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A crise económica mundial: implicações e impacto em

Moçambique no primeiro Semestre de 2009

por
Félix Simione

Discussion papers No. 65P


Janeiro de 2010
Direcção Nacional de
Estudos e Análise de Políticas
Ministério da Planificação e
Desenvolvimento
República de Moçambique
O objectivo das publicações é estimular a discussão e troca de ideias sobre questões
pertinentes para o desenvolvimento económico e social de Moçambique. Existem opiniões
diferentes acerca da melhor maneira de fomentar o desenvolvimento económico e social. As
publicações têm como objectivo abordar essa diversidade.

É de salientar que as ideias apresentadas nos documentos são da inteira


responsabilidade dos respectivos autores e não necessariamente reflectem o
posicionamento do Ministério de Planificação e Desenvolvimento ou qualquer
instituição do Governo de Moçambique.

O logo foi gentilmente providenciado pelo artista moçambicano Ndlozy.


RESUMO

A comparação de agregados macroeconómicos nos primeiros semestres de 2008 e 2009


sugere que os efeitos da crise económica mundial foram notáveis em alguns sectores da
economia moçambicana no primeiro semestre de 2009. O sector externo foi o mais
afectado, com a queda acentuada das exportações reflectindo a queda da demanda e
preços externos. No sector real, os sectores do turismo, transportes e comunicações, e
indústria mineira registaram desacelerações significativas no crescimento, reflectindo
parcialmente a retracção da demanda externa e restrições no acesso ao financiamento
externo. No sector fiscal, apesar do crescimento dos recursos internos, o crescimento dos
recursos externos sob forma de donativos e as receitas provenientes dos mega-projectos
reduziram significativamente. Contudo, o sector monetário mostrou-se estável,
reflectindo sua fraca integração no sistema financeiro internacional. No geral, apesar da
desaceleração da economia, seu crescimento continuou robusto no primeiro semestre de
2009, com um crescimento do PIB na ordem dos 5.6%. Espera-se que o crescimento real
do PIB desacelere de 6.7% em 2008 para 5.8% em 2009, reflectindo a queda da demanda
externa e preços de exportação.
1. Introdução
Desde Setembro de 2008, a economia mundial tem estado em recessão devido a crise
financeira internacional que, rapidamente, se transformou numa crise económica. Esta
crise tem estado a causar nas economias desenvolvidas uma recessão e,
consequentemente, uma queda nos indicadores de confiança e nas expectativas. Apesar
da sua fraca (mas crescente) integração no sistema financeiro internacional, as economias
em desenvolvimento também têm sido afectadas pela crise, mas de forma indirecta. O
receio dos efeitos indirectos da crise levou a que as taxas de crescimento do produto
interno bruto (PIB) fossem revistas para baixo em muitos países em desenvolvimento.

Em Moçambique, desde Janeiro de 2009, o governo tem estado formalmente a monitorar


os potenciais canais de transmissão da crise para a economia nacional e as potenciais
medidas de politica para minimização do seu impacto. Foi nesse âmbito que foi criado
pelo Conselho de Ministros o Grupo de Acompanhamento da Situação Internacional
(GASI). O GASI tem reportado periodicamente ao Conselho de Ministros a situação de
diversos aspectos da economia nacional face a conjuntura internacional.

O presente trabalho visa complementar o esforço do GASI, discutindo particularmente as


seguintes questões: (i) quais são os potenciais canais através dos quais a crise mundial
pode se alastrar para as economias em desenvolvimento? (ii) quais são os potenciais
factores de risco para Moçambique? (iii) quais são os sectores de actividade
potencialmente vulneráveis a crise? (iv) até que ponto a crise afectou a economia
nacional no primeiro semestre de 2009? e (v) quais são as perspectivas de crescimento no
médio prazo em Moçambique? Em adição a estas questões, o trabalho discute o papel do
governo para a minimização de futuros choques oriundos de crises económicas
internacionais.

A discussão prossegue com a seguinte estrutura. Na secção 2 é apresentado o quadro


analítico e o método usado para estimar o impacto da crise mundial sobre o crescimento
do PIB em Moçambique; na secção 3 são apresentados resumidamente os potenciais
mecanismos de transmissão da crise mundial para as economias em desenvolvimento,

1
num plano teórico; na secção 4 é discutido o potencial impacto da crise em Moçambique
à luz de algumas características económicas do país; na secção 5 é apresentado o impacto
da crise sobre a economia nacional no primeiro semestre de 2009; na secção 6 é discutida
a perspectiva de crescimento no médio prazo face a crise mundial. O trabalho termina
com conclusões e implicações para o papel do governo, na secção 7.

2. Quadro analítico
Neste trabalho assume-se que a crise económica mundial afectará todos os sectores
produtivos, com a magnitude do impacto em cada sector dependendo de (i) exposição do
sector ao ciclo de negócios global e (ii) correlação entre o ciclo de negócios do sector e o
ciclo de negócios global. O indicador adoptado para captar a exposição de determinado
sector ao ciclo de negócios global é o peso das exportações do sector no total da
produção sectorial, excepto para os sectores do turismo, transportes de passageiros e
serviços financeiros. Para o sector do turismo, o indicador usado é a proporção de turistas
estrangeiros no total de turistas que visitam o país e, para o sector de transporte de
passageiros, a proporção de passageiros internacionais no total de passageiros
transportados no país. Para o sector dos serviços financeiros, o indicador resulta da média
de dois rácios: o crédito em USD no total do crédito à economia e os depósitos em USD
no total dos depósitos na economia.

O indicador adoptado para captar a correlação entre os ciclos de negócios dos sectores e o
ciclo de negócios global foi o coeficiente de correlação (simples) entre as exportações
dos sectores e o rendimento mundial, excepto para os sectores do turismo, transportes de
passageiros e serviços financeiros. Para estes sectores, os indicadores usados foram,
respectivamente, as correlações entre (i) o número de turistas estrangeiros em
Moçambique e o rendimento mundial, (ii) o número de passageiros internacionais em
Moçambique e o rendimento mundial e (iii) a taxa de juro para crédito em USD em
Moçambique e a taxa LIBOR.

A combinação dos dois indicadores (exposição e correlação) permitiu proceder a um


mapeamento da vulnerabilidade dos sectores. Tal fez-se recorrendo a um diagrama de

2
quatro quadrantes, onde são identificadas três zonas: (i) zona de alta probabilidade de
choque, caracterizada por alta exposição sectorial e alta correlação com o ciclo de
negócios mundial, (ii) zona de baixa probabilidade de choque, caracterizada por baixa
exposição sectorial e baixa correlação com o ciclo de negócios mundial e (iii) zona de
moderada probabilidade de choque, caracterizada por alta (baixa) exposição sectorial e
baixa (alta) correlação com o ciclo de negócios mundial. Tais zonas, apesar de não
indicarem a probabilidade exacta com que a crise mundial afectará determinando sector,
permitem identificar sectores mais vulneráveis a crises económicas externas. Jones et al.
(2008) discutem vulnerabilidade a crise económica mundial, baseando-se na estimação de
probabilidades. No entanto, devido a constrangimentos nos dados disponíveis, neste
trabalho não são estimadas probabilidades de impacto sectorial.

A identificação dos sectores mais vulneráveis permitiu estimar o impacto da crise sobre o
PIB considerando três cenários: (i) se a crise afectar todos os sectores, sem medidas de
mitigação, (ii) se a crise afectar apenas os sectores mais vulneráveis, sem medidas de
mitigação e (iii) se a crise afectar apenas os sectores mais vulneráveis, com medidas de
mitigação. Para estimar tal impacto começou-se por definir a taxa de crescimento do PIB
como uma soma ponderada do produto das taxas de crescimento sectoriais e o peso dos
respectivos sectores no PIB, ou seja,

1
1 ,    1 , 1, 1
PIB 1 1
1 1

onde Ωt é a taxa de crescimento do PIB real no período t, αit-1 é o peso do sector i no


PIB no período t-1, sit é a taxa de crescimento do PIB do sector i no período t, Sit é o valor
acrescentado do sector i no período t e n é o numero de sectores de actividade na
economia.

3
Seja hi um choque exógeno sobre o crescimento do sector i (ex., oriundo da crise
económica mundial) e θ a magnitude do choque. Então, o impacto da crise mundial sobre
o PIB pode ser estimado fazendo

onde hi é um choque exógeno sobre o crescimento do sector i, medido como sendo o


desvio padrão histórico das taxas de crescimento sectoriais no período 1991-20081. Um
pressuposto crítico implícito nesta análise é que potenciais choques originados na
economia internacional podem ser comparados a choques históricos na economia
nacional. No mundo real, este pressuposto pode ser por vezes contrariado, mas sua
plausibilidade reside no facto do desvio padrão tomar em conta variações históricas do
PIB que resultaram parcialmente de choques na economia internacional. O parâmetro θ
mede a magnitude de transmissão do choque sobre a economia nacional, pelo que éa
taxa de crescimento do PIB (com choque) no período t. O parâmetro θ pode assumir dois
valores extremos com interpretações importantes:

θ = 0, se a economia moçambicana não for afectada por choques na economia


internacional, ou;
θ = 1, se a economia moçambicana for afectada por choques na economia internacional,
com a mesma severidade verificada nos choques históricos sobre o PIB.

Como em muitos outros países, nenhum dos valores extremos de θ adequa-se a economia
moçambicana porque (i) o grau de abertura da economia moçambicana é relativamente
alto, pelo que θ > 0; e (ii) apesar de (i), o mercado financeiro nacional está pouco
integrado no mercado internacional, pelo que θ < 1. Isso implica que o valor de θ está

1
1991-2008 é o período para o qual as taxas de crescimento anuais do PIB estão disponíveis em
Moçambique.

4
entre zero e um, sendo o seu valor exacto uma questão empírica. Usando o trabalho
empírico de Akin e Kose (2007), assumiu-se que θ = 0.45, ou seja, 45% dos choques
sobre o crescimento da economia mundial serão repassados para o crescimento da
economia moçambicana2. Akin e Kose (2007) constataram que 35% a 45% dos choques
que ocorrem no ciclo de negócios das economias desenvolvidas são repassados para as
economias em desenvolvimento. Por forma a proceder a uma estimativa mais
conservadora do impacto, adoptou-se o limite superior, 45%.

Adicionalmente, assumiu-se que a magnitude de transmissão do choque, θ, tenderá a


reduzir com o tempo, reflectindo a implementação de medidas de mitigação ao nível
internacional e nacional. Não são especificadas as medidas a tomar, mas assume-se que
estas não eliminarão completamente os efeitos da crise, apenas reduzirão o efeito de 45%
previsto em Akin e Kose (2007). Os detalhes dos cenários considerados estão patentes no
Anexo G.

