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As transformações da memória: articulações

entre Sigmund Freud e Eric Kandel


(As transformações da memória)
Transformations of Memory: Articulations between
Sigmund Freud and Eric Kandel (Transformations of memory)
Las transformaciones de la memoria: articulaciones entre Sigmund Freud
y Eric Kandel (Las transformaciones de la memoria)

Graziele Luiza Barizon Scopel Gerbasi, Paulo José da Costa*


Universidade Estadual de Maringá

Doi: dx.doi.org/10.12804/apl33.01.2015.06

Resumo Palavras-chave:Memória, psicanálise, neurociências

O tema desta pesquisa é a memória e suastransfor- Abstract


mações, a partir da interlocução entre a psicanálise e as
neurociências, representadas pelas obras de S. Freud e The topic of this investigation is the memory and its
de E. Kandel, respectivamente. Seu objetivo é investigar transformations, exemplified by the dialogue between
quaissão as convergências entre as teorizações desses psychoanalysis and the neurosciences, represented by
dois autores acerca das transformações da memória e, the works of S. Freud and E. Kandel, respectively. The
a partir disso, delinear possíveis articulações, acerca de goal is to investigate the points of convergence between
alguns processos psíquicos e neurológicos que atuam the theorizations of these two authors about changes in
em tais transformações. Para isso, são abordadas as memory and, from that, to outlines the possible connec-
noções de Freud sobre as retranscrições mnêmicas, as tions, regarding some psychological and neurological
lembranças encobridoras e o Nachträglichkeit (après- processes that act in such transformations. For that,
coup) e também os mecanismos de consolidação e Freud’s notions about mnemic retranscriptions, concea-
reconsolidação da memória de longo prazo descritos ling memories and Nachträglichkeit (après-coup) and
por Kandel. A principal convergência é o fato de que a also the consolidation and reconsolidation mechanisms
memória é suscetível a (re) construções retroativamente. of long-term memory described by Kandel are addres-

* Graziele Luiza Barizon Scopel Gerbasi, Departamento de Psicologia, Universidade Estadual de Maringá; Paulo José da Costa,
Departamento de Psicologia.
A correspondência relacionada com este artigo deve ser direcionada a Paulo José da Costa Paulo, Rua Campos Sales, 255 - ap.
102 - Zona 7 - CEP 87.020-080 Maringá-PR, Brasil. Correio eletrônico: pjcosta@uem.br

Para citar este artigo: Gerbasi, G. L. B. S., Costa, P. J. (2015). As transformações da memória: articulações entre Sigmund Freud
e Eric Kandel (As transformações da Memória). Avances en Psicología Latinoamericana, 33(1), 77-89. doi: dx.doi.org/10.12804/
apl33.01.2015.06

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sed. The main convergence identified in the publications consolidação da memória de longo prazo, que lhe
of these authors is the fact that the memory is susceptible garantem maleabilidade.
to (re) constructions retroactively. Entretanto, a psicanálise e as neurociências
Keywords: Memory, psychoanalysis, neurosciences têm bases epistemológicas diferentes. Enquanto
a primeira produz conhecimento e evolui princi-
Resumen palmente por meio da clínica psicanalítica, tendo
sua validade reconhecida entre os pares, as neuro-
El tema de esta investigación es la memoria y sus trans- ciências seguem os paradigmas vigentes no campo
formaciones, a partir del diálogo entre psicoanálisis y das ciências naturais, como objetividade, reprodu-
neurociencias representadas por las obras de S. Freud tibilidade, refutabilidade, entre outros, utilizando
y E. Kandel, respectivamente. El objetivo es investigar métodos experimentais para a comprovação de
cuáles son las convergencias entre las teorizaciones de suas hipóteses. Embora exista essa divergência
estos autores sobre las transformaciones de la memoria fundamental entre esses campos, evidenciada tam-
y, a partir de esto, esbozar posibles articulaciones sobre bém nas obras de S. Freud e E. Kandel, ela não
algunos procesos psicológicos y neurológicos que actúan representa um obstáculo à interlocução proposta
en tales transformaciones. Para ello, se abordan las no- entre eles, porque o que se busca é uma cooperação
ciones de Freud sobre las re-transcripciones mnémicas, interdisciplinar referente a um assunto de interesse
los recuerdos encubridores y el Nachträglichkeit (après- comum, numa perspectiva de complementaridade.
coup) y también los mecanismos de consolidación y Portanto, não se trata de buscar confirmações ou
reconsolidación de la memoria a largo plazo descritos refutações das suas construções teóricas, utilizan-
por Kandel. La principal convergencia es el hecho de do-se como critério de validade um pressuposto
que la memoria es susceptible a (re)construcciones de um campo como referencial para o outro. A
retroactivamente. proposta desta pesquisa é tentar construir pontes
Palabras clave: Memoria, psicoanálisis, neurociencias que permitam trocas de saberes entre essas áreas, a
fim de contribuir para a compreensão da memória.
A memória é um tema relevante, uma vez que
Esta pesquisa teórica se situa no campo inter- é por meio de nossa história que nos constituímos
disciplinar entre a psicanálise e as neurociências, como sujeitos, além de se mostrar adequado ao
tendo como proposta identificar possíveis conver- diálogo entre a psicanálise e as neurociências. As
gências entre as obras de Sigmund Freud e de Eric recordações representam a essência do material
Kandel, a fim de elaborar articulações teóricas a do trabalho analítico e os estudos neurocientífi-
respeito das transformações retroativas da memó- cos relacionados à memória já obtiveram muitos
ria. Tais transformações ocorrem à medida que o avanços, notadamente após o desenvolvimento
sujeito tem novas experiências. Portanto, parte-se das técnicas de neuroimagem e do conhecimento
do pressuposto de que as lembranças não corres- do genoma humano. A seleção das obras de Freud
pondem de modo fidedigno aos acontecimentos, e Kandel justifica-se por seu reconhecimento no
porque estão sujeitas a mudanças ao longo do âmbito acadêmico mundial. Além disso, ambos ex-
tempo. Essa ideia está presente tanto na meta-psi- pressam opiniões favoráveis a esse diálogo. Freud
cologia freudiana, como nas noções de atos fa- (1950/1986a) considerou que a psicanálise poderia
lhos, de retranscrições mnêmicas, de lembranças se beneficiar com avanços da neurologia em prol de
encobridoras, de Nachträglichkeit, quanto nas seu próprio desenvolvimento e aprimoramento, e
neurociências, devido às evidências de processos Kandel (1999) argumenta em favor da cooperação
neurobiológicos envolvidos na consolidação e re- da psicanálise com as neurociências, oferecendo

