
mesmo por meio do diálogo com o outro, o leva a ‘estranhar’ sua própria experiência,
redescobrindo-a para então reorganizá-la sob um outro ponto de vista (CLOT, 1998,
p.181).
A esse primeiro nível sucede uma fase ao longo da qual essa mesma atividade filmada é
exposta ao olhar de um par, membro do coletivo que solicitou a demanda e está inserido no
processo. Trocas vão acontecer, evoluindo de modo alternado sobre os registros do
questionamento, da crítica, do começo de conflito, da pesquisa de um consenso, etc. Os
pressupostos que no começo detinham os participantes não resistem ao processo dialógico.”
(Faïta, 2005, p.121).
De acordo com Vieira (2004) e Faïta e Vieira (2003) o método se estrutura em cinco
fases:
I – O filme
II – Autoconfrontação simples
Produção de um objeto que é resultado das fases anteriores e busca responder à questão
inicial (a questão que motiva o estudo dessa situação de trabalho). O objeto ganha uma
certa autonomia em relação às fases anteriores (aquelas de sua produção) e pode ser
utilizado para diferentes fins: suporte para mudanças no meio de trabalho, formação,
etc.
* * *
Faïta e Vieira (2003, p.130), citando Bakhtin (1984:316), afirmam que “a atividade
humana é um texto em potencial e não pode ser compreendida (na qualidade de
atividade humana, diferente da ação física) fora do contexto dialógico de seu tempo”. A
centralidade do diálogo nos processos de autoconfrontação encontra sua origem na
influência de Bakhtin.
uma verbalização que “é em si mesma uma legítima atividade do sujeito, e não apenas
um meio de acesso a outra atividade” (CLOT, 2006, 135). É uma atividade que nos
permite ter acesso a uma outra atividade, uma atividade sobre a atividade. Enquanto
busca evitar uma compreensão incompleta de sua atividade por seus interlocutores, o
sujeito olha para essa atividade com um outro olhar, sob uma outra perspectiva,
redescobrindo-a.
REFERÊNCIAS
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Projeto de dissertação apresentado ao Programa de Pós-Graduação: Conhecimento e Inclusão Social, da
Faculdade de Educação da UFMG. A pesquisa encontra-se, atualmente, na etapa de coleta de dados junto
ao campo.