Com base nas perspectivas de crescimento do PIB no médio prazo, procurou-se prever o
potencial impacto sobre o sector fiscal. Para prever o impacto da desaceleração do PIB
sobre a arrecadação de receitas fiscais no médio prazo foi adoptado o critério da taxa
marginal efectiva. Este critério permite estimar a variação da receita decorrente da
variação do PIB, dada a taxa marginal efectiva. A taxa marginal efectiva foi computada
usando os dados do PIB e da receita do estado para o período 2002-2008. Com recurso a
ferramenta Quadro Macro do Ministério da Planificação e Desenvolvimento, simulou-se
o impacto da desaceleração do PIB sobre as exportações, importações e balança
comercial moçambicanas no médio prazo, dadas as taxas de crescimento da economia
nacional e mundial, a taxa de câmbio MT/USD e o índice de preços mundial. A previsão
dos indicadores do sistema bancário no médio prazo esta fora do escopo deste trabalho.

2
Note que o pressuposto subjacente é que o choque na economia mundial equipara-se ao choque histórico
na economia nacional, medido pelo desvio padrão histórico das taxas de crescimento. Embora simplista,
este pressuposto é razoavelmente realista na medida em que baseia-se nos choques históricos da economia
nacional.

5
Indisponibilidade de dados e problemas metodológicos limitam a análise do impacto da
crise económica mundial sobre a economia moçambicana. Por um lado, dados
disponíveis são altamente agregados, o que inviabiliza análises mais profundas e
detalhadas. Por outro lado, a crise económica mundial é um de entre vários eventos
económicos que ocorreram durante o período em análise, o que torna difícil isolar
precisamente o impacto da crise. Ciente destes constrangimentos, o impacto
macroeconómico da crise neste trabalho é discutido comparando agregados
macroeconómicos em dois períodos distintos – o primeiro semestre de 2008 (período
antes da crise financeira se alastrar internacionalmente em Setembro de 2008) e o
segundo semestre de 2009 (período após a crise se alastrar). Portanto, as variações
macroeconómicas entre os dois períodos devem ser interpretadas como “variações em
contexto de crise” e não como “variações resultantes exclusivamente da crise”. Sempre
que factores extra-crise tiverem determinado algumas variações macroeconómicas,
referências serão feitas este facto.

3. Canais de transmissão da crise


Os canais de transmissão de choques financeiros para a economia já foram discutidos por
vários autores, entre os quais Kamin et al. (1998). O Fundo Monetário Internacional
(FMI), através da publicação do World Economic Outlook (WEO) de Abril de 2009, e o
Banco Mundial, também providenciam uma analise extensa sobre os canais de
transmissão da crise financeira mundial para as economias em desenvolvimento (EED).
Da vasta literatura existente, três canais de transmissão são particularmente relevantes:
(i) o contagio financeiro, (ii) o efeito sobre o financiamento e (iii) o efeito sobre o sector
real. Como nota o Banco Mundial (2008), a reduzida exposição do sistema financeiro das
EED ao sistema financeiro internacional poderá permitir que as EED escapem dos efeitos
financeiros directos da crise. Por conseguinte, neste trabalho, a discussão do impacto da
crise sobre as EED será limitada ao efeito sobre o financiamento e o sector real.

6
3.1. Efeito sobre o financiamento
A crise económica mundial poderá estreitar as fontes de financiamento das EED. Uma
dessas fontes é o investimento directo estrangeiro (IDE), factor impulsionador do
crescimento em muitas EED. A hipótese de retracção do IDE é plausível na medida em
que, em situações de crise, é comum observar mudanças de comportamento dos
investidores no sentido de adoptar abordagens mais aversas ao risco. Esta aversão ao
risco poderá levar a um aumento persistente dos custos de financiamento no mercado
internacional. A evidencia da crise asiática de 1997 sugere que o efeito da crise sobre o
financiamento poderá durar para alem do curto prazo. Após a crise asiática de 1997, o
influxo de capital liquido privado para as economias emergentes e em desenvolvimento
entre 1997 e 2006 permaneceu abaixo dos seus níveis de 1996 (Jones et al., 2008).

Com efeito, as finanças internacionais ainda estão sob pressão e espera-se que assim
persistam pelo menos até 2010 (WEO, Abril 2009). Por conseguinte, as previsões
apontam para a redução do credito ao sector privado nas economias desenvolvidas (ED)
em 2009 e 2010, o que poderá reduzir o acesso das EED ao financiamento externo em
2009 e 2010 (WEO, Abril 2009). A África do Sul e a Índia são exemplos de países onde
alguns investimentos de grande escala não arrancaram devido a dificuldades de
financiamento no mercado internacional (te Velde, 2008). Por outro lado, num contexto
de escassez de capital, as decisões do IDE tornam-se ainda mais sensíveis ao risco
associado aos países receptores. Isto implica que, com a actual crise, o capital poderá
fluir menos ainda para EED com alto risco de retorno, caso de muitos países africanos.

Por outro lado, a escassez de liquidez no mercado financeiro internacional poderá impor
aos bancos comerciais a necessidade de racionalização do crédito. Tipicamente, a
racionalização do credito leva a priorização de crédito a investimentos de curto prazo,
dada a rapidez e previsibilidade com que o mesmo pode ser reavisto. Isso sugere que, os
projectos de investimento público nas EED, por serem tipicamente de longo prazo,
poderão enfrentar constrangimentos na mobilização de financiamento.

7
A grande dependência das EED da ajuda externa é outro factor que as poderá tornar
severamente afectadas pela crise económica mundial. A queda das receitas fiscais
causada pela desaceleração da actividade económica em muitas ED e os pacotes de
estimulo tem estado a aumentar a competição pelos escassos recursos orçamentais e a
afectar a decisão sobre o alocação dos recursos nacionais (Nanto, 2009). Com a actual
crise, há pressão para que as ED reduzam seu orçamento de ajuda devido a deteriorada
posição fiscal em que se encontram e aos problemas de dívida pública que enfrentam. O
Reino Unido, um dos maiores doadores nas EED, é um dos países que tem enfrentado
pressão para reduzir seu orçamento de ajuda (te Velde, 2008).

Evidencias do efeito de crises sobre a ajuda externa são significativas na literatura. Por
exemplo, Roodman (2008) mostra que as crises que afectaram a Finlândia, Japão,
Noruega e Suécia nas décadas 80 e 90 foram seguidas de substancial declínio de ajuda
externa, variando de 10% na Noruega a 62% na Finlândia. Cálculos recentes baseados em
todos os países doadores que sofreram crises bancárias nos últimos trinta anos suportam a
existência de correlação positiva entre ocorrência de crises bancárias e queda de influxos
de ajuda oficial ao desenvolvimento – no ano da crise, a ajuda media declina em 1%, no
ano seguinte a queda cumulativa ascende aos 4% e no quinto ano 30% (UNCTAD,
Março 2009).

3.2. Efeito sobre o sector real


A crise no mercado financeiro internacional e a consequente estagnação da demanda
agregada nas ED traz implicações negativas para o sector real das EED. Algumas dessas
implicações relacionam-se com o comercio externo e o preço das exportações. Parte
substancial das exportações das EED são colocadas em ED, cujos mercados enfrentam
actualmente uma retracção na demanda. Este facto sugere que as ED poderão reduzir sua
demanda pelas exportações das EED, levando a uma queda no volume exportado – efeito
volume. A queda das exportações poderá ser tão severa quanto mais elásticos forem os
produtos em causa.

8
Por outro lado, a recessão da economia global e a consequente contracção da demanda
têm colocado pressões deflacionárias sobre os preços de commodities no mercado
internacional. Dado que as EED exportadores de commodities são tomadoras de preço,
suas exportações serão valoradas a preços mais baixos, levando a queda do seu valor –
efeito preço. A conjugação dos efeitos volume e preço sobre as exportações poderá
deteriorar o défice da balança comercial em muitas EED.

O reduzido acesso a crédito no mercado internacional, bem como a retracção do influxo


de capital externo sob forma de IDE são outros factores que poderão afectar
negativamente o sector real. A disponibilidade e o custo de crédito têm estado
frequentemente correlacionados de forma significativa com o investimento privado tanto
nas ED como nas EED (Jones et al., 2008).

O sector real também poderá se ressentir da redução nas remessas de emigrantes,


especialmente nos países de baixa renda. A recessão económica e o consequente
desemprego que se verifica nas ED poderá reduzir as oportunidades de emprego para
muitos emigrantes provenientes das EED. Isto sugere que as remessas por migrante
poderão reduzir significativamente nas EED. Com efeito, muitas EED têm estado a
registar queda nas remessas desde os finais do ano 2008 (te Velde). Este facto poderá
afectar substancialmente muitas EED africanas onde muitas famílias, devidas as
imperfeições dos mercados financeiros, têm as remessas como uma fonte importante de
poupança e investimento3.

3
Para a importância das remessas nas EED, veja por exemplo Addison (2004) para o caso do Ghana. Nesse
pais, o influxo de remessas de emigrantes mostrou-se mais estável e maior que a ajuda externa e o IDE
durante o período 1990-2003. Por outro lado, as remessas cresceram mais do que proporcionalmente que o
PIB e as receitas de exportação.

9
4. Implicações económicas para Moçambique

4.1. Factores de vulnerabilidade


Os canais de transmissão discutidos na secção anterior sugerem que a crise económica
mundial coloca em maior risco países caracterizados por: (i) mercado de exportação
orientado para ED afectadas pela crise, (ii) produtos de exportação altamente elásticos a
renda e pro-cíclicos, (iii) dependência no IDE, (iv) dependência na ajuda externa e (v)
importância das remessas de emigrantes na poupança interna. Nesta sub-secção, procura-
se discutir ate que ponto estes riscos são reais para a economia moçambicana.

Fraca diversificação dos mercados de exportação


Moçambique é um país aberto, com um grau de abertura de cerca de 71%4. Essa abertura,
não sendo um mal em si, torna o país exposto aos choques da economia mundial. Em
particular, os choques nos principais mercados de exportação podem afectar
significativamente as exportações nacionais. Os principais mercados de exportação para
Moçambique são a Espanha, África do Sul, EUA5, Japão, Portugal, Malawi, Zimbabwe,
Índia e Reino Unido. Nestes países, devido a actual crise económica, prevê-se uma
desaceleração ou recessão da economia em 2009, com recuperação gradual a partir de
2010. Isso sugere que, devido ao efeito renda, as exportações moçambicanas para aqueles
países poderão reduzir em 2009. A redução será tanto maior quanto menos diversificados
forem os mercados de exportação, como é o caso para os produtos nacionais. O gráfico 1
mostra que as exportações moçambicanas estão muito concentradas em alguns mercados.
Medido pelo índice de Herfindahl (HH index), o grau de concentração das exportações
moçambicanas por mercado esta acima do valor 0,18 (linha vermelha no gráfico), acima
do qual a concentração é interpretada como sendo elevada.