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subsídios teóricos para as pesquisas neste campo Existem publicações em que os autores se mostram
e desempenhando, desse modo, um papel ativo favoráveis ao diálogo entre psicanálise e neuro-
na construção de um modelo de investigação da ciências, incluindo aqueles que utilizam elemen-
mente. Assim, sugere que as duas áreas teriam seus tos de ambos os campos de forma complementar,
próprios ganhos, sendo que os da psicanálise seriam enquanto outros são contrários a tal cooperação,
a sua validação e o seu reconhecimento no meio por considerarem isso inviável ou desnecessário.
científico por sua submissão aos seus métodos. Vários deles se dedicaram mais especificamente à
O principal objetivo deste trabalho é investigar memória, demonstrando a viabilidade da interlo-
a existência de convergências presentes na obra cução proposta neste estudo.
de S. Freud e de E. Kandel acerca da ideia de que
ocorrem transformações da memória retroativa- As transformações da memória
mente. Seus objetivos específicos são: delinear a sob a perspectiva das neurociências
noção de que ocorrem transformações dos registros
mnêmicos na obra de Freud incluindo as noções Atualmente, no campo das neurociências são
de retranscrição, de lembranças encobridoras e de encontradas algumas classificações da memória.
Nachträglichkeit; esboçar a noção de memória e de Uma delas se refere à sua duração, que pode ser de
suas transformações, segundo Kandel, principal- curto e de longo prazo. As memórias de curto prazo
mente em função do processo de reconsolidação; têm duração de uma a seis horas. Um exemplo é a
analisar as proposições acima e identificar elemen- memória de trabalho, que permite que o indivíduo
tos que possam contribuir para o estabelecimento mantenha uma conversa, dê seguimento a uma
de possíveis articulações entre essas teorias. ação, enfim, que possa administrar sua realidade
No decorrer deste artigo, são apresentados, imediata. Neurobiologicamente, a memória de cur-
primeiramente, um histórico das neurociências ta duração exige apenas a modificação de proteínas
e dos estudos sobre a memória, bem como suas pré-existentes e da força das conexões sinápticas.
classificações e seus processos neurobiológicos. Na Já a memória de longo prazo pode durar dias, me-
sequência, são delineadas algumas noções de Freud ses ou anos. Seu processo de consolidação dura de
sobre as transformações mnêmicas. Então, é feita três a oito horas e requer a síntese de proteínas e a
uma explanação sobre trabalhos atuais desenvolvi- formação de novas conexões neuronais. Esse é um
dos na interface psicanálise/neurociências para, a período em que a memória ainda é lábil e sujeita a
partir daí, proceder-se à exposição das convergên- interferências de outros estímulos (Izquierdo, 2011;
cias identificadas e à elaboração das articulações Kandel, 2001; Kandel, 2012; Mayford, Siegelbaum
possíveis entre eles. Por fim, são considerados os & Kandel, 2012).
desdobramentos dessa interlocução relacionados Outra classificação divide as memórias em im-
à memória entendida como uma construção, suas plícitas ou não declarativas e explícitas ou de-
implicações para a técnica psicanalítica e à tempo- clarativas. As memórias não declarativas são in-
ralidade, segundo essa perspectiva interdisciplinar. conscientes, num sentido descritivo, e envolvem
Sendo esta uma pesquisa teórica, foi realizado a aquisição de habilidades motoras e cognitivas
um amplo levantamento de publicações relacio- resultantes da experiência, que se expressam por
nadas ao tema no Brasil e no exterior, tanto de mudanças no comportamento. Porém, não são re-
materiais impressos quanto daqueles disponíveis cordadas conscientemente e relatadas pelo indiví-
em bases de dados online, dos quais foi realizada duo, embora seja possível construir conhecimento
a leitura e análise. Inúmeros estudos foram en- explícito acerca delas (Gazzaniga, Ivry & Mangun,
contrados sobre assuntos afins aos desta pesquisa. 2006; Lent, 2001; Kandel, Kupfermann & Iversen,

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2003; Squire & Kandel, 2003). O hipocampo des- da memória” (Squire & Kandel, 2003, p. 89). Na
empenha um papel importante na consolidação da obra em que Kandel foi convidado a escrever em
memória explícita, pois células ali presentes são função de ter ganhado o Prêmio Nobel, ele também
suscetíveis à potenciação de longa duração (LTP – aborda esse assunto:
sigla em inglês para long-term potentiation), que
é um tipo de facilitação sináptica que aumenta evocar uma lembrança episodicamente ―não
sua efetividade (Gazzaniga et al., 2006; Kandel, importa o quanto ela seja importante― não é como
2003; Kandel, 2009b; Squire & Kandel, 2003). O olhar uma fotografia num álbum. A recordação é
processo de consolidação está sujeito a influências, um processo criativo. Acredita-se que aquilo que
por exemplo, da atenção, do estado emocional, dos a mente armazena é apenas uma porção nuclear da
níveis de estresse e ansiedade, entre outros. Esses memória. Ao ser recordada, essa porção nuclear é
fatores exercem um efeito modulatório na aquisição então elaborada e reconstruída, com subtrações,
da memória (Izquierdo, 2011; Lent, 2001). adições, elaborações e distorções (Kandel, 2009a).
As transformações, às quais a memória decla-
rativa está sujeita, se tornam evidentes na sua evo-
Ideia semelhante é encontrada em publicações
cação, momento em que ocorre sua reconsolidação.
de outros neurocientistas. Izquierdo (2011) afirma
Durante esse processo, a memória entra em um
que o cérebro é capaz de armazenar, modificar e re-
estado de maleabilidade que permite sua edição,
verter a realidade ao mundo real de forma coerente
sendo possível a adição, subtração ou distorção de
e, acerca da evocação, escreve que “ao converter a
alguns de seus elementos. Isto oferece as bases para
realidade num complexo código de sinais elétricos
que suas transformações sejam consideradas tanto
e bioquímicos, os neurônios traduzem... Em cada
em seus aspectos cognitivos quanto neurobioló-
tradução ocorrem perdas e mudanças... Porque,
gicos. Kandel (2009a) apresenta a ideia de que na
afinal, traduzir quer dizer transformar” (p. 22).
recordação ocorre a reconstrução da memória que,
Por sua vez, Damásio (2011) também aborda tais
portanto, é um processo criativo e não mera repro-
alterações da memória, destacando que:
dução de algo imutável. Squire e Kandel (2003)
referem que é possível que uma lembrança seja
diferente daquilo que foi armazenado a princípio Conforme as experiências vividas são recons-
e que a recordação representa truídas e reencenadas, seja na reflexão consciente,
seja no processamento inconsciente, sua substância
um processo reconstrutivo, não uma espécie é reavaliada e inevitavelmente rearranjada, modifi-
de ‘registro em vídeo’ literal do passado. No final, cada em menor ou maior grau no que respeita à sua
uma experiência de evocação pode ser tida como composição factual e acompanhamento emocional.
precisa e subjetivamente convincente quando é Alguns quadros da recordação são extirpados na
apenas uma aproximação do passado e não de uma sala de cortes da mente, outros são restaurados e
reprodução exata (p. 86). realçados, e outros ainda são tão habilmente com-
binados por nossas necessidades ou pelo acaso que
Esses autores dizem ainda que “o cenário mais criam novas cenas nunca realmente ocorridas. É
provável é que novos episódios de armazenamen- assim que, com o passar dos anos, nossa história é
to de informação esculpam de novo, e, continua- sutilmente reescrita (Damásio, 2011).
mente, representações previamente existentes. O
apagamento do velho pelo novo e, provavelmente, Esse fenômeno é possível graças ao processo
a própria passagem do tempo mudam o conteúdo de reconsolidação, como explica Kandel (2009b):