4
O grau de abertura é normalmente calculado como o peso da soma de exportações e importações no PIB.
Os cálculos basearam-se em dados referentes ao ano 2008 (a preços constantes) do Instituto Nacional de
Estatística.
5
EUA - Estados Unidos da América.

10
Gráfico 1 - Moçambique: índice de concentração
das exportações por mercado (HH index),
.5

.4
todos mercados
excluindo paises desenvolvidos
.3

.2

.1

.0
Fonte: Cálculos do autor com base em dados do Anuário
Estatístico de 2007 (INE)

O gráfico 1 ilustra ainda que, retirando as exportações para as ED, o índice de


concentração baixa substancialmente, mas permanece elevado (acima do valor 0,18). Este
facto sugere que o mercado das exportações moçambicanas não é diversificado e,
portanto, a recessão das economias com quem Moçambique transacciona bens afectara
significativamente as exportações nacionais.

Fraca diversificação dos produtos de exportação


A maioria dos principais produtos que Moçambique exporta (casos do alumínio, gás,
carvão, madeira, algodão e açúcar) são pró-cíclicos, i.e., enfrentam crescente demanda
nos períodos de expansão da economia mundial e vice e versa. Com a actual crise, prevê-
se uma redução significativa na procura mundial por commodities em 2009, o que poderá
ocasionar quedas acentuadas nos seus preços6, em particular no preço das exportações
moçambicanas. Com a explosão da crise mundial em Setembro de 2008, muitos produtos
que Moçambique exporta registaram quedas acentuadas nos seus preços. Este facto
sugere que tanto o valor (devido ao efeito preço) como o volume (devido ao efeito renda)
das exportações moçambicanas poderão reduzir em 2009.

Por outro lado, alguns produtos que Moçambique exporta (casos de camarão, amêndoa e
castanha de cajú, e tabaco) apresentam tipicamente uma alta elasticidade ao rendimento.

6
O Fundo Monetario Internacional prevê para 2009 uma queda de 27.9% e 46.4% nos preços internacionais
de commodities (excluindo o petróleo) e petróleo, respectivamente (World Economic Outlook, April 2009).

11
Com a actual perspectiva de que o rendimento mundial decline em 1.3% em 2009 e o das
ED em 3.8%7, as exportações moçambicanas dos produtos acima referidos poderão ser
substancialmente afectadas. Em particular, com a actual perspectiva de que o rendimento
da Índia (principal importador da castanha de Moçambique) desacelere de 7.2% em 2008
para 4.5% em 20098, é provável que o volume de exportação da castanha de cajú registe
uma desaceleração em 2009.

Em adição aos problemas acima levantados, os produtos moçambicanos de exportação


são pouco diversificados, o que constitui outra fonte de vulnerabilidade para a economia.
Como se constata no gráfico 2, o índice de concentração das exportações por produto é
alto. Excepto no sector da agricultura, o HH index excede o valor 0,18.

Gráfico 2 - Moçambique: índice de concentração


das exportações por produto (HH index)
1.0

0.8
agricultura
energia
0.6
manufactura
manufactura sem Mozal
extracção
0.4
extracção sem mega-projectos
pescas
todos
0.2

0.0
Fonte: Cálculos do autor com base em dados do Anuário
Estatístico de 2007 (INE)

A fraca diversificação dos produtos de exportação sugere que, com a queda da demanda e
de preços no mercado internacional, a balança comercial não terá capacidade de absorver
o choque. Isto é particularmente verdade no caso de queda de demanda e preço dos
produtos exportados pelos mega-projectos que representam 69.7% das exportações totais.

7
World Economic Outlook (April, 2009)
8
World Economic Outlook (April, 2009)

12
Exposição ao IDE
Em Moçambique, o IDE continua a desempenhar um papel importante para a
dinamização do crescimento, geração de receita e criação de emprego. Cerca de 38% do
total do investimento autorizado em Moçambique em 2008 foi investimento directo.
Deste, cerca de 89% foi IDE9. Excepto no sector da banca e seguros, o IDE superou o
investimento directo nacional (IDN) em todos os sectores de actividade, representando
90.6% no sector da agricultura e agro-indústria, 93.2% na industria e 99.2% nos
transportes e comunicações. A importância do IDE em Moçambique é tal que seu influxo
determina a posição financeira da balança de pagamentos (Tabela 1).

Tabela 1: Moçambique, Conta capital e financeira (2007-2008)


(milhões de USD)
2007 2008
Conta Capital e Financeira 725.4 1007.5
Conta Capital 541.9 413.4
Conta Financeira 183.5 594.1
Investimento Directo no Exterior 0.3 0.0
Investimento Directo em Moçambique 427.4 587.1
Investimento de Carteira -3.2 -7.8
Instrumentos Financeiros Derivados -16.0 0.0
Outro Investimento - Activos -411.5 -101.8
Outro Investimento - Passivos 471.7 295.7
Activos de Reserva -285.2 -179.0
Fonte: Banco de Moçambique - Balança de Pagamentos

Entretanto, os fluxos do IDE são muito dependentes das condições de financiamento no


mercado internacional de capitais. Dada a actual escassez de crédito no mercado
internacional, dois potenciais problemas podem se impor em Moçambique: (i) a
actividade das empresas cujo financiamento provem do IDE poderá reduzir ou ficar
suspensa enquanto a crise durar, em particular em 2009 e 2010 e (ii) alguns grandes
projectos cujo arranque estava previsto para o período 2009-2012, cuja fonte de
financiamento é o mercado financeiro internacional, poderão ser adiados ate que a
economia mundial mostre sinais de recuperação. A potencial retracção do IDE, dado seu

9
Cifra calculada com base em dados do Centro de Promoção de Investimentos, referentes a projectos de
investimento autorizados no ano 2008.

13
alto peso nos sectores da agricultura, industria e transportes, pode ter impacto
significativo sobre o crescimento do PIB.

Dependência de ajuda externa


Moçambique é um dos maiores beneficiários de ajuda externa ao nível mundial, com
cerca de 44% dos recursos do estado em 2008 sob forma de donativos e empréstimos
externos (Gráfico 3).

Gráfico 3: Fontes de recursos para o orçamento do estado 
(%), Moçambique 2008

13.9

Receitas do estado
Empréstimos internos
29.9 55.7 Donativos
Empréstimos externos

0.5

Fonte: Relatório de Execução do Orçamento do Estado (REO) de 2008

A dependência nos fundos externos é tal que, no orçamento do estado de 2008, previa-se
que os donativos financiassem cerca de 68% do défice global e os empréstimos externos
cerca de 32%. Este facto torna o orçamento do estado vulnerável a conjuntura económica
nos países doadores. Uma vez que alguns países doadores estabelecem os níveis de ajuda
externa como uma percentagem do PIB, a queda do PIB naqueles países pode implicar
uma redução nos níveis de ajuda10. Esta é uma hipótese preocupante para Moçambique na
medida em que todos os seus doadores prevêem para o ano 2009 uma recessão, com
recuperação gradual a partir de 2010.

A recessão esperada nos doadores de Moçambique sugere que suas receitas fiscais
poderão baixar ou desacelerar. Este facto, associado ao custo com os pacotes de estímulo

10
Para discussão sobre o impacto de crises na ajuda externa, veja por exemplo UNCTAD (Março, 2009)

14
a economia que vem sendo desenhados naqueles países, poderá aumentar a pressão para
alocação de recursos a nível nacional, deixando menos recursos disponíveis para ajuda
externa. O Reino Unido, que em Moçambique concentra cerca de 23% do total de
donativos para programas, e a União Europeia (22%), são alguns dos países que têm
enfrentado pressão para reduzir seu orçamento de ajuda (te Velde, 2008).

Por outro lado, a potencial redução dos montantes de ajuda externa pode ser agravada
pela depreciação que tem sido constatada em muitas moedas dos países doadores em
relação ao Dólar americano (USD). O orçamento de ajuda é frequentemente fixado em
moeda doméstica; e se tal moeda se deprecia em relação a moeda do país beneficiário da
ajuda, o valor da ajuda, medido na moeda do país beneficiário, também reduz
(UNCTAD, Março 2009).

Em adição a dependência aos donativos, coloca-se o problema do acesso ao crédito


comercial. Cerca de 32%11 dos recursos externos que Moçambique recebe (que incluem
donativos) provém de créditos de bancos comerciais internacionais. A descapitalização
que assola tais bancos poderá levar a uma racionalização do crédito e aplicação de
maturidades curtas, o que implica que muitos bancos poderão dar primazia a projectos de
curto prazo. Dado que os projectos para os quais Moçambique procura crédito são
maioritariamente de longo prazo (típico nas EED), o acesso a crédito comercial poderá
ser limitado para Moçambique, levando a que alguns programas de desenvolvimento de
longo prazo não arranquem devidamente.

Moçambique vs. Remessas de emigrantes


Em Moçambique, as remessas de emigrantes desempenham um papel sócio-económico
importante para muitas famílias rurais. Grande parte das remessas provem da África do
Sul. Neste pais, prevê-se uma desaceleração da economia em 2009, o que implica que as
oportunidades de emprego poderão ser escassas para emigrantes. Isso sugere que as
remessas de emigrantes para Moçambique poderão desacelerar por duas vias: (i) redução
da emigração de trabalhadores moçambicanos, causada pela fraca expectativa de

11
Cifra calculada com base no Relatório de Execução do Orçamento do Estado de 2008.

15
emprego nos países de destino e (ii) redução do volume de remessas por migrante,
causada pela desaceleração da economia dos países de destino. Contudo, o declínio das
remessas de emigrantes não é susceptível de deteriorar significativamente o défice da
conta corrente em Moçambique. Dados da balança de pagamentos de 2007 sugerem que,
apesar das remessas de trabalhadores constituírem cerca de 35%12 das receitas que
Moçambique capta pela cedência de seus factores produtivos ao exterior, as mesmas
representam apenas 0.8% das transferências correntes, contra 86% para o caso dos
donativos. Isso sugere que as transferências de trabalhadores, embora sejam importantes
para muitas famílias rurais, não constituem um factor de risco para o défice da conta
corrente13.

4.2. Mapeamento de vulnerabilidade


Os potenciais problemas e factores de risco levantados na sub-secção anterior, em
especial a recessão da economia mundial e a consequente queda de preços de exportação,
implicam que os sectores produtivos em Moçambique poderão se ressentir da crise
económica mundial. O impacto em cada sector será tanto maior quanto maior for a
exposição de cada sector ao mercado internacional e a correlação entre o ciclo de
negócios sectorial e o ciclo de negócios internacional. O diagrama abaixo (Gráfico 4)
apresenta um mapeamento de vulnerabilidade em oito sectores produtivos
moçambicanos, numa tentativa de identificar aqueles com maior probabilidade de serem
afectados pela crise económica mundial. No eixo horizontal é apresentado a exposição
sectorial a choques na demanda mundial, medido como peso das exportações do sector no
total da produção sectorial14; no eixo vertical é apresentado a correlação entre as

12
Cifra calcalada com base em dados da Balança de Pagamentos de 2007 (Banco de Moçambique).
13
Em países como Ghana, as remessas de emigrantes excedem os fluxos de ajuda externa e de outras
transferências privadas. Addison (2004) apresenta uma discussão extensiva para o caso do Ghana. Neste
país, um choque sobre as transferências de trabalhadores é susceptível de agravar significativamente o
défice da conta corrente.
14
Excepto para os sectores de turismo, transportes e serviços financeiros. Para estes sectores o indicador
usado foi, respectivamente, a proporção de turistas estrangeiros no total de turistas que visitam o país, a
proporção de passageiros internacionais no total de passageiros transportados no país, e o crédito em USD
no total do crédito à economia mais os depósitos em USD no total dos depósitos na economia.

16
exportações sectoriais e o ciclo de negócios internacional, medido pelo coeficiente de
correlação entre as exportações sectoriais e o PIB mundial15.

Gráfico 4: Mapeamento de vulnerabilidade sectorial
1
transp. pass. manufactura
man. exc. Mozal electricidade minas
turismo
agricultura serviços 
financeiros

Correlação com o 
II I
ciclo de negócios  0.5
mundial
III IV

pescas

0
0 0.5 1

Exposição  a demanda  externa

Fonte: cálculos do autor com base em dados do Anuário Estatístico de 2007

Sectores que caem no quadrante III do diagrama podem ser interpretados como sendo os
mais vulneráveis a choques na demanda externa, dado o peso relativamente elevado das
suas exportações na produção sectorial e a alta correlação entre as suas exportações e o
rendimento mundial. Por razoes contrarias, sectores do quadrante I podem ser
interpretados como sendo os menos vulneráveis. Os quadrantes II e IV denotam uma
vulnerabilidade menor que do quadrante III, dada a sua baixa correlação com o ciclo de
negócios mundial e baixa exposição a choques internacionais, respectivamente.

15
Excepto para os sectores de turismo, transportes e serviços financeiros. Para estes sectores o indicador
usado foi, respectivamente, a correlação entre (i) o número de turistas estrangeiros em Moçambique e o
rendimento mundial, (ii) o número de passageiros internacionais em Moçambique e o rendimento mundial
e (iii) a taxa de juro para crédito em USD em Moçambique e a taxa LIBOR.

17
Os sectores que caem na zona de alta vulnerabilidade são a indústria manufactureira,
industria mineira, turismo e electricidade e água. Estes sectores apresentam altos níveis
de exposição a demanda externa, dado que o peso das suas exportações na produção
sectorial é relativamente alto. Por outro lado, o volume das exportações dos referidos
sectores é altamente pro-cíclico, i.e., cresce em períodos de expansão económica mundial
e decresce em períodos de recessão. Este facto é suportado pelo alto coeficiente de
correlação positivo entre as exportações dos respectivos sectores e o rendimento global.
Este facto, não sendo um mal em si, sugere que qualquer choque que ocorra nos
mercados de exportação poderá ser transmitido aqueles sectores com impacto maior do
que nos restantes sectores.

Entretanto, cumpre notar que a alta vulnerabilidade do sector da indústria manufactureira


é, em grande medida, determinada pela Mozal. Retirando a Mozal do sector, este move-
se para o quadrante IV, onde a vulnerabilidade é menor. Este facto faz sentido se atender-
se que a Mozal concentra cerca de 62% das exportações totais da economia, o que torna a
industria manufactureira altamente propensa ao seu desempenho.

Os sectores da agricultura, transportes de passageiros e serviços financeiros caem no


quadrante IV, sugerindo uma menor vulnerabilidade em relação aos sectores da indústria,
turismo e electricidade e agua (quadrante III). Apesar de serem altamente pro-cíclicos
(conforme suportado pela alta correlação com o ciclo de negócios mundial), a agricultura,
transportes de passageiros e serviços financeiros estão relativamente pouco expostos ao
ciclo de negócios mundial. Este hipótese é suportada pelo baixo peso das exportações no
total da produção sectorial para o caso da agricultura16; baixa proporção de passageiros
internacionais no total de passageiros para o caso do sector dos transportes; e baixo peso
do crédito e depósitos em USD para o caso do sector dos serviços financeiros, o que
reduz a exposição do sistema bancário a depreciação do MT face ao USD.

16
Isso nao implica que os produtos nacionais agrícolas de exportação (algodão, tabaco, castanha de cajú,
etc.) não serão afectados pela queda da demanda mundial.

18
O sector das pescas (quadrante II) também apresenta uma vulnerabilidade reduzida, visto
que, apesar de estar altamente exposto ao ciclo de negócios global, mostra-se pouco
correlacionado com o mesmo.

A soma dos valores das duas variáveis do gráfico 6, exposição e correlação, ponderando
cada uma por 50%, permitiu construir um índice simples de vulnerabilidade dos sectores
(gráfico em Anexo A). Tal índice aponta, uma vez mais, para os sectores da industria
(transformadora e mineira) e turismo como sendo os mais vulneráveis a crise económica
mundial; e os sectores das pescas, agricultura e serviços financeiros como sendo os
menos vulneráveis.

5. Impacto da crise no 1º semestre de 2009


Nas secções anteriores foram identificados os potenciais canais de transmissão da crise e
os sectores de actividade mais vulneráveis. Nesta secção, procura-se identificar o real
impacto da crise no primeiro semestre de 2009, uma tentativa de perceber ate que ponto
os canais de transmissão tem estado a repassar os efeitos da crise mundial para a
economia moçambicana.17 O impacto da crise é analisado em quatro sectores,
nomeadamente o real, fiscal, externo e monetário.

5.1. Sector real


O impacto da crise económica mundial sobre o sector real em Moçambique fez-se sentir
maioritariamente nos ramos de actividade orientados para o mercado internacional. A
queda da demanda global e as dificuldades de financiamento no mercado internacional
afectaram algumas empresas, particularmente as que operam nos sectores da industria
(transformadora e mineira), turismo e transportes e comunicações, obrigando-as a
reajustar seus factores produtivos por forma a se manterem sustentáveis. Nalgumas
empresas, a mão de obra mostrou-se um factor vulnerável ao reajustamento, dada a
facilidade com que pode ser realocada. Com efeito, no período de Janeiro a Março de

17
Os problemas e dados apresentados nesta secção devem ser interpretados com cautela porque alguns
problemas ocorridos no prineiro semestre de 2009 não são consequências directas da crise mas, de certa
forma, derivam da conturbada conjuntura internacional.

19
2009, registaram-se casos de despedimentos colectivos por motivos estruturais e de
mercado. Tais despedimentos ocorreram não só em mega-projectos, mas também em
empresas de menor escala.

Dados da Mozal, maior mega-projecto em Moçambique, indicam que em Junho de 2009


o preço do alumínio havia caído em cerca de 48% em termos homólogos. Apesar da
empresa não ter reduzido seu volume de produção em consequência, sua receita registou
uma queda significativa, forçando a empresa a reajustar sua estrutura produtiva, tendo
despedido quarenta e oito trabalhadores (Tabela 2).

Para alem da Mozal, também ocorreram despedimentos colectivos de dezanove


trabalhadores no mega-projecto das areias pesadas de Chibuto, alegadamente porque a
taxa de retorno do investimento era baixa, tendo ficado por se investigar tecnologias de
produção que melhorem o retorno esperado. Ainda no sector mineiro, até Abril de 2009,
a empresa Highland African Mining Company (Zambézia), dedicado a extracção e
processamento de pentóxido de tântalo para exportação, estava na eminência de encerrar
temporariamente as suas operações. Esse facto foi motivado pelo facto da empresa não
mais poder assegurar o pré-financiamento das suas exportações, anteriormente
asseguradas por um banco britânico que entrou em falência devido a crise financeira
mundial (GASI).

No total, na província de Maputo registaram-se seis casos de despedimentos colectivos


envolvendo duzentos e trinta trabalhadores (Tabela 2). Para alem destes casos, a empresa
tipográfica ABC, Lda. havia manifestado a intenção de despedir 80 trabalhadores,
alegadamente em resultado dos efeitos da crise económica mundial18.

18
Até Abril de 2009, este processo aguardava desfecho do processo negocial em curso naquela empresa, o
qual iria determinar quantos trabalhadores seriam efectivamente despedidos e os demais detalhes do
processo.

20
Table 2: Firmas afectadas pela crise económica mundial, Moçambique,
                primeiro semestre de 2009
Empresa Província Sector Problema Despedimentos
Africa Wood Maputo Manufactura Preço de exportação 12
ECL* Maputo Manufactura Queda de demanda 20
Kemp Smelp* Maputo Manufactura Queda de demanda 36
Mozal Maputo Manufactura Preço de exportação 45
Rafia Bagff* Maputo Manufactura Queda de demanda 84
Tipografia ABC Maputo Manufactura ‐‐‐ 80
Highland African Mining Compa Zambézia Minas Financiamento 314
Barra Reef Inhambane Turismo Queda de demanda 42
Montanha Lodge Inhambane Turismo Queda de demanda 3
Marlin Lodge Inhambane Turismo Queda de demanda 33
Vilanculo Madeira Inhambane Turismo Queda de demanda 5
Macolo Bay Inhambane Turismo Queda de demanda 5
Farol da Barra Inhambane Turismo Queda de demanda 5
Sun Set Lodge Inhambane Turismo Queda de demanda 8
Terra Firme Inhambane Turismo Queda de demanda 3
Sociedade Tofo Scuba Inhambane Turismo Queda de demanda 2
Aquapesca ‐‐‐ Pescas ‐‐‐ 10
Mulep Maputo Serviços ‐‐‐ 30
PSI Jeito Maputo Serviços Financiamento 15
Actionad ‐‐‐ Serviços ‐‐‐ 25
Hiefer Internacional ‐‐‐ Serviços ‐‐‐ 9
Sabie Game Park ‐‐‐ Turismo ‐‐‐ 51
Arcelor Mitall Maputo Manufactura Queda de demanda 0
Ferpinta Moçambique Maputo Manufactura Preço de exportação 0
Associação Artes Mondlane  Maputo Manufactura Demanda/Financiamento 0
The Maputo Clothing Company Maputo Manufactura Queda de demanda 0
Kanes Maputo Manufactura Queda de demanda 0
Southern Refinary ‐‐‐ Manufactura Risco de Preço 0
Facobol Maputo Manufactura Financiamento 0
Fasorel ‐‐‐ Manufactura Queda de demanda 0
SABIMO Maputo Manufactura Risco de Preço/Financ. 0
Total 837
* indica companhias que prestam serviços a Mozal
Fonte: GASI (n. 2, n. 4)

Cumpre notar que nem todas empresas afectadas pela crise recorreram a diminuição de
sua mão de obra. A empresa metalúrgica Arcelor Mittal South Africa, localizada no
parque industrial de Beleluane, encerrou temporariamente a sua actividade sem despedir
os cerca de 350 trabalhadores. Adicionalmente, esta empresa adiou o seu projecto de
construção de uma nova fabrica metalúrgica no parque industrial de Beluluane devido ao
ambiente de incerteza na economia mundial.