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a descoberta de que a memória precisa ser man- de pesquisa que, a seu ver, não deve se restringir
tida ativamente levanta questões relacionadas à à relação entre analista e analisando que se dá no
evocação e à modificação da memória através da setting analítico. Ele acredita que teorias e práticas
reconsolidação, na qual a recordação de uma expe- psicanalíticas devem ser submetidas aos métodos
riência aprendida transforma a memória num estado empíricos das ciências naturais, a fim de ter sua va-
lábil, apenas para se tornar estável novamente com lidade reconhecida e ter seu campo de investigação
o tempo (p. 12752, tradução nossa, destaque nosso). ampliado e aprimorado, incorporando dispositivos
que garantam rigor acadêmico e atendam às exi-
Kandel participou de vários estudos relaciona- gências institucionais de pesquisa.
dos à reconsolidação, dentre eles um no qual inves- Esta visão não é compartilhada pela maioria
tigou esse mecanismo em nível celular. Utilizou a dos representantes do campo psicanalítico, sal-
lesma marinha Aplysia (Lee et al., 2012), e buscou vo poucas exceções e aqueles que são da área de
esclarecer se as mesmas sinapses envolvidas na neuropsicanálise. Esta postura faz com que ele se
codificação da memória são desestabilizadas e torne alvo de críticas, principalmente por ser con-
reestabilizadas ou se esse processo envolve novas siderado reducionista, como também por conceber
sinapses. Ele e seus colegas concluíram que as que todas as funções psíquicas são resultado do
mesmas sinapses que armazenam a memória de funcionamento cerebral. Contudo, isso não impe-
longa duração são reconstruídas após a evocação. de uma interlocução, de modo que conhecimentos
A plasticidade neuronal evidenciada pelas pes- provenientes dessas diferentes disciplinas sejam
quisas de Kandel sobre a memória constituem, usados de maneira complementar em busca de uma
segundo ele, as bases neurobiológicas da indivi- maior compreensão da mente/cérebro em toda sua
dualidade. Tendo em vista que à medida que o in- complexidade.
divíduo tem novas experiências e há formação de
novas conexões sinápticas, cada encéfalo se torna As transformações da memória sob
único. Kandel (2009a) escreve que a a perspectiva da psicanálise freudiana

plasticidade do sistema nervoso... é o meca- A memória é um assunto abrangente na obra


nismo subjacente à aprendizagem e à memória de de Freud por permear toda a metapsicologia que
longo prazo. Consequentemente, uma vez que cada desenvolveu. Quando ele fala sobre o aparelho psí-
ser humano cresce num ambiente diferente e tem quico e suas instâncias, os atos falhos, as psicopato-
experiências diferentes, a arquitetura do cérebro de logias, entre tantos outros conceitos, traz implícita
cada pessoa é única. alguma noção sobre a memória. Contudo, o tema
desta pesquisa está circunscrito às transformações
Kandel faz um convite à psicanálise para o diá- que a memória sofre retroativamente, ou seja, ela
logo e a cooperação. Ele argumenta que estudos é entendida como resultado de um processo de
realizados de forma complementar entre a psica- (re) construção. Por isso, vamos abordar apenas
nálise e as neurociências podem ser produtivos e algumas ideias de Freud que contribuem para o
beneficiar ambos os campos (Kandel, 1998; 1999). entendimento desse aspecto das recordações.
Este neurocientista reconhece o valor da clínica Desde a obra Projeto para uma psicologia cien-
psicanalítica como método de tratamento e sugere tífica, escrita em 1895 e publicada décadas de-
que a psicanálise traga contribuições aos estudos pois, Freud (1950/1986a) já esboça um aparelho
que visam ao entendimento do funcionamento fundamentalmente de memória e de linguagem.
psíquico. Entretanto, questiona sua metodologia Este aparelho é composto de sistemas neuronais