21
Os despedimentos de trabalhadores face a retracção da actividade económica ocorreram
também no sector do turismo, resultado da redução do fluxo de turistas. Na Província de
Inhambane, registaram-se casos de despedimentos colectivos em nove estabelecimentos
do sector do turismo, tendo afectado cento e seis trabalhadores (tabela 2). Na província de
Cabo Delgado, o sector do turismo ressentiu-se igualmente da queda da procura.
Informação do Ministério da Agricultura (MINAG) sugere que alguns estabelecimentos
da província têm registado adiamentos e cancelamentos de actividade de safaris por parte
de seus clientes, predominantemente norte-americanos. Por exemplo, a empresa Ntsewa
Lda. teve que baixar em 17% as suas tarifas diárias, por forma a mitigar a redução da
demanda por safaris. Uma outra empresa, a Mozunaf Safaris, registou uma queda de
cerca de 67% na venda de safaris, alegadamente devido a redução da demanda.

As empresas nacionais exportadoras de madeira não estiveram alheias a queda da


demanda mundial. Informações do MINAG indicam que os operadores das províncias de
Nampula, Zambézia e Maputo colocavam as suas encomendas a USD 700, 720 e 500 por
m3 em 2007, contra USD 475, 525 e 350 por m3 em finais de 2008, respectivamente. Este
facto levou algumas empresas a suspenderem temporariamente as suas exportações e, em
outros casos, a encerrarem a sua actividade. Conforme mostra a tabela acima, até Abril de
2009, existia um total de treze empresas encerradas, correspondente a cerca de 7% do
total das unidades de exploração e processamento de madeira (tabela em Anexo B). Por
outro lado, cerca de 32% das unidades encontravam-se temporariamente paralizadas,
afectando um total de 2.096 trabalhadores, dos quais 1.248 efectivos e 938 sazonais.

A crise económica mundial e a consequente queda da demanda mundial também vem


afectando o subsector do algodão, dada a sua ligação com o mercado internacional.
Dados do MINAG indicam que em Marco de 2009 o preço de exportação do algodão
havia caído em cerca de 55% em termos homólogos. Esta queda de preço, conjugado com
outras causas, levou a que a quantidade exportada reduzisse ligeiramente em 4%,
comparativamente a Março de 2008. A queda do preço do algodão no mercado
internacional forçou o reajustamento do preço mínimo ao produtor ao nível doméstico,

22
cuja proposta em Março de 2008 representava uma queda de 18% em relação a campanha
anterior (MINAG).

As taxas de crescimento por sector no primeiro semestre de 2009 permitem ter uma
perspectiva geral da actividade económica nacional no actual ambiente de crise. Com
excepção da agricultura, manufactura, electricidade e água e serviços financeiros, todos
os sectores registaram desaceleração no crescimento durante o primeiro semestre de 2009
(Gráfico 5).

G r á f i c o  5 : C r e s c i m e n t o  r e a l  d o  v a l o r  a c r e s c e n ta d o  ( % )
25
2 1 .4
1 9 .9
20

15 1 3 .6
1 2 .4
1 1 .0 1 0 .8 1 1 .0
9 .3 9 .3
10 8 .3
7 .1 7 .5
6 .1 7 .2
5 .4 5 .4
5 3 .2 2 .6
3 .1
2 .2
0 .7 0 .3
0

‐5 ‐3 . 8

‐6 . 8
‐1 0 ‐8 . 2

‐1 3 . 0
‐1 5
2008  1o   s e m e s tre 2009 1o  s e m e s tre

Fonte: cálculos do autor com base em dados do INE

Como seria de esperar, os sectores identificados como sendo mais vulneráveis (os do
quadrante IV no gráfico 4) são os que registaram maior desaceleração. O valor
acrescentado da indústria transformadora caiu em 2.3% no primeiro trimestre, mas a
recuperação verificada no segundo trimestre permitiu que o sector crescesse em 3.2% no
primeiro semestre. Esse performance é, de certa forma, contrário as expectativas, uma
vez que a previsão apontava para a queda da produção da indústria transformadora
devido ao desincentivo dos preços de exportação e a queda da demanda externa. A

23
manutenção dos níveis de produção da Mozal e a entrada em funcionamento de novas
indústrias na área de bebidas podem ter contribuído para tal performance. O sector do
turismo (hotéis e restaurantes) registou uma queda de 8.2%, contra um crescimento de
2.2% registado em 2008. A retracção da demanda por turismo por turistas estrangeiros
contribuiu para tal queda. A indústria extractiva registou uma desaceleração no
crescimento, de 13.6% em 2008 para 8.3% em 2009. O encerramento da empresa
Highland African Mining Company devido a falta de pré-financiamento das suas
exportações no mercado internacional pode ter contribuído significativamente para tal.

O valor acrescentado no sector dos transportes e comunicações, mesmo não sendo de


grande vulnerabilidade nos termos definidos no gráfico 6, registou uma queda de 13%,
contra um crescimento de 21.4% em 2008. Esta queda pode estar associada ao declínio
do comercio externo (exportações) e a consequente retracção dos serviços de portos,
caminhos de ferro e transportes rodoviários.

Excepções notáveis foram os sectores da agricultura, electricidade e água, e serviços


financeiros. Estes sectores cresceram, respectivamente, em 12.4%, 11% e 10.5%, contra
um crescimento em 2008 de 9.3%, -6.8% e 7.5%, respectivamente. Estas excepções não
são surpreendentes pelas seguintes razoes:
• O sector agrícola em Moçambique esta pouco exposto ao mercado internacional –
do total da produção sectorial, menos de 10% é exportada - sugerindo que os
choques de demanda no mercado internacional tem um impacto desprezível sobre
a produção agrícola doméstica; por outro lado, a produção agrícola em
Moçambique é bastante condicionada pelas condições climatéricas, as quais
foram favoráveis para a campanha agrícola 2008/2009;
• O sector da electricidade, apesar de estar bastante exposto a demanda no mercado
sul-africano, mostrou-se robusto durante o primeiro semestre de 2009 porque (i)
as obras de reabilitação e manutenção da HCB19 que ditaram o desempenho
negativo de 2008 foram concluídas, bem como foi ultrapassada a crise energética

19
Halbufeira de Cahora Bassa.

24
que se gerou na África do Sul em 2008; e (ii) a entrada em funcionamento do 4º
gerador da HCB em 2009 acelerou o ritmo de produção;
• O sistema financeiro moçambicano, por estar pouco integrado no sistema
financeiro internacional, é geralmente pouco afectado pelos choques financeiros
internacionais.

A aceleração da produção nos sectores da agricultura, electricidade e água e serviços


financeiros mais do que contrabalançou o declínio da produção nos sectores da indústria
transformadora, turismo e transportes e comunicações, e a desaceleração verificada nos
restantes sectores. Por conseguinte, apesar de ter desacelerado, o crescimento da
economia manteve-se robusto no primeiro semestre de 2009. O PIB real cresceu em
5.4%, após 6.1% em 2008. Este crescimento sugere que, apesar de choques localizados
que ditaram o declínio do valor acrescentado em alguns sectores, o sector real como um
todo continuou estável no primeiro semestre de 2009.

5.2. Sector Fiscal


O desempenho do sector fiscal no primeiro semestre de 2009 superou as expectativas. A
expectativa de que os recursos internos do OE declinassem devido ao impacto da crise
económica mundial sobre a actividade produtiva nacional não foi verificada até ao final
do primeiro semestre. As receitas do estado cresceram em 8.7% em termos reais
homólogos no primeiro semestre de 2009 (Gráfico 6). Embora tenha desacelerado em
relação a 2008, o crescimento da produção doméstica de bens e serviços manteve-se
forte, o que assegurou que as receitas provenientes dos impostos sobre bens e serviços
domésticos crescessem em 15.3% em termos reais.

25
Gráfico 6: Crescimento real das receitas do estado (%)

25 21.2
20 17.1
15.1 15.7 15.3
13.2 14.1
15
8.7 9.5 9.4
10 6.0
5
0.6
0
Total de  Receitas  Impostos  Impostos  Operacoes  Operacoes 
receitas do  fiscais sobre  sobre bens  internas externas
estado rendimento e servicos

2008 1o semestre 2009 1o semestre
 
Fonte: REO (Junho, 2009)

Contudo, o crescimento das receitas do estado (8.7%) desacelerou significativamente em


relação ao crescimento registado no igual período de 2008 (13.2%). Esta desaceleração
foi principalmente causada pelo impacto da crise económica mundial sobre o comércio
externo, o que se manifestou sob forma de desaceleração do crescimento dos impostos
provenientes do comércio externo de 21.2% em 2008 para 0.6% em 2009. Este facto foi
determinante para a desaceleração do valor total dos impostos sobre bens e serviços de
17.1% em 2008 para 6.0% em 2009 e, por conseguinte, do total das receitas fiscais de
15.1% em 2008 para 9.5% em 2009.

Embora as receitas provenientes dos impostos sobre o rendimento tenham crescido em


14.1% em termos reais, a crise económica mundial afectou as receitas provenientes dos
mega-projectos. Seu peso na receita total caiu de 6.6% em 2008 para 2.4% em 2009.
Com excepção da HCB, as receitas fiscais registaram queda para todos mega-projectos
(Gráfico 7). Este declínio é principalmente explicado pela queda dos preços de
exportação dos seus produtos, o que reduziu sua receita unitária, ainda que alguns mega-
projectos como a Mozal e Sasol tenham mantido seus níveis de produção.

26
Gráfico 7: Crescimento real (%) das receitas 
arrecadadas dos mega‐projectos no primeiro 
semestre de 2009

60
37.9
40
20
0
‐20 Producao de  Exploracao de  Exploracao de  Outros  Total
energia petroleo recursos  mega‐projectos
‐40 minerais
‐60
‐59.9 ‐60.5
‐80
‐100 ‐89.9 ‐84.6

Fonte: REO (Junho, 2009)

Por outro lado, contrariando a expectativa de que a crise económica mundial iria
restringir as fontes de financiamento externo para Moçambique, o valor do financiamento
externo do OE no primeiro semestre de 2009 cresceu em 14.3% em termos nominais,
reflectindo o crescimento dos donativos em 6.7% e dos empréstimos externos em 36.9%
(Gráfico 8). Contudo, mesmo que o financiamento externo tenha crescido, seu
crescimento desacelerou de forma acentuada, de 37.9% em 2008 para 14.3% em 2009.
Esta desaceleração foi resultado da desaceleração verificada nos donativos para projectos
de investimento. Embora a desaceleração dos donativos não seja somente consequência
da crise económica mundial, os desembolsos de alguns doadores foram afectados pela
crise. Por exemplo, em Março a Irlanda havia adiado seu desembolso mensal por se
encontrar a avaliar o impacto da crise sobre a sua economia.

27
Gráfico 8: Crescimento nominal (% ) do 
financiamento externo do OE 

50 44.5
37.9 36.9
40
30 21.3
20 14.3
10 6.7

0
Financiamento  Donativos  Emprestimos 
externo total

2008 1o semestre 2009 1o semestre

Fonte: REO (Junho, 2009)

Por outro lado, é importante notar que, enquanto o financiamento externo do OE


aumentou, o financiamento externo como um todo (incluindo ao OE e ao sector privado)
reduziu significativamente no primeiro semestre de 2009, tanto em donativos (9.9%)
como em créditos (48.2%) (Anexo C).

Em suma, o desempenho do sector fiscal não foi significativamente afectado pela crise
económica mundial em termos de colecta de receitas, uma vez que as fontes de
financiamento do OE permaneceram estáveis até ao final do primeiro semestre de 2009.
A tabela em Anexo D apresenta as taxas de realização do programa orçamental em 2008 e
2009, donde nota-se que o cumprimento do programa fiscal não difere significativamente
entre os dois anos, sugerindo uma estabilidade na performance fiscal.

5.3. Sector Externo


O sector externo foi significativamente afectado pela crise económica mundial no
primeiro semestre de 2009. Mais do que sobre o volume das exportações, o impacto da
crise manifestou-se sobre o valor das mesmas sob forma de declínio da receita gerada
pela queda de preços no mercado internacional. Ainda que a maioria dos mega-projectos
não tenha reduzido seus níveis de produção como consequência da crise, a queda dos
preços no mercado internacional afectou a sua receita. Até ao final do primeiro semestre,
as exportações de bens haviam caído em cerca de 39% em termos nominais, face ao
período homologo de 2008 (Gráfico 9). A queda em 47% das exportações do alumínio,

28
cujo peso sobre as exportações totais ascende aos 62%, foi o maior determinante da
queda das exportações. Do mesmo modo, as importações decresceram em cerca de14%,
determinado pela queda do valor das importações de combustíveis.

Gráfico 9: Exportações e Im portações (crescim ento real),


balança com ercial, conta corrente e saldo global (% do PIB)

5.4
%
0.8
0
Exportações  Importações  Balanca  Conta corrente Saldo global
comercial 
‐10 ‐9.5
‐10.7 ‐11.9
‐13.8
‐20
‐18.8

‐30

‐40
‐39.3
2008 1o semestre 2009 1o semestre

Fonte: Calculos do autor com base em dados da BOP e INE

A abrupta queda das exportacoes acentuou o défice da balança comercial e da conta


corrente que, como percentagem do PIB, passaram de 10.7% para 18.8% e 9.5% para
11.9%, respectivamente. A deterioração do saldo da conta corrente foi, em grande
medida, resultado da concentração das exportações em mega-projectos, os quais
ressentiram-se fortemente da queda dos preços internacionais. Exceptuando as
exportações de energia eléctrica e ilmenite, as exportações dos mega-projectos cairam de
forma acentuada (veja tabela no Anexo E). Com efeito, abstraindo-se dos mega-projectos,
os défices da balança comercial e da conta corrente deterioraram-se numa proporção
menor do PIB20, 1.6% e 1.3%, respectivamente (gráfico em Anexo E).

20
Para o caso do gráfico 13, o PIB sem mega-projectos foi estimado assumindo que o peso dos mega-
projectos no PIB eh 10.1% (Sonne-Schmidt et al. 2009).

29
A conta corrente também ressentiu-se da redução das transferências correntes. Estas,
apesar do aumento das transferências de trabalhadores e outras transferências privadas,
caíram em 6.0% em termos nominais, devido principalmente a redução do influxo de
ajuda externa sob forma de donativos21 (Gráfico 10). Em comparação com o primeiro
semestre de 2008, os donativos registaram uma queda de 18.4%, influenciado pela
redução dos donativos ao sector privado.

G ráfico 10: Transfê re ncias corre nte s (m ilhõe s de  U SD)

481
452 446
364

82
42
7

Tr an sfe r e n c ias  C o o p e r ac ao  e m   Tr an sfe r e n c ias d e   O u tr as 


c o r r e n te s (to tal) d o n ativo s tr ab alh ad o r e s tr an sfe r e n c ias

2 0 0 8  1 o  se m e str e 2 0 0 9  1 o  se m e str e


 
Fonte: Banco de Moçambique - BOP

Contrariamente a expectativa de que o IDE iria reduzir devido as deficientes condições


de financiamento no mercado internacional, a crise económica mundial não reduziu o
fluxo do IDE no primeiro semestre de 2009. Apesar do cancelamento de alguns projectos
cujo arranque tinha sido previsto para 2009, O IDE cresceu em 95.6% em termos
nominais (Gráfico 11). No entanto, este crescimento reflectiu apenas o aumento do IDE
dos mega-projectos, influenciado pelo arranque da fase de construção do mega-projecto
de exploração de carvão mineral22. O aumento do IDE contribuiu substancialmente para a
melhoria do saldo da conta financeira e, aliado ao aumento dos donativos para o OE e

21
Note que, conforme foi referido na secção anterior, enquanto que os donativos para o OE aumentaram, os
donativos para a economia como um todo (incluindo o sector privado), conforme captado pela BOP,
reduziram.
22
O IDE excluindo mega-projectos manteve-se relativamente estável, com uma ligeira queda de 2.0%.

30
outras transferências, permitiu melhorar o superavit da conta de capital e financeira em
39.7%.

Gráfico 11: Conta de capital e financeira (milhões de USD)

500  440
394
400 
315
300 
224 216 201
200  172
143

100 


Conta de Capital  e  Conta Capital  Conta Financeira  Investimento 
Financeira  Directo em 
Moçambique
2008 1o semestre 2009 1o semestre

Fonte: Banco de Moçambique - BOP

Portanto, apesar do impacto da crise económica mundial sobre a conta corrente, a BOP
como um todo manteve-se sustentável na medida em que o influxo de capitais externos
na conta de capital e financeira permitiu financiar o défice da conta corrente. Como
resultado, o saldo global da BOP permaneceu superavitário no primeiro semestre, apesar
do superavit ter reduzido como percentagem do PIB de 5.4% em 2008 para 0.8% em
2009. Por conseguinte, mesmo com a conta corrente sob stress, a economia continuou
dispondo de um nível adequado de reservas internacionais (Gráfico 12).

Gráfico 12: Meses de cobertura de


importações

2008 Junho

8 2009 Junho
6
4 5.88
4.58
2
0
Todos Sem mega‐projectos

31
Fonte: Banco de Moçambique

Como ilustra o gráfico acima, até ao final do primeiro semestre de 2009 o stock de
reservas internacionais era suficiente para assegurar 4.6 meses de importações de bens e
serviços não factoriais (incluindo mega-projectos), acima dos 3 meses
convencionalmente recomendados como mínimo23. Este facto sugere que, apesar do
impacto da crise mundial sobre a conta corrente, a BOP continua sustentável, ainda que
tal sustentabilidade seja significativamente assegurada pelo fluxo de capitais externos sob
forma de IDE e ajuda externa.

5.4. Sector Monetário


Não obstante a crise económica mundial ter se originado no sistema financeiro, o sistema
financeiro moçambicano tem se mostrado imune a crise, dada a sua fraca exposição ao
sistema financeiro internacional. Com efeito, até ao primeiro semestre de 2009, os
indicadores de vulnerabilidade mostravam que o sistema bancário nacional, como um
todo, não enfrentava riscos de crédito. Dois desses riscos são particularmente relevantes,
nomeadamente o risco de maturidade24 e o risco de câmbio25. Ao contrário do que seria
de esperar numa situação de crise bancária, o risco de maturidade no sistema bancário
nacional era significativamente mais baixo no primeiro semestre de 2009, comparando
com igual período de 2008. Com efeito, a taxa de cobertura dos depósitos de curto prazo
pelos activos internos cresceu de 14% em média no primeiro semestre de 2008 para 36%
no igual período de 2009 (Gráfico 13). Isso sugere que a capacidade do sistema bancário
nacional satisfazer as suas obrigações junto dos seus credores na eventualidade de uma

23
Em Moçambique, tal como na generalidade dos países em desenvolvimento com restrição no fluxo
internacional de capitais e reduzido acesso ao mercado mundial de capitais, o défice da conta corrente é
financiado principalmente através de variações nas reservas internacionais. Um critério para avaliar a
vulnerabilidade é que as reservas tem de ser iguais a pelo menos três meses de importações de bens e
serviços (IMF Institute, 2008).
24
Em inglês maturity mismatch risk. Esse risco surge quando os activos do sistema financeiro são de longo
prazo e as obrigações são de curto prazo, o que reduz a capacidade do sistema satisfazer as suas obrigações
junto dos seus credores na eventualidade de uma corrida aos bancos.
25
Em inglês currency mismatch risk. Esse risco é causado pelas disparidades entre as moedas nas quais os
activos e os passivos estão denominados. Os passivos podem estar denominados em moeda estrangeira,
enquanto os activos estão denominados em moeda doméstica, causando severas perdas quando a moeda
doméstica se deprecia.

32
potencial corrida aos bancos era mais alta no primeiro semestre de 2009 do que no
período homologo de 2008.

G ráfico 13 ‐ Siste m a bancário: risco de  m aturidade  vs. risco 


de  câm bio
0 .8

0 .6

0 .4

0 .2

0 .0
M ar ‐0 8 M ai‐0 8 Ju l‐0 8 Se t‐0 8 No v‐0 8 Jan‐0 9 M ar ‐0 9 M ai‐0 9

Rác io ac tivos  in te rnos/de pósitos  d e  c u rto  p razo e m M T


Rác io ac tivos  e m  USD/passivo s  d e  c u rto  p razo   e m USD

Fonte: Banco de Moçambique

A redução do risco de maturidade verificou-se também para as transacções denominadas


em Dólar americano. Para essas transacções, a cobertura dos passivos de curto prazo
pelos activos aproximava-se a 57% em média no primeiro semestre de 2009, acima de
37% no período homologo de 2008. Esse facto reduz o risco de câmbio, ou seja, reduz a
vulnerabilidade do sistema financeiro a depreciação do Metical face ao Dólar, uma vez
que o nível de cobertura dos passivos em Dólar pelos activos em Dólar reduz a
probabilidade do sistema recorrer a conversão de parte dos activos internos em Metical
para satisfazer as suas obrigações denominadas em Dólar.