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cujas funções são a percepção (φ), a memória (ψ) Outra noção freudiana que ajuda a elucidar as
e a consciência (ω). O sistema perceptivo não alterações da memória é a de lembranças enco-
oferece resistência aos estímulos por não contar bridoras. Ele explica o que são tais lembranças
com barreiras de contato e, por isso, não armazena principalmente num texto de mesmo nome (Freud,
informações. Por outro lado, o sistema de memó- 1899/1986j) e em A psicopatologia da vida coti-
ria oferece resistência e, assim, origina registros diana (Freud, 1901/1986l). O autor se dedica à
mnêmicos. Por sua vez, a consciência requer um tentativa de elucidar as nítidas lembranças infantis
elemento qualitativo, sendo que as representações de eventos aparentemente insignificantes. Ele per-
são os elementos que viabilizam o acesso a ela. cebe que se trata de experiências significativas que,
A primeira tópica composta pelos sistemas cons- justamente por representarem conflitos e gerarem
ciente, pré-consciente e inconsciente é mais bem desprazer, são encobertas por recordações mais
delineada somente no capítulo VII de Interpretação amenas por via associativa. A princípio, ele destaca
dos sonhos (Freud, 1900/1986k). É nesse texto que que cenas infantis encobrem eventos posteriores
Freud apresenta o inconsciente como uma instância de conteúdo conflitivo (Freud, 1899/1986j). Pos-
psíquica que transcende o sentido descritivo e que teriormente, ele considera que cenas infantis são
armazena os traços mnêmicos, que somente che- encobertas por lembranças de fases mais tardias
gam à consciência após sofrerem certa modulação da vida do sujeito (Freud, 1901/1986l), deixando
de sua excitação no pré-consciente. A capacidade em aberto a possibilidade de esse fenômeno ocor­
do inconsciente de registrar de forma duradoura os rer em ambos os sentidos temporais. Portanto,
traços mnêmicos é ilustrada por Freud (1925/2011) aquilo que é recordado é maleável e suscetível a
em Nota sobre o bloco mágico. reedições em função de experiências subsequentes.
A Carta 52 é de especial interesse, porque nela Esta concepção das lembranças infantis poderia
Freud (1896/1986c) postula que ocorrem vários ser estendida às de etapas posteriores, incluindo
processos de transcrição no aparelho psíquico: as da vida adulta e velhice, uma vez que é sempre
“de tempos em tempos o material preexistente possível a mobilização de conflitos em função da
em traços mnêmicos experimenta um reordena- persistência do infantil na vida anímica e da atem-
mento segundo novos nexos, uma retranscrição” poralidade do inconsciente.
(p. 274, tradução nossa). O primeiro reordena as No que diz respeito à reconstrução retroativa
percepções, passando pelo inconsciente e pelo da memória destaca-se a ideia de Nachträglichkeit
pré-consciente até o consciente, por meio de seu (après-coup ou a posteriori), a qual se encontra
representante psíquico. Outro processo de trans- várias vezes ao longo da teoria freudiana, algumas
crição acontece ao longo das sucessivas etapas da delas nessa forma substantivada ou como adjetivo
vida do sujeito, em que as suas experiências são ou advérbio (nachträglich). O termo après-coup
traduzidas segundo as leis de funcionamento de foi proposto inicialmente por Jacques Lacan e,
cada período do desenvolvimento. Assim, Freud posteriormente, desenvolvido por Jean Laplan-
transita de um modelo de caráter mais econômico che, como veremos. Roudinesco e Plon (1998,
e topológico para um mais dinâmico e, ainda, in- p. 32) a descrevem como “um processo de reorga-
troduz a ideia de que novas circunstâncias vividas nização ou reinscrição pelo qual os acontecimentos
pelo sujeito podem influenciar a reordenação dos traumáticos adquirem significação para o sujeito
seus registros mnêmicos. Dessa forma, a memória apenas num a posteriori, isto é, num contexto
estaria sujeita a rearranjos à medida que cada pes- histórico e subjetivo posterior, que lhes confere
soa tem novas experiências, as quais terão efeito uma nova significação”. Por sua vez, Laplanche
sobre as (re) configurações de suas recordações. e Pontalis (2000) dizem o seguinte: “há experiên-