Por outro lado, mesmo com a acentuada depreciação que o Metical vem sofrendo face ao
Dólar, a estrutura monetária dos créditos e depósitos continuou estável no primeiro
semestre de 2009 – o peso do crédito a economia e dos depósitos denominados em Dólar
manteve-se relativamente constante (veja Anexo F), sugerindo que a actual depreciação
do Metical face ao Dólar não tem afectado significativamente a confiança no Metical. Por
outro lado, apesar da crise económica mundial ter propiciado a cortes nas taxas de juro

33
em muitos países, as taxas de juro de referencia do Banco de Moçambique mantiveram
uma relativa estabilidade até ao final do primeiro semestre (Gráfico 14), o que tornou o
sistema bancário pouco exposto ao risco da taxa de juro e o sector real menos
constrangido no acesso ao crédito.

Gráfico  14: Taxas d e ju ro  n o  sistem a b an cário  (m atu rid ad e 


12 m eses)
25
%
20

15

10

0
M ar‐0 8 M ai‐0 8 Ju l‐0 8 Se t‐0 8 No v‐0 8 Jan ‐0 9 M ar ‐0 9 M ai‐0 9

o p e raç õ e s ac tivas o p e raç õ e s p assivas


 
Fonte: Banco de Moçambique

A estabilidade das taxas de juro, aliada a estabilidade do sector real, permitiu que a
alocação do crédito a economia pelo sector bancário continuasse estável. Até ao final do
primeiro semestre o crédito a economia persistia relativamente constante, quer em termos
de crescimento, quer em termos de estrutura (Gráfico 15).

34
Gráfico 15: Estrutura e crescimento do crédito a economia (%)
100

90 Outros

80 Transportes e  com.
70
Comércio
60
Turismo
50
Construção
40
Indústria
30
20 Agricultura

10 Crescimento real do crédito 
(Março 2008=100)
0
Mar‐08 Jun‐08 Set‐08 Dez‐08 Mar‐09 Jun‐09
 
Fonte: Banco de Moçambique

A estabilidade que se verificou na estrutura do crédito por sector durante o primeiro


semestre sugere que a crise económica mundial não influenciou significativamente o
perfil do risco nos diferentes sectores produtivos nacionais. Se o risco aumentasse em
alguns sectores (em especial nos mais expostos a procura mundial), seria de esperar, em
princípio, realocações de crédito de sectores de risco para sectores de baixo risco, o que
não é o caso patente no Gráfico 15. Isso implica que o declínio de produção verificado no
primeiro semestre de 2009 nos sectores de transportes e comunicações, e turismo não
reflecte o estado da maioria das empresas nestes sectores, mas sim problemas em
empresas específicas (e grandes no sector) significativamente expostas a procura no
mercado internacional. Esta hipótese é suportada pelo facto do índice de concentração de
produção e exportação naqueles sectores ser elevado, o que os torna muito sensíveis a
futuações de poucas grandes empresas.

6. Perspectivas macroeconómicas no médio prazo


Na secção anterior foi apresentado o impacto da crise económica mundial na economia
moçambicana no primeiro semestre de 2009. Nesta secção procura-se, com base na
conjuntura actual, prever a conjuntura macroeconómica em Moçambique no médio prazo

35
face aos potenciais desenvolvimentos impostos pela crise económica mundial. A previsão
abarca os sectores real (crescimento do PIB), fiscal (desempenho das receitas do Estado)
e externo (desempenho da balança comercial).

O facto dos sectores de actividade mais expostos as flutuações da economia mundial


(Indústrias transformadora e mineira, Turismo e Energia) representarem uma porção
significativa do PIB sugere que, ainda que a economia moçambicana cresça em 2009, o
ritmo de crescimento ira desacelerar em relação ao ano 2008. O Gráfico 16 mostra a
provável desaceleração do crescimento real do PIB em Moçambique como resultado de
três cenários possíveis: (i) se a crise afectar todos os sectores de actividade da economia
nacional e não forem tomadas medidas de mitigação, (ii) se a crise apenas afectar os
sectores de risco e não forem tomadas medidas de mitigação e (iii) se a crise apenas
afectar os sectores de risco e medidas de mitigação forem tomadas. Os pressupostos
subjacentes em cada um destes cenários são apresentados no Anexo D.

G ráfico 16: Cre scime nto re al do PIB (2009‐2011)

% 8
6 .8
6 .3 6 .6
5 .8 6 .3
6 5 .6
5 .8
4 .8 4 .4
4

2 2 .0

0
2008 2009 2010 2011
se  a c rise  afe c tar  todos os  se c tore s, se m mitigaç ão
se  a c rise  afe c tar  ape nas os  se c tore s mais  vulne ráve is, se m  mitigaç ão
se  a c rise  afe c tar  ape nas os  se c tore s mais  vulne ráve is, com  mitigaç ão

O Gráfico 16 mostra que o crescimento do PIB em Moçambique poderá desacelerar


significativamente como consequência da crise económica mundial. O cenário mais
provável é que a crise afectará apenas os sectores mais vulneráveis26 (indústrias
transformadora e extractiva, turismo e energia). Se o crescimento dos restantes sectores
26
Lembre que, neste trabalho, vulnerabilidade é definida nos termos propostos no gráfico 6 apresentado na
sub-secção 4.2 (exposição a demanda mundial vs. correlação com ciclo de negócios mundial).

36
se mantiver constante, um choque sobre os sectores mais vulneráveis levaria a uma
desaceleração do crescimento do PIB de 6,7% em 2008 para 4,8% em 2009.

Entretanto, é possível que o governo procure mitigar os efeitos negativos da crise para
minimizar a desaceleração do PIB27. Porém, as medidas de mitigação serão limitadas
porque (i) as causas da desaceleração são exógenas (queda da procura e dos preços no
mercado internacional, redução do fluxo de turistas estrangeiros, etc.) e fora do controle
do governo, (ii) o recurso a uma política fiscal anti-cíclica em Moçambique é limitado
pelo exíguo envelope de recursos disponível, pelo que (iii) ainda não há espaço para que
os chamados “estabilizadores automáticos” funcionem. Isso implica que a desaceleração
pode ser minimizada, entre outras, com medidas que estimulem a realização de
investimentos nos sectores mais vulneráveis mesmo na actual situação de crise28. Com a
implementação de tais medidas, um choque sobre os sectores mais vulneráveis levaria a
desaceleração do crescimento de 6,7% em 2008 para 5,8% em 2009. A previsão de
desaceleração do crescimento é consistente com as previsões de outras instituições. Por
exemplo, o Fundo Monetário Internacional também prevê um crescimento menor em
2009, 4.5%, assim como o Economist Intelligence Unit (4.8%). Ambas as instituições
apontam como principal causa da desaceleração o impacto da crise económica mundial
sobre os sectores mais orientados para as exportações.

A desaceleração prevista no crescimento do sector real terá consequências para a


arrecadação de receitas do estado, sobretudo as fiscais. Em especial, a desaceleração
prevista na actividade dos sectores da indústria e turismo, bem como nas receitas
provenientes do comercio externo, poderão afectar negativamente o desempenho das
receitas fiscais. O Gráfico 17 mostra a possível desaceleração do crescimento das receitas
do estado como consequência da desaceleração do crescimento da economia.

27
Note que o governo criou o GASI (Grupo de Acompanhamento da Situação Financeira Internacional)
cujo objectivo é, entre outros, assessorar o governo nas eventuais medidas a tomar face a crise mundial.
28
As medidas tomadas para acelerar o IDE da companhia Pepsi Cola e Companhia Vale do Rio Doce em
2009 são disso exemplo.

37
Gráfico 17: Impacto da crise sobre as Receitas do 
Estado (2009‐2011)

20
17.8
16.0 16.1 16.4
15 16.3

13.7
10 11.6
10.5

0
2008 2009 2010 2011

% do PIB Crescimento nominal (%)

Assumindo que o crescimento do PIB desacelere de 6.7% em 2008 para 5.8% em 2009
(cenário consistente com o impacto da crise apenas sobre os sectores mais vulneráveis e
com mitigação), implica que o crescimento nominal da receita do estado desacelere de
13.7% em 2008 para 10.5% em 2009. Isso sugere que a receita do estado irá crescer em
apenas 0.1% do PIB em 2009, significativamente abaixo dos 0.5% estabelecidos como
meta anual para Moçambique.

Dada a queda da demanda e preços no mercado internacional, aliada a desaceleração da


economia nacional, as exportações e importações de bens e serviços serão
significativamente afectadas, agravando o défice da conta corrente. O Gráfico 18 mostra
a evolução prevista da balança comercial no período 2009-2011.

38
Gráfico 18: Impacto da crise sobre as exportações, 
importações e balança comercial (2009‐2011)
5000
m ilhões de 
38 3 6
U SD 4000 3 4 58 3 6 40
32 2 1
3000 2 65 3 2 63 2 26 7 6
20 38
2000
1 1 83 10 0 8 1 16 1
8 05
1000

0
2008 2009 2010 2011
Exportaçõe s Importações Défice da balança  come rcial

Assumindo que a crise afectará apenas os sectores mais vulneráveis e com mitigação,
espera-se que as exportações e importações registem, respectivamente, uma queda
nominal de 23% e 7.0% em 2009, agravando o défice da balança comercial em 47%. O
agravamento do défice da balança comercial poderá gerar pressões sobre a taxa de
câmbio, levando a depreciação da mesma.

Em suma, tal como se observou no primeiro semestre de 2009, espera-se que o


crescimento da economia desacelere até ao final de 2009, retomando a aceleração em
2010. Embora a desaceleração da economia vá se traduzir em desaceleração do
crescimento das receitas do estado, espera-se que o crescimento das receitas se mantenha
forte, minimizando a vulnerabilidade das despesas públicas. No entanto, o sector externo
será o mais afectado pela actual crise devido a acentuada queda de preços no mercado
internacional, o que poderá se traduzir no agravamento acentuado da conta corrente e
pressões para a depreciação da taxa de câmbio. Assim sendo, a estabilidade do sector
externo em termos de disponibilidade de reservas dependerá criticamente dos
desembolsos de ajuda externa e entrada de IDE.