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cias, impressões, traços mnésicos que são ulte- que em traduções inglesas Nachträglichkeit apare-
riormente remodelados em função de experiências ce como deferred action (ou ação diferida).
novas, do acesso a outro grau de desenvolvimento” Laplanche (1999; 2006) traz importante contri-
(p. 33). buição para a compreensão do après-coup (Nach-
A noção de Nachträglichkeit aparece desde träglichkeit) na obra freudiana e para ampliação de
o Projeto (Freud, 1950/1986a) no relato do caso seu conceito. Na concepção desse autor o après-
Emma, no qual uma situação vivida pela paciente coup supera a contraposição entre determinismo
aos 8 anos de idade se tornou traumática somen- (o passado determina o presente e o futuro) e her-
te num segundo momento, aos 12 anos, quanto menêutica (ideias do presente reinterpretam e re-
ocorreu outro evento, associado ao primeiro por significam o passado). Em seu modelo tradutivo,
alguns elementos, numa época em que Emma já no bojo de sua Teoria da Sedução Generalizada,
estava na puberdade e pôde ter outra compreensão apresenta a noção de que mensagens enigmáticas
dos fatos devido à maturação sexual. No Rascun- são transmitidas do adulto para a criança e deman-
ho K (Freud, 1896/1986b) e nas Cartas 59, 61 e dam tradução. Essas mensagens são traduzidas e re-
75 (Freud, 1897/1986d,e,g), o autor faz alusão ao traduzidas, numa direção temporal alternadamente
efeito retardado que uma recordação pode ter e, retroativa e progressiva, segundo Laplanche. Esta
assim, mobilizar defesas, em função de fantasias visão subverte a linearidade temporal e concebe
formadas a partir de fatos vivenciados e são com- passado, presente e futuro como coexistentes e de
preendidas somente posteriormente. A ideia de influência mútua.
que lembranças sexuais infantis exercem efeito
retardado também aparece em A sexualidade na A interlocução entre psicanálise
etiologia das neuroses (Freud, 1898/1986i). Em e neurociências sobre as transformações
Observações adicionais sobre as neuropsicoses da memória
de defesa, Freud (1896/1986h) considera inclusive
que lembranças não patogênicas podem ser subs- Vários aspectos da teoria metapsicológica de
tituídas posteriormente (nachträglich) por serem Freud relacionados às transformações da memória
incompatíveis com alterações do ego, como na foram objeto de estudos que visaram sua correlação
paranoia. com descobertas neurocientíficas. Um exemplo
O efeito de Nachträglichkeit também é consi- é a pesquisa de Bocchi (2010) que propôs a re-
derado nos casos clínicos de Elisabeth Von R., nos lação entre a potenciação de longa duração (LTP)
Estudos sobre a histeria (Freud,1895/1985); no e a ideia de facilitação presente no Projeto, uma
do Pequeno Hans – Análise de uma fobia em um vez que ambas forjam vias nervosas. Centonze,
menino de cinco anos (Freud, 1909/1986m), em Siracusano, Calabresi e Bernardi (2004) também
que ele considera que um fato atual é compreen- consideram que a concepção sobre os neurônios ψ,
dido à luz de um acontecimento anterior que gera que seriam os responsáveis pelo armazenamento
efeitos sobre o primeiro; e no caso do Homem dos da memória, foi um insight de Freud sobre o que
lobos (Freud, 1918/2010), onde aparece diversas mais tarde seria descrito como LTP. Centonze, Si-
vezes, explicando o surgimento dos sintomas do racusano, Calabresi e Bernardi (2005a) retomam
jovem russo. Ele volta a mencionar esse último a correlação entre as noções de Freud sobre a me-
caso em Análise terminável e interminável (Freud, mória com a LTP e incluem a plasticidade sináptica
1937/1986n), referindo-se ao efeito retardado que em sua discussão. Os mesmos autores (Centonze,
resquícios de conteúdos patogênicos ainda exer- Siracusano, Calabresi & Bernardi, 2005b) abor-
ciam anos após encerrar sua análise. Lembrando dam as bases neurobiológicas da eficácia psicote-

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rapêutica. Para tanto, consideram uma disfunção O Nachträglichkeit representa uma noção freu-
do processo de consolidação e reconsolidação da diana que pode ser correlacionada com o processo
memória e da plasticidade associada à sua manu- de reconsolidação da memória, presente em publi-
tenção ou extinção. Eles postulam que a psicote- cações de Kandel, representando um ponto de con-
rapia tem como objetivo a remoção das memórias vergência entre as obras desses autores. Portanto,
implícitas mal adaptativas e plasticidade sináptica o fato de que aquilo que é armazenado/inscrito no
disfuncional, exercendo ação sobre tais processos cérebro/mente sofre transformações retroativa-
neurobiológicos. mente ao longo do tempo representa um possível
São possíveis, ainda, algumas articulações en- consenso entre a psicanálise e as neurociências.
volvendo os atos falhos e distorções da memória es- Bleichmar (2004) aborda as mudanças psíquicas
tudadas sob a perspectiva da psicologia cognitiva. produzidas pela análise. Ele postula que o efeito
Autores que se destacam neste campo são Schacter das interpretações se dá nas memórias implícitas,
(2001) e Loftus (2003a, 2003b). O primeiro afirma considerando as descobertas neurocientíficas sobre
que as memórias estão sujeitas a vieses, em função a sua labilidade que demonstram que “no momento
de emoções vividas e de conhecimentos adquiri- da recordação, a memória entra num estado que
dos posteriormente aos fatos recordados. Schacter, tem sido designado como lábil, no qual a inscrição
Chiao e Mitchell (2003) referem que memórias antiga é modificada pela experiência que está sendo
implícitas podem exercer influência sobre expe- vivida... no exato momento da recordação ocorre
riências e ações atuais. Loftus (2001) sugere que uma reinscrição da memória antiga” (p. 1393-1394,
imaginar um evento pode aumentar a confiança de tradução nossa). Esse autor correlaciona este fenô-
que ele realmente ocorreu. Ela também desenvol- meno ao après-coup: “esta reestruturação ocasiona
veu pesquisas sobre a maleabilidade da memória a possibilidade de se adicionar elementos que não
e suas distorções, como em casos de testemunhas eram parte da circunstância original. O fenômeno
oculares. Além disso, pesquisou as falsas memórias da ação diferida [defered-action] (après-coup)
que podem ser induzidas por informações incorre- descrita por Freud é solidamente corroborada pela
tas, o que ficou conhecido como efeito da distorção pesquisa neurocientífica atual” (Bleichmar, 2004, p.
de informação (Loftus, 2006). 1394, tradução nossa). Este autor ainda destaca que
Esses estudos sobre os vieses e distorções da a eficácia terapêutica depende de uma experiência
memória também demonstram que ela está sujeita relacional e afetiva, para que ocorra a reconfigu-
a transformações a partir de novas experiências ração do que está inscrito e, assim, uma efetiva
do indivíduo. Essa noção é semelhante à ideia de transformação. Bleichmar (2010) considera o uso
Nachträglichkeit ou après-coup e, de acordo com terapêutico da reconsolidação da memória e associa
os estudos apresentados, são fenômenos normais este mecanismo com o après-coup: “na verdade, os
e possuem finalidade adaptativa. Isso pode ofere- trabalhos atuais sobre a reconsolidação da memó-
cer subsídios para se considerar o après-coup de ria, demonstrando que uma nova experiência muda
forma mais generalizada, como algo que ocorre o significado de uma experiência prévia e o integra
no funcionamento psíquico comum, não ficando em sua estrutura, corrobora a noção freudiana de
restrito a situações de trauma ou ao processo ana- Nachträglichkeit [defered action, après-coup]”
lítico. Desse modo, poderia ser concebido como (p. 1525-1526, tradução nossa).
um mecanismo atuante na vida mental que, a partir É possível afirmar que Freud e Kandel apresen-
de experiências de maior conteúdo emocional ou tam concepções de individualidade e de singulari-
conflitivo, poderia se intensificar e ter efeitos de dade com certas semelhanças em função do fato de
maior amplitude. ambos conceberem, respectivamente, um aparelho

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As transformações da memória: articulações entre Sigmund Freud e Eric Kandel. (As transformações da memória)

psíquico e neuronal que se (re) organiza à medida suas recordações, baseado em seus sonhos, nos seus
que o indivíduo tem novas vivências. Dessa forma, relatos por meio da associação livre, nos compor-
a constituição de cada sujeito passa por sua história tamentos que apresenta na relação transferencial.
de vida, por suas experiências afetivas, cognitivas, A confirmação das construções se dá por meio de
emocionais etc, que podem (re) configurar suas re- novas associações que as complementem e elas são
des neuronais e (re) construir sua subjetividade. Isto terapeuticamente eficazes, porque contêm fragmen-
permite que cada pessoa seja única e possa mudar. tos das experiências originais. Portanto, a memória
A plasticidade neuronal e o fato de que a trans- entendida como uma construção tem implicações
missão sináptica pode ser modulada pela expe- para a prática clínica e remete a questões relacio-
riência são considerados pontos de interlocução nadas à verdade e à fantasia em análise, assunto
entre a psicanálise e as neurociências por Magis- abordado por Collins (2011) e também por autores
tretti e Ansermet (2007). Eles dizem que “pelos que relacionam as construções em análise com o
mesmos mecanismos de plasticidade, através dos Nachträglichkeit, como Laverde-Rubio (2011),
rearranjos dos traços inscritos, poderá se formar Bohleber (2007), Blanck-Cereijido (2006) e Faim-
uma realidade inconsciente, que desempenhará berg (2005; 2011).
um papel determinante na constituição do sujeito” Considerar as transformações às quais a me-
(p. 139, tradução nossa). Também defendem que a mória está sujeita retroativamente traz implícita
reconsolidação cria uma descontinuidade entre a uma noção de temporalidade, marcada pelo Nach-
experiência e seu traço mnêmico de onde emerge o träglichkeit, que subverte a linearidade temporal.
sujeito e o inconsciente. Tais autores ainda susten- Segundo André (2008), o Nachträglichkeit rompe
tam que as associações entre os traços ocorrem no com a lógica que diferencia claramente passado e
après-coup e podem produzir uma nova realidade presente, atribuindo-lhes certa simultaneidade e
inconsciente, independente daquilo que constituiu poder de transformação, reinscrevendo o passado
os primeiros traços. “O inconsciente pode assim ser e reorganizando o psiquismo. Para o autor, a plas-
visto como descontinuidade, de onde se origina o ticidade oferecida pelo Nachträglichkeit abran-
sujeito em sua particularidade” (p. 142, tradução ge mesmo o recalcado, viabilizando a mudança
nossa). Segundo Arminjon, Ansermet e Magistretti psíquica e, assim, concebe uma temporalidade
(2010) “o sujeito produz traços de memória em vez capaz de metamorfose. Marion (2012) também
de ser produzido por eles... tudo é registrado, mas articula temporalidade e Nachträglichkeit, por
tudo pode se desenvolver e mudar. Tudo é mantido, sua vez oferecendo maior destaque para o perío-
mas tudo é transformado: nós nunca usamos duas do de latência entre o primeiro e o segundo tempo
vezes o mesmo cérebro.” (p. 278, tradução nossa). desse fenômeno, que seria a fase das elaborações
Portanto, não somos biologicamente determinados, psíquicas.
havendo a possibilidade de transformação e da Sobre esse assunto são importantes as con-
existência da singularidade e da imprevisibilidade tribuições de Braier (2008) e Dahl (2010), que
do sujeito. consideram a complementaridade entre presente e
A partir destas articulações teóricas, são per- passado; Tutté (2004), para quem passado e futuro
tinentes alguns desdobramentos relacionados às são reciprocamente modulados por seus significa-
construções em análise e à temporalidade na in- dos; Birksted-Breen (2012), que faz uma leitura a
terface entre psicanálise e neurociências. As cons- partir da escola inglesa de psicanálise que privilegia
truções fazem parte da técnica psicanalítica, junto o aqui-agora da sessão analítica; Azevedo (2011)
com as interpretações. Freud (1937/1986o) explica que faz articulações com as neurociências; e, ain-
que o analista deve ajudar o paciente a reconstruir da, Gorender (2012), que resgata a relatividade do