39
7. Conclusões e implicações de política
A crise financeira internacional, tendo rapidamente evoluído para uma crise económica
mundial, constitui sem dúvida um desafio para a economia moçambicana. Até ao final do
primeiro semestre de 2009, os efeitos da crise em Moçambique foram mais visíveis no
sector externo. Embora os principais exportadores tenham mantido seus níveis de
produção, a queda de preços internacionais traduziu-se em queda na receita das
exportações, tendo agravado significativamente o défice da balança comercial. O IDE
excluindo mega-projectos também registou uma queda ligeira de 2%.
No sector fiscal, o efeito da crise foi negligenciável. Apesar da desaceleração verificada
nas receitas do estado, seu crescimento continuou robusto. Por outro lado, o
financiamento externo do OE sob forma de donativos e empréstimos cresceu, o que
aliado ao crescimento das receitas fiscais, resultou no crescimento do envelope de
recursos do estado. O efeito da crise também foi negligenciável sobre a saúde do sistema
financeiro nacional. Até ao final do primeiro semestre de 2009, o sector bancário
mostrava-se robusto, com as taxas de juro relativamente estáveis e o crédito a economia
crescente em termos reais.

Contudo, apesar da economia ter se mantido robusta no primeiro semestre de 2009, a


desaceleração do crescimento em 2009 será inevitável. Em particular, a queda da
demanda e preços no mercado internacional serão um constrangimento com que as
exportações nacionais terão que lidar. O facto das exportações estarem altamente
concentradas em mega-projectos e pouco diversificadas por produtos e mercados
amplifica o risco de deterioração da conta corrente. Por outro lado, a racionalização do
crédito no mercado internacional poderá condicionar os fluxos de IDE, o que a acontecer
poderá ditar que o IDE flua menos para Moçambique e mais para outras economias em
desenvolvimento com um perfil de risco melhor que o de Moçambique. Estes
constrangimentos afectarão o desempenho da economia que, ainda que cresça, irá
desacelerar comparativamente aos anos anteriores. Atendendo o facto de que alguns
efeitos da crise poderão ocorrer com algum desfasamento, o crescimento da economia
poderá permanecer afectado em 2010 e 2011.

40
A desaceleração no crescimento da economia no geral e a queda do comércio externo em
particular afectarão provavelmente a arrecadação de receitas fiscais que, ainda que
cresçam, seu crescimento irá desacelerar. Aliado ao facto de que o influxo de ajuda
externa poderá reduzir devido as pressões fiscais que enfrentam os países doadores, a
desaceleração das receitas fiscais implicará necessariamente uma desaceleração no
crescimento dos recursos do estado comparativamente ao ano 2008.

Os potenciais impactos negativos acima mencionados impõem ao governo a necessidade


de um melhor entendimento das medidas de política apropriadas para lidar com a crise.
No entanto, dado que a dependência externa da economia moçambicana não permite o
recurso a uma politica fiscal anti-cíclica, é difícil encontrar medidas de curto prazo que o
Governo possa implementar para conter os efeitos da crise. Assim sendo, as medidas de
racionalização das despesas correntes para garantir a manutenção das despesas de
investimento nos sectores prioritários deverão ser encorajadas.

Entretanto, no médio prazo, o governo pode conceber estratégias para minimizar a


vulnerabilidade do sector externo a queda de demanda e preços mundiais. Em particular,
a diversificação dos produtos e mercados das exportações nacionais deve ser um
objectivo constante nos sectores da agricultura, indústria e comércio. Políticas de
atracção de investimento (nacional e estrangeiro) focalizadas na diversificação do mesmo
podem ser um complemento importante para a diversificação da produção e exportações.
Isso passa, no entanto, pela melhoria do ambiente de negócios em Moçambique, para o
que deve contribuir a implementação de políticas sectoriais viradas para a remoção de
constrangimentos estruturais que aumentam o custo de transacções. Para tal, o Centro de
Promoção de Investimentos e o Instituto de Promoção de Exportações devem ter um
papel activo, assessorando as políticas sectoriais.

Uma vez que as crises económicas tendem a desacelerar o crescimento das receitas
fiscais e a desaceleração da economia afecta o ritmo de criação de emprego, será
importante encontrar medidas que acelerem a criação de emprego e expandam as fontes
de receitas fiscais. Uma vez mais, a criação de um ambiente de negócios dinâmico que

41
facilite o estabelecimento de pequenas e médias firmas, aliada a reformas conducentes a
expansão da base tributária, é essencial para esse fim.

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Transmission from Border to Consumer Prices in Mozambique. National
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Governo de Moçambique.

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What have we learned?

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United Nations Conference on Trade and Development, Global FDI in Decline due to the
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de 2009
• Banco de Moçambique, 2009, Estatísticas de Crédito, disponível em
www.bancomoc.mz
• Banco de Moçambique, Estatísticas de Taxas de Juros, disponível em
www.bancomoc.mz
• Banco de Moçambique, Síntese Monetária do Sistema, disponível em
www.bancomoc.mz
• Centro de Promoção de Investimentos, Investimentos Aprovados em 2008
• Direcção Nacional do Orçamento, Relatórios de Execução do Orçamento do
Estado de 2008 e do Primeiro Semestre de 2009, disponível em
www.dno.gov.mz
• Instituto Nacional de Estatística, 2008, Anuário Estatístico de 2007
• Instituto Nacional de Estatística, 2009, Contas Nacionais de 2008 e do Primeiro
Semestre de 2009, disponível em www.ine.gov.mz

44
ANEXO A

índicede vulnerabilidade no sector real

0 0.25 0.5 0.75 1

Manufactura
Indústria extractiva
Turismo
Energia
Transp. Passageiros
Serv. financeiros
Man. Sem Mozal
Agricultura
Pescas

ANEXO B

Unidades de processamento de madeira afectadas pela crise


Empresas afectadas % do Total
Empresas temporariamente paralizadas 63 31.8
Empresas encerradas 13 6.6
Maputo 2
Gaza 1
Inhambane 1
Sofala 1
Tete 1
Nampula 4
Cabo Delgado 3
Total paralizadas + encerradas 76 38.4
Fonte: Ministério da Agricultura

45
ANEXO C

A juda e xte rna e m  donativos (m ilhoe s de  USD )


600
523
500 471

400

300 247
224
200
107 108 122
100 77 59
32
6 13
0
To tal D o nativos  D o nativo s  D o nativos  e m   D o n ativos  D o nativos 
para  para p r o j.  e spe c ie para  p ar a pro g. 
p r o gr am as in ve stim e n to me d ic am e ntos e spe c iais

1 o se me str e  2 0 0 8 1 o  se m e str e  2 0 0 9

Ajuda externa em creditos (milhoes de USD)
400 352
350
300
250
200 182 181 171
140
150
100
42
50
0
Total Sector publico Sector privado

1o semestre 2008 1o semestre 2009

ANEXO D

T a x a d e r e a l i z a c a o d o p r o g r a m a o r c a m e n ta l (% )
I se m . 2 0 0 8 I se m . 2 0 0 9
R e c u rs o s i n t e rn o s 46.8 4 6.0
R e c e it a s d o e s t a d o 47.2 4 5.6
E m p re s t i m o s in t e rn o s 0.0 10 0.0
R e c u rs o s e x t e rn o s 30.4 3 3.5
D o n a t ivo s 33.4 3 3.0
E m p re s t i m o s 23.9 3 4.8
T o t a l d e re c u rs o s 37.6 3 9.4
D e s p e s a s d e fu n c io n a m e n t o 49.5 4 9.6
D e s p e s a s d e i n ve s t i m e n t o 22.8 2 6.2
C o m p o n e n t e in t e rn a 35.3 3 9.0
C o m p o n e n t e e x t e rn a 18.3 2 1.1
O p e ra c o e s fi n a n c e ira s 21.6 2 2.3
To ta l d e d e s p e s a 34.1 3 6.4
F o n te : R E O Ju n h o d e 2 0 0 9

46
ANEXO E

Cre scim e n to d a s e x p o rta çõ e s (%)


2009 I se m .
Cam arão -71.2
A m êndoa de C ajú -16.1
A lgodão -38.9
A ç úc ar -59.5
Tabac o -17.4
M adeira -56.3
Cas tanha de C ajú -64.4
E nergia E léc tric a* 17.8
G ás * -47.3
A lum ínio* -47.4
Ilm enite* 73.1
F onte: B anc o de M oç am bique
* ex portac oes dos m ega-projec tos

Exportações e Importações (crescimento real), balança


comercial e conta corrente (% do PIB) excluindo grandes
projectos

10 2008 1o semestre 2009 1o semestre


%
0
Exportações Importações Balanca Conta corrente
-10 -8.6
comercial
‐13.5 -14.8
-20
‐23.4 -25.0
-30

-40
-41.8
-50

 
Fonte: Cálculos do autor com base em dados da BOP e INE

47
ANEXO F

Estrutura do crédito a economia (%)
100

80
60

40
20
0

em MT em USD

Fonte: cálculos do autor com base em dados da síntese monetária do sistema (Banco de Moçambique)

Estrutura dos depósitos (%)
100

80
60

40
20
0

em MT em USD

Fonte: cálculos do autor com base em dados da síntese monetária do sistema (Banco de Moçambique)

48
ANEXO G

Cenário 1: Se a crise afectar todos os sectores de actividade da economia moçambicana e o


Governo não tomar medidas de contenção
Pressupostos:
• 45% dos choques que ocorrem nas economias desenvolvidas são repassados para as
economias em desenvolvimento (Akin e Kose, 2007);
• Todos os sectores serão afectados pela crise;
• A transmissão dos choques diminuirá com o tempo: 45% em 2009, 22.5% em 2010 e
11.25% em 2011.

Cenário 2: Se a crise afectar apenas os sectores de risco e o Governo não tomar medidas de
contenção
Pressupostos:
• 45% dos choques que ocorrem nas economias desenvolvidas são repassados para as
economias em desenvolvimento (Akin e Kose, 2007);
• A crise afectara apenas os sectores de risco;
• A transmissão dos choques diminuirá com o tempo: 45% em 2009, 22.5% em 2010 e
11.25% em 2011.

Cenário 3: Se a crise afectar apenas os sectores de risco e o Governo tomar medidas de


contenção apenas nos sectores de risco
Pressupostos:
• Relaxamento da hipótese de Akin e Kose (2007): Ao invés de 45%, o efeito do choque é
reduzido a metade – 22,5% dos choques que ocorrem nas economias desenvolvidas são
repassados para as economias em desenvolvimento;
• A crise afectará apenas os sectores de risco;
• O Governo toma medidas para minimizar o impacto da crise apenas nos sectores de risco;
A transmissão dos choques diminuirá com o tempo: 22.5% em 2009, 11.25% em 2010 e 5.8% em
2011.

49

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