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tempo para física moderna ao abordar o après-coup posteriores, a fim de que esses caminhos se tornem
e as retranscrições da memória. mais seguros e levem a novos desenvolvimentos.

Considerações finais Referências


Empreender a pesquisa sobre os vários estu-
dos já realizados na interface entre psicanálise e André, J. (2008). O acontecimento e a temporalidade:
neurociências proporcionou subsídios a favor da o après-coup no tratamento. Ide psicanálise e
viabilidade e proficuidade dessa proposta, mas cultura, 31(47), 139-167.
também ofereceu a perspectiva do quanto ainda é Arminjon, M., Ansermet, F., & Magistretti, P. (2010).
necessário pesquisar, dada a amplitude e a varie- The homeostatic psyche: Freudian theory and
dade dos temas possíveis. Demonstrou-se, ainda, somatic markers. Journal of Physiology - Paris,
que a memória representa um assunto pertinente 104, 272-278.
a esse diálogo interdisciplinar. Azevedo, A. M. A. (2011). Algumas considerações
Abordando mais especificamente a interlocução sobre o tempo. Jornal de Psicanálise, 44(81),
proposta entre S. Freud e E. Kandel, foram identifi- 67-84.
cadas divergências entre eles, principalmente acer- Birksted-Breen, D. (2012). Taking time: the tempo
ca da cientificidade da psicanálise, mas sobretudo of psychoanalysis. The International Journal
algumas convergências acerca das transformações of Psychoanalysis, 93, 819-835.
retroativas da memória, que lhe conferem caráter Blanck-Cereijido, F. (2006). La memoria en el diván.
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ideias presentes desde as fases mais iniciais da Bleichmar, H. (2004). Making conscious the uncons-
metapsicologia freudiana, passando pelas retrans- cious in order to modify unconscious proces-
crições da memória, pelos atos falhos e lembranças sing: some mechanisms of therapeutic change.
encobridoras, até se chegar às construções em aná- The International Journal of Psychoanalysis,
lise, abordando a técnica já em fase mais tardia. 85, 1379-1400.
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como os processos de consolidação e reconsoli- discussão a partir das concepções sobre o ego.
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como um correlato biológico da individualidade e Bohleber, W. (2007). Recordação, trauma e memória
da possibilidade de mudança psíquica, congregando coletiva: a luta pela recordação em psicanáli-
a maleabilidade e a historicidade da subjetividade. se. Revista Brasileira de Psicanálise, 41(1),
Portanto, foi possível contribuir com o processo 154-175.
de construção de pontes entre a psicanálise e as Braier, E. (2008). Puntualizaciones desde una re-
neurociências que já vem sendo promovido por lectura de la retroactividad (Nachträglichkeit;
vários pesquisadores. Também se espera que ou- après-coup) en la obra de Freud. Intercanvis,
tros mais possam contribuir com críticas e estudos 21, 13-38.

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Recebido em: 2 de julho de 2014


Aprovado em: 19 de setembro de 2014

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